EMBARGOS DE EXECUTADO
TÍTULO EXECUTIVO
CONTRATO DE ARRENDAMENTO
AUTORIDADE DO CASO JULGADO
EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO
Sumário

I – Um “protocolo” invocado como contrato de arrendamento comercial em ação de despejo e ali considerado inválido – por, à época, tais contratos de arrendamento terem, obrigatoriamente, de ser celebrados mediante escritura pública, o que não ocorreu – não pode constituir título executivo válido e eficaz numa posterior execução, entre as mesmas partes, para pagamento de quantia certa, por a nulidade anteriormente declarada ocasionar a inexistência de título executivo.
II – Em tal situação, a autoridade do caso julgado formado na ação de despejo impede que se discuta, de novo, na execução, a questão da validade do “protocolo” como contrato de arrendamento.

Texto Integral

Relator: Arlindo Oliveira
Adjuntos: Helena Melo
Chandra Gracias

           

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

Por apenso à execução para pagamento de quantia certa que lhe move a Diocese de Leiria Fátima, veio a executada A..., L.da, já ambas identificadas nos autos, deduzir os presentes embargos, alegando para o efeito, em primeiro lugar, que desconhecendo se a titularidade do prédio descrito no requerimento executivo se encontra na esfera jurídica da Embargada, esta última não dispõe de legitimidade activa na presente execução. Em segundo lugar, aduz a embargante que inexiste um contrato de arrendamento celebrado entre as partes. Mais acrescenta que n.º 1, do art. 14.º-A, do Novo Regime do Arrendamento Urbano é bem claro ao expressar que o título executivo para a execução para pagamento de quantia certa tem por objeto as rendas, os encargos e/ou as despesas que corram por conta do arrendatário, não conferindo já exequibilidade a indemnizações que ao senhorio sejam devidas pela mora no pagamento de rendas, a indemnização a que alude o n.º 1 do art. 1041.º do Código Civil.

Sem conceder invoca, ainda, a embargante que não pagou as rendas relativas aos meses de Fevereiro a Dezembro de 2018, à razão de 4.762,13€ mensais, e as rendas de Fevereiro a Março de 2020, à razão de 4.000,00€ mensais, porquanto estava dispensado de o fazer por acordo alcançado entre as Partes, considerando o valor suportado pela Embargante em obras, a qual descrimina.

Termina pugnando pela procedência dos embargos, com extinção da execução e peticiona a suspensão da execução, sem prestação de caução.

Junta documentos.

*

Foram admitidos liminarmente os embargos de executado deduzidos.

*

Regularmente notificada, a embargada/exequente Diocese de Leiria/Fátima deduziu contestação, na qual pugna pela improcedência dos embargos.

Para tanto, aduz que é proprietária do prédio em apreço, existe contrato de arrendamento que consiste no documento dado à execução, sendo que, relativamente aos alegados acordos apenas aceita que a partir de 1 de janeiro de 2019, a pedido da Executada, a renda foi reduzida para o valor de € 4.000,00 mensais, logo por acordo, nada mais. Ademais, alega ainda que a Embargante não solicitou autorização à Exequente para fazer quaisquer obras, nem antes, nem depois de alegadamente as ter feito, não lhe tendo apresentado qualquer orçamento ou plano de trabalhos.

Juntou documentos.

Foi designada data para a realização de audiência prévia nos termos e para os efeitos do artigo 591º do Código de processo Civil (C.P.C.), a qual teve lugar e na qual foi proferido despacho saneador, em que se indeferiu o pedido de suspensão da execução, se julgou improcedente a excepção de ilegimitidade activa da exequente, se fixou o objeto de litígio e os temas da prova, bem como se admitiram os requerimentos probatórios.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova nela produzida, e finda a mesma foi proferida a sentença de fl.s 269 a 279, na qual se fixou a matéria de facto considerada como provada e não provada e respectiva fundamentação e, a final, se decidiu o seguinte:

“Face ao exposto, decide-se julgar procedente o incidente de oposição à execução mediante embargos de executado e, em consequência, determinar a extinção da execução nos termos do artigo 732.º, n.º 4, do Código de Processo Civil com o consequente levantamento de penhoras realizadas no processo de execução.

***

Custas pela exequente/embargada (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).

*

Registe e notifique, incluindo o agente de execução que deverá proceder ao levantamento das penhoras pendentes (artigo 153.º, n.º 4, do Código de Processo Civil).”.

Inconformada com a mesma, interpôs recurso a exequente/embargada Diocese de Leiria Fátima, recurso, esse, admitido como de apelação, com subida, imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 379 e v.º), finalizando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões:

(…).

Contra-alegando, a executada/embargante, A..., L.da, pugna pela manutenção da decisão recorrida, apresentando as seguintes conclusões:

(…).

Dispensados os vistos legais, há que decidir.          

