DESPEJO
NOTIFICAÇÃO
DOMICÍLIO
ALTERAÇÃO
Sumário

1 – O n.º 2 do artigo 229.º do Código de Processo Civil não é aplicável nas notificações do BNA aos arrendatários relativos aos requerimentos de despejo.
2 – Se tiver ocorrido a alteração de domicílio que foi aceite ou conhecida do senhorio, em sede de procedimento especial de despejo, este não pode indicar a morada previamente convencionada, sob pena de, assim não sendo, em caso de frustração da notificação pessoal do requerimento inicial, sempre que o destinatário da citação pessoal não chegue a ter conhecimento do acto, ocorrer um cenário de falta de citação.
(Sumário do Relator)

Texto Integral

Processo n.º 334/24.9T8GDL.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal – Juízo de Local de Competência Cível de Grândola – J1
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Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora:
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I – Relatório:
No Procedimento Especial de Despejo instaurado por “(…), Lda.” contra (…), a requerida veio interpor recurso do despacho que indeferiu o pedido de declaração de nulidade da citação.
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Em 02/10/2024, a requerida (…) arguiu a nulidade da citação.
Para tanto, a requerida invocou que celebrou com a requerente um contrato de arrendamento relativamente à fracção autónoma designada pelas letras “(…)” do aldeamento turístico “Casas da (…)” e que, à data da outorga do mesmo, tinha como residência a Rua da (…), em Lisboa.
Afirmou que, em 18/04/2023, alterou o seu domicílio fiscal e que essa modificação da morada foi comunicada, na mesma data, por email, à requerente.
Mais salientou que não foi notificada ou citada para o presente procedimento e que apenas teve conhecimento destes autos quando foi sujeita a uma penhora de saldos bancários no âmbito do processo executivo que corre termos sob o n.º 4100/24.3T8STB, no Juízo de Execução de Setúbal – J 2.
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Exercido o contraditório, a requerente “(…), Lda.” disse que a requerida teve conhecimento da presente acção na decorrência da deslocação do Agente de Execução ao imóvel em causa no âmbito dos presentes autos, com vista à tomada de posse do imóvel.
A requerente referiu ainda que, conforme resulta do contrato de arrendamento dos autos, as partes convencionaram domicílio nas moradas constantes do preâmbulo do referido contrato e que, em momento algum, contrariamente ao referido pela requerida, recepcionou qualquer comunicação escrita a comunicar a alteração do domicílio.
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Após ter enunciado o histórico do incidente e descrito os factos apurados, a decisão recorrida tinha o seguinte conteúdo:
«(…) Conforme avulta da factualidade fixada, convencionaram as partes no contrato de arrendamento que celebraram que todas as comunicações decorrentes da relação contratual de arrendamento seriam efectuadas nas moradas que constam do respectivo preâmbulo, sendo que para o aqui releva, a morada da Autora é Estrada dos (…), Quinta da (…), 2900-720 Setúbal, sendo a da Ré Rua da (…), n.º 83, 5L.
Daqui decorre à saciedade, que existiu entre as partes um domicílio convencionado para efeitos de comunicações atinentes à execução do contrato.
Ora, invoca a Ré que comunicou à Autora a alteração do domicílio convencionado através de correio electrónico.
E, o que desde logo resulta à evidência, é que mesmo que a comunicação por correio electrónico tenha sido recebido pela Autora – o que esta não confirma – tal comunicação não foi efectuada nos termos e condições acordadas (para o domicilio da Autora que consta do preâmbulo do contrato) pelo que dificilmente se poderá considerar como válida.
Ora, no âmbito do PED, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 15.º-B, alínea e) do n.º 1 do artigo 15.º-C e n.º 3 do artigo 15.º-D, todos do NRAU, a notificação é realizada para a morada convencionada.
A circunstância de a Ré arrendatária ter alterado o seu domicílio fiscal, sem que o tenha comunicado na forma contratualmente estabelecida, em nada altera a morada convencionada para onde foi requerida a notificação.
Com efeito, a notificação é realizada para a morada convencionada no contrato de arrendamento, sendo irrelevante a alteração da morada convencionada sem observância do acordado e dos termos legais, ou seja, mediante carta registada com a/r, nos termos do artigo 229.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, sendo certo que do artigo 9.º, n.º 7, do NRAU parece resultar uma exigência acrescida, uma vez que faz depender a referida alteração da autorização da modificação pretendida pelo próprio senhorio.
Ora, a Ré não alegou nem demonstrou ter dado cumprimento à alteração do domicílio convencionado nos termos acordados e/ou legais. Limitou-se a juntar aos autos uma missiva cujo endereço electrónico se desconhece, remetido de forma muito pouco prudente, numa altura em que a relação contratual já se encontraria num ponto de ruptura, atenta a notificação judicial avulsa expedida relativamente poucos meses depois com fundamento na falta de pagamento de rendas desde Janeiro de 2021.
Aliás, tal ponto de ruptura é indiciado no corpo da própria mensagem de correio electrónico, tanto mais que a Ré menciona no mesmo que “Se prefere não comunicar por email, poderá enviar para lá.”
