I. Na apreciação dos pressupostos para a manutenção da prestação alimentar a suportar pelo FGA, o ISS está a exercer uma função como coadjuvante do tribunal, elaboração de relatório.
II. Nesta medida, a notificação feita pelo ISS à agora recorrente, não podia ser feita na pessoa da sua mandatária, mas sim, na pessoa da recorrente, pelo que a notificação teria de ser feita para a morada, fornecida pelo tribunal ao ISS, para onde foi feita, nos termos do disposto no art.º 249.º, do C.P.C..
Proc.º n.º 8175/15.8T8CBR-A.C1
1.- Relatório
1.1. Nos presentes autos foi proferido despacho, datado de 11/3/2024, a determinar a cessação da atribuição de alimentos devidos a menores a favor de AA, do seguinte teor:
“A instituição do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores encontra fundamento no direito das crianças e jovens à protecção, consagrado constitucionalmente, visando proporcionar-lhes condições de subsistência mínimas essenciais ao seu desenvolvimento e a uma vida digna.
Nos termos do disposto no nº. 1 do artigo 9º do Decreto-Lei 164/99, de 13.05, com a redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei nº. 84/2019, de 28.06, o montante das prestações a pagar pelo Fundo mantém-se enquanto se verificarem as circunstâncias subjacentes à sua concessão e até que cesse a obrigação a que o devedor está obrigado.
De outro lado, nos termos do preceituado no artigo 9º, nº.s 4 e 5 e ainda no artigo 10º do mesmo diploma legal, mostra-se necessário que a pessoa que recebe a prestação de alimentos renove anualmente a prova da manutenção dos pressupostos de atribuição do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, sob pena da sua cessação e restituição das quantias pagas indevidamente. O que lhe é notificado pelo Tribunal sempre que a decisão de atribuição ou manutenção da intervenção do FGADM é deferida.
No caso dos autos, a requerente, notificada para comparecer junto dos serviços do ISS para elaboração do relatório relativo aos rendimentos do agregado familiar, para efeito de renovação da prova de manutenção dos pressupostos de atribuição do FGADM, sob cominação de indeferimento da sua pretensão, não compareceu e nada veio informar, não logrando fazer, dessa forma, prova da referida renovação de pressupostos.
Pelo exposto, e nos termos das disposições legais citadas, determino a cessação da atribuição do pagamento da prestação alimentar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores a favor de AA, determinando o oportuno arquivamento dos autos.
Custas pelo obrigado a alimentos, sem prejuízo de conta já elaborada.
Valor da causa: 30.000,01 €.
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Registe e notifique”
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1.2. – Inconformada com tal decisão, em 5/4/2024, dela recorreu - BB -, terminando a sua motivação com as conclusões que se transcrevem:
“1. A Requerente sempre cumpriu escrupulosamente as suas obrigações perante o Tribunal e o Instituto da Segurança Social e nunca se furtou às suas obrigações perante as entidades envolvidas no presente processo ou demonstrou desinteresse em prestar esclarecimentos e/ou prova dos rendimentos do agregado familiar e para tal basta atender ao histórico dos presentes autos.
2. A Requerente não recepcionou qualquer ofício do Instituto da Segurança Social, pelo que, não teve conhecimento das datas para a realização das entrevistas e por essa razão não compareceu às mesmas.
3. Para cumprimento do despacho proferido em 15 de Novembro de 2023, a Requerente deslocou-se aos Serviços da Segurança Social junto da loja do cidadão, munida do despacho comprovativo da necessidade da sua presença junto de tal instituto.
4. Nos Serviços da Segurança Social na loja do cidadão foi informada que aquele não seria o local correcto e que teria de se deslocar às Instalações da Segurança Social na Rua Abel Dias Urbano, 2, r/c, 3004-519, Coimbra.
5. A Requerente dirigiu-se às Instalações da Segurança Social na Rua Abel Dias Urbano, 2, r/c, 3004-519, Coimbra, exibiu o despacho a um funcionário cuja identidade desconhece e foi informada que para o efeito teria de aguardar notificação por parte da Segurança Social.
6. A Requerente ficou convicta de que havia cumprido o despacho, tendo ficado a aguardar a notificação que nunca chegou.
7. Por não ter efectuado qualquer marcação online e por não ter entregue, nessa ocasião, qualquer documento em que fosse gerado recibo de entrega, não detém qualquer comprovativo da sua presença nos referidos locais.
8. O facto de não ter comparecido às entrevistas marcadas pelo Instituto de Segurança Social deve-se exclusivamente ao facto de não ter tido conhecimento das mesmas.
