CUSTAS DE PARTE
NOTA DISCRIMINATIVA E JUSTIFICATIVA
RECLAMAÇÃO
DECISÃO
RECURSO
ADMISSIBILIDADE
PRAZO DE RECURSO
Sumário

A decisão judicial incidente sobre uma reclamação de nota discriminativa e justificativa de custas de parte, apresentada ao abrigo do Art.º 26.º-A do R.C.P. depois de proferida a decisão final que pôs termo ao processo principal, é recorrível, mas o prazo de admissão desse recurso é de 15 dias, por se mostrar preenchida a previsão do Art.º 644.º n.º 2 al. g) do C.P.C. e, por isso, ser aplicável a 2.ª parte do n.º 1 do Art.º 638.º n.º 1 do C.P.C..

Texto Integral

Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

JB, notificado do despacho do Juiz Relator datado de 7 de outubro de 2024 (Ref.ª n.º 22166745 – p.e.) que, nos termos do Art.º 643º n.º 4 do C.P.C., desatendeu à reclamação apresentada relativamente a despacho da 1.ª instância que não havia admitido recurso por si interposto de decisão datada de 20 de fevereiro de 2023 (Ref.ª n.º 54902235 – p.e.), veio apresentar reclamação para a conferência ao abrigo do disposto no Art.º 652.º n.º 3 do C.P.C..
A Recorrida, Caixa Geral de Depósitos, S.A., notificada que foi dessa reclamação nada veio dizer aos autos.
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Foram considerados os seguintes factos documentados nos autos:
1- JB deduziu oposição, por embargos de executado, à execução que lhe era movida pela Caixa Geral de Depósitos, S.A., nos termos da qual a exequente pedia o pagamento da quantia de €43.488.232,50, tendo sido atribuído ao processo de embargos esse mesmo valor tributário (cfr. “Requerimento de início de processo” de 14-06-2019 – Ref.ª n.º 3280829 - p.e. do apenso “A”);
2- Por sentença de 3 de fevereiro de 2020, foram os embargos julgados improcedentes por não provados (Ref.ª n.º 48193581 - p.e.), o que foi confirmado por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 16 de fevereiro de 2021 (Ref.ª n.º 17787668 - p.e.), tendo em ambas as instâncias sido o Embargante condenado como responsável pelas custas do processo;
3- Transitada em julgado essa decisão e regressados os autos à 1.ª instância, foi o processo à conta, daí resultando a responsabilidade do embargante pelo pagamento da quantia de €264.537,00 (cfr. “Conta” de 21-03-2022 – Ref.ª n.º 51478392 - p.e.);
4- O Embargante veio a reclamar da conta, requerendo a sua reforma, no sentido de ser decidido que não era devida a taxa de justiça remanescente, ou que fosse dispensado o seu pagamento (cfr. “Requerimento” de 07-04-2022 – Ref.ª n.º 4692689 - p.e.);
5- Esse requerimento veio a ser deferido por despacho de 4 de maio de 2022 (Ref.ª n.º 51699952 - p.e.), mas o Ministério Público dele interpôs recurso de apelação (cfr. “Alegações de Recurso” de 18-05-2022 – Ref.ª n.º 4706955 - p.e.), tendo o Tribunal da Relação de Lisboa revogado esse despacho, ordenando a subsistência da conta original e mantendo a obrigação de pagamento da taxa de justiça remanescente, condenando o Embargante nas custas do processo (cfr. “Acórdão” de 06-02-2022 – Ref.ª n.º 19276334 - p.e.);
6- O Embargante ainda recorreu para o Tribunal Constitucional (cfr. “Alegações” de 04-11-2023 – Ref.ª n.º 612997 - p.e.), que negou provimento ao recurso e condenou o Embargante nas custas do processo (cfr. “Acórdão” de 10-10-2023 - p.e.);
7- Regressados os autos ao tribunal de 1.ª instância, por despacho de 5 de dezembro de 2023 é ordenado notificar de novo o executado/embargante da conta original e para proceder ao seu pagamento (Ref.ª n.º 54525560 - p.e.);