Tendo em linha de conta que nos termos do preceituado nos artigos 635, n.º 4 e 639, n.º 1, ambos do CPC, as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e considerando a natureza jurídica da matéria versada, a questão a decidir é a de saber se a exequente/embargada dispõe de título executivo, como tal se devendo considerar o “Protocolo” celebrado entre as ora partes, que constitui um contrato de arrendamento.

 

É a seguinte a matéria de facto dada como provada na sentença recorrida:

1 - A Exequente é dona e legítima proprietária do prédio urbano sito em Rua ..., freguesia e concelho ..., inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...72, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...62/....

2 – A Exequente veio intentar acção executiva para pagamento de quantia certa contra a Executada dando à execução um documento datado de 01.06.1996, intitulado “Protocolo” acompanhado de notificação judicial avulsa.

3 – O documento intitulado de Protocolo tem o seguinte teor:


4 – Nos termos do documento descrito em 3) foi convencionada a renda mensal de 600.000$00 ( seiscentos mil escudos , no primeiro ano, passando a renda para 700.000$00 ( setecentos mil escudos ), a partir do segundo ano, actualizável anualmente de acordo com os coeficientes a publicar pelo governo.

5 - A renda passou desde então a ter que ser paga no mês a que respeita, e por transferência para a conta bancária da Exequente.

6 - Entretanto, por carta de 26-10-2009, a sociedade B..., SA, comunicou à Exequente os termos de contrato promessa de trespasse do estabelecimento de ensino, denominado B..., a funcionar no prédio descrito em 1) celebrado com a sociedade A..., L.Da, para efeitos do exercício do direito de preferência.

7 - A Exequente não exerceu o direito de preferência, e o estabelecimento de ensino foi efectivamente transferido para a A..., L.da, por trespasse, a partir de 30-10-2009, conforme comunicação de 09-11-2009, de AA, gerente da mesma.

8 - Em razão das actualizações a que foi sujeita, a renda mensal era em 1 de janeiro de 2018 do montante mensal de € 4.762,13 ( quatro mil, setecentos e sessenta e dois euros e treze cêntimos ).

9 - E a partir de 1 de janeiro de 2019, por acordo, na sequência de pedido da Executada, a renda mensal passou a ser de € 4.000,00 (quatro mil euros ).

10 - Acontece que, a Executada não pagou as rendas que se venceram de fevereiro a dezembro de 2018, bem como as rendas que se venceram de fevereiro a dezembro de 2019, e ainda as rendas que se venceram de janeiro a março de 2020.

11 - Em 24-03-2022, a Exequente solicitou a notificação por via judicial da Executada, na pessoa do seu legal representante, das rendas em dívida e para que no prazo de 10 dias procedesse ao pagamento da quantia de € 146.975,14 ( cento e quarenta e seis mil, novecentos e setenta e cinco euros e catorze cêntimos ), referente às mencionadas rendas, sendo o valor de € 108.383,43 ( cento e oito mil, trezentos e oitenta e três euros e quarenta e três cêntimos ) de capital e € 38.591,71 ( trinta e oito mil, quinhentos e noventa e um euros e setenta e um cêntimos ) de indemnização pela mora.

12 - A notificação foi realizada por Agente de Execução, em 26 de abril de 2022.

13 - A partir de 30/10/2009, na sequência de trespasse, a Executada passou a ser a legitima possuidora do prédio urbano em causa nos presentes autos, onde se encontra instalado o B... (adiante apenas B...).

14 – Apenas no decurso do ano de 2023 foi emitido Alvará de Autorização de Utilização pelo Município ..., aprovado por despacho proferido em 21.12.2022, para a utilização do prédio descrito em 1) para estabelecimento de ensino.

15 – O B... tem “ Autorização Definitiva de Funcionamento n.º570” passada pelo Ministério de Educação, datada de 05.01.1998.

16 - Na referida Autorização Definitiva n.º 570 para o B... encontra-se averbada a alteração da entidade titular do estabelecimento, passando a partir de 03/11/2009 a ser titular a ora Executada.

17 - À data do trespasse e nos contactos mantidos com a Exequente, a ora Executada alertou para a necessidade de realizar obras no prédio descrito em 1), de conservação, manutenção e adequação ao fim a que se destina.

18 - Entre 2010 e 2011, a Executada executou obras no prédio descrito em 1) que atingiram um montante de 243.775,99€ (duzentos e quarenta e três mil setecentos e setenta e cinco euros e noventa e nove cêntimos), a saber:

- obras de restauro do edifício, canalizações e arranjos exteriores nos campos desportivos, que importaram no valor total de 104.441,70 €;

- obras de restauro e substituição de alumínios, caixilharias, janelas, vidros e vedações, que importaram no valor total de 16.370,52 €;

- obras de reparação e substituição de carpintaria, madeiras e pavimentos, que importaram no valor total de 17.455,80 €;

- obras de reparação, adequação e substituição de instalações elétricas, que importaram no valor total de 19.537,87 €;

- obras de reparação e manutenção do chão interior e repavimentação exterior, que importaram no valor total de 38.459,14€;

- obras de reparação e manutenção de pinturas interiores e exteriores e isolamentos, que importaram no valor total de 31.945,81€;

- obras de restauro e substituição do furo de água e do sistema de bombagem, que importaram no valor total de 15.565,15€.

