I - No âmbito de execução cujo título junto é uma livrança mas utilizado como mero quirógrafo ao abrigo do artº703 nº1. al.c), última parte, do CPC, cabe ao exequente alegar a relação causal ou subjacente.
II - No âmbito dos embargos em relação às execuções que se estribaram em títulos particulares a alegação, nos embargos, da inexistência da obrigação exequenda, constitui matéria de impugnação que faz lançar sobre o exequente o ónus da prova da existência do direito invocado.
III - O exequente/embargado, como titular do direito que pretende fazer valer, continua a ter de alegar e provar os factos que o constituem, enquanto o titular do dever correspondente tem o ónus de provar os factos que impedem, modificam, ou extinguem os efeitos dos primeiros (artº342º1 e 2 do CC).
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I
Nos autos de embargos de executado deduzidos por AA, BB e A..., Ldª, em reação à acção executiva para pagamento de quantia certa em que figuram como executados e interposta pelo Banco 1..., S.A.[1], requereram a final, para o que interessa e a benefício deste recurso, que o valor exequendo fosse corrigido para 16.861,04 €.
Alegou o exequente no seu requerimento executivo no que respeita ao valor aposto na livrança [2]:
- face ao incumprimento do contrato de mútuo por parte da sociedade mutuária, procedeu à sua resolução, comunicando-o a cada um dos embargantes por carta registada de 09.07.2013, sendo que no dia 19/07/13, encontravam-se em dívida as prestações n.º 2, 3, 4 e 5 vencidas, respetivamente, nos dias 15/08/2012, 15/11/2012, 15/02/2013 e 15/05/2013, no valor global de 9.617,86 €, a que acresce o capital vincendo o qual ascendia a 36.382,59 €;
- sobre cada uma das prestações vencidas e não pagas foram calculados, desde a data do respetivo vencimento até dia 19/07/2013, juros moratórios e respetivo imposto de selo, calculados às taxas sucessivamente aplicáveis de 9,494%, 9,247%, 8,958 e 9,955%, acrescida a sobretaxa de mora de 4%, em conformidade com o previsto no artigo 8º, nº 2 do contrato celebrado entre as partes.
- sobre o capital vincendo foram calculados juros moratórios e respetivo imposto de selo, à taxa contratualizada de 8,959%, em dívida desde 15/05/2013 até dia 19/07/2013 (data de vencimento da última prestação vencida e não paga, a prestação n.º 5);
- a este valor acresce a quantia devida a título de despesas, a qual, aquando do preenchimento da livrança, ascendia a 2.329,86 €.
Alegaram os embargantes na sua petição de embargos que no valor aposto não se consideraram dois pagamentos feitos ao embargado em resultado da venda do imóvel - que melhor se identificado no artº20 da p.i (al. b) do artigo 8.º do requerimento executivo) - realizada em sede de execução fiscal, a saber: 1.734,10 € em 18/10/17 e 24.874,86 € em 31/07/2018;
A isto reagiu o embargado na contestação aos embargos alegando que o pagamento dos valores em causa, além de terem sido confirmados no requerimento executivo (cfr. artigo 11.º do requerimento), foram contabilizados aquando da liquidação da obrigação exequenda, concretamente que:
- o pagamento ocorrido no dia 31/07/2019, no valor de 1.734,10 €, foi imputado 1.667,70 € a juros e 66,70 € a imposto de selo, passando a dívida à quantia global de 58.343,75 €, sendo que 50.941,83 € diz respeito capital; 7.117,23 € a juros e 284,69 € a imposto de selo;
- posteriormente, com a amortização ocorrida ano dia 31/07/2018, no valor de 24.874,86 €, foi imputada a 8.736,05 € a juros, 349,44 € a imposto de selo e 15.789,37 €, e capital conforme quadro que apresenta na sequência do que se alega no artº48, passando a dívida a 35.152,46 €, a esse valor acrescendo juros calculados à taxa legal de 4%, desde 31/07/2018 até à data da instauração da execução.
Realizado o julgamento foi proferida decisão decidindo-se a final julgar parcialmente provados os presentes embargos de executado, e, em consequência, determinando-se que se proceda à rectificação da liquidação da obrigação exequenda nos termos explicitados no ponto V, nº 6 e 7[3].
Conclui o recorrente:
1.º A sentença proferida em primeira instância ordenou a retificação da liquidação da obrigação exequenda no requerimento executivo considerando algumas amortizações que neste não foram mencionadas e que, em sede de sentença, se encontram referidas nos pontos 18, 19 e 20 dos factos dados como provados.
2.º O presente recurso tem como objeto o ponto 18 de tal factualidade, o qual se encontra redigido sem tomar em linha de conta a abrangência de operações em dívida pelos Executados à Recorrente e as alocações por este efetuadas a tais operações creditícias aquando do recebimento datado de 18 de outubro de 2017.
3.º Diz-se no referido ponto 18 que «O exequente recebeu na data de 18.10.2017, em sede de execução fiscal, com o nº 0159.2015.124, o valor de 14.352,90€, proveniente da venda do prédio inscrito na matriz sob o artigo ..., da freguesia ....»
4.º Em tal declaração- que não é uma inverdade- faltou, porém, o rigor de referir que daqueles 14.352,90€, resultaprovadoque 11.106,63€ (onze mil centoeseiseuros esessentaetrês cêntimos) serviram à liquidação de crédito alheio ao dos presentes autos, e no qual também estes Executados/embargantes eram devedores ao Banco 1..., S.A..
