Efetuada pelo tribunal a quo consulta eletrónica de elementos processuais de um outro processo via citius, com base na qual julga provados factos essenciais para o conhecimento do mérito dos autos, sem que do resultado de tal consulta dê conhecimento às partes, ocorre a violação do principio do contraditório consagrado no artigo 3º nº 3 do CPC.
Violação geradora de nulidade da decisão proferida.
Relatora – M. Fátima Andrade
Adjunto – António Mendes Coelho
Adjunta – Anabela Mendes Morais
Tribunal de Origem do Recurso – T J Comarca do Porto – Jz. Execução do Porto
Apelante/ “A..., STC, S.A.”
Sumário (artigo 663º nº 7 do CPC):
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Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto
I - Relatório
1- Por apenso à execução contra si instaurada por “A..., STC, S.A.” deduziu o executado AA embargos de executado, requerendo pela sua procedência que seja declarada a “nulidade da citação em sede de injunção ser dada como provada prosseguindo os presentes autos para arquivada por falta de título executivo que fundamente a sua manutenção.
Nulidades que se reclamam ainda quanto ao titulo executivo na medida em que não prova de forma inequívoca a causa de pedir fazendo prova de todo o desenvolvimento creditório desde o seu inicio omitindo elementos fundamentais no que tange à matéria fática ora em execução.”
Para tanto e em suma alegou o embargante:
- Vir demandado com base em título executivo proveniente de injunção, na qual não foi notificado.
Sendo como tal nulo o título executivo, bem como a decisão em sede de injunção por falta de citação.
- Mais alegou desconhecer a cessão de créditos com base na qual a exequente invoca ser credora. Bem como impugnou a existência do crédito exequendo e respetivo valor liquidado.
Imputando finalmente à exequente uma postura abusiva e até usurária, nos termos em que alegou no seu requerimento de embargos.
2- Notificada a embargada para contestar impugnou, em suma, o alegado.
Quer quanto à arguida nulidade de não notificação, cuja improcedência defendeu.
Quer quanto à dívida exequenda, cujo valor defendeu.
Tendo concluído pela total improcedência dos embargos.
“O embargante foi devidamente notificado da Injunção, tendo sido cumpridas todas as formalidades legais, nos termos do disposto no Artigo 12.º do Anexo ao DL 269/98, conforme documentos que se requer a V. Exa que seja oficiado o Balcão Nacional de Injunções para vir aos autos juntar, os quais desde já se dão por integralmente reproduzidos para os devidos e legais efeitos.”
3- Foi proferido saneador sentença, no qual e conhecendo-se da arguida nulidade relativa ao processo de injunção de não notificação, se decidiu:
“Pelo exposto e ao abrigo dos arts. 729º, al. d), 191º, nº 1, 857º, nº 1 e 732º, nº 4, todos do Código de Processo Civil, julgo procedente a arguida nulidade da notificação em causa, efetuada em sede do procedimento de injunção, em consequência do que determino a absolvição do aqui embargante/executado da instância executiva e, por força da mesma, determino a extinção da execução de que estes autos constituem um apenso.”
Para o efeito tendo o tribunal a quo declarado assente a factualidade que infra se identificará “Com base no teor dos documentos infra referidos consignando-se que procedi à consulta do processo injunção em causa através do sistema “citius”[1], e por acordo das partes (…)”
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“Conclusões
A. Vem o presente recurso interposto da Sentença que decidiu pela dispensa da audiência prévia e proferiu decisão surpresa de mérito sem notificar previamente as partes para qualquer pronúncia, quer sobre a dispensa da audiência prévia quer sobre que pretendia conhecer de imediato sobre o mérito da causa.
B. Com todo o respeito que nos merece a opinião contrária espelhada na sentença recorrida, e com a devida vénia, não pode a recorrente conformar-se com a mesma.
C. Isto porque, pese embora a audiência prévia possa ser dispensada, o Tribunal a quo deve ouvir previamente as partes com indicação das razões pelas quais entende dever dispensar a realização de tal ato processual, o que não ocorreu.
D. Acresce que, de igual modo, o Tribunal a quo proferiu saneador-sentença sem que tenha sido precedido de despacho a convidar as partes para se pronunciarem sobre a intenção de conhecer de imediato do mérito da causa no referido despacho saneador.