19 – Desde a data descrita em 18) que as Partes foram encetando diversos contactos tendo em vista discutir um eventual modelo de compensação pelas obras realizadas pela Executada no prédio descrito em 1), e que poderia passar por uma redução do valor da renda até perfazer a quota parte de comparticipação da ora Exequente na realização das obras, sem que até aos dias de hoje tenham chegado a qualquer acordo, apesar das reuniões realizadas, contactos encetados e troca de correspondência realizada.

20 – Em 29/10/2018 as Partes reuniram no prédio descrito em 1), estando presentes o gerente da Executada e o Sr. BB, por parte da ora Exequente.

21 - No dia 09/11/2018, correspondendo a solicitação do Sr. BB, a Executada remeteu por email a Descrição dos Assuntos ali tratados, designadamente

“Bom dia Sr. Pde. BB,

No seguimento da nossa reunião do passado dia 29 de Outubro, que muito agradeço, segue a descrição dos assuntos ali tratados e propostas de resolução:

1. Obtenção da Licença de Utilização do edifício escolar passada pela CM da ..., para entrega junto da Inspeção Geral da Educação e Ciência, que aguarda este documento da N. parte.

2. Redação de um contrato de arrendamento actualizado, nos termos e nas partes intervenientes, para substituição do existente “Protocolo” datado de 1 de Junho de 1996.

3. Reconhecimento do valor das obras realizadas no Colégio, conforme descriminação enviada por nós a 18 de Outubro de 2013.

4. Redução da renda paga para metade do seu valor, dadas as dificuldades financeiras do colégio atravessa e que se arrastam há vários anos, devido à falta de alunos e que impedem o pagamento da totalidade do valor.

5. Abatimento do valor das rendas em dívida e de parte da renda que vier a ser fixada ao valor das obras realizadas.

Na expectativa das V. notícias e disponíveis para o que entenderem necessário, somos com elevada consideração.

Atentamente,

AA.”

22 - E nesse mesmo dia, o Sr. BB, também por email. respondeu:

“Exmo Dr AA

Acuso receção do seu mail. Vai merecer a nossa melhor atenção.

No entanto queria pedir-lhe o favor se me podia enviar por esta via a documentação relacionada com as obras. Seria mais fácil para nós se a tivesse em formato digital.

Não encontro nos nossos mails essa documentação...

Obrigado

Respeitosos cumprimentos

P. BB

Atentamente,”.

23 – A informação solicitada foi nesse mesmo dia 09/11/2018 enviada pela Executada e recebida pela Exequente.

24 - No dia 10/11/2018 a Executada solicitou à Exequente o envio de um “Mapa Resumo das despesas todas que realizaram no Colégio”, o qual foi remetido pela Executada no dia 14/11/2018.

25 - E no dia 22/11/2018 as Partes voltaram a reunir sobre o assunto.

26 - Em 13/05/2019, o Sr. BB solicitou a disponibilidade do gerente da Executada para participar na reunião do Conselho para os Assunto Económicos, a realizar na Casa Episcopal de Leiria no dia 23/05/2019, pelas 17h30, com a presença do Sr. Bispo D. CC, “para expor os assuntos que estão pendentes, de acordo com a nossa conversa”.

27 - No âmbito dessa reunião, na presença do Sr. Bispo D. CC foram abordados os vários assuntos pendentes, designadamente a inexistência da Licença de Utilização para entrega junto da Inspeção Geral da Educação e Ciência, relativamente ao qual a Exequente informou a Executada que estava a tratar do assunto com um gabinete especializado nessa matéria. Foi igualmente abordada a questão da celebração de um novo contrato de arrendamento atualizado, para substituição do existente “Protocolo” datado de 1 de Junho de 1996, ficando a Exequente de remeter à Executada a respetiva proposta de arrendamento.

28 - As Partes acordaram nessa reunião reduzir o valor da renda mensal, para o valor de 4.000,00€ (quatro mil euros) mensais, por referência ao 01 de Janeiro de 2019.

29 – As Partes trocaram entre si várias minutas de contratos de arrendamento, sem que tenham chegado a qualquer acordo final.

30 - A Executada vem pagando uma renda mensal de 3.000,00€ (três mil euros), com dedução de retenção na fonte.

31 – À data descrita em 17) e 18), a Executada não remeteu à Exequente orçamentos ou plano de trabalho de obras.

