PRINCÍPIO DO DISPOSITIVO
CONDENAÇÃO ULTRA PETITUM
EXCESSO DE PRONÚNCIA
NULIDADE DA SENTENÇA
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
INUTILIDADE DE APRECIAÇÃO
Sumário


1- Por força dos princípios do dispositivo e do contraditório a causa de pedir, as exceções e o pedido delimitam o thema decidendum a que o tribunal se encontra adstrito, não podendo aquele, na sentença, conhecer de fundamento (causa de pedir e/ou exceção) não invocadas e cujos factos essenciais não tenham sido alegados pelas partes, sob pena de incorrer em nulidade por excesso de pronúncia, salvo se se tratar de exceção que seja de conhecimento oficioso (contanto que, quanto a esta, tenha sido alegada e provada a respetiva facticidade), e também não pode condenar em quantia superior ou em objeto diverso (qualitativamente diferente) do pedido, sob pena de incorrer em nulidade por condenação ultra petitum.
2- É nulo o segmento decisória da sentença recorrida, por excesso de pronúncia e por condenação ultra petitum em que se declarou cessado o contrato de arrendamento celebrado entre o Autor e a 2ª Ré (recorrente) e se condenou a última a entregar-lhe o locado e, bem assim, a pagar-lhe as rendas em dívida e as vincendas até ao trânsito em julgado da sentença, bem como, a título de indemnização, o montante mensal da renda acordada, desde o trânsito em julgado da sentença até à efetiva entrega do locado, quando se verifica que, na petição inicial, o Autor não pediu que se declarasse a resolução do contrato de arrendamento celebrado entre aquele e a 2ª Ré, mas sim o contrato de arrendamento que celebrou com a 1ª Ré, e quando nela fundou (causa de pedir) os pedidos que aí formulou no incumprimento do contrato de arrendamento que celebrou com a 1ª Ré (não no incumprimento do contrato de arrendamento que celebrou com a 2ª Ré).
3- O tribunal de recurso deve abster-se de apreciar a impugnação do julgamento da matéria de facto operada pelo recorrente quando verifique que o resultado dessa apreciação, atentas as várias soluções plausíveis de direito suscetíveis de serem aplicadas ao caso, é insuscetível de se projetar na decisão de mérito, determinando uma decisão de mérito distinta, sob pena de se estar a levar a cabo uma atividade processual que de antemão se sabe ser inútil e inconsequente e, por isso, proibida, nos termos do art. 130º do CPC.

Texto Integral


Acordam na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I- RELATÓRIO

AA, residente nos ..., representado pela sua procuradora, BB, residente na Avenida ..., ..., ..., instaurou a presente ação declarativa, com processo comum, contra CC, residente na Rua ..., ..., ..., ..., e DD, com domicílio profissional na Rua ..., ..., fração ..., ..., pedindo que se declarasse resolvido o contrato de arrendamento celebrado entre o Autor e a primeira Ré e que, por via disso, se condenasse as Rés a despejarem imediatamente a fração autónoma designada pelas letras ..., localizada no ..., lado sul, a terceira a nascente, com entrada pela Rua ..., inscrita na matriz predial urbana da União de Freguesias ..., ... e ... (... e ...), do concelho ... sob o art. 4º-.../urbano, e descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...19.../..., do prédio urbano afeto ao regime de propriedade horizontal denominado “Quinta ... ou ...”, sito na Rua ..., da União de Freguesias ..., ... e ... (... e ...), concelho ..., entregando-a ao Autor livre e devoluta e nas condições em que a receberam e, bem assim, se condenasse solidariamente as Rés a pagarem-lhe as rendas vencidas e não pagas, no montante global de 2.400,00 euros, e as vincendas até efetivo despejo, acrescidas dos correspondentes juros de mora, as quais deverão ser elevadas ao dobro em caso de mora ou atraso na entrega ou restituição do locado por via da declaração de resolução do contrato de arrendamento que vier a ser decretada pelo tribunal.
Para tanto alegou, em suma: ser dono e legítimo possuidor da fração ..., localizada no prédio constituído em propriedade horizontal, denominado “Quinta ... ou ...”, sito na Rua ..., da União de Freguesias ..., ..., ... (... e ...), concelho ..., em virtude de o ter comprado em 5/05/2017, encontrando-se essa fração registada definitivamente em seu nome na Conservatória do Registo Predial ... pela ap. ...49, de 09 de maio de 2017; por acordo escrito de 01/11/2021 deu de arrendamento a dita fração à 1ª Ré, pelo prazo de dois anos, com início em 1/11/2021, prorrogável por um ano, no caso de não ser denunciado por qualquer das partes, pela renda mensal de 220,00 euros, a ser paga por transferência bancária para a conta (cujo n.º identifica) aberta no Banco 1..., para a atividade de exploração de café; por acordo verbal celebrado entre o Autor e a 1ª Ré, em janeiro de 2022, foi alterado o fim do arrendamento para a atividade de cabeleireiro;  atualmente a fração encontra-se ocupada e a ser utilizada pela 2ª Ré, que nela exerce a atividade de cabeleireiro, “desconhecendo o Autor se tal ocupação e fruição pela segunda ré da indicada fração autónoma foi por transmissão definitiva, a título oneroso, da posição de arrendatário, acompanhada da transferência, em conjunto, das instalações, utensílios, mercadoria e outros utensílios que integram o estabelecimento de cabeleireiro, ou por transferência temporária e onerosa do gozo da aludida fração autónoma, em conjunto com a exploração do estabelecimento de cabeleireiro nela instalado” (transcrição ipsis verbis do alegado no art. 12º da p.i.); a 2ª Ré encontra-se a ocupar e fruir a fração pelo menos desde janeiro de 2022 e afirma que é quem está à frente do estabelecimento de cabeleireiro, intitulando-se proprietária desse estabelecimento; desde março de 2022, inclusive, as Rés deixaram de pagar-lhe as rendas, apenas tendo pago, em 19/04/2022, a quantia de 200,00 euros, por conta da renda do mês de março; por consequência, encontram-se em dívida 20,00 euros da renda de março de 2022, bem como as rendas dos meses de abril a dezembro de 2022, janeiro e fevereiro de 2023, ascendendo o montante global das rendas em dívida a 2.440,00 euros.
A 1ª Ré, CC, contestou defendendo-se por exceção e por impugnação.
Impugnou que o Autor lhe tivesse arrendado, direta ou indiretamente, qualquer espaço, nomeadamente aquele a que se reportam os autos; a arrendatária desse espaço foi desde o primeiro minuto a co-Ré DD que, desde o primeiro momento ali explora um estabelecimento de cabeleireiro e que foi quem tudo negociou com o senhorio.
Em sede de defesa por exceção alegou que a 2ª Ré DD, à data, tinha problemas ligados com  fornecimento de energia e água, dado que as empresas fornecedoras recusavam-se a contratar com ela sem a prévia liquidação de débitos anteriores; em perfeita e total sintonia com a procuradora do senhorio, a única solução seria, como foi, elaborarem o contrato de arrendamento através de outra pessoa, que depois tudo seria oportunamente regularizado, inclusive, quando fosse autorizada na fração a atividade de cabeleireiro; o senhorio sempre exigiu o cumprimento do contrato, em especial, o pagamento de rendas à 2ª Ré DD, e só “porque terá havido desaguisado, se virou para a aqui Ré no sentido da cobrança da renda”; o senhorio bem sabe que nada arrendou à contestante, mas sim à 2ª Ré; “entretanto e por mera cautela, devidamente aconselhada, a contestante enviou nesta data carta ao senhorio a denunciar o contrato, não porque assuma as responsabilidades, mas para evitar que quaisquer delongas caiam sobre a sua responsabilidade, mesmo atento a alínea c) do pedido contante da petição inicial”.
Concluiu pedindo que a ação fosse julgada improcedente e fosse absolvida do pedido.
A 2ª Ré, DD, contestou, defendendo-se por impugnação e por exceção, e deduziu reconvenção.
Impugnou a generalidade dos factos alegados na petição inicial.
Deduziu a exceção de não cumprimento do contrato, alegando, em suma: dedicar-se à atividade de cabeleireira, a título profissional; em finais de 2021, por acordo verbal, o Autor, por intermédio da sua procuradora, BB, arrendou-lhe a fração para que nela explorasse um salão de cabeleireiro, mediante 220,00 euros de renda mensal; aquando da celebração daquele acordo, a fração encontrava-se afeta à atividade de café, ao abrigo do alvará de utilização n.º ...5; o Autor, por intermédio da sua procuradora, autorizou a Ré a efetuar as alterações à fração que se revelassem necessárias às instalação do salão de cabeleireiro e, concomitantemente, comprometeu-se a regularizar a situação junto da Câmara Municipal ..., com vista à emissão do alvará de utilização correspondente à atividade de cabeleireiro; nessa sequência, a Ré dotou a fração de estruturas e de bens necessários ao funcionamento de um salão de cabeleireiro, nomeadamente, sofás, cadeiras, espelhos, lavatórios, secadores, prateleiras, armários, etc., e pagou-lhe as rendas que identifica (no ponto 10º da contestação); sucede que, por ofício de 28/04/2022, a Câmara Municipal ...  notificou-a de que o exercício da atividade de cabeleireiro na fração é ilegal e, bem assim, que até àquela data não tinha dado entrada na Câmara nenhum pedido de alteração de uso da fração em causa, a qual se encontra licenciada para café; o Autor, em contravenção com o acordado consigo, não diligenciou no sentido de obter da licença de utilização do estabelecimento como cabeleireiro, impedindo-a de dar cumprimento às normas legais e regulamentares aplicáveis à atividade de cabeleireiro naquele estabelecimento, apesar de bem saber que ele é o único com poderes para efetuar requerimentos e pedidos relativos ao seu imóvel junto das entidades públicas, o que lhe confere o direito a recusar o pagamento da renda enquanto o Autor (senhorio) não obtiver a autorização camarária para que possa operar um salão de cabeleireiro na fração que lhe arrendou.
Concluiu pedindo que fosse absolvida dos pedidos.
Deduziu reconvenção pedindo que o Autor fosse condenado a obter o alvará de utilização correspondente à atividade de cabeleireiro no imóvel objeto do acordo celebrado entre as partes (identificado em 4), colocando o alvará à disposição da Ré DD enquanto esta explorar o referido estabelecimento e, bem assim, a reduzir a escrito o acordo de arrendamento outorgado com aquela, com observância de todas as formalidades legais.
O Autor replicou defendendo-se por exceção e por impugnação.
Suscitou a exceção dilatória de ineptidão da reconvenção por falta de alegação de causa de pedir, alegando que nela a Ré DD se limitou a alegar factos absolutamente genéricos dos quais não emerge facticidade que pudesse fundamentar o pedido de condenação daquele a reduzir a escrito o alegado contrato de arrendamento, na medida em que se limita repetidamente a alegar, de forma vaga, genérica e sem concretização um pretenso “acordo verbal”, que teria sido celebrado entre aquela e a procuradora do Autor.
Impugnou a totalidade da facticidade alegada na reconvenção, nomeadamente, que tivesse celebrado qualquer acordo verbal com a 2ª Ré, no sentido de lhe arrendar a fração, designadamente, para que nela explorasse um salão de cabeleireiro, mantendo que apenas celebrou o contrato de arrendamento com a 1ª Ré CC. Alegou que, mediante o alvará de utilização n.º ...22, emitido pela Câmara Municipal ... em 31/05/2022, a fração encontra-se licenciada para que nela seja exercida a atividade de comércio/serviços, na qual se inclui a atividade de cabeleireiro, podendo, por isso, nela ser exercida a dita atividade.
Concluiu pedindo que se julgasse procedente a exceção dilatória de ineptidão da reconvenção por falta de causa de pedir e que, em todo o caso, se julgasse a reconvenção improcedente e procedente a petição inicial.
Exerceu o direito ao contraditório quanto à contestação apresentada pela 1ª Ré CC, alegando manter “todo o alegado na petição inicial, por ser a rigorosa expressão da verdade”, “pelo que a alegada denúncia do contrato de arrendamento carece de qualquer efeito e/ou eficácia jurídicas”.
Concluiu como na petição inicial.
Por despacho de 17/10/2023, notificou-se as partes para, no prazo de cinco dias, informarem se não se opõem à não realização da audiência prévia, advertindo-as que, caso nada dissessem, o tribunal entenderia que nada tinham a opor a tal, e prosseguiria com os ulteriores termos processuais.
Na sequência, mantendo-se as partes silentes, em 16/11/2023, proferiu-se despacho em que se: admitiu a reconvenção deduzida pela Ré DD; fixou o valor da causa em 12.340,00 euros; proferiu despacho saneador, em que se conheceu da exceção dilatória de ineptidão da reconvenção por falta de alegação de causa de pedir, julgando-a improcedente, e em que se relegou o conhecimento da exceção de não cumprimento do contrato para a decisão final; conheceu dos requerimentos probatórios apresentados pelas partes; e designou data para a realização de audiência final.
Realizada a audiência final, a qual se prolongou ao longo de duas sessões, em 05/03/2024, proferiu-se sentença, em que se julgou a ação parcialmente procedente e a reconvenção totalmente improcedente, a qual consta da seguinte parte dispositiva:
“Pelo exposto e atentas as considerações expendidas:
A)  Julga-se a presente ação parcialmente procedente, por parcialmente provada e, consequentemente, decide-se:
a) Declarar cessado o contrato de arrendamento celebrado entre ao Autor AA e a Ré DD, relativo à fração autónoma identificada pelas letras ..., localizada no ..., lado sul, a terceira a nascente, com entrada pela Rua ..., inscrita na matriz predial urbana da União de Freguesias ..., ... e ... (... e ...), do concelho ... sob o artigo 4, ... Urbano, e descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob a descrição ...19.../...;
b) Condenar a Ré DD a restituir ao Autor o locado, completamente livre e desocupado de pessoas e bens;
c) Condenar a Ré DD no pagamento ao Autor AA da quantia de € 2.440,00 (dois mil quatrocentos e quarenta euros), a título de rendas vencidas desde março de 2022 até à data de entrada da ação e, bem assim, as rendas que se venceram desde a data da entrada da ação até ao trânsito em julgado da sentença, montantes aos quais acrescem os juros de mora até efetivo e integral pagamento;
d) Condenar a Ré DD no pagamento ao Autor AA, a título de indemnização, da quantia de € 220,00 (duzentos e vinte euros) mensais até à restituição do imóvel;
e) Absolver a Ré CC de todo o peticionado.
B) Julga-se a reconvenção deduzida por DD totalmente improcedente, e, consequentemente, decide-se absolver o Autor AA de todo o peticionado.
Custas da ação: A cargo do Autor e da 2.ª Ré na proporção, respetivamente, de 1/5 e 4/5.
Custas da reconvenção: A cargo da 2.ª Ré”.    
Inconformada com o segmento da sentença que julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, declarou a cessação do contrato de arrendamento celebrado entre o Autor e a 2ª Ré, e condenou a última a restituir ao primeiro o arrendado, completamente livre e desocupado de pessoas e bens, bem como, a pagar-lhe a quantia de 2.440,00 euros, a título de rendas vencidas desde março de 2022 até à data da entrada da ação em juízo, e, bem assim, as rendas que se venceram desde a entrada em juízo da ação até ao trânsito em julgado da sentença, montantes aos quais acrescem juros de mora até efetivo e integral pagamento, além da quantia de 220,00 euros mensais, a título de indemnização até a restituição do imóvel ao Autor, a 2ª Ré, DD, interpôs recurso, em que formulou as conclusões que se seguem:
I- Versa o presente recurso sobre a sentença que antecede (Referência ...75), que, julgando a ação parcialmente procedente, declarou a cessação do contrato de arrendamento celebrado entre o Autor/Recorrido e a 2ª Ré/Recorrente, com os efeitos que derivam dessa declaração, nomeadamente a entrega do imóvel livre de pessoas e bens, a condenação no pagamento da quantia de 2.440,00 € a título de rendas vencidas, as rendas vincendas e a quantia de 220,00 €, a título de indemnização, até à restituição do imóvel.