8- A Embargada, por requerimento de 7 de fevereiro de 2023 (Ref.ª n.º 5540880 - p.e.), veio apresentar nota discriminativa e justificativa de custas de parte, ao abrigo do Art.º 25.º do R.C.P., reclamando o pagamento de €135.572,50;
9- O Embargante veio reclamar da nota discriminativa e justificativa de custas de parte (cfr. “Requerimento” de 21-12-2023 – Ref.ª n.º 5562059 - p.e.), invocando a extemporaneidade da sua apresentação, pondo em causa algumas das verbas da nota justificativa e justificando não ser devido o depósito prévio, tendo assim depositado apenas €102,00 relativo à taxa de justiça do incidente (cfr. “Comprovativo do Pagamento” de 21-12-2023 – Ref.ª n.º 5562059 - p.e.);
10- A Embargada respondeu à reclamação, suscitando logo a questão da falta de depósito prévio do valor reclamado na nota discriminativa e justificativa das custas de parte (cfr. “Requerimento” de 15-01-2024 – Ref.ª n.º 5589636 - p.e.);
11- Por despacho de 20 de fevereiro de 2024 (Ref.ª n.º 54902235 - p.e.), foi decidido não conhecer da reclamação por não ter o Embargado procedido ao depósito do valor da nota reclamada;
12) Esse despacho foi notificado ao executado por registo de 21-02-2024 (Ref.ª n.º 54914819 – p.e.);
13) O Embargante interpor recurso de apelação desse despacho em 9 de abril de 2024 (Ref.ª n.º 5719462 - p.e.);
14) Após ser concedido prazo para exercer o contraditório sobre a questão da tempestividade do recurso (cfr. “Despacho” de 15-05-2024 – Ref.ª n.º 55333807 - p.e.), veio a ser proferido o despacho de não admissão do recurso de 19 de junho de 2024 (Ref.ª n.º 55532888 - p.e.), com o seguinte teor:
«O recurso apresentado pelo executado versa sobre o despacho de 20/02/2024, notificado em 21/02/2024 ao recorrente, pelo qual foi decidido não conhecer da reclamação da nota justificativa de custas de parte apresentada pela Caixa Geral de Depósitos, SA.
«A decisão não pôs termo à causa, nem a procedimento cautelar, nem a incidente processado autonomamente, estando por isso afastado o disposto no artigo 644.º n.º 1 do CPC.
«O incidente também não reveste autonomia processual para efeito de integração no perímetro do artigo 644.º n.º 1 do CPC.
«Como ensina Abrantes Geraldes1, «A apelação autónoma apenas abarca os incidentes processados autonomamente. Não se circunscrevendo esta previsão aos incidentes processados por apenso, como ocorre com a habilitação, tem potencialidades para abarcar outros incidentes tramitados no âmbito da própria ação, desde que sejam dotados de autonomia, designadamente a intervenção de terceiros ou a verificação do valor da causa, implicando trâmites específicos que não se confundam com os da ação em que estão integrados.»
«Seja como for, está em causa um despacho proferido depois da decisão final dos embargos de executado, pelo que o recurso só podia ser admitido ao abrigo do n.º 2 do artigo 644.º, mais concretamente da sua alínea g).
«Nos casos subsumíveis ao n.º 2 do artigo 644.º do CPC, o prazo de recurso é de 15 dias, como resulta do artigo 638.º n.º 1 (parte final) do CPC.
«Tendo o executado sido notificado do despacho no dia 21/02/2024, o prazo de recurso terminou em 12/03/2024 (15/03/2022 foi o terceiro dia útil subsequente – cf. artigo 139.º n.º 5 do CPC).
«O recurso deduzido em 09/04/2024 é, pois, intempestivo.
«Neste sentido: acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 09/05/2024 (Tomé de Carvalho), acessível em www.dgsi.pt, que versa precisamente sobre a mesma questão.
«Pelo exposto, julgo inadmissível o recurso.
«Notifique».
