I - O art. 629.º, n.º 2, al. d), do CPC, deve ser interpretado restritivamente no sentido de que que o recurso de revista com base nesta norma só tem aplicação aos recursos de revista que ponham termo ao processo ou apreciem o mérito da causa, nos termos do art. 671.º, n.º 1, do CPC.
II - Sendo assim, a norma do art. 629.º, n.º 2, al. d), do CPC, não é aplicável a decisões interlocutórias de natureza adjectiva.
(1ª Secção)
Relator – Jorge Arcanjo
I – RELATÓRIO
- Que a Executada, AA, seja, desde já, notificada para permitir o acesso imediato ao interior do bem imóvel, pelo representante legal da Adquirente, a fim de este aferir o actual estado de conservação do imóvel;
- Que lhe seja concedido um prazo legal, nunca superior a 60 (sessenta) dias, para que a Executada AA entregue o bem, devoluto de pessoas e bens;
- Caso não o faça voluntariamente no decurso de tal prazo seja, desde já, se requer que seja deferido o auxílio de força pública para que o Interveniente Acidental possa tomar posse efectiva do bem imóvel.
1.2. AA, executada, respondeu com a seguinte alegação:
A executada requereu a suspensão dos actos a realizar em sede de processo executivo referente à entrega judicial do imóvel penhorado nos autos, o que lhe havia sido deferido mediante despacho sob a ref.ª ...29 de 02/07/2021, ao abrigo da al. b), do n.º 7, do artigo 6.º-E da Lei n.º 13-B/2021, redacção então vigente da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, uma vez tratando-se da sua casa de morada de família.
Em requerimento datado de 20/12/2021, a Executada reeditou tal pedido alegando, além do mais, que nele residem a própria e o seu neto com problemas mentais.
Por força do disposto na alínea b) do n.º 7 do referido artigo 6-º-E, estão suspensos «os actos a realizar em processo executivo (…) relacionados com a concretização de diligências de entrega judicial da casa de morada de família», enquanto vigorar o regime excepcional e transitório previsto nesse mesmo artigo.
A suspensão prevista neste último preceito legal - que tem por objecto exclusivo actos de entrega judicial de casa de morada de família -opera ope legis, como reconhecido por este Tribunal e reiterado por despacho datado 30/03/2022, remetendo as partes para o despacho já anteriormente proferido neste sentido, proferido no apenso B, a propósito da suspensão dos actos com vista à entrega do imóvel.
Está provado, por documentos e acordo, que o imóvel penhorado nos autos é casa de morada de família da executada, pelo que não poderá ser efectuada a sua entrega coerciva enquanto durar o referido regime excepcional, o qual se manteve com a última versão da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, resultante da Lei n.º 91/2021, de 17/12 que manteve aquele dispositivo em vigor, e que se mantém até hoje em vigor uma vez não tendo sido objecto de qualquer revogação, ao contrário de outros do mesmo diploma e de diplomas diversos, conforme resultou do Decreto-Lei 66A/2022, de 30 de Setembro.
Deverão manter-se suspensas as diligências de entrega judicial do imóvel em causa.
1.3.- Sobre o referido requerimento foi proferido o seguinte despacho:
“O adquirente veio requerer a entrega coerciva do imóvel vendido, ao que a executada se opôs, alegando que não foi revogada a Lei nº 1-A/2020.
Cumpre apreciar e decidir:
A produção de efeitos da Lei nº 1-A/2020 (que prevê medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS- CoV -2 e da doença COVID-19), é reportada à data da produção de efeitos do DL nº 10-A/2020, conforme art. 10º da Lei nº 1-A/2020, sendo que o DL nº 66- A/2022, de 30/09, revogou a maioria do corpo normativo estabelecido pelo DL nº 10-A/2020, de 13/03.
(…)
Acresce-se que a Lei nº 1-A/2020, na redação original, estabelecia que o regime processual excecional sobre prazos e diligências só por decreto-lei poderia deixar de se aplicar (cf. art. 7º, nº 2), sendo que, entretanto, este preceito foi revogado pelo art. 8º da Lei nº 16/2020, de 29/5.