E. Ante a essa omissão, não foi dada a oportunidade das partes pronunciarem sobre os fundamentos de facto e de direito para o conhecimento do mérito da causa.
F. O Tribunal deve respeitar e fazer observar o princípio do contraditório ao longo de todo o processo, não sendo lícito ao juiz conhecer de questões de mérito sem dar a oportunidade às partes de, previamente, sobre elas se pronunciarem, sendo proibidas as denominadas decisões-surpresa.
G. O Tribunal a quo proferiu uma decisão surpresa.
H. A omissão das notificações prévias para pronúncia constitui uma inobservância do contraditório, o que é uma omissão grave e representa uma nulidade processual, sempre que tal omissão seja suscetível de influir no exame ou na decisão da causa, o que ocorreu.
I. Cometeu assim o tribunal a quo uma nulidade, traduzida na omissão de um ato que a lei prescreve.
J. A nulidade acima referida se transmite diretamente para a decisão recorrida, acarretando a nulidade também desta última tanto pela omissão de um ato que a lei prescreve, quanto pelo excesso de pronúncia, uma vez que o Tribunal a quo conheceu de matéria que, abarcada pela omissão do dever de permissão do contraditório às partes, não poderia conhecer.
K. Termos em que, deve a sentença recorrida ser considerada nula.
L. Ainda que assim não se entenda, sem prescindir nem conceber, a sentença é nula porquanto considera provados factos por acordo, os quais, com o devido respeito a opinião diversa, devem ser provados por documentos, os quais devem estar carreados nos autos.
M. A sentença recorrida refere que procedeu à consulta do processo Injunção em causa através do sistema “citius”, e por acordo das partes, julgou assentes os factos.
N. Acontece que, não foram carreados para os autos os documentos constantes no procedimento de Injunção, comprovativos da citação do recorrido, nem foi oficiado o Balcão Nacional de Injunções para o efeito.
O. Assim, entende a recorrente que os autos não estão munidos de todos os elementos necessários a promover a justa composição da causa e dar como assentes os factos sem prova junta aos autos é conceder ao princípio da eficácia extraprocessual das provas uma amplitude não permitida.
P. Pese embora a recorrente aceite os documentos existentes no procedimento de Injunção como prova da citação, a verdade é que tais documentos devem, com o devido respeito, ser carreados aos autos para efeito de serem considerados como prova “produzida”, termos em que, não estando nos autos, há insuficiência de prova.
Q. A recorrente requereu na Contestação apresentada que, no seu requerimento probatório, estivessem incluídos os “documentos comprovativos da notificação do embargado no procedimento de Injunção n.º 129014/16.0YIPRT, os quais se requereu ofício ao Balcão Nacional de Injunções para vir juntar aos autos.”, nos termos do disposto no art. 432.º do CPC, por serem documentos em poder de terceiro (o BNI).
R. É certo que há uma aceitação das partes quanto ao facto de que a citação ocorreu pelo Balcão Nacional de Injunções, porém, não estão as partes de acordo sobre se foram ou não cumpridas as formalidades da citação e nem discutiram as partes os termos em que foi efetuada a citação.
S. Sem prescindir, refere o douto Tribunal a quo que a citação é nula porque não poderia ter sido efetuada por carta simples por não haver domicílio convencionado.
T. Acontece que, pese embora não houvesse domicílio convencionado, o Balcão Nacional de Injunções seguiu os trâmites legais para a notificação do recorrido e a notificação por carta simples nestes casos também é permitida, dentro dos pressupostos do diploma legal.
U. Refere a douta sentença recorrida que foi primeiro tentada a citação por carta registada e que, resultando frustrada, a secretaria do Banco Nacional de Injunções procedeu às pesquisas das moradas nas bases de dados existentes para o efeito e posteriormente enviou carta simples.
V. Resulta do diploma legal que, na falta de domicílio convencionado, a notificação do Requerimento de Injunção far-se-á por carta registada com aviso de receção ou por agente de execução ou mandatário judicial e que, no caso de se frustrar as formas de notificação atrás referidas, a secretaria obterá informação sobre residência, local de trabalho, sede ou local onde funciona normalmente a administração do notificando, nas bases de dados dos serviços de identificação civil, da segurança social, da Direção-Geral dos Impostos e da Direção Geral de Viação.
