I – A contradição de julgados relevante a que se refere o art. 629º/2/d, do CPCivil, tem de ser uma oposição frontal, não bastando uma oposição implícita ou pressuposta e tem de referir-se a questão que se tenha revelado essencial para a sorte do litígio em ambos os processos, desinteressando para o efeito questões marginais ou que respeitem a argumentos sem valor determinante para a decisão emitida.
II – A contradição ou oposição de julgados há de determinar-se atendendo a dois elementos: a semelhança entre as situações de facto e a dissemelhança entre os resultados da interpretação e/ou da integração das disposições legais relevantes em face das situações de facto consideradas.
III – Ainda que, segundo o disposto no artigo 674º/1/c, do CPCivil, a revista possa ter por fundamento as nulidades do art. 615º/b/c/d/e, do mesmo código, certo é que aquela norma não pode deixar de ser conjugada com o preceituado no n.º 4 deste último artigo, segundo o qual, tais nulidades só são arguíveis por via recursória quando da decisão reclamada caiba também recurso ordinário, ou seja, como fundamento acessório desse recurso.
IV – Quando não seja admissível recurso de revista, as nulidades previstas no art. 615º e imputadas ao acórdão recorrido no que respeita a estes pedidos, terão de ser conhecidas pelo Tribunal da Relação (art. 615º/4/1ª parte e art. 617º/6, ambos do CPCivil).
V – A “justa indemnização” há de tomar como ponto de referência o valor adequado que permita ressarcir o expropriado da perda do bem que lhe pertencia, com respeito pelo “princípio da equivalência de valores”.
VI – Apenas o critério do valor real em condições de mercado assegura a garantia do direito a uma justa indemnização.
VII – Em condições normais de mercado, a possibilidade de construção de cave para estacionamento ou arrumos assume, no contexto de venda a valores de mercado, uma importância que não pode deixar de se repercutir na valorização do solo, na medida em que qualquer construção que ali seja realizada com aproveitamento do subsolo terá um valor acrescido por esse motivo.
VIII – O art. 6º/7 do Regulamento das Custas Processuais permite que, em ações de valor superior a 275 000,00€, seja desconsiderado, no todo ou em parte, o valor da taxa de justiça remanescente que, de outro modo, as partes teriam de pagar a final.
IX – Tal norma deve ser interpretada no sentido de que ao juiz é lícito dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fração ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa e/ou do recurso exceder o patamar de 275 000,00€, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade da tramitação processual, comportamento processual das partes e complexidade substancial das questões a decidir), à luz dos princípios da proporcionalidade e da igualdade.
RECURSO DE REVISTA1,2,3,4,5 | 6520/18.3T8MAI.P1.S1 |
RECORRENTE6 | INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, S.A. |
RECORRIDOS7 | I – HERDEIROS DE AA:
– BB; – CC; – DD; – EE. II – HERDEIROS DE FF e GG : – HH; – II. III – JJ; IV –KK. |
I – A contradição de julgados relevante a que se refere o art. 629º/2/d, do CPCivil, tem de ser uma oposição frontal, não bastando uma oposição implícita ou pressuposta e tem de referir-se a questão que se tenha revelado essencial para a sorte do litígio em ambos os processos, desinteressando para o efeito questões marginais ou que respeitem a argumentos sem valor determinante para a decisão emitida. II – A contradição ou oposição de julgados há de determinar-se atendendo a dois elementos: a semelhança entre as situações de facto e a dissemelhança entre os resultados da interpretação e/ou da integração das disposições legais relevantes em face das situações de facto consideradas. III – Ainda que, segundo o disposto no artigo 674º/1/c, do CPCivil, a revista possa ter por fundamento as nulidades do art. 615º/b/c/d/e, do mesmo código, certo é que aquela norma não pode deixar de ser conjugada com o preceituado no n.º 4 deste último artigo, segundo o qual, tais nulidades só são arguíveis por via recursória quando da decisão reclamada caiba também recurso ordinário, ou seja, como fundamento acessório desse recurso. IV – Quando não seja admissível recurso de revista, as nulidades previstas no art. 615º e imputadas ao acórdão recorrido no que respeita a estes pedidos, terão de ser conhecidas pelo Tribunal da Relação (art. 615º/4/1ª parte e art. 617º/6, ambos do CPCivil). V – A “justa indemnização” há de tomar como ponto de referência o valor adequado que permita ressarcir o expropriado da perda do bem que lhe pertencia, com respeito pelo “princípio da equivalência de valores”. VI – Apenas o critério do valor real em condições de mercado assegura a garantia do direito a uma justa indemnização. VII – Em condições normais de mercado, a possibilidade de construção de cave para estacionamento ou arrumos assume, no contexto de venda a valores de mercado, uma importância que não pode deixar de se repercutir na valorização do solo, na medida em que qualquer construção que ali seja realizada com aproveitamento do subsolo terá um valor acrescido por esse motivo. VIII – O art. 6º/7 do Regulamento das Custas Processuais permite que, em ações de valor superior a 275 000,00€, seja desconsiderado, no todo ou em parte, o valor da taxa de justiça remanescente que, de outro modo, as partes teriam de pagar a final. IX – Tal norma deve ser interpretada no sentido de que ao juiz é lícito dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fração ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa e/ou do recurso exceder o patamar de 275 000,00€, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade da tramitação processual, comportamento processual das partes e complexidade substancial das questões a decidir), à luz dos princípios da proporcionalidade e da igualdade. |
ACÓRDÃO10
1. RELATÓRIO
A presente ação de expropriação por utilidade pública, em que é expropriante, INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, S.A., e expropriados, HERDEIROS DE AA; HERDEIROS DE FF E GG; JJ e, KK, é relativa às parcelas 47.1 e 47.2, a destacar do prédio rústico situado no lugar de Calquim, freguesia de Castêlo da Maia, concelho da Maia, descrito na 1.ª Conservatória do Registo Predial da … sob o n.º ...3/… (…) e inscrito na matriz rústica daquela freguesia sob o artigo ...7, e que foi declarada de utilidade pública urgente, por despacho n.º 1132/2018 do Secretário de Estado das Infraestruturas publicado no DR, 2.ª Série, n.º 22, de 31/01/2018.
Foi proferida sentença em 1ª instância que julgou parcialmente procedentes, quer o recurso interposto pela entidade expropriante, INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, S.A., quer o recurso dos expropriados, fixando o valor da justa indemnização devida pela entidade expropriante aos expropriados pelas parcelas 47.1 e 47.2 em 1 420 579,61€ (um milhão quatrocentos e vinte euros e setenta e nove euros e sessenta e um cêntimos) por referência à data da publicação da Declaração de Utilidade Pública - 31/01/2018, a atualizar até ao trânsito em julgado desta decisão, de acordo com o índice de preços do consumidor, com exclusão de habitação, obtidos pelo Instituto Nacional de Estatística.
A expropriante e expropriados interpuseram recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação do Porto proferido acórdão que negou provimento ao recurso interposto pela expropriante e, concedeu provimento ao recurso interposto pelos expropriados, alterando a decisão proferida nos seguintes termos: “Custas a cargo da Expropriante e dos Expropriados na proporção do respetivo decaimento (art.º 527º, nºs 1 e 2 do CPC”.
Inconformada, veio a expropriante interpor recurso de revista deste acórdão, tendo extraído das alegações11,12 que apresentou as seguintes
b) Ao decidir dever a indemnização total ser atualizada até à data da decisão final, desconsiderando o montante de 642.561,23€ disponibilizado aos expropriados em 2020, o acórdão recorrido decidiu contra a jurisprudência uniformizada do STJ (AUJ n.º 7/2001), em aplicação da qual não podia ter lugar a atualização daquele montante desde a data da respetiva disponibilização.
c) Ao decidir atribuir uma indemnização a título de desvalorização da parte sobrante do prédio, por efeito da criação de uma servidão "non aedificandi" em consequência da construção do nó de acesso à nova estrada construída após a DUP, o acórdão recorrido decidiu em oposição, entre outros, com o decidido no ac. do TRP de 25/1/2016, pelo qual se decidiu que este tipo de danos não é indemnizável no processo de expropriação, nos termos do art.º 29.º, n.º 2 do CE, por não ter a sua causa na divisão do prédio operada pela expropriação.
d) Ao decidir incluir na indemnização do valor do solo da parcela 47.1 a construção de estacionamento em cave, por o art.º 51.º do Regulamento do PDM da Maia impor a criação de lugares de estacionamento no interior do lote e por a valorização da construção em cave, desde que autorizada no PDM, dever ser tida em conta no cálculo do valor do solo, por se repercutir positivamente no valor de venda do imóvel, o acórdão recorrido decidiu em oposição, entre outros, com o decidido no ac. do TRP de 8/2/2024 (referente à mesma DUP), nos termos do qual, nem daquele art.º 51.º decorre tal conclusão, nem a construção em cave deve ser considerada num aproveitamento económico normal do terreno.
e) Ao decidir fixar o custo de construção em 1.000€/m², acolhendo sem reservas o laudo dos peritos maioritários, que desconsideraram em absoluto o art.º 26.º, n.º 5 do CE, em detrimento do laudo do perito indicado pela expropriante, que observou o disposto nesta norma, o acórdão recorrido decidiu em oposição, entre outros, com o decidido no ac. do TRC de 8/10/2019, nos termos do qual o afastamento do valor resultante da aplicação do art.º 26.º, n.º 5 só é legítimo mediante cabal e convincente justificação e demonstração de que esse valor (que nunca pode deixar de ser apurado) não conduz ao apuramento do valor real e corrente do bem.
DOS FUNDAMENTOS DO RECURSO
1.ª – Como bem se decidiu no acórdão-fundamento invocado, a depreciação da parte sobrante de um prédio, em consequência da criação de uma servidão non aedificandi decorrente da construção de uma via rodoviária no local após a DUP, não é indemnizável no processo de expropriação, por força do disposto no art.º 29.º, n.º 2 do CE, que limita o ressarcimento dos danos àqueles que resultem da divisão do prédio operada pela expropriação, excluindo-se os danos resultantes da obra a ser construída após a expropriação.
2.ª – A alteração feita pelo legislador nesta norma, por comparação com a correspondente norma do código anterior – no Código de 1991, fazia-se referência aos prejuízos ou encargos decorrentes “da expropriação”, no Código de 1999 passou a contemplar-se apenas os prejuízos ou encargos decorrentes “da divisão” – visou precisamente pôr cobro às dúvidas de interpretação que se suscitavam na vigência da lei antiga, procurando-se deixar claro que só estão em causa os danos diretamente resultantes da divisão do prédio criada pelo destaque da área expropriada.
3.ª – Interpretação que tem merecido significativo consenso na doutrina e na jurisprudência.
4.ª – Embora haja relação entre a obra e a expropriação (pois é a necessidade de realização da obra que motiva a expropriação do terreno), estamos perante factos distintos, independentes e temporalmente não coincidentes. Se, apesar da DUP e do ato expropriativo, não tivesse sido concretizada a construção da estrada, não haveria qualquer servidão "non aedificandi".
5.ª – E são distintas as fontes da obrigação de indemnização: a expropriação por utilidade pública é um facto lícito que gera a obrigação de indemnizar o expropriado, de acordo com os critérios definidos no Código das Expropriações; a construção da obra pode ou não gerar obrigação de indemnizar, consoante importe ou não a prática de um facto ilícito ou cause um sacrifício (danos especiais e anormais) ao proprietário por ela afetado ou a terceiros.
6.ª – A necessidade de a questão ser discutida em ação autónoma decorre, não só da celeridade que o legislador quis garantir ao processo de expropriação (não compatível com a espera da realização da obra), da dificuldade de prova no processo de expropriação ou do princípio da igualdade (pensando nos restantes proprietários eventualmente prejudicados pela servidão, mas que não tenham sido expropriados), decorre também da ideia de “processo adequado”: um processo concebido para a realização de certo direito (como é o processo especial de expropriação) não deve ser aproveitado para a realização de quaisquer outros, sob pena de comprometimento das garantias constitucionais que o legislador pretendeu acautelar ao fazer corresponder a dada situação uma determinada forma de processo e tramitação especial.
7.ª – O desacerto do decidido relativamente a esta matéria reforça a conclusão de que é mais acertada a sua apreciação e decisão em processo autónomo, após a construção da estrada e ponderadas todas as circunstâncias relevantes nessa data (e não na data da DUP).
8.ª – A servidão "non aedificandi" não se traduz em desvalorização da parte sobrante se não impedir a edificação com o mesmo índice na parte restante ou se a área afetada puder ser utilizada como apoio à construção a efetuar na parte restante, designadamente como logradouro ou estacionamento ou integrando as áreas de cedência ao município, por exemplo para infraestruturas, acessos, espaços verdes ou equipamentos.
9.ª – Os peritos e o próprio Tribunal concluíram que a constituição da servidão não impede a edificação com o mesmo índice de construção, a executar na parte não afetada pela servidão, o que resulta aliás dos factos provados, na medida em que a área do prédio não atingida pela servidão apurada pelos peritos é de 14.382 m2 e a área de terreno necessária à execução da capacidade construtiva admitida no PDM é de apenas 3.724 m² - e isto já esquecendo que as áreas de cedência ao município (ex. para espaços verdes, acessos ou estacionamento) podem localizar-se na zona "non aedificandi".
10.ª – Ainda que assim não fosse, acresce que o Tribunal desconsiderou o disposto no art.º 55.º, n.º 1, al. a) da Lei n.º 34/2015, de acordo com o qual a servidão não prejudica a possibilidade de, na zona por ela afetada, «construir ou implantar edificações ao longo de estradas, nos troços que constituam ruas de zonas urbanas consolidadas, de acordo com o alinhamento das edificações existentes e devidamente legalizadas», tendo sido dado como assente que “o prédio confronta a Norte, a Sul e a Poente com malha urbana consolidada” (ponto 27 da matéria de facto).
11.ª – Ainda para mais, a indemnização por desvalorização foi atribuída sem que os expropriados alguma vez tivessem deduzido o correspondente pedido, tendo o direito de defesa da entidade expropriante ficado prejudicado: os expropriados fizeram depender a liquidação de um tal pedido de uma resposta do Município às informações por eles requeridas, mas das quais vieram a desistir, nenhuma modificação do pedido tendo sido feita no processo, até ao encerramento da discussão, limitando-se os expropriados, nas alegações finais apresentadas nos termos do art.º 64.º, a concluir pela procedência do seu recurso da arbitragem e afirmando mesmo expressamente que continuavam a não dispor de elementos para liquidar aquele pedido.
12.ª – Por todo o exposto, errou o Tribunal recorrido na atribuição de uma indemnização aos expropriados a título de desvalorização da parte sobrante do prédio pela criação de uma servidão "non aedificandi".