II. São as seguintes questões objeto do presente recurso:

- Da nulidade da sentença nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC;
- Da nulidade da sentença nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC;
- Da impugnação da decisão relativa à matéria de facto;
- Da exceção de não cumprimento do contrato;
- Da nulidade do contrato de arrendamento.

III. Quanto à nulidade da sentença nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, ela decorre do facto de o Tribunal a quo ter declarado, não a resolução do contrato de arrendamento celebrado entre o Autor/Recorrido e a 1ª Ré - o que lhe foi pedido -, mas a resolução do contrato de arrendamento celebrado entre o Autor/Recorrido e a 2ª Ré/Recorrente.
IV. Nem o Autor, nem a 1ª Ré, nem a 2ª Ré/Recorrente pediram ao tribunal que declarasse cessado o contrato de arrendamento celebrado entre o Autor/Recorrido e a 2ª Ré/Recorrente.
V. Atendendo a que o Tribunal a quo declarou cessado um contrato de arrendamento diferente do contrato de arrendamento cuja cessação lhe foi pedida em sede de petitório, existe condenação em objeto diverso do pedido, sendo, por isso, nula a sentença nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, o que deve ser reconhecido e decretado, com as legais consequências.
VI. Quanto à nulidade da sentença nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, ela decorre da ambiguidade e obscuridade entre a factualidade dada como provada sob o item 4) da sentença recorrida e a factualidade dada como não provada sob o item a) da sentença recorrida.
VII. De acordo com a definição de “locação”, o gozo temporário de uma coisa imóvel dá-se por mero efeito do contrato, pelo que, se por documento escrito intitulado de contrato de arrendamento não habitacional com prazo certo, datado de ../../2021, o Autor, na qualidade de senhorio, declarou dar de arrendamento a CC, na qualidade de arrendatária, a fração autónoma identificada em 1) - item 4) da matéria provada -, é forçoso concluir que o Autor proporcionou à Ré CC o gozo da fração autónoma identificada em 1) da sentença recorrida, sendo, por isso, incompreensível a resposta que mereceu a factualidade sob o item a) como não provada.
VIII. Por conseguinte, ocorre ambiguidade e obscuridade entre a factualidade dada como provada sob o item 4) e a factualidade dada como não provada sob o item a), o que torna a decisão ininteligível, e, consequentemente, determina a nulidade da sentença nos termos da alínea c) do n.º 1 do art. 615.º do CPC, o que deve ser reconhecido e decretado, com as legais consequências.
IX. Sem prejuízo do exposto, passando à impugnação da decisão relativa à matéria de facto, a 2ª Ré/Recorrente discorda da factualidade sob os itens 6) da matéria de facto provada, porque deveria ter sido dada como provada noutros termos, e c) da matéria de facto não provada, porque deveria ter sido dada como provada.
X. O meio de prova que impõe decisão diversa quanto aos referidos itens - 6) da matéria provada e c) da matéria não provada - são as declarações do Autor/Recorrido, prestadas em sede de depoimento de parte perante o tribunal no dia 25/01/2024.
XI. No âmbito dessas declarações, o Autor/Recorrido confessou os factos alegados nos artigos 2.º, 3.º, 4.º e 5.º da contestação da 2ª Ré/Recorrente, tendo o Tribunal a quo lavrado a competente assentada, conforme se pode apurar da ata da sessão de julgamento datada de 25/01/2024.
XII. O Tribunal a quo omitiu da factualidade dada como provada a parte final do item 4. da contestação/reconvenção - “com vista à exploração, por esta, de um salão de cabeleireiro” - não obstante ter havido, também quanto a ela, confissão, lavrada em assentada, conforme decorre da ata da sessão de julgamento datada de 25/01/2024.
XIII. Deve a referida matéria ser integrada no elenco dos factos provados, devendo, para o efeito, o item 6) passar a ter a seguinte redação: “(…) por acordo verbal, o Autor, por intermédio da sua procuradora BB, proporcionou à Ré DD, o gozo da fração autónoma descrita em 1) com vista à exploração, por esta, de um salão de cabeleireiro, ficando esta obrigada, como contrapartida, ao pagamento da quantia mensal de € 220,00 (duzentos e vinte euros)”; e o item c) da matéria de facto não provada ser dado como provado.
XIV. Em síntese, deve ser alterada a decisão relativa à matéria de facto, dando-se como:
- PROVADO que “(…) por acordo verbal, o Autor, por intermédio da sua procuradora BB, proporcionou à Ré DD, o gozo da fração autónoma descrita em 1) com vista à exploração, por esta, de um salão de cabeleireiro, ficando esta obrigada, como contrapartida, ao pagamento da quantia mensal de € 220,00 (duzentos e vinte euros)” - item 6) da sentença recorrida;
- PROVADO que “aquando do acordo referido em 6) dos factos provados a Ré DD informou o Autor que pretendia utilizar o imóvel referido em 1) para o exercício da atividade de cabeleireiro” - item c) da sentença recorrida.
XV. Tendo por base a matéria dada como provada pela sentença recorrida, com as alterações decorrentes da impugnação da decisão relativa à matéria de facto aqui deduzida, a exceção de não cumprimento do contrato traduz-se na falta de licença de utilização correspondente à atividade de cabeleireiro no imóvel objeto do contrato de arrendamento enquanto exceção perentória do não pagamento das rendas por parte da 2ª Ré/Recorrente.
XVI. Resulta da sentença recorrida que, na data de 28/04/2022, a 2ª Ré/Recorrente foi alvo do ofício ...23, proveniente da Divisão de Fiscalização e Contraordenações do Município ... - ofício esse correspondente ao documento n.º 14 junto com a contestação da 2ª Ré/Recorrente, cujo teor está provado, por integralmente reproduzido, sob o item 10) da matéria de facto dada como provada pela sentença recorrida -, dando-lhe nota da necessidade de alteração do alvará de utilização para que no imóvel pudesse ser exercida a atividade de cabeleireiro.
XVII. Da conjugação do documento n.º 14 junto com a contestação da 2ª Ré/Recorrente, cujo teor está provado, por integralmente reproduzido, sob o item 10) da matéria dada como provada pela sentença recorrida, com a matéria sob os itens 6) e c) com as alterações decorrentes da impugnação da matéria de facto supra efetuadas, resulta que, na data em que o Autor/Recorrido e a 2ª Ré/Recorrente outorgaram o acordo de arrendamento (novembro de 2021), o imóvel não possuía licença de utilização para o fim a que se destinava tal acordo de arrendamento (exercício da atividade de cabeleireiro).
XVIII. Tal significa, nos termos do artigo 1070.º/1 do Código Civil e do art. 5.º/1, 5, 7 e 8 do Decreto-Lei 160/2006, de 8 de agosto, que (1) ficou o Autor/Recorrido sujeito a uma coima não inferior a um ano de renda, (2) assistia à 2ª Ré/Recorrente a faculdade de resolver o contrato, com direito a indemnização, e (3) o contrato é nulo, sem prejuízo, neste caso, da coima e do direito da 2ª Ré/Recorrente à indemnização.
XIX. Se à 2ª Ré/Recorrente, na qualidade de arrendatária, assistia a faculdade de resolver o contrato, com direito a indemnização, por maioria de razão assistia-lhe a faculdade de recusar o pagamento da renda enquanto não fosse obtida a licença de utilização necessária ao exercício da atividade de cabeleireiro no imóvel objeto do acordo de arrendamento, pois que, quem pode o mais, pode o menos.
XX. Por conseguinte, deve a sentença recorrida ser substituída por outra que julgue procedente a matéria de exceção invocada pela 2ª Ré/Recorrente na sua contestação, reconhecendo-se-lhe o direito de recusar o pagamento das rendas enquanto não for obtida a licença de utilização necessária à execução da atividade de cabeleireiro no imóvel objeto do acordo de arrendamento celebrado com o Autor/Recorrido.
XXI. Sem prejuízo do exposto, para a hipótese de improcedência dos fundamentos expostos, o que por cautela se equaciona, é também fundamento do presente recurso a nulidade do contrato de arrendamento celebrado entre o Autor/Recorrido e a 2ª Ré/Recorrente.
XXII. A sentença recorrida deu como provada a existência de dois contratos de arrendamento sobre o imóvel objeto da presente ação, vigorando ambos os contratos no mesmo período temporal: um dos contratos foi celebrado por escrito e tem por objeto a atividade de café, nele figurando como arrendatária a 1ª Ré; o outro contrato foi celebrado verbalmente e tem por objeto a atividade de cabeleireiro, nele figurando como arrendatária a 2ª Ré/Recorrente, conforme decorre dos itens 4), 5) e 6) da matéria provada, este último com as alterações decorrentes da impugnação da matéria de facto.
XXIII. Incidindo somente sobre o contrato celebrado entre o Autor/Recorrido e a 2ª Ré/Recorrente, este contrato foi celebrado verbalmente e o seu fim é o exercício da atividade de cabeleireiro.
XXIV. O contrato celebrado entre o Autor/Recorrido e a 2ª Ré/Recorrente não cumpriu a forma legalmente exigida, o que determina a nulidade, nos termos dos artigos 1069.º/1 e 220.º do Código Civil.
XXV. Por outro lado, e conforme resulta da conjugação do documento n.º 14 junto com a contestação da 2ª Ré/Recorrente, cujo teor está provado, por integralmente reproduzido, sob o item 10) da matéria dada como provada pela sentença recorrida, e dos itens 6) e c) com as alterações decorrentes da impugnação da matéria de facto aqui deduzida, na data em que o Autor/Recorrido e a 2ª Ré/Recorrente outorgaram o acordo de arrendamento (novembro de 2021), o imóvel não possuía licença de utilização para o fim a que se destinava tal acordo de arrendamento (exercício da atividade de cabeleireiro), o que constitui igualmente causa de nulidade, nos termos do artigo 5.º/1 e 8 do Decreto-Lei n.º 160/2006.
XXVI. Não foi a 2ª Ré/Recorrente quem deu causa à(s) referida(s) nulidade(s): quanto à ausência de forma escrita, ficou provado que a 2ª Ré/Recorrente solicitou ao Autor a redução a escrito do acordo (verbal) de arrendamento, conforme resulta do item 15) dos factos dados como provados pela sentença recorrida; quanto à ausência de licença de utilização, é da responsabilidade do Autor/Recorrido, enquanto proprietário, assegurar que o imóvel dado de arrendamento reúne todas as condições legais e regulamentares necessárias à execução do contrato, sendo ele, de resto, o único com legitimidade para efetuar tais pedidos junto das entidades públicas.
XXVII. A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal (art. 286.º do CC).
XXVIII. Assim, deve a sentença recorrida ser substituída por outra que reconheça a nulidade do contrato de arrendamento celebrado entre o Autor/Recorrido e a 2ª Ré/Recorrente, com as legais consequências.
Termos em que, concedendo provimento ao presente recurso, farão Vossas Excelências a habitual Justiça.