5.º Pelo que do facto dado como provado no ponto 18, sendo o sustento para a condenação em « descontar ao montante aposto na livrança os valores recebidos em sede de execução fiscal» deveria constar que, quanto ao recebimento referente à venda do prédio inscrito na matriz sob o artigo ..., da freguesia ... e após a liquidação de um outro crédito, o Banco amortizou à livrança executada o montante remanescente, de 3.246,27€ (três mil, duzentos e quarenta e seis euros e vinte e sete cêntimos).
6.º Não tendo havido tal rigor na escrita da sentença, só por erro o Tribunal a quo declarou no ponto 7 da parte da ‘Fundamentação de direito’ que « os descontos efectuados pelo exequente não se mostram totalmente correctos, uma vez que terá considerado indevidamente o valor vertido na alínea a) dos factos não provados, de 1.734,10€, desconsiderando, contudo, o montante reportado no ponto 18 dos factos assentes, recebido na data de 18.10.2017, de 14.352,90€.»
7.º Tal condenação desrespeita as amortizações efetuadas à dívida subjacente à livrança executada nos presentes autos, cujos montantes se encontram devidamente explanados em sede de prova testemunhal, como resulta da gravação da mesma.
8.º Assim se impondo, por isso, a respetiva reapreciação.
9.º Reportando-se às amortizações à dívida exequenda elencadas nos pontos 18 a 20, a sentença tem o seu fundamento nas « declarações dos embargantes e das testemunhas ouvidas em julgamento, as quais foram confrontadas com os documentos juntos aos autos, em conjugação com estes, destacando-se o ofício do Serviço de Finanças ... de 17.09.2021 », tendo os factos referentes às amortizações sido portanto « confirmados no confronto da supra mencionada documentação com as declarações das testemunhas apresentadas pelo exequente embargado, as quais tinham conhecimento dos recebimentos em questão em razão das suas funções, não se vislumbrando motivos para se duvidar da seriedade e da isenção das mesmas.»
10.º As testemunhas apresentadas pelo exequente embargado ouvidas em Julgamento foram CC, DD e EE.
11.º Do depoimento prestado pelas três, destaca-se a utilidade do de DD e do de EE em matéria de amortizações à dívida titulada pela livrança executada- testemunhos em relação aos quais a sentença objeto do presente recurso refere expressamente não se vislumbrar motivos para duvidar da respetiva seriedade e isenção.
12.º Atentando na prova testemunhal registada na PRIMEIRA GRAVAÇÃO de áudio efetuada pelo Tribunal ao longo do depoimento de DD, conclui-se desde logo que, questionada acerca do conhecimento do empréstimo efetuado pelo Exequente à A... Lda. em janeiro de 2012, tendo como avalistas desta sociedade os seus legais representantes BB e AA (equivalente ao mútuo abrangido pela livrança executada), DD atestou integral conhecimento da operação de empréstimo, acrescentando ainda: (03:38m) – “ fui eu que tratei do processo na altura, quando ele veio para contencioso, na parte da resolução, de preenchimento de livrança, elaboração de cálculos e preparação do processo ao escritório.” (03:48m).
13.º Em confronto com a cópia do contrato de mútuo e com a livrança subjacente à presente execução, a testemunha DD confirmou que a livrança vencida em 2013 foi preenchida na sequência da resolução de um contrato de mútuo de 43.500,00€ (quarenta e três mil e quinhentos euros) e discriminou pormenorizadamente os montantes que perfazem o seu valor, de 50.941,83€ (a saber, 49.684,83€ devidos por força do contrato de mútuo, a que se somaram 1.257,00€ devidos a título de um saldo devedor existente em conta à ordem).
14.º Já decorridos vinte minutos desta PRIMEIRA GRAVAÇÃO de áudio das declarações de DD, é possível ouvir os esclarecimentos prestados por esta ao Tribunal acerca dos valores que foram recebidos pelo Banco após o vencimento do título executivo e abatidos à respetiva dívida, os quais se iniciaram do seguinte modo: (20:29m) –“Sei que houve recebimentos do banco posteriores, porque consultei e estive a ver a conta, também o processo, decorrentes da venda dos três imóveis sobre os quais o banco tinha uma garantia hipotecária genérica também, que eram três prédios rústicos. Nós elaboramos ocálculoe eu tenhoaqui ocálculo, posso-lhe dar ovalor.Como é que nós fizemos o cálculo? Sobre o valor da livrança e do preenchimento à taxa de quatro por cento, desde a data do vencimento, de 19 de julho de 2013, até à data do primeiro recebimento. Eu sei que a este contrato foram imputados, em dezoito do dez de 2017, foram amortizados três mil, duzentos e quarenta e seis euros e vinte e sete cêntimos. Três mil, duzentos e quarenta e seis euros e vinte e sete cêntimos. Ou seja, o que é que nós liquidamos primeiro sempre? Primeiro liquidamos os juros e o imposto de selo e depois o capital inserido na livrança. Foi o que aconteceu. Neste caso não foi, senhora doutora, porque o valor dos juros era muito superior ao valor recebido, ou seja o valor que foi recebido só deu para liquidar mesmo juros e imposto, não foi possível imputar-se a (…)”
15.º Assim, a testemunha identifica como a primeira amortização ao crédito titulado pela Livrança dada à presente ação o valor de 3.246,27€ (três mil, duzentos e quarenta e seis euros e vinte e sete cêntimos) decorrente da venda de um imóvel, sendo que quanto à data da amortização, ficou comprovado que ocorreu a 18 de outubro de 2017, nos seguintes momentos, assim registados:(22:05m) – Juíza: “O valor foi imputado à data, que foi recebido esse valor …” (22:08m) – Testemunha: “que o Banco o recebeu, sim” (22:10m): Juíza: “Dezoito do dez …” (22:11) – Testemunha: “de 2017, sim.”
