I – A possibilidade de o juiz ordenar oficiosamente a realização de diligências ao abrigo do art. 411º do Cód. Proc. Civil não pode servir de fundamento para que este, substituindo-se à parte, determine a realização de uma diligência probatória que a parte poderia ter requerido e não o fez.
II – Se o juiz assim o fizesse violaria, de forma grave, os princípios da preclusão, da autorresponsabilidade das partes e também da igualdade das partes, uma vez que estaria a permitir a realização de um ato já precludido e a favorecer uma das partes no litígio em detrimento da outra.
Comarca de Aveiro – Juízo de Competência Genérica de Vale de Cambra
Apelação
Recorrente: “A..., Lda.”
Recorrida: “B..., Lda.”
Relator: Eduardo Rodrigues Pires
Adjuntos: Desembargadores Alberto Taveira e Maria da Luz Teles de Meneses de Seabra
Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto:
RELATÓRIO
A autora “B..., Lda.”, com sede na Rua ..., ... intentou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra a ré “A..., Lda.”, com sede na Rua ..., ..., peticionando que a ré seja condenada a pagar-lhe:
- O valor da fatura FT 1/1997 de 12.10.2022, que reflete o preço referente à venda da máquina de etiquetas e estufa, no montante de 5.227,50€;
- O valor da factura 1394/2022, de 13.7.2022, emitida pelos C..., no montante de 123,00€;
- O valor da fatura FAC A22/659, de 23.9.2022, emitida pela D..., Lda., no montante de 110,70€;
- O valor da fatura FAC A22/864, também emitida pela D..., Lda., no montante de 467,40€;
- A quantia de 250,00€ a título de danos morais.
Peticiona ainda a condenação da ré no pagamento dos juros vencidos, contabilizados à taxa legal desde 13.7.2022 até à data da instauração da ação, no valor de 141,50€ e nos juros vincendos até efetivo e integral pagamento.
Alega para o efeito, e em síntese, que, em data que não pode precisar, mas no mês de maio de 2022, acordou vender à ré uma máquina de etiquetas e estufa, pelo preço de 5.227,50€. Nesse seguimento, entregou a máquina nas instalações da ré no dia 13.7.2022, que a recebeu e aceitou sem nenhuma reserva.
Entregue a máquina nas instalações da ré, pediu que esta lhe pagasse o preço devido pela venda e pelo transporte da mesma, tendo os responsáveis da ré informado que teriam que falar primeiro com o contabilista.
Após essa data, e perante as insistências da autora, a ré respondeu que a máquina perdia óleo, o que motivou que a autora enviasse um mecânico às instalações da ré, mecânico esse que, após verificar a máquina e o seu funcionamento, constatou que a mesma não apresentava nenhuma avaria ou defeito.
Alega ainda que a ré não só não lhe pagou, como alegou que a máquina estava cheia de defeitos, nomeadamente, perdia óleo, a correia e as molas dos rolos estavam a partir, o contador não funcionava e a estufa também não.
Tal motivou uma segunda deslocação do mecânico às instalações da ré, tendo este chegado à mesma conclusão que anteriormente, ou seja, de que a máquina não tem qualquer defeito ou avaria.
Termina, assim, peticionando a condenação da ré no pagamento do preço da máquina, do transporte, das duas deslocações do mecânico às suas instalações e de 250,00€ a título de danos morais, tudo acrescido de juros à taxa legal.
A ré “A..., Lda.”, regularmente citada, apresentou contestação, defendendo-se por exceção e por impugnação.
Com efeito, alega que, da reunião ocorrida no mês de maio de 2022, apenas resultou o interesse da autora em vender a máquina e o interesse da ré em comprá-la, mas sujeita à condição de a experimentar em contexto de trabalho, e que, face aos defeitos de que a máquina padecia (a verter óleo pelas juntas, a correia partida, o contador inoperacional e as molas dos rolos partidas), nunca chegou a dar como aceite o mencionado equipamento.
Invoca, assim, que a autora emitiu a fatura de venda à revelia da ré, recusando-se a aceitar a devolução da máquina de etiquetas, tendo, por esse motivo, emitido nota de devolução de todo o equipamento faturado, advertindo a autora de que deveria recolher todo o equipamento constante da nota de devolução, nas suas instalações em ..., o que não sucedeu, estando a máquina a ocupar as suas instalações, lutando esta com dificuldades de espaço.
Termina pugnando pela improcedência da ação, deduzindo ainda pedido reconvencional contra a autora, peticionando a respetiva condenação no seguinte:
- No reconhecimento da resolução do contrato “à condição”, por incumprimento do acordado, nomeadamente, da eliminação dos defeitos da máquina de etiquetas e estufa;
- No pagamento à ré/reconvinte do montante de 1.500,00€ a título de compensação pela ocupação, até à data da apresentação da contestação, das instalações da mesma pela aludida máquina;
- No pagamento do montante de 30,00€ diários desde a data da notificação da autora/reconvinda do pedido reconvencional até que esta proceda ao levantamento da máquina de etiquetas e estufa das instalações da ré/reconvinte.
Notificada a contestação/reconvenção à autora/reconvinda, esta apresentou réplica, reproduzindo o já alegado em sede de petição inicial, reiterando que a máquina vendida não padecia de qualquer vício ou defeito que impedisse o seu normal funcionamento e que a conduta da ré/reconvinte ao emitir nota de devolução do equipamento e advertir a autora para proceder à sua recolha, sem qualquer causa que o justificasse, é, na sua perspetiva, uma conduta arbitrária, integrando o instituto jurídico do abuso do direito.
Mediante requerimento com a referência citius n.º 1513682 datado de 11.10.2023 veio a ré/reconvinte pugnar pela não verificação do abuso do direito.
Foi realizada audiência prévia, com admissão do pedido reconvencional, bem como da réplica.
Nos termos das disposições conjugadas dos arts. 596º e 597º, al. e) “a contrario”, ambos do Cód. de Proc. Civil, foi dispensada a prolação de despacho a identificar o objeto do litígio e a enunciar os temas da prova.
Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento, com observância do formalismo legal.
Por fim, foi proferida sentença que:
a) Julgou parcialmente procedente a ação e, em consequência, condenou a ré “A..., Lda.” no pagamento à autora “B..., Lda.” do montante global de 5.461,20€ de capital, correspondente às seguintes faturas:
- Fatura FT 1/1997 datada 12.10.2022, no valor global de 5.227,50€, que reflete o preço referente à venda da máquina de etiquetas e estufa, com vencimento nessa data.
- Fatura 1394/2022, de 13.7.2022, vencida em 11.9.2022, emitida pelos C..., Lda., no valor de 123,00€.
- Factura FAC A22/659, de 23.9.2022, vencida em 23.10.2022, emitida pela D..., Lda, no valor de 110,70€.
b) Condenou a ré “A..., Lda.” no pagamento à autora “B..., Lda.” dos juros de mora vencidos e vincendos, devidos desde a data de vencimento de cada uma das faturas referidas na alínea (a) até à data da propositura da ação, no valor global de 93,05€ e desde essa data até efetivo e integral pagamento, segundo a taxa legal sucessivamente aplicável aos juros civis, fixada atualmente, nos termos do artigo 559º, nº 1 do Cód. Civil e da Portaria nº 291/2003, de 8.4., em 4%.
c) Absolveu a ré do demais peticionado;
d) Julgou totalmente improcedente, por não provado, o pedido reconvencional deduzido pela ré/reconvinte “A..., Lda.”.
Inconformada com o decidido interpôs recurso a ré, tendo finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões[1]:
1. Nestes autos, e muito sumariamente, veio a Autora requerer a condenação da Ré no pagamento do preço da compra de uma máquina usada, bem como de outras despesas como o transporte da mesma para as instalações da Ré e o pagamento efectuado por uma das deslocações de um mecânico às instalações da Ré, a mando da Autora, tendo a Ré invocado, em sede de contestação com dedução de reconvenção, a existência de defeitos na máquina, vindo o Tribunal a quo a considerar como não provado a existência de defeitos e por conseguinte, condenar a Ré em tais pagamentos.
2. Começa-se por referir dos presentes autos, depois de ouvida a prova, podemos concluir seguramente que a máquina vendida vertia óleo! Que a Ré denunciou atempadamente (12 dias após a entrega) esse e outros defeitos e que a Autora enviou um técnico para a reparar, pelo que não vislumbramos a razão pela qual foi a Ré condenada no pagamento!
3. Efetivamente, valorada toda a prova produzida, seja documental, seja testemunhal, vislumbra-se sem margem para dúvidas que a máquina apresentava fugas de óleo!
4. Daí a Autora ter aceitado enviar, a expensas da mesma (facto provado 25), um técnico (testemunha AA) às instalações da Ré, o qual até confessou em Tribunal que é especializado em outro tipo de máquinas, mas que se sentia à vontade para resolver o problema do óleo da máquina! (vid. Fundamentação de facto relativamente à alínea G dos factos não provados pág. 20 da sentença).
5. Neste sentido, com vista ao apuramento da verdade, e ficando ainda a Mª Juíza com algumas dúvidas, relativamente aos outros defeitos também denunciados pela Ré, impunha-se que a mesma ordenasse, oficiosamente, a realização de uma perícia à máquina, ao abrigo do artigo 411.º do CPC, a fim de serem detectados os defeitos da máquina. O que não fez!
6. Nessa conformidade, e nos termos das alíneas a), b) e c) do n.º 1 e da alínea a) do n.º 2 do art. 640.º do CPC, as provas que impõem decisão diversa da que decorre da douta sentença são as que resultam da prova documental e que decorrem dos depoimentos prestados, cujas partes principais adiante se transcrevem e que constam de gravação magnetofónica.
7. 1 – A resposta dada à alínea F) dos Factos Não Provados – “que a máquina padeça de defeitos, nomeadamente, verta óleo pelas juntas, a correia esteja partida, o contador inoperacional e as molas dos rolos partidas, não trabalhando” não está correta, não tem qualquer fundamentação e está em contradição insanável com a resposta dada à alínea A) dos factos não provados “ – que aquando a primeira visita às instalações da Ré, o mecânico tenha verificado a máquina e o seu funcionamento, constatando nessa primeira visita que a mesma não perdia óleo, nem apresentava nenhuma avaria ou defeito”.
8. Na verdade, dá-se como não provado que a máquina padece de defeitos, mas também como não provado que a máquina não apresenta qualquer avaria ou defeito. O que constitui uma evidente contradição!
9. Também consideramos que o facto provado 21 “Na sequência da aludida comunicação, a Autora enviou às instalações da Ré um mecânico” e o facto provado 26 “A Autora solicitou de novo ao mecânico que se deslocasse às instalações da Ré”, estão incorretamente julgados e sem fundamentação.
10. Começando pela alínea F) dos Factos não Provados, na sua douta decisão, entendemos que a fundamentação de facto não corresponde à prova testemunhal, aos documentos juntos aos autos e às regras da experiência comum.
11. Com efeito, a 08-07-2022, a máquina foi entregue nas instalações da Ré (facto provado n.º 14), a 20-07-2022, a Ré denunciou que a máquina perdia mesmo muito óleo, o que fez por comunicação dirigida à Autora (facto provado n.º 20), no qual foram anexadas as fotografias juntas como Doc. 3 a 11 em sede de contestação, assim ficando documentado o óleo que já existia no chão naquela concreta data.
12. A Autora, depois desta denúncia a 20-07-2022, mas só volvidos dois meses, aceitou enviar um técnico as expensas suas às instalações da Ré, através do email datado de 13.09.2022 (facto provado n.º 25), o qual esteve lá duas vezes, em datas não concretamente apuradas, mas seguramente depois de 13-09-2022, conforme se pode depreender pela factura de 23-09-2022 (facto provado nº 22) e pela factura emitida em 12-12-2022 (facto provado nº 30 e doc. 5 da petição).
13. Da conjugação dos e-mails de 20.07.2022 e de 13.09.2022, ambos dados como factos provados (20º e 25º), resultam três factos em evidência: a máquina não funcionava correctamente, vertia óleo; que esse facto foi reportado à vendedora e que esta reconheceu esses defeitos ao ter enviado um técnico para reparar a expensas suas.
14. Não é despiciendo referir que a Autora, no artº 27 da Réplica, já confessa que a máquina vendida, “apresentou, em determinado momento, uma pequena fuga de óleo, prontamente resolvido pelo mecânico que a autora fez deslocar às instalações da Ré um mecânico”.
15. Acresce que, ao contrário do que fundamentou o Tribunal a quo, a fuga de óleo não foi apenas relatada em sede de declarações de parte da Ré e do depoimento da testemunha desta, BB, tal defeito foi também mencionado por outras testemunhas.
16. Veja-se o que refere CC (impressor gráfico na Ré testemunha arrolada pela Ré: disse que viu a mancha de óleo à volta da máquina, mas não donde ela saiu, afirmando que a máquina tinha problemas, (vid. Sentença página 16), e gravação aos minutos 02:33, 03:16, 05:53, 06:10 e 06:36 do seu depoimento, supra transcrito.
17. Veja-se também o técnico AA, testemunha da Autora, conforme a sentença nos três últimos parágrafos da pág. 13, “confirmou que foi duas vezes às instalações da Ré, a primeira para identificar o problema e a segunda para resolver. Referiu ainda que, da primeira vez, esteve lá o Sr. BB, os filhos e um empregado, bem como o legal representante da Autora, e que existia óleo à volta de toda a máquina e chegou-se à conclusão que era preciso levantar a máquina para ver de onde vinha o problema Relatou também esta testemunha que, da segunda vez que foi às instalações da Autora, levantou a máquina, tirou o óleo todo, comprou uma massa própria de vedação e vedou-se todos os sítios de onde podia estar a verter o óleo (…)”, “Mais referiu esta testemunha que pese embora as máquinas de etiquetas e estufa não sejam a sua especialidade “sentia-se à vontade para resolver o problema de óleo da máquina”. (…)
18. Analisemos, ainda, a transcrição do depoimento da testemunha AA aos minutos 04:27, 04:59, 05:22, 07:37, 07:44, 08:10, 08:36, 08:41, 08:51, 09:58, 10:08, 13:50, 14:37 e 20:08 do seu depoimento, nos termos supra transcritos, podemos ouvir que ele disse que viu óleo e que só foi lá para resolver o problema de óleo e mais nada.
19. Por fim, analisemos partes do depoimento da testemunha da Ré DD, aos minutos 02:47, 03:38, 03:55, 06:08, 12:01, 12:08, 13:50, 14:02, 14:34 e 06:08 do seu depoimento, conforme foi supra transcrito, o qual confirma a existência de defeitos e a fuga de óleo.