Em suma: concluindo-se existir no contrato celebrado entre as partes domicilio convencionado e não logrando a Ré demostrar que, validamente, procedeu à alteração de tal domicilio, a notificação expedida no âmbito do PED para esse mesmo domicilio terá de se considerar válida, eficaz e a produzir os seus efeitos legais, não se verificando qualquer preterição de formalidade legal que a torne nula ou inapta a produzir os seus efeitos.
O mesmo é dizer que se tem a notificação por válida e regular, julgando-se improcedente a nulidade de citação invocada pela Ré».
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Inconformada com tal decisão, a recorrente apresentou recurso de apelação e formulou as seguintes conclusões:
«A. Vem o presente Recurso interposto do despacho proferido em 17.10.2024 que, considerando não ter a Requerida alterado validamente a morada convencionada para efeitos das comunicações entre as partes ao abrigo do contrato de arrendamento por elas celebrado, julgou improcedente a alegação de nulidade da sua citação, mantendo válido o título de desocupação do locado emitido pelo BNA e determinou que o Sr. Agente de Execução desse cumprimento ao mesmo nos termos do artigo 15.º-J do NRAU.
B. Salvo o devido respeito, a Requerida entende que no Despacho Recorrido, o Tribunal a quo faz uma interpretação incorreta do Contrato e da própria lei no que concerne aos requisitos para alteração do domicílio convencionado entre as partes.
C. Contrariamente ao entendimento do Tribunal a quo, a válida alteração da morada convencionada não depende do envio de carta registada com aviso de receção para a morada estabelecida no preâmbulo do Contrato, nem da autorização do senhorio (no caso a Requerente).
D. Por um lado, ao contrário do que afirma o Despacho Recorrido, as partes não convencionaram que qualquer alteração ao domicílio convencionado para efeitos do contrato deveria comunicada por carta para a morada constante do preâmbulo do mesmo. Antes pelo contrário, a única formalidade prevista para efeitos de alteração da morada convencionada foi a exigência de comunicação escrita, que a Requerida cumpriu através do email que enviou à Autora a 18.04.2023.
E. Por outro lado, andou mal o Tribunal a quo ao considerar que a formalidade de envio de carta registada com aviso de receção prevista no artigo 229.º, n.º 2, do CPC se impunha. Isto porque, no presente caso, a morada convencionada releva para efeitos da notificação do PED, regulada pelo artigo 15.º-D, n.º 3, do NRAU que não remete para o citado 229.º, n.º 2, do CPC. Daqui decorre ser intenção do legislador submeter a alteração do domicílio convencionado ao princípio da liberdade de forma estabelecido no artigo 219.º do CC, pelo que o email de 18.04.2023 cumpre claramente os requisitos legais de forma que lhe são aplicáveis.
F. Finalmente, não deve proceder o entendimento do Tribunal a quo de que a alteração do domicílio convencionado da Requerida (arrendatária) depende da autorização da Requerente (senhorio), nos termos do artigo 9.º, n.º 7, alínea c), do NRAU. Primeiro, porque a regra em causa aplica-se apenas à comunicação do senhorio para efeitos de cessação do contrato por resolução – o que, no caso sub judice foi promovido por notificação judicial avulsa para a Morada do Locado; segundo, porque a referida norma se encontra ferida de inconstitucionalidade por violação do princípio da proporcionalidade pelo que a sua aplicação deve ser recusada nos termos do artigo 204.º da CRP; terceiro, e mesmo que assim não fosse a verdade é que a Requerente autorizou tacitamente a alteração do domicílio da Requerida ao ter remetido a notificação judicial avulsa que serve de base ao presente procedimento para a morada constante do email de 18.04.2023 que procedeu à alteração da morada convencionada.
G. Em face do exposto, importa concluir que a Requerida alterou validamente o seu domicílio convencionado pelo que a falta de conhecimento das duas notificações que lhe foram endereçadas pelo BNA e consequente falta de oposição no âmbito do PED não lhe podem ser imputáveis.
H. Consequentemente, houve no presente caso uma nulidade de citação nos termos do artigo 188.º, n.º 1, alínea e), do CPC, o que implica a anulação de todos os termos subsequentes que dela dependam conforme estabelece o artigo 191.º, n.º 2, do CPC, o que se requer.
I. Independentemente da nulidade da citação, o presente processo é manifestamente improcedente, uma vez que a norma que se extrai da interpretação dos artigos 15.º-D, n.º 3, do NRAU, 229.º, nºs 4 e 5, do CPC, 230.º, n.º 2, do CPC e 15.º-E, n.º 1, alínea a), do NRAU, e que habilitou a formação de título de desocupação do locado por parte da Ré é inconstitucional por violação dos direitos de defesa do requerido num âmbito do PED e do princípio da proporcionalidade, quando interpretadas no sentido de que, em caso de frustração da notificação do requerido (para desocupar o locado, pagar a quantia pedida acrescida da taxa de justiça liquidada pelo requerente, deduzir oposição ou requerer o deferimento da desocupação do locado), por terem sido devolvidas ambas as cartas enviadas para a morada indicada pelo requerente como sendo do domicílio convencionado, faz presumir a notificação do requerido, ainda que o mesmo aí não resida, contando-se a partir desse depósito o prazo para deduzir oposição.