13.ª – Foi fixado à parcela 47.1 um exagerado valor unitário de 141,07€/m2, bastante desfasado da realidade do terreno e dos valores recebidos pelos outros expropriados. E é quase o dobro do valor apurado pelos três peritos da lista oficial que realizaram a arbitragem e também do valor apurado pelo perito da lista oficial que realizou a avaliação a que se refere o art.º 10.º, n.º 4 do CE, o que é uma situação anómala, exigindo redobrados cuidados por parte do julgador.
14.ª – O Tribunal recorrido fez errada interpretação e aplicação do art.º 51.º do Regulamento do PDM da Maia ao pressupor que esta norma imporia a construção de certo número de lugares de estacionamento subterrâneo. Como bem se decidiu no acórdão-fundamento invocado, relativo ao mesmo ato expropriativo, essa norma do PDM limita-se a prescrever a obrigatoriedade de a operação urbanística garantir determinada área para estacionamento “no interior do lote ou parcela”, em lado nenhum exigindo que essa área tenha de ser em cave (e tão-pouco o exigem os diplomas citados na pág. 35 do acórdão).
15.ª – Atentas a dimensão do terreno e o índice de utilização aplicável (0,7), o estacionamento exigido no citado art.º 51.º do PDM pode, aliás, perfeitamente ser acomodado à superfície.
16.ª – Tal como também se decidiu no acórdão-fundamento invocado, «a imposição regulamentar de uma área para aparcamento constitui um encargo urbanístico na operação a realizar, podendo assim apresentar-se como um custo na operação urbanística, nomeadamente quando implique a construção em cave, à semelhança, aliás, do que sucede com outras imposições legais e regulamentares, como por exemplo a necessidade de reforço das infraestruturas ou a imposição de áreas de cedência ao município, relativamente às quais também não faz o mínimo sentido falar-se em acréscimo de indemnização».
17.ª – Em todo o caso, a valorização da construção em cave seria sempre incorreta, porque no cálculo do valor de um solo apto para a construção não se deve considerar, para efeitos de indemnização, as áreas de cave, designadamente para estacionamento (salvo em casos excecionais de caves muito amplas com viabilidade de comercialização autónoma, face à especial localização do imóvel).
18.ª – A construção em cave faz aumentar muito os custos da construção (com escavações, fundações, movimentos de terras, muros de suporte, drenagem de águas freáticas, impermeabilizações, medidas de segurança contra incêndios, etc.), que são repercutidos no valor das habitações vendidas, não devendo esse tipo de construção ser considerado num “aproveitamento económico normal” (artigos 23.º, n.º 1 e 26.º, n.º 1 do CE).
19.ª – Errou, pois, a decisão recorrida ao valorizar, para efeitos indemnizatórios (valor do solo da parcela 47.1), a construção em cave, mediante a aplicação de um índice de utilização adicional de 0,3, não tendo cabimento a consideração de um índice de utilização abaixo do solo.
20.ª – Ainda a respeito da avaliação do solo da parcela 47.1, e relativamente ao custo de construção, o laudo do perito indicado pela expropriante, em cumprimento do disposto no art.º 26.º, n.º 5 do CE, adotou como referencial o montante fixado administrativamente para efeitos de aplicação do regime da renda condicionada e assim apurou o custo de construção de 731,86€/m², que depois arredondou para 750,00€/m².
21.ª – Diversamente, os restantes peritos, ignorando essa norma, limitaram-se a fazer constar do relatório que «atendendo à localização da parcela e ao tipo de construção da envolvente, considera-se como valor referencial da construção o valor de 1.000,00€/m²».
22.ª – As instâncias acolheram este último laudo, interpretando o disposto no art.º 26.º, n.º 5 do Código das Expropriações como se os valores aí previstos fossem meramente supletivos.
23.ª – Ora, como decidiu o acórdão-fundamento invocado, aliás apenas um exemplo entre numerosa jurisprudência, numa questão que é consensual, o facto de os valores previstos no art.º 26.º, n.º 5 do CE deverem ser atendidos “como referenciais” não significa que possam ser afastados como se fossem meramente supletivos, antes se exigindo que sejam atendidos e que só possam ser substituídos mediante a demonstração de que o valor apurado através da sua aplicação não conduz ao apuramento do valor da justa indemnização, como aliás resulta do disposto no art.º 23.º, n.º 5.
24.ª – Não foi isso que sucedeu no caso concreto: aceitou-se como válido, face à referida norma, que os peritos simplesmente tivessem adotado outro valor, com a vaga justificação de que o faziam face à “localização da parcela e ao tipo de construção da envolvente”. Os peritos maioritários não chegaram a apurar o valor que resultaria do disposto no art.º 26.º, n.º 5, norma que pura e simplesmente ignoraram, como se não existisse, e não justificaram, portanto, de modo convincente, e sustentado em elementos objetivos, comprovadamente, que um tal valor não permitiria atingir o valor real e corrente do bem.
25.ª – Errou, pois, a decisão proferida ao acolher um laudo que simplesmente adotou critério diferente do legal – não baseado em elementos objetivos, documentais –, e concluiu, subjetivamente, pelo concreto valor de 1.000,00€/m².
26.ª – Um dos princípios fundamentais em matéria de fixação da indemnização por expropriação é o princípio da igualdade (art.º 2.º do CE), que, na sua vertente interna, pressupõe que os expropriados não sejam tratados de forma desigual. E um dos principais garantes legais dessa igualdade é que os bens sejam avaliados segundo critérios idênticos, em lugar de cada perito ou colégio de peritos proceder a uma avaliação segundo os critérios da sua preferência.
27.ª – Não está minimamente demonstrado, no processo, que o custo de construção resultante da aplicação do art.º 26.º, n.º 5 conduzisse à determinação de uma indemnização injusta.
28.ª – Em suma, o custo de construção adotado pelos peritos do Tribunal foi acolhido pelo Tribunal simplesmente por… ser o custo de construção adotado pelos peritos do Tribunal. Ainda que ao arrepio dos critérios legais.
29.ª – O que não é aceitável, sendo absolutamente pacífico, na jurisprudência, que o Tribunal se deve afastar das conclusões de um laudo, ainda que unânime ou dos peritos do Tribunal, quando este não tenha respeitado as normas legais aplicáveis.
30.ª – Neste ponto, não pode, pois, deixar de ser acolhido o laudo do perito indicado pela expropriante, o único que apurou o custo de construção com respeito das normas legais aplicáveis, mantendo-se o custo de construção de 750,00€/m2 fixado na arbitragem.
31.ª – Não colhe o argumento, invocado no acórdão, de que «o legislador, desde o ano de 2014, deixou de publicar preços para o arrendamento condicionado», pois a revogação do Decreto-Lei n.º 329-A/2000 não inviabilizou a continuação da aplicação deste critério, como tem sucedido na generalidade dos processos de expropriação, dado que os valores fixados anualmente se limitavam a atualizar o valor publicado no ano anterior pela simples aplicação do coeficiente anual de atualização das rendas e este continuou a ser publicado.
32.ª – Confirmando a maior adequação do valor de 750,00€/m² à realidade da zona onde se situa o prédio expropriado, veja-se que foi de 752,52€/m² o custo de construção fixado para um prédio vizinho, a que respeita o acórdão do TRP de 8/2/2024 anexo a esta peça e referente à mesma DUP dos autos.
33.ª – E, ainda relativo à mesma DUP dos autos, foi de 731,86€/m² (813,18€/m2 x 90%) o custo de construção fixado para outro prédio vizinho, a que respeita o ac. do TRP de 20/5/2024 (dgsi.pt, proc. 109/20.4T8MAI.P1). No presente processo, foi também de 731,86€/m² (813,18€/m² x 90%) o valor apurado pelo perito da entidade expropriante, que depois efetuou o arredondamento para 750,00€/m².
34.ª – Acresce que, no presente processo, a decisão arbitral fixou o custo de construção em 750,00€/m² e, no recurso que interpuseram da decisão arbitral, os expropriados não só não impugnaram este valor, como o aceitaram, incluindo-o nos seus cálculos da indemnização da parcela 47.1 (art.º 95.º da petição de recurso dos expropriados), pelo que o custo de construção nunca devia ter sido fixado em montante superior ao fixado na arbitragem e que não foi impugnado no recurso.
35.ª – Com efeito, como se refere no ac. do STJ de 26/11/2009 (dgsi.pt, proc. n.º 2416/04.4TJVNF.S1), «a decisão arbitral é uma decisão judicial, proveniente de um tribunal arbitral necessário, constitui o julgamento das questões cujo conhecimento lhe é submetido, sendo-lhe aplicável, em matéria de recursos, o regime contido no Código de Processo Civil, pelo que o poder de cognição do juiz se delimita pelas conclusões das alegações do recorrente e pelo decidido no acórdão arbitral, transitando em tudo quanto seja desfavorável para a parte não recorrente e envolvendo a falta de recurso concordância com o decidido pelos árbitros».
36.ª – Por todo o exposto, o custo de construção a considerar deverá ser de 750,00€/m².
37.ª – Eliminando a valorização da cave (0,3 x 400,00€/m² x 22% x 90% x 95%) e alterando o custo de construção de 1.000,00€/m² para 750,00€/m² [(0,7 x 750,00€/m²) x 22% x 90% x 95% em vez de (0,7 x 1.000,00€/m² x 90%) x 22% x 90% x 95%], à parcela 47.1 deve, em conclusão, ser fixado o valor unitário de 98,75€/m² (em vez de 141,07€/m²) e, por conseguinte, ser fixado o valor indemnizatório de 844.806,25€ (98,75€/m² x 8.555 m²), em vez do valor de 1.206.853,85€ (141,07€/m² x 8.555 m²).
38.ª – Assim, a decisão recorrida, que violou as disposições legais acima citadas, deverá ser revogada e substituída por outra que fixe a indemnização no valor total de 863.852,65€ (correspondente à soma dos seguintes valores: parcela 47.1: 844.806,25€; parcela 47.2: 6.296,40€; benfeitorias: 12.750,00€; nenhum valor devendo ser atribuído a título de desvalorização da parte sobrante do prédio, como se concluiu).
39.ª – Ao determinar a atualização da totalidade do valor indemnizatório até à data da decisão final, desconsiderando o montante parcelar de 642.561,23€ que foi disponibilizado aos expropriados em julho de 2020 (e que estes efetivamente levantaram), a sentença da 1.ª instância e o acórdão recorrido decidiram contra a jurisprudência uniformizada do STJ – AUJ n.º 7/2001 –, numa decisão que penaliza a expropriante e beneficia os expropriados em mais de 114 mil euros (isto contabilizado o período de atualização até à presente data).
40.ª – Não é a circunstância de o Tribunal recorrido ter feito constar que a atualização determinada na sentença respeita, «sem quaisquer dúvidas ou obstáculos», a jurisprudência fixada no AUJ n.º 7/2001 (pág. 41 do acórdão recorrido) que impede a conclusão contrária, isto é, de que a decisão, na realidade, contraria esta jurisprudência uniformizada.
41.ª – Conforme jurisprudência fixada no citado Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 7/2001, o valor fixado na decisão final é atualizado apenas até à notificação do despacho que atribua ao expropriado a quantia sobre a qual se verifica acordo (nos termos do art.º 52.º, n.º 3 do CE), sendo que, a partir dessa data, a atualização incide apenas sobre a diferença entre o valor fixado na decisão final e aquele valor parcelar anteriormente atribuído.
42.ª – A atribuição do valor sobre o qual se verificou “acordo das partes” - que foi de 642.561,23€ - consta do despacho de 15/7/2020, proferido a requerimento dos próprios expropriados e que lhes foi notificado em 23/7/2020 (tendo os expropriados efetivamente levantado a quantia em causa, segundo a repartição entre eles acordada).
43.ª – Pelo que, nos termos do art.º 24.º, n.º 1 do CE e do citado AUJ n.º 7/2001, a decisão recorrida deverá ser nesta parte revogada e substituída por outra pela qual se decida, quanto à atualização da indemnização a fixar, que o valor indemnizatório total deve ser atualizado desde a data da publicação da DUP (Janeiro de 2018) até Julho de 2020 e que, desde Julho de 2020, a atualização deve incidir apenas sobre a diferença entre a indemnização fixada e o valor de 642.561,23€ anteriormente disponibilizado e levantado pelos expropriados.
44.ª – Sem conceder: como se concluiu, a sentença decidiu contra a jurisprudência uniformizada do STJ e, não obstante a entidade expropriante a ter impugnado com esse fundamento na apelação que interpôs (conclusões 24.ª a 26.ª das alegações da apelação), a Relação manteve a decisão, fazendo constar do acórdão que ela respeitava o citado acórdão uniformizador.
45.ª – A decisão da Relação sobre este ponto é muito breve e ocupa não mais do que meia dúzia de linhas, na pág. 41 do acórdão, nas quais o Tribunal praticamente se limita a fazer constar que não foi desrespeitado o acórdão uniformizador 7/2001.
46.ª – Salvaguardando-se a hipótese de se entender que a Relação não chegou a pronunciar-se sobre a questão suscitada no recurso, ocorre então nulidade do acórdão, por omissão de pronúncia, que aqui se argui, nos termos dos artigos 666.º, n.º 1 e 615.º, n.º 1, al. d) e n.º 4, já que, nos termos do art.º 608.º, n.º 2, aplicável por força do art.º 663.º, n.º 2, constituía dever do Tribunal a quo apreciar e decidir a questão submetida à sua decisão (a desconsideração, na decisão sobre a atualização, do montante de 642.561,23€ disponibilizado aos expropriados na fase inicial do processo, contra o citado acórdão uniformizador).
47.ª – Nessa hipótese, a procedência da nulidade acarreta que se ordene a baixa do processo à Relação, a fim de se reformar a decisão, nos termos do art.º 684.º, n.º 2 do CPC.
48.ª – Requer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos e com os fundamentos acima expostos no cap. VII destas alegações.
Nestes termos, deverá ser declarado procedente o presente recurso e:
I – A indemnização deverá ser fixada no valor total de 863.852,65€.
II – Quanto à atualização, deverá decidir-se que o valor indemnizatório total deve ser atualizado de janeiro de 1018 até julho de 2020 e que, a partir de julho de 2020, a atualização deve incidir apenas sobre a diferença entre a indemnização fixada e o valor de 642.561,23€ anteriormente disponibilizado aos expropriados.
Ou, e sem conceder, julgar-se procedente a nulidade do acórdão, ordenando-se a baixa do processo à Relação a fim de se reformar a decisão, nos termos do art.º 684.º, n.º 2 do CPC.