W. Após efetuar as pesquisas, nos termos do disposto nos números 4 e 5 do art.º 12º do DL 269/98, a secretaria procederá à notificação do requerido mediante o envio de carta simples para o endereço ou cada um dos endereços constantes das referidas bases de dados, devendo o distribuidor do serviço postal certificar o depósito na respetiva caixa de correio.
X. Não vislumbra a recorrente que o facto de ter sido enviada carta simples possa ofender a formalidade da Injunção quando não há domicílio convencionado, considerando o disposto no art. 12º do DL 269/98.
Y. Ante o exposto, não se verifica nulidade da citação.
Z. Sem prescindir, mas o que por cautela de patrocínio se refere, ainda que se considere que o Balcão Nacional de Injunções, no âmbito de todo o processado, tenha cometido algum erro ou lapso, certo é que, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 6 do art.º 157.º do CPC, tal erro não poderá ser imputado à recorrente, que tudo fez para que o ora recorrido fosse devidamente notificado do procedimento de Injunção contra si movido.
AA. O Tribunal a quo violou o disposto nos art.º 432º, art. 607.º n.º 4 e 5, art. 3º, n.º 3, CPC, art. 615º, nº 1, alínea d), 2ª parte, art.º 157.º, n.º 6, todos do CPC, art.º 12º n.º 4 e 5 do DL 269/98, porquanto não cumpriu com o disposto por estes.
BB. Deveriam ter sido aplicados os normativos acima referidos, com a sua correta atuação.
CC. Deve ser considerada nula a sentença recorrida, nos termos do art, 195 n.º 1 do CPC, por ter sido cometida uma nulidade, traduzida na omissão de um ato que a lei prescreve, devendo a tramitação do processo ser retomada no momento imediatamente anterior à prolação do despacho saneador-sentença, devendo as partes serem notificadas para pronunciar sobre a intenção de conhecer de imediato do mérito da causa no referido despacho saneador, bem como para pronunciar sobre a dispensa da audiência prévia, ou ainda, caso assim se entenda, deve o processo prosseguir para discussão e prova da factualidade alegada.
DD. Não devem ser dados por provados os factos n.º 3 a 8 por acordo e a decisão que deve ser proferida sobre as matérias de facto impugnadas é que deve o tribunal a quo proporcionar que a prova seja carreada para os autos, oficiando o Balcão Nacional de Injunções para vir juntar aos autos todo o documento probatório da citação do embargante.
Nestes termos e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve julgar-se procedente o presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, substituindo-a por acórdão que determine a nulidade da sentença recorrida, determinando o prosseguimento dos autos para que seja produzida prova, admitindo-se, para o caso vertente, que o Balcão Nacional de Injunções deve juntar aos autos todos os documentos do procedimento quanto a citação do recorrido, bem como determinando que as partes devem ser previamente notificadas para pronunciar sobre a dispensa da audiência prévia e da intenção do Tribunal de proferir decisão de mérito no despacho saneador, devendo a tramitação do processo ser retomada no momento imediatamente anterior à prolação do despacho saneador-sentença, seguindo a presente execução os seus termos até final, com as legais consequências, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”
Foram dispensados os vistos legais.
O tribunal a quo julgou assentes «Com base no teor dos documentos infra referidos», consignando que procedeu «à consulta do processo injunção em causa através do sistema “citius”», e «por acordo das partes», os seguintes factos:
“1. A exequente apresentou à execução o requerimento de injunção com o nº 129014/16.0YIPRT, do qual consta, para além do mais, no seu canto superior direito o seguinte: “Este documento tem força executiva Porto, 15-03-2017 O Secretário de Justiça” (cf. documento dado como título executivo dos autos de execução de que estes constituem um apenso, cujo teor, no mais, se dá aqui por integralmente reproduzido).
2. Nesse requerimento de injunção a aqui exequente assinalou domicílio não convencionado e indicou como morada do Requerido R ..., ..., ... ... SÃO ....
3. Em 21.12.2016 foi enviada notificação para o requerido com aviso de receção para a morada Rua ..., ... ....
4. Em 11.01.2017 a missiva referida em 3. foi devolvida encontrando-se assinalado o campo “endereço insuficiente”.
5. A secretária do Banco Nacional de Injunções procedeu às pesquisas das moradas, em 16.01.2017, resultando das consultas efetuadas às plataformas da Segurança Social, Identificação Civil e Autoridade Tributária a morada mencionada em 2..