J. Por fim, não pode deixar de ser globalmente ponderada a atuação da Requerente que, não obstante ter promovido a notificação judicial avulsa da Requerida na Morada do Locado, que sabia ser a sua morada atual, optou por deliberadamente indicar no PED a antiga morada da Requerente, o que impediu que esta tomasse conhecimento da pendência do PED e que tivesse a oportunidade de apresentar a sua defesa no processo.
Nestes termos e nos melhores de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá ser dado provimento ao recurso, revogando-se o Despacho Recorrido, substituindo-o por outro que:
a) Declare nula a citação da Ré nos presentes autos e anule todos os atos processuais subsequentes;
b) Declare nulo o título de desocupação do locado por ter sido emitido através da aplicação de normas inconstitucionais.
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A parte contrária contra-alegou, defendendo a manutenção da decisão recorrida, dizendo basicamente que:
i) A alegada alteração da morada convencionada efectuada pela Apelante por correio eletrónico (não recebido pela Apelada) não cumpre as formalidades exigidas pelo contrato de arrendamento.
ii) Resulta do contrato de arrendamento que, para além da comunicação ter de ser efetuada por escrito, isto é, por carta, sempre teria de o ser para a morada da Apelada indicada no preâmbulo.
iii) E a Apelada não autorizou tal modificação, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 9.º, n.º 7, alínea c), do NRAU».
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II – Do objecto do recurso:
É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do CPC), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma).
Da interpretação e da análise das transcritas alegações de recurso apresentadas resulta que a matéria a decidir se resume à apreciação da existência de:
i) nulidade da citação e respectivas consequências.
ii) má-fé da requerente.
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III – Da factualidade com interesse para a justa decisão da causa:
1) Por requerimento de 2/4/2024, a Autora “(…), Lda.” apresentou requerimento de despejo do locado sito no Aldeamento Turístico Casas da (…), n.º (…).
2) Indicou para tanto a identificação da Ré, com a morada Rua da (…), n.º 83, 5L, 1100-178 Lisboa.
3) Juntou ao requerimento de despejo, notificação judicial avulsa concretizada na própria Ré em 31/08/2023, notificada na morada do locado, ou seja, no Aldeamento Turístico Casas da (…), n.º (…).
4) A Ré foi notificada pelo BNA para a morada indicada no requerimento de despejo, por notificação que não foi recebida com fundamento de “objecto não reclamado”.
5) O BNA expediu nova notificação, para a morada que consta do requerimento de despejo, que foi objecto de depósito no receptáculo em 30/04/2024.
6) Em 04/06/2024, e face à não oposição da Ré, foi emitido o título de desocupação do locado.
7) Em 02/10/2024, a Ré juntou aos autos o requerimento a arguir a nulidade da citação em apreciação.
8) Acordaram as partes na cláusula 10ª do contrato de arrendamento que “cada um dos contraentes obriga-se a comunicar por escrito, aos outros, qualquer alteração às respectivas moradas – identificadas no preâmbulo do presente contrato – aceitando expressamente que, até se efectuar tal comunicação, os únicos locais válidos para o efeito de se endereçarem comunicações decorrentes deste contrato são as constantes do preâmbulo do mesmo. A recusa de recebimento de qualquer comunicação vale para todos os efeitos como comunicação efectuada”.
9) A Ré remeteu no dia 18/03/2023, via correio electrónico, para o endereço “mail....com”, a seguinte comunicação: “Bom dia, efectuei a alteração do domicílio fiscal para o espaço que lhe arrendo nas Casas da (…). Se prefere não comunicar por email, poderá enviar para lá. Já dei informação a recepção para aceitar as cartas registadas. Segue em anexo o comprovativo de morada”.
10) No preâmbulo do contrato celebrado entre as partes, a morada que consta da Ré é “Rua da (…), n.º (…), 5L”.
11) No preâmbulo do contrato, a morada que identifica a Autora é Estrada dos (…), Quinta da (…), 2900-720 Setúbal.
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IV – Fundamentação:
A citação é o acto pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada acção e se chama ao processo para se defender (primeira parte do n.º 1 do artigo 219.º[1] do Novo Código de Processo Civil). Com a citação, que completa o esquema da relação processual iniciado, num primeiro lance, com a proposição da acção, o réu fica constituído no ónus de contestar[2].
As partes devem poder exercer em condições de igualdade o direito de acesso aos Tribunais. Para tanto, é imprescindível que se verifique, em termos reais, o cumprimento integral do princípio do contraditório, o qual tem consagração constitucional nos artigos 2.º e 20.º, nº 1[3], da Constituição da República Portuguesa e está reflectido na lei ordinária nos artigos 3.º[4] e 4.º[5] do Código de Processo Civil, entre outros.
A citação é o acto processual mais relevante tendente a assegurar a realização dos princípios do contraditório e da transparência e que, assim, em termos abstractos, permite que sejam impulsionadas e perfectibilizadas as garantias de defesa.
Só assim, na verdade, se pode perspectivar que o princípio do contraditório foi observado e que ao réu foi, na prática, dada a possibilidade de uma actuação na lide em condições idênticas à do autor, princípio e possibilidade essas que que defluem dos aludidos normativos constitucionais.