15) O Embargante foi notificado desse despacho de não admissão do recurso por registo de 20-06-2024 (Ref.ª n.º 55544828 - p.e.) e apresentou a presente reclamação a 09-07-2024 (Ref.ª n.º 5858127 - p.e.), com pagamento de multa, nos termos do Art.º 139.º n.º 5 do C.P.C., sustentando que o prazo de interposição do recurso, por se tratar de incidente autónomo, seria de 30 dias, nos termos do Art.º 644.º n.º 1 al. a) do C.P.C..
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Corridos os vistos, cumpre apreciar.
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Em causa está a decisão singular, proferida pelo Juiz Relator, que nos termos do Art.º 643º n.º 4 do C.P.C., tendo por assente a factualidade supra transcrita, decidiu que o recurso era extemporâneo, confirmando a decisão da 1.ª instância que não havia admitido o recurso.
Na reclamação para a conferência, sustenta-se que a reclamação de custas consubstancia um incidente processual inominado (cfr. Art.s 145.º n.º 1, 539.º n.º 1 do C.P.C. e Art.º 31.º n.º 6, 1.ª parte, do R.C.P. (cfr. acórdão do TRG de 2/9/2017). O que é extensivo à reclamação da nota de custas de parte (cfr. Art.º 33.º n.º 3 da Portaria n.º 419-A/2009 de 17 de abril e Art.º 26.º-A do R.C.P.).
Sendo um incidente, é um incidente processado autonomamente, nos termos de para os efeitos do disposto na al. a) do n.º 1 do Art.º 644.º do C.P.C., relativamente ao qual se aplica o prazo de recurso de 30 dias, previsto no Art.º 638.º n.º 1, 1.ª parte do C.P.C..
Suporta essa conclusão no sumário do “acórdão” do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 12/12/20174, disponível em www.dgsi.pt), donde se pode ler: «I- O incidente da reclamação da conta deve ser entendido, face a sua tramitação própria relativamente ao processado que conduz à decisão final da ação, como um “incidente processado autonomamente”, para efeitos do disposto no 644, n°1, al. a) parte final do nCPC. II - Segundo julgamos, a decisão final, como referência para a apelação autónoma, prevista no artº 644º, n°2, al. g) do NCPC, e para o enquadramento na previsão do prazo de 15 dias estabelecido na parte final do artº 638º, nº1, só interessa relativamente aos recursos que não sejam interpostos de decisão que ponha termo a “incidente processado autonomamente”.
III - Se a decisão pôs termo ao “incidente processado autonomamente” é logo o nº 1, a), do artº 644º que manda seguir o respectivo recurso como apelação autónoma, não havendo qualquer necessidade de, para o efeito, chamar a colação o disposto no n°2, al. g) desse artigo e, consequentemente, de aplicar o prazo de 15 dias previsto, “ex vi” da parte final do artº 638º, nº 1, para os casos em que a apelação autónoma é admissível por via dessa alínea g). IV - A disposição do nº 2, g) do artº 644º visa disciplinar todos os recursos proferidos depois da decisão final que não tenham integração no nº1 desse artigo, ou numa das outras alíneas do nº2 do mesmo. V - Ao recurso de decisão da 1ª instância que ponha termo a “incidente processado autonomamente”, ainda que tal decisão seja proferida depois daquela que colocou termo à causa principal, aplica-se o prazo de interposição de 30 dias, “ex vi” do nº 1, a) do artº 644º e da 1ª parte do nº 1 do artº 638º, ambos do NCPC, não havendo que chamar à colação o disposto na nº 2, g) desse artº 644º, nem, consequentemente, o prazo de 15 dias previsto na parte final do citado artº 638º, nº 1»
Temos de referir, antes de mais, que consultado o mencionado “acórdão” no sítio da “dgsi”, verificamos que se trata formalmente de decisão singular da autoria do Sr. Juiz Desembargador Falcão de Magalhães, nela se expressando um entendimento evidentemente contrário ao sustentado pelo Relator dos presentes autos.