20. Quanto a esta testemunha, acrescenta a Mª Juíza na página 15 da sentença, nos dois últimos parágrafos o seguinte: “ (…) O depoimento desta testemunha não se revelou, contudo, credível aos olhos do Tribunal, desde logo porque a própria sócio-gerente, EE, nas declarações que prestou, mencionou que demora dias a acumular-se a poça de óleo e que não é no mesmo dia, contrariando, deste modo, o depoimento prestado por esta testemunha, segundo o qual, passadas 24 horas, já havia “um mar de óleo” à volta da máquina”.
21. No entanto, não concordamos com a opção da Mª Juíza, em retirar a credibilidade a esta testemunha com base apenas na contradição, entre o seu depoimento e as declarações da legal representante da Ré, relativamente ao nº de dias em que a poça de óleo ocorre.
22. Na verdade, o que importa reter deste depoimento é que a testemunha refere que a máquina vertia óleo de uma forma anormal.
23. Consideramos que o depoimento desta testemunha revelou conhecimento directo dos factos que relatou, foi prestado perante o Tribunal de forma objectiva, demonstrando intenção de responder ao que se recordava e como se recordava, não indiciando qualquer interesse pessoal ou profissional, um depoimento que, embora não coincidisse na íntegra com as declarações da sócia gerente da Ré, revelou o relato de factos que observou e viveu.
24. De facto, um testemunho não é necessariamente infalível nem necessariamente erróneo como salienta FF, advertindo para que ― todo aquele que tem a árdua função de julgar, fuja à natural tendência para considerar a concordância dos testemunhos como prova da sua veracidade.
25. Assim sendo, todas estas supra referidas testemunhas e não só os legais representantes da Ré e a testemunha desta BB, referiram que havia fuga de óleo!
26. Por todo o exposto e face à fixação incorrecta da matéria de facto vertida, deverão V. Exas alterar a resposta dada ao ponto F) - dos Factos Não Provados, considerando esse facto Provado.
27. Em relação ao facto provado 21 “Na sequência da aludida comunicação, a Autora enviou às instalações da Ré um mecânico” e facto provado 26 “A Autora solicitou de novo ao mecânico que se deslocasse às instalações da Ré”, também estão incorretamente julgados e sem fundamentação, considerando, erradamente, a Mª Juíza que foram admitidos por acordo.
28. Com efeito, e como já se referiu, encontra-se assente que o técnico, a pedido da Autora, foi às instalações da Ré, duas vezes, “a primeira para identificar o problema e a segunda para resolver” (vid. Sentença pag.13), sendo que as duas deslocações resultaram apenas de um pedido da Autora e não de um novo pedido ou até de uma nova tentativa de resolver o problema.
29. A primeira deslocação (para identificar o problema) ocorreu em 23-09-2022 (facto provado nº 22).
30. A segunda deslocação (para resolver o problema) ocorreu posteriormente conforme factura emitida em 12-12-2023 (facto provado 30 e documento 5 da p.i.).
31. É isto que resulta da prova produzida, mas o Tribunal a quo, fundamentando erradamente que esses factos (21 e 26) ficaram assentes por acordo das partes (vid. Página 17 da Sentença), e trocando a cronologia dos factos ocorridos, fez corresponder a segunda deslocação (para resolver o problema) a uma nova solicitação. Nada mais errado! Nem se vislumbra onde poderá o Tribunal a quo ter tirado esta ideia.
32. Pelo que, e face à fixação incorreta da matéria de facto, deverão V. Exas, eliminar o facto provado n.º 26 ou, quando não, passar de provado para não provado e quanto ao facto provado 21 deverá ser acrescentado que a deslocação ocorreu apenas em Setembro.
33.2 – E face à prova produzida, a resposta dada aos factos nº 27 e 28 dos Factos Provados:
“Aquele profissional desmontou a máquina, procedeu à realização de testes exaustivos, vedou as partes onde poderia eventualmente haver uma fuga de óleo, fuga de óleo essa que não detectou e “O mecânico passou 6 horas na realização daquelas tarefas, não tendo detectado qualquer defeito ou avaria” e a al. G) dos Factos não provados: “Que o mecânico enviado às instalações da Ré tenha comunicado aos legais representantes da Ré que nada percebia deste tipo de máquinas e que não conseguia resolver o problema”, não está correta nem tem qualquer fundamento.
34. Com efeito, a Mª Juíza fundou a sua convicção apenas no supra referido depoimento do técnico AA, testemunha da Autora “a qual, na perspectiva do Tribunal, prestou um depoimento isento e credível, mencionando que já fez trabalhos para ambas as partes, não tendo o Tribunal notado qualquer animosidade quanto a nenhuma das partes” (pág.. 13 e 14 da sentença).
35. Sem pretensões de colocar em causa a credibilidade da dita testemunha, afirmamos que do seu depoimento, apenas podemos concluir que o mesmo levantou a máquina, tirou o óleo todo e que, com uma massa própria para vedação, vedou todos os sítios de onde podia estar a verter o óleo, tendo dado indicações à Ré para encher o depósito do óleo passado uns dias.
36. Deste depoimento não se depreende que ele tenha desmontado a máquina, pois só levantou, e que tenha feito fez testes exaustivos, por outro lado do seu depoimento resulta que ele verificou a fuga de óleo, só não conseguiu foi apurar a origem.
37. Pelo que deverão V. Exas alterar a resposta dada ao ponto 27 dos Factos Provados, considerando apenas que:
“Aquele profissional levantou a máquina, tirou o óleo todo e que, com uma massa própria para vedação, vedou todos os sítios de onde podia estar a verter o óleo, tendo dado indicações à Ré para encher o depósito do óleo passado uns dias”.
38. Quanto ao nº 28 dos Factos Provados: “O mecânico passou 6 horas na realização daquelas tarefas, não tendo detectado qualquer defeito ou avaria”, foi também julgado provado com base no depoimento da mesma testemunha, sendo que deste depoimento acima transcrito, apenas se pode depreender que ele foi a mando da Autora resolver apenas o problema da fuga do óleo e que embora as máquinas de etiquetas e estufa não fossem a sua especialidade, sentia-se à vontade para resolver o problema de fuga de óleo.
39. Deste depoimento não se pode extrair a conclusão de que o técnico não detectou qualquer defeito ou avaria, pois é o próprio a referir que apenas foi resolver o problema do óleo, “não fui ver movimentos de máquina, não fui ver se a máquina trabalhava, se não trabalhava. Fui ver a fuga de óleo (minuto 14:37); “Eu não fui chamado para resolver nenhum problema da máquina (minuto 20:08).
40. Pelo que deverão V. Exas alterar a resposta dada ao ponto 28 dos Factos Provados, considerando o facto não provado.
41. Relativamente à al. G) dos Factos não provados: “Que o mecânico enviado às instalações da Ré tenha comunicado aos legais representantes da Ré que nada percebia deste tipo de máquinas e que não conseguia resolver o problema”, consideramos que, do depoimento da referida testemunha podemos depreender que este não é um mecânico especializado naquelas máquinas, pelo que, e de acordo com as regras da experiência comum, é de aceitar que este técnico tenha transmitido essa limitação aos legais representantes da Ré e à testemunha BB, na primeira vez que foi às instalações da Ré.
42. Na verdade, este técnico disse em sede de julgamento, vezes sem conta, que apenas foi chamada pela Autora para resolver o problema do óleo, pese embora, tenha resultado provado que a Ré denunciou outros defeitos como correias e molas partidas, contador e estufa sem funcionar (facto provado n.º 24), pelo que é absolutamente possível que o técnico tenha dito que não percebia deste tipo de máquinas.
43. Note-se que esse facto, não foi só referido pelos legais representantes da Ré, mas também pela testemunha BB ao minuto 26:26 do seu depoimento, supra transcrito.
44. Bem como o disse à frente do sócio-gerente da Ré, GG, que também estava presente, conforme consta ao minuto 20:18 das suas declarações, supra transcritas.
45. Assim como técnico AA, testemunha da Autora disse em relação a esse facto ao minuto 19:39 do seu depoimento, supra transcrito.
46. Verificamos que o técnico não negou que tenha transmitido aos legais representante a sua limitação relativamente a este tipo de máquina.
47. Deste modo, face à prova produzida, indicadora de que o técnico não possuía competências, deverá a alínea G) dos factos não provados passar a provada, ou seja, que “Que o mecânico enviado às instalações da Ré tenha comunicado aos legais representantes da Ré que nada percebia deste tipo de máquinas e que não conseguia resolver o problema”.
48.3 – A resposta dada ao nº 17, 18, 19, 20 e 23 dos Factos Provados – “Entregue a máquina nas instalações da Ré, a Autora pediu à Ré que esta lhe pagasse o valor devido a título de pagamento do preço pela venda da máquina e o devido pelo transporte daquele equipamento para as instalações da Ré; “Perante aquela solicitação de pagamento, os responsáveis da Ré responderam que teriam de falar primeiro com o contabilista” e “A Autora voltou a insistir junto da Ré pelo pagamento dos valores”, “Perante esta nova insistência por parte da Autora, a Ré, no dia 20 de Julho de 2022, na pessoa da sua sócia gerente, EE, remeteu à Autora, a seguinte comunicação via e-mail, dirigida a HH, colaboradora da Autora responsável pela facturação: «Bom dia HH, Amanhã vamos testar também a estufa com etiquetas impressas e logo que possível dizemos alguma coisa. Entretanto aproveito para enviar as fotografias em anexo sobre o problema da máquina perder mesmo muito óleo conforme falamos ao telefone. Em tão pouco tempo de andamento de máquina verificamos a formação de poças de óleo a toda a volta da máquina. Ate ao final da semana damos resposta” e “A Autora voltou a instar a Ré ao pagamento”, respectivamente, não tem qualquer fundamentação e está em contradição com a prova produzida e a experiência comum e até a lógica, porquanto perante uma solicitação de pagamento, cujo momento temporal não foi sequer definido, como deveria, não é coerente que os sócios-gerentes da Ré tivessem respondido que teriam de falar primeiro com o contabilista, o que, também pela lógica, somente se justificaria se o assunto fosse de facturação, mas não de pagamento! E parece que poderá ter sido isso que ocorreu.
49. Com efeito, o Tribunal assentou a sua fundamentação de facto, no depoimento do legal representante da Autora, II, nas declarações da filha deste, a testemunha HH e na comunicação via mail, junta pela Ré como documento 2.
50. No entanto, nem o representante legal nem a testemunha da Autora falam em pedido de pagamento depois da entrega da máquina, mas sim em facturar, o que é bem diferente! E no documento junto pela Ré, como Doc. 2, encontram-se dois emails e portanto duas comunicações, uma da testemunha HH para a legal representante da Ré EE e outra desta para a HH (a mesma referida no facto provado nº 20), ambas enviadas no dia 20-07-2023, mas em nenhuma dela se escreve a palavra pagamento (!), a HH apenas indaga a legal representante da Ré se pode emitir a factura e aquela responde-lhe que amanhã iria testar também a estufa com etiquetas impressas e logo que possível dizia alguma coisa (até ao final da semana) sendo que também no mesmo mail denunciou formalmente a fuga de óleo, pois já o havia feito anteriormente por telefone.
51. No depoimento do legal representante da Autora, II, em sede de depoimento de parte, (vid. Sentença página 10,11e 12), resultam desde logo várias incongruências. Desde logo começa por referir que tinha interesse em vender a máquina porque já não necessitava dela, mas depois disse que quando lá foram a filha do Sr. BB, a sócio-gerente da Ré EE a mesma encontrava-se ligada e a trabalhar. Ora se não necessitava da máquina é porque esta estava parada e não a trabalhar! Quando muito ligaram-na.
52. Vejamos o que, a este respeito, diz a testemunha HH filha do legal representante da Autora, aos minutos 01:53 e 02:17 do seu depoimento. Disse que a máquina esteve parada vários anos, e embora tenha referido, como consta na pág. 13 da sentença, que, “no que concerne às negociações que antecederam a aquisição da máquina, a máquina estava ligada e em pleno funcionamento aquando da primeira deslocação da sócia gerente, EE, conjuntamente com o pai (Sr. BB) às instalações da Autora, tendo realizado meio-corte de etiquetas e que da segunda vez estava desligada”, pensamos que, salvo melhor opinião, atendendo a que a testemunha, como a própria confessa não estava presente e que também disse que a máquina esteve parada por vários anos, faz mais sentido com as regras de experiência, que tenham ligado a máquina apenas para o comprador ver que funcionava. Já não fazendo sentido que tivessem realizado o corte de etiquetas, pois estas, como ela disse, há muito que tinham deixado de as fazer quando o cliente de Guimarães fechou portas.
53. Ainda a este propósito, não se compreende como esta testemunha, HH, poderia dizer que, na primeira visita, a sócia-gerente EE viu a máquina em funcionamento quando, na verdade, aquela testemunha referiu que não estava presente nessa primeira visita e que, na segunda, nem sequer a máquina estava ligada, a que acresce o facto de que o seu pai, o legal representante da Autora, não ter dito que a máquina produziu meio corte de etiquetas na primeira visita. Veja-se o que se disse a testemunha HH aos minutos 02:44, 03:40, 04:03, 04:38 e 34:58 do seu depoimento, supra transcrito.
54. Por outro lado, e ainda relativamente às incongruências do depoimento do legal representante da Autora, se impõe a seguinte conclusão: se tinham combinado que o preço da máquina seria o de 4.250 € mais IVA, não faz sentido aguardar pela indicação da Ré para facturar, a menos que tivessem acordado que a máquina tivesse ido para as instalações da Ré com o objectivo desta a testar.
55. Por fim, disse o legal representante da Autora que o técnico Sr. AA foi lá duas vezes e lhe disse que estava tudo bem com a máquina, mas que havia marcas de óleo à volta da máquina, sendo que este técnico, confirmou a existência de óleo à volta da máquina e disse que a primeira vez foi lá para identificar o problema e a segunda para resolver o problema do óleo (vid. Página 13 da sentença). Ora, se o técnico foi lá duas vezes (a primeira para identificar e a segunda para resolver) e se viu óleo à volta da máquina é porque não estava tudo bem com a máquina!
56. No que diz respeito à testemunha HH, tal como está descrito na fundamentação de facto da sentença, na página 14, “por esta foi referido que esteve presente aquando da colocação da máquina nas instalações da Ré e que o Sr. BB pediu para aguardar para facturar porque queria falar com o contabilista, confirmando a data em que descarregaram a máquina (08 de Julho de 2022) (…) . Quanto ao transporte da máquina, referiu esta testemunha que era a Ré que viria buscar a máquina, e que falou com o Sr. BB porque precisava do espaço liberto, e que o Sr. BB disse que ia falar com um senhor para ir buscar a máquina e que, foram adiando, adiando, até que chegaram a uma fase limite, em que a Autora se disponibilizou a arranjar o transporte, tendo o Sr. BB pedido para ter cuidado com o valor”.