III – Quanto a custas, deverá conceder-se à expropriante a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça relativamente ao recurso da decisão arbitral interposto pelos expropriados, ao recurso de apelação interposto pela expropriante e ao presente recurso14.
Os recorridos contra-alegaram, pugnando pela improcedência da revista e a manutenção do acórdão recorrido.
Colhidos os vistos15, cumpre decidir.
Emerge das conclusões do recurso de revista apresentadas por INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, S.A., ora recorrente, que o seu objeto está circunscrito às seguintes questões:
1.) Saber se será admissível recorrer de revista por ter o Tribunal a quo decidido contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça quanto à questão referente à atualização da indemnização (art. 629º/2/c, do CPCivil).
2.) Saber se será admissível recorrer de revista para este Supremo Tribunal de Justiça por haver contradição jurisprudencial quanto à questão referente à desvalorização da parte sobrante da parcela expropriada (art. 629º/2/d, do CPCivil).
3.) Saber se será admissível recorrer de revista para este Supremo Tribunal de Justiça por haver contradição jurisprudencial quanto à questão de a valorização da construção de cave dever ser admitida no cálculo do valor do solo (art. 629º/2/d, do CPCivil).
4.) Saber se será admissível recorrer de revista para este Supremo Tribunal de Justiça por haver contradição jurisprudencial quanto à questão referente aos critérios legais a observar para apurar o custo de construção (art. 629º/2/d, do CPCivil).
5.) Saber se este tribunal ad quem deverá conhecer da arguida nulidade do acórdão proferido pelo tribunal a quo por omissão de pronúncia.
6.) Saber se a valorização decorrente da possibilidade de construção de cave para estacionamento deve ser admitida no cálculo do valor do solo.
7.) Saber se deve conceder-se à recorrente a dispensa do pagamento do remanescente relativamente ao recurso da decisão arbitral interposto pelos expropriados, ao recurso de apelação interposto pela expropriante e ao presente recurso.
2. FUNDAMENTAÇÃO
1.) SABER SE SERÁ ADMISSÍVEL RECORRER DE REVISTA POR TER O TRIBUNAL A QUO DECIDIDO CONTRA JURISPRUDÊNCIA UNIFORMIZADA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUANTO À QUESTÃO REFERENTE À ATUALIZAÇÃO DA INDEMNIZAÇÃO (ART. 629º/2/C, DO CPCIVIL).
A recorrente alegou que “conforme a jurisprudência fixada no Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 7/2001, de 12/7/2001, o valor fixado na decisão final é atualizado apenas até à notificação do despacho que atribua a quantia sobre a qual se verifica acordo das partes, sendo que, a partir dessa data, a atualização incide apenas sobre a diferença entre o valor fixado na decisão final e aquele valor parcelar anteriormente atribuído”.
Mais alegou que “não é a circunstância de o Tribunal recorrido ter feito constar que a atualização determinada na sentença respeita, «sem quaisquer dúvidas ou obstáculos», a jurisprudência fixada do AUJ n.º 7/2001, que impede a conclusão contrária, isto é, de que a decisão, na realidade, contraria esta jurisprudência uniformizada”.
O tribunal de 1ª instância decidiu que a totalidade da indemnização deve ser atualizada «até à data da presente decisão».
O tribunal a quo decidiu que «tal atualização assenta, sem quaisquer dúvidas ou obstáculos, na previsão legal do art.º 24.º do C.E. e no que decorre da decisão proferida no AUJ n.º 7/2001, de 12.07.2001».
Vejamos a questão, isto é, se será admissível recorrer de revista para este Supremo Tribunal de Justiça.
Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso, das decisões proferidas, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça – art. 629º/2/c, do CPCivil.
Com esta previsão pretende-se potenciar, de forma indireta, a obediência aos acórdãos de uniformização de jurisprudência19.
Para que seja aplicável esta regra especial, necessário se torna que estejam reunidos diversos requisitos:
- Objeto do recurso: decisão da 1.ª instância ou acórdão da Relação;
- Razão do recurso: contradição relativamente ao núcleo essencial de acórdão de uniformização de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça;
- Relevo do recurso: a decisão impugnada deve traduzir uma oposição frontal e não apenas implícita ou pressuposta em relação ao acórdão fundamento;
- Natureza da matéria: a divergência jurisprudencial deve verificar-se relativamente a questões de direito, sendo irrelevantes eventuais divergências relativamente a questões de facto;
- Essencialidade: a questão de direito sob controvérsia deve revelar-se essencial para o resultado numa e noutra decisões, sendo irrelevantes respostas ou argumentos que não tenham valor decisivo (obter dicta);
- Identidade: deve verificar-se uma relação de identidade entre a questão de direito que foi objeto de uniformização jurisprudencial e a que foi objeto da decisão recorrida; não se mostra necessária a verificação de uma identidade integral entre o objeto de cada um dos processos em que foi proferido o acórdão de uniformização e a decisão recorrida, bastando que em cada uma das causas tenha sido apreciada e decidida a mesma questão de direito;
- Resultado da contradição: é necessário que na decisão recorrida se tenha optado por uma resposta diversa da que foi assumida no acórdão de uniformização, diversidade que não representa uma necessária contradição absoluta quanto à decisão com efeitos uniformizadores, bastando que esta não tenha sido inteiramente acolhida;
- Quando normativo: a divergência deve verificar-se num quadro normativo substancialmente idêntico;
- Requisitos formais: nas alegações de recurso, o recorrente deve expor os motivos que expliquem a verificação da divergência essencial relativamente à jurisprudência uniformizadora; deve ainda instruí-la com cópia, ainda que não certificada, do acórdão fundamento (AUJ) (art. 637.º)20.
O Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 7/2001, de 12/7/2001 (AUJ) uniformizou a seguinte jurisprudência: “Em processo de expropriação por utilidade pública, havendo recurso da arbitragem e não tendo esta procedido à atualização do valor inicial, o valor fixado na decisão final é atualizado até à notificação do despacho que autorize o levantamento de uma parcela do depósito. Daí em diante a atualização incidirá sobre a diferença entre o valor fixado na decisão final e o valor cujo levantamento foi autorizado; tendo havido atualização na arbitragem, só há lugar à atualização, desde a data da publicação da declaração de utilidade pública até à decisão final, sobre a diferença entre o valor fixado na decisão final e o valor cujo levantamento foi autorizado”.
Ora, entende a recorrente que o tribunal a quo decidiu em contradição com jurisprudência uniformizada, porquanto a atualização da indemnização não pode incidir sobre a parcela já disponibilizada aos expropriados em 15-07-2020.
Analisas os arestos em confronto, cumpre afirmar que não se verifica a invocada contradição de julgados.
Efetivamente, lido o acórdão do tribunal a quo, resulta com evidência que a decisão fundamental de direito que deu origem ao acórdão de uniformização de jurisprudência em análise nos autos não foi, sequer implicitamente, apreciada no âmbito da decisão recorrida.
Na verdade, o tribunal a quo pronunciou-se, em exclusivo, sobre a questão de saber se a indemnização deve ser atualizada tendo por referência da DUP, tendo concluído em sentido afirmativo.
Não se retira, assim, qualquer pronúncia sobre uma eventual cisão da indemnização para efeitos de atualização, matéria em relação à qual a recorrente manifesta discordância.
Acresce dizer, que a circunstância de o acórdão da tribunal a quo poder estar, eventualmente, ferido por omissão de pronúncia, é matéria que não se coloca ao nível da admissibilidade do presente recurso de revista, sendo manifesto que não se mostra a previsão normativa convocada pela recorrente para justificar a interposição do presente recurso de revista.
Concluímos, não tendo o tribunal a quo decidido contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça, não se verifica a previsão normativa contida no art. 629º/2/c, do CPCivil.
Destarte, não se admite o presente recurso quanto a esta matéria, pelo que, dela não se conhece, por não poder integrar o objeto do presente recurso de revista.
2.) SABER SE SERÁ ADMISSÍVEL RECORRER DE REVISTA PARA ESTE SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA POR HAVER CONTRADIÇÃO JURISPRUDÊNCIAL QUANTO À QUESTÃO REFERENTE À DESVALORIZAÇÃO DA PARTE SOBRANTE DA PARCELA EXPROPRIADA (ART. 629º/2/D, DO CPCIVIL).
A recorrente alegou que “Não obstante a conclusão das instâncias de que a servidão "non aedificandi" criada «não afeta na verdade a capacidade edificativa na parcela sobrante», decidiu-se fixar uma indemnização no valor de 194.679,36€, a título de desvalorização da parte sobrante do prédio, em consequência dessa servidão, por redução da área de implantação, verificando-se, assim, oposição com o decidido, por ex., no ac. do TRP de 25/1/2016, proc. 1664/07.0TBLSD.P1”.
Assim, concluiu que “Nos dois arestos – o acórdão recorrido e o acórdão-fundamento – foram, assim, dadas soluções opostas à questão de saber se, nos termos do art.º 29.º, n.º 2 do Código das Expropriações, deve ser indemnizada no processo de expropriação a desvalorização da sobrante decorrente da criação de uma servidão "non aedificandi" pela obra rodoviária construída após a DUP: no sentido afirmativo segundo o acórdão recorrido, no sentido negativo segundo o acórdão-fundamento”.
Vejamos a questão, isto é, se será admissível recorrer de revista para este Supremo Tribunal de Justiça, por haver contradição jurisprudencial, nos termos do disposto no art. 629º/2/d, do CPCivil.
Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso, do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme – art. 629º/2/d, do CPCivil.
Cabe revista para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação, proferido sobre decisão da 1.ª instância, que conheça do mérito da causa ou que ponha termo ao processo, absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos – art. 671º/1, do CPCivil.
Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte – art. 671º/3, do CPCivil.
Nos autos, como o recurso tem por objeto uma decisão final proferida num processo de expropriações em que o Tribunal da Relação se pronunciou sobre o valor da indemnização devida, o recurso de revista apenas será possível se se tratar de um caso em que o recurso seja sempre admissível, no caso, a invocação de existência de contradição de acórdãos.
Ora, a contradição de julgados relevante a que se refere o art. 629º/2/d, do CPCivil, tem de ser uma oposição frontal, não bastando uma oposição implícita ou pressuposta e tem de referir-se a questão que se tenha revelado essencial para a sorte do litígio em ambos os processos, desinteressando para o efeito questões marginais ou que respeitem a argumentos sem valor determinante para a decisão emitida21,22.
A oposição de acórdãos pressupõe, assim, primo, que a decisão e fundamentos do acórdão-recorrido se encontrem em contradição com outro relativamente às correspondentes identidades; secundum, que essa disparidade se situe dentro do mesmo campo normativo23.
Em sentido técnico, a oposição de acórdãos quanto à mesma questão fundamental de direito verifica-se, assim, quando a mesma disposição legal se mostre, num e noutro, interpretada e/ou aplicada em termos opostos, havendo identidade da situação de facto subjacente a essa aplicação24,25,26,27.
Se as situações em tela são diametralmente opostas, não coincidindo nem no seu objeto, nem na sua apreciação e solução jurídico-normativa, conduz-nos à respetiva desconsideração em termos de admissibilidade da impugnação havida em sede de recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência28.
Estamos perante oposição/contradição de acórdãos quanto à mesma questão fundamental de direito, se “a mesma disposição legal se mostre, num e noutro, interpretada e/ou aplicada em termos opostos, havendo identidade da situação de facto subjacente a essa aplicação”, ou, isto é, “quando o núcleo da situação de facto, à luz da norma é idêntico, havendo conflito jurisprudencial se os mesmos preceitos são interpretados e aplicados a enquadramentos factuais idênticos”, bem como em termos da estrita incidência sobre factualidade, conduzindo a conclusões opostas29.
A contradição deve ser frontal, e não implícita, não bastando que se tenha abordado o mesmo instituto, pressupondo que a subsunção jurídica realizada em quaisquer das decisões tenha operado sobre o mesmo núcleo factual, ou factualidade como tal considerada, sem ser atribuída relevância a elementos de natureza acessória, e assim ser idêntica a ratio decidendi30.
Deverá, pois, ocorrer uma verdadeira contradição entre os acórdãos, o que significa que a questão essencial, que constituiu a razão de ser e objeto da decisão, foi resolvida de forma frontalmente oposta nas decisões em confronto, não bastando oposição respeitante a questões laterais ou a fundamentos de ordem secundária, nem oposição meramente implícita31.
Deve verificar-se uma relação de identidade entre a questão de direito apreciada no acórdão que é objeto de recurso e a apreciada no acórdão-fundamento, não bastando que nos dois acórdãos se tenha abordado o mesmo instituto jurídico, pois tal pressupõe que os elementos de facto relevantes para a ratio da regra jurídica sejam coincidentes32,33, isto é, que a subsunção jurídica feita em qualquer das decisões tenha operado sobre núcleo factual essencialmente idêntico, sem se atribuir relevo a elementos de natureza acessória.
Por último, a divergência deve verificar-se num quadro normativo substancialmente idêntico34.
Quadro fáctico
O acórdão fundamento deu como provado que35:
- De acordo com o P.D.M. de Lousada, o solo da parcela n.º ..-. está inserido em zona de “Reserva Agrícola Nacional” e o restante prédio em zona de “Aglomerados de média densidade” – facto provado nº 4.
- Na parte sobrante do prédio, a Norte da parcela de terreno n.º ..-., localizam-se as construções existentes no prédio, uma antiga com 156 m2 de área coberta, constituída por casa de dois pisos, com paredes em pedra e cobertura em telha assente em estrutura de madeira, com um quarto, duas salas, uma cozinha e uma varanda no andar e uma loja no rés-do-chão, outra recente, com dois pisos, sendo que o andar constitui farmácia – facto provado nº 8.
- Na parte sobrante a área de implantação possível fica reduzida a cerca de 550 m2.1– facto provado nº 9.
O acórdão recorrido deu como provado que:
- Face ao Plano Diretor Municipal da Maia (adiante designado por PDM da Maia), a área do prédio abrangido pela parcela 47.1 estava inserida em Solo Urbano, na categoria de “Área de Habitação Coletiva – HC1”, na qual o índice pode variar entre 0,4 m2/m2 até 1m2/m2 e essas áreas de habitação coletiva dividem-se em função da altura da fachada, que para a categoria HC1 vai de 2 a 4 pisos ou 14 metros – facto provado nº 13.
- A expropriação dessa sub parcela 47.1 origina uma área sobrante de 21.282 m2, que se localiza a Sul e a Poente dessa área – facto provado nº 24.
- Esta área sobrante mantém frentes para as vias que já marginavam a área de onde é destacada a sub-parcela 47.1, ou seja, do Norte para a Via Diagonal, do Sul para a Rua Serafim da Cruz, do Nascente para a Rua de Avioso e do Poente para a Rua D. Idalina Santos Quelhas – facto provado nº 25.