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O Autor contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso.
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A 1ª Instância admitiu o recurso como sendo de apelação, a subir nos próprios autos e com efeito suspensivo, o que não foi objeto de modificação no tribunal ad quem.
*
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- DO OBJETO DO RECURSO

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, nº 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC.
Acresce que, o tribunal ad quem também não pode conhecer de questão nova, isto é, que não tenha sido, ou devesse ser, objeto da decisão sob sindicância, salvo se se tratar de questão que seja do conhecimento oficioso, dado que, sendo os recursos os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, mediante o reexame de questões que tenham sido, ou devessem ser, nelas apreciadas, visando obter a anulação da decisão recorrida (quando padeça de vício determinativo da sua nulidade) ou a sua revogação ou alteração (quando padeça de erro de julgamento, seja na vertente de erro de julgamento da matéria de facto e/ou na vertente de erro de julgamento da matéria de direito), nos recursos, salvo a já enunciada exceção, não podem ser versadas questões de natureza adjetivo-processual e/ou substantivo material sobre as quais não tenha recaído, ou devesse recair, a decisão recorrida[1].
No seguimento desta orientação cumpre ao tribunal ad quem apreciar as seguintes questões:
a- Se a sentença recorrida, no segmento em que julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, declarou a cessação do contrato de arrendamento celebrado entre o Autor (recorrido) e a 2ª Ré (recorrente), e a condenou a restituir-lhe o arrendado, completamente livre e desocupado de pessoas e bens, bem como, a pagar-lhe a quantia de 2.440,00 euros, a título de rendas vencidas desde março de 2022 até à data da entrada da ação em juízo e, bem assim, as que se vencerem desde a entrada em juízo da ação até ao trânsito em julgado da sentença, montantes esses aos quais acrescem juros de mora até efetivo e integral pagamento, além da quantia de 220,00 euros mensais, a título de indemnização, até a restituição efetiva do imóvel ao recorrido, é nula, nos termos da al. e), do n.º 1 do art. 615º do CPC, por nela o tribunal a quo ter condenado a recorrente em objeto diverso do pedido formulado na petição inicial (conclusões III a V das alegações de recurso)?
b- Se aquela sentença é nula, nos termos da al. c), do n.º 1 do art. 615º do CPC, por ocorrer ambiguidade e obscuridade entre a facticidade que nela foi julgada provada sob o item 4º e a facticidade que nela se julgou não provada sob a alínea a), o que torna a decisão proferida ininteligível (conclusões VI a VIII das alegações de recurso)?
c- Se na sentença recorrida, em sede de julgamento da matéria de facto, quanto à facticidade julgada provada no ponto 6º e, bem assim, quanto à julgada não provada sob a alínea c), o tribunal a quo incorreu em infração de regras de direito probatório material, mais concretamente, das normas relativas à confissão, uma vez que, na audiência final o recorrido confessou os factos alegados pela recorrente nos artigos 2º, 3º, 4º e 5º da contestação e o tribunal a quo lavrou essa confissão em assentada, conforme decorre da ata da sessão de audiência final datada de 25/01/2024, e se, em consequência, se impõe:
- quanto à facticidade julgada provada no ponto 6º, julgar como provado o seguinte:
“6- Por acordo verbal, o Autor, por intermédio da sua procuradora BB, proporcionou à Ré DD, o gozo da fração autónoma descrita em 1), com vista à exploração por esta de um salão de cabeleireiro, ficando esta obrigada, como contrapartida, ao pagamento da quantia mensal de 220,00 euros”; e
- quanto à facticidade julgada não provada sob a alínea c), essa matéria fáctica tem de ser julgada provada, impondo-se, em consequência, aditar ao elenco dos factos provados na sentença a seguinte facticidade:
“Aquando do acordo referido em 6) dos factos provados a Ré DD informou o Autor que pretendia utilizar o imóvel referido em 1) para o exercício da atividade de cabeleireiro” (conclusões IX a XIV das alegações de recurso)?
d- Se na sequência da impugnação, com êxito, do julgamento da matéria de facto operada pela recorrente, a decisão de mérito constante da sentença recorrida (ao julgar improcedentes as exceções de não cumprimento do contrato e da nulidade do contrato de arrendamento invocadas pela recorrente) padece de erro de direito e se, em consequência, se impõe a sua revogação e “substituição por outra que reconheça a nulidade do contrato de arrendamento celebrado entre o Autor/Recorrido e a 2ª Ré/recorrente, com as legais consequências” (conclusões XV a XXVII das alegações de recurso)?
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III- DA FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A 1ª Instância julgou provada a seguinte facticidade com relevância para a decisão a proferir no âmbito da presente ação e da reconvenção nela deduzida pela recorrente:
1) Encontra-se registada a favor do Autor, pela apresentação 149, de 9 de maio de 2017, a fração autónoma identificada pelas letras ..., localizada no ..., lado sul, a terceira a nascente, com entrada pela Rua ... de polícia, inscrita na matriz predial urbana da União de Freguesias ..., ... e ... (... e ...), do concelho ..., sob o artigo 4, ... Urbano, e descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob a descrição ...19.../....
2) A fração autónoma descrita em 1), faz parte do prédio urbano, afeto ao regime de propriedade horizontal, denominado Quinta ... ou ..., sito na Rua ..., da União de Freguesias ..., ... e ... (... e ...), do concelho ....
3) A fração autónoma descrita em 1) foi adquirida, por compra, em 5 de maio de 2017, a EE e mulher, FF, que a declararam vender ao Autor.
4) Por documento escrito intitulado de contrato de arrendamento não habitacional com prazo certo, datado de ../../2021, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, o Autor, AA, na qualidade de senhorio, declarou dar de arrendamento a CC, na qualidade de arrendatária, a fração autónoma identificada em 1).
5) Do acordo identificado em 4), consta, além do mais, o seguinte:
«PRIMEIRA
1.- O prazo de duração do arrendamento é de um (2) ano, com início em 01 de novembro de 2021 e termo em 31 de outubro de 2023 (…), renovando-se automática e sucessivamente por períodos sucessivos de 1 (um) ano, caso não seja denunciado ou se verifique oposição à renovação.
(…)
TERCEIRA
A renda fixada é de € 2.640,00 (dois mil seiscentos e quarenta euros) anuais, divididos em duodécimos de € 220,00 (duzentos e vinte euros), que deverá ser paga por transferência bancária ou depósito em conta do Banco 1... com o IBAN:  ...50, até ao oitavo dia do mês a que disser respeito.
SEXTA
1.- O destino do arrendado é exclusivamente para a atividade/exploração comercial de CAFÉ, não lhe podendo ser dado outro uso ou fim sob pena de resolução contratual.
2.- A arrendatária não pode sublocar ou ceder, no todo e em parte, onerosa ou gratuitamente, sem consentimento expresso e por escrito do Senhorio».
6) Na data mencionada em 4), por acordo verbal, o Autor, por intermédio da sua procuradora BB, proporcionou à Ré DD, o gozo da fração autónoma descrita em 1), ficando esta obrigada, como contrapartida, ao pagamento da quantia mensal de € 220,00 (duzentos e vinte euros).
7) A fração autónoma descrita em 1) encontra-se, desde a data referida em 4), a ser ocupada e utilizada pela Ré DD, que nela exerce a atividade de cabeleireiro.
8) A Ré DD colocou na fração autónoma descrita em 1), sofás, cadeiras, espelhos, lavatórios, secadores, prateleiras e armários, para funcionamento de salão de cabeleireiro.
9) A 14/12/1995 a Câmara Municipal ... emitiu o Alvará de Licença n.º ...07, destinado à fração autónoma identificada em 1), cujo teor se dá por integralmente reproduzido, no qual consta «café/serviços».
10) Com data de 28-04-2022 a Divisão de Fiscalização e Contraordenações do Município ... dirigiu à Ré DD, para a morada da fração autónoma descrita em 1), o ofício ...23, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, constando do mesmo o seguinte «(…) NOTIFICA-SE V. Exª PARA NO PRAZO DE 10 DIAS, comprove junto deste Município o uso a que se destina a fração ..., em virtude do referido no ponto 5 da informação fiscal, que se transcreve (…)», sendo que, da informação fiscal transcrita nesse ofício consta, além do mais, que foram realizadas deslocações ao local em 26/01/2022 e 02/02/2022.
11) Com data de 31-05-2022, a Câmara Municipal ... emitiu um documento intitulado de Alvará de Alteração de Utilização n.º 2322, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, no qual declarou entre o mais, o seguinte:
«(…) é emitido o presente Alvará de Alteração de Utilização, em nome de AA, portado do C.C./B.I. n.º ... e número de contribuinte ...90, que titula a alteração de utilização, do edifício sito na Rua ..., da U.F. ..., ... e ... (... e ...), descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o n.º ...19/... e inscrito na matriz Urbana, sob o n.º ..., da respetiva freguesia. A utilização foi autorizada por despacho, de 30-05-2022, (…) Utilização a que foi destinada a fração autónoma ...: Comércio/Serviços (…)».
12) A Ré DD depositou na conta bancária do Autor, por conta do acordado referido em 6), apenas as seguintes quantias: € 220,00, em 13/12/2021, € 220,00, em 24/01/2022, € 220,00, em 07/03/2022, e € 200,00, em 19/04/2022.
13) Em 05/12/2021 o Autor liquidou o imposto de selo relativo ao contrato ..., com início em 01/11/2021 e referente à fração autónoma descrita em 1).
14) No ano 2021, em anexo ao Modelo 3 de IRS, em rendimentos prediais da categoria F o Autor declarou o valor ilíquido de €440,00 a título de rendas referentes à fração autónoma descrita em 1).
15) A Ré DD solicitou ao Autor a redução a escrito do acordo referido em 6).
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Por sua vez, a 1ª Instância julgou não provada a facticidade que se segue:

a) O Autor proporcionou à Ré CC, o gozo da fração autónoma descrita em 1) dos factos provados.
b) Por acordo verbal entre o Autor e a Ré CC, em janeiro de 2022, foi alterado o fim do acordo referido em 4) dos factos provados para a atividade de cabeleireiro.
c) Aquando do acordo referido em 6) dos factos provados a Ré DD informou o Autor que pretendia utilizar o imóvel referido em 1) para o exercício da atividade de cabeleireiro.
d) No momento referido em 6) dos factos provados o Autor, por intermédio da sua procuradora BB, autorizou a Ré DD a efetuar as alterações que se revelassem necessárias à instalação de um salão de cabeleireiro na fração autónoma descrita em 1) dos factos provados.
e) O Autor, em contravenção do acordado com a Ré DD, não diligenciou no sentido da obtenção da licença de utilização para a fração autónoma descrita em 1) dos factos provados como cabeleireiro.
f) A Ré DD não liquidou a quantia de € 20,00, devida pelo mês de março de 2022, e as quantias devidas pelos meses subsequentes, em virtude do Autor não ter obtido a licença referida em e).
g) A Ré DD está privada de utilizar a fração autónoma descrita em 1) dos factos provados como cabeleireiro, por falta de alvará de utilização para essa atividade.
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III- DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