57. Ora, deste depoimento e pelo teor do Doc. 2 junto pela Ré na contestação, podemos apenas concluir que a máquina foi entregue, pela Autora, nas instalações da Ré, em 8-07-2022, que no dia 20 de Julho a testemunha pediu, e pela primeira vez, se já podia emitir a factura (não referiu sequer o pagamento) e que a legal representante da Ré disse que ia testar as estufa com etiquetas impressas e logo que possível dizia alguma coisa (fim da semana), não se referindo sequer ao contabilista. Pelo que não se vislumbra em que prova se baseou a Mª Juíza para dar como provado que a Autora depois da entrega da máquina pediu à Ré para lhe ser efectuado o pagamento e que esta tenha respondido que teriam de falar primeiro com o contabilista! (facto provado n.º 20).
58. Acresce que, denunciando a Ré os defeitos 12 dias após a entrega da máquina, mais especificamente no dia 20.07.2022 (facto provado n.º 20), o que a Autora reconheceu no dia 13.09.2022, momento em que decidiu enviar o técnico (facto provado n.º 25), não tem qualquer lógica que se fale em pagamento! Tanto mais que a factura apenas veio a ser emitida no mês de Outubro (facto provado n.º 29), razão pela qual, até aí, se a venda não tinha sido facturada, não existia qualquer obrigação de pagamento.
59. Pelo que, e pelas razões expostas, deverão V. Exas alterar a resposta dada ao ponto 17,18, 19 e 23 dos Factos Provados, considerando os factos não provados. E modificar o facto 20 para a seguinte redação:
60.“No dia 20 de Julho a Autora, na pessoa da sua funcionária HH, perguntou via e mail se podia emitir a factura, tendo a sócia gerente EE respondido: «Bom dia HH, Amanhã vamos testar também a estufa com etiquetas impressas e logo que possível dizemos alguma coisa. Entretanto aproveito para enviar as fotografias em anexo sobre o problema da máquina perder mesmo muito óleo conforme falamos ao telefone. Em tão pouco tempo de andamento de máquina verificamos a formação de poças de óleo a toda a volta da máquina. Ate ao final da semana damos resposta”.
61. Finalmente, face à prova produzida, resposta dada ao nº 15 dos Factos Provados e à alínea C) dos Factos Não Provados –“ “A Ré recebeu a máquina sem qualquer reserva” e “Que, aquando da reunião ocorrida em Maio de 2022 a Ré tenha manifestado o interesse em adquirir a máquina de etiquetas e estufa, mas sujeita à condição de a experimentar em contexto de trabalho, ou seja, em funcionamento, ficando acordado que tomaria a decisão de compra apenas após a experienciar”, está incorreta e não tem qualquer fundamentação.
62. Relativamente ao facto provado nº 15, o Tribunal fundamentou que “Efectivamente a Ré, em sede de contestação, defendeu a tese de que a máquina havia sido negociada à condição de ser experimentada em contexto de trabalho pela Ré, tese esse que não logrou convencer o Tribunal pelos motivos supra expostos” (pág. 17 da sentença).
63. E, relativamente à alínea C) dos factos não provados, refere que “incumbia à Ré o respectivo ónus da prova, não tendo a mesma logrado convencer o Tribunal de tal facto, atenta a parca […] produzida nesse sentido, pois somente os sócios-gerentes da Ré afirmaram tal facto, assim como o pai dos mesmos, o Sr. BB. De notar que não existe qualquer troca de e-mails a combinar os termos em que seria tal experimentação da máquina em contexto de trabalho efectuada, o prazo que tinham acordado para dar uma resposta se ficariam ou não com a máquina, ao que acresce o facto de se tratar de uma máquina dispendiosa, pesada (mais de 2 toneladas), carecendo de sentido que a mesma fosse adquirida à condição de a experimentar em contexto de trabalho nas instalações da Ré, quando, se fosse esse o caso, bem o poderia ter sido nas instalações da Autora, ainda para mais se tivermos em conta que, na versão apresentada pela Ré, o transporte incumbiria à Autora, pelo que, a mesma poderia pagar o transporte, ver a máquina devolvida e perder o dinheiro que gastou com a transportadora, tanto para deslocar a máquina para as instalações da Ré como de novo as instalações da Autora, o que contraria totalmente as regras da experiência comum” (pág. 18 da sentença).
64. Quanto ao facto 15 dos factos provados “a Ré recebeu a máquina, sem qualquer reserva”, para além de ser um facto alegado pela Autora, entendemos ser um facto conclusivo, o qual deveria ser explicitado com outros factos sendo que, da expressão “sem qualquer reserva” não se extrai obrigatoriamente a conclusão de que se está a referir à venda sob condição, pelo que, salvo melhor opinião, consideramos que esse facto deverá ser retirado dos factos provados.
65. Quanto à alínea C) dos factos não provados, entendemos que a fundamentação do Tribunal a quo, não corresponde à prova testemunhal e documental produzida nos presentes autos, nem mesmo vai ao encontro com as regras da experiência comum.
66. Consideramos que a prova foi suficiente, para ser julgado como provado que a venda foi efectuada na condição de, depois de ser experimentada no contexto de trabalho da Ré, estar em funcionamento.
67. Condição, que a nosso ver e ao contrário do que considera o Tribunal a quo, não contraria, de todo, as regras da experiência e até faz bastante sentido. Com efeito, atendendo a que se tratava de uma máquina usada, dispendiosa, que esteve parada por vários anos, como referiu a testemunha da Autora, HH (gravação ao minuto 02:12 “ E nós tivemos a máquina parada durante alguns anos ainda”) e que não resultou provado que os sócios-gerentes da Ré a tenham visto a funcionar e a produzir em trabalho, o mais sensato seria precisamente experimentar a máquina no contexto de trabalho, antes de a comprar.
68. A Mª juíza só visionou o ponto de vista da Autora! Não considerou que a Ré neste negócio corria um risco maior: comprar uma máquina dispendiosa e inutilizada!
69. Alega também o Tribunal a quo que, “não existe qualquer troca de e-mails a combinar os termos em que seria tal experimentação da máquina em contexto de trabalho efectuada, o prazo que tinham acordado para dar uma resposta se ficariam ou não com a máquina”.
70. Ora tal afirmação, não corresponde à prova documental junta aos autos.
Senão vejamos:
71. Uma vez entregue a máquina nas instalações da Ré no dia 08.07.2022 (facto provado n.º 14), veio, em 20-07-2022, a HH, testemunha e filha do legal representante da Autora, indagar a Ré se podia emitir a factura da máquina. (vid. Documento 2 junto com a contestação da Ré).
72. A Ré, na pessoa da sua legal representante EE, responde o seguinte: “bom dia HH Amanhã vamos testar também a estufa com etiquetas impressas e logo que possível dizemos alguma coisa. Entretanto aproveito para enviar as fotografias em anexo sobre o problema de a máquina perder mesmo muito óleo conforme falamos ao telefone. Em tão pouco tempo de andamento de máquina verificamos a formação de poças de óleo a toda a volta da máquina, até ao final da semana damos resposta.” (facto provado 20) (…).
73. Neste email, para além de denúncia da fuga de óleo, a Ré refere que vai realizar um teste de funcionamento da máquina, e que até ao final da semana dizia alguma coisa.
74. Portanto, estes mails traduzem inevitavelmente a conclusão de que a emissão da factura estaria condicionada pela aprovação da Ré, relativamente ao bom funcionamento da máquina e foi estabelecido um prazo até ao final da semana.
75. E de facto, a Autora só emitiu a factura em Outubro e não aquando a entrega da máquina ocorrida em Julho (facto provado nº 29), como impunha a alínea a) do n.º 1 do artigo 36.º do CIVA, o que daqui se retira outra conclusão: é que a venda da máquina apenas seria concretizada se esta não tivesse qualquer problema e/ou defeito, o que equivale a dizer que a máquina foi, efectivamente, vendida à condição.
76.Por fim, consideramos que nos autos foi produzida prova documental, mas também testemunhal, de que a máquina seria comprada na condição de no contexto do trabalho da Ré funcionar.
77. A fundamentação do Tribunal a quo para não dar como provado esse facto, a nosso ver, não colhe.
78. Com efeito, o facto de somente os sócios-gerentes da Ré, bem como o pai dos mesmos, a testemunha BB, afirmarem tal facto, não é fundamento para considerar como não provado um facto, veja-se os 8, 9, 16 e 18 dos factos provados, foram dados como provados somente com o depoimento de parte do legal representante da Autora e pela filha deste, a testemunha HH, e o facto 23 ficou provado apenas com o depoimento desta testemunha, a qual, a nosso ver, não mostrou credibilidade.
79. Por outro lado, o Tribunal retirou a credibilidade aos sócios-gerentes da Ré bem como o pai dos mesmos, a testemunha BB, apenas porque considerou que a versão da Autora estava mais conforme as regras da experiência comum, o que, pelas razões já expostas não podemos concordar.
80. Os depoimentos dos legais representantes da Ré, EE e GG, e as declarações da Testemunha BB foram coerentes, credíveis e a versão corresponde às regras da experiência.
81. Senão vejamos parte das declarações da legal representante da Ré EE aos minutos 02:22, 02:42, 04:33, 04:58, 05:37, 06:01, 20:17, 21:28 e 23:45, as declarações do representante legal da Ré, GG, ao minuto 03:58 das suas declarações, e o depoimento da testemunha da Ré BB aos minutos 08:24 e 12:32 do seu depoimento, ambos são unanimes em afirmar que a máquina foi vendida à condição.
82. Sendo que a testemunha da Autora HH, também acaba por admitir minuto 35:40 do seu depoimento, que a Ré queria experimentar a máquina.
83. Pelo que, pelas razões expostas, consideramos que V. Exas deverão alterar a alínea C) dos factos não provados, para provado.
Diga-se ainda,
84. Mostrando-se provado que a factura de 110,70 €, referida no facto provado 22, referente à primeira deslocação do técnico (nas palavras deste: para identificar o problema) às instalações da Ré a mando da Autora, foi emitida dez dias depois do email enviado pela Autora no dia 13.09.2022 (facto provado n.º 25) e que a segunda deslocação do técnico (nas palavras deste para resolver o problema) não se deveu a uma nova solicitação da Autora, mas antes ao cumprimento do seu trabalho que se desenvolvia em duas fases distintas de identificação e posterior resolução, podemos concluir que também o pagamento da primeira deslocação foi expressamente assumido pela Autora no referido email, por lhe ser cronologicamente antecedente.
85. Assim como concluiu o Tribunal a quo que o pagamento da segunda deslocação do técnico não poderá ser imputado à Ré, atento o princípio da boa fé consagrado no n.º 2 do artigo 762.º do Código Civil, então, pela mesma razão de ser, também o primeiro deverá ficar a cargo da Autora.
86. Aqui chegados, consideramos que nestes autos ficou manifestamente demonstrado que, por um lado, a Ré somente tinha interesse na compra da máquina se esta estivesse em condições, o que equivale a dizer que o negócio foi celebrado à condição (o que, em bom rigor, acontece em todas as vendas e negócios) e, por outro lado, que a máquina não foi vendida em boas condições, o que equivale a dizer que padece de defeitos.
87. A Ré perdeu, assim, com legitimidade o interesse na máquina e emitiu uma nota de devolução nos termos devidamente provados (35 dos facto provados), tendo em sede de contestação, com apresentação de reconvenção, requerido a resolução do negócio.
88. Alterando-se - como deve alterar-se - a decisão sobre a matéria de facto, caem por terra os fundamentos que sustentaram toda a decisão de mérito constante da sentença recorrida: quer quanto à celebração de um negócio sujeito a condição, quer quanto aos defeitos na máquina, os quais foram tempestivamente denunciados pela Ré e cuja existência dos defeitos consideramos lograr provar.
89. O conteúdo do negócio jurídico, a que corresponde a determinação de efeitos jurídicos, assenta, no nosso ordenamento jurídico, no princípio da liberdade contratual e no âmbito da autonomia privada.
90. Nessa medida, as partes podem acordar a celebração de negócios jurídicos sob condição.
91. No caso vertente, decorre da prova produzida nestes autos que a máquina foi vendida na condição de apresentar boas condições, nomeadamente pela circunstância de a Autora não ter de imediato emitido a respectiva factura (o que somente veio a fazer em Outubro, ou seja, vários meses após a entrega da máquina, o que ocorreu em Julho), de a Ré ter referido que iriam testar também a estufa com etiquetas impressas (facto provado nº 20) e de estarmos perante uma máquina usada e até há vários anos parada.
92. Desta forma, podemos concluir que o negócio em apreço nestes autos foi realizado sob condição resolutiva, nos termos do artigo 270.º do Código Civil, razão pela qual a ocorrência do evento - traduzida nos vícios e defeitos que vieram a detectar-se meros dias depois e reportados no dia 20.07.2022 (facto provado nº 20) -, fizeram cessar os efeitos do negócio.
93. Em bom rigor, é isto que sucede com todos - ou a grande maioria - os negócios de compra e venda, onde naturalmente os compradores apenas têm interesse na compra, na condição de a coisa não ter defeitos, ou seja, a entrega da coisa sem defeitos já é algo que decorre do próprio negócio por ser intrínseco ao mesmo.
94. O Tribunal a quo considerou que nos presentes autos “é de concluir pela aplicação do regime geral da responsabilidade por vícios ou defeitos da coisa constante do Código Civil”.
95. Há, no entanto, como ensina o Prof. Antunes Varela, que distinguir a simples venda de coisa defeituosa de outra figura mais ampla e, por isso, mais abrangente, que é a do cumprimento defeituoso da obrigação, dizendo este autor que “Há venda de coisa defeituosa sempre que no contrato de compra e venda, tendo por objecto a transmissão da propriedade de uma coisa, a coisa vendida sofrer dos vícios ou carecer das qualidades abrangidas no art. 913,° do Código Civil, quer a coisa entregue corresponda, quer não, à prestação a que o vendedor se encontra vinculado. O cumprimento defeituoso da obrigação verifica-se não apenas em relação à obrigação da entrega da coisa proveniente da compra e venda, mas quanto a toda e qualquer outra obrigação, proveniente de contrato ou qualquer outra fonte. E apenas se dá quando a prestação realizada pelo devedor não corresponde, pela falta de qualidades ou requisitos dela, ao objecto da obrigação a que ele estava adstrito” (…).
