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REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
INCUMPRIMENTO
NECESSIDADE DE COMPORTAMENTO GRAVE E REITERADO
RESPONSABILIDADE POR CUSTAS
CRITÉRIO DE CAUSALIDADE
Sumário
I - Para declarar verificado o incumprimento da regulação das responsabilidades parentais não basta a ocorrência de chamadas dirigidas por um dos progenitores ao filho fora do horário estipulado no regime então em vigor para os contactos telefónicos diários com a criança, sendo ainda necessário a formulação de um juízo objetivo de censura ao comportamento do progenitor em causa, sobretudo quando se constata que as chamadas não foram atendidas e surgem em sequência, sendo assim plausível a justificação apresentada pelo progenitor visado, no sentido de que tentou contactar o filho dentro do horário fixado para o efeito, sempre infrutiferamente, pois que todas as chamadas foram recusadas e, por tal motivo, insistiu para além daquele horário. II - A responsabilidade por custas assenta num critério de causalidade, segundo o qual, as custas devem ser suportadas, em regra, pela parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento, pela parte que tirou proveito do processo. III - O índice do vencimento ou da sucumbência, em matéria de custas, surge de difícil aplicação no âmbito da providência tutelar cível de incumprimento da regulação do exercício das responsabilidades parentais, por configurar uma instância incidental na qual o julgador deve procurar encontrar a solução mais conveniente a uma equitativa composição dos interesses em presença e não um processo de partes que vise solucionar ou compor um conflito de interesses disponíveis, sendo que a natureza do processo em causa torna inoperante o índice do proveito.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:
I. Relatório
Em 01-08-2021, AA deduziu contra BB procedimento tutelar cível de incumprimento do regime de regulação do exercício das responsabilidades parentais atinente ao filho de ambos, CC, nascido a ../../2010, alegando, em síntese, que nos dias 22 e 24 de julho de 2021 não conseguiu ver e estar com o seu filho, apesar de ter informado a requerida de tal intenção com a antecedência de 24 horas, tal como prevê o acordo provisório, imputando à requerida a violação do regime convivial nas datas indicadas.
Requereu a intimação da requerida a abster-se de colocar qualquer entrave ao direito de visitas e convívio previsto no regime provisório, nomeadamente o convívio com o seu filho sempre que o requerente avise com 24 horas de antecedência.
Por requerimento apresentado em 31-08-2021, o requerente veio deduzir novo incidente de incumprimento, à data autuado como apenso D), no qual alega, em síntese, que nos dias 16 e 17 de agosto de 2021, informou a requerida com 24 horas de antecedência da sua intenção de passar o dia com o seu filho, imputando à requerida a violação do regime convivial nas datas pretendidas. Termina pedindo que a requerida seja intimada a abster-se de impedir, constantemente, que o progenitor possa conviver com o filho, cumprindo com o estabelecido na decisão provisória.
Por requerimento apresentado em 31-08-2021, o requerente veio deduzir novo incidente de incumprimento, à data autuado como apenso E), no qual alega, em síntese, que a requerida, à revelia do requerente e do Tribunal, inscreveu unilateralmente o menor numa escola francesa, escola essa que o requerente desconhece.
Em 06-10-2021, o requerente veio deduzir novo incidente de incumprimento, à data autuado como apenso F), no qual imputa à requerida a violação do regime convivial nos dias 17 de 19 de setembro de 2021, alegando ter informado a requerida, no dia 15 de setembro, que se encontrava em ... e solicitando o seu direito de visita, tendo a requerida informado que não seria possível conviver com o menor naquele fim de semana, já que teria de regressar a Portugal para atender à respetiva perícia de psicologia forense. Mais alega que a requerida e o menor apenas embarcaram para Portugal no dia 19 de setembro.
Por requerimento apresentado em 15-10-2021, o requerente veio deduzir novo incidente de incumprimento, à data autuado como apenso G), no qual alega, em síntese, que, na semana de 4 de outubro de 2021, o requerente informou a requerida, com mais de 24 horas de antecedência, da intenção de passar o fim de semana com o menor, o que a requerida recusou sem apresentar qualquer justificação para o sucedido.