- Passando, no entanto, a ser marginada em parte da sua extensão a Nascente e parte da extensão a Norte, pelo ramal de acesso que liga a Rotunda 1, realizada sobre a Via Diagonal, à nova EN 14 – facto provado nº 26.
- O prédio sobrante e a sub parcela 47.1 situam-se em zona que confronta a Norte, a Sul e a Poente com malha urbana consolidada e em consolidação, onde existem construções em propriedade horizontal, moradias, escolas, centro de saúde, clínicas, farmácias, bancos, correios, etc. – facto provado nº 27.
- E, o centro do Castelo da Maia localiza-se a cerca de 600 metros, a linha do Metro a cerca de 750 metros e o Instituto Universitário da Maia (ISMAI), a cerca de 1.200 metros – facto provado nº 28.
- A parcela sobrante fica abrangida na sua zona Norte/Poente, numa área de cerca de 6.900 m2, pela servidão non aedificandi constituída pela Rotunda 1 e pelo acesso dessa rotunda ao novo traçado da EN 14 – facto provado nº 29.
- E dispõe de viabilidade construtiva que resulta das suas frentes que mantém, não afetadas, pela servidão, para as Ruas serafim da Cruz e D. Idalina Santos Quelhas – facto provado nº 30.
- Face à dimensão da parcela sobrante, e classificação urbanística, a área de construção que poderia ser realizada na denominada “Zona non aedificandi” transferida em parte para a restante área, com a cércea prevista no PDM de 2 a 4 pisos ou 14 metros, sofre depreciação estimada em 20% – facto provado nº 31.
Ora, muito embora a questão fundamental de direito apreciada num e noutro caso seja idêntica, o que é certo que os acórdãos em confronto se debruçaram sobre casos concretos cujos contornos fácticos são distintos.
Enquanto nos autos estamos perante uma parcela de terreno com capacidade construtiva inserida em solo urbano, no acórdão fundamento estamos perante um solo inserido em Reserva Agrícola Nacional.
Assim, se no âmbito do acórdão-fundamento surge incontestado que a constituição de uma servidão non aedificandi implicou uma diminuição da capacidade construtiva36, já no âmbito do acórdão recorrido tal não sucede.
Efetivamente, no âmbito do acórdão recorrido resultou demonstrado que a constituição de uma servidão non aedificandi não teve qualquer implicação no que à capacidade construtiva diz respeito, sendo que estava em causa apenas uma “deslocação” do local de implantação.
Subscrevendo o teor da sentença dos autos, escreveu o tribunal a quo que “no caso, não existem duvidas que uma área que dispunha da capacidade construtiva, passou a estar onerada com uma servidão non aedificandi mas que não afeta na verdade a capacidade edificativa na parcela sobrante mantendo-se o mesmo índice de construção e cércea legalmente prevista no PDM à data da DUP, as mesmas duas frentes para as duas ruas, sendo certo que, foi considerado pelos Peritos do tribunal, que a redução da área de implantação do(s) prédio(s), que passaria a esta limitada à parte excedente à área da servidão non aedificandi, se afigurava constrangimento suscetível de constituir um prejuízo resultante do ato expropriativo e face a esse constrangimento consideram ocorrer uma depreciação estimada de 20%, de que resulta uma indemnização de €194.679,36” (realce e sublinhado nosso).
Considerou, assim, o tribunal a quo que o constrangimento em crise nos autos resultava, diretamente, do fracionamento e já não da constituição de servidão non aedificandi.
Ora, resulta do exposto que, não só os quadros fácticos considerados nos acórdãos em confronto se nos afiguram distintos, como a medida da diferença foi determinante para o resultado a que se chegou num e noutro caso.
O diferente recorte fáctico considerado nas decisões em confronto é quanto basta para afastar a invocada contradição de julgados.
Concluindo, não se verificando os requisitos da contradição/ oposição de julgados previstos no art. 629º/2/d, do CPCivil, o recurso de revista não deve ser admitido, quanto a esta questão fundamental de direito, pois o acórdão recorrido não está em oposição frontal com o acórdão-fundamento do Tribunal da Relação do Porto, por não resultar que sufragam entendimentos diferentes.
Destarte, não se admite o presente recurso quanto a esta matéria, pelo que, dela não se conhece, por não poder integrar o objeto do presente recurso de revista.
3.) SABER SE SERÁ ADMISSÍVEL RECORRER DE REVISTA PARA ESTE SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA POR HAVER CONTRADIÇÃO JURISPRUDÊNCIAL QUANTO À QUESTÃO DE A VALORIZAÇÃO DA CONSTRUÇÃO DE CAVE DEVER SER ADMITIDA NO CÁLCULO DO VALOR DO SOLO (ART. 629º/2/D, DO CPCIVIL).
A recorrente alegou que “No âmbito da fixação do valor do solo da parcela expropriada 47.1, decidiram as instâncias que ao índice de utilização admitido no PDM para o prédio (0,7) devia ser acrescentado um índice de 0,3 para a construção de estacionamento em cave, pelo qual foi, assim, atribuída indemnização (resultante da multiplicação do referido índice de 0,3 pelo custo de construção de 400,00€/m² e pelos restantes parâmetros adotados para a fixação do valor do solo, ou seja, índice fundiário de 22% e deduções de 10% e de 5% nos termos dos n.ºs 9 e 10 do art.º 26.º), verificando-se, assim, oposição com o decidido, por ex., no ac. do TRP de 8/2/2024, proferido no proc. 6215/18.8T8MAI.P1”.
Assim, concluiu que “Foram, pois, dadas soluções opostas, nos dois acórdãos, à questão de saber se a valorização da construção em cave devia ser admitida no cálculo do valor do solo: no sentido afirmativo segundo o acórdão recorrido, no sentido negativo segundo o acórdão-fundamento”.
Vejamos a questão.
Quadro fáctico
O acórdão fundamento deu como provado que:
- Por despacho do Secretário de Estado das Infraestruturas de 11/1/2018 publicado no Diário da República nº 22, de 31/1/2018, 2ª série, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, da expropriação da parcela nº 27, necessária à construção da obra da EN 14 – Maia (Nó do Jumbo)/Via Diagonal – facto provado nº 8.
- A parcela tem a área de 681m2, confronta do Norte, do Sul e do Poente
com estrada (a Rua da Fonte Cova) e do Nascente com a parte restante do prédio – facto provado nº 9.
O acórdão recorrido deu como provado que:
- Todavia, face ao referido PDM e correspondente Planta de Ordenamento / Programação e Execução, a área do prédio abrangida pela parcela 47.1. integra-se na “Unidade Operativa de Planeamento e Gestão [UOPG] 2.10 – Área de Expansão a Nascente da Rua Dona Idalina Santos Quelhas”, à qual corresponde a qualificação operacional de Solo Urbanizável, sujeito por isso a um índice de utilização máximo de 0,7, e construção em altura da fachada de 2 a 4 pisos ou 14 metros – facto provado nº 21.
- O identificado Regulamento do PDM impõe ainda a construção de construção de lugares de estacionamento - 1,5 lugar de estacionamento por cada 120 m2 de superfície bruta de construção afeta a habitação, no caso de desconhecida a dimensão dos fogos – facto provado nº 22.
- Considerando a área expropriada da parcela 47.1, há a necessidade de construir 75 lugares (8.555 m2 x 0,7 m2/m2 ÷ 120 m2 x 1,5 lugar = 75 lugares) correspondente a cerca de 1/3 da área de construção acima do solo, ou seja, de 8.555 m2 x 0,7 m2/m2 ÷ 3= 1.996 m2 – facto provado nº 23.
Ora, compulsados os acórdãos em confronto, constata-se, com facilidade, que, não só os mesmos se pronunciaram sobre a mesma questão fundamental de direito, como o fizeram por apelo a quadros fáctico-normativos idênticos.
É quanto basta para concluir pela invocada contradição de julgados, pelo que deve o presente recurso de revista ser admitido nesta parte.
Concluindo, verificando-se os requisitos da contradição/ oposição de julgados previstos no art. 629º/2/d, do CPCivil, o recurso de revista deve ser admitido nesta parte, pois o acórdão recorrido está em oposição frontal com o acórdão-fundamento do Tribunal da Relação do Porto.
Destarte, admite-se o presente recurso quanto a esta matéria, integrando a mesma o objeto do presente recurso de revista.
4.) SABER SE SERÁ ADMISSÍVEL RECORRER DE REVISTA PARA ESTE SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA POR HAVER CONTRADIÇÃO JURISPRUDENCIAL QUANTO À QUESTÃO REFERENTE AOS CRITÉRIOS LEGAIS A OBSERVAR PARA APURAR O CUSTO DE CONSTRUÇÃO (ART. 629º/2/D, DO CPCIVIL).
A recorrente alegou que “as instâncias interpretaram o disposto no art. 26º/5 do CExpropriações, como sendo os valores aí previstos meramente supletivos, verificando-se, assim, oposição com o decidido, por ex., no ac. do TRC de 8/10/2019, proferido no proc. 32/10.0TBSJP.C3”.
Assim, concluiu que “a questão em causa mereceu respostas diferentes no acórdão recorrido e no acórdão-fundamento”.
Vejamos a questão.
Entende a recorrente que o custo de construção deve ser determinado, preferencialmente, por apelo aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada, sendo que, apenas excecionalmente e quando esteja em causa a justeza da indemnização a atribuir, será de lançar mão de outros critérios.
Analisadas as decisões em confronto, é manifesto que não se descortina qualquer divergência de entendimento.
De facto, os arestos em confronto propugnaram o mesmo exato entendimento, ou seja, consideraram ambos que o recurso a outros critérios – que não a aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada - deve ocorrer de forma excecional e em face das circunstâncias do caso concreto.
Entendeu-se, pois, no acórdão recorrido que “Neste âmbito deve pois considerar-se, como expressamente decorre do citado nº5 do art.º 26º do CE que o regime de renda condicionada e de habitação a custos controlados servem como mero referencial para o custo de construção, afastando-se a tese de que estamos perante um critério imperativo e rígido que deve ser adotado para apurar o valor do custo de construção”.
Por seu turno, considerou o acórdão fundamento que “Sendo que, nos termos do nº 5, na determinação do custo de construção atende-se, como referencial, aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada. Sendo estes montantes referenciais valem aqui as observações supra expostas. Ou seja, apenas se eles não forem suficientes para atingir o valor de mercado do bem é que podem/devem ser complementados ou substituídos por outros critérios; e não podendo ser liminarmente postergados na avaliação sem que cabal motivo justificativo para tal aduzido”.
O que sucedeu foi que, no âmbito do acórdão fundamento, se concluiu que inexistiam elementos para justificar o afastamento dos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada, não se tendo sequer chegado a equacionar a factualidade dada como assente.
A pronúncia sobre a concreta sobre a factualidade dada como provada não se verificou e, a ter ocorrido, foi implícita, o que não se mostra suficiente para a afirmação da contradição de julgados.
Por seu turno, concluiu o acórdão recorrido que esse afastamento se encontrava cabalmente justificado em sede de relatório pericial, tendo em especial consideração as “características da parcela, da sua envolvente, a boa localização, boa qualidade ambiental e proximidade com equipamentos sociais (…) justificava a adoção de tal percentagem”, não tendo o acórdão fundamento tecido quaisquer considerações sobre a factualidade ali apurada.
Concluindo, não se verificando os requisitos da contradição/ oposição de julgados previstos no art. 629º/2/d, do CPCivil, o recurso de revista não deve ser admitido, quanto a esta questão fundamental de direito, pois o acórdão recorrido não está em oposição frontal com o acórdão-fundamento do Tribunal da Relação de Coimbra, por não resultar que sufragam entendimentos diferentes.
Destarte, não se admite o presente recurso quanto a esta matéria, pelo que, dela não se conhece, por não poder integrar o objeto do presente recurso de revista.
1) Por despacho n.º 1132/2018 do Secretário de Estado das Infraestruturas, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 22, de 31/01/2018, foi declarada a utilidade pública urgente da expropriação de diversas parcelas, necessárias à realização da obra da “EN 14 – Maia (Nó do Jumbo/Via Diagonal)”.
2) De entre as parcelas referidas no despacho identificado em 1), constam duas parcelas a que foi atribuído os números 47.1 e 47.2.
3) Sendo ambas as parcelas a destacar do prédio rústico situado no lugar de Calquim, freguesia de Castêlo da Maia, concelho da Maia, com área de 30.420 m2, descrito na 1.ª Conservatória do Registo Predial da Maia sob o n.º ...3/Avioso (Santa Maria) e inscrito na matriz rústica daquela freguesia sob o artigo ...7º, que se encontra registado a favor dos expropriados Recorrentes em comum e sem determinação de parte ou direito por sucessão hereditária de AA, pela ap....2 de 1989/07/17.
4) O prédio referido em 3) encontra-se dividido pela Rua de Avioso a qual se desenvolve na direção Norte/Sul,
5) A sub-parcela 47.1 é destacada da área que se situa a Poente da Rua de Avioso.
6) A sub-parcela 47.2 localiza-se a Nascente da Rua de Avioso.
7) A sub parcela n.º 47.1 tem a área de 8.555m2, é retangular mas arredondada a norte e poente, e confrontava do Norte com a Via Diagonal, do Sul com a parte restante do prédio referido em 2), do Nascente com a Rua do Avioso e do Poente com a parte restante do prédio referido em 2).
8) Aquando da vistoria ad perpetuam rei memoriam, a sub parcela 47.1 estava cultivada com azevém, era plana e bem irrigada e murada.
9) A parcela n.º 47.2 com a área de 583m2, com forma triangulada, confronta do Norte com a Via Diagonal, do Sul com Ponta Aguda, do Nascente com LL e do Poente com Rua do Avioso.
10) Aquando da vistoria ad perpetuam rei memoriam, a parcela n.º 47.2 encontrava-se com silvedo e rebentos de plátanos.
11) A área do prédio de onde é destacada a sub parcela 47.1 confronta atualmente do Norte com a Via Diagonal, do Sul com a Rua Serafim Cruz, do Nascente com a Rua de Avioso e do Poente com a Rua D. Idalina Santos Quelhas,
12) O Instrumento de Gestão Territorial eficaz para a localização das parcelas, à data da DUP, era o Plano Diretor Municipal do concelho da Maia cuja alteração/revisão do seu Regulamento foi aprovada e foi republicado no Diário da República, 2ªsérie, nº 145, de 30 de julho, em anexo ao Aviso nº 9751/2013.