96. A propósito da extinção do contrato, veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 06.12.2022 (Proc. n.º 37204/20.1YIPRT.L1-7), onde se referiu que tendo o comprador “pedido a resolução do contrato de compra e venda, por motivo de venda de coisa defeituosa, mas considerando-se que a solução que decorre da lei, correspondente ao seu interesse, é a anulação do contrato, nos termos do Art.º 905 “ex vi” Art.º 913.º n.º 1 do C.C., pode operar-se a convolação oficiosa do pedido de resolução do contrato pelo de anulação do mesmo, porque ambas as soluções são na sua materialidade equivalentes, desde logo porque os efeitos da anulação do negócio jurídico previstos no Art.º 289.º do C.C. são essencialmente os da resolução dos contratos”
97. Se as qualidades da coisa objecto do contrato foram negociadas entre as partes e se, realizada a prestação, se averiguar que ela não possui as qualidades acordadas, daí decorre que o vendedor não efectuou a prestação a que se encontrava adstrito, ou seja, há uma desconformidade entre a prestação devida e a que foi realizada. Estamos, assim, perante uma situação de cumprimento imperfeito, cumprimento defeituoso ou violação contratual positiva.
98. E, nas palavras de Pedro Martinez, “mesmo que não tenha sido estabelecida uma garantia de qualidade do bem, não cabe ao comprador a prova da precedência do defeito, impendendo sobre a contraparte o dever de demonstrar que este é posterior ao cumprimento” (…).
99. E é assim porque, tendo a lei estabelecido prazos curtos para o exercício do direito de reparação (e para os demais derivados do cumprimento defeituoso) em matéria de compra e venda pressupõe-se que qualquer defeito nesse período é, ele próprio, anterior ou advém de causa preexistente.
100. Acresce que, no caso vertente, por força do negócio de compra e venda realizado entre as partes, a Autora estava obrigada a prestar a coisa nas devidas condições, direito esse que, no caso, é indiscutível porque, para além da prova da denúncia dos defeitos (facto provado n.º 20), provou-se que a Autora se dispôs a levar a cabo a reparação da máquina (facto provado n.º 25), pese embora tenha contratado e pago a um técnico sem formação na máquina em apreço e apenas o tenha contratado com o único intuito de resolver as fugas de óleo e nada mais.
101. Neste sentido, decidiu o Tribunal da Relação do Porto em 14.06.2016 (Proc. n.º 715/14.6T8PDL.P1), onde se decidiu que "Se, na sequência de reiteradas denúncias do comprador, o vendedor – através de técnico seu, que fez deslocar diversas vezes junto da contraparte – reconheceu os reclamados problemas de funcionamento da coisa (máquina) vendida e procedeu a sucessivas diligências de reparação, sem que lograsse repará-la definitivamente, ocorre conduta reparadora que constitui reconhecimento desses vícios de funcionamento e consequente direito reparatório, afastando a caducidade do direito à reparação da coisa de molde a colocá-la em adequado estado de funcionamento”.
102. E essa obrigação de cumprimento traduzida na entrega da máquina sem defeitos resulta, também, do facto de a Autora, no caso aqui em apreço, ter conhecimento de que a Ré necessitava daquela para o exercício normal da actividade daquela empresa.
Diga-se ainda que,
103. Nos presentes autos, e pelas razões expostas na matéria de facto, na nossa opinião ficou declaradamente provado que a máquina vertia óleo e que havia outros defeitos denunciados pela Ré (correntes e rolos partidos, etc), sendo que, nesta matéria, fundamentou a Mma. Juíza que existia falta de prova dos defeitos, o que, salvo melhor entendimento, se esclareceria com o recurso a uma perícia, nos termos do artigo 411.º do CPC.
104. Mas mais: salvo o devido respeito, face à prova produzida, o Tribunal a quo não dispunha de fundamentos bastantes para condenar a Ré nos termos em que o veio a fazer, pois não deu como provados factos que sustentassem a não existência de defeitos, pelo que estamos perante uma insuficiência da matéria de facto.
105. Por outro lado, resulta dos autos que, em sede de contestação, a Ré requereu que fosse declarada “a resolução do contrato prometido, da máquina de etiquetas e estufa, por esta se encontrar parada, por não se verificada a condição a que foi sujeito, por não cumprimento por parte da Reconvinda”, tendo também apresentado pedido reconvencional, através do qual requereu que a Reconvinda fosse “condenada a pagar à Reconvinte a título de ocupação das suas instalações o montante de € 1.500,00 até à presente data” e “no pagamento à Reconvinte de um montante diário de € 30,00, desde a data da notificação à Reconvinda do pedido reconvencional até ao levantamento da máquina de etiquetas e estufa, das instalações da Reconvinte”.
106. Neste ponto, o Tribunal a quo cingiu-se a referir que, atentas as alíneas C) e F) dos factos não provados, e “não se tendo provado o fundamento invocado para a resolução contratual, não assiste, consequentemente, à Ré o direito a tal resolução, pelo que é forçoso conclui-se pela improcedência de todos os pedidos formulados em sede reconvencional”.
107. Contudo, alterando-se a matéria de facto dada como provada como neste recurso se fundamenta, vindo a dar-se como provadas as alíneas C) e F) dos factos não provados da sentença, impõe-se também que sejam apreciados os pedidos reconvencionais apresentados pela Ré.
108. Porém, em lugar algum dos factos provados e não provados consta qualquer facto atinente aos pedidos reconvencionais, pese embora os mesmos tenham sido discutidos em sede de julgamento aquando da inquirição de testemunhas.
109. Por conseguinte, estamos perante uma manifesta omissão de pronúncia, a qual acarreta a nulidade da sentença, nos termos e para os efeitos da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, dado o Tribunal a quo não se ter pronunciado sobre questões que deveria ter apreciado.
110. Por tudo quanto ficou exposto, é manifesto que deverá a decisão proferida pelo Tribunal a quo ser totalmente revogada e substituída por outra que julgue a acção totalmente improcedente, por não provada, bem como que seja a Autora/Reconvinda condenada no pagamento dos valores constantes no pedido reconvencional oportunamente apresentado.
A autora apresentou contra-alegações, nas quais se pronunciou pela confirmação do decidido.
Formulou as seguintes conclusões:
1) A sentença recorrida não merece qualquer censura, devendo a decisão recorrida ser mantida.
2) E, nessa sequência, mantida, na integra, a decisão proferida quanto à matéria de facto.
3) Por isso, não têm razão os Ré [sic], nem fundamento, para o recurso apresentado.
4) Os factos considerados provados, não poderiam, nem deveriam levar a uma solução diversa daquela que foi encontrada pela Meritíssima Juiz do tribunal a quo.
5) O material probatório, documental e testemunhal, que foi carreado para os autos, secundariza e sustenta, amplamente, a decisão proferida e aqui sob escrutínio.
6) A Recorrente fundamenta o seu recurso em pressupostos que não se verificam e que ela sabe não se verificarem.
7) Em factos cuja prova não se fez.
8) Em culpa que não ficou provado a Autora ter.
9) Padecendo o pedido formulado pela Ré de total ausência de nexo de causalidade atinente à conduta da Autora.
O recurso foi admitido como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.
Cumpre então apreciar e decidir.
O âmbito do recurso, sempre ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, encontra-se delimitado pelas conclusões que nele foram apresentadas e que atrás se transcreveram – cfr. arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do Cód. do Proc. Civil.
I – Apurar se a Mmª Juíza “a quo” deveria ter determinado oficiosamente a realização de perícia à máquina;
II – Apurar se deve ser alterada a decisão proferida sobre a matéria de facto;
III – Apurar se entre a autora e ré, relativamente à máquina de etiquetas e estufa, foi celebrado contrato de compra e venda sob condição;
IV – Apurar se a referida máquina tinha defeitos;
V – Apurar se o pagamento da fatura de 110,70€, referente à primeira deslocação do técnico às instalações da ré, deverá ficar a cargo da autora;
VI – Apurar se na sentença recorrida ocorre omissão de pronúncia.
1- A Autora B..., Lda. é uma empresa que se dedica a actividades de preparação da impressão e de produtos média.
2- Para levar a cabo o exercício da sua actividade possui a Autora diversas máquinas.
3- Uma dessas máquinas era uma máquina de etiquetas mais estufa.
4- Máquina essa que a Autora decidiu vender.
5- Posta a máquina à venda, a Ré manifestou à Autora interesse na aquisição desse equipamento.
6- Tendo as partes, vendedora e compradora, reunido, em data não concretamente apurada do mês de Maio de 2022.
7- Nesta reunião estiveram presentes por parte da Ré, BB, ex-sócio, um dos fundadores da Ré, e os seus filhos, EE e GG, actuais sócios-gerentes da Ré.
8- No fim dessa reunião ficou fechado o negócio de venda da máquina de etiquetas e estufa pela Autora à Ré.
9- Mais acordaram as partes que o preço seriam €4.250,00, acrescidos de IVA, perfazendo o valor total de € 5.227,50.
10- Foi ainda acordado pelas partes que a Ré viria levantar a máquina às instalações da Autora na semana seguinte.
11- Sucede que, tal não aconteceu, tendo a Ré consecutivamente adiado o transporte da máquina para as suas instalações.
12- A Autora questionou a Ré se pretendia que esta providenciasse a entrega da máquina nas suas instalações.
13- A Ré respondeu afirmativamente, aceitando que a Autora providenciasse pela entrega supra referida.
14- A máquina foi efectivamente entregue nas instalações da Ré no dia 08 de Julho de 2022.
15- A Ré recebeu a máquina, sem qualquer reserva.
16- Com esse transporte e entrega, pagou a Autora a quantia de €123,00 à empresa C..., Lda., conforme factura 1394/2022, de 13/07/2022, vencida em 11/09/2022.
17- Entregue a máquina nas instalações da Ré, a Autora pediu à Ré que esta lhe pagasse o valor devido a título de pagamento do preço pela venda da máquina e o devido pelo transporte daquele equipamento para as instalações da Ré.
18- Perante aquela solicitação de pagamento, os responsáveis da Ré responderam que teriam de falar primeiro com o contabilista.
19- A Autora voltou a insistir junto da Ré pelo pagamento dos valores.
20- Perante esta nova insistência por parte da Autora, a Ré, no dia 20 de Julho de 2022, na pessoa da sua sócia gerente, EE, remeteu à Autora, a seguinte comunicação via e-mail, dirigida a HH, colaboradora da Autora responsável pela facturação:
«Bom dia HH, Amanhã vamos testar também a estufa com etiquetas impressas e logo que possível dizemos alguma coisa.
Entretanto aproveito para enviar as fotografias em anexo sobre o problema da máquina perder mesmo muito óleo conforme falamos ao telefone. Em tão pouco tempo de andamento de máquina verificamos a formação de poças de óleo a toda a volta da máquina.
Ate ao final da semana damos resposta. Obrigada.
Com os melhores cumprimentos,
EE».
21- Na sequência da aludida comunicação, a Autora enviou às instalações da Ré um mecânico.
22- A Autora despendeu a quantia de €110,70 com a deslocação e o serviço do mecânico nas instalações da Ré conforme factura FAC A22/659, de 23/09/2022, vencida em 23/10/2022.
23- A Autora voltou a instar a Ré ao pagamento.
24- A Ré alegou que a máquina estava cheia de defeitos, nomeadamente, que perdia óleo, a correia e as molas dos rolos estavam a partir, o contador e a estufa não funcionavam.
25- Em 13 de Setembro de 2022, a Autora, na pessoa de HH, colaboradora da Autora responsável pela facturação, remeteu à sócio-gerente da Ré, EE, uma comunicação via e-mail com o seguinte teor:
«Boa tarde EE,
Desde o início que nos disponibilizamos a resolver todas as vossas questões quer de facturação quer de transporte e ultimamente a questão da perda de óleo da máquina.
Fomos flexíveis a todos os níveis, mas como devem compreender, esta situação já se arrasta à meses e inclusive, já pagamos o transporte da máquina sem a ter faturado. (documento em anexo).
A vossa proposta não é de todo aceitável. Acabamos de comprar uma máquina nova e de valor bem maior e não temos garantia de 2 anos.
Posta a situação, iremos faturar a máquina na totalidade e enviar o técnico às vossas instalações, despesa essa que será suportada por nós.
Obrigada».
26- A Autora solicitou de novo ao mecânico que se deslocasse às instalações da Ré.
27- Aquele profissional desmontou a máquina, procedeu à realização de testes exaustivos, vedou as partes onde poderia eventualmente haver uma fuga de óleo, fuga de óleo essa que não detectou.
28- O mecânico passou 6 horas na realização daquelas tarefas, não tendo detectado qualquer defeito ou avaria.
29- Em 12 de Outubro de 2022, a Autora emitiu a fatura FT 1/1997, no valor de €4,250,00 acrescidos de IVA, perfazendo o montante global de € 5.227,50, referentes ao preço da máquina de etiquetas e estufa, com vencimento nessa data.
30- A Autora despendeu a quantia de €467,40 para pagar a deslocação e o serviço do mecânico nas instalações da Ré conforme factura FAC A22/864, vencida em 11 de Janeiro de 2023.
31- No dia 26 de Dezembro de 2022 a Autora, na pessoa de HH, remeteu à sócio-gerente da Ré, EE, uma comunicação via e-mail com o seguinte teor:
«Boa tarde,
Agradecemos o pagamento da máquina em dívida, para podermos fechar o ano.
Obrigada».
32- A sócio-gerente da Ré, EE, remeteu à Autora, na pessoa de HH, resposta mediante comunicação via e-mail com o seguinte teor:
«Boa tarde HH,
Conforme já comunicado a máquina apresenta inúmeros problemas que desconhecíamos. Visto que os mesmos se encontram ainda sem resolução e como não pretendemos armazenar máquinas nas nossas instalações, visto o reduzido espaço de que dispomos vamos proceder à emissão de guia de devolução da mesma.
Com os melhores cumprimentos».
33- Nessa sequência, a colaboradora da Autora, HH, remeteu à sócio-gerente da Ré, EE, nova comunicação via e-mail com os seguintes termos:
«Boa tarde,
A máquina esteve à vossa disposição de todas as vezes que estiveram nas nossas instalações, para testes e análises. A máquina foi vos entregue no dia 08 de Julho (que perfaz 5 meses nas vossas instalações).
Já efectuamos pagamentos, como transporte que era à vossa conta e manutenção do técnico nas vossas instalações. De acordo com o técnico o problema foi resolvido e por portanto, após tantos meses, iremos proceder à cobrança da fatura em dívida.