A- Da nulidade da sentença por condenação ultra petitum              
A recorrente, DD, cinge o recurso que interpôs ao segmento decisório da sentença recorrida em que se julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, se declarou cessado o contrato de arrendamento celebrado entre recorrente e recorrido e se condenou aquela a restituir-lhe o locado, completamente livre e desocupado de pessoas e bens e, bem assim, a pagar-lhe a quantia de 2.240,00 euros, a título de rendas vencidas desde março de 2022 até à entrada da presente ação em juízo, bem como, as que se venceram desde a data da entrada da ação em juízo até ao trânsito em julgado da sentença, acrescidas de juros de mora até efetivo e integral pagamento, além da quantia de 220,00 euros mensais, a título de indemnização, desde o trânsito em julgado da sentença até à restituição efetiva do locado.
Neste sentido, a recorrente inicia as alegações de recurso dizendo expressamente que o presente recurso “versa sobre a sentença que antecede (Referência ...75), que, julgando a ação parcialmente procedente, declarou a cessação do contrato de arrendamento celebrado entre o Autor/recorrido e a 2ª Ré/recorrente, com os efeitos que derivam dessa declaração, nomeadamente a entrega do imóvel livre de pessoas e bens, a condenação no pagamento da quantia de 2.440,00 euros a título de rendas vencidas, as rendas vincendas, e a quantia de 220,00 euros, a título de indemnização, até à restituição do imóvel”, alegação essa que reafirma expressis verbis no ponto I das conclusões de recurso.
Sendo pacífico o entendimento doutrinário e jurisprudencial que, por via do disposto nos arts. 635º, n.º 4 (onde se estabelece que: “Nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objeto inicial do recurso”), 637º, n.º 2 (onde se dispõe que: “O requerimento de interposição do recurso contém, obrigatoriamente a alegação do recorrente, em cujas conclusões deve ser indicado o fundamento específico da recorribilidade), 639º, n.º 1 (em que se estatui que: “O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”) e 641º, n.º 2, al. b) (em que se dispõe que o tribunal recorrido, no despacho sobre o requerimento de interposição de recurso, deve indeferir esse requerimento “quando não contenha ou junte a alegação do recorrente ou quando esta não tenha conclusões), todos do CPC, que as conclusões, como proposições sintéticas, encontram paralelo na formulação do pedido que deve integrar a petição inicial e, por isso, delimitam o objeto do recurso, não podendo o tribunal ad quem conhecer de questões que não foram nelas suscitadas, salvo se se tratar de questão de conhecimento oficioso[2], sob pena do acórdão que venha a proferir ser nulo por excesso de pronúncia (al. d), do n.º 1, do art. 615º do CPC), é indiscutível que a recorrente, por um lado, limita o presente recurso ao segmento decisório da sentença sob sindicância acabado de referir; e, por outro, que aquela deixou por sindicar a sentença no segmento em que julgou a ação quanto à Ré CC (1ª Ré) improcedente e a absolveu de todos os pedidos e, bem assim, se julgou a reconvenção totalmente improcedente e se absolveu o recorrido (Autor-reconvindo) de todo o pedido reconvencional.
Deste modo, a sentença sob sindicância encontra-se transitada em julgado quanto à improcedência da ação quanto à 1ª Ré, CC, e à consequente absolvição desta de todos os pedidos que contra ela foram formulados pelo recorrido na petição inicial e, bem assim, quanto à improcedência da reconvenção e à consequente absolvição do recorrido do pedido reconvencional.
A propósito do segmento decisório da sentença de que recorre, advoga a recorrente que o mesmo é nulo, nos termos da al. e), do n.º 1, do art. 615º do CPC, na medida em que, confrontado o pedido formulado na petição inicial com a parte dispositiva da sentença, “verifica-se que o tribunal a quo declarou, não a resolução do contrato de arrendamento celebrado entre o Autor/Recorrido e a 1ª Ré – o que lhe foi pedido -, mas a resolução do contrato de arrendamento celebrado entre o Autor/Recorrido e a 2ª Ré/Recorrente”. Acontece que “nem o Autor, nem a 1ª Ré, nem a 2ª Ré/Recorrente pediram ao tribunal que declarasse cessado o contrato de arrendamento celebrado entre o Autor/Recorrido e a 2ª Ré/Recorrente relativo à fração autónoma identificada pelas letras ..., localizada no ..., lado sul, a terceira a nascente, com entrada pela Rua ..., inscrita na matriz predial urbana da União de Freguesias ..., ... e ... (... e ...), do concelho ... sob o artigo 4, ... urbano, e descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob a descrição ...19.../...”.
Conclui que, “atendendo a que o tribunal a quo declarou cessado um contrato de arrendamento diferente do contrato de arrendamento cuja cessação lhe foi pedida em sede de petitório, existe condenação em objeto diverso do pedido, sendo, por isso, nula a sentença nos termos da al. e), do n.º 1 do art. 615º do CPC, o que deve ser reconhecido e decretado, com as legais consequências”.
Vejamos se assiste razão à recorrente para a nulidade que assaca ao segmento decisório da sentença sob sindicância de que recorre.
Os princípios do dispositivo e do contraditório apesar das restrições que paulatinamente foram sendo introduzidas aos mesmos pelas sucessivas revisões introduzidas à lei adjetiva nacional, principalmente pela Lei n.º 41/2013, de 26/06, continuam a constituir princípios estruturantes e angulares do atual processo civil.
Na conceção tradicional e liberal daqueles princípios o processo civil caracterizava-se pela passividade judicial, em que às partes era concedido o controlo sobre o processo e sobre os factos relevantes para a resolução do litígio e onde era minimizado o contributo do juiz e de terceiros para essa resolução.
Acontece que, no sentido de adotar um modelo de processo que promovesse decisões de mérito em detrimento de decisões formais, abandonou-se o modelo de passividade judicial, ao impor-se a magistrados, mandatários, partes e, inclusivamente, aos terceiros um dever de boa-fé processual e a obrigação de cooperarem entre si, no sentido de transformarem o processo civil numa “comunidade de trabalho”[3], devendo encará-lo, não como um fim em si mesmo, mas como um simples instrumento de trabalho, ao serviço da realização da lei substantiva, a fim de se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio (arts. 7º e 8º).
Na atual conceção de processo civil proíbe-se às partes e seus mandatários a formulação de pretensões ou de argumentos inconsistentes, a dedução de incidentes ou oposições sem fundamento razoável, ou de tomarem iniciativas processuais com o objetivo de dilatar a conclusão do processo, sob pena de se sancionar essas condutas como ilícitos processuais, suscetíveis de serem sancionados como litigância de má-fé.
Por outro lado, sujeitou-se as partes, seus representantes e mandatários, e os terceiros ao dever de cooperação para a descoberta da verdade material, ao impor-se-lhes o dever jurídico de responderem ao que lhes for perguntado, se submeterem às inspeções necessárias, facultando o que lhes for requisitado e praticando os atos que lhes forem determinados (arts. 7º, n.º 2 e 3 e 417º).
Finalmente, abandonou-se a passividade do juiz ao impor-lhe um poder-dever de cooperar com as partes, seus representantes e mandatários nos moldes e com os propósitos já acima enunciados, mas também ao impor-lhe que, ao longo de todo o processo, assegure um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no exercício de faculdades, no uso de meios de defesa e na aplicação de cominações ou de sanções processuais (art. 4º) e, sem prejuízo do ónus especialmente imposto pela lei às partes, impôs-se-lhe o poder-dever de dirigir ativamente o processo, providenciando pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação, recusando o que for impertinente ou meramente dilatório e, ouvidas as partes, adotando mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam a justa composição do litígio em prazo razoável e, bem assim, o poder-dever de providenciar oficiosamente pelo suprimento da falta de pressupostos processuais suscetíveis de sanação, determinar a realização dos atos necessários à regularização da instância ou, quando a sanação dependa de ato que deva ser praticado pelas partes, convidar estas a praticá-lo (art. 6º).
Deste modo, no âmbito da atual lei adjetiva sujeitou-se o juiz a uma série de poderes-deveres, nomeadamente, ao dever de esclarecimento, prevenção, consulta e de auxílio, os quais se projetam ao longo de todo o processo civil atualmente vigente.
No âmbito do atual processo civil, conforme expende Teixeira de Sousa, “as partes repartem com o tribunal o domínio sobre o processo e elas próprias são consideradas uma fonte de informações relevantes para a decisão da causa; - as partes e terceiros estão obrigados a um dever de cooperação com o tribunal; - a legitimação da decisão depende da sua adequação substancial e não apenas da sua correção formal; - as regras processuais podem ser afastadas ou adaptadas quando não se mostrem idóneas para a justa composição do litígio”[4].
Não obstante a referida mudança de paradigma que informa o atual processo civil nacional e o papel (ativo) que nele é reservado ao juiz, certo é que, conforme antedito, os princípios do dispositivo e do contraditório continuam a constituir princípios nucleares e estruturantes do processo civil nacional.
Debruçando-nos sobre o princípio do dispositivo, podendo as partes dispor dos direitos de natureza privada que a lei substantiva lhes reconhece, nos termos do n.º 1 do art. 3º do CPC (a que se reportam todas as disposições legais que se venham a citar sem menção em contrario), o tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a ação pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes.
Deste modo, por via do princípio do dispositivo, salvo situações excecionalíssimas em que, atenta a especial relevância da natureza dos direitos em jogo (que demanda o afastamento daquele princípio regra, impondo o princípio da oficiosidade - v.g. fixação, no âmbito da ação de divórcio e separação sem consentimento do outro cônjuge de um regime provisório de alimentos, quanto à regulação das responsabilidades parentais dos filhos, e quanto à utilização da casa de morada da família – art. 931º, n.º 7 -, fixação de alimentos provisórios a favor de menores – art. 2007º, n.º 1 do CC -, etc.), por princípio, o tribunal apenas pode dirimir os litígios que lhe sejam solicitados pelos interessados ou por quem detenha legitimidade extraordinária ou indireta, incluindo certos casos em que essa legitimidade é atribuída ao Ministério Público[5].
Acresce que, por via do princípio do dispositivo, além do processo, em regra, só se iniciar sob o impulso das partes, também é sobre aquelas que impende o ónus de alegar os factos concretos que constituem os específicos fundamentos (causa de pedir e exceções) que servem de base às pretensões (pedido) que pretendam que o tribunal lhes reconheça e, bem assim, formular essas pretensões.
Destarte, causa de pedir, exceções e pedido delimitam o thema decidendum  a que o tribunal se encontra adstrito, a quem não é lícito conhecer de fundamento (causa de pedir e/ou de exceção) não alegado pelas partes, salvo se se tratar de questão que seja de conhecimento oficioso, sob pena da decisão que venha a proferir ser nula por excesso de pronúncia, e tendo de nela de conhecer de todos os fundamentos (causas de pedir e exceções) que foram alegados pelas partes, sob pena de incorrer em nulidade por omissão de pronúncia, exceto se o fundamento de que não conheceu estiver prejudicado pela solução dada a outro dos fundamentos de que conheceu e decidiu (arts. 608º, n.º 2 e 615º, n.º 1, al. d)).
Na sentença, o tribunal também não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido formulado pelo autor ou pelo réu-reconvinte, sob pena de incorrer em nulidade por condenação ultra petitum (arts. 609º, n.º 1 e 615º, n.º 1, al. e)).
Deste modo, por via do princípio do dispositivo cabe ao autor alegar na petição inicial o fundamento fáctico concreto que elege e que constitui a fonte (causa de pedir) de que faz dimanar o direito a que se arroga titular e onde faz assentar a pretensão (pedido) que pretende que o tribunal lhe reconheça.
A causa de pedir consiste “no ato ou facto jurídico ou no específico vício invalidante, que constituem a fonte de que dimana o direito de que o autor (ou o réu-reconvinte) pretende fazer valer em juízo”. Tem de tratar-se, de um ato ou facto legalmente idóneo a condicionar ou a produzir o efeito jurídico que o pedido encerra. A causa de pedir é, assim, o ato ou facto, simples ou complexo, mas juridicamente relevante do qual dimana a pretensão (o pedido)[6].
Dito por outras palavras, a causa de pedir é o facto jurídico concreto, simples ou complexo, do qual emerge, por força do Direito, a pretensão deduzida pelo autor (ou pelo réu, no caso do pedido reconvencional ou da alegação de qualquer exceção). “No plano funcional ou operacional, a causa de pedir é o elemento que, com o pedido, identifica a pretensão da parte e que, por isso, ajuda a decidir a da procedência desta (mediante a prévia averiguação da sua existência, da sua validade, da sua eficácia, etc.). Constitui assim um elemento definidor do objeto da ação. Não basta, para esse efeito, saber que o autor quer que o réu lhe pague 10, 100 ou 1000. É preciso conhecer a fonte do crédito que o autor se arroga; ele quer 10, 100 ou 1000, por ser esse o montante da quantia que lhe emprestou, o preço da consulta que concedeu ou da coisa que vendeu ao réu, o valor do legado que lhe faz o autor da herança de quem o réu é o único herdeiro”[7].
Daí que, nos termos do n.º 4 do art. 581º, impenda sobre o autor o ónus de alegar na petição inicial, de forma substanciada, os factos concretos que integram previsão da norma ou normas que elegeu e de onde faz derivar o direito a que se arroga titular, ou seja, que constituem a causa de pedir em que faz assentar a pretensão que pretende lhe seja reconhecida pelo tribunal.
Por sua vez, cabe ao réu invocar na contestação as exceções que tenha por pertinentes, tendo de nela alegar, de forma substanciada, os factos concretos constitutivos dessas exceções, nomeadamente, das perentórias,  de modo a impedir, modificar ou extinguir o direito a que o autor se arroga titular perante aquele e em que faz assentar a causa de pedir de onde faz derivar o pedido que contra si formula, sob pena de ficarem precludidos esses seus direitos de defesa que não cuidou de nela (na contestação) invocar, não os podendo posteriormente alegar, exceto se se tratar de meios de defesa que sejam supervenientes, ou que a lei expressamente admita passado esse momento, ou de que se deva conhecer oficiosamente (art. 573º).
E também cabe ao autor na réplica, não sendo esta admissível, no início da audiência prévia, ou, não havendo lugar a ela, no início da audiência final (arts. 584º e 3º, n.º 4), alegar as contra exceções que pretenda opor às exceções invocadas na contestação, alegando, de forma substanciada, os factos concretos constitutivos das mesmas, sob pena de se considerarem admitidos por acordo os factos novos alegados pelo réu na contestação e que integram as exceções que aí invocou (art. 587º, n.º 1).   
Note-se que, enquanto tradicionalmente se entendia que o referido ónus da substanciação que recai sobre as partes abrangia não só os factos essenciais ou principais integrativos da causa de pedir ou das exceções por elas invocadas, mas também os factos complementares ou concretizadores, e mesmo os factos instrumentais (indiciários), na sequência da revisão ao CPC operada pela Lei n.º 41/2013, de 26/06, o autor apenas tem de alegar na petição inicial os factos essenciais constitutivos da causa de pedir que elegeu e de onde faz derivar o direito em que faz assentar o pedido (arts. 5º, n.º 1 e 552º, n.º 1, al. d)). Por sua vez, o réu, na contestação, apenas tem de alegar os factos essenciais em que se baseiam as exceções que nela invocou (arts. 5º, n.º 1 e 572º, al. c)). E o autor, na réplica, não sendo esta admissível, no início da audiência prévia ou, não havendo lugar a ela, no início da audiência final, apenas tem de alegar os factos essenciais integrativas das contra exceções que oponha às exceções invocadas pelo réu (arts. 5º, n.º 1, 587º, n.º 2, ex vi, 572º, al. c) e 3º, n.º 4), mas as partes já não têm de alegar os factos complementares, nem os instrumentais.
Com efeito, quanto aos factos complementares, independentemente da sua alegação, os mesmos serão levados ao elenco dos factos provados na sentença desde que a respetiva prova resulte da instrução da causa e as partes tenham tido oportunidade de se pronunciarem, isto é, de em audiência contraditória, produzirem prova quanto aos mesmos (art. 5º, n.º 2, al. b)). E quanto aos factos instrumentais, porque os mesmos exercem no processo uma função puramente probatória, ao indiciarem a prova (ou não) dos factos essenciais ou dos complementares, independentemente da sua alegação, os mesmos devem ser julgados provados na sentença, desde que a respetiva prova resulte da instrução da causa (art. 5º, n.º 2, al. a)), mas não em sede de elenco de factos provados, mas em sede de motivação/fundamentação do julgamento de facto, conforme o determina o n.º 4 do art. 607º, onde se estatui que: “Na fundamentação da sentença, o juiz (…), indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais(…)”.
Decorre do que se vem dizendo que, por força do princípio do dispositivo, a causa de pedir exerce uma função individualizadora do pedido e de conformação do objeto do processo, na medida em que o autor tem de alegar na petição inicial os factos essenciais integrativos da causa de pedir que elegeu e que, na sua perspetiva, lhe atribuirá o direito a que se arroga titular, onde faz assentar o pedido que formula contra o réu, assim como o último tem de alegar na contestação os factos essenciais integrativos das exceções que oponha ao direito invocado pelo réu, tendo, por sua vez, o autor de alegar na réplica, no início da audiência prévia ou no início da audiência final (nos moldes já acima concretizados) os factos essenciais das eventuais contra exceções que aí oponha às exceções invocadas pelo réu na contestação.
Na sentença, o tribunal não pode, portanto, conhecer de causa de pedir que não tenha sido invocada pelo autor na petição inicial e cujos factos essenciais não tenham sido por si alegados naquele articulado inicial, nem pode conhecer de exceção que não tenha sido alegada pelo réu na contestação e cujos factos essenciais não tenham sido por ele nela alegados, assim como não pode conhecer de contra exceção que não tenha sido invocada pelo autor na réplica, no início da audiência prévia, ou no início da audiência final (conforme for o caso) e cujos factos essenciais não tenham sido por ele aí alegados, sob pena de incorrer em nulidade por excesso de pronúncia, salvo se tratar de exceção que seja de conhecimento oficioso (mas contanto que os respetivos factos essenciais tenham sido alegados e provados), assim como tem de conhecer de todos os pedidos à luz de todas as causa de pedir que foram alegadas pelo autor na petição inicial e de todas as exceções que foram alegadas pelas partes, sob pena de incorrer em nulidade por omissão de pronúncia, salvo se o conhecimento da causa de pedir ou da exceção sobre a qual omitiu total pronúncia se encontrar prejudicado pelo conhecimento de outra questão de que decidiu.
A causa de pedir e as exceções delimitam, assim, o tema decidendum a que o tribunal vê o seu campo de instrução e cognição limitado, o qual é também delimitado pelo pedido.
O pedido é a pretensão que o autor (ou o réu-reconvinte) pretende que o tribunal lhe reconheça; “o direito que ele solicita ou requer a tutela judicial e o modo por que intenta obter essa tutela (a providência judicial requerida); o efeito jurídico pretendido pelo autor”[8].
A dedução ou formulação do pedido é essencial para que o tribunal possa dirimir o conflito de interesses que a ação pressupõe, na medida em que é através dele que o autor (e o réu reconvinte) dá a conhecer ao demandado e ao tribunal qual a concreta pretensão que pretende que este último lhe reconheça. Por isso, o autor tem de formular na petição inicial o pedido (al. e) do n.º 1 do art. 552º), impondo-se igual exigência quanto ao réu-reconvinte na reconvenção (n.º 1 do art. 552º).  
O pedido, não só conforma ou molda o objeto do processo, como condiciona o conteúdo da decisão de mérito a emitir pelo tribunal, na medida em que na sentença que venha a proferir o julgador não pode condenar em quantidade superior (em termos quantitativos) ou em objeto diverso (em termos qualitativos) do que se pedir (art. 609º, n.º 1), sob pena de incorrer em nulidade por condenação ultra petitum (al. e), do n.º 1 do art. 615º).
A definição de pedido consta do art. 581º, n.º 3, e corresponde ao efeito prático-jurídico que o autor pretende retirar da ação, pelo que mais importante que a concreta pretensão formulada pelo autor (ou pelo réu reconvinte), é o efeito prático que o mesmo pretende efetivamente obter do tribunal com a formulação do pedido que formula. Assim, porque o que releva não é o concreto pedido (a concreta fórmula/linguagem utilizada)  que o autor formula na petição inicial, mas o efeito prático que o mesmo pretende efetivamente alcançar do tribunal, não consubstancia condenação ultra petitum o conhecimento oficioso de nulidade de um negócio jurídico e a condenação do réu a restituir o que tenha recebido, se na ação tiverem sido fixados os necessários factos materiais (Assento n.º ...5), ou, em ação de impugnação pauliana, a declaração na sentença da ineficácia do ato impugnado em  relação ao autor quando este na petição inicial pediu a declaração de nulidade ou a anulação do ato jurídico impugnado (AUJ n.º 3/01).
A causa de pedir alegada pelo autor na petição inicial, complementada pela defesa que venha a ser apresentada pelas partes (exceções) e, bem assim, o pedido deduzido pelo primeiro naquele articulado base da ação, por via do princípio do dispositivo, em suma, conformam o tema decidendum a que o tribunal vê a sua atividade instrutória e decisória delimitada, o que é também uma consequência do princípio do contraditório, previsto no art. 3º.
Na verdade, ao princípio do contraditório subjaz a ideia de que repugna ao nosso sistema processual civil decisões tomadas à revelia de algum dos interessados, regra  essa que apenas sofre desvios quando outros interesses se sobreponham[9] (v. g., no âmbito dos procedimentos cautelares, quando a observância do princípio do contraditório for suscetível de pôr em risco sério o fim ou a eficácia da providência requerida – art. 366º, n.º 1 –, ou nos casos de providência cautelar de restituição provisória da posse ou de arresto, as quais são decretados sem audiência prévia do requerido – arts. 378º e 393º, n.º 1 -, em que a observância do contraditório é relegado para momento posterior ao deferimento da providência requerida).
Daí que, nos termos do art. 3º, n.º 1, parte final, no âmbito do processo civil nacional seja proibido, regra geral, ao tribunal proferir qualquer decisão quanto à resolução do conflito de interesses que a ação pressupõe e cuja resolução lhe foi pedida sem que a parte contrária réu/demandado) tenha sido devidamente chamada ao processo (o que se alcança através da citação) para deduzir, querendo, oposição, a fim de que tome conhecimento que contra ela foi proposta uma ação ou requerida uma providência, e se possa defender.
Por força do princípio do contraditório, na sua dimensão negativa de defesa, reconhece-se, assim, ao demandado não só um direito ao conhecimento que contra ele foi proposta uma ação ou requerida uma providência,  como um direito à audição antes de ser tomada qualquer decisão[10], para que possa apresentar a sua defesa, direitos esses que naturalmente apenas lhe serão assegurados quando o mesmo tenha efetivo conhecimento da concreta pretensão (pedido) que contra ele é formulada pelo demandante, mas também dos concretos fundamentos (causa de pedir) em que este fundamenta essa pretensão.
Por conseguinte, a exigência imposta ao autor de, na petição inicial, ter de alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir de que emerge o direito a que se arroga titular e de onde faz derivar a sua pretensão (pedido) e, bem assim, de nela ter de formular o pedido, além de ser uma exigência que decorre do princípio do dispositivo, também é uma decorrência do princípio do contraditório, na sua dimensão tradicional e negativa de defesa.
Acontece que o atual CPC, ao dispor, no art. 3º, n.º 3, que: “O juiz deve observar e fazer cumprir ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem”, adotou uma conceção ampla de contraditoriedade.
Ao assim estatuir, o legislador, além de continuar, no n.º 1 do art. 3º, a consagrar o princípio do contraditório na sua dimensão tradicional (negativa), adotou uma conceção ampla e positiva de contraditoriedade, ao proibir a indefesa (art. 20º, n.º 4 da C.R.P.), associado à regra do contraditório, conferindo às partes uma participação efetiva no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objeto da causa e que, em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão a ser nele proferida. E, nessa medida, ao proibir-se ao julgador a possibilidade de proferir qualquer decisão-surpresa, ainda que interlocutória, sobre qualquer questão, processual ou substantiva, de facto ou de direito, ainda que de conhecimento oficioso, sem que, previamente, tenha sido conferido às partes, especialmente àquela contra quem é dirigida, a efetiva possibilidade de a discutir, contestar e valorar[11].
Nessa conceção positiva de contraditoriedade o fundamento do princípio já não é a defesa, no sentido negativo de oposição ou resistência à atuação alheia, mas sim a influência, no sentido positivo de reconhecimento do direito das partes de influírem ativa e decisivamente no desenvolvimento e no êxito do processo[12].
Na referida conceção ampla do princípio do contraditório (defesa e influência) este tem um conteúdo multifacetado, projetando-se nas soluções legislativas adotadas ao longo de todo o processo civil e inspirando a interpretação e aplicação dessas soluções, entre as quais se contam os limites acima já enunciados à atividade instrutória e decisória do tribunal, que lhe veda a possibilidade de conhecer de causa de pedir e/ou de exceção que não tenham sido invocadas, respetivamente, na petição pelo autor e pelas partes nos seus articulados (nos moldes acima já enunciados) e cujos factos essenciais não tenham sido por eles aí alegados, nem pode condenar em pedido quantitativamente superior ou qualitativamente diferente do que tiver sido pedido pelo autor na petição inicial ou pelo réu-reconvinte na reconvenção.
Assentes nas premissas que se acabam de enunciar, revertendo ao caso dos autos, o recorrido AA, instaurou a presente ação de despejo contra CC (1ª Ré) e a recorrente DD (2ª Ré) pedindo que se declarasse resolvido o contrato de arrendamento que celebrou com a 1ª Ré e que, consequentemente, se condenasse ambas as Rés a despejarem imediatamente o arrendado, restituindo-o àquele livre e devoluto, nas condições em que o receberam, e, bem assim, a pagar-lhe as rendas vencidas e não pagas, no montante global de 2.440,00 euros, acrescidas de juros de mora, bem como as que se viessem a vencer desde a propositura da ação até ao trânsito em julgado da sentença que declarasse resolvido o contrato de arrendamento, bem como o respetivo valor mensal, a título de indemnização, desde o trânsito em julgado da sentença até à efetiva entrega do arrendado.
Como causa de pedir o Autor alegou, na petição inicial, o seu direito de propriedade sobre o prédio constituído pela fração ..., inscrito na matriz predial urbana da União de Freguesias ..., ... e ... (... e ...), do concelho ..., sob o art. 4º, e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...19.../...; a celebração com a 1ª Ré (CC) de um contrato de arrendamento escrito, em 01/11/2021, mediante o qual lhe arrendou a dita fração, para que nela explorasse a atividade de café (finalidade essa que, posteriormente, veio a ser alterada para exploração de salão de cabeleireiro), mediante o pagamento de uma renda mensal de 220,00 euros; o não pagamento pelas Rés de 20,00 euros da renda do mês de março de 2022, e a totalidade das rendas dos meses de abril a dezembro de 2022 e de janeiro e fevereiro de 2023, num total de 2.240,00 euros.
Deste modo, os pedidos que o recorrido (Autor) formulou na petição inicial assentam, isto é, têm como causa de pedir, em função dos factos essenciais que o mesmo alegou naquele articulado base da presente ação, o contrato de arrendamento que alegou ter celebrado com a 1ª Ré, CC, mediante o qual lhe deu de arrendamento, em 01 de novembro de 2021, o prédio urbano constituído pela fração ..., mediante uma contrapartida mensal (renda) de 220,00 euros, e o incumprimento desse contrato decorrente de não lhe ter sido pago 20,00 euros da renda do mês de março de 2022 e a totalidade das rendas dos meses de abril a dezembro de 2022 e de janeiro e fevereiro de 2023.
O princípio da eficácia relativa dos contratos, consagrado no art. 406º do CC, estabelece que os contratos apenas produzem efeitos jurídicos entre as partes contratantes, não produzindo efeitos em relação a terceiros, salvo os casos especialmente previstos na lei (n.º 2, daquele art. 406º)[13].
Por sua vez, sendo a locação o contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário de uma coisa, mediante retribuição (art. 1022º do CC), alegando o recorrido, nos arts. 7º  a 9º da p.i., que “por contrato escrito, celebrado em ../../2021, o Autor deu de arrendamento à primeira Ré, com prazo certo, para atividade/exploração de café, a fração autónoma identificadas pelas letras ... (…), pelo prazo de dois anos, com início em ../../2021 e termos em 31 de outubro de 2023, sendo as suas prorrogações de um ano no caso de não ser denunciado por qualquer das partes para o seu termo”, mediante uma “renda inicial que ainda se mantém, de 220,00 euros”,  impõe-se concluir que, em função da causa de pedir por ele alegada, no contrato de arrendamento celebrado figura como senhorio o próprio recorrido AA, e como arrendatária a 1ª Ré CC.
Nos termos desse contrato foi a 1ª Ré, enquanto arrendatária, quem se obrigou a pagar a renda nele prevista como contrapartida do gozo temporário do locado que o recorrido lhe proporcionou e que, por isso, incorreu no invocado incumprimento do mesmo ao não pagar as rendas vencidas, causa essa em que aquele filia o direito à resolução desse contrato, assim como a restituição do prédio arrendado, bem como os créditos de rendas e a indemnização que reclama na petição inicial.
Quanto à recorrente (2ª Ré) DD, salvo o devido respeito por opinião contrária, o recorrido não alegou, na petição inicial, nenhuma causa de pedir  que lhe confira o direito a obter a condenação daquela a despejar imediatamente o arrendado, entregando-o livre e devoluto, bem como a pagar-lhe as rendas vencidas e não pagas e, bem assim, as que se viessem a vencer desde a propositura da ação até ao trânsito em julgado da sentença que declarasse resolvido o contrato de arrendamento, assim como as quantias indemnizatórias que dela peticiona. Ou seja, em síntese, para formular os pedidos que deduz nas als. b) e c) do petitório contra a recorrente, a petição inicial é absolutamente destituída de causa de pedir.
Acontece que a recorrente DD, contestou a presente ação, alegando que o recorrido AA, por acordo verbal, lhe arrendou o prédio urbano constituído pela fração ..., em finais de 2021, mediante a renda mensal de 220,00 euros (cfr. pontos 2º a 5º da contestação).  Invocou a exceção de não cumprimento do contrato, alegando que aquele lhe deu de arrendamento a dita fração para que nela exercesse a atividade de cabeleireiro, mas que se obrigou a regularizar a situação do locado junto da Câmara Municipal ..., de modo a que fosse emitido o alvará de utilização para o exercício dessa atividade, o que não fez, o que, na sua perspetiva, lhe conferiu (e confere) o direito a recusar o pagamento da renda enquanto o recorrido não obtivesse a autorização camarária para que possa operar na fração a atividade de cabeleireiro, concluindo pela improcedência da ação.
Deduziu reconvenção, pedindo a condenação do recorrido-reconvindo AA a obter o alvará de utilização correspondente à atividade de cabeleireiro e, bem assim, a reduzir o contrato de arrendamento que com ela celebrou, a escrito.
Na réplica, o recorrido AA, impugnou, além do mais, que tivesse celebrado qualquer contrato de arrendamento com a recorrente DD, alegando expressamente que “apenas celebrou com a Ré, CC, o contrato de arrendamento junto com a petição inicial. Não tendo efetuado com a reconvinte, DD, qualquer contrato de arrendamento para o gozo da fração, identificada pelas letras ..., mediante a contrapartida mensal de 220,00 euros” (cfr. pontos 22º e 23º da réplica).
Deste modo, o único contrato de arrendamento que o recorrido AA alegou na petição inicial ter sido incumprido e em cujo incumprimento fez assentar os diversos pedidos que aí formulou foi o celebrado com a 1ª Ré CC, em 01 de novembro de 2021, sendo este também o único contrato que o mesmo pretende que o tribunal declare resolvido – cfr. alínea a) do petitório – e em cujo incumprimento filia os pedidos condenatórios que formula sob as alíneas b) e c) do petitório.
Ora, ao declarar na sentença recorrida cessado o contrato de arrendamento celebrado entre o recorrido (Autor AA) e a recorrente (2ª Ré DD), relativo à fração ..., e ao condenar a última a restituir-lhe a dita fração, completamente livre e desocupada, bem como ao condená-la a pagar-lhe as rendas vencidas e não pagas, bem como, as vincendas, desde a propositura da ação até ao trânsito em julgado da sentença e, bem assim, a quantia de 220,00 euros, a título de indemnização, desde o trânsito em julgado da sentença até à restituição da fração, a 1ª Instância condenou em objeto qualitativamente diverso do pedido formulado pelo recorrido na petição inicial, ao declarar resolvido um contrato de arrendamento  (o celebrado entre o recorrido e a recorrente DD) que não é aquele cuja resolução vem pedida pelo mesmo na petição inicial (onde pede a resolução do contrato de arrendamento que celebrou com a 1ª Ré CC), o que, nos termos dos arts. 609º, n.º 1 e 615º, n.º 1. al. e) do CPC, determina a nulidade da sentença recorrida, na parte de que a recorrente recorre, por condenação ultra petitum.
 Ademais, ao condenar a recorrente na restituição do arrendado ao recorrido e, bem assim, a pagar-lhe as rendas, juros de mora, e a indemnização, tudo conforme consta das alíneas b) a d) da parte dispositiva da sentença, a 1ª Instância condenou a recorrente com base numa causa de pedir (o incumprimento do contrato de arrendamento que celebrou com o recorrido AA) que não é a que foi alegada na petição inicial como fundamento para esses pedidos condenatórios (o incumprimento pela 1ª Ré CC do contrato de arrendamento que com esta celebrou), o que, nos termos do disposto nos arts. 608º, n.º 2, parte final, e 615º, n.º 1, al. d), parte final, do mesmo Código, também determina a nulidade da sentença por excesso de pronúncia.
Resulta do excurso antecedente, proceder o fundamento de recurso acabado de analisar, impondo-se anular a sentença recorrida no segmento em que nela se declarou cessado o contrato de arrendamento celebrado entre a recorrente, DD, e o recorrido, AA, e, em consequência, a condenou a restituir ao último o locado, completamente livre e desocupado de pessoas e bens, bem como, a pagar-lhe a quantia de 2.240,00 euros, a título de rendas vencidas e não pagas desde março de 2022 até à entrada da presente ação em juízo, e as que se venceram (e vencerem) desde a data da entrada em juízo da presente ação até ao trânsito em julgado da sentença recorrida, acrescidas de juros de mora até efetivo e integral pagamento e, bem assim, a pagar-lhe a quantia de 220,00 euros mensais, a título de indemnização, desde o trânsito em julgado da sentença até à restituição do imóvel ao recorrido (ou seja, do decidido nas als. a) a d) da parte dispositiva da sentença sob sindicância) por condenação ultra petitum e também por excesso de pronúncia.
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B- Da superação do vício da nulidade que afeta a sentença recorrida  
 