O Relator expressou então a seguinte posição:
«O que está em causa é um recurso interposto pelo Embargante, no quadro de um processo de embargos de executado, que já se mostrava julgado por sentença transitada em julgado, relativamente a despacho que indeferiu uma reclamação à nota discriminativa e justificativa de custas de parte apresentada pela Embargada, na qual se reclamava o pagamento de €135.572,50 ao abrigo do Art.º 25.º do R.C.P..
«Não se põe em causa que a decisão recorrida era objetivamente recorrível, por não se tratar de despacho de mero expediente, nem proferido no exercício de um poder discricionário (cfr. Art.º 630.º do C.P.C.).
«Também nunca se pôs em causa a questão da recorribilidade relacionada com o valor da causa ou da sucumbência (cfr. Art.º 629.º n.º 1 do C.P.C. e Art.º 33.º n.º 3 da Portaria n.º 419-A/2009 de 17/4).
«De igual modo, não se suscita qualquer dúvida sobre a legitimidade do Recorrente, que ficou integralmente vencido pela decisão recorrida (cfr. Art.º 631.º n.º 1 do C.P.C.).
«O problema da admissibilidade do recurso rejeitado só se coloca relativamente à sua tempestividade (cfr. Art.º 638.º n.º 1 do C.P.C.).
«Assim, enquanto no despacho reclamado se sustenta que o prazo para interposição do recurso seria de 15 dias, por estarmos perante uma “decisão posterior à decisão final” (cfr. Art.º 644.º n.º 2 al. g) do C.P.C.), para o ora Reclamante o prazo seria de 30 dias, porquanto o recurso tem por objeto uma decisão que pôs termo a “incidente processado autonomamente” (cfr. Art.º 644.º n.º 1 al. a) do C.P.C.).
«Apreciando, há que ter em conta que, nos termos do Art.º 638.º n.º 1 do C.P.C.: «1 - O prazo para a interposição do recurso é de 30 dias e conta-se a partir da notificação da decisão, reduzindo-se para 15 dias nos processos urgentes e nos casos previstos no n.º 2 do artigo 644.º e no artigo 677.º».
«Portanto, a regra é que o prazo para interposição de recurso é de 30 dias, exceto se se verificar alguma das situações previstas na 2.ª parte do n.º 1 do Art.º 638.º do C.P.C., caso em que o prazo é reduzido para 15 dias.
«Fica assim claro que esta norma está construída segundo a ideia de que, verificada a exceção, não se aplica a regra.
«Ora, uma das situações previstas nessa 2.ª parte do n.º 1 do Art.º 638.º do C.P.C. é precisamente o caso da decisão recorrida corresponder a um dos casos previstos no Art.º 644.º n.º 2 do C.P.C., onde efetivamente existe uma alínea g) que prevê a possibilidade de haver recurso autónomo da: «g) (…) decisão proferida depois da decisão final».
«Não pode haver discussão que a decisão recorrida foi efetivamente proferida depois do trânsito em julgado do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que pôs termo aos embargos de executado que o embargante havia deduzido. De facto, todo o processado posterior, em que se inclui a decisão recorrida aqui em causa, está apenas relacionado com a concretização, desenvolvimento e conteúdo das obrigações tributárias da parte que havia perdido definitivamente a ação.
«Sustenta, no entanto, o Reclamante que a decisão recorrida tinha por objeto a apreciação de “incidente processado autonomamente” e, portanto, estaria em causa uma situação que se enquadrava na al. a) do n.º 1 do Art.º 644.º do C.P.C..
«E, de facto, o Art.º 644.º n.º 1 al. a) estabelece que: «1 - Cabe recurso de apelação: a) Da decisão, proferida em 1.ª instância, que ponha termo à causa ou a procedimento cautelar ou incidente processado autonomamente».
«Não se nega que o Art.º 33.º da Portaria n.º 419-A/2009 de 17/4, que trata da matéria da reclamação da nota justificativa de custas de parte, estabelece o seguinte:
«1 A reclamação da nota justificativa é apresentada no prazo de 10 dias, após notificação à contraparte, devendo ser decidida pelo juiz em igual prazo e notificada às partes.