Não cobrando o valor de todo o material, rolos e autocolantes que levaram sem qualquer custo.
Obrigada».
34- A sócio-gerente da Ré, EE, respondeu o seguinte:
«Boa Tarde,
A máquina esteve sempre parada desde que cá chegou. Empurraram-nos uma máquina cheia de problemas e ocultaram-nos os problemas que ela tinha.
O que nos disseram na altura é que precisavam do espaço dessa máquina para colocar uma máquina nova que tinham adquirido e que iria chegar em breve e por isso empurram-nos a máquina e fizeram questão de vir cá depositá-la.
Agradecemos que nos indiquem o dia para a podermos devolver nas vossas instalações no prazo de 15 dias, caso contrário entregaremos o assunto ao nosso advogado.
Com os melhores cumprimentos».
35- Em 26 de Dezembro de 2022, a Ré emitiu nota de devolução da fatura n.º 1/1997 de 12 de Outubro de 2022.
A) Que, aquando da primeira visita às instalações da Ré, o mecânico tenha verificado a máquina e o seu funcionamento, constatando nessa primeira visita que a mesma não perdia óleo, nem apresentava nenhuma avaria ou defeito.
B) Que a Ré, ao pôr em causa a bondade do negócio efectuado com a Autora, tenha posto em causa a boa imagem, reputação e credibilidade da Autora.
C) Que, aquando da reunião ocorrida em Maio de 2022 a Ré tenha manifestado o interesse em adquirir a máquina de etiquetas e estufa, mas sujeita à condição de a experimentar em contexto de trabalho, ou seja, em funcionamento, ficando acordado que tomaria a decisão de compra apenas após a experienciar.
D) Que, aquando da reunião ocorrida em Maio de 2022, a Ré tenha apenas assumido a possibilidade de efectuar o levantamento da máquina nas instalações da Autora, mas sem ficar sequer acordado qualquer prazo, devido à dificuldade da Ré em arranjar transporte adequado e equipamento para a descarga da máquina.
E) Que o custo do transporte da máquina de etiquetas e estufa para as instalações da Ré já estivesse incluído no preço da máquina.
F) Que a máquina padeça de defeitos, nomeadamente, verta óleo pelas juntas, a correia esteja partida, o contador inoperacional e as molas de rolos partidas, não trabalhando.
G) Que o mecânico enviado às instalações da Ré tenha comunicado aos legais representantes da Ré que nada percebia deste tipo de máquinas e que não conseguia resolver o problema.
I – Apurar se a Mmª Juíza “a quo” deveria ter determinado oficiosamente a realização de perícia à máquina
Na primeira parte do seu recurso a ré/reconvinte sustenta que, tendo ficado a Mmª Juíza “a quo” com dúvidas relativamente à existência de defeitos, deveria ter providenciado pela realização oficiosa de uma perícia à máquina ao abrigo do art. 411º do Cód. de Proc. Civil.
Estatui-se neste preceito, onde aflora o princípio do contraditório, que «[i]ncumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer.»
Contudo, este princípio coexiste com outros, como sejam os do dispositivo, da preclusão, da autorresponsabilidade das partes, da igualdade das partes e da imparcialidade do juiz, de modo que não poderá ser invocado para, de forma automática, superar eventuais falhas de instrução que sejam de imputar a alguma das partes, designadamente quando esteja precludida a apresentação de meios de prova.[2]
O princípio dispositivo significa que as partes dispõem do processo, como da relação jurídica material. O processo é coisa ou negócio das partes. É uma luta, um duelo entre as partes, em que o juiz arbitra a pugna, controlando a observância das normas processuais e assinalando e proclamando o resultado. Donde a inércia e a passividade do juiz em contraste com a atividade das partes.[3]
Contraposto a este princípio surge o princípio inquisitório ou da oficialidade, em que o seu enunciado e a determinação das suas consequências se obtém por inversão da formulação do princípio dispositivo.
Acontece que o nosso sistema processual que é de matriz dispositiva tempera este modelo com diversas medidas de natureza inquisitória, onde se salienta o referido art. 411º do Cód. de Proc. Civil.
O princípio da autorresponsabilidade das partes significa que são as partes que conduzem o processo a seu próprio risco. Elas é que têm de deduzir e fazer valer os meios de ataque e de defesa que lhes correspondam, incluindo as provas, suportando uma decisão adversa, caso omitam algum. A negligência ou inépcia das partes redunda inevitavelmente em prejuízo delas, porque não pode ser suprida por iniciativa e atividade do juiz.[4]
O princípio da preclusão exprime a ideia de que há ciclos processuais rígidos, cada um com a sua finalidade própria e formando compartimentos estanques. Por isso, os atos, onde se englobam as alegações de factos ou os meios de prova, que não tenham lugar no ciclo próprio ficam precludidos.[5]
O princípio da igualdade das partes consiste em as partes serem colocadas no processo em perfeita paridade de condições, desfrutando de idênticas possibilidades de obter a justiça que lhes seja devida.[6]
Regressando ao caso dos autos, há que avaliar se na presente situação a parte dispôs de oportunidade de produzir o meio de prova em causa, requerendo a realização da perícia à máquina, e não o fez.
Tal como escreve LEMOS JORGE (in “Os poderes instrutórios do Juiz: alguns problemas”, Revista Julgar, n.º 3 - Set/Dez. 2007 -, pág. 77), “… a parte não poderá ter uma pretensão legítima de impugnação do despacho do juiz que nega a promoção de certa diligência se ela própria não cuidou minimamente de satisfazer o ónus probatório que sobre si incide. A “sugestão”, pela parte, da realização de certa diligência probatória nunca pode constituir um meio de evitar os fenómenos de preclusão processual. Só a demonstração clara de que tal diligência se impunha como necessária, independentemente da vontade da parte de que ela se realizasse, poderá constituir uma base suficientemente sólida para construir um recurso viável quanto a esta matéria. No fundo, há que demonstrar que, segundo qualquer critério razoável, o tribunal devia ter providenciado pela realização de certa diligência concreta, em face dos elementos disponíveis. Só assim a necessidade da prova se imporá desligada da mera vontade subjectiva da parte”.
Com efeito, “se a parte podia ter requerido a diligência probatória em questão e não o fez, a intervenção do juiz substituindo-se a ela, violaria o princípio da preclusão e o da autorresponsabilidade das partes conjugado com o princípio da igualdade das partes no processo, pois estaria a permitir a prática de um ato já precludido, a esvaziar a autorresponsabilidade de uma das partes e eventualmente a favorecer uma parte e, ao suceder isso, a desfavorecer a outra.”[7]
Ora, o que resulta dos autos é que a ré/reconvinte para, de acordo com o que alegou, demonstrar que a máquina tinha defeitos, teve oportunidade de requerer a realização de perícia à mesma, designadamente aquando da apresentação da sua contestação – art. 572º, nº 1, al. d) – ou em sede de audiência prévia – art. 598º, nº 1.
Poderia até no decurso da audiência de julgamento, ter colocado já aí, perante a Mmª Juíza “a quo”, a possibilidade de se proceder à realização de tal perícia por iniciativa oficiosa desta.
No entanto, nada disto foi feito.
Foi apenas depois de conhecida a sentença da 1ª Instância, que desatendeu a posição sustentada pela ré/reconvinte quanto à existência de defeitos, que esta, já em fase de recurso, vem pugnar agora pela possibilidade de realização de perícia à máquina, afirmando que a mesma deveria ter sido determinado oficiosamente pela Mmª Juíza “a quo”, ao abrigo do art. 411º do Cód. Proc. Civil.
Afigura-se-nos de meridiana clareza que esta pretensão da recorrente não pode ser acolhida.
É que se agora fossemos determinar que os autos regressassem à 1ª Instância, a fim de se efetuar uma perícia, cuja possibilidade de realização fora ignorada pela ré/reconvinte, estaríamos a violar, de forma grave, os princípios da preclusão, da autorresponsabilidade das partes e também o da igualdade das partes. Estar-se-ia a permitir a realização de um ato já precludido, a esvaziar o princípio da autorresponsabilidade das partes e até, eventualmente, a favorecer uma das partes no litígio em desfavor de outra.
Em bom rigor, estar-se-ia a admitir que, pese embora a inércia da ré/reconvinte ao não requerer a realização de perícia à máquina e ao não juntar qualquer relatório que pudesse atestar a existência dos defeitos que invocou, pudesse depois de concluída a produção de prova e conhecida a sentença, que não acolheu a sua posição, fazer que o processo regressasse à 1ª Instância a fim de se realizar a perícia, que sempre fora ignorada pela ré até ao momento em que interpôs recurso.
Haveria um claro favor concedido à ré, que descurara a realização da perícia, apesar da prova da existência de defeitos lhe caber, em detrimento da autora que, em função do funcionamento das regras do ónus probatório, lograra ganho de causa.
Como tal, improcede, nesta parte, o recurso interposto pela ré.
1. O recurso interposto pela ré/reconvinte incidiu depois, e no essencial, sobre a decisão proferida pela 1ª Instância sobre a matéria de facto, pretendendo que esta seja alterada quanto a diversos pontos factuais, provados e não provados.
Desde já se refere que na impugnação fáctica efetuada a ré/reconvinte observou os ónus previstos no art. 640º do Cód. de Proc. Civil, razão pela qual não há obstáculo à sua apreciação.
Vejamos então.
2. O primeiro ponto factual impugnado pela recorrente foi a alínea F) dos factos não provados - Que a máquina padeça de defeitos, nomeadamente, verta óleo pelas juntas, a correia esteja partida, o contador inoperacional e as molas de rolos partidas, não trabalhando – que entende dever transitar para o elenco dos factos provados.
Considera desde logo a recorrente que este facto não provado não tem qualquer fundamentação e está em contradição insanável com a alínea A) dos factos não provados - Que, aquando da primeira visita às instalações da Ré, o mecânico tenha verificado a máquina e o seu funcionamento, constatando nessa primeira visita que a mesma não perdia óleo, nem apresentava nenhuma avaria ou defeito -, uma vez que se dá como não provado que a máquina padece de defeitos, mas também como não provado que a máquina não apresenta qualquer avaria ou defeito.
Ora, é manifesto que a Mmª Juíza “a quo” explicou, com detalhe, os motivos porque deu como não provado o facto F), conforme decorre do que escreveu a propósito desta alínea em sede de motivação da decisão de facto e que se passa a transcrever:
“ (…) no que concerne ao facto não provado vertido na alínea (F) importa realçar que, tendo sido a Ré a invocar os defeitos da máquina como matéria de excepção em sede de contestação, à mesma incumbia o ónus da prova dos aludidos defeitos (cf. Artigo 342.º, n.º 2 do Código Civil).
Sucede que, considera o Tribunal que não foi feita pela Ré prova cabal da existência de tais defeitos.
Com efeito, o técnico AA que se deslocou às instalações da Autora por duas vezes para resolver o alegado problema da máquina, referiu que não conseguiu identificar o sítio concreto por onde a máquina estaria a perder óleo, e que vedou as partes onde o óleo poderia estar a verter numa atitude preventiva.
Assim, constata-se que apenas em sede de declarações de parte e do depoimento da testemunha BB foram tais defeitos relatados, sendo certo que o depoimento da testemunha DD não foi valorado pelo Tribunal, por não se afigurar credível.
Não foi ouvido qualquer técnico da parte da Ré, que atestasse a existência dos defeitos, sendo certo que igualmente não foi junto qualquer relatório por técnico habilitado para o efeito a atestar a existência tais defeitos, não nos podendo olvidar que as declarações de parte traduzem uma posição interessada e parcial no que concerne ao relato dos factos, posição essa que considera o Tribunal que não foi devidamente corroborada por outros meios de prova.
Face ao exposto, atenta a parca prova produzida nesse sentido, considerou-se como não provado “Que a máquina padeça de defeitos, nomeadamente, verta óleo pelas juntas, a correia esteja partida, o contador inoperacional e as molas de rolos partidas, não trabalhando” (cf. facto não provado vertido na alínea F).”
E quanto à invocada contradição existente entre os factos não provados A) e F) importar referir que “constitui entendimento prevalecente que só existe contradição entre factos quando eles se mostrem absolutamente incompatíveis entre si, de tal modo que não possam coexistir entre si, sendo certo que se vem entendendo que essa incompatibilidade deve existir entre os próprios factos provados e já não em relação aos factos dados como não provados, pois que em que relação a estes tudo se deve passar como se na verdade não tivessem sido alegados (…) – cfr. Ac. Rel. Coimbra de 12.12.2017, p. 320/15.0 T8MGR.C1, relator ISAÍAS PÁDUA, disponível in www.dgsi.pt. e demais jurisprudência aí citada.
Assim, tratando-se ambos de factos não provados terá que se concluir pela inexistência da arguida contradição.
Prosseguindo, no sentido de ver a alínea F) como provada e consequentemente assente que a máquina padece de defeitos, a recorrente alude aos emails de 20.7.2022 e de 13.9.2022 (factos nºs 20 e 25), às fotografias juntas pela ré com a contestação e a excertos dos depoimentos prestados pelas testemunhas CC, AA e DD, a cuja audição procedemos.
CC é impressor gráfico e funcionário da ré. Disse que não trabalhava com aquele tipo de máquinas. No entanto, referiu que a máquina largava óleo; havia óleo por debaixo da máquina. E quanto mais trabalha, mais óleo deita. Também disse que rebentaram duas correias. Quanto ao óleo debaixo da máquina não soube dizer donde ele saía.
AA é técnico gráfico e a autora é sua cliente. Foi duas vezes às instalações da ré, a primeira para identificar o problema, a segunda para resolver. Da primeira vez estavam lá o Sr. BB, os filhos e um empregado. Havia muito óleo à volta da máquina e concluiu-se que era necessário levantá-la para ver de onde vinha o problema. Da segunda vez, levantou a máquina, tirou o óleo todo, comprou-se uma massa própria de vedação e vedou-se todos os sítios por onde poderia haver fuga de óleo. Sublinha que a única coisa que viu foi óleo à volta da máquina, de tal forma que a sua intervenção foi apenas preventiva. Também não conseguiu identificar de onde é que vinha o óleo. Não reparou nas correias. Afirma também que depois desta segunda intervenção nunca mais foi contactado, pelo que pensava que tudo tinha ficado bem. Também referiu que embora este tipo de máquinas não fosse a sua especialidade sentia-se habilitado a resolver o problema da fuga de óleo e foi para isso que foi chamado pelo Sr. II (gerente da autora). Esclarece que como não viu de onde vinha a fuga de óleo, vedou todos os sítios de onde ele poderia vir.