9. O despacho de que ora se recorre, assenta na premissa errada de que a Requerente foi notificada para comparecer junto dos serviços do Instituto de Segurança Social, sob cominação de indeferimento da sua pretensão, e que não compareceu e nada veio informar.
10. A Requerente não foi notificada de qualquer ofício remetido pelo Instituto de Segurança Social por via postal, e tendo-se deslocada àquele Instituto foi erradamente informada de que teria de aguardar uma notificação.
11. A Requerente não cumpriu a obrigação de fornecer prova para aferição dos pressupostos de atribuição do FGADM por causas que não lhe podem ser imputáveis.
12. Manter-se o despacho recorrido, poderá resultar na violação de um direito constitucionalmente consagrado.
13. O Despacho de que ora se recorre, viola os normativos legais previstos nos artigos 1º, 2º nº 2, ambos da Lei nº 75/98, de 19 de Novembro e artigo 3º e 9º
do Decreto-Lei nº 164/99, de 13 de Maio.
Assim decidindo farão, Vas Exas a acostumada JUSTIÇA!”
“REQUER: nos termos e para os efeitos do estatuído no artigo 429º do Código de Processo Civil, que o Instituto de Segurança Social, concretamente, a Unidade de Desenvolvimento Social e Programas – Núcleo de Intervenção Social, sito na Rua Abel Dias Urbano, nº 2, r/c, 3004-519 Coimbra, seja notificada para juntar aos autos os registos postais, comprovativos da recepção (ou não) pela Requerente dos ofícios com aviso de recepção expedidos em 17 de Outubro de 2023 e em 16 de Novembro de 2023 para a morada da Requerente.
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1.3. – Feitas as notificações a que alude o art.º 221.º, do C.P.C., não houve resposta.
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1.4. – Em 30/7/2024 foi proferido despacho do seguinte teor:
“ Atendendo ao objecto do requerimento apresentado pela progenitora, antes de mais, com cópia do mesmo, solicite ao ISS esclarecimento sobre as notificações realizadas à mesma para elaboração do relatório apresentado, juntando aos autos cópia das comunicações expedidas e respectivos AR.
Oportunamente, juntos os elementos solicitados, se decidirá sobre a admissão do recurso apresentado, se nisso mantiver interesse a requerente.
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Sem prejuízo, atendendo às informações prestadas pela progenitora e à natureza da intervenção do FGADM, solicite ainda ao ISS a elaboração de novo relatório para averiguação da condição de recursos da requerente, com vista a aferir os requisitos para intervenção do FGADM”.
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1.5. – Foi proferido despacho, datado de 24/9/2024, admitir o recurso do seguinte teor:
“Por tempestivo admito o recurso interposto, que é de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (artigos 32.º e 33.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível e 645.º, n.º 1, al. a), do Código de Processo Civil).
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Subam os autos ao Tribunal da Relação de Coimbra”.
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1.6.- Em 9/10/2024 foi proferido despacho do seguinte teor:
“Compulsados os autos, e quando estávamos a estudar os mesmos, verificamos que o Sr.º Procurador apenas foi notificado da decisão, recorrida, já não do recurso interposto, nem do despacho que recebeu o mesmo.
Assim, para evitar que venha a ser invocada qualquer violação do contraditório, remeta os autos à 1.ª instância para se proceder às respetivas notificações, após ser proferido em consonância”.
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1.7. – Em 17/10/2024 o M.P. veio dizer que não irá apresentar resposta escrita.
Porquanto ao MºPº Publico cabe, por força estatutária, a representação das crianças e jovens na menoridade.
Ora, o jovem AA, visado nos autos, tem 20 anos de idade e, por isso, o MºPº carece de legitimidade para a respetiva representação.
Ademais, também não cabe ao MºPº a representação do Fundo de Garantia de Alimentos devidos a Menores, a quem cabe garantir o pagamento das prestações de alimentos em caso de incumprimento da obrigação pelo respetivo devedor, após ordem do tribunal competente e subsequente comunicação da entidade gestora.
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1.8. – Com dispensa de vistos cumpre decidir
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2.- Fundamentação
Os factos a ter presente são os aludidos no relatório supra bem como, os que se seguem.
2.1.- Por decisão judicial datada de 5/12/2019, transitada em julgado, foi determinado que o Fundo de Garantia de Alimentos devidos a Menores prestasse a pensão de alimentos em substituição do progenitor incumpridor.