«2 - A reclamação da nota justificativa está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota.
«3 - Da decisão proferida cabe recurso em um grau se o valor da nota exceder 50 UC.
«4 - Para efeitos de reclamação da nota justificativa são aplicáveis subsidiariamente, com as devidas adaptações, as disposições relativas à reclamação da conta constantes do artigo 31.º do RCP».
«Sobrelevando esta última regra, dela resulta que, uma vez que a “reclamação da conta” é tratada pelo RCP como uma questão incidental que só pode ser tributada nos termos do Art.º 7.º n.º 4 do R.C.P., de acordo com a tabela II a ela anexa, implicando a prova do pagamento prévio da taxa de justiça (cfr. Art.s 145.º n.º 1 e 539.º n.º 1 do C.P.C.), tal se implicará igualmente à reclamação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte, por força do Art.º 33.º n.º 4 da Portaria n.º 419-A/2009 de 17/4.
«No fundo é isto que o Reclamante evidenciou na reclamação ora em apreço.
«Mas por se tratar de questão incidental, daí não decorre que se trate necessariamente de “incidente processado autonomamente”.
«De facto, tem-se vindo a entende que um “incidente processado autonomamente” é aquele que é regulado pela lei processual civil de forma independente relativamente à ação principal, embora intrinsecamente relacionado com esta, assumindo tal natureza os denominados “incidentes da instância” regulados nos artigos 292.º a 361.º do C.P.C. (cfr. Ac. do TRL de 15/9/2022 – Proc. n.º 1634/05.2TMLSB-E.L1-2 – Relator: Paulo Fernandes da Silva, disponível em www.dgsi.pt).
«Abrantes Geraldes (in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Ed. 2018, pág. 204), escreve a este propósito que: «[a] apelação autónoma apenas abarca “os incidentes processados por apenso, como ocorre com a habilitação, (…) mas que é extensiva a outros incidentes tramitados no âmbito da própria ação, desde que sejam dotados de autonomia. Tal como ocorre com os incidentes de intervenção de terceiros, (…) com o da liquidação ou com o de verificação do valor da causa, cada um deles a implicar trâmites específicos que não se confundem com os da ação em que estão integrados (…)».
«Teixeira de Sousa (in post de 20.10.2020, Jurisprudência 2020 (76), no blogippc.blogspot.com), em sentido semelhante refere: «(…) tendo presente que qualquer incidente dispõe sempre de algum grau de autonomia, afigura-se-nos que foi intenção do legislador incluir na referida al. a) do nº 1 do art.º 644º apenas os incidentes que a lei processual civil expressamente prevê e regula de forma autónoma relativamente à ação principal, nos art.º 296º a 361º do CPC.. Neste sentido, o Ac. do STJ de 16.06.2015, CJ, III, 123, refere que esses incidentes “são apenas aqueles a que a lei atribui tal processado independentemente do que é próprio das ações em que se possam suscitar, encontrando-se regulados nos art.º 296º a 361º: verificação do valor da causa, intervenção de terceiros, liquidação” (…)».
«Portanto, nem todos os incidentes, mesmo que sujeitos a tributação como incidentes, são verdadeiros “incidentes autónomos” ou “independentes”.
«É verdade que a autonomia nada tem a ver com a circunstância da sua tramitação ser processada formalmente por apenso ou nos próprios autos. O que releva é que eles possam ser estranhos ao normal processado dos autos, sendo que tal não ocorre relativamente a matérias relacionadas com a determinação da responsabilidade por custas, que emerge diretamente duma concretização e desenvolvimento mais pormenorizado da condenação das partes em custas constante do final das decisões que apreciam o mérito da causa ou, por qualquer outra razão, põem termo ao processo principal em que o incidente se insere.