Da leitura do artigo 15.º-D[6] do Novo Regime do Arrendamento Urbano, na respectiva relação com o artigo 15.º-T[7] do mesmo diploma, resulta que, recebido o requerimento, o BNA expede imediatamente a respectiva notificação para o requerido, por carta registada com aviso de recepção, a fim de, em 15 dias, proceder nos termos do disposto nas alíneas a) e b).
A notificação é expedida para o local indicado no requerimento de despejo, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 228.º, nos n.ºs 3 a 5, do artigo 229.º, no n.º 2 do artigo 230.º e nos artigos 231.º, 232.º, 237.º, 238.º e 246.º do Código de Processo Civil, não havendo lugar à advertência prevista no artigo 233.º do mesmo Código.
Trata-se da regra geral de notificação pessoal do requerido, que é por carta registada com aviso de recepção, tal como ocorre em relação à citação provisionada no Código de Processo Civil.
Não apresentando o requerido no mencionado prazo de quinze dias, resposta ao requerimento ou a oposição não for operante, há lugar à constituição de título para desocupação do locado, daqui decorrendo a exequibilidade do referido título[8].
A questão que se coloca é a de saber se foram cumpridas as formalidades previstas na lei e se se pode considerar que a requerida teve conhecimento (ou estava em condições de ter conhecimento) da existência do procedimento de despejo.
A lei adjectiva distingue a falta de citação da nulidade da citação. Haverá falta de citação quando: (a) o acto tenha sido completamente omitido; (b) tenha havido erro de identidade do citado; (c) se tenha empregado indevidamente a citação edital; (d) se mostre que foi efectuada depois do falecimento do citando ou da extinção deste tratando-se de pessoa colectiva ou sociedade; ou (e) quando se demonstre que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do acto, por facto que não lhe seja imputável, como decorre da letra da lei. Haverá nulidade da citação quando, na sua realização, não hajam sido observadas as formalidades prescritas na lei, como decorre do disposto no n.º 1 do artigo 191.º[9] do mesmo diploma.
Na situação vertente, tal como resulta da análise do expediente incorporado no procedimento e dos factos apurados, as cartas de notificação enviadas pelo Balcão Nacional do Arrendamento foram remetidas para a morada Rua da (…), n.º 83, 5L, 1100-178 Lisboa, que constituía o domicílio contratualmente convencionado.
De acordo com a cláusula 10.ª do contrato de arrendamento, cada um dos contraentes obrigava-se “a comunicar por escrito, aos outros, qualquer alteração às respectivas moradas – identificadas no preâmbulo do presente contrato – aceitando expressamente que, até se efectuar tal comunicação, os únicos locais válidos para o efeito de se endereçarem comunicações decorrentes deste contrato são as constantes do preâmbulo do mesmo” e a recusa de recebimento de qualquer comunicação valeria para todos os efeitos como comunicação efectuada.
No dia 18/03/2023, através de correio electrónico, dirigido para o endereço “mail….com”, foi comunicada uma alteração de morada, a qual correspondia ao objecto do locado arrendado, que se situa no Aldeamento Turístico Casas da (…), n.º (…).
A requerente diz que não recebeu a referida comunicação, mas não indica que o mail em causa não é seu nem fornece qualquer explicação válida para não ter tido acesso à supra mencionada comunicação electrónica. Recorde-se que os factos apurados não foram impugnados por nenhuma das partes litigantes.
Da exegese da referida cláusula contratual não se impõe a interpretação que a alteração da morada convencionada dependeria do envio de carta registada com aviso de recepção para a morada estabelecida no contrato e a única formalidade prevista para esse efeito foi a exigência de comunicação escrita.
A lei faz recair sobre o declarante o ónus de efectuar uma comunicação eficiente[10]. E na visão de Ferreira Pinto compete-lhe fazer com que a declaração seja recepcionada pelo destinatário em circunstâncias tais que possa este possa ter um efectivo acesso ao seu conteúdo[11].
Em sede de declarações recepiendas, de acordo com as regras gerais de distribuição do ónus da prova, incumbe ao Autor da declaração demonstrar que empregou um meio de transmissão que se revele idóneo a atingir a esfera do conhecimento do declaratário e que a declaração foi por ele efectivamente recebida, enquanto que compete a este último convencer que a declaração foi recebida em condições de, sem culpa sua, não poder ser conhecida.
A declaração recepienda, de acordo com o estatuído no artigo 224.º[12] do Código Civil, torna-se apta a produzir os efeitos pretendidos pelo declarante logo que é efectivamente conhecida pelo destinatário ou quando ao poder deste em condições de ser por ele conhecida ou a partir do momento em que, normalmente, teria sido recebida pelo destinatário, caso este não tivesse obstado, com culpa, à sua oportuna recepção.
A lei parte da situação regular e normal de que, com a chegada ao poder, o destinatário (o declaratário) está em condições de tomar conhecimento e que ele toma este conhecimento. O saber se a chegada ao poder conduz realmente a uma situação, suposta pela lei, que permite o conhecimento efectivo, determina-se em conformidade com as concepções reinantes no tráfico jurídico para os negócios em causa[13].