Por requerimento apresentado em 26-11-2021, o requerente veio deduzir novo incidente de incumprimento, à data autuado como apenso K), no qual alega, em síntese, que denotou que o seu filho não se encontrava bem, pelo que sugeriu à requerida que o mesmo fosse avaliado por um psicólogo da área, o que foi recusado pela progenitora da criança.
Por requerimento apresentado em 26-11-2021, o requerente veio deduzir novo incidente de incumprimento, à data autuado como apenso J), no qual invoca a intransigência da requerida/progenitora em permitir que a criança prive com as primas.
Em 20-10-2021, o requerente veio alegar que o número que era utilizado pelo requerente para contactar com o menor, que sempre foi do menor, encontra-se permanentemente desligado, não conseguindo o Requerente, sequer por telefone, contactar com o seu filho. O requerente continua sem a possibilidade de contactar com o menor, não tendo assim a oportunidade de comunicar diariamente com o mesmo.
Em 21-10-2021, o requerente veio alegar que, a requerida não proporcionou acesso ao horário do menor, à plataforma educacional com as informações escolares, nem inscreveu o pai como contacto de emergência do menor na escola.
Por requerimento apresentado em 26-11-2021, o requerente veio deduzir novo incidente de incumprimento, à data autuado como apenso L), no qual alega, em síntese, que o CC, em 12-10-2021, foi submetido a 3 atos médicos e que a mãe nada comunicou ao pai.
Por requerimento apresentado em 26-11-2021, o requerente veio deduzir novo incidente de incumprimento, à data autuado como apenso M), no qual alega, em síntese, que, a progenitora não comunica ao pai os assuntos relativos a CC, apenas lhe apresentando contas para pagar.
Por requerimento apresentado em 26-11-2021, o requerente veio deduzir novo incidente de incumprimento, à data autuado como apenso N), no qual alega, em síntese, que, apesar de ter cumprido todos os formalismos necessários (avisando a mãe dentro do período estipulado no acordo), em 13-11-2021 deparou-se com mais um constrangimento na sua tarefa enquanto pai pois após ter chegado ao local onde iria buscar o filho, a requerida negou-se a cumprir com a sua parte, não restando alternativa ao requerente se não chamar a polícia, que tratou de registar o sucedido.
Por requerimento apresentado em 26-11-2021, o requerente veio deduzir novo incidente de incumprimento, à data autuado como apenso O), no qual alega que os tios pretendiam proporcionar um momento lúdico ao menor e, em simultâneo, conviver com ele e predispuseram-se a levar o menor à ..., juntamente com os seus filhos, na busca de lhe proporcionarem uma experiência única e marcadamente alegre/engraçada, solicitação que foi negada pela requerida.
Em 25-01-2022, o requerente veio deduzir novo incidente de incumprimento, à data autuado como apenso Q), no qual alega, em síntese, que em 18-11-2021 se dirigiu à residência da requerida, comunicando ao menor que havia chegado e que ficaria a aguardar que este saísse, sendo que o menor, em resposta, e repetindo o que lhe dizia a requerida, colocou uma série de entraves, sendo que a requerida nada mais fez do que prolongar a situação no tempo, colocando o requerente numa situação de impasse que era, em toda a medida, evitável, ficando o requerente mais de 30 minutos numa situação de total incerteza, sem que houvesse qualquer justificação para tal.
Por requerimento apresentado em 26-11-2021, o requerente veio deduzir novo incidente de incumprimento, à data autuado como apenso R), no qual alega que os avós do menor, residentes em Portugal, deslocaram-se a ... para estar com o menor, sendo que a requerida nem sequer respondeu à mensagem em que o solicitavam.
Por requerimento apresentado em 25-01-2022, o requerente veio deduzir novo incidente de incumprimento, à data autuado como apenso T), no qual alega, em síntese, não ter sido informado da existência de uma reunião escolar atinente ao menor, nem ter tido acesso ao respetivo relatório, que a requerida não remeteu ao requerente as classificações obtidas pelo menor no primeiro período escolar, bem como que teve lugar uma sessão fotográfica em que o menor aparecia - quer individualmente, quer com os seus restantes colegas - e que apenas a requerida conseguiu comprar as fotografias em que aparecia o filho de ambos pois o requerente não foi informado de tal sessão.