16.º Decorre das declarações da testemunha DD que a dezoito de outubro de 2017, o Exequente descontou ao título avalizado pelos Embargantes AA e BB, executados nesta execução, o valor de3.246,27€ (três mil, duzentos e quarenta e seis euros e vinte e sete cêntimos) após a «venda do primeiro imóvel» que à mesma servia como garantia.
17.º Assim, em matéria de liquidação parcial do crédito exequendo na sequência da venda do primeiro imóvel, existe uma contradição entre o montante comunicado pela Testemunha e o montante indicado no ponto 18 da factualidade dada como provada na sentença, que é de 14.352,90€ (catorze mil, trezentos ecinquenta e dois eurose noventa cêntimos), situação que se impõe corrigir.
18.º A sentença proferida contraria também as declarações da técnica da Direção de Recuperação de crédito do Banco 1..., S.A., ouvida como testemunha, de nome EE- a qual referiu que em outubro de 2017 o Banco Exequente recebeu uma primeira transferência, de catorze mil, trezentos e cinquenta e dois euros e noventa cêntimos, alocada da seguinte forma, conforme declarações prestadas por esta testemunha: (06:14m): “Quando o cliente foi afeto em contencioso, havia dois contratos de crédito. Era um financiamento QREN mais este contrato de mútuo. Quando recebemos a primeira transferência, de catorze mil euros, liquidamos integralmente o outro contrato de mútuo e ficou em dívida este, que ainda não está liquidado.”
19.º Resulta do depoimento ora transcrito, de EE (que, relembre-se, é responsável pela elaboração de cálculos de dívida da A...,Lda.) que além do contrato de mútuo subjacente à livrança executada, aquela sociedade tinha outra responsabilidade em dívida ao Banco 1..., S.A., a qual veio a ser liquidada na íntegra em outubro de 2017, através da venda de imóvel.
20.º Resulta ainda do seu depoimento que, fruto da mesma venda, apenas foi parcialmente liquidado o mútuo que subjaz à livrança executada nestes autos.
21.º O apuramento da quantia de liquidação “parcial” do crédito exequendo é facilmente efetuado se se conciliar os depoimentos das testemunhas EE e DD: nesta operação de conjugação, é imperativa a conclusão de que, de entre os 14.352,90€ (catorze mil, trezentos e cinquenta e dois euros e noventa cêntimos) transferidos para o Banco no ano de 2017, foi possível liquidar integralmente um crédito da A..., Lda. alheio aos presentes autos (financiamento QREN) e, adicionalmente, amortizar 3.246,27€ (três mil, duzentos e quarenta e seis euros e vinte e sete cêntimos) à livrança dada à presente ação executiva.
22.º. Uma tal conclusão, além de decorrer da prova testemunhal analisada no presente recurso, resulta explícita também no teor do requerimento do Banco junto ao apenso de embargos a 11/10/2021, mais concretamente do artigo 16.º do mesmo.
23.º Analisando o referido requerimento de 11/10/2021, conclui-se que entre o preenchimento da livrança dada à execução e o seu acionamento nestes autos, o Exequente recebeu valores decorrentes da venda em execução fiscal de dois prédios rústicos, assim discriminados: A 10 de outubro de 2017, recebeu 14.352,90€ (catorze mil, trezentos e cinquenta e dois euros e noventa cêntimos)
A 31 de julho de 2018, recebeu 24.874,86€ (vinte e quatro mil, oitocentos e setenta e quatro euros e oitenta e seis cêntimos), No total de 39.227,76€ (trinta e nove mil, duzentos e vinte e sete euros e setenta e seis cêntimos).
24.º Desses 39.227,76€, o Embargado informou no artigo 16.º do mesmo requerimento, o seguinte:
«
26.º O alegado no requerimento acabado de analisar encontra coesa sustentação nas declarações prestadas pelas testemunhas DD e EE, ouvidas na audiência de julgamento de 06/02/2023, supratranscritas.
27.º A interpretação conjugada de tais elementos probatórios com o alegado pelo Credor conduz a que, com base na diversidade de operações de crédito da responsabilidade da Empresa subscritora da livrança à Exequente, se considere como facto provado que a primeira dedução ocorrida ao crédito executado nestes autos é de 3.246,27€ (três mil, duzentos e quarenta e seis euros e vinte e sete cêntimos) - ao invés de ordenar na dedução de 14.352,90€ (catorze mil, trezentos e cinquenta e dois euros e noventa cêntimos).
28.º Tendo o Tribunal a quo considerado como valor da primeira amortização ao crédito exequendo o de 14.352,90€, fez errada interpretação da prova produzida.
29.º Impondo-se, assim, a reapreciação da prova gravada para efeitos de sanar o erro de julgamento patente na sentença em crise, e, por consequência, para que seja produzida nova decisão que considere como provado, no ponto 18 da Factualidade assente, que na data de 18/10/2017 o exequente recebeu valores da venda do prédio inscrito na matriz sob o artigo ..., da freguesia ..., em execução fiscal com o nº 0159.2015.124, com os quais se amortizou 3.246,27€ (três mil, duzentos e quarenta e seis euros e vinte e sete cêntimos) à livrança executada nestes autos.
Pede-se:
Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a douta Sentença que condenou na retificação da liquidação da obrigação exequenda considerando, entre outras, a amortização datada de 18/10/2017 no valor de 14.352,90€, devendo ser substituída por douto Acórdão que substitua a decisão nesta parte e condene à retificação da liquidação considerando, entre outras, a amortização de 3.246,27€, assim se fazendo a devida Justiça.