Dito isto, decorre daqui que, independentemente do meio utilizado, foi comunicado de forma regular ao senhorio o novo domicílio da inquilina, mostrando-se assim perfectibilizado o ónus imposto ao declaratário, sendo que dos factos provados não resulta que, ao invés do por si afirmado, o inquilino não tenha tido acesso ao conteúdo do mail e que desconhecesse a nova morada da contraparte.
Aliás, a invocação desse desconhecimento esbarra em parte no comportamento procedimental do senhorio que, em momento anterior à propositura do despejo, mais concretamente em 31/08/2023, para efeitos de reclamação de rendas em dívida, pediu a notificação judicial avulsa da requerida na morada do locado.
Ou seja, ao optar por solicitar a realização da notificação judicial avulsa na morada do locado e não no domicílio convencionado, a senhoria manteve um comportamento concludente no sentido de conhecer qual era o efectivo e actual domicílio da requerida. E, assim sendo, por decorrência lógica e em obediência às regras da lisura contratual, estava vinculada a instaurar o procedimento especial de despejo naquela mesma morada.
Se a simples alteração da domicílio fiscal é absolutamente irrelevante para os efeitos contratuais aqui em presença, a prova do envio do correio electrónico com o novo lugar de contacto e o comportamento assumido em sede de notificação judicial avulsa impunham que a notificação do requerimento de procedimento especial de despejo fosse realizada na morada do locado.
Na verdade, o senhorio optou por deliberadamente indicar no procedimento especial de despejo a antiga morada da requerente e, face à devolução das cartas, conciliada com a ausências de outros sinais que demonstrem o conhecimento por parte da inquilina do processo em curso, tal implica que se considere que existe um cenário de falta de citação.
Estamos num domínio em que não existe aqui a necessidade de a alteração do domicílio convencionado ser autorizada pelo senhorio ou comunicada por carta registada com aviso de recepção, dado que a factispécie não se integra na esfera de protecção da alínea c) do n.º 1 do artigo 9.º[14] do Novo Regime do Arrendamento Urbano.
Como assinala um acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, o n.º 2 do artigo 229.º do Código de Processo Civil não é aplicável nas notificações do BNA aos arrendatários relativos aos requerimentos de despejo[15].
Deste modo, surge uma situação em que se demonstra que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do acto, por facto que não lhe seja imputável, matéria que é enquadrável na alínea e) do n.º 1 do artigo 188.º[16] do Código de Processo Civil. E a referida nulidade não se encontra sanada[17].
Se tiver ocorrido a alteração de domicílio que foi aceite ou conhecida, em sede de procedimento especial de despejo, o senhorio não pode indicar a morada previamente convencionada, sob pena de, assim não sendo, em caso de frustração da notificação pessoal do requerimento inicial, sempre que o destinatário da citação pessoal não chegue a ter conhecimento do acto, ocorrer um cenário de falta de citação.
É ponto assente que ao sistema processual civil repugnam as decisões proferidas à revelia dos interessados, pela fácil constatação de que, em tais circunstâncias, os riscos de injustiça material são muito superiores aos que se conseguem através de processos com contraditório efectivo.
Se fosse prosseguida interpretação diversa, nas hipóteses em que a falta de oposição não pode ser imputada ao inquilino, antes a situação deriva do comportamento da inquilino que indicou no requerimento de despejo a morada que sabia (ou deveria saber) ter sido alterada, estar-se-ia perante uma situação com identidade substancial com aquela que foi decidida no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 99/2019, de 14/03, proferido no Processo n.º 541/2018[18], com as consequências que daí resultariam.
Com efeito, está-se num enquadramento em que a regra da comunicação da mudança de residência por parte do inquilino não tem de ser aceite pelo senhorio nem o arrendatário está vinculado a fazer a competente formalização através de correio registado, por não existir qualquer regra imperativa nesse sentido, prevalecendo aqui o princípio da liberdade de forma[19], o qual foi exteriorizado na cláusula contratual acima referida.
Quanto à questão da má-fé, não obstante aquilo que acima se deixou expresso, os autos não disponibilizam elementos que, de pronto, permitam concluir que, deliberadamente, a requerente utilizou uma morada com o intuito de obter, por essa via, um título executivo, fazendo-se prevalecer de um domicílio em que sabia que a requerida não se encontrava. E, a par disto, tampouco ocorre a existência de qualquer outro comportamento subsumível na previsão do artigo 542.º[20] do Código de Processo Civil.
Não se pode aqui afirmar que o senhorio fez uso indevido do procedimento especial de despejo do locado e tal asserção apenas poderia ser retirada se os autos disponibilizassem no imediato elementos que permitissem concluir que, conscientemente, não ocorria a causa de pedir invocada para a resolução contratual ou houvesse o recurso a meios cuja falta de fundamento não devesse ignorar [21].
Nessa ordem de ideias, declara-se a falta da citação com todas as consequências legais, designadamente ao nível da anulação do processado posterior à petição inicial de harmonia com o disposto no artigo 187.º[22] do Código de Processo Civil, afastando-se, no entanto, a condenação da sociedade requerente como litigante de má fé.
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V – Sumário: (…)

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VI – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar procedente o recurso interposto, revogando-se a decisão recorrida, declarando-se a falta da citação da requerida e, consequentemente, determina-se a anulação do processado posterior à petição inicial.