Por requerimento apresentado em 25-01-2022, o requerente veio deduzir novo incidente de incumprimento, à data autuado como apenso S), no qual alega, em síntese, que aquando das férias de natal do menor com o pai, a requerida, no dia em que o pai foi buscar o menor - 18-12-2021-, após 4 meses sem ver o filho, por culpa da requerida, esta ligou seis vezes para o filho, tendo a última chamada ocorrido muito depois das 21:00 horas, sendo que no dia seguinte a requerida contactou mais de doze vezes o menor até às 12h00, quer por chamada, quer via Whatsapp. Mais alega que no dia 20-12-2021 a requerida manteve-se em chamada com o filho por mais de 65 minutos - divididos em 3 chamadas telefónicas distintas - e ainda o contactou por videochamada, tendo esta durado mais de 20 minutos, e que no dia 21-12-2021, a requerida ultrapassou em 6 minutos os 10 diários de que dispõe e que só a muito custo permite ao requerente usar e que nos dias seguintes a mãe contactou o menor sempre por mais de 13 minutos.
Por requerimento apresentado em 27-04-2022, o requerente veio deduzir novo incidente de incumprimento, à data autuado como apenso V), no qual alega que a requerida insiste em sonegar ao requerente o direito de exercer o seu papel de pai e aceder a informações básicas da vida do menor, como sendo o seu histórico escolar e informações sobre a sua saúde.
Realizou-se conferência de pais.
Por despacho de 18-02-2022, devidamente notificado aos ora recorrente e recorrido, foi decidida a tramitação conjunta de todos os apensos de incidente suscitados pelo progenitor com o incidente deduzido no apenso C), no qual foram incorporados.
Após remessa dos progenitores para a audição técnica especializada foram os mesmos notificados para alegarem em relação aos incumprimentos suscitados no apenso C), com vista à simplificação e saneamento processual.
Apresentados os meios de prova, teve lugar a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença, a qual se transcreve na parte dispositiva: «(…) Termos em que se decide: 1. Declarar incumprido, pela requerida BB o regime do exercício das responsabilidades parentais relativo a CC. 2. Condenar requerente e requerida, na proporção de metade, nas custas do processo. Notifique e registe».
Inconformada, a requerida apresentou-se a recorrer, pugnando no sentido da alteração da decisão recorrida quanto ao suscitado incumprimento do regime estabelecido para os contactos telefónicos e no que respeita a custas processuais.
Termina as respetivas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem): «A. Insurge-se a Recorrente, desde logo, relativamente à Sentença recorrida na parte em que decidiu condenar requerente e requerida, na proporção de metade, nas custas do processo. Para o efeito, considerou-se naquele aresto que, atento o decaimento parcial, “(…) vão requerente e requerido condenados nas custas do processo na proporção de metade, fixando-se o valor da causa em € 30.000,01 - cfr. artigos 527.º e 303.º, n.º 1 do CPCivil e 44.º da LOSJ. B. A conjugação do disposto no art.° 527.°, n.°s. 1 e 2, com o n.° 6 do art.° 607.° e com o n.° 2 do artigo 663.°, todos do CPC, permite aferir que a responsabilidade pelo pagamento dos encargos e das custas de parte assenta no critério do vencimento ou decaimento na causa, ou, não havendo vencimento, no critério do proveito, mas, tal não sucede quanto à taxa de justiça, cuja responsabilidade pelo seu pagamento decorre automaticamente do respectivo impulso processual C. De acordo com o estatuído no n.° 2 do art. 527.º do CPC, o critério de distribuição da responsabilidade pelas custas assenta no princípio da causalidade e, apenas subsidiariamente, no da vantagem ou proveito processual. D. “Dá causa à acção, incidente ou recurso quem perde. Quanto à acção, perde-a o réu quando é condenado no pedido; perde-a o autor quando o réu é absolvido do pedido ou da instância. Quanto aos incidentes, paralelamente, é parte vencida aquela contra a qual a decisão é proferida: se o incidente for julgado procedente, paga as custas o requerido; se for rejeitado ou julgado improcedente, paga-as o requerente. No caso dos recursos, as custas ficam por conta do recorrido ou do recorrente, conforme o recurso obtenha ou não provimento (…)” [Cfr. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre; Código de Processo Civil Anotado, volume 2.º, 3.ª ed., p. 419]. E. Assim, deve pagar as custas a parte que não tem razão, litiga sem fundamento ou exerce no processo uma atividade injustificada, pelo que interessa apurar o teor do dispositivo da decisão em confronto com a posição assumida por cada um dos litigantes. F. Vertendo ao caso concreto, sobre a decisão proferida pela 1.ª instância quanto a custas, importa, desde logo, exaltar que ao procedimento tutelar cível de incumprimento intentado por AA, através de Requerimento início de processo, Ref.ª Citius 11803293, datado de 01-08-2021, contra BB, aqui Recorrente, foram incorporados mais 15 (quinze) incidentes. G. Salvo melhor entendimento, desconsiderou a Sentença recorrida aquela que vem sendo a “perseguição judicial” preconizada pelo Requerente/Recorrido, pois que, socorrendo-se da via judicial de forma absolutamente irrefletida, intentou 16 incidentes, alguns deles submetidos com intervalos de segundos, sobre tudo e sobre nada, alguns dos quais, veio repetida a sua factualidade em incidente autónomo, como sucedeu com o Apenso X, sendo que, a Requerida/Recorrente não teve qualquer impulso processual em 10 (dez) dos referidos incidentes, pois que, não apresentou Alegações/Oposição, por não ter sido citada/notificada para o efeito.qualquer impulso processual em 10 (dez) dos referidos incidentes, pois que, não apresentou Alegações/Oposição, por não ter sido citada/notificada para o efeito. H. Assim, e sem prejuízo da impugnação da decisão recorrida quanto à condenação da recorrente em 4 (quatro) dos supra enunciados incidentes, certo é que, a decisão que a vem condenar em custas na proporção de metade encerra errada aplicação de Direito. I. Pelo que, sem prejuízo da alteração da matéria de facto e consequente aplicação de direito que infra melhor se pugnará, sempre deve a decisão recorrida, no que respeita a custas processuais, ser revogada e substituída por outra que condene o requerente/recorrido e requerida/recorrente na proporção de ¾ e ¼ respetivamente. J. Uma das funções mais nobres dos Tribunais da Relação consiste na reapreciação da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto, conferindo-se-lhe o poder-dever de apurar da razoabilidade da convicção formada em 1ª instância e, ainda, de valorar a prova produzida, formando a sua própria convicção, em ordem à modificação da matéria de facto - Cfr. 712º e 662º do CPC. K. Assim, visando este recurso o erro de julgamento de facto, impõe-se, desde logo, especificar os concretos pontos que entende a Recorrente ter sido incorretamente julgados, os quais: *FACTOS PROVADOS 50.No dia 18 de Dezembro de 2021, dia em que CC foi entregue ao pai, pela mãe, cerca das 12.00h requerida ligou 6 vezes para o filho, tendo a última chamada ocorrido muito depois das 21:00 horas 51.No dia 19 de Dezembro de 2021 a requerida até às 12:00, contactou mais de 12 vezes o menor, quer por chamada, quer via Whatsapp. 52.No dia 20 de Dezembro de 2021 a requerida manteve-se em chamada com o filho por mais de 65 minutos - divididos em 3 chamadas telefónicas distintas- e ainda o contactou por videochamada, tendo esta durado mais de 20 minutos. L. Salvo melhor entendimento, o Tribunal recorrido não levou a cabo a devida apreciação/valoração dos documentos juntos pelo requerente/recorrido para comprovar os factos por si alegados. M. E isto porque, compulsados os documentos juntos aos autos em 25-01-2022, com o Requerimento com Ref. Citius...89, como docs. 1, 2, 3, 4, 5 e 6, dos mesmos não decorre de forma alguma que, a