Assim, considero que a vigência da Lei nº 1-/2020 cessou por caducidade, não apenas porque deixou de existir a realidade que ela se destinava a regular (ou seja, a situação excecional da pandemia), como também porque a revogação deixou de ser a forma prevista para aquela lei deixar de vigorar.
Nestes termos, deverá entender-se que a Lei nº 1-A/2020 cessou a sua vigência por caducidade às 23h59m do dia 30 de setembro de 2022 (data em que cessou por caducidade a Resolução do Conselho de Ministros nº 73-A/2022, de 26/8), devendo considerar-se tacitamente revogada a dita lei, designadamente o Regime Processual Excecional e Transitório previsto no seu art. 6ºE.
Por todo o exposto, autorizo a intervenção da força pública como vista à entrega do imóvel objecto destes autos, se necessário com arrombamento, devendo, no entanto, ter-se presente o que se dispõe no art. 861º, nº 6, do Cód. Proc. Civil”.
1.4.- Inconformada, a executada recorreu de apelação e a Relação, por acórdão de 25/5/2023, confirmou, em voto de vencido, a decisão.
1.5.- A executada interpôs recurso de revista excepcional, concluindo, em síntese:
Ambas as decisões ( da 1ª instância e da Relação) erraram na interpretação das normas jurídicas aplicáveis ao pugnar pela caducidade da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, onde se inclui o art.º 6.º-E, n.º 7, al. b), impondo-se a revogação do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido nos presentes autos e, consequentemente, do despacho recorrido, sob pena de violação do direito da Recorrente à Habitação, à Família e a um processo equitativo nos termos do disposto pelos arts.º 2.º, 65.º/1, 67.º/1 e 20.º, n.º 4 da CRP, mantendo-se a suspensão da diligência de entrega do imóvel que é casa de morada de família da Recorrente.
1.6.- Por decisão do Relator foi cumprido o art. 655 nº1, por força do art.679 CPC, e a Recorrente alegou, em síntese:
Quer no requerimento de admissão do seu Recurso junto do Tribunal da Relação de Lisboa, quer no introito das suas alegações endereçadas a este Venerando Tribunal, expressamente referiu fazê-lo, não nos termos do art.º 859.º do CPC, mas sim, nos termos do disposto pelo art.º 629.º, n.º 1 e 2, al. d) CPC.
Entendeu a Recorrente, convicção que mantém, que, pese embora estando perante o recurso incidente sobre um acórdão da Relação que confirma, sem voto vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª Instância (art.º 671.º, n.º), no presente caso os pressupostos gerais da admissão da Revista dita normal, encontram-se preenchidos porquanto, nos termos daquele outro referido dispositivo, o art.º 629.º, n.º2, al. d) do CPC, no presente caso, estamos perante um caso em que o recurso é sempre admissível atento estarmos perante um acórdão da Relação que está em contradição com outros, no domínio da mesma legislação – art.º 6.º-E, n.º 7, al. b) da Lei n.º 1-A/2020, de 19-03, e sobre a mesma questão fundamental de direito – apurar se ocorreu ou não a caducidade daquele dispositivo.
E sendo certo que, até à data da interposição do Recurso ora em causa, não tinha sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência conforme com o acórdão recorrido.
Assim, partiu deste pressuposto, que considerou assente, para a fundamentação da admissibilidade do seu recurso nos termos do art.º 672.º, n.º 1, al. c) do CPC.
À presente data, atenta a publicação da Lei n.º 31/2023, de 4 de Julho, que veio esclarecer que aquele dispositivo só deixou de vigorar com esta, entendemos que a questão já não assumirá relevância que revestia à data da interposição do presente recurso.
Contudo, à data da interposição do mesmo a situação assumia relevância, como assume agora vê-lo reconhecido, decorrendo daquele diploma que à data do despacho impugnado a norma em causa art.º 6.º-E, n.º 7, al. b) da Lei n.º 1-A/2020, de 19-03 não havia caducado.