Custas a cargo da apelada nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 527.º do Código de Processo Civil.
Notifique.
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Processei e revi.
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Évora, 05/12/2024
José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho
Mário Branco Coelho
Maria Domingas Simões

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[1] Artigo 219.º (Funções da citação e da notificação):
1 - A citação é o ato pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada ação e se chama ao processo para se defender; emprega-se ainda para chamar, pela primeira vez, ao processo alguma pessoa interessada na causa.
2 - A notificação serve para, em quaisquer outros casos, chamar alguém a juízo ou dar conhecimento de um facto.
3 - Com a citação e as notificações são sempre disponibilizados todos os elementos e cópias legíveis dos documentos e peças do processo necessários à plena compreensão do seu objeto, ainda que conste de outro suporte acessível ao citando ou notificando, nos termos previstos em portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da justiça e da modernização administrativa.)
[2] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra, Sampaio da Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2ª edição, 1985, pág. 274.
[3] Artigo 20.º (Acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva)
1. A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.
2. Todos têm direito, nos termos da lei, à informação e consulta jurídicas, ao patrocínio judiciário e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade.
3. A lei define e assegura a adequada protecção do segredo de justiça.
4. Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo.
5. Para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos.
[4] Artigo 3.º (Necessidade do pedido e da contradição):
1 - O tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a ação pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição.
2 - Só nos casos excecionais previstos na lei se podem tomar providências contra determinada pessoa sem que esta seja previamente ouvida.
3 - O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.
4 - Às exceções deduzidas no último articulado admissível pode a parte contrária responder na audiência prévia ou, não havendo lugar a ela, no início da audiência final.
[5] Artigo 4.º (Igualdade das partes):
O tribunal deve assegurar, ao longo de todo o processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no exercício de faculdades, no uso de meios de defesa e na aplicação de cominações ou de sanções processuais.
[6] Artigo 15.º-D (Finalidade, conteúdo e efeito da notificação):
1 - O BAS expede imediatamente notificação para o requerido, por carta registada com aviso de receção, para, em 15 dias, este:
a) Desocupar o locado e, sendo caso disso, pagar ao requerente a quantia pedida, acrescida da taxa por ele liquidada;
b) Deduzir oposição à pretensão e ou requerer o diferimento da desocupação do locado, nos termos do disposto no artigo 15.º-M.
2 - Havendo vários requeridos, a notificação é expedida para todos eles, nos termos e para os efeitos previstos no número anterior.
3 - A notificação é expedida para o local indicado no requerimento de despejo, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 228.º, nos n.ºs 3 a 5 do artigo 229.º, no n.º 2 do artigo 230.º e nos artigos 231.º, 232.º, 237.º, 238.º e 246.º do Código de Processo Civil, não havendo lugar à advertência prevista no artigo 233.º do mesmo Código.
4 - O ato de notificação deve conter:
a) Os elementos referidos nas alíneas a) a h) do n.º 2 do artigo 15.º-B e, se for caso disso, no n.º 3 do mesmo artigo;
b) A indicação do prazo para a oposição e a respetiva forma de contagem;
c) A indicação de que, na falta de desocupação do locado, de oposição dentro do prazo legal ou do pagamento ou depósito das rendas que se venceram na pendência do procedimento especial de despejo, será proferida decisão judicial para entrada imediata no domicílio, com a faculdade de o requerente a efetivar imediatamente;
d) Nos casos de pedido de pagamento das rendas, encargos ou despesas em atraso, a indicação de que, na falta de pagamento da quantia pedida e da taxa liquidada pelo requerente, são ainda devidos juros de mora desde a data da apresentação do requerimento;
e) A indicação de que a dedução de oposição cuja falta de fundamento o requerido não deva ignorar o responsabiliza pelos danos que causar ao requerente e determina a condenação em multa de valor não inferior a 10 vezes a taxa devida.
f) A indicação de que deve efetuar o pagamento ou proceder ao depósito das rendas que se forem vencendo na pendência do procedimento especial de despejo;
g) Nos casos do n.º 4 do artigo 15.º, a indicação de que o requerido pode pôr fim à mora no prazo da oposição, exceto quando se verifique a situação prevista no n.º 4 do artigo 1084.º do Código Civil.
5 - A notificação efetuada nos termos do presente artigo interrompe a prescrição, nos termos do disposto no artigo 323.º do Código Civil.