Requerida/Recorrente tenha incumprido o regime fixado nos termos alegados pelo Requerente/Recorrido, o que o Tribunal a quo deu, erradamente, como provado. N. Desde logo, quanto ao dia 18 de dezembro de 2021, o que resulta dos documentos juntos é que a requerida/recorrente, tentou contatar o menor dentro do horário fixado para o efeito, sempre infrutiferamente, pois que todas as chamadas foram recusadas e, por tal motivo, insistiu para além daquele horário, tendo a última tentativa ocorrido pelas 21h40m. O. Por sua vez, sobre as tentativas de contacto ocorridas no dia 19 de Dezembro de 2021, compete dizer que do documento n.º 2 decorre tão só que, nesse dia, pelas 11h44, terá a requerida/recorrente insistido em contactar o menor, com quem não havia conseguido estabelecer contacto no dia anterior, somando-se às seis chamadas constantes do documento 1 esta última, perfazendo o total de 7 chamadas; sublinhe-se que todas elas não atendidas. P. Por fim, não decorre dos documentos juntos como n.º 4 , n.º 5 e nº 6, que no dia 20 de dezembro de 2021 a requerida/recorrente se tenha mantido em chamada com o filho por mais de 65 (sessenta e cinco) minutos – divididos em 3 chamadas telefónicas distintas - e ainda o contactou por videochamada, tendo esta durado mais de 20 minutos; pelo contrário, dos supra aludidos documentos, resulta, quanto muito, que a requerida/recorrente se tenha mantido em chamada/videochamada, naquele dia, por um período total de 13 minutos e 35 segundos. Q. Acresce que, dos documentos nº 4, nº5 e nº 6, não resulta qualquer data sobre o histórico de chamadas, que permita com segurança concluir que os registo ai inscritos respeitem aos dias alegados pelo Requerente/Recorrido. R. EM TODO O CASO, ainda que se admitisse, o que não sucede, que tais registos correspondam a chamadas e contactos do dia 20 de dezembro de 2021, jamais se percebe como concluiu o Tribunal de Primeira Instância que tais contactos tenham tido duração superior a 65 minutos. S. De relevar ainda, que os documentos juntos aos autos pelo Requerente/Recorrido estejam escritos em língua francesa, não tendo o mesmo procedido à sua tradução e, bem assim, o facto de a Requerida/Recorrente, não ter impugnado o seu conteúdo e força probatória em tempo útil, em virtude de não ter sido notificada/citada do Requerimento de Inicio de Processo, ou tão pouco do despacho que admitiu que o mesmo fosse incorporado no Apenso C. T. Pelo exposto, deverá a factualidade vertida nos pontos 50., 51. e 52. DOS FACTOS PROVADOS, passar a constar da factualidade NÃO PROVADA. U. Na sequência da alteração da factualidade supra sufragada, deverá considerar-se que, não obstante tenha a Requerida/Recorrente, contactado o menor fora do horário fixado e/ou a duração de tais contactos terem ultrapassado o estipulado, mormente em 3 e/ou 6 minutos, não se afigura, a nosso ver, que tal atuação se possa considerar censurável e/ou geradora de condenação da Requerida/Recorrente; V. Ademais, também essa foi a posição do Magistrado Judicial e Digníssima Procuradora do Ministério Publico, nas várias sessões da Audiência de Julgamento dos presentes autos, advertindo os progenitores de que, na estabelecer com o menor, não deve o mesmo ser sujeito à sua cronometração, obrigando-o à sua imediata cessação, logo que esgotado o tempo fixado, pois que tal seria apenas gerador de maior ansiedade e stress para este, devendo antes, ambos os progenitores atuar com bom senso, o que, atento o supra expendido, ou seja que a Requerida/Recorrente tenha, num dia, ultrapassado a duração fixada para os contactos, em 3 minutos e, noutro dia, em 6 minutos, nos leva a concluir, inexistirem duvidas de que tal se encontre dentro dos limites, repetimos, do bom senso exigíveis. W. PELO EXPOSTO, deverá nesta parte a decisão recorrida ser alterada, absolvendo-se a Requerida/Recorrente quanto ao suscitado incumprimento do regime estabelecido para os contactos telefónicos.