Foram colhidos os vistos legais.
II.
II. 1
Os factos dados como provados e não provados na sentença recorrida são os seguintes:
Factos provados[7]
1. Mediante requerimento entrado em Juízo o dia 04.02.2019, Banco 1..., S.A., instaurou acção executiva para pagamento de quantia certa, sob a forma sumária, contra AA, BB e A..., Lda., dando à execução a livrança cuja cópia apresentou na mesma altura.
2. O original da livrança referido no ponto 1 foi junto aos autos na data de 12.02.2019, dando-se aqui por reproduzido o seu integral teor.
3. No requerimento executivo, o exequente alegou o seguinte: «1. Por força de uma operação de fusão, o Banco 2..., S. A. incorporou a sociedade “Banco 1..., S. A.”, sociedade anónima com sede social sita na Rua ..., ..., freguesia ..., concelho de Lisboa, NIPC ..., matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, sob o mesmo número. 2. O ato de fusão foi já devidamente inscrito no registo comercial competente – cfr. certidão permanente do registo comercial relativa ao Banco Exequente disponível para consulta em www.portaldaempresa.pt, através da inserção do seguinte código de acesso: .... Por força do registo da fusão por incorporação acima referida, o Banco Exequente adotou a denominação social “Banco 1..., S. A.”, através da alteração ao seu contrato de sociedade. 4. Pelo exposto, o Banco Exequente tem plena legitimidade para prosseguir nos presentes autos».
4. No requerimento executivo, o exequente alegou, também, o seguinte: «5. O Banco Exequente é dono e legítimo portador de uma livrança subscrita pela sociedade Executada A..., Lda. e avalizada pelos co-Executados BB e AA, no montante de 50.941,83€, vencida em 19/07/2013. Junta-se, como Doc. n.º 1, cópia da aludida livrança, dando-se o respetivo teor por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. Com efeito, 6. No exercício da sua atividade bancária o Banco ora Exequente celebrou, em 24/01/2012, com a sociedade Mutuária/Executada, a pedido desta, um contrato de mútuo, no montante de € 43.500,00, pelo período de 72 meses, conforme artigo 1.º e 3.º do contrato junto de seguida. Junta-se, como Doc. n.º 2, cópia do aludido contrato dando-se o respetivo teor por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. 7. Para garantia e segurança do cumprimento de todas as obrigações assumidas no âmbito do referido contrato, a sociedade Mutuária/Executada, na qualidade de subscritora, e os co-Executados, na qualidade de avalistas, entregaram ao Banco ora Reclamante uma livrança por si respetivamente subscrita e avalizada, destinada a garantir o pagamento de todas as responsabilidades, assumidas ou a assumir pela Mutuária perante o Banco Exequente, por crédito concedido ou a conceder e valores descontados e/ou adiantados, livrança essa que é precisamente aquela que é dada à execução, cujo montante e data de vencimento se encontravam, então, em branco, para que o Banco ora Exequente os preenchesse, em caso de incumprimento, quando o julgasse conveniente, pelo montante que nessa data se encontrasse em dívida, compreendendo capital mutuado, juros, outras despesas e encargos. 8. Da mesma forma, tendo em vista garantir o integral pagamento de todas as quantias em dívida no âmbito do aludido contrato, os co-Executados declararam expressamente, conforme artigo ponto 2 do artigo 12.º do Doc. n.º 2 que todas as responsabilidades deste emergentes ficariam garantidas pelas hipotecas voluntárias constituídas por escritura pública outorgada em 11.12.2009, sobre os seguintes bens imóveis, de que são proprietários: a) Prédio rústico sito na freguesia ..., do concelho de Arouca, com a descrição número ... e inscrito na matriz sob o artigo ...- imóvel vendido no âmbito da execução fiscal n.º ..., que correu termos no Serviço de Finanças ...; b) Prédio rústico sito na freguesia ..., do concelho de Arouca, com a descrição ... e inscrito na matriz sob o artigo ...- imóvel objeto de venda no âmbito da mesma execução fiscal acima identificada; c) Prédio Rústico sito na freguesia ..., do concelho de Castelo de Paiva, com a descrição ... e inscrito na matriz com o artigo .... Junta-se, como Doc. n.º 3, a escritura pública de constituição das hipotecas».
5. No requerimento executivo, o exequente alegou, igualmente, o seguinte: «9. Em 15/08/2012, a Mutuária deixou de cumprir as obrigações que validamente assumiu perante o Banco Exequente no âmbito do referido contrato, nada mais tendo pago ao Banco Exequente desde então. Ora, 10. Face ao reiterado incumprimento da Mutuária, o Banco Exequente viu-se forçado a proceder à resolução do contrato em 09/07/2013 e, posteriormente, em 19/07/2013, ao preenchimento da livrança dada à execução, pelo montante que nessa data se encontrava em dívida 50.941,83€. Sucede que, 11. Na data de 18/10/17 foi efetuado pelos Executados o pagamento no montante de 1.734,10€ e, em 31/07/2018, recuperada a quantia de 24.874,86€, proveniente da venda do imóvel melhor descrito supra na alínea b) do artigo 8. Assim, 12. Na presente data os Executados continuam devedores do Banco Exequente da quantia de € 35.152,46 (trinta e cinco mil cento e cinquenta e dois euros e quarenta e seis cêntimos), a título de capital, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal de 4%, desde a referida data de 19 de julho de 2013 até efetivo e integral pagamento de todas as quantias em dívida, montante que, nesta data, ascende a € 734,30 (setecentos e trinta e quatro euros e trinta cêntimos). 13. É, ainda, devida ao Banco Exequente a quantia que terá que ser por este suportada a título de imposto de selo conforme decorre da verba 17 da tabela geral do Imposto de Selo, resultante da aplicação da taxa de 4% aos montantes devidos a título de juros, montante que nesta data se cifra em € 29,37 (vinte e nove euros e trinta e sete cêntimos). 14. O Banco Exequente é, nesta data, credor dos Executados da quantia global de € 35.916,13 (trinta e cinco mil novecentos e dezasseis euros e treze cêntimos)».