1.7. Por decisão do Relator de-11-12-2023, não se conheceu do objecto de recurso, por inadmissibilidade legal.
1.8.- A executada reclamou para a conferência, alegando, em síntese:
O recurso de revista é legalmente admissível com base no art.629 nº2 d) CPC, dispositivo que sempre invocou.
Não deve ser feita uma interpretação restritiva desta norma porque limita injustificadamente o direito de acesso.
Neste contexto, o art.852 CPC remete, também no caso de revista, para as disposições gerais reguladoras do processo de declaração.
Mas na execução o recurso de revista tem um espectro mais restritivo do que no processo declarativo, em face da regra específica do art.854 CPC, ao limitar a sua admissibilidade aos acórdãos da Relação proferidos em determinados procedimentos – liquidação não dependente de simples cálculo aritmético, verificação e graduação de créditos e oposição deduzida contra a execução -, o que significa, a contrario, que não é admissível revista de quaisquer acórdãos da Relação proferidos no procedimento executivo e nos apensos declarativos que não sejam os especialmente contemplados na norma, respeitem estes a decisões interlocutórias ou finais, estando esta interpretação consolidada na jurisprudência do Supremo ( cf., por ex., Ac STJ 11/7/2019 ( prc. nº 4696/17), Ac STJ de 31/1/2019 (proc. nº 19920/13), Ac STJ de 26/1/2021 (proc. nº 1060/14), disponíveis em www dgsi.pt).
Ora não se está perante acórdão da Relação proferido em recurso nos procedimentos de liquidação não dependente de simples cálculo aritmético, verificação e graduação de créditos e de oposição deduzida contra a execução, e só estes admitem revista, desde que verificados os pressupostos gerais. Daqui resulta que não tem aplicação o art.854 (2ª parte) do CPC.
No entanto, o art.854 (1ª parte) CPC ressalva as situações em que é sempre admissível recurso para o STJ (“Sem prejuízo dos casos em que é sempre admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça (…)”), o que convoca as hipóteses do art.629 nº2 a), b), c), e d), e as do art.671 nº2 b) CPC.
Não se verificando quaisquer das alíneas a), b), c) do nº2 do art.629, nem a alínea b) do nº2 do art.671 CPC, resta apurar se o recurso tem apoio no art.629 nº2 alínea d) CPC.
A recorrente, aquando da notificação para efeitos do art. 655 CPC, e na reclamação para a conferência veio dizer que o recurso de revista é admissível, nos termos do art.629 nº 2 d) CPC, tendo indicado o Ac Relação de Lisboa de 23-2-2023 ( proc nº 16142/12), ou seja, o acórdão-fundamento.
Contudo, a executada declarou interpor recurso de revista excepcional, com fundamento no art.672 nº1 c) CPC, e foi este o seu acto postulativo.
No requerimento de interposição e na motivação é clara ao dizer que recorre de revista excepcional
“(…) vem, nos termos do disposto pelos artigos 629.º, n.º1 e 2, al. d), 631.º, n.º 1, 637.º a 639.º, 672.º, n.º 1, al. c) e n.º 2, 673.º, al. a), 674.º, n.º 1, al. a) e n.º 2, 677.º do Código de Processo Civil (CPC) dele interpor RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL(…)”
E na motivação:
“Pese embora a ali referida diversidade de Acórdãos fundamento possíveis, indica-se para o pretendido efeito, nos termos do disposto pelo art.º 672.º, n. º2, al c) do CPC, o Acórdão da Relação de Lisboa de 23/02/2023, proferido no Proc. 16142/12.7T2SNT-F.L1-6, cuja cópia se anexa.”
(…)
Sendo já inúmeras as decisões proferidas pelos diferentes Tribunais da Relação incidindo sobre esta mesma questão jurídica com consequências sociais impactantes, verificando-se igual polarização de posições, afigura-se claramente necessário, para uma melhor aplicação do direito, a apreciação da questão pelo Supremo Tribunal de Justiça, pugnando pelo entendimento jurídico que protege a já mencionada e essencial segurança jurídica, atenta, sobretudo, a particular vulnerabilidade dos executados em iguais circunstâncias, posição pela qual a Recorrente pugnou desde o início (art.º 672.º, n.º 2, als. a) e b) do CPC)”.