DD é serralheiro mecânico e faz trabalhos para a autora e para a ré. Disse que depois da máquina ser posta a trabalhar foi lá ver e estava tudo correto, mas no dia seguinte voltou lá e o chão estava cheio de óleo. As fugas vinham do lado do depósito, do bujão[8], tendo exclamado “aquilo era um descalabro.” O motivo pode ser por estar muito tempo parada e o próprio ferro ter estalado ou rachado e ter fugas e não terem detetado. Não detetou qualquer outro problema, não tendo visto qualquer correia partida.
Sobre esta questão ouvimos ainda o depoimento da testemunha BB, que foi fundador da ré e é pai dos seus legais representantes atuais. Disse que a máquina apresentava fugas de óleo, que não foram verificadas logo no dia em que ela foi montada. Só no dia seguinte. Referiu que o Sr. AA percebia pouco daquele tipo de máquinas, não a levantou e não resolveu o problema.
A sócia gerente da ré, EE, ouvida em declarações, disse que depois de terem posto a máquina em funcionamento, cinco dias depois da sua entrega, começaram a notar alguns defeitos – correia partida, molas dos rolos de impressão partidas, contador não funcionava – e depois mais tarde, uma grande perda de óleo. Falou sobre essas situações, por email, com a HH. Quanto às deslocações do técnico, que foi lá a mando do Sr. II (legal representante da autora), referiu que este não estava dentro do funcionamento daquelas máquinas. Este técnico viu a perda de óleo, vedou o depósito e nunca levantou a máquina. Afirma, porém, que esta continua a perder óleo, tendo, no entanto, referido que demora dias ou até uma semana a acumular-se a poça de óleo.
O sócio gerente da ré, GG, ouvido em declarações, disse que depois de a máquina ter começado a trabalhar verificaram que desta escorria óleo, perdendo mais óleo do que o normal. O técnico que foi lá enviado pela autora pôs vedante nos sítios em que lhe indicou, mas tudo se manteve igual. Para além do problema do óleo, a máquina tem problemas com a correia, contador e já partiu a mola de um dos rolos de impressão. O técnico que lá foi admitiu que aquele tipo de máquinas não era a sua especialidade e nunca disse que o problema estava resolvido.
O legal representante da autora, II, foi ouvido em depoimento de parte. Disse que depois da máquina estar lá, a ré, através do Sr. BB, começou a levantar problemas, dizendo que estava a largar óleo, o que nunca tinha acontecido. Foi lá uma primeira vez com um técnico que não encontrou nada na máquina. Voltou a ir lá uma segunda vez com o mesmo técnico que, com um elevador, levantou a máquina e novamente não lhe encontrou nenhum defeito. Referiu também ser normal que neste tipo de máquinas existam pequenas perdas de óleo.
Quanto ao email referido no nº 20 da factualidade assente, remetido pela sócia gerente da ré a HH, colaboradora da autora, no dia 20.7.2022, acompanhado de fotografias, verifica-se que nele se refere que a máquina perde muito óleo e que se formam poças de óleo em volta dela.
Por seu turno, no email a que se reporta o nº 25 da factualidade assente remetido por HH a EE, em 13.9.2022, a primeira refere que a autora sempre se disponibilizou a resolver a questão da perda de óleo da máquina e que irá enviar um técnico às instalações da ré.
Tivemos ainda em atenção as fotografias, referentes à máquina, que foram juntas pela ré na sua contestação.
Ora, da valoração de todos estes elementos probatórios entendemos não haver motivos para dissentir da convicção formada pela Mmª Juíza “a quo”, que, desde logo, salienta, com pertinência, na sentença recorrida que a prova da existência de defeitos na máquina, como matéria de exceção que é, cabe à ré nos termos do art. 342º, nº 2 do Cód. Civil.
Acontece que essa prova não foi feita.
Os sócios gerentes da ré – EE e GG -, bem como a testemunha BB referiram a existência de defeitos na máquina, acentuando a verificação de uma significativa perda de óleo, ao passo que o legal representante da autora – II – negou a existência de qualquer defeito.
O técnico que a autora enviou às instalações da ré – AA – não constatou que a máquina tivesse defeitos, embora tenha referido que à sua volta havia óleo, sem que, porém, tivesse conseguido identificar o ponto de onde ele provinha. Por isso, ao colocar vedante em todos os pontos onde se poderia originar tal fuga a sua intenção foi meramente preventiva.
As testemunhas CC e DD disseram que a máquina largava óleo, sendo que a primeira não soube precisar de onde ele saía e em relação à segunda a Mmª Juíza “a quo” assinalou a sua pouca credibilidade, uma vez que esta referiu que bastou um dia para o chão ficar cheio de óleo, enquanto a sócia gerente da ré, EE, disse que a poça de óleo demora dias ou até uma semana a formar-se.
Por outro lado, importa referir que a ré como testemunha não apresentou qualquer técnico especializado naquele tipo de máquinas que atestasse a existência dos defeitos invocados, tal como não apresentou qualquer relatório técnico nesse sentido.
Prosseguindo, há também a referir que a circunstância de a autora ter enviado às instalações da ré um técnico para ver a questão da perda de óleo, despesa a ser suportada por si, não significa desde logo que tenha reconhecido a existência de defeitos, tal como esse reconhecimento não decorre do que a autora escreveu no art. 27º da sua réplica.
Com efeito, é o seguinte o texto deste artigo: “Apresentou, em determinado momento, uma pequena fuga de óleo, prontamente resolvida pelo mecânico que a autora fez deslocar às instalações da ré”.
Daqui decorre que a autora apenas aceita a ocorrência de uma pequena fuga de óleo, prontamente resolvida pelo mecânico, o que não equivale ao reconhecimento da existência de defeitos na máquina.
Até porque, de acordo com as regras da experiência e sublinhado pela ré nas suas contra-alegações, o surgimento de pequenas fugas de óleo numa máquina desta natureza pode resultar tão-só de alguma necessidade de manutenção, em virtude de um parafuso mal apertado ou de um vedante desgastado, sem que uma situação desse género possa ser havida como um defeito.
Neste contexto, e salientando sempre que o ónus da prova da existência dos defeitos incumbia à ré/reconvinte, entendemos que esta não logrou fazer prova da sua verificação, isto porque a presença de óleo à volta da máquina não significa, só por si, que nela existam defeitos.
Como tal, a alínea F) manter-se-á na factualidade não provada.
3. Conexa com a impugnação desta alínea, acha-se a impugnação relativa aos factos provados sob os nºs 21 e 26 [21- Na sequência da aludida comunicação, a Autora enviou às instalações da Ré um mecânico; 26- A Autora solicitou de novo ao mecânico que se deslocasse às instalações da Ré] em que a ré/recorrente pretende que o nº 26 seja eliminado e que no nº 21 se acrescente que esta deslocação ocorreu em setembro, de modo a melhor compatibilizar estes dois pontos factuais com os nºs 22 e 30, que correspondem às duas faturas emitidas para pagamento das deslocações do técnico, AA, às instalações da ré.
Do depoimento prestado por este técnico resulta que se deslocou duas vezes às instalações da ré e que por essas deslocações foram emitidas as duas faturas a que se reportam os nºs 22 e 30 da factualidade assente. A primeira emitida em 23.9.2022, com data de vencimento em 23.10.2022 e a segunda emitida em 12.12.2022, com data de vencimento em 11.1.2023.
Mesmo que a linha cronológica resultante da factualidade assente não surja muito clara, o que se verifica é que o técnico [mecânico] efetuou duas deslocações às instalações da ré, ambas a pedido da autora, tendo as duas ocorrido, face ao que consta das faturas emitidas, depois do mail referido no facto nº 25, remetido em 13.9.2022 por HH, colaboradora da autora, para EE, sócia gerente da ré.
Como da conjugação do facto nº 21 com a fatura referida no subsequente nº 22 decorre que a deslocação do mecânico aí mencionada se verificou em setembro de 2022 não carece o dito facto nº 21 de qualquer alteração na sua redação.
Tal como o nº 26 se deverá manter na factualidade provada, porquanto houve efetivamente duas deslocações do mecânico às instalações da ré, as quais justificaram a emissão das duas faturas constantes dos nºs 22 e 30.
4. Seguidamente a ré/recorrente impugna os factos dados como provados sob os nºs 27 e 28 [27- Aquele profissional desmontou a máquina, procedeu à realização de testes exaustivos, vedou as partes onde poderia eventualmente haver uma fuga de óleo, fuga de óleo essa que não detectou; 28- O mecânico passou 6 horas na realização daquelas tarefas, não tendo detectado qualquer defeito ou avaria] e também o facto não provado a que se refere a alínea G) [G) Que o mecânico enviado às instalações da Ré tenha comunicado aos legais representantes da Ré que nada percebia deste tipo de máquinas e que não conseguia resolver o problema].
Pretende que a redação do nº 27 passe a ser a seguinte:
- Aquele profissional levantou a máquina, tirou o óleo todo e que, com uma massa própria para vedação, vedou todos os sítios de onde podia estar a verter o óleo, tendo dado indicações à Ré para encher o depósito do óleo passado uns dias.
Simultaneamente entende que o nº 28 deve ser dado como não provado, ao passo que a alínea G) deve transitar para o elenco dos factos provados.
No sentido destas alterações indica excertos dos depoimentos das testemunhas AA e BB e também das declarações prestadas pelo sócio gerente da ré, GG.
Em termos de fundamentação a Mmª Juíza “a quo”, a propósito dos nºs 27 e 28 e da alínea G), escreveu o seguinte:
“No que concerne aos factos provados números 27 e 28 e conforme referido supra, o Tribunal atribuiu credibilidade ao depoimento prestado pela testemunha AA.
(…)
Por último, quanto ao facto não provado (G), importa realçar que, pese embora o técnico AA tenha admitido que está especializado noutro tipo de máquinas, o mesmo referiu igualmente que “Sentia-se à vontade para resolver o problema de óleo da máquina”, motivo pelo qual não foi feita prova cabal que “Que o mecânico enviado às instalações da Ré tenha comunicado aos legais representantes da Ré que nada percebia deste tipo de máquinas e que não conseguia resolver o problema”, sendo que, tirando as declarações da própria parte (sócios-gerentes da Ré) não foi produzida prova nesse sentido.”
Já quanto ao depoimento da testemunha AA escreveu o seguinte:
“… importa realçar que o técnico AA foi também ouvido como testemunha em sede de Audiência de Discussão e Julgamento, tendo confirmado que foi duas vezes às instalações da Ré, a primeira para identificar o problema e a segunda para resolver.
Referiu ainda que, da primeira vez, esteve lá o Sr. BB, os filhos e um empregado, bem como o legal representante da Autora, e que existia óleo à volta de toda a máquina e chegou-se à conclusão que era preciso levantar a máquina para ver de onde vinha o problema.
Relatou também esta testemunha que, da segunda vez que foi às instalações da Autora, levantou a máquina, tirou o óleo todo, comprou uma massa própria de vedação e vedou-se todos os sítios de onde podia estar verter o óleo, tendo dado indicações à Ré para encher o depósito do óleo passado uns dias e que, depois, nunca mais foi contactado pelo que pensava que tinha ficado tudo resolvido.
Mais referiu que não conseguiu identificar um sítio concreto de onde a máquina vertesse óleo, tendo procedido à vedação com um intuito preventivo.
Mais referiu esta testemunha que pese embora as máquinas de etiquetas e estufa não sejam a sua especialidade “sentia-se à vontade para resolver o problema de óleo da máquina”.
Face ao exposto, é desde logo notória uma clara divergência entre o depoimento prestado pelos sócios-gerentes da Ré e o desta testemunha, a qual, na perspectiva do Tribunal, prestou um depoimento isento e credível, mencionando que já fez trabalhos para ambas as partes, não tendo o Tribunal notado qualquer animosidade quanto a nenhuma das partes, motivo pelo qual, com base nas referidas declarações, considerou o Tribunal como provado que “Aquele profissional desmontou a máquina, procedeu à realização de testes exaustivos, vedou as partes onde poderia eventualmente haver uma fuga de óleo, fuga de óleo essa que não detectou” (cf. facto provado número 27), bem como que “O mecânico passou 6 horas na realização daquelas tarefas, não tendo detectado qualquer defeito ou avaria” (cf. Facto provado número 28) e como não provado que “Que o mecânico enviado às instalações da Ré tenha comunicado aos legais representantes da Ré que nada percebia deste tipo de máquinas e que não conseguia resolver o problema” (cf. facto não provado vertido na alínea G).”
Do depoimento da testemunha AA, já acima sintetizado, resulta que este levantou a máquina, tirou o óleo todo e, com uma massa própria de vedação, vedou todos os sítios por onde poderia haver fuga de óleo. A única coisa que viu foi óleo à volta da máquina, de tal forma que a sua intervenção foi apenas preventiva, referindo também que não conseguiu identificar de onde é que vinha o óleo. Afirmou igualmente que embora este tipo de máquinas não fosse a sua especialidade sentia-se habilitado a resolver o problema da fuga de óleo.
Acresce que a fatura correspondente a esta deslocação às instalações da ré [nº 30] refere seis horas de serviço.
Por seu turno, a testemunha BB referiu que o técnico – AA – percebia pouco daquele tipo de máquinas e o sócio gerente da ré, GG, nas suas declarações disse que o técnico admitiu que aquele tipo de máquinas não era a sua especialidade.
Valorando estes elementos probatórios, e conferindo, tal como o fez a Mmª Juíza “a quo”, credibilidade ao depoimento prestado pelo técnico AA, ouvido como testemunha, entendemos que a redação do nº 27 deverá ser alterada, uma vez que este não referiu ter desmontado a máquina, mas sim tê-la levantado. A realização de testes à máquina, a fim de apurar da existência de uma fuga de óleo, é algo que decorre do próprio trabalho que efetuou, ao longo de seis horas, e que se objetivou na colocação de vedante em todos os sítios de onde eventualmente essa fuga poderia provir e que não detetou. Já o carácter exaustivo desses testes é algo que pelo seu teor conclusivo deverá ser eliminado deste ponto factual, cuja redação passará assim a ser a seguinte:
- Aquele profissional levantou a máquina, procedeu à realização de testes, vedou as partes onde poderia eventualmente haver uma fuga de óleo, fuga de óleo essa que não detetou.
No tocante ao nº 28, que é complementado pela fatura a que se refere o nº 30, permanecerá na factualidade assente sem qualquer modificação de redação, tal como se manterá na factualidade não provada a sua alínea G).