6. No requerimento executivo, mais alegou o exequente o seguinte: «Como se pode comprovar pela análise da referida livrança, o direito de ação cambiária já se encontra prescrita, nos termos do artigo 70.º e 77.º da L.U.L.L. 16. No entanto, apesar de as obrigações cambiárias se encontrarem prescritas, continuam a ter força executiva na medida em que constituem documentos particulares, recognitivos de uma obrigação pecuniária, nos termos do artigo 703.º, n.º 1, al. c) do CPC. 17. Com efeito, estamos perante documento particular, assinados pelo interveniente, no qual este se reconhecem devedores das quantias nele indicadas, por força do financiamento referido no artigo 6. supra deste requerimento executivo (cfr. Doc. n.º 2). Assim sendo, 18. Embora extinta, por prescrita, a obrigação cambiária, o Banco Exequente mantém o direito de acionar os Executados com base nas relações causais subjacentes à emissão das mesmas. Ademais, 19. Uma vez que a livrança apresentada à execução é título executivo suficiente, nos termos do n.º 1, al. c) do art. 703.º do CPC, e encontra-se garantida pela hipoteca constituída pelo imóvel acima referido na alínea c) do artigo 8., deve a presente execução seguir a forma sumária e a penhora de bens iniciar-se por aquele imóvel».
7. No requerimento executivo, o exequente alegou por fim o seguinte: «20. Na presente data, o Banco Exequente é credor do montante total de € 35.916,13 (trinta e cinco mil novecentos e dezasseis euros e treze cêntimos). 21. O Banco Exequente é ainda credor dos juros que se venham a vencer até efetivo e integral pagamento da quantia em dívida. 22. A dívida é certa, líquida e exigível».[8]
8. Na secção do requerimento executivo dedicada à liquidação da obrigação exequenda, o exequente indicou como valor líquido o de «35.152,46€», como valor dependente de simples cálculo aritmético o de «763,67€» e o total de «35.916,13€», alegando imediatamente abaixo o seguinte:
«O montante líquido indicado corresponde ao valor em dívida, a título de capital.
O valor indicado como encontrando-se dependente de simples cálculo aritmético corresponde à soma das seguintes parcelas:
i) € 734,30, devidos a título de juros de mora calculados à taxa legal de 4%, sobre o montante titulado pela livrança dada à execução, desde a respetiva data de vencimento, até esta data
ii) € 29,37, que terão que ser suportados a título de imposto de selo, calculados, nos termos da verba 17.3da TGIS, por aplicação da taxa de 4% aos montantes devidos a título de juros».
9. Teor do documento nº 2 junto com o requerimento executivo, intitulado «Contrato de Mútuo» e datado de 24.01.2012, aqui dado por integralmente reproduzido.
10. Teor do documento nº 3 junto com o requerimento executivo, intitulado «Hipoteca» e datado de 11.12.2009, aqui dado por integralmente reproduzido.
11. Teor do documento nº 2 junto com a petição inicial de embargos, aqui dado por integralmente reproduzido.
12. Teor do documento nº 3 junto com a petição inicial de embargos, aqui dado por integralmente reproduzido.
13. Teor do documento nº 4 junto com a petição inicial de embargos, aqui dado por integralmente reproduzido.
14. Teor do documento nº 5 junto com a petição inicial de embargos, aqui dado por integralmente reproduzido.
15. Teor da correspondência datada de 09.07.2013, endereçada pelo exequente aos executados, junta aos presentes autos com a sua contestação, aqui dado por integralmente reproduzido.
16. Teor da correspondência datada de 24.01.2012, endereçada pela sociedade executada ao exequente, tendo por assunto «Garantia de Responsabilidades – ENVIO DE LIVRANÇA – AUTORIZAÇÃO DE PREENCHIMENTO», junta aos presentes autos com a contestação do exequente, aqui dado por integralmente reproduzido.
17. A sociedade executada pagou a primeira das prestações contempladas no contrato vertido no ponto 9, deixando de pagar as demais.
18. O exequente recebeu na data de 18.10.2017, em sede de execução fiscal, com o nº 0159.2015.124, o valor de 14.352,90€, proveniente da venda do prédio inscrito na matriz sob o artigo ..., da freguesia ....
19. O exequente recebeu na data de 31.07.2018, em sede de execução fiscal, com o nº 0159.2015.124, o valor de 24.874,86€, proveniente da venda do prédio inscrito na matriz sob o artigo ..., da freguesia ....
20. O exequente recebeu na data de 31.05.2022, em sede de execução fiscal, com o nº ..., o valor de 9.763,91€, proveniente da venda do prédio rústico inscrito na matriz sob o artigo ..., de Arouca.
a) o exequente recebeu o montante de 1.734,10€ referido no requerimento executivo.
b) na data de vencimento da livrança, de 19.07.2013, a executada sociedade não era devedora do montante nela aposto, de 50.941,83€.