13) Face ao Plano Diretor Municipal da Maia (adiante designado por PDM da Maia), a área do prédio abrangido pela parcela 47.1 estava inserida em Solo Urbano, na categoria de “Área de Habitação Coletiva – HC1”, na qual o índice pode variar entre 0,4 m2/m2 até 1m2/m2 e essas áreas de habitação coletiva dividem-se em função da altura da fachada, que para a categoria HC1 vai de 2 a 4 pisos ou 14 metros.
14) O prédio objeto de expropriação de onde a parcela 47.1 é destacada é marginado em todo o seu perímetro por vias publicas infraestruturadas, não ocupado, que é envolvido por construção, exceto a Nascente, zona objeto de expropriação para o novo traçado da EN 14.
15) A envolvente imediata da parcela e do prédio de onde a mesma é destacada, situam -se num quarteirão caracterizado predominantemente por construções.
16) Na Rua de Avioso, a Nascente, e a Via Diagonal, a Norte, constata-se a existência de dois prédios de construção multifamiliar em altura com rés-do-chão e seis andares acima da cota de soleira.
17) Do outro lado, a Poente, a Rua D. Idalina Santos Quelhas, na margem oposta, encontra-se a Escola Secundária do Castelo da Mala.
18) E ainda, a Sul do prédio, na Rua Serafim da Cruz é visível a construção de dois edifícios em altura de rés-do-chão e três andares e rés-do-chão e quatro andares acima do solo mesmo em frente do prédio de onde a parcela e desanexada e algumas moradias de construção nova.
19) Constituindo uma área de terreno infraestruturada em todo o seu perímetro e não ocupado, com a construção atrás caracterizada nas margens oposta dos arruamentos que o marginam e situado defronte de solos classificados em HC2.
20) E uma zona de construção consolidada, inserida em área de tecido urbano onde se pretende intensificar usos urbanos com recurso a edifícios multifamiliares.
21) Todavia, face ao referido PDM e correspondente Planta de Ordenamento / Programação e Execução, a área do prédio abrangida pela parcela 47.1. integra-se na “Unidade Operativa de Planeamento e Gestão [UOPG] 2.10 – Área de Expansão a Nascente da Rua Dona Idalina Santos Quelhas”, à qual corresponde a qualificação operacional de Solo Urbanizável, sujeito por isso a um índice de utilização máximo de 0,7, e construção em altura da fachada de 2 a 4 pisos ou 14 metros.
22) O identificado Regulamento do PDM impõe ainda a construção de construção de lugares de estacionamento - 1,5 lugar de estacionamento por cada 120 m2 de superfície bruta de construção afeta a habitação, no caso de desconhecida a dimensão dos fogos.
23) Considerando a área expropriada da parcela 47.1, há a necessidade de construir 75 lugares (8.555 m2 x 0,7 m2/m2 ÷ 120 m2 x 1,5 lugar = 75 lugares) correspondente a cerca de 1/3 da área de construção acima do solo, ou seja, de 8.555 m2 x 0,7 m2/m2 ÷ 3= 1.996 m2.
24) A expropriação dessa sub parcela 47.1 origina uma área sobrante de 21.282 m2, que se localiza a Sul e a Poente dessa área.
25) Esta área sobrante mantém frentes para as vias que já marginavam a área de onde é destacada a sub-parcela 47.1, ou seja, do Norte para a Via Diagonal, do Sul para a Rua Serafim da Cruz, do Nascente para a Rua de Avioso e do Poente para a Rua D. Idalina Santos Quelhas,
26) Passando, no entanto, a ser marginada em parte da sua extensão a Nascente e parte da extensão a Norte, pelo ramal de acesso que liga a Rotunda 1, realizada sobre a Via Diagonal, à nova EN 14.
27) O prédio sobrante e a sub parcela 47.1 situam-se em zona que confronta a Norte, a Sul e a Poente com malha urbana consolidada e em consolidação, onde existem construções em propriedade horizontal, moradias, escolas, centro de saúde, clínicas, farmácias, bancos, correios, etc.
28) E, o centro do Castelo da Maia localiza-se a cerca de 600 metros, a linha do Metro a cerca de 750 metros e o Instituto Universitário da Maia (ISMAI), a cerca de 1.200 metros.
29) A parcela sobrante fica abrangida na sua zona Norte/Poente, numa área de cerca de 6.900 m2, pela servidão non aedificandi constituída pela Rotunda 1 e pelo acesso dessa rotunda ao novo traçado da EN 14.
30) E dispõe de viabilidade construtiva que resulta das suas frentes que mantém, não afetadas, pela servidão, para as Ruas serafim da Cruz e D. Idalina Santos Quelhas.
31) Face à dimensão da parcela sobrante, e classificação urbanística, a área de construção que poderia ser realizada na denominada “Zona non aedificandi” transferida em parte para a restante área, com a cércea prevista no PDM de 2 a 4 pisos ou 14 metros, sofre depreciação estimada em 20%.
32) Na inspeção colegial ao local observou-se que a obra que deu lugar a expropriação estava executada.
33) A Rua D. Idalina Santos Quelhas, que separa a Poente o prédio objeto de expropriação do agrupamento de Escolas do Castelo da Maia, constitui um acesso rodoviário pavimentado a betuminoso, com perfil transversal de cerca de 6 metros ao qual acresce uma baía de estacionamento com cerca 8 metros, dotada de passeios, dispondo de redes de abastecimento domiciliário de água, energia elétrica e telefónica, bem de redes de drenagem de saneamento com ligação à estação depuradora e de águas pluviais.
34) As ruas de Avioso e Serafim da Cruz, são acessos rodoviários pavimentados com calçada a fiada, com perfil transversal com cerca de 6 metros de largura e dotadas de infraestruturas urbanísticas de abastecimento de água, energia elétrica e telefónica, de redes de drenagem de águas residuais com ligação à estação depuradora e de águas pluviais.
35) A Via Diagonal constitui um acesso rodoviário pavimentado a betuminoso com perfil transversão de 10 metros e passeios, dispondo de redes de abastecimento domiciliário de água, energia elétrica e telefónica, bem de redes de drenagem de saneamento com ligação à estação depuradora e de águas pluviais.
36) Da vistoria ad perpetuam rei memoriam consta que, na parcela 47.1. terá destruído um muro de granito, bem aparelhado, em bom estado de conservação geral, com altura de 1 metro à vista, espessura de 25 cm e na extensão de 170 metros.
37) Segundo o supra identificado PDM da Maia e Planta de ordenamento, à data da DUP, a parcela 47.2 encontra-se inserida em Solo Rural, na categoria de “Espaços Agrícolas” e na subcategoria de “Áreas Agrícolas Fundamentais”.
38) A parcela 47.2 encontra-se, na Planta de condicionantes, do PDM, à data da DUP, integrava área abrangida pela Reserva Agrícola Nacional (R.A.N.)
39) A sub parcela 47.2 constava já classificada em RAN na revisão do PDM da Maia, publicado em Diário da República, Aviso 2383/2009, 2º Serie, nº 17, em 26 de janeiro de 2009.
40) Atendendo à localização, a parcela 47.2., desde 2000, estava classificada como Classe A1, Unidades de Terra com aptidão levada para uso agrícola genérico na Carta de Solos e Aptidão da terra, propriedade da ex- Direção Regional de Agricultura de Entre o Douro e Minho (DRAEDM).
41) Conforme planta de ordenamento- Qualificação Funcional do Solo do PDM da Maia, à data da DUP, para a via prevista- Variante EN 14 – estava definido o espaço canal, mas sem implantação definida.
42) A parcela 47.2. é fértil, tem abundância de água, morfologia, altimetria, condições de acesso, constituição geológica e outras e encontra-se a uma curta distância dos centros de consumo, considerando-se as culturas de batata e couve penca.
43) A parcela 47.2 e o prédio do qual é destacada confrontam com vias públicas pavimentadas dotadas com infraestruturas e num raio de 300 metros existem construções habitacionais (habitação coletiva e habitação unifamiliar), equipamento escolar e áreas verdes de enquadramento.
44) A EN 14 integrava o Plano Rodoviário Nacional aprovado pelo Decreto-Lei n.º 222/98 de 17 de julho.
2.2. FACTOS NÃO PROVADOS NA 1ª E 2ª INSTÂNCIA
a) A construção da via que motiva a expropriação estava prevista no PDM objeto de aprovação pela Assembleia Municipal da Maia em 20 de dezembro de 1993, ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 33/94 (D.R. Ia Série-B, n.º 114 de 17 de maio de 1994) e o traçado da via prevista estava demarcado na planta de ordenamento.
b) Do Estudo de Impacte Ambiental da Variante EN 14 - Maia (Nó do Jumbo) /Famalicão (Nó da Cruz do IP1/A3) – Estudo Prévio, de 2 de Junho de 2010, no item 3 “Antecedentes” retira-se que, "Os estudos iniciais referentes ao projeto de uma variante à atual EN 14, nos concelhos da Maia, Trofa, Santo Tirso e Famalicão, datam de há mais de uma década, tendo, a pedido da extinta Junta Autónoma de Estradas (JAE), em 1992 e em 1995, sido desenvolvidos Estudos Prévios para variantes à EN 14 quer na área do concelho da Trofa (Variante à Trofa) quer no de Vila Nova de Famalicão (Variante de Famalicão entre o IC5/A7 e o nó da Cruz da A3),...".
c) A previsão em plano da construção da via Variante à EN14 - condicionou o aproveitamento urbanístico do prédio de onde foi destacada a parcela 47.2. e se não fosse a previsão da via, o prédio seria, à data da DUP, destinado à construção.
d) A variante à EN14 integrava o Plano Rodoviário Nacional aprovado pelo Decreto-Lei n.º 222/98 de 17 de julho.
2.3. O DIREITO
Importa conhecer o objeto do recurso, circunscrito pelas respetivas conclusões, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e as que sejam de conhecimento oficioso37 (não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objeto).
5.) SABER SE ESTE TRIBUNAL AD QUEM DEVERÁ CONHECER DA ARGUIDA NULIDADE DO ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRIBUNAL A QUO POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA.
A recorrente alegou que “salvaguardando-se a eventualidade de se entender que a Relação não chegou a pronunciar-se expressamente sobre a questão suscitada no recurso (nas referidas conclusões 24.ª a 26.ª da apelação da expropriante), verifica-se então, a nulidade do acórdão, por omissão de pronúncia, nos termos do disposto nos artigos 666.º, n.º 1 e 615.º, n.º 1, al. d) e n.º 4 do CPC, já que, nos termos do art.º 608.º, n.º 2, aplicável por força do disposto no art.º 663.º, n.º 2, constituía dever do Tribunal a quo apreciar e decidir a questão submetida à sua decisão (a desconsideração, na decisão sobre a atualização, do montante de 642.561,23€ disponibilizado aos expropriados na fase inicial do processo, contra o citado acórdão uniformizador)”.
Assim, concluiu que “a procedência da nulidade acarreta que se ordene a baixa do processo à Relação, a fim de se reformar a decisão, nos termos do art.º 684.º, n.º 2 do CPC”.
Vejamos a questão.
É nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento – art. 615º/1/d ex vi do art. 666º/1, ambos do CPCivil.
As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades – art. 615º/4 ex vi do art. 666º/1, ambos do CPCivil.
Arguida perante o juiz que proferiu a sentença alguma nulidade, nos termos da primeira parte do n.º 4 do artigo 615.º, ou deduzido pedido de reforma da sentença, por dela não caber recurso ordinário, o juiz profere decisão definitiva sobre a questão suscitada; porém, no caso a que se refere o n.º 2 do artigo anterior, a parte prejudicada com a alteração da decisão pode recorrer, mesmo que a causa esteja compreendida na alçada do tribunal, não suspendendo o recurso a exequibilidade da sentença – art. 617º/6 ex vi do art. 666º/1, ambos do CPCivil.
A omissão de pronúncia constitui uma nulidade da decisão judicial prevista no art. 615°/1/d, do CPCivil, quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que deva apreciar (incumprimento do dever prescrito no art. 608°/2, do CPCivil)38,39,40,41,42.
As nulidades decisórias apenas podem ser suscitadas perante o tribunal que proferiu a decisão nos casos em que esta não admita recurso, já que, na situação inversa, deverão ser incluídas nas alegações do recurso de apelação43.
No caso sub judice, como se entendeu, não tendo o tribunal a quo decidido contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça, não se verifica a previsão normativa contida no art. 629º/2/c, do CPCivil, pelo que, não se admitiu o recurso quanto a esta matéria, não integrando a mesma o seu objeto.
Assim, a invocada nulidade por omissão de pronúncia, por estar relacionada com questão de direito que não será apreciada por este Supremo Tribunal de Justiça, deverá ser, oportunamente, apreciada pelo Tribunal da Relação.
Com efeito, esta nulidade constitui um fundamento acessório do recurso de revista, na parte em que o mesmo não foi admitido, pelo que deve ser, em exclusivo, apreciada pelo Tribunal da Relação.
Assim, não sendo admissível recurso ordinário, aquela nulidade terá de ser conhecida pelo Tribunal a quo, isto é, aquele que proferiu a decisão (arts. 615º/4/1ª parte e 617º/6, ambos do CPCivil).
Concluindo, não sendo admissível recurso de revista quanto à questão suscitada, a nulidade por omissão de pronuncia e imputada ao acórdão recorrido, terá de ser conhecida pelo Tribunal da Relação44,45,46.
6.) SABER SE A VALORIZAÇÃO DECORRENTE DA POSSIBILIDADE DE CONSTRUÇÃO DE CAVE PARA ESTACIONAMENTO DEVE SER ADMITIDA NO CÁLCULO DO VALOR DO SOLO.
A recorrente alegou que “constitui um equívoco dizer-se que a valorização da construção em cave para estacionamento deve ser admitida no cálculo do valor do solo, por ter uma «repercussão positiva no valor final do edificado»”.
Mais alegou que “a valorização da construção em cave seria sempre incorreta e nunca poderia ser acolhida, já que a determinação da capacidade construtiva, para efeitos de avaliação, é obtida apenas através da potencialidade construtiva acima do solo”.
Assim, concluiu que “a construção da cave não deve ser considerada na avaliação do imóvel”.
Vejamos a questão.
A requisição e a expropriação por utilidade pública só podem ser efetuadas com base na lei e mediante o pagamento de justa indemnização – art. 62º/2, da Constituição da República Portuguesa.
A justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efetivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data – art. 23º/1, do Código das Expropriações.
Para efeitos do cálculo da indemnização por expropriação, o solo classifica-se em solo apto para a construção e, solo para outros fins – art. 25º/1/a/b, do Código das Expropriações. 1 - O valor do solo apto para a construção calcula-se por referência à construção que nele seria possível efetuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento económico normal, de acordo com as leis e os regulamentos em vigor, nos termos dos números seguintes e sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 23.º – art. 26º/1, do Código das Expropriações.