TERMOS EM QUE, e nos demais de direito que Vossas Excelências Doutamente suprirão, deve o presente recurso ser admitido e julgado totalmente procedente por provado, fazendo-se assim, Inteira e Costumada Justiça!».
O requerente apresentou contra-alegações, pronunciando-se no sentido da manutenção do decidido, o mesmo sucedendo com o Ministério Público.
O recurso veio a ser admitido como apelação, com subida imediata, nos próprios autos, e com efeito devolutivo.
II. Delimitação do objeto do recurso
Face às conclusões das alegações do recorrente e sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso - artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC) - o objeto da apelação circunscreve-se às seguintes questões:
A) saber se houve erro no julgamento da matéria de facto quanto aos pontos 50., a 52., dos factos provados;
B) reapreciação do mérito da decisão recorrida em face da pretendida modificação da matéria de facto: aferir se os factos descritos em 50., a 52., dos factos provados consubstanciam atos voluntários, ilícitos e culposos, suscetíveis de fundamentar um juízo de censura à requerida, traduzido no declarado incumprimento do regime do exercício das responsabilidades parentais relativo a CC;
C) se a decisão recorrida errou ao condenar em custas na proporção de metade, designadamente por não ter imputado tal responsabilidade ao requerente/recorrido e requerida/recorrente na proporção de ¾ e ¼ respetivamente.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
III. Fundamentação
1. Os factos
1.1. Os factos, as ocorrências e elementos processuais a considerar na decisão deste recurso são os que já constam do relatório enunciado em I. supra, relevando ainda os seguintes factos considerados provados na decisão recorrida:
1. A 16-07-2021 foi proferida decisão fixando um regime provisório relativo ao exercício das responsabilidades parentais quanto a CC com o seguinte teor: a. 1) Residência da criança e atos da vida corrente:
A criança fica à guarda e cuidados da mãe, com quem fica a residir, exercendo esta as responsabilidades parentais relativas aos atos de vida corrente da criança, podendo a progenitora fixar a sua residência em ...;
b. 2) Questões de particular importância:
As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida da criança, nomeadamente, no que respeita à saúde e educação, serão exercidas exclusivamente pela progenitora;
Contudo, desde já autorizo a progenitora: a viajar para ... com a criança e a aí ficar a residir com a criança; e a matricular a criança em ..., estabelecimento de ensino oficial, para aí continuar o seu percurso escolar;
c. 3) Direito de visitas e convívios:
O Requerente pode conviver com a criança sempre que o pretender, desde que avise a mãe com pelo menos 24 horas de antecedência, sem prejuízo das atividades escolares e descanso da criança;
Nas férias escolares do presente ano, o CC passará a primeira semana do mês de agosto (de 1 a 8 de agosto) com o pai, em Portugal ou em ..., assegurando o progenitor o seu transporte, recolha e entrega em casa da mãe, sem prejuízo de outro regime que os progenitores acordem;
d. 4) Alimentos/despesas:
4.1 - A título de alimentos devidos ao filho, o pai pagará mensalmente à mãe, a quantia de 200,00€ (duzentos euros), até ao dia 08 (oito) de cada mês, mediante transferência ou depósito bancário, através do IBAN que a progenitora comunicará, em 5 dias;
4.2 - A atualização automática do montante das prestações para alimentos à criança anteriormente previstos será realizada anualmente, de acordo com o índice de inflação que vier a ser publicado pelo INE, mas nunca inferior a 3%, com início em janeiro de 2022;
4.3 - As despesas de saúde, médico/medicamentosas e escolares da criança serão suportadas por ambos os progenitores em partes iguais, mediante a apresentação de fatura ou documento.