2.2. - Em 15/9/2022, foi proferida decisão a julgar verificados os pressupostos de manutenção do pagamento da prestação alimentar a efectuar pelo Fundo de Garantia de Alimentos devidos a Menores, renovando a prestação alimentar fixada a cargo do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores no montante de € 100,00 (cem euros) mensais, quantia a atualizar de acordo com o estabelecido na sentença de regulação do exercício das responsabilidades parentais, ou seja, de acordo com a taxa de inflação publicada pelo INE, com início em Novembro de 2016, a favor de AA.
2.3. - Esta decisão foi comunicada em 16/9/2022 ao FGDAM, bem como à mandatária da recorrente, via CITIUS em 16/9/2022.
2.4. - Em 10/10/2023 foi proferido despacho a solicitar à Segurança Social os habituais relatórios sobre o agregado familiar das crianças ou jovens e obrigado/a a alimentos para efeitos de intervenção do Fundo de Garantia de Alimentos devidos a Menores.
2.5. - Em 15/11/2023 foi proferido despacho a notificar a requerente, aqui recorrente para, no prazo de 10 dias, comparecer nos serviços da Segurança Social em Coimbra para elaboração do relatório necessário para renovação da intervenção do FGADM, sob pena de indeferimento da sua pretensão.
2.6. - A mandatária da mesma foi notificada de tal despacho em 16/11/2023, via CITIUS.
2.7. - A equipa ATT (ISS) em 6/12/2023 fez entrar um mail no tribunal, onde no mais refere “foi agendada entrevista para 21/11/2023, expedida a 16/11/2023, afim de dar cumprimento ao solicitado por V.Ex.ª, no entanto o/a requerido/a não se apresentou, nem justificou a ausência até à presente data”
2.8. - Em 11/3/2024 foi proferida a decisão recorrida.
2.9. - O despacho aludido em 1.4. foi notifico ao Centro Distrital de Segurança Social, em Coimbra, via Citius em 30/7/2024.
Nessa notificação diz-se: “Tenho a honra de solicitar a V.Exª se digne providenciar no sentido de ser remetido a este tribunal inquérito sobre as necessidades do menor AA, desconhecida ou sem Profissão, filho(a) de , nascido(a) em ../../2004, nacional de Portugal, NIF - ...13, BI - ...60, Endereço: Rua ... ... ... bem como a situação sócio-económica do alimentado e da sua família.
Com os melhores cumprimentos”.
2.10. - Noutra notificação, datada de 30/7/2024, via CITIUS, tendo ainda haver com o despacho aludido em 1.4, refere-se; “Por ordem do Mmº Juiuz e atendendo ao objecto do requerimento apresentado pela progenitora, cuja cópia se junta, solicita-se a V. Exª esclarecimento sobre as notificações realizadas à mesma para elaboração do relatório apresentado, juntando aos autos cópia dascomunicações expedidas e respectivos AR.
Oportunamente, juntos os elementos solicitados, se decidirá sobre a admissão do recurso apresentado, se nisso mantiver interesse a requerente.
CRIANÇA:
BB estado civil: Desconhecido, NIF -...07 domicílio: CC N ...8..., ... ...”.
2.11. – A Equipa ATT (ISS) em 5/8/2024 fez entrar um mail onde consta, entre o mais:
“- Em 11/10/2023, foi agendada entrevista para o dia 23/10/2023, por oficio com aviso de receção, expedido a 17/10/2023, a fim de dar cumprimento ao solicitado por V.Ex.ª Ex.ª, no entanto o/a requerido/a não se apresentou, nem justificou a ausência, conforme documento anexo.
- A 16/11/2023 foi agendada entrevista para 21/11/2023, por oficio com aviso de receção, expedido a 16/11/2023, a fim de dar resposta ao pedido por V. Ex.ª. no entanto o/a requerido/a voltou a não comparecer, nem justificar, anexam-se os comprovativos
- Informa-se ainda, que após o prazo legal para justificar a falta à entrevista e efetuado o respetivo relato de diligências para o Tribunal competente, apenas efetuamos nova convocatório, com a mesma instituição via electrónica convencionada.
2.12.- Dos documentos anexos resulta que a correspondência foi enviada para a Rua ..., ..., ... – ....
2.13. – A qual foi devolvida ao remetente.
2.14. – Em 19/8/2024 o (ISS) fez entrar mail onde entre o mais refere:
“Somos a informar que, relativamente ao processo de incumprimento das responsabilidades parentais n.º 8175/15...., Ref. 9421889, datado de 30/7/2024, foi agendada entrevista para o dia 8/8/2024 por oficio com aviso de receção, expedido a 31/7/2024, a fim de dar cumprimento ao solicitado por VE.ª, no entanto o/a requerido/a não se apresentou nem justificou a ausência até à presente data.