32 - No ano de 2013 foram mandadas fazer pela Exequente, a pedido da Executada obras de substituição e reparação da tela de impermeabilização das telas dos telhados, e substituição da caixilharia das claraboias dos telhados.

3.2. Factos não provados

Não se provou que:

a) a Exequente desde Junho de 2016 que não emitia e remetia à Executada os recibos de rendas;

b) a Executada não pagou as rendas mensais descritas em 10) dos Factos Provados porquanto foi dispensada do respetivo pagamento, pela própria Exequente, por acordo alcançado entre as Partes;

c) À data do trespasse a Executada foi pressionada a realizar as obras de adequação, conservação e manutenção no edifício locado, sob risco de o Alvará de Ensino / Autorização Definitiva poder ser retirado, pelo Ministério da Educação.

d) A globalidade das obras descritas em 18) dos Factos provados eram indispensáveis à prossecução da actividade de estabelecimento de ensino no prédio descrito em 1) dos Factos provados;

e) na reunião descrita em 26) e 27) dos Factos provados, relativamente às obras realizadas, a Exequente reconheceu a sua realização e comunicou à Executada que iria comparticipar no custo das mesmas, ficando acordado entre as Partes que a comparticipação da Exequente no custo das obras realizadas pela Executada seria realizado através do perdão das rendas relativas ao ano de 2018, no montante de 52.383,43€, ficando a Executada dispensada de proceder ao seu pagamento, bem como, nessa reunião, as Partes acordaram que em compensação das obras realizadas pela ora Executada, a ora Exequente compensaria a Executada no montante total de 112.383,43€. As Partes acordaram ainda nessa reunião, que o novo contrato de arrendamento a celebrar consagraria uma redução temporária do valor da renda, no montante mensal de 1.000€ (mil euros) e durante um período de 5 (cinco) anos, isto é, 60 meses, o que perfazia uma redução na renda mensal no valor de 60.000,00 €.

f) As Partes passaram de imediato a executar o acordo alcançado na referida reunião, descrito em e).

g) o descrito em 30) dos Factos provados tenha o acordo da Exequente.

h) a Exequente tenha tido conhecimento das obras descritas em 18) dos Facos provados apenas em 2018, quando da remessa do email dado como provado em 23) dos Factos provados.

Aos factos provados, nos termos do disposto no artigo 607.º, n.º 4, ex vi artigo 663.º, n.º 2, ambos do CPC, há a acrescentar o seguinte:

33 – Cf. dc. de fl.s 307 a 315 v.º, correu termos no Juízo Central Cível de Leiria, uma acção de despejo, em que figura como autora a Diocese de Leiria Fátima (aqui exequente/embargada) e A..., L.da (aqui executada/embargante), na qual a ali autora, peticionou fosse reconhecida dona e legítima possuidora do prédio urbano ali identificado; se declarasse a resolução do contrato de arrendamento em vigor entre autora e ré, respeitante ao prédio urbano ali identificado e ser a ré condenada a pagar as rendas vencidas e vincendas e respectivos juros de mora.

34 – Como resulta do item 1.º dos factos ali dados como provados, o que é invocado como constituindo o contrato de arrendamento celebrado entre as partes é o “Protocolo”, invocado como título executivo nos autos de execução, de que os presentes embargos constituem apenso, não se tendo chegado a realizar escritura pública de arrendamento, cf. item 2.º.

35 – Por sentença proferida em 28 de Fevereiro de 2023, no que aos presentes autos interessa, com fundamento na falta de celebração de escritura pública, foi decidido o seguinte:

“Declaro a nulidade do contrato de arrendamento celebrado entre a Diocese de Leiria Fátima e o B... SA, - a que as partes deram o nome de “protocolo” que tinha por objeto o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...23 e na matriz predial urbana sob o artigo ...72, em vigor desde 01 de Junho de 1996.”.

36 – Tendo sido interposto recurso desta sentença, a mesma veio a ser confirmada, cf. Acórdão, cuja cópia antecede de fl.s 351 a 375 v.º, proferido neste Tribunal da Relação, em 7 de Novembro de 2023, já transitado em julgado.

Se a exequente/embargada dispõe de título executivo, como tal se devendo considerar o “Protocolo” celebrado entre as ora partes, que constitui um contrato de arrendamento.

Como resulta do relatório que antecede, o título executivo invocado pela exequente/embargada na execução é, precisamente o “Protocolo”, que na acção de despejo acima assinalado se destinava a fazer prova do contato de arrendamento, (cf. itens 2.º e 3.º, dos factos dados como provados na sentença aqui em recurso e item 1.º, dos factos dados como provados na sentença proferida na supra citada acção de despejo) que, ali, foi declarado nulo, por inobservância da forma legal.