«Por isso, na decisão singular de 24/11/2020, proferida pelo Sr. Desembargador José Manuel Barata (Proc. n.º 3145/15.9T8PTM-A.E1, disponível no sítio www.dgsi.pt) se defendeu que: «I- Incidente da instância é uma ocorrência estranha ao desenrolar normal de um processo, que dá lugar a processado próprio e tem fins específicos a alcançar. II- O incidente anómalo que constitui a reclamação da conta de custas não tem as características de incidente da instância como exigido pelo regime legal, pelo que não está incluído na previsão do artigo 644.º/1, a), do CPC. III.- O prazo para recorrer do despacho que indeferiu a reclamação da conta de custas é o de 15 dias, previsto pela conjugação dos artigos 638.º/1, in fine, e 644.º/2, g), do CPC».
«O que vai de encontro, embora partindo doutro ponto de vista, ao sentido do acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 9/5/2024 (Proc. n.º 82/20.9T8FAR-A.E1 – Relator: Tomé de Carvalho, disponível no mesmo sítio), citado na decisão reclamada, de cujo sumário consta: «Uma decisão proferida depois da decisão final está integrada na esfera de previsão da alínea g) do n.º 2 do artigo 644.º do Código de Processo Civil e, por conseguinte, o prazo para a interposição do recurso é de 15 dias».
«Em suma, é nosso entendimento que o incidente de reclamação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte é efetivamente um incidente, mas não é um “incidente processado autonomamente” para os efeitos do Art.º 644.º n.º 1 al. a) “in fine” do C.P.C.. Consequentemente, a decisão que incida sobre esse incidente, porque posterior à prolação da decisão que pôs termo ao processo, e porque ligada incindivelmente à normal tramitação do processo, consequente à condenação das partes em custas, preenche a previsão da al. g) do n.º 2 do Art.º 644.º do C.P.C., estando assim sujeita ao prazo de 15 dias para interposição de recurso sobre ela, por força da 2.ª parte do n.º 1 do Art.º 638.º do C.P.C..
«Visto isto, o despacho recorrido, proferido a 20 de fevereiro de 2024 (Ref.ª n.º 54902235 - p.e.), foi notificado ao executado por registo de 21-02-2024 (Ref.ª n.º 54914819 - p.e.), pelo que o recurso deveria ter sido interposto até ao dia 12 de março de 2024 (ou até ao dia 15 de março, sexta-feira seguinte, mediante o pagamento de multa, nos termos do Art.º 139.º n.º 5 ou 6 do C.P.C.). No entanto, o recurso foi interposto em 9 de abril de 2024 (Ref.ª n.º 5719462 - p.e.). Logo, fora de prazo.
«Nessa medida, só poderemos confirmar a decisão reclamada e indeferir a reclamação».
Em suma, o ponto central é o seguinte: mesmo que estivéssemos perante um incidente processado autonomamente – o que, admitimos, pode efetivamente ser discutível –, o presente recurso tem por objeto uma decisão que preenche a previsão da al. g) do n.º 2 do Art.º 644.º do C.P.C. e, assim sendo, aplica-se a 2.ª parte do Art.º 644.º n.º 1 do C.P.C., onde se estatui que o prazo de interposição de recurso é de 30 dias «reduzindo-se para 15 dias nos processos urgentes e nos casos previstos no n.º 2 do artigo 644.º e no artigo 677.º». Ou seja, verificando-se a exceção, afasta-se a regra.
Nestes termos, julgamos confirmar a decisão singular reclamada.
                       
DECISÃO:
Pelos fundamentos expostos, ao abrigo do Art.º 652.º n.º 3 “ex vi” Art.º 643º n.º 4 do C.P.C., acorda o coletivo de Juízes desta 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em manter o despacho do Relator que indeferiu a reclamação ao despacho de 07/10/2023, que não havia admitido o recurso interposto do despacho de 20/02/2023, mantendo assim a decisão de que esse recurso não era admissível por ser extemporâneo.
- Custas do incidente pelo reclamante (Art.º 527.º do C.P.C.), fixando-se a taxa de justiça em 2 U.C. (Art.º 7.º n.º 4 e tabela II anexa ao RCP).
- Notifique.
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Lisboa, 3 de dezembro de 2024
Carlos Oliveira
José Capacete
Paulo Ramos Faria