Num aproveitamento economicamente normal, o valor do solo apto para a construção deverá corresponder a um máximo de 15% do custo da construção, devidamente fundamentado, variando, nomeadamente, em função da localização, da qualidade ambiental e dos equipamentos existentes na zona, sem prejuízo do disposto no número seguinte – art. 26º/6, do Código das Expropriações.
O art. 62º/2, da Constituição da República Portuguesa, confere aos poderes públicos o poder expropriatório, autorizando-os a procederem à privação da propriedade ou de outras situações patrimoniais dos administrados; por outro lado, reconhece ao cidadão um sistema de garantias que inclui designadamente os princípios da legalidade, da utilidade pública e da indemnização. Valem, aqui, inteiramente, os princípios constitucionais relativos à restrição de direitos fundamentais, nomeadamente o princípio da necessidade e da proporcionalidade. O recurso à expropriação só deve ter lugar quando se gorar a aquisição por via negocial, que deve ser previamente explorada, salvo porventura em caso de urgência excecional47.
É certo que, determinando a Constituição que a indemnização há de ser «justa», ela não estabelece, porém, qualquer critério indemnizatório («valor venal», «valor de mercado», «valor real», etc); mas é evidente que os critérios definidos em lei têm de respeitar os princípios materiais da Constituição (igualdade, proporcionalidade), não podendo conduzir a indemnizações irrisórias ou manifestamente desproporcionais em relação à perda do bem requisitado ou expropriado. Por outro lado, a justa indemnização deve respeitar o princípio da equivalência de valores, expulsando desta equivalência valores especulativos ou ficcionados, decisivamente perturbadores da «justa medida» que deve existir entre as consequências da expropriação e a sua indemnização48.
Temos, pois, que o direito de propriedade privada não se mostra consagrado na nossa Constituição em termos absolutos, sendo garantido nos termos da Lei Fundamental; quer isto dizer que pode aquele direito limitado ou restringido.
Ora, a possibilidade de requisição e expropriação por utilidade pública é reflexo da natureza relativa do direito de propriedade, na medida em que, por via do recurso a tais figuras, o direito de propriedade privada pode ser sacrificando em função de um interesse público.
Como é evidente, este sacrifício encontra legitimação na ideia de justa indemnização, que garante aos particulares, que se vejam privados da sua propriedade, uma compensação justa por tal ato ablativo.
Sobre a justa indemnização o Tribunal Constitucional tem consolidado o entendimento de que “tal indemnização tem como medida o prejuízo que para o expropriado resulta da expropriação”, na sintética, mas rigorosa, formulação do Acórdão n.º 52/90. Pondo de lado fatores especulativos, muitas vezes artificialmente criados (Acórdão n.º 381/89), a “justa indemnização” há de tomar como ponto de referência o valor adequado que permita ressarcir o expropriado da perda do bem que lhe pertencia, com respeito pelo “princípio da equivalência de valores”, como se extrata do Acórdão n.º 11/2008. O princípio da justa indemnização impõe uma compensação integral, tendencialmente correspondente ao valor venal do bem, de acordo com a sua cotação no mercado. A função da indemnização é a de fazer entrar, na esfera do atingido, o equivalente pecuniário do bem expropriado, de tal modo que, efetuada a expropriação, o seu património ativo muda de composição, mas não diminui de valor”49,50.
O Supremo Tribunal de Justiça propugna entendimento coincidente, considerando, em suma, que se tem “«entendido que a justa indemnização por imperativo constitucional (artigo 62.º n.º 2 da C.R.P.) visa «ressarcir o prejuízo que advém para o expropriado correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efetivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em conta as circunstâncias e condições de facto existentes», nunca podendo ser determinada de forma abstrata, mas em face das características do bem a avaliar, de modo a permitirem tratar de forma igual o que é igual e de forma diferente o que é desigual, permitindo, assim, que os expropriados recebam o equivalente ao que conseguiriam obter pelo seu bem (aquele concreto bem), não fora a expropriação”51.
O dano patrimonial suportado pelo expropriado é ressarcido de uma forma integral e justa, se a indemnização corresponder ao valor comum do bem expropriado, ou, por outras palavras, ao respetivo valor de mercado ou ainda ao seu valor de compra e venda. Este critério do «valor venal» ou do «justo preço», isto é a quantia que teria sido paga pelo bem expropriado se tivesse sido objeto de um livre contrato de compra e venda, ê seguido pela quase generalidade dos ordenamentos jurídicos52,53.
Resulta, assim, que apenas o critério do valor real em condições de mercado assegura a garantia do direito a uma justa indemnização54.
O mesmo é dizer: ao expropriado deve ser garantido o direito a uma indemnização que corresponda a uma efetiva compensação pela perda de um bem, devendo ser aquela indemnização o equivalente pecuniário do bem expropriado, respeitando sempre os princípios da igualdade e da proporcionalidade.
Este critério do valor de mercado, correspondente ao valor que o expropriado obteria no mercado pelo bem, é essencial para a solução a propugnar nos autos.
As instâncias consideraram que “Para além da previsão de lugares de estacionamento no referido artigo 51º do Regulamento do PDM, adiantamos que a obrigatoriedade de previsão de garagens para estacionamentos resulta do Decreto-Lei nº 555/99 de 16 de Dezembro na redação que lhe foi conferida pela Lei nº 60/2007, de 4 de Setembro e da Portaria nº 216-B/2008 de 3 de Março. Por definição o índice de construção bruto refere-se apenas à área bruta de construção destinada a habitação excluindo as áreas relativas a caves e sótãos quando destinadas a garagens e arrumos. (…). Quer isso dizer que a capacidade construtiva limitada no PDM se reporta à construção para a habitação acima do solo excluindo as garagens e arrumos em cave. (…) E seguindo esse acórdão pela pertinência dos seus argumentos, com que concordamos, reproduzimos parcialmente o seguinte: Os encargos associados à construção das caves são, do ponto de vista da lógica avaliativa, equiparados aos encargos com a construção da habitação. De facto, existindo em qualquer dos casos, têm uma repercussão positiva no valor final do edificado. Situação diferente dos encargos previstos no nº 8 do artigo 26º do C.E. que se reporta a custos não habituais relacionados com as condições específicas do local. Percebe-se bem a diferença para os normais encargos com a construção de caves para garagens e arrumos que, para além de, no caso, não serem excecionais, promovem uma unanimemente reconhecida mais valia”(…) “O PDM define como área bruta de construção (ab) o somatório de todas as áreas de pavimentos a construir acima e abaixo da cota de soleira, com exceção das áreas em cave destinadas a estacionamento. Assim para além da área de habitação, é possível construir os referidos espaços. O valor do solo da parcela foi, portanto, calculado considerando a construção que nele seria possível efetuar. (…) No presente caso considerou-se que a construção para a habitação fosse apenas efetuada acima da cota da soleira, sendo as garagens e arrumos construídas abaixo da referida cota. Ora, tendo os peritos do tribunal, pelas razões pelos mesmos citadas, considerado um índice de construção médio bruto de 0,7 para a construção acima do solo, resulta óbvio que a cave e/e ou o sótão corresponda a 0,3 de construção que acresce ao índice previsto para os pisos de habitação acima do solo. Ou seja, diremos então como ali se diz que, “a opção dos peritos, perante a possibilidade de construção de caves, destinadas a estacionamento, abaixo da cota da soleira, conferida pelo aludido PDM, confirma as regras da experiência e do senso comum, pois que é consabido que a construção que tenha estacionamento automóvel - maxime em cave, já que aqui os veículos ficam mais seguros e a salvo das intempéries, bem como se torna mais cómoda para os seus donos - é muito mais valorizada no comércio imobiliário. Valorização esta que, salvo casos excecionais, nos quais não se demonstra ou sequer indicia estar o presente incluído, sobreleva os custos de tal construção. Nesta conformidade se concluindo que tal tipo de construção se mostra um efetivo, ou, pelo menos, muito provável, fator de valorização da parcela e, como tal, deve ser considerado. (vide no mesmo sentido o Ac. Rel. Porto, de 16.9.2008, Proc.0822734, indicado sítio. (sublinhado nosso). Nesse sentido, a posição do laudo maioritário supra exposta, que teve a concordância do perito dos expropriados, mostra-se correta e ajustada.” Perante o acabado de referir, nenhuns outros argumentos cabe acrescentar, impondo-se dizer, em conclusão, o seguinte: Constitui regra do senso comum que a existência de aparcamento coberto, de anexos ou de arrumos (afetações normais para esses espaços abaixo do solo) valorizam o imóvel, influenciando naturalmente a sua transação no mercado. Todos sabemos que principalmente nos centros urbanos das grandes cidades, fruto da forte pressão urbanística que atualmente existe e, bem assim, a insuficiência de espaços livres para parqueamento exterior, salvo com pagamento, ser cada vez mais valorizado um terreno em função da sua capacidade construtiva, sendo que nesta, não será estranha a possibilidade de construção no subsolo, tanto de habitação, loja, garagens ou arrumos, funcionando para cada caso percentagens diferentes. Nestes casos, é da mais elementar justiça considerar que tal construção deve ser tida em conta para efeitos de avaliação do terreno em causa”.
Está provado que:
- O identificado Regulamento do PDM impõe ainda a construção de construção de lugares de estacionamento - 1,5 lugar de estacionamento por cada 120 m2 de superfície bruta de construção afeta a habitação, no caso de desconhecida a dimensão dos fogos – facto provado nº 22.
- Considerando a área expropriada da parcela 47.1, há a necessidade de construir 75 lugares (8.555 m2 x 0,7 m2/m2 ÷ 120 m2 x 1,5 lugar = 75 lugares) correspondente a cerca de 1/3 da área de construção acima do solo, ou seja, de 8.555 m2 x 0,7 m2/m2 ÷ 3= 1.996 m2 – facto provado nº 23.
Ora, em face dos dados, subscrevemos a posição assumida pelas instâncias, pois, como é evidente, não se encontra em discussão a possibilidade de construção de estacionamento à superfície, matéria que não se encontra em parte alguma negada pelas instâncias.
O que ali se afirmou foi que a possibilidade de construção de cave para estacionamento abaixo do solo não podia deixar de relevar para o cálculo do valor do solo.
Tal conclusão, para além de razoável, afigura-se-nos incontestável.
Efetivamente, em condições normais de mercado, a possibilidade de construção de cave para estacionamento ou arrumos assume, no contexto de venda a valores de mercado, uma importância que não pode deixar de se repercutir na valorização do solo, na medida em que qualquer construção que ali seja realizada com aproveitamento do subsolo terá um valor acrescido por esse motivo.
Um imóvel com estacionamento em cave coberta não tem o mesmo valor que um imóvel com estacionamento à superfície.
Como salientaram, e bem, as instâncias, é consensual que a existência de estacionamento coberto valoriza o imóvel a construir, sendo evidente que a circunstância de tal construção no subsolo não relevar para efeitos de cálculo da área bruta de construção máxima implica que seja uma solução apetecível para quem vise adquirir aquele terreno.
Por outro lado, não é possível ignorar que a construção de estacionamento à superfície implica a ocupação de cerca de 2000 m2, o que equivale a 1/3 da área disponível para construção em superfície, inviabilizando, como é evidente, a ocupação de tal área disponível por mais área de construção, disponibilização de outros equipamentos, espaços verdes ou outras zonas de lazer.
Isto vale por dizer que a construção de cave, para além de se repercutir de forma favorável no valor do imóvel a construir, tem a virtualidade de não esgotar 1/3 da área bruta máxima a considerar, o que torna tal opção, não só possível, como a mais provável.
Sabendo-se que o valor do solo se calcula por referência à construção que nele seria possível efetuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, vemos como incontornável a consideração da possibilidade de construção de cave para a aferição do valor do solo a indemnizar ao expropriado.
Resulta, assim, que sendo possível o aproveitamento do subsolo, essa possibilidade não pode deixar de ter relevância na aferição do valor da parcela a expropriar, pelo que, consideramos que o presente recurso não pode deixar de improceder.
7.) SABER SE DEVE CONCEDER-SE À RECORRENTE A DISPENSA DO PAGAMENTO DO REMANESCENTE RELATIVAMENTE AO RECURSO DA DECISÃO ARBITRAL INTERPOSTO PELOS EXPROPRIADOS, AO RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO PELA EXPROPRIANTE E AO PRESENTE RECURSO.
A recorrente alegou que “No que diz respeito à complexidade da causa, a atividade desenvolvida no processo não reflete o valor elevado do processo e a taxa de justiça fixada na tabela unicamente em função desse valor”.
Mais alegou que “As questões discutidas e decididas no presente processo, ainda que não possam considerar-se extremamente simples, são, basicamente, as questões típicas de um comum processo de expropriação, frequentemente tratadas nos tribunais, existindo relativamente a elas abundante jurisprudência”.
Assim, requereu “nos termos do art.º 6.º, n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais, a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, quer relativamente ao processo, quer relativamente ao recurso de apelação interposto pela expropriante, quer, por fim, ao presente recurso de revista”.
Vejamos a questão.
Para efeitos do presente Regulamento, considera-se como processo autónomo cada ação, execução, incidente, procedimento cautelar ou recurso, corram ou não por apenso, desde que o mesmo possa dar origem a uma tributação própria – art. 1º/2, do Regulamento das Custas Processuais.
Nas causas de valor superior a 275 000€, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de
forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento – art. 6º/7, do Regulamento das Custas Processuais.
Quando o incidente ou procedimento revistam especial complexidade, o juiz pode determinar, a final, o pagamento de um valor superior, dentro dos limites estabelecidos na tabela ii – art. 7º/7, do Regulamento das Custas Processuais.
Para efeitos de condenação no pagamento de taxa de justiça, consideram-se de especial complexidade as ações e os procedimentos cautelares que contenham articulados ou alegações prolixas; digam respeito a questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso, ou, impliquem a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas – art. 530º/7/a/b/c, do CPCivil.
O valor da taxa de justiça deixou de ser fixado com base numa mera correspondência face ao valor da ação, estabelecendo-se, agora, «um sistema misto que assenta no valor da ação, até um certo limite máximo, e na possibilidade de correção da taxa de justiça quando se trate de processos especialmente complexos, independentemente do valor económico atribuído à causa»55.
Ficou assim, consagrada legalmente «a possibilidade de intervenção do juiz no sentido da correção, a final, dos montantes da taxa de justiça, quando da sua fixação unicamente em função do valor da causa resultem valores excessivos e desadequados à natureza e complexidade da causa»56,57,58.