Na sentença ora recorrida considerou-se, igualmente, que o designado “Protocolo” não obstante revista todas as qualidades para poder ser considerado como um contrato de arrendamento comercial, não pode constituir título executivo válido e eficaz, porquanto, à época, tais contratos de arrendamento tinham, obrigatoriamente, de ser celebrados mediante escritura pública, o que não se verificou, o que acarreta a respectiva nulidade, do que resulta inexistir título executivo, com a consequente extinção da execução, nos termos do disposto nos artigos 729.º, a) e 732.º, n.º 4, ambos do CPC.

Recorrendo, a exequente/embargada Diocese de Leiria Fátima, continua a pugnar no sentido de que se considere que o referido “Protocolo”, não obstante a não celebração de escritura pública, deve ser considerado como contrato de arrendamento, reunindo as condições para valer como título executivo, o que, assim, deve ser declarado, com o consequente prosseguimento da execução.

Contra-alegando, a executada/embargante A..., pugna pela manutenção da decisão recorrida, com o fundamento em que tal “Protocolo” não reveste as características de título executivo o que, desde logo, resulta do facto de na aludida sentença de despejo, transitada em julgado, já ter sido declara a nulidade de tal “protocolo”, por falta da forma legal, pelo que não se pode, agora, de novo, discutir tal questão.

Daqui resulta, pois, que se impõe a análise da eficácia do decidido naquela acção de despejo, quanto a esta questão, designadamente se, se em virtude da designada “autoridade do caso julgado” já não se poderá, nestes embargos, discutir a validade/nulidade do designado “Protocolo” com a vista a aferir se o mesmo pode valer ou não como título executivo. 

Como sabido, visa a “exceção de caso julgado” evitar que o órgão jurisdicional contrarie na decisão posterior o sentido da decisão anterior ou repita na decisão posterior o conteúdo da decisão anterior; garantindo assim aos particulares o mínimo de certeza e de segurança jurídicas indispensáveis à vida de relação, razão pela qual o que essencialmente se exige, em nome do caso julgado, é que os tribunais respeitem a decisão já proferida, não julgando a questão de novo.

Garante-se, portanto, a impossibilidade do tribunal decidir sobre o mesmo objeto duas vezes de maneira diferente e a inviabilidade do tribunal decidir sobre o mesmo objeto duas vezes de maneira idêntica, uma vez que a finalidade dum processo não se esgota na definição do direito/justiça do caso concreto, tendo também em vista conferir certeza/segurança jurídicas e paz social, essenciais à vida em sociedade; certeza/segurança jurídicas e paz social que nunca aconteceriam se, proferida uma decisão, esgotada a possibilidade de interpor recurso de tal decisão, a parte vencida pudesse suscitar nova e sucessivamente a questão antes decidida.

Há pois caso julgado quando se repete uma causa, sendo que há a “repetição da causa” quando há identidade de sujeitos, identidade do pedido e também da causa de pedir (cfr. art. 581.º/1 do CPC).

Identidade de sujeitos que reside no facto de as partes serem as mesmas nas duas ações sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.

Identidade da causa de pedir que existe quando a pretensão deduzida nas duas ações procede do mesmo facto jurídico, identidade que tem de ser procurada não relativamente às demandas formuladas, mas na questão fundamental levantada nas duas ações; pelo que, tendo a nossa lei adotado a chamada teoria da substanciação, se exige sempre a indicação do título ou facto jurídico em que se baseia o direito do autor.

Identidade do pedido que tem de ser apreciada não só em relação ao que se pede nas duas ações mas também em relação ao que se alega a respeito da questão fundamental que comanda o pedido das ações.

E se, quanto à identidade de sujeitos, nenhumas especiais dificuldades normalmente se suscitam, não é sempre com a mesma facilidade que se percebe a identidade nos elementos objetivos (causa de pedir e pedido).

Assim, a propósito dos limites objetivos do caso julgado, não será demais referir que desde há muito que a conceção/sistema restrito do caso julgado se foi impondo quer na doutrina quer na jurisprudência, ou seja, hoje, não é sustentável dizer que qualquer fundamento fica pelo trânsito em julgado indiscutível (sistema amplo do caso julgado), devendo antes ser dito, como regra, que só a decisão tem foros de indiscutibilidade, sendo tudo o mais (todos os seus fundamentos) discutível (sistema restrito).

Porém, o que se diz como regra (só ter a sentença força de caso julgado na parte decisória e não nos motivos) é algo que não tem uma rigidez absoluta, distinguindo-se, tendo como ponto de partida tal regra (própria dum sistema restritivo puro), hipóteses em que os fundamentos têm força de caso julgado e hipóteses em que não têm[1].

Verdadeiramente, hoje, em termos de limites objetivos do caso julgado, impera a ideia pragmática do “in medio virtus[2]: o sistema restritivo adotado acaba por ser apenas “pseudo-restritivo” ou, mais exatamente, um sistema intermédio[3].