2. A 29-11-2021 o regime provisório do exercício das responsabilidades parentais foi alterado por acordo tendo sido fixado que:
a. O progenitor não se pode ausentar de ... com o filho e irá buscar o filho à escola à sexta feira.
b. A progenitora declara autorizar o colégio ... a que o progenitor seja informado, não só dos horários, como de todas as questões relativas ao CC.
c. A progenitora compromete-se a enviar um e-mail e a dar conhecimento nos autos - ao colégio da criança a autorizar e a pedir que todas as comunicações respeitantes ao CC, também sejam efetuadas via e-mail ao progenitor, para o seguinte endereço: ..........@......
d. O pai vai buscar o filho dois fins de semana seguidos.
e. Vai buscar o CC à escola na sexta feira e entrega-o na casa da mãe, às 19:00 horas de domingo, a comunicar qualquer alteração, com pelo menos 48 horas de antecedência.
f. Como o pai vai para ... entre 18 e 27 ou 28 de dezembro, o CC passará metade das férias de Natal com o pai e a outra metade com a mãe.
g. O pai vai buscar o CC à escola no dia 18 de dezembro e entrega-o na casa da mãe no dia 25 de dezembro, pelas 09:00 horas.
h. Até ../../...., o pai diz à mãe quando é que vai buscar o CC aos fins-de-semana em janeiro e fica assim definido dessa forma.
i. Contatos telefónicos: o CC poderá contatar diariamente por videochamada, por um período de 10 minutos, com o progenitor com quem não está, entre as 20:00 e as 21:00 horas.
j. Férias do Carnaval e da Páscoa: A criança passará uma semana com cada um dos progenitores.
k. Em 2022, os primeiros períodos serão passados com o progenitor e alterna nos anos seguintes.
l. O pai vai buscar o CC à escola e entrega-o na casa da mãe, no domingo, atè às 19:00 horas.
m. Férias de verão: A criança passará 15 (quinze) dias de férias consecutivos com cada progenitor; a primeira quinzena com um e a segunda quinzena com o outro, passando com o pai a primeira quinzena.
3. A 27 de Abril de 2023 foi alterado o regime provisório no sentido das questões de particular importância passarem a ser exercidas em comum por ambos os progenitores (cf. apenso Y) - em conformidade com o despacho da primeira instância de 6.8.2021.
4. A 14 de Junho de 2023, por acordo entre os progenitores, foi no apenso Z resolvida a questão relativa ao tratamento ortodôntico de CC:
1º
Pai e mãe pagarão, por referência aos valores apresentados no requerimento inicial, metade do remanescente, não comparticipado.
2º
Ambos os progenitores obrigam-se a obter a comparticipação de maior valor, quer junto das entidades estaduais, quer junto dos respetivos seguros de saúde.
3º
Pai e mãe obrigam-se, a diligenciar no sentido de permitir, um e outro, obter a comparticipação das entidades estaduais e seguradoras, diligenciando em tudo o que for necessário.
4º
O progenitor pagará a sua quota parte, por referência aos valores apresentados pela progenitora no requerimento inicial, ficando desobrigado ao pagamento de qualquer outra quantia, em virtude do tratamento em causa.
5º
O jovem CC utilizará o aparelho dentário, fixo ou móvel, em estrito cumprimento com as orientações médico-dentista.
5. A 5 de Dezembro de 2023, por acordo entre os progenitores, foi no apenso AC alterado o regime provisório no sentido de:
1º
O CC estará com o pai no dia 29 de dezembro de 2023, avisando a mãe no dia 28, as horas a que irá buscar o CC e entrega-o em casa da mãe, no dia 05 de janeiro de 2024, em hora posteriormente a combinar e entre pai e mãe.
2º
Pai e mãe autorizam-se mutuamente a viajar em lazer, de ... para Portugal e de Portugal para ..., em qualquer altura de férias do CC e quando este esteja a cargo de cada um dos progenitores.
6. A perícia do INML em relação a AA conclui que este não evidencia características de perturbações ao nível da personalidade ou sintomas psicopatológicos com significado clínico. Demonstra competências parentais, sendo capaz de prestar todos os cuidados necessários a CC, nomeadamente ao nível dos cuidados mais básicos como de higiene, da alimentação, afecto e da estimulação assim como das práticas educativas, entre outras.
7. Não lhe foram observadas, ainda que a título de suspeitas, alterações psicopatológicas ou perturbações da personalidade que prejudiquem ou comprometam o exercício responsável da parentalidade.
8. Apesar do ajustamento global, a capacidade para o exercício da parentalidade poderá ficar comprometida pela conflitualidade que caracteriza a relação entre os progenitores sendo, por isso, absolutamente necessário intervir a este nível.