No domínio das custas judiciais, a lei distingue e trata diferenciadamente os procedimentos com maior complexidade (tributando os especialmente complexos com taxa agravada ou excecional), os procedimentos de normal complexidade (aplicando-lhes a taxa em função dela e do valor, já refletida e fixada como regra nas tabelas e presumidamente considerada pelo legislador como seu equilibrado correspetivo) e os procedimentos de menor complexidade relativa (possibilitando a dispensa ou a redução dessa taxa, em concretas e atendíveis circunstâncias específicas, quando o valor do serviço nestas prestado em cotejo com o do suposto naquela se revelar injustamente desproporcionado).
A dispensa do remanescente da taxa de justiça, tem natureza excecional, pressupõe uma menor complexidade da causa e uma simplificação da tramitação processual aferida pela especificidade da situação processual e pela conduta das partes59,60,61,62,63,64, 65,66.
Mesmo nas causas de valor superior a 275 000,00€, a regra continua a ser o pagamento integral da taxa de justiça resultante da aplicação dos critérios legais, assumindo natureza excecional a dispensa, pelo juiz, de pagamento do remanescente da taxa de justiça ao abrigo do disposto no artigo 6.º/7, do RCProcessuais.
O critério da complexidade da causa pode extrair-se do art. 530º/767, e a conduta processual das partes deve ser apreciada conforme os princípios consignados nos artigos 7º/1 e, 8º, todos do CPCivil68.
Deferida a dispensa, no todo ou em parte, a requerimento de alguma das partes, ou oficiosamente, a todos aproveita de igual modo69.
E, justifica-se a dispensa no todo ou em parte do pagamento do remanescente da taxa de justiça prevista no art. 6º/7, do RCProcessuais?
Atendendo, v.g., à tramitação dos autos, à extensão ou número dos articulados, às alegações não prolixas, às questões jurídicas suscitadas, à análise de prova, estamos perante um procedimento de normal complexidade.
Por outro lado, a conduta das partes na prática dos atos processuais necessários à adequada decisão da causa, foi conforme com a boa-fé, face à quase inexistência de afirmações ou alegações de índole dilatória70.
Bastaria, no entanto, a conduta processualmente inadequada de uma das partes para excluir em absoluto a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça relativo à causa71.
Temos, pois, que a conduta das partes não merece censura, em face da cooperação, lealdade e da boa-fé processual demonstrada.
Concluindo, por um lado, sendo um procedimento de normal complexidade e, por outro, atendendo à conduta adequada das partes, sendo por isso, o valor da ação o único referente para que seja devida taxa de justiça remanescente, há fundamento para se excluir em absoluto a dispensa desse pagamento72,73,74,75.
Destarte, procedendo as razões invocadas pela recorrente, há que deferir a requerida dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça para além do valor de 275 000,00€, na conta a final.
3. DISPOSITIVO
3.1. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desta secção cível (1ª) do Supremo Tribunal de Justiça em:
a) Não admitir o presente recurso quanto às matérias em que não se verificam os requisitos da contradição/oposição.
b) Julgar improcedente a revista e, consequentemente, em confirmar-se o acórdão recorrido.
c) Deferir a dispensa pela recorrente de pagamento do remanescente da taxa de justiça para além do valor de 275 000,00€, na conta a final.
d) Determinar a remessa dos autos ao Tribunal a quo para aí ser conhecida, se possível pelos mesmos desembargadores, da invocada nulidade por omissão de pronúncia (art. 615º/4/1ª parte, do CPCivil).
3.2. REGIME DE CUSTAS
Custas76 pela recorrente (na vertente de custas de parte, por outras não haver77), porquanto a elas deu causa por ter ficado vencida78.
(Nelson Borges Carneiro) – Relator
(Anabela Luna de Carvalho) – 1º adjunto
(Maria João Vaz Tomé) – 2º adjunto
_____________________________________________
2. Recursos, «em sentido técnico-jurídico, são os meios específicos de impugnação das decisões judiciais, através dos quais se obtém o reexame da matéria apreciada pela decisão recorrida» – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 463.↩︎
3. No nosso sistema processual (no que à apelação e à revista) predomina o «esquema do recurso de reponderação»: o objeto do recurso é a decisão impugnada, encontrando-se à partida, vedada a produção defeitos jurídicos ex-novo. Através do recurso, o que se visa é a impugnação de uma decisão já ex-ante proferida que não o julgamento de uma qualquer questão nova. Uma relevante exceção ao modelo de reponderação é a que se traduz nas questões de conhecimento oficioso: o tribunal superior pode sempre apreciar qualquer dessas questões ainda que não suscitadas perante o tribunal a quo – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 468.↩︎
4. Os recursos são ordinários ou extraordinários, sendo ordinários os recursos de apelação e de revista e extraordinários o recurso para uniformização de jurisprudência e a revisão – art. 627º/2, do CPCivil.↩︎
5. A lei estabelece uma divisão entre recursos ordinários e recursos extraordinários a partir de um critério formal ligado ao trânsito em julgado da decisão. Enquanto os recursos ordinários pressupõem que ainda não ocorreu o trânsito em julgado, devolvendo-se ao tribunal de recurso a possibilidade de anular, revogar ou modificar a decisão, os recursos extraordinários são interpostos depois daquele trânsito – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 777.↩︎
6. Aquele que interpõe o recurso – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 477.↩︎
7. Aquele contra quem se interpõe o recurso – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 477.↩︎
8. O juiz que lavrar o acórdão deve sumariá-lo – art. 663º/7, do CPCivil.↩︎
9. O sumário não faz parte da decisão, consistindo tão só numa síntese daquilo que fundamentalmente foi apreciado com mero valor de divulgação jurisprudencial. Por tais motivos, o sumário deve ser destacado do próprio acórdão, sendo da exclusiva responsabilidade do relator – ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, p. 301.↩︎
10. O acórdão principia pelo relatório, em que se enunciam sucintamente as questões a decidir no recurso, expõe de seguida os fundamentos e conclui pela decisão, observando-se, na parte aplicável, o preceituado nos artigos 607.º a 612.º – art. 663º/2, do CPCivil.↩︎
11. Para além do dever de apresentar a sua alegação, impende sobre o recorrente o ónus de nela concluir, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão – ónus de formular conclusões (art. 639º/1) – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 503.↩︎
12. As conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objeto do recurso, como clara e inequivocamente resulta do art. 639º/3. Conforme ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que o recorrente pretende obter do tribunal superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal a quo – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 795.↩︎
13. O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar, as normas jurídicas violadas; o sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, e invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada – art. 639º/1/2 ex vi do art. 679º, ambos do CPCivil.↩︎
14. Depois de formular conclusões, o recorrente termina deduzindo um pedido de revogação, total ou parcial, de uma decisão judicial – RUI PINTO, Manual do Recurso Civil, Volume I, AAFDL Editora, Lisboa, 2020, p. 293.↩︎
15. Na sessão anterior ao julgamento do recurso, o processo, acompanhado com o projeto de acórdão, vai com vista simultânea, por meios eletrónicos, aos dois juízes-adjuntos, pelo prazo de cinco dias, ou, quando tal não for tecnicamente possível, o relator ordena a extração de cópias do projeto de acórdão e das peças processuais relevantes para a apreciação do objeto da apelação – art. 657º/2 ex vi do art. 679º, ambos do CPCivil.↩︎
16. Todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas, não podendo de elas conhecer o tribunal de recurso.↩︎
17. Vem sendo entendido que o vocábulo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir.↩︎
18. O Tribunal ad quem não pode conhecer de questões novas (isto é, questões que não tenham sido objeto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que “os recursos constituem mecanismo destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando… estas sejam do conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha elementos imprescindíveis” – ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil, 7ª edição, p. 139.↩︎
19. ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil, Almedina, 2020, 6.ª edição atualizada, p. 57.↩︎
20. ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil, Almedina, 2020, 6.ª edição atualizada, pp. 57/60.↩︎
21. Tem-se entendido que o apuramento da contradição jurisprudencial, para o efeito de ajuizar acerca dos pressupostos que permitem que o recurso de revista seja sempre admissível, ao abrigo da al. d) do n.º 2 do art. 629.º do CPC, obedecerá a critérios semelhantes aos utilizados para efeitos de admissibilidade da revista excecional (art. 672.º, n.º 2, al. c), do CPC) ou do recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência (art. 688.º, n.º 1, do CPC). Estes requisitos são os seguintes: 1) Que o acesso ao Supremo esteja vedado unicamente por motivos de ordem legal não ligados à alçada da Relação; 2) Identidade entre a questão de direito apreciada no acórdão recorrido e no acórdão fundamento, não bastando que neles se tenha abordado o mesmo instituto jurídico, exigindo-se que a subsunção jurídica feita em qualquer das decisões tenha operado sobre o mesmo núcleo factual; 3) Que exista uma efetiva contradição de acórdãos, isto é, uma oposição frontal e não apenas implícita entre as decisões dos acórdãos em contradição e que essa questão de direito se revista de natureza essencial na decisão, sendo irrelevante a divergência que incida sobre argumentos sem valor decisivo ou em torno de meros obiter dicta; 4) A divergência deve verificar-se num quadro normativo substancialmente idêntico – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-04-06, Relatora: Maria Clara Sottomayor, Revista: Revista n.º 1431/20.5T8VFR.P1.S1, https://www.dgsi. pt/jstj.↩︎
22. O recurso de revista de decisões proferidas nos procedimentos cautelares só é admissível nos casos previstos no art. 629.º, n.º 2, do CPC (cf. art. 370.º, n.º 2, do CPC). Quando o motivo por que não cabe recurso ordinário seja o art. 370.º, n.º 2, do CPC, o art. 629.º, n.º 2, al. d), decompõe o fundamento da recorribilidade em três requisitos: que o acórdão recorrido esteja em contradição com algum acórdão anteriormente proferido pela Relação, denominado de acórdão fundamento; que os dois acórdãos tenham sido proferidos no domínio da mesma legislação; e que os dois acórdãos tenham sido proferidos sobre a mesma questão fundamental de direito – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-06-30, Relator: NUNO PINTO OLIVEIRA, Revista: 22121/20.3T8LSB.L1.S1, https:// www.dgsi .pt/jstj.↩︎
23. Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-01-12, Relatora: ANA PAULA BOULAROT, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
24. Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-01-12, Relatora: ANA PAULA BOULAROT, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
25. A contradição ou oposição de julgados há de determinar-se atendendo a dois elementos: a semelhança entre as situações de facto e a dissemelhança entre os resultados da interpretação e/ou da integração das disposições legais relevantes em face das situações de facto consideradas – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-09-14, Relator: NUNO PINTO OLIVEIRA, Revista 338/20.0T8ESP.P1.S1, https:// www.dgsi.pt/jstj.↩︎
26. O que tem de existir no acórdão recorrido, para que seja admissível o recurso de agravo para o Supremo Tribunal de Justiça, é que exista efetivamente contradição entre decisões, a proferida no acórdão recorrido, e as prolatadas no acórdão ou nos acórdãos-fundamento, no que concerne à questão ou questões fundamentais de direito no domínio da mesma legislação, o que pressupõe se esteja, num e no outro, ou em outros, perante um núcleo de facto comum similar. É certo que a verificação da contrariedade de acórdãos não pode ater-se à consideração superficial da factualidade descrita nos acórdãos a comparar – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2008-07-10, Relator: SALVADOR DA COSTA, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
27. A contradição de decisões que admite a revista nos termos do art. 629.º, n.º 2, al. d), do CPC tem de consistir numa oposição frontal sobre a mesma questão fundamental de direito, e com um núcleo factual idêntico ou coincidente, na perspetiva das normas ali diversamente interpretadas e aplicadas. Não admite a revista nos termos do art. 629.º, n.º 2, al. d), do CPC a situação em que a apelação foi julgada improcedente com base em não se terem alegados factos concretos para sustentar a pretensão e a recorrente apresenta como acórdão fundamento para contradição de julgados um em que a questão decidida foi aquela cuja pretensão ela queria ver discutida no acórdão recorrido mas que o não foi porque se decidiu a improcedência com fundamento em não terem sido alegados factos que permitissem o conhecimento do pedido – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-05-20, Relator: MANUEL CAPELO, Revista: 1584/20.2T8CSC-C.L1.S1, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
28. Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-01-12, Relatora: ANA PAULA BOULAROT, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
29. Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-10-17, Relatora: ANA RESENDE, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
30. ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 7ª edição, p. 547.↩︎
31. Estar-se-á perante a mesma questão fundamental de direito, grosso modo, quando o núcleo da concernente situação fáctica, na envolvência das normas jurídicas aplicáveis, é em ambos os casos idêntica. Releva, pois, para a determinação da existência de decisões opostas sobre a mesma questão fundamental de direito, o seu conteúdo decisório em conexão com os respetivos fundamentos – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2008-07-10, Relator: SALVADOR DA COSTA, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
32. Importa atentar em que a contradição tem de resultar claramente do confronto entre o acórdão recorrido e o acórdão-fundamento, especificamente considerados, em termos de a sua comparação a revelar, ou seja, que a mesma questão fundamental de direito, baseada em similar núcleo de facto, sob a égide do mesmo quadro normativo tenha sido antagonicamente decidida – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2008-07-10, Relator: SALVADOR DA COSTA, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
33. Não há contradição de julgados, habilitante da via de recurso prevista no art.º 629º nº 2 al. d), quando as situações de factos apreciadas são essencialmente diferentes e conduzem, naturalmente a soluções jurídicas diferentes. Nestas circunstâncias não se verifica contradição que legitime a abertura dessa via recursiva especial – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-01-28, Relator: BERNARDO DOMINGOS, https:// www.dgsi.pt/jstj.↩︎
34. A contradição/oposição de julgados invocada como fundamento de recurso de revista impõe, desde logo, de per si, e além de outros, a verificação cumulativa dos seguintes pressupostos: a) identidade do quadro factual; b) identidade da questão de direito expressamente resolvida; c) identidade da lei aplicável; d) carácter determinante da resolução daquela questão para a decisão final; e e) oposição concreta de decisões – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2022-04-20, Relator: ISAÍAS PÁDUA, Revista: 822/21.9T8FAR.E1.S1, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
35. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 15-01-2016, Processo:1664/07.0TBLSD.P1.↩︎
36. “Ou seja, voltando ao caso concreto, se apesar da divisão do prédio por virtude do ato da expropriação, não tivesse sido concretizada a construção da autoestrada, a área sobrante não teria sofrido a apontada diminuição da aptidão construtiva pela imposição de uma servidão “non aedificandi”. A desvalorização da parcela sobrante do imóvel expropriado não relevam para o cálculo da justa indemnização no âmbito do processo de expropriação, ao abrigo do disposto no artigo 29.º, nº 2 do Código das Expropriações aprovado pela Lei 168/99 de 18/9, pois não são uma consequência direta e necessária da divisão do prédio”.↩︎