Prescreve o art. 665º, n.º 1 do CPC que: “Ainda que declare nula a decisão que põe termo ao processo, o tribunal de recurso deve conhecer do objeto da apelação”.
Decorre da previsão acabada de transcrever que a anulação da sentença não tem como efeito invariável a remessa do processo para a 1ª Instância, mas antes é imposto ao tribunal de recurso que supra esse vício e conheça do restante objeto do recurso, exceto se não dispuser dos elementos necessários  que lhe permitam esse conhecimento com a necessária segurança[14].
No caso dos autos, tendo a recorrente, na contestação, alegado que, por acordo verbal celebrado em finais de 2021, o recorrido AA, por intermédio da sua procuradora, BB, lhe proporcionou o gozo do prédio urbano constituído pela fração ..., com vista à exploração, por esta, de um salão de cabeleireiro, mediante a obrigação de a mesma lhe pagar, como contrapartida, a quantia mensal de 220,00 euros (cfr. pontos 2º a 5º da contestação, fls. 65 do processo físico), tendo pago ao recorrido, a título de renda: em 13/12/2021, a quantia de 220,00 euros; em 24/01/2022, a quantia de 220,00 euros; em 07/03/2022, a quantia de 220,00 euros; e em 19/04/2022, a quantia de 200,00 euros (cfr. ponto 10º da contestação, fls. 65 verso do processo físico), constata-se que essa facticidade veio a ser julgada provada na sentença sob sindicância (pontos 6º e 12º dos factos provados).
Acontece que a 1ª Instância veio a julgar que a recorrente, DD, incumpriu o contrato de arrendamento que celebrou com o recorrido e, em consequência, declarou cessado o mesmo e  condenou-a a restituir-lhe o locado, completamente livre e desocupado de pessoas e bens, e, bem assim, a pagar-lhe as rendas vencidas e não pagas, no montante de 2.440,00 euros, e as que se venceram (e vencerem) desde a propositura da presente ação até ao trânsito em julgado da sentença, acrescidas de juros de mora, bem como, a pagar-lhe a quantia mensal de 220,00 euros, a título de indemnização, desde o trânsito em julgado da sentença até à efetiva restituição do locado.
Na petição inicial o recorrido não pediu que se declarasse resolvido o contrato de arrendamento que celebrou com a recorrente, mas sim aquele que celebrou com a 1ª Ré, CC (cfr. alínea a) do pedido – fls. 7 verso do processo físico), e também não alicerçou os restantes pedidos que aí formulou sob as alíneas b) e c) no incumprimento pela recorrente do contrato de arrendamento que celebrou com esta, mas antes no incumprimento pela 1ª Ré CC do contrato de arrendamento que celebrou com a última.
Daí que se imponha julgar a presente ação totalmente improcedente quanto à recorrente DD e, em consequência, absolvê-la de todos os pedidos que contra ela foram formulados pelo recorrido AA.