Não é a circunstância de se limitar a invocar conjuntamente com outros preceitos o art.629 nº2 d) CPC que impõe a interpretação agora preconizada. O alegado acórdão fundamento foi invocado expressamente para efeitos do art.672 nº1 c) CPC, como resulta das seguintes conclusões, delimitadoras do objecto:
“5. Resulta do confronto de ambas as decisões – do Tribunal de Primeira Instância e do Tribunal da Relação de Lisboa – uma evidente identidade, não diferindo uma da outra, sem fundamentação essencialmente diferente que as separe, conforme previsto nos termos do art.º 672.º, n.º 1, al C) do CPC, legitimando assim a dedução do presente recurso.
6. Como o próprio Acórdão acabado de citar destaca, o entendimento acolhido em ambas as instâncias não é de todo consensuais, designadamente, entre os Tribunais de segunda instância, pelo que, pese embora a referida diversidade de Acórdãos fundamento possíveis, indica-se para o pretendido efeito, nos termos do disposto pelo art.º 672.º, n. º2, al c) do CPC, o Acórdão da Relação de Lisboa de 23/02/2023, proferido no Proc. 16142/12.7T2SNT-F. L1-6, cuja cópia se anexa.”
Vejamos, não obstante, se o recurso de revista é admissível a coberto do art. art.854 (1ª parte) CPC por remissão para o art.629 nº2 d) CPC.
O art. 629 nº2 d) ( “Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme”) deve ser interpretado restritivamente no sentido de que que o recurso de revista com base nesta norma só tem aplicação aos recursos de revista que ponham termo ao processo ou apreciem o mérito da causa, nos termos do art. 671 nº1 CPC. Nesta perspectiva, não é admissível o recurso de revista (normal) com fundamento na regra do art.629 nº2 d) CPC (contradição entre acórdãos da mesma ou de outra Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental) se não estiverem preenchidos os pressupostos de amissibilidade da revista – regra (art.671 CPC).
Sendo assim, a norma do art.629 nº2 d) CPC não é aplicável a decisões interlocutórias de natureza adjectiva, mas antes a regra do art. 671 nº2 b) CPC.
Esta orientação tem sido sustentada pelo Prof. Miguel Teixeira de Sousa ( cf anotação ao Ac STJ de 2 de Junho de 2015, Blog do IPPC (IPPC) https://blogippc.blogspot.com/2015/06/jurisprudencia- ao esclarecer que “o art. 629.º, n.º 2, al. d), CPC só é aplicável se houver uma exclusão legal da revista por um motivo que nada tenha a ver com a relação entre o valor da causa e a alçada do tribunal ou, mais em concreto, se a lei excluir a admissibilidade de uma revista que, de outro modo, seria admissível”. Justifica o ilustre Professor que “há uma (boa) razão de ordem sistemática para se entender que o disposto no art. 629.º, n.º 2, al. d), CPC não pode dispensar a admissibilidade da revista nos termos gerais (sendo nomeadamente necessário, para a admissibilidade da revista, que o valor da causa exceda a alçada da Relação)”, desde logo, porque “se todos os acórdãos da Relação em contradição com outros acórdãos da Relação admitissem a revista “ordinária” nos termos do art. 629.º, n.º 2, al. d), CPC, deixaria necessariamente de haver qualquer justificação para construir um regime de revista excecional para a contradição entre acórdãos das Relações tal como se encontra no art. 672.º, n.º 1, al. c), CPC”. Por isso, defende que “a única forma de atribuir algum sentido útil à contradição de julgados das Relações que consta, em sede de revista excecional, do art. 672.º, n.º 1, al. c), CPC é pressupor que a revista “ordinária” não é admissível sempre que se verifique essa mesma contradição”, na medida em que só “nesta base é possível compatibilizar a vigência do art. 672.º, n.º 1, al. c), CPC com a do art. 629.º, n.º 2, al. d), CPC”.