37. Relativamente a questões de conhecimento oficioso e que, por isso mesmo, não foram suscitadas anteriormente, deve ser assegurado o contraditório, nos termos do art. 3º/3, do CPCivil.↩︎
38. A omissão de pronúncia implica, caso se verifique, de harmonia com o disposto no art. 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, a nulidade do acórdão – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-01-12, Relatora: ANA PAULA BOULAROT, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
39. Se o acórdão recorrido conheceu das questões suscitadas na apelação – embora remetendo para a motivação da sentença e sem explicitar, formalmente, a improcedência dessa apelação –, não incorre em nulidade, por omissão de pronúncia – art. 615.º, n.º 1, al. d), do CPC – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2016-05-17, Relator: PINTO DE ALMEIDA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
40. A nulidade do Acórdão pressupõe a verificação de alguma das hipóteses no artigo 615.º, n.º 1, do CPC. A nulidade por omissão de pronúncia advém da falta de resposta a questões que o Tribunal tenha o dever de responder – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-03-16, Relatora: CATARINA SERRA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
41. O direito adjetivo civil enuncia, imperativamente, no n.º 1, do art.º 615º, aplicável ex vi artºs. 666º, 679º e 685º, todos do Código de Processo Civil, as causas de nulidade do acórdão. Os vícios da nulidade do acórdão correspondem aos casos de irregularidades que põem em causa, nomeadamente, a ininteligibilidade do discurso decisório, em razão do uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de não tratar de questões de que deveria conhecer (omissão de pronúncia) – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-03-07, Relator: OLIVEIRA ABREU, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
42. O tribunal só tem que se pronunciar sobre questões (artigo 660, nº2 do CPC), entendendo-se como tal as concretas controvérsias centrais a dirimir e não os simples argumentos, opiniões, motivos, razões, pareceres, ou doutrinas expendidas pelas partes – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2004-05-13, Relator: FERREIRA GIRÃO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
43. ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 762.↩︎
44. Ainda que, segundo o disposto no artigo 674º, nº 1, alínea c), do Código de Processo Civil, a revista possa ter por fundamento as nulidades previstas nas alíneas b) a e) do artigo 615.º do mesmo código, certo é que aquela norma não pode deixar de ser conjugada com o preceituado no n.º 4 deste último artigo, segundo o qual, tais nulidades só são arguíveis por via recursória quando da decisão reclamada caiba também recurso ordinário, ou seja, como fundamento acessório desse recurso. Daí que, não sendo admissível recurso de revista quanto a determinados pedidos formulados na ação e na reconvenção, por a isso obstar a dupla conforme a que alude o artigo 671º, nº 3 do Código de Processo Civil, as nulidades previstas no citado artigo 615º e imputadas ao acórdão recorrido no que respeita a estes pedidos terão de ser conhecidas pelo Tribunal da Relação, nos termos da 1.ª parte do n.º 4 do artigo 615.º e n.º 6 do artigo 617.º do Código de Processo Civil – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-12-16, Relatora: ROSA TCHING, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
45. A inadmissibilidade da revista não permite que sejam apreciadas as nulidades decisórias arguidas quanto ao acórdão recorrido, uma vez que constituem fundamento acessório e dependente do recurso ordinário admitido, nos termos previstos e contemplados pelo art. 615º, 4, ex vi arts. 666º, 1, e 679º do CPC. Não sendo admitido o recurso, as nulidades só são suscetíveis de serem apreciadas pelo tribunal recorrido que proferiu a decisão alegadamente viciada, o que implica ordenar a devolução do processo à Relação para conhecer de nulidade ainda não apreciada (em acórdão antes proferido: arts. 615º, 4, 617º, 1, 666º, 1 e 2, CPC), nos termos do art. 617º, 5, 2ª parte, ex vi arts. 666º, 1, 679º, do CPC, e 666º, 2, do CPC. – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2022-09-06, Relator: RICARDO COSTA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
46. Nos casos de admissibilidade excecional dos recursos o objeto do recurso é restrito à matéria que constitui o fundamento da sua admissibilidade. E nesses casos, entendendo-se que a invocação de nulidades enquanto fundamento da revista (artigo 674º, nº 1, al, c), do CPC) tem carácter acessório, haverá ainda de considerar-se só serem suscetíveis de invocação e conhecimento aquelas nulidades que se relacionem com o objeto do recurso.– Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-02-02, Relator: RIJO FERREIRA, http://www.dgsi. pt/jstj.↩︎
47. GOMES CANOTILHO – VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, volume I, 4ª ed., p. 807.↩︎
48. GOMES CANOTILHO – VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, volume I, 4ª ed., pp. 808/09.↩︎
49. Ac. do Tribunal Constitucional nº 719/2002 , de 2022-11-03, Relator: LINO RODRIGUES RIBEIRO, https://www. tribunalconstitucional.pt/.↩︎
50. A indemnização só é justa, se conseguir ressarcir o expropriado do prejuízo que efetivamente sofreu. Não pode ser de montante tão reduzido que a torne irrisória ou meramente simbólica, mas também não pode ser desproporcionada à perda do bem expropriado. E, por isso, não deve atender a fatores especulativos ou outros que distorçam a proporção que deve existir entre o prejuízo imposto pela expropriação e a compensação a pagar por ela, para mais ou para menos. Há, consequentemente, que observar aqui um princípio de igualdade e de proporcionalidade – um princípio de justiça, em suma. O quantum indemnizatório a pagar a cada expropriado há de realizar a igualdade dos expropriados entre si e a destes com os não expropriados: trata-se de assegurar que haja igualdade de tratamento perante os encargos públicos. O desiderato de justiça, postulado pelo reconhecimento do direito fundamental dos expropriados ao recebimento de uma justa indemnização pela perda do bem de que são privados por razões de utilidade pública – sublinhou-se no acórdão n.º 194/97 (publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, volume 36º, página 407) – alcança-se, seguramente, quando o legislador opta pelo critério do valor do mercado do bem expropriado, mas são possíveis outros critérios. Questão é que realizem os princípios da justiça, da igualdade e da proporcionalidade que a indemnização tem de cumprir. Ora, quando os solos tenham aptidão edificativa, os princípios da justiça, da igualdade e da proporcionalidade só são respeitados, se essa potencialidade for levada em conta no cálculo da indemnização a pagar ao expropriado – Ac. do Tribunal Constitucional nº 243/2001 , de 2001-05-23, Relator: MESSIAS BENTO, https://www.tribunalconstitucional.pt/.↩︎
51. Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2022-06-21, Relator: TIBÉRIO NUNES DA SILVA; Processo 4473/11.8TBVFX.L1.S1, https://www. dgsi.pt/jstj.↩︎
52. FERNANDO ALVES CORREIA, As Garantias do Particular na Expropriação por Utilidade Pública, Coimbra, 1982, p. 129.↩︎
53. Neste sentido pronunciaram-se, igualmente, FRANCISCO CALVÃO e FERNANDO JORGE SILVA, Código das Expropriações – Anotações adaptadas ao Novo Código de Processo Civil, Coimbra Editora, 2013, pp.171/72.↩︎
54. Neste sentido, Ac. do Tribunal Constitucional nº 408/2008, de 2008-07-31, Relator: JOÃO CURA MARIANO, https://www. tribunalconstitucional.pt/.↩︎
55. SALVADOR DA COSTA apud Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-01-14, Relatora: ROSA TCHING, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
56. SALVADOR DA COSTA apud Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-01-14, Relatora: ROSA TCHING, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
57. As partes poderão requerer tal dispensa também até à prolação da decisão final da causa, incidente ou recurso, sendo que, resultando da lei o montante devido, estão em perfeitas condições de o fazer, independentemente da elaboração da conta – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2019-01-31, Relator: TOMÉ GOMES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
58. A condenação em custas de cada uma das partes em cada uma das instâncias, com efeitos designadamente na exigibilidade da taxa de justiça remanescente, assume sempre natureza provisória, ficando a sua exigibilidade ou a sua quantificação dependente dos resultados futuros – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-12-20, Relator: ABRANTES GERALDES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
59. Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2020-05-05, Relator: RAIMUNDO QUEIRÓS, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
60. A norma constante do nº 7 do art. 6º do RCP deve ser interpretada em termos de ao juiz ser lícito dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fração ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de €275 000, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2013-12-12, Relator: LOPES DO REGO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
61. Os critérios de cálculo da taxa de justiça, integrando normação que condiciona o exercício do direito fundamental de acesso à justiça (artigo 20.º da Constituição), constituem, pois, a essa luz, zona constitucionalmente sensível, sujeita, por isso, a parâmetros de conformação material que garantam um mínimo de proporcionalidade entre o valor cobrado ao cidadão que recorre ao sistema público de administração da justiça e o custo/utilidade do serviço que efetivamente lhe foi prestado (artigos 2.º e 18.º, n.º 2, da mesma Lei Fundamental), de modo a impedir a adoção de soluções de tal modo onerosas que se convertam em obstáculos práticos ao efetivo exercício de um tal direito – Acórdão do Tribunal Constitucional nº 421/2013, de 15-07-2013.↩︎
62. Esta dispensa tem natureza excecional, que vai para além da magnitude do valor da causa, e a sua função corretiva pressupõe, em especial, uma menor complexidade técnico-jurídica da causa, aferida pela simplificação da tramitação processual e da especificidade da situação substantiva e adjetiva em face da utilidade económica dos pedidos, assim como um comportamento das partes sem censura – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-12-19, Relator: RICARDO COSTA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
63. Quanto ao remanescente da taxa de justiça relativa às causas de valor superior a € 275 000,00, o artigo 6.º, n.º 7, do RCP determina que, quando a especificidade da situação o justificar, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, cabe ao juiz, de forma fundamentada, dispensar o respetivo pagamento, o que significa que lhe incumbe fazê-lo mesmo oficiosamente, assistindo também às partes o direito de o requerer. Consoante os casos, tal dispensa pode ser total ou apenas parcial – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2019-01-31, Relator: TOMÉ GOMES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
64. Verificando-se o exagero ou desproporcionalidade entre a taxa remanescente e a especificidade da situação (complexidade da causa e trabalho produzido) há sempre a possibilidade de ser requerida, ou decidida oficiosamente, a dispensa (total ou parcial) do pagamento dessa taxa remanescente, ao abrigo do n.º 7 do art. 6.º do RCP – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-05-30, Relator: JORGE DIAS, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
65. A complexidade da causa ou a conduta das partes constituem fatores que devem ser atendidos, mas outros podem ser relevantes para o efeito em função do princípio da proporcionalidade, designadamente a natureza e a atividade exercida pelos sujeitos processuais, o valor dos interesses económicos em discussão ou os resultados obtidos – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-12-20, Relator: ABRANTES GERALDES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
66. A norma constante do nº 7 do artigo 6º do Regulamento das Custas Processuais deve ser interpretada no sentido de que ao juiz é lícito dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fração ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa e/ou do recurso exceder o patamar de € 275 000, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade da tramitação processual, comportamento processual das partes e complexidade substancial das questões a decidir), à luz dos princípios da proporcionalidade e da igualdade – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-01-14, Relatora: ROSA TCHING, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
67. Para aferir da complexidade da causa, deve ser convocado o art. 530º, 7, do CPC – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-12-19, Relator: RICARDO COSTA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
68. SALVADOR DA COSTA, As Custas Processuais, Análise e Comentário, 7ª ed., p. 143 (nota 6.9).↩︎
69. SALVADOR DA COSTA, As Custas Processuais, Análise e Comentário, 7ª ed., p. 141.↩︎
70. Para ter em conta a conduta processual das partes, devem ser aplicados ao caso os arts. 7º, 1, e 8º do CPC – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-12-19, Relator: RICARDO COSTA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
71. SALVADOR DA COSTA, As Custas Processuais, Análise e Comentário, 7ª ed., p. 141.↩︎
72. Numa ação com valor superior a € 3 000 000,00, cuja complexidade deriva não apenas da natureza das questões de direito material e adjetivo que foram suscitadas como ainda da forte litigância promovida por cada uma das partes, com mútuas acusações de litigância de má fé, da variedade de meios de prova que foram produzidos ou do número de sessões de julgamento realizadas, não se justifica nem a dispensa nem a redução da taxa de justiça remanescente na 1ª instância – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-12-20, Relator: ABRANTES GERALDES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
73. Está excluído da dispensa contemplada no art.6º,n.º7, do RCP , o processo que comportou 19 sessões de julgamento,2 procedimentos cautelares, 2 incidentes de prestação de caução, embargos de terceiro e, recursos de apelação e revista, interpostos por ambas as partes – Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 2018-09-18, Relatora: TERESA DE SOUSA HENRIQUES, http://www.dgsi.pt/jtrl.↩︎
74. A aplicação do disposto no art. 6º, nº 7, do RCP, envolverá toda a tramitação processual que ocorreu na presente ação, apreciando se se verificam condições para declarar a dispensa ou a redução das taxas de justiça remanescentes que ainda não foram pagas na 1ª instância, na Relação e neste Supremo, nas parcelas que excedem os valores liquidados em função do plafond de € 275.000,00 – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-12-20, Relator: ABRANTES GERALDES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
75. Ao juiz é lícito dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fração ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de € 275 000, consoante o resultado da ponderação da situação concreta – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2022-07-13, Relator: VIEIRA E CUNHA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
76. A fundamentação autónoma da condenação em custas só se tornará necessária se existir controvérsia no processo a esse propósito – Acórdãos do Tribunal Constitucional nº 303/2010, de 2010-07-14, Relator: VÍTOR GOMES e, nº 708, de 2013-10-15, Relatora: MARIA JOÃO ANTUNES, https://www.tribunalconstitucional.↩︎
77. Como o conceito de custas stricto sensu é polissémico, porque é suscetível de envolver, nos termos do artigo 529º/1, além da taxa de justiça, que, em regra, não é objeto de condenação – os encargos e as custas de parte, importa que o juiz, ou o coletivo de juízes, nos segmentos condenatórios das partes no pagamento de custas, expressem as vertentes a que a condenação se reporta – SALVADOR DA COSTA, As Custas Processuais, Análise e Comentário, 7ª ed., p. 8.↩︎
78. A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito – art. 527º/1, do CPCivil.↩︎
79. A assinatura eletrónica substitui e dispensa para todos os efeitos a assinatura autógrafa em suporte de papel dos atos processuais – art. 19º/2, da Portaria n.º 280/2013, de 26/08, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 267/2018, de 20/09.↩︎
80. Acórdão assinado digitalmente – certificados apostos no canto superior esquerdo da primeira página.↩︎