Com efeito, pese embora o técnico AA tenha efetivamente admitido que aquele tipo de máquinas – de etiquetas - não era a sua especialidade, também salientou que se sentia habilitado a resolver o problema da fuga de óleo. Assim, em momento algum comunicou aos legais representantes da ré que nada percebia dessas máquinas e que não conseguia resolver o problema.
5. Prosseguindo, a ré/recorrente impugnou depois os nºs 17, 18, 19, 20 e 23 da factualidade provada cuja redação é a seguinte:
17- Entregue a máquina nas instalações da Ré, a Autora pediu à Ré que esta lhe pagasse o valor devido a título de pagamento do preço pela venda da máquina e o devido pelo transporte daquele equipamento para as instalações da Ré.
18- Perante aquela solicitação de pagamento, os responsáveis da Ré responderam que teriam de falar primeiro com o contabilista.
19- A Autora voltou a insistir junto da Ré pelo pagamento dos valores.
20- Perante esta nova insistência por parte da Autora, a Ré, no dia 20 de Julho de 2022, na pessoa da sua sócia gerente, EE, remeteu à Autora, a seguinte comunicação via e-mail, dirigida a HH, colaboradora da Autora responsável pela facturação:
«Bom dia HH, Amanhã vamos testar também a estufa com etiquetas impressas e logo que possível dizemos alguma coisa.
Entretanto aproveito para enviar as fotografias em anexo sobre o problema da máquina perder mesmo muito óleo conforme falamos ao telefone. Em tão pouco tempo de andamento de máquina verificamos a formação de poças de óleo a toda a volta da máquina.
Ate ao final da semana damos resposta. Obrigada.
Com os melhores cumprimentos,
EE».
23- A Autora voltou a instar a Ré ao pagamento.
Pretende que os factos nºs 17, 18, 19 e 23 sejam havidos como não provados e que a redação do nº 20 seja alterada passando a ser a seguinte:
- No dia 20 de Julho a Autora, na pessoa da sua funcionária HH, perguntou via email se podia emitir a factura, tendo a sócia gerente EE respondido: «Bom dia HH, Amanhã vamos testar também a estufa com etiquetas impressas e logo que possível dizemos alguma coisa. Entretanto aproveito para enviar as fotografias em anexo sobre o problema da máquina perder mesmo muito óleo conforme falamos ao telefone. Em tão pouco tempo de andamento de máquina verificamos a formação de poças de óleo a toda a volta da máquina. Ate ao final da semana damos resposta”.
No sentido destas alterações indica excertos do depoimento da testemunha HH e o documento nº 2 junto com a contestação que corresponde a emails trocados entre HH, colaboradora da autora e EE, sócia gerente da ré.
Em termos de fundamentação a Mmª Juíza “a quo” escreveu o seguinte no tocante aos factos agora impugnados:
“Quanto aos factos provados números 16 a 18 foi tido em consideração o depoimento de parte do legal representante da Autora, as declarações prestadas pela testemunha HH, assim como o teor da factura n.º 1394/2022 emitida pela C..., Lda. e junta pela Sociedade Autora com a petição inicial apresentada.
Relativamente aos factos provados vertidos nos pontos 19 e 20 o Tribunal valorou a comunicação via e-mail junta pela Ré como documento n.º 2 à contestação apresentada.
(…)
No que toca aos factos provados número 23 e 24 os mesmos resultaram do depoimento prestado pela testemunha HH, tendo a sócio-gerente da Ré, EE afirmado expressamente que denunciou os seguintes defeitos da máquina (perdas de óleo, correia partida, molas dos rolos de impressão partidas, contador não funcionava).”
Já quanto ao depoimento da testemunha HH, a Mmª Juíza “a quo” escreveu que por esta “… foi referido que esteve presente aquando da colocação da máquina nas instalações da Ré e que o Sr. BB pediu para aguardar para facturar porque queria falar com o contabilista, confirmando a data em que descarregaram a máquina (08 de Julho de 2022).”
Por seu lado quanto ao depoimento do legal representante da autora, escreveu-se na sentença recorrida que este “[a]firmou (…) que o preço acordado entre as partes ascendeu a € 4.250,00 + IVA (afirmando que inicialmente queria pôr a máquina à venda por € 4.500,00 + IVA, mas que depois retiraram os € 250,00 em sede de negociações).” E a seguir quanto ao pagamento do preço escreveu-se que o legal representante da autora alegou que esse pagamento “seria a 30 dias, negando perentoriamente que tenha sido acordado que a máquina iria à experiência para as instalações da Ré.” Quanto ao preço da máquina escreveu ainda a Mmª Juíza “a quo” que o legal representante da autora “não facturou logo a máquina porque o Sr. BB pediu para aguardar, mas que, depois foram alegando sucessivos problemas com a máquina (com o óleo, correia partida, contador que não funcionava, molas dos rolos partidas…), pelo que, chegou a uma determinada altura em que não podiam aguardar mais tempo e acabaram por facturar a máquina.”
Procedemos assim à audição do depoimento da testemunha HH, que é encarregada geral da autora e filha do seu sócio gerente. Disse que tinham uma máquina de etiquetas que foi comprada apenas por causa de um cliente, que foi para Guimarães. Por isso, deixou de fazer sentido e ficou parada, até que, depois de terem falado com algumas pessoas, surgiu a ré “A...” interessada na máquina, com quem acertaram a sua venda. Estava presente aquando do transporte e entrega da máquina nas instalações da ré, o que ocorreu em julho de 2022. Falou então com o Sr. BB sobre o pagamento do preço da máquina e este pediu para se aguardar algum tempo porque queria falar com o contabilista para saber se era para faturar ou se era para ser “ao negro” ou se era “metade/metade”. Deram estas facilidades porque confiavam na ré com quem tinham boas relações. Quiseram ajudar. Mas a situação continuou indefinida e a certa altura, talvez em setembro/outubro, decidiram faturar a máquina e pedir o dinheiro.
Por seu lado, II, no seu depoimento de parte como sócio gerente da autora, disse que não faturaram logo a máquina porque o Sr. BB lhes pediu para faturarem mais tarde, se havia de ser tudo, se havia de ser metade. Mas a certa altura como a ré começou a arranjar problemas decidiram faturar a máquina.
Quanto aos emails, constantes do documento nº 2 junto com a contestação, surge um remetido de HH para EE no dia 20.7.2022, pelas 11:40:43, do qual consta o seguinte: “Já posso emitir a fatura da máquina? Quero fechar esse processo que já se está arrastar algum tempo?”. O outro, remetido de EE para HH, tem o teor que se mostra reproduzido no nº 20 da factualidade assente.
Da avaliação destes meios probatórios resulta que no dia da entrega da máquina nas instalações da ré – 8.7.2022 – a autora solicitou a esta o pagamento do respetivo preço, tendo os seus responsáveis dito para se aguardar, pois iriam falar com o contabilista sobre a sua faturação e a forma de pagamento, o que foi aceite pela autora devido à relação de confiança existente.
Alguns dias depois, em 20.7.2022, por mail, HH, colaboradora da autora, pergunta a EE, se já pode emitir a fatura da máquina e, nesse mesmo dia, surge o mail que se mostra reproduzido no nº 20 da factualidade assente, em que a ré começa a levantar, perante a autora, a questão do aparecimento de óleo em volta da máquina.
A partir daí desencadeia-se o litígio entre a autora e a ré, com a segunda a invocar a existência de problemas com a máquina, não providenciando pelo seu pagamento, nem nada dizendo quanto à faturação da máquina, e a primeira a enviar um técnico às instalações da ré por duas vezes a fim de, existindo esses problemas, solucioná-los.
É neste contexto, já conflitual, que surge, em 12.10.2022, a emissão da fatura relativa ao pagamento do preço da máquina por parte da autora, a qual não é paga pela ré.
Deste modo, entendemos que os nºs 17, 18 e 23 se deverão manter na factualidade assente sem qualquer alteração de redação, ao passo que o nº 19 será dela eliminado.
O nº 20 passará a ter a seguinte redação:
- No dia 20.7.2022 a autora, através da sua funcionária HH, perguntou via email se podia emitir a fatura relativa ao pagamento do preço da máquina, tendo a sócia gerente da ré, EE, respondido: «Bom dia HH, Amanhã vamos testar também a estufa com etiquetas impressas e logo que possível dizemos alguma coisa. Entretanto aproveito para enviar as fotografias em anexo sobre o problema da máquina perder mesmo muito óleo conforme falamos ao telefone. Em tão pouco tempo de andamento de máquina verificamos a formação de poças de óleo a toda a volta da máquina. Ate ao final da semana damos resposta. Com os melhores cumprimentos. EE”.
6. Por último, a ré/recorrente relativamente ao facto nº 15 [A Ré recebeu a máquina, sem qualquer reserva] sustenta que este deve ser retirado do elenco dos factos provados por se tratar de facto conclusivo.
Já no que concerne ao facto não provado constante da alínea C) [ Que, aquando da reunião ocorrida em Maio de 2022 a Ré tenha manifestado o interesse em adquirir a máquina de etiquetas e estufa, mas sujeita à condição de a experimentar em contexto de trabalho, ou seja, em funcionamento, ficando acordado que tomaria a decisão de compra apenas após a experienciar] entende que o mesmo deve transitar para os factos provados, indicando nesse sentido excertos das declarações dos sócios gerentes da ré, EE e GG, e dos depoimentos das testemunhas BB e HH e também o teor dos mails já referidos e que foram trocados entre a autora e a ré no dia 20.7.2022.
Vejamos então.
EE, sócia gerente da ré, nas suas declarações, disse que se propuseram fazer o negócio da compra da máquina na condição desta estar em funcionamento. Quando foram às instalações da autora ver a máquina, eles puseram a máquina a funcionar, mas não a produzir, tendo chegado à conclusão de que, estando ela em perfeito estado de funcionamento, lhes daria jeito. O negócio iria processar-se com a vinda da máquina à experiência.
GG, também sócio gerente da ré, nas suas declarações disse que quando foram às instalações da autora ver a máquina eles ligaram-na para a verem, mas foi por poucos minutos. Foi combinado que a máquina vinha à condição. Só ficariam com ela se estivesse em boas condições.
BB disse que, tendo ido com os seus filhos às instalações da autora, nunca viu a máquina a trabalhar. Foi só ligar e desligar. Só com algum tempo de trabalho é que se percebe se a máquina está funcional. Mais referiu que o Sr. II (gerente da autora) lhe dizia que a máquina não tinha problemas nenhuns, mas, se a máquina não estivesse bem, era a título experimental.
HH disse que o Sr. BB e a EE foram às instalações da autora uma primeira vez, tendo visto e experimentado a máquina. Trabalharam com ela, fazendo meio corte de etiquetas. Na segunda vez, ficou tudo acertado quanto à compra da máquina pela ré, tendo, inclusive, os seus responsáveis levado os respetivos acessórios (cortantes e rolos de impressão) e até levaram uma laminadora, que foi oferecida.[9]
O sócio gerente da autora, II, no seu depoimento disse que os responsáveis da ré quando foram às instalações da autora, pela primeira vez, viram a máquina a trabalhar. Na segunda deslocação acertaram o negócio, tendo os responsáveis da ré levado já peças pertencentes à máquina.
Ouvimos ainda o depoimento da testemunha II, filho do legal representante da autora e irmão de HH, que trabalha na autora há cerca de 25 anos. Disse que na primeira vez em que os representantes da ré – o Sr. BB e a EE - foram às instalações da autora ensaiaram a máquina e estiveram a trabalhar com ela. Na segunda vez fizeram o negócio e não puseram a máquina a trabalhar porque já a tinham experimentado antes. O único assunto que então discutiram foi o preço. Nunca se falou que o negócio fosse à condição.
Constata-se, pois, que no respeitante aos contornos do negócio celebrado entre a autora e a ré, no sentido deste se ter realizado na condição da máquina ser experimentada em contexto de trabalho, se perfilam duas versões antagónicas.
A da ré, que sustenta que a máquina veio à experiência e que só ficaria com ela se estivesse em boas condições. A da autora, que defende nunca se ter falado que o negócio fosse à condição e que a máquina tivesse ido para as instalações da ré à experiência.
Confrontada com estas duas versões opostas, a Mmª Juíza “a quo” entendeu que a defendida pela ré não se provou, dando-a como não assente na alínea C).
Fundamentou a sua convicção nos seguintes termos:
“No que concerne à alínea (C) incumbia à Ré o respectivo ónus da prova, não tendo a mesma logrado convencer o Tribunal de tal facto, atenta a parca […] produzida nesse sentido, pois somente os sócios-gerentes da Ré afirmaram tal facto, assim como o pai dos mesmos, o Sr. BB.
De notar que não existe qualquer troca de e-mails a combinar os termos em que seria tal experimentação da máquina em contexto de trabalho efectuada, o prazo que tinham acordado para dar uma resposta se ficariam ou não com a máquina, ao que acresce o facto de se tratar de uma máquina dispendiosa, pesada (mais de 2 toneladas), carecendo de sentido que a mesma fosse adquirida à condição de a experimentar em contexto de trabalho nas instalações da Ré, quando, se fosse esse o caso, bem o poderia ter sido nas instalações da Autora, ainda para mais se tivermos em conta que, na versão apresentada pela Ré, o transporte incumbiria à Autora, pelo que, a mesma poderia pagar o transporte, ver a máquina devolvida e perder o dinheiro que gastou com a transportadora, tanto para deslocar a máquina para as instalações da Ré como de novo as instalações da Autora, o que contraria totalmente as regras da experiência comum.”
A argumentação explanada na sentença recorrida é, a nosso ver, válida, salientando-se nesta a circunstância de não existir qualquer troca de emails quanto aos termos em que se faria a experimentação da máquina pela ré.
É certo que a ré sustenta que o seu email de 20.7.2022, enviado de EE para HH, serviria de apoio à sua versão, pois dele consta que “amanhã vamos testar também a estufa com etiquetas impressas”.
Porém, apesar de alguma dúvida que este email pode produzir, não podemos ignorar que, para além desta breve referência, nenhuma outra há nos emails trocados entre a autora e a ré que possa servir de fundamento à tese da venda da máquina sob condição de experimentação, sendo certo que entrando o negócio celebrado em fase conflitual este seria de imediato um poderoso argumento a ser esgrimido pela ré.
Aliás, é sintomático que na troca de emails ocorrida em 26.12.2022 entre EE e HH [nºs 31 a 34] nunca a primeira defendeu que a venda da máquina havia sido feita na condição de experimentação, centrando antes a sua argumentação na existência de defeitos.