Acrescenta que o art. 629.º, n.º 2, al. d), CPC “ estabelece uma recorribilidade para acórdãos que são recorríveis nos termos gerais e irrecorríveis por exclusão legal”, porque dada a “exclusão da revista por um critério legal independente da relação do valor da causa com a alçada do tribunal, há que instituir um regime que permita que o STJ possa pronunciar-se (e, nomeadamente, uniformizar jurisprudência) sobre matérias relativas aos procedimentos cautelares e aos processos de jurisdição voluntária”, sendo que é “precisamente essa a função do disposto no art. 629.º, n.º 2, al. d), CPC”.
No plano jurisprudencial, seguindo esta interpretação, por exemplo, Ac STJ de 17/11/2015 (proc. nº 3709/12) Ac STJ de 26/11/2019 (proc nº 1320/17), Ac STJ de 14/7/2021 ( proc nº 2498/03) Ac STJ de 17/11/2021 ( ( proc nº 5585/19) todos disponíveis em www dgsi.pt.
Deve acolher-se a tese restrita, considerando o argumento sistemático e as razões subjacentes às limitações quanto ao terceiro grau de jurisdição, sendo que a norma do art.629 nº2 d) não pode ser interpretada atomisticamente, mas sistematicamente, ou seja, em conjugação com a ratio das normas que definem os pressupostos do recurso de revista geral e do recurso de revista excecional para o Supremo Tribunal de Justiça (cf. arts 671 e 672 do CPC).
A ratio legis do art. 671 nº1 CPC radica na limitação do acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, reservando a sua jurisdição para uma fase do processo em que o objecto tenha sido definitivamente decidido, ou seja, quando se está perante uma decisão final, de natureza material ou processual dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos.
Como elucida Lopes do Rego (“O direito fundamental do acesso aos tribunais e a reforma do processo civil”, Estudos em Homenagem a Cunha Rodrigues, Vol. I, Coimbra Editora, Coimbra, 2001, pág. 764), as “limitações derivam, em última análise, da própria natureza das coisas, da necessidade imposta por razões de serviço e pela própria estrutura da organização judiciária de não sobrecarregar os Tribunais Superiores com a eventual reapreciação de todas as decisões proferidas pelos restantes tribunais”.
Tanto o Tribunal Constitucional, como o Supremo Tribunal de Justiça têm jurisprudência consolidada no sentido de que “ a Constituição não impõe que o direito de acesso aos tribunais, em matéria cível, comporte um triplo ou, sequer, um duplo grau de jurisdição, apenas estando vedado ao legislador ordinário uma redução intolerável ou arbitrária do conteúdo do direito ao recurso de actos jurisdicionais”, pelo que “o legislador dispõe de ampla margem de conformação do regime de recursos” ( cf., por todos, Acórdão TC nº 361/2018).
Por outro lado, também o Tribunal Constitucional no Acórdão nº 701/2005 decidiu que “nenhuma norma ou princípio constitucional impõe a obrigatoriedade de recurso para o Supremo, para uniformização de jurisprudência, de todos os acórdãos proferidos pelas Relações; concretamente, nenhuma norma ou princípio constitucional impõe a obrigatoriedade de recurso para o Supremo, para uniformização de jurisprudência, de acórdão da Relação do qual não seja possível recorrer por motivo respeitante à alçada da Relação”.
E ainda o Acórdão nº159/2019 do Tribunal Constitucional que decidiu “não julgar inconstitucional a interpretação do artigo 629.º, n.º 2, alínea d), conjugada com o n.º 1 do artigo 671.º, ambos do Código de Processo Civil, conducente ao sentido de que o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, não é admissível quando não se verifiquem os requisitos do artigo 671.º, n.º 1, do CPC”.
2.2. - Síntese conclusiva:
1.O art. 629 nº2 d) CPC deve ser interpretado restritivamente no sentido de que que o recurso de revista com base nesta norma só tem aplicação aos recursos de revista que ponham termo ao processo ou apreciem o mérito da causa, nos termos do art. 671 nº1 CPC.
2. Sendo assim, a norma do art.629 nº2 d) CPC não é aplicável a decisões interlocutórias de natureza adjectiva.
Lisboa, 10 de Dezembro de 2024.
Jorge Arcanjo (Relator)
Nelson Borges Carneiro
Manuel Aguiar Pereira