II.2
O recurso diz respeito à matéria de facto e, ajustada a mesma, com repercussão na conclusão que se retira do valor exequendo em dívida
Da análise das alegações resulta que a questão a decidir é apenas uma e prende-se com o que provado está no facto 18: «O exequente recebeu na data de 18.10.2017, em sede de execução fiscal, com o nº 0159.2015.124, o valor de 14.352,90€, proveniente da venda do prédio inscrito na matriz sob o artigo ..., da freguesia ...»
Pretende-se que passe a ter a seguinte redacção: «na data de 18/10/2017 o exequente recebeu valores da venda do prédio inscrito na matriz sob o artigo ..., da freguesia ..., em execução fiscal com o nº 0159.2015.124, com os quais se amortizou 3.246,27€ (três mil, duzentos e quarenta e seis euros e vinte e sete cêntimos) à livrança executada nestes autos.»
Comecemos pelos requisitos necessários para a impugnação da decisão da matéria de facto.
Nos termos do disposto no art.º 640.º do C.P.C: “1 – [q]uando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) – Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) – Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) – A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 – No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) – Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição, do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) – Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes”[9].
Da análise das alegações resulta que a questão a decidir se reposta a saber se houve erro de julgamento na decisão da matéria de facto quanto ao ponto 18, sendo o erro de aplicação do Direito dependente da eventual alteração da matéria ali referida[10].
Resulta igualmente da análise do recurso que os ónus referidos supra foram cumpridos.
Por assim ser importará conhecer daquela questão, mas previamente se balizando os limites por onde a Relação se pode movimentar.
O artigo art.º 662.º, n.º 1, do C.P.C. refere a propósito da modificabilidade da decisão de facto, que “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa»
Para isso, na reapreciação da matéria de facto, tem a Relação uma extensa margem de apreciação de toda a prova produzida, pois que, independentemente de ter havido, ou não, erro de julgamento, vigora também nesta instância, nos termos do 607.º, n.º 5, do C.P.C[11], o princípio da livre apreciação da prova[12]/[13]: «[o] juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto», tudo sem prejuízo da decisão quanto a factos para cuja prova a lei exija formalidade especial e aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.
Isto posto importa analisar a justeza da decisão de que resultou a prova do que consta no facto 18: «O exequente recebeu na data de 31.07.2018, em sede de execução fiscal, com o nº 0159.2015.124, o valor de 24.874,86€, proveniente da venda do prédio inscrito na matriz sob o artigo ..., da freguesia ....».
Para o efeito importa relevar a quem cabe o ónus da prova do pagamento feito por conta da quantia exequenda, no quadro de outro processo, ou extrajudicialmente.
Sabemos que o título executivo dado à execução é uma livrança que, em rigor, não corporiza uma relação cartular[14], ao invés surgindo como documento particular e em relação ao qual se impõe a alegação da relação substantiva que esteve na sua génese – artº703 nº1 al.c) do CPC[15].
É essa a causa de pedir, a relação subjacente ao documento particular.
O título executivo é o invólucro em relação ao qual a lei parte para fazer presumir o direito, é a condição processual de procedência (específica), condicionando a exequibilidade extrínseca da pretensão.
No âmbito dos embargos em relação às execuções que se estribaram em títulos particulares como o dado à execução a alegação, nos embargos, da inexistência da obrigação exequenda, constitui matéria de impugnação que faz lançar sobre o exequente o ónus da prova da existência do direito invocado.
A especial fisionomia da oposição à execução através dos embargos de executado não significa que haja alteração das regras do ónus da prova da existência do direito invocado.
Nos embargos de executado, as regras que presidem à distribuição do ónus da prova, e que se baseiam em normas de direito substantivo, não se alteram.
Não será pela diferente posição ocupada pelo credor e devedor nos autos, portanto, ora como autor vs réu, ora como exequente/embargado vs executado/embargante, que se altera a obrigação do titular do direito ter de provar os factos que o constituem, mantendo o titular do dever correspondente o ónus de provar os factos que impedem, modificam ou extinguem os direitos exercitados - art. 342º CC.
Tudo, pois, sempre como se passa na acção declarativa propriamente dita.
Certo que se reconhece que os embargos correspondem a uma acção de simples apreciação negativa, e isso exactamente porque o que se pretende é o reconhecimento que não existe fundamento total ou parcial para se exigir a quantia exequenda, entrega de coisa certa ou prestação de facto[16].
Mas por aqui se fica.
A qualificação é meramente dogmática, dela não se retirando nenhuma consequência em termos de distribuição do ónus da prova, em concreto apelando-se à aplicação da inversão que emana do artº343ºnº1 do CC
A razão de ser da inversão do ónus da prova nestas acções (artº343ºnº1 do C.C.) não está presente nos embargos de executado[17].
Por conseguinte o exequente/embargado, como titular do direito que pretende fazer valer, continua a ter de alegar e provar os factos que o constituem, enquanto o titular do dever correspondente tem o ónus de provar os factos que impedem, modificam, ou extinguem os efeitos dos primeiros (artº342º1 e 2 do CC)[18].
Volvendo-nos ao caso que é objecto de recurso, resulta evidente que o pagamento feito no quadro de outra execução (uma execução fiscal) e por conta da quantia exequenda que versa a execução de que estes autos são apenso, é matéria cuja prova, por ser facto extintivo(parcial), o pagamento, cabia aos executados.