Efetivamente, de modos diversos e com mais ou menos nuances (de linguagem), diz-se repetidamente que a decisão e fundamentos constituem um todo único; que toda a decisão é a conclusão de certos pressupostos (de facto e de direito), pelo que o respetivo caso julgado se encontra sempre referenciado a certos fundamentos; que reconhecer que a decisão está abrangida pelo caso julgado não significa que ela valha com esse valor, por si mesma e independentemente dos respetivos fundamentos; enfim, que não é a decisão, enquanto conclusão do silogismo judiciário que adquire o valor de caso julgado, mas o próprio silogismo no seu todo; que o caso julgado incide sobre a decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge esses fundamentos enquanto pressupostos dessa decisão[4].

 “Em regra, o caso julgado não se estende aos fundamentos de facto da decisão; mais exatamente, os fundamentos não adquirem valor de caso julgado quando são autonomizados da respetiva decisão judicial; não são vinculativos quando desligados da respetiva decisão. Mas valem (os fundamentos) enquanto fundamentos da decisão e em conjunto com esta[5]”.

Enfim, repetindo, os pressupostos da decisão (de facto e de direito[6]) estão cobertos pelo caso julgado enquanto pressupostos da decisão – caso julgado relativo – ou seja, a força de caso julgado alarga-se aos pressupostos enquanto tais[7]: o que está em causa no caso julgado é o raciocínio como um todo e não cada um dos seus elementos; e só o raciocínio como um todo faz caso julgado.

Mas mais – e relacionado com esta ideia dos fundamentos, enquanto tal (ligados ao decidido), adquirirem valor de res judicata – o caso julgado também possui um valor enunciativo, ou seja, a eficácia do caso julgado exclui toda a situação contraditória ou incompatível com aquela que ficou definida na decisão transitada, ficando afastado todo o efeito incompatível, isto é, todo aquele efeito que seja excluído pelo que foi definido na decisão transitada.[8]

Mais ainda, os fundamentos podem possuir um valor próprio de caso julgado sempre que haja que respeitar e observar certas conexões entre o objeto decidido e um outro objeto; conexões que podem ser, designadamente, de prejudicialidade, o que significa, por ex., que, se numa compra e venda o comprador obtém a redução do preço atendendo aos defeitos da coisa, não pode questionar a validade do contrato em ação em que o vendedor requeira que ele lhe pague a quantia em dívida.

E ainda o que resulta do que é normalmente chamado de “efeito preclusivo”; que designa o efeito da sentença segundo o qual não se pode formular a mesma solicitação processual no futuro com base em factos não supervenientes ao momento do encerramento da discussão em 1.ª instância (art. 611.º/1 do CPC)[9].

Podendo referir-se, neste ponto, que “o âmbito da preclusão é substancialmente distinto para o autor e para o réu. Quanto ao autor, a preclusão é definida exclusivamente pelo caso julgado: só ficam precludidos os factos que se referem ao objeto apreciado e decidido na sentença transitada. Assim, não está abrangida por essa preclusão a invocação de uma outra causa de pedir para o mesmo pedido, pelo que o autor não está impedido de obter a procedência da ação com base numa distinta causa de pedir. (…). Quanto ao âmbito da preclusão que afeta o réu, há que considerar que lhe incumbe o ónus de apresentar toda a defesa na contestação (art. 498.º/1), pelo que a preclusão que o atinge é independente do caso julgado: ficam precludidos todos os factos que podiam ter sido invocados como fundamento dessa contestação, tenham ou não qualquer relação com a defesa apresentada e, por isso, com aquela que foi apreciada pelo tribunal.[10]

O que significa – é o sentido do efeito preclusivo para um réu – que os contra-direitos que um réu possa fazer valer – e não fez – são ininvocáveis contra o caso julgado; que este abrange aquilo que foi objeto de controvérsia e ainda os assuntos que o réu tinha o ónus de trazer à colação, estando neste último caso todos os meios de defesa do réu; que a indiscutibilidade duma questão, o seu carácter de res judicata, pode resultar tanto duma investigação judicial, como do não cumprimento dum ónus que acarrete consigo por força da lei esse efeito[11].

É, na síntese clássica, a regra do “tantum judicatum quantum disputatum vel disputari debetat”.

E é chegado a este ponto da compreensão dos limites objetivos do caso julgado – nos meandros das situações incompatíveis, de prejudicialidade e do chamado efeito preclusivo – que emerge a “figura” da autoridade de caso julgado e os exemplos de escola (e jurisprudenciais) da verificação da “autoridade de caso julgado”.