6. Da pesquisa efetuada no site do IMT não consta os dados da morada.
7. Após as pesquisas, a carta para a notificação do Requerido foi enviada com prova de depósito simples para a morada suprarreferida em 2., no dia 24.01.2017.
8. A carta foi depositada no dia 25.01.2017.”
Delimitado como está o recurso pelas conclusões das alegações, sem prejuízo de e em relação às mesmas não estar o tribunal sujeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito nem limitado ao conhecimento das questões de que cumpra oficiosamente conhecer – vide artigos 5º n.º 3, 608º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4 e 639º n.ºs 1 e 3 do CPC – resulta serem questões a apreciar:
- nulidade da decisão recorrida por ter sido dispensada a audiência prévia e proferida decisão de mérito sem previamente terem sido as partes notificadas pelo tribunal a quo de tal intenção, em violação do princípio do contraditório;
- nulidade da decisão recorrida por considerar provados factos com base na consulta via citius do processo de injunção, sem que tenham sido junto aos autos tais elementos, como a recorrente requerera em sede de contestação. Igualmente em violação do princípio do contraditório.
Implicando não deverem ser julgados provados os factos provados 3 a 8;
- regularidade da notificação no âmbito do processo de injunção.
As questões sujeitas à nossa apreciação, serão conhecidas por ordem de precedência na medida em que a solução de uma possa prejudicar o conhecimento de outras (vide artigo 608º ex vi 663º do CPC ambos].
E como tal impõe-se em primeiro lugar apreciar da invocada nulidade da decisão proferida por não convocação de audiência prévia, em violação do princípio do contraditório, na medida em que o tribunal a quo conheceu de mérito sem previamente de tal dar conhecimento às partes, nem da sua intenção de conhecer de mérito.
Tal como resulta do relatório supra, a exequente execução, tendo por título executivo procedimento de injunção instaurado ao abrigo do DL 269/98 e assim sujeito ao formalismo processual nele previsto e respetivo Anexo, de cujo artigo 21º decorre que a execução fundada em requerimento de injunção segue, com as necessárias adaptações, a forma de processo comum.
O mesmo é dizer que segue a forma de processo sumário, por força do disposto no artigo 550º nºs 1 e 2 al. b) do CPC.
Não sendo de aplicar ao caso o nº 3 deste mesmo artigo, por não invocado circunstancialismo que convoque a sua aplicação.
Assente a forma sumária aplicável à execução, é aos embargos da execução sumária aplicável a tramitação prevista nos artigos 856º e 857º do CPC e, subsidiariamente as disposições do processo ordinário (da execução) – vide nº 3 do artigo 551º do CPC, bem como as disposições do processo de declaração que se mostrem compatíveis com a natureza da ação executiva com as necessárias adaptações (vide nº 1 do artigo 551º do CPC).
Por força do previsto no artigo 732º do CPC, é-lhe ainda aplicável o previsto nos artigos 591º, nº, al. d), 593º, nº 1, 595º, nº 1, al. b) e 597º, al. c) do CPC convocados pelo tribunal a quo na decisão recorrida.
Da conjugação destas normas e atento o valor em causa (vide artigo 597º do CPC) sendo legítimo ao tribunal não convocar a audiência prévia e proferir despacho saneador nos termos do artigo 595º nº 1 do CPC.
Nesta perspetiva não merece a decisão do tribunal a quo censura.
Ocorre que para o efeito de conhecer as exceções suscitadas e assim apreciar do mérito dos embargos quanto à nulidade do título executivo, teve o tribunal a quo de recorrer à consulta dos autos de injunção, conforme o consignou.
Sem que de tal consulta tenha deixado qualquer registo nos autos.
E sem que às partes tenha dado o necessário prévio conhecimento do resultado de tal consulta para que sobre a mesma pudessem exercer o contraditório.
Os factos provados 3 a 8, indispensáveis ao conhecimento do mérito dos embargos e assim da decisão proferida, resultam de uma consulta oficiosa do tribunal, sem qualquer registo ou prévio conhecimento das partes.
Dispõe o artigo 3º nº 3 do CPC «O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem».
Consagra este artigo o princípio da contradição ou do contraditório, um dos princípios gerais estruturantes do processo civil, intimamente ligado ao princípio da igualdade das partes e com uma matriz constitucional, assente nos princípios de acesso ao direito e aos tribunais e da igualdade.