C- Do restante objeto do recurso – prejudicado.

O conhecimento do restante objeto do recurso (supra identificado nas als. b), c) e d) em “II-Do objeto do Recurso”) encontra-se prejudicado.
Com efeito, a recorrente deixou por sindicar o segmento da sentença recorrida em que se julgou a ação totalmente improcedente quanto à 1ª Ré, CC, e, em consequência, se absolveu a última de todos os pedidos (nem se vislumbra que dispusesse de legitimidade para recorrer desse segmento decisório, uma vez que a dita decisão de absolvição da 1ª Ré não acarreta qualquer prejuízo direto para a esfera jurídica da recorrente, pelo que não dispõe da qualidade de “vencida” quanto a esse segmento decisório, exigida pelo art. 631º), pelo que esse segmento encontra-se transitado em julgado.
A recorrente também não sindicou o segmento da sentença recorrida em que se julgou a reconvenção que deduziu totalmente improcedente e, em consequência, se absolveu o recorrido-reconvindo de todos os pedidos reconvencionais que contra ele formulou, pelo que esse segmento decisório está igualmente transitado em julgado.
O único segmento decisório da sentença recorrida de que a recorrente interpôs recurso (a parte em que nela se julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, se declarou a cessação do contrato de arrendamento celebrado entre aquela e o recorrido, com os efeitos que derivam dessa declaração, a saber: a condenação da recorrente a entregar ao recorrido o locado livre de pessoas e bens, bem como, a pagar-lhe a quantia de 2.440,00 euros, a título de rendas vencidas, bem como, as vincendas, acrescidas de juros de mora, e a quantia de 220,00 euros, a título de indemnização, desde o trânsito em julgado da sentença até à restituição efetiva do locado ao recorrido) foi anulada por esta Relação com fundamento em condenação ultra petitum e também por excesso de pronúncia. E em superação dessa nulidade, esta Relação absolveu a recorrente dos pedidos que contra ela foram formulados pelo recorrido. 
Daí que a apreciação dos restantes fundamentos de recurso consubstancie uma atividade absolutamente inútil, por ser insuscetível de se projetar na decisão de mérito e, como tal, proibida por lei, nos termos do art. 130º do CPC.
Com efeito, a pretensa nulidade da al. c), do n.º 1, do art. 615º que a recorrente assaca à sentença sob sindicância decorre da circunstância de nela ocorrer uma pretensa ambiguidade e obscuridade  entre a facticidade julgada provada sob o ponto 4º e a que foi julgada não provada sob a alínea a), o que, salvo o devido respeito por entendimento contrário, não se reconduz a qualquer causa determinativa de nulidade da sentença, nomeadamente, da que vem invocada pela recorrente, mas antes um alegado erro de julgamento da matéria de facto decorrente da facticidade julgada provada pela 1ª Instância no ponto 4º estar pretensamente em contradição com a que julgou não provada na alínea a).
Sucede que, a propósito da impugnação do julgamento da matéria de facto operada pelo recorrente é pacífico o entendimento jurisprudencial de que o tribunal de recurso deve abster-se de apreciar essa impugnação, quando, independentemente do resultado que dela decorra, de acordo com as várias soluções plausíveis de direito suscetíveis de serem aplicadas ao caso em apreciação, esse resultado ser insuscetível de se projetar na decisão de mérito nele a proferir (o que, conforme acabado de demonstrar, é a situação dos autos), determinando uma decisão de mérito distinta da proferida, sob pena de se estar a levar a cabo uma atividade processual que de antemão se sabe ser inútil e inconsequente[15].
Por sua vez, quanto ao erro de direito que a recorrente assaca à decisão de mérito constante da sentença, no que tange à decisão da 1ª Instância que julgou improcedente a exceção perentória de não cumprimento do contrato por ela invocada na contestação, esta suscita esse pretenso erro de direito como forma de ser absolvida do pedido condenatório formulado pelo recorrido a pagar-lhe as rendas vencidas e vincendas e a indemnização em que foi condenada pela 1ª Instância.
Ora, tendo a recorrente sido absolvida por esta Relação de todos os pedidos que contra ela foram formulados pelo recorrido (pelos fundamentos acima sobejamente explanados), naturalmente que a apreciação desse pretenso erro de direito que afetará a decisão de mérito constante da sentença encontra-se prejudicada.
O que se acaba de dizer mostra-se igualmente válido quanto ao pretenso erro de direito que afetará a sentença recorrida, decorrente de nela a 1ª Instância não ter declarado nulo o contrato de arrendamento verbal que celebrou com o recorrido, por vício de forma, na medida em que aquela apenas invoca, em sede de recurso, esse alegado erro de direito com vista a ser absolvida das condenações de que foi alvo na sentença recorrida (cfr. conclusão XXI das alegações de recurso, em que expressamente diz: “Sem prejuízo do exposto, para a hipótese de improcedência dos fundamentos expostos, o que por mera cautela se equaciona, é também fundamento do presente recurso, a nulidade do contrato de arrendamento celebrado entre o Autor/Recorrido e a 2ª Ré/Recorrente”.  
Destarte, sem mais, por desnecessárias, considerações, declara-se prejudicado o conhecimento dos restantes fundamentos de recurso.
 Decorre do exposto, impor-se julgar o presente recurso procedente e, em consequência, anular a sentença recorrida no segmento em que nela se declarou cessado o contrato de arrendamento celebrado entre a recorrente, DD, e o recorrido, AA, e, em consequência, a condenou a restituir ao último o locado, completamente livre e desocupado de pessoas e bens, bem como, a pagar-lhe a quantia de 2.240,00 euros, a título de rendas vencidas e não pagas desde março de 2022 até à entrada da presente ação em juízo, e as que se venceram (e vencerem) desde a data da entrada em juízo da presente ação até ao trânsito em julgado da sentença recorrida, acrescidas de juros de mora até efetivo e integral pagamento e, bem assim, a pagar-lhe a quantia de 220,00 euros mensais, a título de indemnização, desde o trânsito em julgado da sentença até à restituição do imóvel ao recorrido (ou seja, do decidido nas als. a) a d) da parte dispositiva da sentença sob sindicância) por condenação ultra petitum e também por excesso de pronúncia. Suprindo a nulidade cometida, impõe-se julgar a presente ação improcedente e, em consequência, absolver a recorrente, DD, de todos os pedidos que contra a mesma foram deduzidos pelo recorrido (Autor).
*
(....)
V- Decisão