Terão logrado estes, por acção própria, por via da oficiosidade do Tribunal ou da aquisição processual[19], a efectiva prova do que resultou assente no facto posto em crise, contante do ponto 18: «O exequente recebeu na data de 18.10.2017, em sede de execução fiscal, com o nº 0159.2015.124, o valor de 14.352,90€, proveniente da venda do prédio inscrito na matriz sob o artigo ..., da freguesia ...»?
Convoca-se para prova deste facto os seguintes documentos:
- ofício das finanças com entrada em 17.09.21 (na sequência de decisão proferida em audiência) e do qual consta que do produto da venda do imóvel com a matriz ..., ..., 16.000,00 €, se pagou 14.352,19 ao exequente. Surgiu tal pagamento no quadro do processo de execução fiscal ...;
- reclamação do exequente no âmbito da convocação de credores ocorrida no processo aludido, doc. este junto com a contestação. Desta peça resulta que o exequente alega e pede o reconhecimento de 3 créditos, titulados por duas livranças (9.417,65€ e 50.941,83 €[20]) e uma letra (100.000,00 €).
O primeiro dos documentos, pela sua singeleza[21], não tem a virtualidade de dar saída integral à dúvida seguinte: terão os 14.352,19€ sido imputados integralmente à dívida que se pretende saldar no âmbito da execução dos autos de que este apenso depende?
Na ausência de mais prova documental ouviram-se as testemunhas, em exercício que teríamos até por desnecessário e face à noção presente de que o ónus da prova do pagamento e sua extensão aos executados caberia, concretamente atestando por via documental, a juntar por eles ou na sequência de solicitação às finanças, concretamente com a especificação de qual o valor concreto daquele que consta do ofício das finanças com entrada em 17.09.21e serviu para pagar a quantia exequenda.
E dessas testemunhas resulta afirmado a versão do exequente e não uma qualquer que abone o interesse dos executados, uma versão que cabe dentro da informação que consta do ofício das finanças aludido[22].
Desses depoimentos resulta de facto que no âmbito da citada execução fiscal, o exequente recebeu a quantia que consta do ponto 18. Mas também resulta que tal não diz integralmente respeito à quantia titulada pelo documento que se deu à execução no quadro do processo principal, tudo de resto como oportunamente foi informado pelo exequente no requerimento de 11.10.21.
Do depoimento de DD resulta uma versão que se aproxima do teor do requerimento de 11.10.21, ou seja, que o valor da livrança ficou reduzida a 33.640,29 €.
Do depoimento EE emerge a explicação que dos catorze mil (referindo-se naturalmente ao valor id. no ponto 18) recebidos, apenas serviu para liquidar o crédito exequendo a quantia 3.246,27 €, sendo o remanescente para liquidar outra responsabilidade perante o exequente.
Diz na motivação a propósito destas testemunhas: «Os valores reportados nos pontos 18 a 20 foram confirmados no confronto da supra mencionada documentação com as declarações das testemunhas apresentadas pelo exequente embargado, as quais tinham conhecimento dos recebimentos em questão em razão das suas funções, não se vislumbrando motivos para se duvidar da seriedade e da isenção das mesmas.»
Foram tidas tais testemunhas como credíveis e não encontramos na audição motivo para fugir a essa conclusão.
Acresce que não se convocou por mobilizada prova no sentido de pagamentos superiores imputados à quantia exequenda e por quem tinha de o fazer: os executados.
Dito isto, conclui-se pela alteração do facto constante do ponto 18, passando o mesmo a ter a seguinte redacção: «na data de 18/10/2017 o exequente recebeu valores da venda do prédio inscrito na matriz sob o artigo ..., da freguesia ..., em execução fiscal com o nº 0159.2015.124, com os quais se amortizou 3.246,27€ (três mil, duzentos e quarenta e seis euros e vinte e sete cêntimos) à livrança executada nestes autos.»
II.3
Com esta alteração, a consequência directa prende-se com a computação do que é devido pelos executados ao exequente.
Passa a ser devido ao exequente a quantia apurada na sentença mas, ao invés da dedução 14.352,90€ obtidos em sede de execução fiscal, deve apenas ser deduzida apenas a quantia 3.246,27€.
III.
Pelo exposto, dando procedência ao recurso, revoga-se a decisão na parte em que descontou à quantia exequenda o valor de 14.352,90€ (catorze mil, trezentos e cinquenta e dois euros e noventa cêntimos), impondo-se apenas o desconto de 3.246,27€ (três mil duzentos e quarenta e seis Euros e vinte e sete cêntimos).
Custas pelos recorridos.
………………………………
………………………………
………………………………
Notifique.
Porto, 5/12/2024
Carlos Cunha Rodrigues Carvalho
João Venade
Isoleta de Almeida Costa
_______________
[1] Execução com estribo em livrança que se preencheu e utilizou como mero quirógrafo.
[2] Segue-se o relatório da sentença posta em crise.
[3] Concretamente, e para o que interessa, a quantia de 14.352,90 €.
[4] Cfr. a citação da doutrina a propósito no Ac. do STJ de 6.6.2018 proc. 4691/16.2T8LSB.L1.S1: (a) António Santos Abrantes Geraldes - «[a]s conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objeto do recurso, como clara e inequivocamente resulta do artigo 635º, n.º 3, do CPC. Conforme ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões do recurso devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que se pretende obter do tribunal Superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo Tribunal a quo.» - in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017 – 4ª edição, Almedina, página 147. / (b) Fenando Amâncio Ferreira - «[n]o momento de elaborar as conclusões da alegação pode o recorrente confrontar-se com a impossibilidade de atacar algumas das decisões desfavoráveis. Tal verificar-se-á em dois casos; por preclusão ocorrida aquando da apresentação do requerimento de interposição do recurso, ou por preclusão derivada da omissão de referência no corpo da alegação. Se o recorrente, ao explanar os fundamentos da sua alegação, defender que determinada decisão deve ser revogada ou alterada, mas nas conclusões omitir a referência a essa decisão, o objeto do recurso deve considerar-se restringido ao que estiver incluído nas conclusões.» - in Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 2000, página 108 / (c) José Augusto Pais do Amaral - «[o] recorrente que tenha restringido o âmbito do recurso no requerimento de interposição, pode ainda fazer maior restrição nas conclusões da alegação. Basta que não inclua nas conclusões da alegação do recurso alguma ou algumas questões, visto que o Tribunal ad quem só conhecerá das que constem dessas conclusões.» - Direito Processual Civil, 2013, 11ª edição, Almedina, páginas 417/418.