[7] Artigo 15.º-T (Injunção em matéria de arrendamento):
1 - A injunção em matéria de arrendamento (IMA) é um meio processual que se destina a efetivar os seguintes direitos do arrendatário:
a) Pagamento de quantia certa do valor da compensação em dívida por execução de obras em substituição do senhorio, em caso de execução de intimação emitida ao abrigo do n.º 2 do artigo 89.º do regime jurídico da urbanização e da edificação, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro, ou do n.º 1 do artigo 55.º do regime jurídico da reabilitação urbana, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 307/2009, de 23 de outubro, quando a injunção seja titulada pelo contrato de arrendamento, acompanhado da comunicação prevista no n.º 3 do artigo 22.º-C do regime jurídico das obras em prédios arrendados, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 157/2006, de 8 de agosto, e de cópia da intimação a que se reporta;
b) Pagamento de quantia certa do valor da compensação em dívida por execução de obras em substituição do senhorio, nos casos de reparações previstas nos n.ºs 1 ou 2 do artigo 1036.º do Código Civil, quando a injunção seja titulada pelo contrato de arrendamento, acompanhado da comunicação prevista no n.º 3 do artigo 22.º-C do regime jurídico das obras em prédios arrendados, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 157/2006, de 8 de agosto;
c) Cessação de atividades causadoras de risco para a saúde do arrendatário, quando a injunção seja titulada pela intimação dirigida pelo arrendatário nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 13.º-B acompanhada por auto emitido pela autoridade policial ou equiparada ou pela câmara municipal competente;
d) Correção de deficiências do locado causadoras de risco grave para a saúde ou para a segurança de pessoas ou bens, quando a injunção seja titulada pela intimação dirigida pelo arrendatário nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 13.º-B acompanhada por auto emitido pela câmara municipal competente;
e) Correção de impedimento da fruição do locado, quando a injunção seja titulada pela intimação dirigida pelo arrendatário nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 13.º-B acompanhada por auto emitido pela autoridade policial ou equiparada ou pela câmara municipal competente;
2 - Caso seja demonstrada a apresentação de requerimento da vistoria prevista no n.º 3 do artigo 13.º-B, dentro do prazo estabelecido no n.º 7 do mesmo artigo, a câmara municipal é notificada para envio do referido auto no prazo de 20 dias, suspendendo-se o processo até receção do referido auto, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
3 - Com o decretamento das injunções previstas nas alíneas c) a e) do n.º 1, a sanção pecuniária prevista na alínea b) no n.º 5 do artigo 13.º-B, passa a ser, por cada dia de incumprimento a partir dessa data, no valor de 50 euros, podendo ser deduzida pelo arrendatário do pagamento das rendas mensais vincendas a partir dessa data, até que o cumprimento da injunção seja demonstrado pelo senhorio ao arrendatário nos termos do artigo 9.º.
4 - À sanção pecuniária prevista no número anterior aplica-se o disposto no n.º 6 do artigo 13.º-B.
5 - O processo de injunção em matéria de arrendamento é objeto de diploma próprio.
[8] Artigo 15.º-E (Constituição de título para desocupação do locado):
1 - O BAS converte o requerimento de despejo em título para desocupação do locado se:
a) Depois de notificado, o requerido não deduzir oposição no respetivo prazo;
b) A oposição se tiver por não deduzida nos termos do disposto no n.º 4 do artigo seguinte;
c) Na pendência do procedimento especial de despejo, o requerido não proceder ao pagamento ou depósito das rendas que se forem vencendo, nos termos previstos no n.º 8 do artigo 15.º.
2 - O título de desocupação do locado é autenticado com recurso a assinatura eletrónica.
3 - Constituído o título de desocupação do locado, o BAS disponibiliza o requerimento de despejo no qual tenha sido colocada a fórmula de título para desocupação do locado ao requerente e ao agente de execução, notário ou oficial de justiça designado, consoante os casos, nos termos definidos por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça.
[9] Artigo 191.º (Nulidade da citação):
1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 188.º, é nula a citação quando não hajam sido, na sua realização, observadas as formalidades prescritas na lei.
2 - O prazo para a arguição da nulidade é o que tiver sido indicado para a contestação; sendo, porém, a citação edital, ou não tendo sido indicado prazo para a defesa, a nulidade pode ser arguida quando da primeira intervenção do citado no processo.
3 - Se a irregularidade consistir em se ter indicado para a defesa prazo superior ao que a lei concede, deve a defesa ser admitida dentro do prazo indicado, a não ser que o autor tenha feito citar novamente o réu em termos regulares.
4 - A arguição só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado.
[10] José Alberto Vieira, Negócio Jurídico – Anotação ao regime do Código Civil (Artigos 217.º a 295.º), Coimbra Editora, Coimbra, 2006, pág. 30.
[11] Fernando A. Ferreira Pinto, Comentário ao Código Civil – Parte Geral, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2014, pág. 506.
[12] Artigo 224.º (Eficácia da declaração negocial):
1. A declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder ou é dele conhecida; as outras, logo que a vontade do declarante se manifesta na forma adequada.
2. É também considerada eficaz a declaração que só por culpa do destinatário não foi por ele oportunamente recebida.
3. A declaração recebida pelo destinatário em condições de, sem culpa sua, não poder ser conhecida é ineficaz.
[13] Heinrich Ewald Hörster, A Parte Geral do Código Civil Português – Teoria Geral do Direito Civil, Almedina, Coimbra, 2000, pág. 449.
[14] Artigo 9.º (Forma da comunicação):
1 - Salvo disposição da lei em contrário, as comunicações legalmente exigíveis entre as partes relativas a cessação do contrato de arrendamento, atualização da renda e obras são realizadas mediante escrito assinado pelo declarante e remetido por carta registada com aviso de receção.
2 - As cartas dirigidas ao arrendatário, na falta de indicação por escrito deste em contrário, devem ser remetidas para o local arrendado.