Nesta conformidade, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar o presente recurso procedente e, em consequência:
I- Declaram nula, por condenação ultra petitum e por excesso de pronúncia o segmento decisório da sentença recorrida que declarou cessado o contrato de arrendamento celebrado entre a recorrente, DD, e o recorrido, AA, e, em consequência, a condenou a restituir ao último o locado, completamente livre e desocupado de pessoas e bens, bem como, a pagar-lhe a quantia de 2.240,00 euros, a título de rendas vencidas e não pagas desde março de 2022 até à entrada da presente ação em juízo, e as que se venceram (e vencerem) desde a data da entrada em juízo da presente ação até ao trânsito em julgado da sentença recorrida, acrescidas de juros de mora até efetivo e integral pagamento e, bem assim, a pagar-lhe a quantia de 220,00 euros mensais, a título de indemnização, desde o trânsito em julgado da sentença até à restituição do imóvel ao recorrido (ou seja, a totalidade do decidido nas als. a) a d) da parte dispositiva da sentença sob sindicância);
II- Suprindo as nulidades que afetam a sentença recorrida referidas em I), julgam a presente ação improcedente quanto à recorrente (2ª Ré) DD e, em consequência, absolvem-na de todos os pedidos que contra ela foram formulados pelo recorrido (Autor).
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Custas em ambas as instâncias (quanto à ação e ao recurso) pelo recorrido AA, uma vez que ficou “vencido”, não só na ação que propôs, onde ambas as Rés acabaram por ser absolvidas de todos os pedidos que formulou, como também ficou “vencido” no presente recurso (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
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Notifique.
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Guimarães, 28 de novembro de 2024

José Alberto Moreira Dias – Relator
Maria Gorete Morais – 1ª Adjunta
João Peres Coelho – 2º Adjunto 
 

[1] Ferreira de Almeida, “Direito Processual Civil”, vol. II, 2015, Almedina, págs. 395 e 396.
[2] Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2017, 4ª ed., Almedina, pág. 147; Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. I, 2ª ed., Almedina, pág. 789; Abílio Neto, “Novo Código de Processo Civil Anotado”, 2ª ed., janeiro/2014, Ediforum, págs. 773  a 776 e múltipla jurisprudência aí citada.
[3] Teixeira de Sousa, “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, Lex, Lisboa 1997, pág. 62.
[4] Teixeira de Sousa, ob. cit., pág. 59.
[5] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, ob. cit., págs. 18 e 19; Manuel de Andrade, “Noções Elementares de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1979, págs. 373 e 374, que ainda imbuído da conceção tradicional e liberal do princípio do dispositivo, defende que o princípio em causa significa que são “as partes que dispõem do processo, como da relação jurídica material. O processo é coisa ou negócio das partes (conceção privatística, contratualista ou quase-contratualista do processo). É uma luta, um duelo entre as partes, que apenas tem de decorrer segundo certas normas. O juiz arbitra a pugna, controlando a observância dessas normas e assinalando e proclamando o resultado (conceção duelística ou «guerresca» do processo. Donde a inércia, inatividade ou passividade do juiz, em contraste com a atividade das partes. Donde também que a sentença procure e declare a verdade formal (intra-processual) e não a verdade material (extra-processual)”. Embora a referida conceção liberal do princípio do dispositivo defendida pelo autor se encontre atualmente ultrapassada em face do CPC vigente, o certo é que as consequências que o mesmo autor retira do princípio do dispositivo continuam plenamente válidas no âmbito do atual processo civil nacional. Assim, como expende o mesmo autor, do princípio do dispositivo resultam as seguintes consequências jurídicas: “a) O processo só se inicia sob o impulso da parte (Autor, etc.), mediante o respetivo pedido, e não sob o impulso do próprio juiz: nemo judex sine actore, ne judez procedat ex-officio. A isto se chama, por vezes, o princípio do pedido; b) As parte é que – através do pedido e da defesa – circunscrevem o thema decidendum. O juiz não tem que saber se, porventura, à situação das partes conviria melhor outra providência que não a solicitada, ou se esta poderia fundar-se noutra causa petendi. É a doutrina da máxima: ne eat judex ultra vel extra petita partium. Alguns (Calamandrei) falam aqui de correspondência entre o requerido e o pronunciado. c) Tal como para instauração do processo se exige o pedido da parte (impulso processual inicial; supra a)), também o seu andamento ulterior depende de solicitação das partes (impulso processual subsequente). O desenvolvimento do processo tem de ser continuamente estimulado pelas partes (ne judex procedat ex-officio). d) As partes podem pôr termo ao processo (desistência da instância) e determinar o conteúdo da sentença de mérito (confissão, desistência do pedido e transação). e) A adução do material de facto a utilizar pelo juiz para a decisão do litígio só compete às partes. A estas é que corresponde proporcionarem ao juiz, mediante as suas afirmações de facto e as provas que tragam ao processo, a base factual da decisão. Ao juiz não é consentido indagar de modo autónomo a verdade. Só pode ter em conta os factos alegados pelas partes”.
[6] Ferreira de Almeida, ob. cit., págs. 69 e 70.
No mesmo sentido, Paulo Pimenta, “Processo Civil Declarativo”, 2014, Almedina, págs. 136 e 137, em que se lê que, “relativamente ao autor, é na petição inicial que este deve dar cumprimento ao ónus de alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir, isto é, todos aqueles de cuja verificação depende a procedência da pretensão deduzida. É na causa de pedir, melhor dito, nos factos que a constituem que o autor estriba ou sustenta o pedido formulado. Tais factos, na expressão de Lebre de Freitas, são “todos aqueles que integram a previsão da norma ou das normas materiais que estatuem o efeito pretendido”. A causa de pedir tem, pois, um substrato fáctico cuja alegação compete ao autor, de modo a fundamentar a sua pretensão. É, muito por isso que se usa falar-se em narração: o autor deverá expor (narrar) o quadro factual atinente ao tipo legal de que pretende prevalecer-se na ação instaurada. Tal narração fáctica envolverá a alegação e a descrição, por exemplo, dos concretos factos relativos à celebração do negócio de compra e venda de um bem por via do qual o autor ficou credor do preço sobre o réu, …”.
[7] Antunes Varela, RLJ, 121º, págs. 147 e segs.
[8] Manuel de Andrade, ob. cit., pág. 111.
[9] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, ob. cit., pág. 18.
[10] Teixeira de Sousa, ob. cit., pág. 47.
[11] Ac. RC. de 20/09/2016, Proc. 1215/14.0TBPBL-B.C1, in base de dados da DGSI, onde constam todos os acórdãos que se venham a identificar, sem menção em contrário.
[12] Lebre de Freitas, ob. cit., págs. 96 e 97.
[13] Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado”, vol. I, 4ª ed., Coimbra Editora, pág. 373.
[14] Abrantes Geraldes, ob. cit., pág. 332, onde sustenta: “O art. 665º abarca outro tipo de nulidades, ou seja, as nulidades da sentença que se manifestam essencialmente através da falta de especificação dos fundamentos de facto ou de direito, verificação de oposição entre os fundamentos de facto ou de direito e a decisão, omissão de pronúncia ou condenação em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido (art. 615º, n.º 1), sendo este apreciado pela Relação. Porém, ainda que a Relação confirma a arguição de alguma das referidas nulidades da sentença, não se limita a reenviar o processo para o tribunal a quo. Ao invés, deve prosseguir com a apreciação das demais questões que tenham sido suscitadas, conhecendo do mérito da apelação, nos termos do art. 665º, n.º 2. Deste modo, a anulação da decisão (v.g., por contradição de fundamentos ou por omissão de pronúncia) não tem como efeito invariável a remessa imediata do processo para o tribunal a quo, devendo a Relação proceder à apreciação do objeto do recurso, salvo se não dispuser dos elementos necessários. Só nesta eventualidade se justifica a devolução do processo para o tribunal a quo”.
No mesmo sentido Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, ob. cit., pág. 830.
[15]Acs. STJ., de 17/05/2017, Proc. 4111/13.4TBBRG; RG., de 09/04/2015, Proc. 4649/11.8TBRG.G1; 18/12/2017, Proc. 3892/16.8TBRG.G1; RL., de 10/1072017, Proc. 23656/15.5T8SNT.L1-7; RC., de 27/5/2014, Proc. 104/12.0T2AVR.C1; e de 24/04/2012, Proc. 219/10.6T2VGS.C1.