Além disso, também haverá a ter em conta que o ónus da prova desta factualidade incumbe à ré e ocorrendo uma situação de dúvida quanto à mesma terá esta que ser decidida contra a parte onerada com a prova – cfr. arts. 342º, nº 2 e 346º do Cód. Civil e 414º do Cód. de Proc. Civil.
Desta forma, em sintonia com a sentença recorrida, concluímos que a alínea C) deverá permanecer na factualidade não provada.
Já no que respeita ao facto nº 15 [A Ré recebeu a máquina, sem qualquer reserva], não oferece dúvidas que a ré recebeu a máquina nas suas instalações, o que, de resto, é admitido por esta. Contudo, o segmento “sem qualquer reserva”, tal como defendido pela recorrente, reveste cariz conclusivo, impondo-se que seja eliminado da sua redação, que passará a ser a seguinte:
- A ré recebeu a máquina.
A impugnação fáctica efetuada pela ré/recorrente obterá parcial procedência, embora desde já se refira que as alterações nela introduzidas nenhuma repercussão terão na decisão dos presentes autos.
Assim, o nº 19 é eliminado da factualidade assente.
Os nºs 15, 20 e 27 passarão a ter as seguintes redações:
15 - A ré recebeu a máquina.
20 - No dia 20.7.2022 a autora, através da sua funcionária HH, perguntou via email se podia emitir a fatura relativa ao pagamento do preço da máquina, tendo a sócia gerente da ré, EE, respondido: «Bom dia HH, Amanhã vamos testar também a estufa com etiquetas impressas e logo que possível dizemos alguma coisa. Entretanto aproveito para enviar as fotografias em anexo sobre o problema da máquina perder mesmo muito óleo conforme falamos ao telefone. Em tão pouco tempo de andamento de máquina verificamos a formação de poças de óleo a toda a volta da máquina. Ate ao final da semana damos resposta. Com os melhores cumprimentos. EE”.
27 - Aquele profissional levantou a máquina, procedeu à realização de testes, vedou as partes onde poderia eventualmente haver uma fuga de óleo, fuga de óleo essa que não detetou.
Da matéria de facto dada como assente decorre que a autora decidiu vender uma máquina de etiquetas mais estufa e que a ré manifestou interesse na sua aquisição [nºs 3, 4 e 5].
Assim, em data não concretamente apurada do mês de maio de 2022, a autora e a ré estiveram reunidas nas instalações da autora, tendo ficado acordado para a aquisição da máquina o preço de 4.250,00€ que, acrescido de IVA, resulta no valor global de 5.227,50€ [nºs 6 a 9].
A máquina viria a ser entregue nas instalações da ré, que a recebeu, no dia 8.7.2022 [nºs 14 e 15].
Neste conspecto, não se suscitam dúvidas no tocante à celebração entre a autora e a ré de um contrato de compra e venda referente à máquina de etiquetas mais estufa – cfr. art. 874º do Cód. Civil.
Sucede que a ré sustenta que a venda da máquina foi sujeita à condição de a experimentar em contexto de trabalho, de tal forma que apenas depois dessa experimentação e no caso dela estar em boas condições de funcionamento é que se concretizaria a aquisição com o pagamento do respetivo preço.
Conforme dispõe o art. 270º do Cód. Civil «[a]s partes podem subordinar a um acontecimento futuro e incerto a produção dos efeitos do negócio jurídico ou a sua resolução: no primeiro caso, diz-se suspensiva a condição; no segundo, resolutiva.»
A condição é suspensiva quando a produção dos efeitos do negócio jurídico fica paralisada enquanto se não verificar o facto ou acontecimento condicionante.
A condição é resolutiva quando a sua verificação tem como consequência a cessação dos efeitos do ato. Neste caso, celebrado o negócio condicionado, os seus efeitos produzem-se desde logo, mas se o facto condicionante vier a ocorrer, esses efeitos são destruídos.[10]
Ora, tendo a ré alegado, em termos de defesa por exceção, que a compra e venda ficara sujeita à condição de experimentar a máquina em contexto de trabalho, daí decorre, como já atrás exposto, que à ré cabia o ónus da prova da subordinação de tal negócio a essa condição – cfr. art. 342º, nº 2 do Cód. Civil.
Porém, conforme flui do facto não provado constante da alínea C), verifica-se que essa prova não foi feita pela ré e assim terá que se concluir que a compra e venda se concretizou sem que estivesse sujeita a qualquer condição, o que significa, nesta parte, a improcedência do recurso interposto.
Conforme preceitua o art. 913º, nº 1 do Cód. Civil, «[s]e a coisa vendida sofrer de vício que a desvalorize ou impeça a realização do fim a que é destinada, ou não tiver as qualidades asseguradas pelo vendedor ou necessárias para a realização daquele fim, observar-se-á, com as devidas adaptações, o prescrito na secção precedente, em tudo quanto não seja modificado pelas disposições dos artigos seguintes.»
Alude-se neste preceito a quatro modalidades de defeitos: i) vícios que estão na origem de uma diminuição do valor da coisa; ii) vícios impeditivos da realização do fim a que a coisa é destinada; iii) falta de qualidades asseguradas pelo vendedor; iv) falta de qualidades necessárias para a realização do fim a que se destina.
Estas quatro hipóteses podem ser reconduzidas a duas grandes categorias: i) vícios da coisa; ii) falta de qualidade da coisa. No essencial, justifica entender-se que existe um defeito quando o objeto não tem as características estruturais ou funcionais contratualizadas.
O vício da coisa traduz um minus em relação a um padrão de normalidade. A falta de qualidade corresponde a um plus relativamente àquele padrão, como fonte negocial.[11]
De regresso à situação “sub judice”, tendo em atenção que o ónus da prova da existência dos defeitos da máquina cabia à ré/reconvinte, teremos naturalmente que concluir que essa prova não foi feita, conforme se alcança do facto não provado vertido na alínea F) e também dos factos provados com os nºs 27 e 28.
Como tal, o recurso interposto improcede ainda neste segmento.
Na sentença recorrida, a propósito do pagamento das faturas relativas às deslocações do técnico, a Mmª Juíza “a quo” escreveu o seguinte:
“Igualmente, não tendo a Ré logrado fazer prova dos defeitos, cujo o ónus da prova lhe incumbia, verifica-se que a foi a conduta da Ré que fez com a Autora despendesse o montante de €110,70 para pagar a deslocação e serviço do mecânico às instalações da Ré (cf. Conforme factura FAC A22/659, de 23/09/2022, vencida em 23/10/2022), pelo que deverá a Ré ser condenada no ressarcimento de tal quantia à Autora.
Sem prejuízo do supra exposto, no que concerne à segunda deslocação do técnico às instalações da Ré constata-se que por e-mail datado de 13/09/2022 a Autora comunicou a Ré que iria proceder à facturação da máquina, mas que enviaria um técnico às instalações da Ré, despesa essa que seria suportada pela Autora (cf. facto provado número 25), motivo pelo qual, e em obediência ao princípio da boa fé (cf. artigo 762.º, n.º 2 do Código Civil), não poderá o reembolso de tal valor ser cobrado à Ré, cumprindo, consequentemente, julgar-se improcedente, nessa parte, o pedido formulado pela Autora.”
Sustenta a ré/recorrente, no seu recurso, que também a fatura de 110,70€, relativa à primeira deslocação do técnico enviado pela autora às instalações da ré, face ao teor do email remetido pela autora no dia 13.9.2022, deverá ficar a cargo da autora.
Neste email, remetido por HH, colaboradora da autora, para EE, sócia gerente da ré, escreveu a primeira o seguinte: “Posta a situação, iremos faturar a máquina na totalidade e enviar o técnico às vossas instalações, despesa essa que será suportada por nós.” – facto nº 25.[12]
Pese embora se constate alguma dificuldade no que concerne à definição da linha cronológica respeitante às duas deslocações do técnico às instalações da ré e sua conexão com o referido email de 13.9.2022, há um aspeto que não poderemos deixar de assinalar.
É que a fatura referente à primeira deslocação do técnico, no valor de 110,70€, foi emitida em 23.9.2022 – facto nº 22 -, donde decorre que essa deslocação terá ocorrido em momento posterior ao email de 13.9.2022, no qual a autora assume que as despesas com a deslocação do técnico serão suportadas por si.
Assim sendo, entendemos que igualmente o pagamento da primeira deslocação do técnico na importância de 110,70€, em respeito pelo princípio da boa fé consagrado no art. 762º, nº 2 do Cód. Civil, deverá ser assumido pela autora.
Por conseguinte, nesta parte, o recurso interposto pela ré obterá procedência, eliminando-se da sua condenação a referida fatura no valor de 110,70€.
Por último, a ré/reconvinte veio arguir a nulidade da sentença recorrida por omissão de pronúncia, ao abrigo do art. 615º, nº 1, al. d) do Cód. Proc. Civil, no tocante ao pedido reconvencional.
Estatui o art. 615º, nº 1, al. d) que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
Manifesto é que esta nulidade não se verifica, tal como se alcança da sentença recorrida, onde a Mmª Juíza “a quo” escreveu o seguinte quanto ao pedido reconvencional:
“Em sede de contestação apresentada, veio a Ré ademais deduzir pedido reconvencional contra a Autora, peticionando a sua condenação:
- No reconhecimento da resolução do contrato “à condição”, por incumprimento do acordado, nomeadamente, da eliminação dos defeitos da máquina de etiquetas e estufa;
- No pagamento à Ré/Reconvinte do montante de €1.500,00 a título de compensação pela ocupação, até à data da apresentação da contestação, das instalações da mesma pela aludida máquina;
- No pagamento do montante de €30,00 diários desde a data da notificação da Autora/Reconvinda do pedido reconvencional até que esta proceda ao levantamento da máquina de etiquetas e estufa das instalações da Ré/Reconvinte
(…)
A Ré, em sede de pedido reconvencional, peticionou o reconhecimento da resolução do contrato “à condição” por incumprimento do acordado, nomeadamente, da eliminação dos defeitos da máquina de etiquetas e estufa.
Nessa conformidade, conforme resulta do artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil, sobre a mesma incumbia o ónus da prova dos factos constitutivo do direito alegado, mormente, de que as partes acordaram que o contrato ficasse sujeito à condição de a máquina ser experimentada em contexto de trabalho pela Ré e a existência de defeitos da máquina de etiquetas e estufa.
Sucede que, conforme resulta dos factos não provados vertidos nas alíneas (C) e (F) não logrou a Ré-Reconvinte, no entendimento do Tribunal, efectuar a referida prova, cujo o ónus lhe incumbia.
Consequentemente, não se tendo provado o fundamento invocado para a resolução contratual, não assiste, consequentemente, à Ré o direito a tal resolução, pelo que é forçoso concluir-se pela improcedência de todos os pedidos formulados em sede reconvencional, pois também não lhe assistirá o direito à devolução da máquina, e consequentemente, aos montantes peticionados pela ocupação da máquina das instalações da Ré.”
Daqui flui que o pedido reconvencional foi objeto de apreciação na sentença recorrida no sentido da improcedência, face ao que resulta dos factos não provados constantes das alíneas C) e F), motivo pelo qual, sem necessidade de outras considerações, se conclui não ocorrer a invocada nulidade de omissão de pronúncia.
Improcede, pois, o recurso da ré ainda neste segmento.
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Nos termos expostos, acordam os juízes que constituem este Tribunal em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pela ré “A..., Lda.” e, em consequência, condena-se a ré a pagar à autora “B..., Lda.” o montante global de 5.350,50€ (cinco mil trezentos e cinquenta euros e cinquenta cêntimos), correspondente às seguintes faturas:
- Fatura FT 1/1997 datada 12.10.2022, no valor global de 5.227,50€, que reflete o preço referente à venda da máquina de etiquetas e estufa, com vencimento nessa data;
- Fatura 1394/2022, de 13.7.2022, vencida em 11.9.2022, emitida pelos “C..., Lda.”, no valor de 123,00€.
A ré “A..., Lda.” vai também condenada no pagamento à autora “B..., Lda.” dos juros de mora vencidos e vincendos, devidos desde a data de vencimento de cada uma das faturas atrás referidas, até efetivo e integral pagamento, calculados de acordo com a taxa indicada na sentença recorrida.
No mais mantém-se o decidido.
As custas serão suportadas por ambas as partes, na proporção do decaimento agora definido.
Porto, 19.11.2024
Eduardo Rodrigues Pires
Alberto Taveira
Maria da Luz Teles de Menezes de Seabra
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[1] As conclusões formuladas são anormalmente extensas, mas apesar desta situação entendemos não ser oportuno proceder ao convite à sua sintetização nos termos do art. 639º, nº 3 do Cód. de Proc. Civil.
[2] rCf. ABRANTES GERALDES, PAULO PIMENTA e PIRES DE SOUSA, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. I, 2ª ed., pág. 503 e Ac. Rel. Coimbra de 12.3.2019, proc. 141/16.2 T8PBL-A.C1, relator ALBERTO RUÇO, disponível in www.dgsi.pt.
[3] Cfr. MANUEL DE ANDRADE, “Noções Elementares de Processo Civil”, 1979, págs. 373/374.
[4] Cfr. MANUEL DE ANDRADE, ob. cit., pág. 378.
[5] Cfr. MANUEL DE ANDRADE, ob. cit., pág. 382.
[6] Cfr. MANUEL DE ANDRADE, ob. cit., pág. 380.
[7] Cfr. o já referido Ac. Rel. Coimbra de 12.3.2019, proc. 141/16.2 T8PBL-A.C1, relator ALBERTO RUÇO, disponível in www.dgsi.pt.
[8] Peça para vedar recipientes – cfr. dicionário.priberam.org.
[9] Faz-se aqui uma referência ao excerto indicado pela ré/recorrente nas suas alegações de recurso apenas para referir que a disponibilidade aí evidenciada pela autora no sentido de permitir que os responsáveis pela ré experimentassem a máquina se referia ao período de negociação entre as partes, no qual ocorreram as duas deslocações às instalações da autora.
[10] Cfr. CARVALHO FERNANDES, “Teoria Geral do Direito Civil”, II, 4ª ed., pág. 409.
[11] Cfr. ANA FILIPA MORAIS ANTUNES/RODRIGO MOREIRA, “Comentário ao Código Civil – Direito das Obrigações – Contratos em Especial”, UCP Editora, 2023, pág. 154; MENEZES CORDEIRO, “Tratado de Direito Civil, XI, Contratos em Especial (1ª parte)”, Almedina, 2019, págs. 252/253.
[12] Sublinhado nosso.
[13] O sumário restringe-se ao segmento do decidido que, a nosso ver, tem interesse jurisprudencial.