Como exceção dilatória, visa o caso julgado (material) prevenir, como já se referiu, a possibilidade de prolação de decisões judiciais contraditórias com o mesmo objeto (efeito impeditivo e função negativa); como autoridade de caso julgado, garante a vinculação dos órgãos jurisdicionais e o acatamento pelos particulares de uma decisão anterior (efeito vinculativo e função positiva).

Quando o objeto processual antecedente é repetido no objeto processual subsequente, o caso julgado da decisão anterior releva como exceção de caso julgado no processo posterior; quando o objeto processual anterior funciona como condição para a apreciação do objeto processual posterior, o caso julgado da decisão antecedente releva como autoridade de caso julgado material no processo instaurado em 2.º lugar[12].

Daí que a exceção do caso julgado pressuponha a identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir; enquanto, naturalmente, a autoridade do caso julgado dispensa tal tríplice identidade[13].

Porém, tal dispensa não significa um não confinamento da “figura” do alcance e da autoridade do caso julgado àquelas situações em que a sentença reconhece, no todo ou em parte, um concreto direito do A., assim fazendo precludir todos os meios de defesa do R., os concretamente deduzidos e até os abstratamente dedutíveis com base em direito próprio; ou àquelas situações em que a sentença, ao reconhecer um direito, constitui um pressuposto ou condição de julgamento de um outro objeto ou prejudica/exclui a invocação de direitos contraditórios e incompatíveis[14].

No caso em apreço, não obstante serem diferentes os fins visados em cada um dos processos em questão: resolução do contrato de arrendamento com base na falta do pagamento de rendas e consequências daí resultantes e exigência do pagamento de tais rendas e demais quantias devidas, com base na celebração do dito “Protocolo”, erigido em título executivo, respectivamente, visando a requerida, nestes autos, persistir na invocação de tal “Protocolo” como título executivo válido, na prática, estamos no âmbito da mesma questão: validade/invalidade do referido “Protocolo”.

Como já se referiu, entre a causa de pedir e a pretensão processual existe um nexo de individualização caracterizado pela reciprocidade: a causa de pedir individualiza a pretensão e a pretensão delimitada a causa de pedir, estabelecendo-se entra ambas uma relação de implicação mútua [15].

Daí o dizer-se, como também já se referiu, que “é a resposta dada na sentença à pretensão do A., delimitada em função da causa de pedir, que a lei pretende seja respeitada através da força e autoridade do caso julgado[16]; ou, por outras palavras, que a eficácia do caso julgado apenas cobre a resposta injuntiva do tribunal à pretensão do A., concretizada no pedido e limitada através da respetiva causa de pedir; ou, ainda, que o que adquire o valor de caso julgado é o silogismo/raciocínio judiciário no seu todo, que o caso julgado incide sobre a decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge esses fundamentos enquanto pressupostos dessa decisão.

Como acima já se referiu e se reitera, o que está em causa nestes autos é apurar se a exequente/embargada detém ou não, título executivo válido que sustente a execução que intentou contra a executada/embargante, consubstanciado no mencionado “Protocolo”.

Ora, analisando, no que tal questão respeita, a matéria de facto dada como provada em ambas as acções em comparação e decisão proferida, tal questão já se mostra decidida, no sentido de que, efectivamente, foi declarada a nulidade do contrato de arrendamento celebrado entre a Diocese de Leiria Fátima e o B..., a que as partes deram o nome de protocolo. Protocolo, este, que é o invocado em ambas as acções, pelo que, nos termos expostos, não se pode, agora, de novo, discutir judicialmente tal questão.

A ordem jurídica já se pronunciou quanto a tal, em termos que vinculam as ora partes, por força da autoridade de caso julgado formado em resultado da prolação da sentença proferida nos autos de despejo supra referidos.

O que mais se reforça, atento a que a exequente/embargada nada refere, de novo, quanto a tal, na execução.

Impõe-se, pois, embora por diferente fundamentação jurídica, manter a decisão recorrida e julgar improcedente a apelação.

Nestes termos se decide:      

Julgar improcedente o presente recurso de apelação, em função do que se mantém a decisão recorrida.

Custas pela apelante.

Coimbra, 26 de Novembro de 2024

[1] A dificuldade – como refere o Prof. Castro Mendes, in Limites Objetivos do Caso Julgado em Processo Civil, pág. 121 e ss. – está “em estabelecer a distinção em bases científicas sem empurrar a questão para uma casuísmo necessariamente arbitrário”.

[2] Efetivamente, a conceção/sistema restrito (da sentença só ter força de caso julgado na parte decisiva e não nos fundamentos) leva a conclusões duvidosas e em última análise insatisfatórias (como resulta dos inúmeros exemplos citados por Castro Mendes, obra citada, pág. 143).