3 - As cartas dirigidas ao senhorio devem ser remetidas para o endereço constante do contrato de arrendamento ou da sua comunicação imediatamente anterior.
4 - Não existindo contrato escrito nem comunicação anterior do senhorio, as cartas dirigidas a este devem ser remetidas para o seu domicílio ou sede.
5 - Qualquer comunicação deve conter o endereço completo da parte que a subscreve, devendo as partes comunicar mutuamente a alteração daquele.
6 - O escrito assinado pelo declarante pode, ainda, ser entregue em mão, devendo o destinatário apor em cópia a sua assinatura, com nota de receção.
7 - A comunicação pelo senhorio destinada à cessação do contrato por resolução, nos termos do n.º 2 do artigo 1084.º do Código Civil, é efetuada mediante:
a) Notificação avulsa;
b) Contacto pessoal de advogado, solicitador ou agente de execução, comprovadamente mandatado para o efeito, sendo feita na pessoa do notificando, com entrega de duplicado da comunicação e cópia dos documentos que a acompanhem, devendo o notificando assinar o original;
c) Escrito assinado e remetido pelo senhorio nos termos do n.º 1, nos contratos celebrados por escrito em que tenha sido convencionado o domicílio, caso em que é inoponível ao senhorio qualquer alteração do local, salvo se este tiver autorizado a modificação.
[15] Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 16/03/2023, publicitado em www.dgsi.pt.
[16] Artigo 188.º (Quando se verifica a falta de citação):
1 - Há falta de citação:
a) Quando o ato tenha sido completamente omitido;
b) Quando tenha havido erro de identidade do citado;
c) Quando se tenha empregado indevidamente a citação edital;
d) Quando se mostre que foi efetuada depois do falecimento do citando ou da extinção deste, tratando-se de pessoa coletiva ou sociedade;
e) Quando se demonstre que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do ato, por facto que não lhe seja imputável.
2 - Quando a carta para citação haja sido enviada para o domicílio convencionado, a prova da falta de conhecimento do ato deve ser acompanhada da prova da mudança de domicílio em data posterior àquela em que o destinatário alegue terem-se extinto as relações emergentes do contrato; a nulidade da citação decretada fica sem efeito se, no final, não se provar o facto extintivo invocado.
[17] Artigo 189.º (Suprimento da nulidade de falta de citação):
Se o réu ou o Ministério Público intervier no processo sem arguir logo a falta da sua citação, considera-se sanada a nulidade.
[18] O Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 99/2019, de 14/03, consultável em www.dgsi.pt, “Declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante dos n.ºs 3 e 5 do artigo 12.º do regime constante do anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de setembro (na redação resultante do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 e fevereiro) no âmbito de um procedimento de injunção destinado a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias de valor não superior a EUR 15 000 – na parte em que não se refere ao domínio das transações comerciais, nos termos definidos no artigo 3.º, alínea a), do referido Decreto-Lei n.º 32/2003 –, quando interpretados no sentido de que, em caso de frustração da notificação do requerido (para pagar a quantia pedida ou deduzir oposição à pretensão do requerente, nos termos do n.º 1 do mesmo artigo 12.º), através de carta registada com aviso de receção enviada para a morada indicada pelo requerente da injunção no respetivo requerimento, por devolução da mesma, o subsequente envio de carta, por via postal simples, para todas as diferentes moradas conhecidas, apuradas nas bases de dados previstas no n.º 3 do artigo 12.º em conformidade com o previsto no n.º 5 do mesmo preceito, faz presumir a notificação do requerido, ainda que o mesmo aí não resida, contando-se a partir desse depósito o prazo para deduzir oposição”.
[19] Artigo 219.º (Liberdade de forma)
A validade da declaração negocial não depende da observância de forma especial, salvo quando a lei a exigir.
[20] Artigo 542.º (Responsabilidade no caso de má-fé – Noção de má-fé):
1 - Tendo litigado de má-fé, a parte é condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir.
2 - Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
3 - Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admitido recurso, em um grau, da decisão que condene por litigância de má-fé.
[21] Artigo 15.º-R (Uso indevido ou abusivo do procedimento):
1 - Aquele que fizer uso indevido do procedimento especial de despejo do locado incorre em responsabilidade nos termos da lei.
2 - Se o senhorio ou o arrendatário usarem meios cuja falta de fundamento não devessem ignorar ou fizerem uso manifestamente reprovável do procedimento especial de despejo, respondem pelos danos que culposamente causarem à outra parte e incorrem em multa de valor não inferior a 10 vezes a taxa de justiça devida.
3 - O disposto no número anterior é ainda aplicável ao detentor do locado ou a qualquer outro interveniente no procedimento especial de despejo que, injustificadamente, obste à efetivação da desocupação do locado.
4 - Incorre na prática do crime de desobediência qualificada quem infrinja a decisão judicial de desocupação do locado.
[22] Artigo 187.º (Anulação do processado posterior à petição)
É nulo tudo o que se processe depois da petição inicial, salvando-se apenas esta:
a) Quando o réu não tenha sido citado;
b) Quando não tenha sido citado, logo no início do processo, o Ministério Público, nos casos em que deva intervir como parte principal.