[5] Também está vedado a este Tribunal conhecer de questões novas (que não tenham sido objeto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de questões prévias judiciais, destinando-se, por natureza, à sua reapreciação e consequente confirmação, revogação ou anulação.
[6] Como expresso nos artigos 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do art.º 663, n.º 2, in fine, do C.P.C..
[7] A referência que se faz a expressão «no requerimento executivo (…) alegou» nos artigos que seguem tem-se por não escrita por relevar tão só o facto e não a forma como surge no processo, como se tem por não escrito o que de conclusivo e de direito se importou para os «factos provados».
[9] “[o] presente regime veio concretizar a forma como se processa a impugnação da decisão, reforçando o ónus de alegação imposto ao recorrente, prevendo que deixe expresso a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação em sede de reapreciação dos meios de prova.
Recai, assim, sobre o recorrente, face ao regime concebido, um ónus, sob pena de rejeição do recurso, de determinar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar – delimitar o objeto do recurso -, motivar o seu recurso através da transcrição das passagens da gravação que reproduzem os meios de prova, ou a indicação das passagens da gravação que, no seu entendimento, impunham decisão diversa sobre a matéria de facto - fundamentação - e ainda, indicar a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação” – Ac. do TRP de 4.3.24 – Proc.2271/19.0T8STS.P1
[10] Que em rigor consubstancia apenas um acerto de aritmética.
[11] Ex vi artº663nº2, última parte, do CPC
[12] E da aquisição processual: artº413 do CPC
[13] «Sendo a decisão do tribunal a quo o resultado da valoração de meios de prova sujeitos à livre apreciação, tais como documentos particulares sem valor confessório, relatórios periciais ou declarações de parte a que não corresponda confissão, desde que a parte interessada cumpra o ónus de impugnação previsto n artº640, a Relação, assumindo-se como verdadeiro tribunal de instância, está em posição de proceder à reavaliação, expressando, a partir deles, a sua convicção com total autonomia» – Abrantes Geraldes, Recursos no Novo CPC, anotação ao artº662, nota 7. [14] Diz-se na sentença, e bem, o credor, não pode escudar-se na abstracção do título.
[15] Tratou-se extensamente a questão na sentença, não carecendo, no quadro deste acórdão, a abordagem da mesma e por se tratar de aspecto que não versa o recurso e se decidiu a contento do exequente.
[16] Cfr. José Lebre de Freitas, “Estudos sobre Direito Civil e Processo Civil”, Coimbra Editora 2002, págs. 454, 456 e 457
[17] Cfr. Ac. STJ de 8.2.2001: “I. Os embargos de executado traduzem-se numa acção de simples apreciação negativa. II. Apesar de ser uma acção de simples apreciação negativa não se observa a regra do ónus da prova contida no nº1 do artº343 do CC, já que as razões que levaram o legislador a inverter o ónus da prova nas acções de simples apreciação negativa não têm cabimento nos embargos de executado”
[18] Na expressão de Lebre Freitas diremos que “O titular do direito continua sempre a ter ónus de provar os factos que o constituem, enquanto que o titular do dever correspondente tem o de provar os factos que impedem, modificam ou extinguem o efeito dos primeiros (artº342 CC)” - José Lebre de Freitas, “Estudos sobre Direito Civil e Processo Civil”, Coimbra Editora 2002, págs. 454, 456 e 457.
[19] «Num sistema processual como o nosso, assente no princípio do dispositivo, mas temperado pelo princípio do inquisitório, o ónus da prova, em vez de revestir um sentido marcadamente subjectivo, como ocorre nos sistemas assentes sobre o princípio dispositivo, passa a ter, nos regimes temperados pelo princípio inquisitório, uma feição acentuadamente objectiva, que só por via reflexa atinge a actividade (probatória) das partes.» – Ac. de 5.12.24 do TR Porto, Apelação nº 1027/23.0T8AGD.P1, do qual somos adjunto.
[20] Valor referente ao documento dado à execução no processo de que estes autos são apenso.
[21] Na motivação, o tribunal a quo restringe-se a uma referência genérica ao referido ofício das finanças, não confrontando com o teor dos depoimentos das testemunhas assim o conjugando. Afirma-se: «Relativamente à factualidade vertida nos pontos 17 a 20, respeitante ao montante voluntariamente pago no âmbito do contrato outorgado entre as partes e aos valores recebidos pelo exequente em sede de execução fiscal, teve-se em consideração as declarações dos embargantes e das testemunhas ouvidas em julgamento, as quais foram confrontadas com os documentos juntos aos autos, em conjugação com estes, destacando-se o ofício do Serviço de Finanças ... de 17.09.2021.»
[22] Lembrar que é inadmissível prova testemunhal contrária ou adicional ao que consta de documento autêntico – Artº394 nº1 do CC.