[3] Como observou – há mais de 50 anos, mas com inteira atualidade – o Prof. Castro Mendes (obra citada, pág. 133), mesmo aqueles (Dias Ferreira) que diziam que “a sentença só tem força de caso julgado na parte decisiva e não nos motivos, considerandos ou enunciações”, não deixavam de acrescentar “excepto quando os considerandos estejam relacionados com a decisão por forma que com ela formem um todo indivisível”. Do mesmo modo a jurisprudência que “aceita a regra segundo a qual o caso julgado não se alarga aos fundamentos da decisão”, logo acrescentado “que o CPC admite a decisão implícita, como consequência necessária do julgamento expressamente proferido e já transitado, constituindo problema de interpretação da sentença saber se nela há um fundamento implícito”.

[4] Seguimos de perto Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, pág. 578.
[5] Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, pág. 579/80.
[6] Aliás, a distinção – entre “factos” e “direito” – já encerra um modo hábil de entender tal dicotomia, uma vez que, no processo, só assume a qualidade de “facto” o quid a que o “direito” reconhece tal qualidade, ou seja, não há “factos” sem “direito”.

[7] O Prof. Antunes Varela – Manual de Processo, 1.ª ed., pág. 693 e ss. – parece ser um pouco mais restritivo, na medida em que apenas diz que “é a resposta dada na sentença à pretensão do A., delimitada em função da causa de pedir, que a lei pretende que seja respeitada através da força e autoridade do caso julgado”; e que “a força do caso julgado não se estende, por conseguinte, aos fundamentos da sentença, que no corpo desta se situam entre o relatório e a decisão final”; porém, mais à frente não deixa de reconhecer que “reveste o maior interesse, para a delimitação do caso julgado, a fixação do sentido e, sobretudo, do alcance dessa resposta contida na decisão final”; e que “é ponto assente na doutrina que os fundamentos da sentença podem e devem ser utilizados para fixar o sentido e alcance da decisão contida na parte final da sentença, coberta pelo caso julgado

[8] Miguel Teixeira de Sousa, obra citada, em que ilustra o referido com os seguintes exemplos: Se o R. é condenado, como devedor, a cumprir uma prestação ao A., aquele não pode demandar este último pedindo a restituição, com base no enriquecimento sem causa, da quantia paga; se o R. é condenado a entregar uma coisa ao A., aquele não pode instaurar uma acção pedindo a restituição da mesma coisa.

[9] A sentença condenatória corresponde à situação existente no momento do encerramento da discussão nos termos do art. 611.º/1 do CPC.
[10] Miguel Teixeira de Sousa, obra citada, pág. 585/6.

[11] E a indiscutibilidade não pode ser posta em causa invocando argumentos, factos ou razões que o efeito preclusivo cobriu. - Prof. Castro Mendes, obra citada, pág. 186.

[12] A exceção do caso julgado encerra a vertente negativa, em ordem a evitar a repetição de ações; a autoridade do caso julgado traduz a vertente positiva, no sentido de imposição externa da decisão tomada.
[13] Se a exigisse não faria diferença com a exceção de caso julgado.

[14] São elucidativos os exemplos em que tal “figura” se considera normalmente como verificada:

Se uma decisão reconhece o direito de propriedade sobre uma parcela de terreno e condena o R. à sua restituição e à demolição da construção que na mesma efetuou, não pode o R. – por força da autoridade do caso julgado da primeira decisão – em nova ação, ainda que com fundamento em acessão industrial imobiliária, pedir o reconhecimento do direito de propriedade sobre a mesma parcela de terreno; apesar de não se verificar a exceção dilatória do caso julgado, atenta a diversidade da causa de pedir, a segurança e a certeza jurídica decorrentes do trânsito em julgado da primeira decisão obstam a que, em nova ação, se questione o direito de propriedade e as obrigações de restituição e de demolição reconhecidas na primeira ação com base numa realidade que já se verificava aquando da primeira ação e que aí poderia/deveria ter sido invocada pelo R. (quer para impedir a procedência da ação, quer para sustentar, em sede reconvencional, o direito potestativo de acessão imobiliária.

Se uma decisão condena no pagamento de uma indemnização, não pode aquele que é ali condenado vir pedir, com base no enriquecimento sem causa, a restituição da quantia paga; impedimento esse que resulta, não da exceção de caso julgado (face à diversidade das causa de pedir), mas da autoridade de caso julgado formado pela primitiva ação/decisão.

Se uma decisão condena no preço (duma compra e venda) duma coisa, não pode o condenado, em posterior ação, vir invocar vício invalidante de tal compra e venda; impedimento que também resulta da autoridade de caso julgado formado pela primitiva ação/decisão.

Se numa ação de reivindicação se reconhece a propriedade, tal vale como autoridade de caso julgado num processo posterior em que o proprietário requer a condenação da contraparte no pagamento duma indemnização pela ocupação indevida do imóvel.
[15] Miguel Teixeira de Sousa, BMJ 325, pág. 106
[16] Antunes Varela, Manual de Processo Civil, pág. 693