Em consonância com o princípio geral e estruturante do processo civil do contraditório, preceitua o artigo 591º do CPC que uma vez findos os articulados e observadas as diligências eventualmente determinadas nos termos do artigo 590º do CPC é convocada audiência prévia para os fins (ou alguns dos fins) indicados no nº 1 do deste mesmo artigo 591º[1], do qual se destaca para o que ora releva nos autos o constante da al. b), a qual determina o agendamento da audiência prévia para a discussão de facto e de direito nos casos em que ao juiz cumpra apreciar exceções dilatórias, ou tencione conhecer de imediato, no todo ou em parte, do mérito da causa.
Esta regra geral comporta algumas exceções, desde logo nas situações em que a exceção dilatória tenha já sido debatida nos articulados, havendo o processo de findar no despacho saneador pela sua procedência: assim o prevê o artigo 592º nº 1 al. b) do CPC.
Adicionalmente e tal como previsto no artigo 597º al. c), nas ações de valor não superior a metade da alçada da Relação, findos os articulados - e sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 590.º relativo a despacho pré-saneador - o juiz, consoante a necessidade e a adequação do ato ao fim do processo pode proferir despacho saneador, nos termos do no n.º 1 do artigo 595.º, conhecendo nomeadamente de exceções dilatórias que hajam sido suscitadas pelas partes ou sejam de conhecimento oficioso [al. a) do nº 1 deste artigo 595º]; ou conhecendo imediatamente do mérito da causa quando o estado da causa o permita [al. b) do nº 1 deste artigo 595º].
Foi ao abrigo destes normativos legais que o tribunal a quo conheceu do mérito dos embargos, analisando a arguida nulidade do título executivo.
A decisão recorrida apenas merecerá censura se o conhecimento do mérito dos embargos não tiver respeitado o analisado princípio do contraditório.
Como acima já se assinalou, o tribunal a quo julgou provada matéria de facto essencial à decisão da causa [factos provados 3 a 8], após ter efetuado consulta do processo de injunção via citius e sem da mesma ter deixado documentação nos autos que permita sequer a este tribunal de recurso sindicar o que foi analisado e julgado provado.
Mais, esta mesma consulta nos moldes em que foi efetuada e considerada para efeitos decisórios não salvaguardou o exercício do contraditório das partes que sempre tem de ser respeitado.
Tanto mais quando a própria recorrente havia impugnado o alegado quanto à factualidade relativa aos atos praticados no processo de injunção com vista à notificação do requerido e expressamente requerera que tais elementos fossem juntos aos autos, para apreciação e prova do alegado.
Efetuada pelo tribunal a quo consulta eletrónica de elementos processuais de um outro processo via citius, com base na qual julga provados factos essenciais para o conhecimento do mérito dos autos, sem que do resultado de tal consulta dê conhecimento às partes, ocorre a violação do principio do contraditório consagrado no artigo 3º nº 3 do CPC.
Violação geradora de nulidade da decisão proferida.
Do exposto, resulta ter ocorrido efetiva violação do princípio do contraditório consagrado no artigo 3º nº 3 do CPC, a qual configura nulidade processual (artigo 195º do CPC) cometida ao abrigo da decisão recorrida e que assim, por oportunamente arguida, cumpre reconhecer e declarar.
Nulidade que afeta a decisão recorrida, determinando a sua anulação para que o tribunal a quo, sanando a mesma, solicite conforme requerido pela recorrente, os elementos constantes do processo de injunção relativos à notificação do requerido.
Após observando o contraditório em relação a tal junção.
Seguindo posteriormente os trâmites processuais adequados, em função do que vier a ser alegado e requerido pelas partes.
O que se determina ao abrigo do disposto no artigo 662º nº 2 als. b) e c) do CPC.
O assim decidido, prejudica o conhecimento das demais questões colocadas à nossa apreciação.
Pelo exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em anular a decisão recorrida para que o tribunal a quo solicite, conforme requerido pela recorrente, os elementos constantes do processo de injunção relativos à notificação do requerido.
Após observando o contraditório em relação a tal junção e seguindo posteriormente os trâmites processuais adequados, em função do que vier a ser alegado e requerido pelas partes.
Custas pelo recorrido.
Porto, 2024-11-25.
(M. Fátima Andrade)
(António Mendes Coelho)
(Anabela Mendes Morais)
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[1] Realce nosso.