2.15. - Dos documentos anexos resulta que a correspondência foi enviada para a Rua ..., ..., ... – ....
2.16. – A qual foi devolvida ao remetente.
2.17. – A requerente em 26/8/2024 fez entrar requerimento onde refere que tendo em consideração os documentos ora juntos, por ofício datado de 31.07.2024, o Instituto de Segurança Social, IP, tentou agendar entrevista com a Requerente para o dia 08.08.2024, sucede que, e conforme facilmente se poderá verificar pela análise dos documentos ora juntos, o ofício foi devolvido ao remetente, não tendo a Requerente tido conhecimento do mesmo, pois a morada correta da requerente é: Rua ... A ... ...
E não a morada para a qual foi remetido o ofício:
Rua ...
... ...
2.18. – Em 24/9/2024 foi proferido despacho admitir recurso, como referido em 1.5.
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3. Motivação
É sabido que é pelas conclusões das alegações dos recorrentes que se fixa e delimita o objeto dos recursos, não podendo o tribunal de recurso conhecer de matérias ou questões nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso (artºs. 635º, nº. 4, 639º, nº. 1, e 608º, nº. 2, do CPC).
Constitui ainda communis opinio, de que o conceito de questões de que tribunal deve tomar conhecimento, para além de estar delimitado pelas conclusões das alegações de recurso e/ou contra-alegações às mesmas (em caso de ampliação do objeto do recurso), deve somente ser aferido em função direta do pedido e da causa de pedir aduzidos pelas partes ou da matéria de exceção capaz de conduzir à inconcludência/improcedência da pretensão para a qual se visa obter tutela judicial, ou seja, abrange tão somente as pretensões deduzidas em termos do pedido ou da causa de pedir ou as exceções aduzidas capazes de levar à improcedência desse pedido, delas sendo excluídos os argumentos ou motivos de fundamentação jurídica esgrimidos/aduzidos pelas partes, bem como matéria nova antes submetida apreciação do tribunal a quo – a não que sejam de conhecimento oficioso - (vide, por todos, Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in “Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, 3ª. ed., Almedina, pág. 735.”
Calcorreando as conclusões das alegações do recurso, verificamos que a questão a decidir consiste em saber – se a decisão recorrida deve ser revogada e substituída por acórdão, que não determine a cessação da atribuição do pagamento da prestação alimentar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores a favor de AA.
Segundo a recorrente não foi notificada o Tribunal “a quo” assenta numa premissa errada de que foi notificada para comparecer junto dos serviços do Instituto de Segurança Social, sob cominação de indeferimento da sua pretensão, e que não compareceu e nada veio informar. Nunca foi notificada de qualquer ofício remetido pelo Instituto de Segurança Social por via postal, e tendo-se deslocada àquele Instituto foi erradamente informada de que teria de aguardar uma notificação, pelo que, a Requerente não cumpriu a obrigação de fornecer prova para aferição dos pressupostos de atribuição do FGADM por causas que não lhe podem ser imputáveis.
Apreciando.
A questão consiste em saber se a recorrente se deve ou não considerar notificada".
A recorrente tem mandatária, pelo que, nos termos do art.º 247.º, do C.P.C., as notificações feitas pelo tribunal devem ser feitas na pessoa da sua mandatária.
No caso em apreço, a notificação não foi feita pelo tribunal, mas sim pelo ISS, tendo tal notificação sido feita para a morada que o Tribunal “a quo”, indicou ao ISS (cfr. factos 2.9 e 2.10).
Assim, coloca-se-nos a questão que preceitos se devem aplicar.
No caso em apreço, temos para nós, que o ISS está a exercer uma função como coadjuvante do tribunal, elaboração de relatório.
Nesta medida, a notificação feita pelo ISS à agora recorrente, não podia ser feita na pessoa da sua mandatária, mas sim, na pessoa da recorrente. Pelo que, sendo assim, a notificação teria de ser feita para a morada, fornecida pelo tribunal ao ISS, para onde foi feita (cfr. factos 2.12. e 2.15.).
Neste quadro, temos para nós, que teremos de aplicar o art.º 249.º, do C.P.C., ou seja ser a notificação feita para a morada constante dos autos, a qual como já referimos foi comunicada pelo tribunal ao ISS, quando se refere nos factos 2.19, 2.10, 2.12. e 2.15.
Seguindo este raciocínio, temos para nós, que a recorrente tem de se considerar notificada, (cfr. n.º 2, do art.º 249.º, do C.P.C.), até, por a mesma não ter comunicado ao tribunal ou ao ISS outra morada.
Neste sentido parecem ir MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e J. PACHECO DE AMORIM [In Código do Procedimento Administrativo, 2.ª Edição, 2010, pp. 360-361] que referem ainda que a respeito do art.º 70.º do CPA que (As notificações podem ser feitas: Por via postal, desde que exista distribuição domiciliária na localidade de residência ou sede do notificando); «II. O envio da notificação pelos correios é feito sob a forma registada, não havendo nenhuma razão para distinguir neste aspecto o processo judicial e o procedimento administrativo, considerando-se, portanto, que vale aqui, até por razões de certeza, a regra do art. 255.º do Código de Processo Civil, (à data hoje art.º 249.º, do mesmo diploma, sublinhado é nosso), fica feita a prova no processo (ao qual é junto o respectivo talão de “registo”) de que a notificação foi enviada e em que data, podendo presumir-se (como em juízo) que os serviços postais entregam, nos prazos normais, aos respectivos destinatários, a correspondência que lhes é confiada.» O que quer dizer que, que no processo administrativo, quer no âmbito do procedimento administrativo, valem, quanto às notificações, as regras estatuídas no Código de Processo Civil.
Estabelecia o artigo 255.º, n.º 1, do CPC, revogado, hoje art.º 249.º que «Se a parte não tiver constituído mandatário, as notificações ser-lhe-ão feitas no local da sua residência ou sede ou no domicílio escolhido para o efeito de as receber, nos termos estabelecidos para as notificações aos mandatários».
No mesmo sentido parecem ir JOSÉ LEBRE DE FREITAS e JOÃO REDINHA e RUI PINTO [In Código de Processo Civil Anotado, Volume 1.º, p. 449] quando referem que ficou consagrado no n.º4 do preceito em apreço, o entendimento que «as partes e os seus mandatários têm o dever de fornecer ao tribunal o conhecimento da residência, local de trabalho ou sede do réu, quando o venham a ter, assim como o juiz tem o dever de se servir para o efeito do conhecimento privado que porventura tenha, ao abrigo do princípio geral da cooperação (art. 266).» Por seu turno, o artigo 254.º do CPC, (à data hoje art.º 249), dispõe que «3. A notificação postal presume-se feita no terceiro dia posterior ao do registo, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja. 4. A notificação não deixa de produzir efeito pelo facto de o expediente ser devolvido, desde que a remessa tenha sido feita para o escritório do mandatário ou para o domicílio por ele escolhido; nesse caso, ou no de a carta não ter sido entregue por ausência do destinatário, juntar-se-á ao processo o sobrescrito, presumindo-se a notificação feita no dia a que se refere o número anterior. (…) 6. As presunções estabelecidas nos números anteriores só podem ser ilididas pelo notificado provando que a notificação não foi efectuada ou ocorreu em data posterior à presumida, por razões que lhe não são imputáveis.».
Face ao exposto e tendo presente aos factos provados não vislumbramos que o recebimento das cartas enviadas pelo ISS não lhe fosse imputável, tanto mais, que na sua motivação e conclusões refere que se exibiu o despacho do Tribunal a um funcionário cuja identidade desconhece e foi informada que para o efeito teria de aguardar notificação por parte da Segurança Social (cfr. ponto 5 das conclusões), Então, sendo assim, deveria ter o cuidado de perguntar qual a morada que constava nos serviços, ou dar a nova morada, o que não é alegado.
Ou seja, tendo-lhe sido dito que iria ser notificada, deveria ter logo indicado a nova morada, o que não refere ter feito.
Assim, não pode vir, agora, referir que a não notificação não lhe é imputável
Poderíamos ser levados a pensar que ao caso seria de aplicar o CPA (código de procedimento administrativo), por o ISS poder ser considerada uma entidade administrativa. Temos para nós, que não deve ser aplicado o mesmo, desde logo, por o ISS no caso vertente não estar a desempenhar qualquer função, de decisão, mas antes uma função de adjuvante ao tribunal, elaboração de relatório.
Mesmo a entender-se que seria de aplicar o CPA, que não é, quanto a nós, também a recorrente teria de ser considerada devidamente notificada por força do preceituado na al.ª a), do n.º 1, do art.º 112,º e n.ºs 1 e 2, do 113.º, do citado diploma (CPA).
Face ao exposto, e, pelas razões, supra referidas, não vislumbramos razão para alterar a decisão recorrida.
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4. Decisão
Face ao exposto, julgamos o recurso improcedente e manter a decisão recorrida nos seus termos.
Custas pela recorrente, sem prejuízo de eventual apoio judiciário.
Coimbra, 26/2024
Pires Robalo (relator)
Francisco Costeira da Rocha (adjunto)
Luís Miguel Caldas (adjunto)