9. A perícia do INML em relação a CC conclui que este vive o processo actual com desajustamento, com repercussões ao nível emocional. Evidencia ansiedade significativa associada à separação dos pais, sobretudo associada ao não entendimento entre os pais sobre a sua guarda.
10. A indefinição perante o futuro, a falta de estabilidade é geradora de ansiedade e medos.
11. CC demonstra um forte vínculo afetivo com ambos progenitores. As figuras materna e paterna surgem associadas a vivências positivas, no entanto, é com a figura materna que o vinculo se afigura mais forte e securizante, sendo esta figura que maior serenidade, estabilidade e segurança lhe transmite.
12. CC manifestou o desejo de morar com a mãe em ..., sem indicadores de instrumentalização por parte da mãe.
13. Em relação a CC mais se conclui que é importante que os pais beneficiassem de apoio no sentido de melhorar a comunicação entre ambos, evitando conflitos constantes que induzem à instabilidade de CC e serem sensibilizados para a importância da presença da figura paterna e materna para o desenvolvimento harmonioso do filho.
14. Os pais deverão ser apoiados no sentido de fazerem o luto da conjugabilidade e da família que tinham em comum e criar novas bases para organizar a parentalidade, definir claramente as responsabilidades parentais e trabalhar a interação entre as famílias.
15. Deverá ser estabelecido, numa fase inicial, um regime estável, bem definido, previsível, com horários e dias claramente definidos, que evite a conflitualidade entre os progenitores e permita uma maior estabilidade a CC, para que este saiba com aquilo que pode contar e organizar-se e preparar-se emocionalmente. A indefinição dos dias e dos horários das visitas tem sido gerador de ansiedade e medos.
16. A perícia do INML em relação a BB conclui que não foram observadas ou suspeitas alterações psicopatológicas ou indicadores de alterações da personalidade impeditivas do exercício da parentalidade.
17. Não evidencia sintomatologia do foro psicológico com significado clínico, à exceção de alguma ansiedade associada ao divórcio recente e à tentativa de reorganização da sua vida, o que é tido como normativo.
18. A progenitora está totalmente motivada e é totalmente capaz para o exercício da parentalidade.
19. Demonstra competências parentais sólidas a todos os níveis.
20. Demonstra afeto pelo filho e é emocionalmente reativa às necessidades afetivas deste, possuindo uma rede de suporte social estável.
21. No dia 21 de julho de 2021 o requerente informou a requerida que no dia seguinte pretendia passar o dia com o seu filho.
22. A requerida na sua resposta informou tal não iria acontecer, uma vez que o filho de ambos tinha uma consulta marcada.
23. No dia 23 de julho de 2021, o requerente voltou a informar a requerida que pretendia passar o dia com o seu filho.
24. O requerente foi informado pela requerida que o seu filho não quereria passar o dia com o pai.
25. O requerente ficou, mais uma vez, sem ver o seu filho e impossibilitado de passar tempo com o mesmo.
26. No passado dia 16 de agosto de 2021, o Requerente informou a requerida, através de SMS e com 24 horas de antecedência da sua intenção de passar o dia com o seu filho. Para tal, o requerente deslocar-se-ia a ..., local onde a requerida e o filho se encontravam.
27. A requerida não mostrou qualquer disponibilidade, não comparecendo no local agendado.
28. Uma vez que o Requerente ainda se encontrava ..., e para evitar regressar ao ..., solicitou, no dia 17 de agosto, mais uma vez com 24 horas de antecedência, a possibilidade de conviver com o seu filho. Para tal, deslocou-se uma vez mais ao local onde aquela se encontrava a requerida voltou não compareceu no local agendado.
29. A 04.09.2021 a requerida deu conhecimento ao requerente do estabelecimento de ensino que o menor passaria a frequentar.
30. No passado dia 16 de setembro de 2021, e uma vez que se encontrava em ..., o requerente, nos termos da decisão provisória, solicitou o seu direito de visita, com mais de 24 horas de antecedência, para conviver com o seu filho entre as 18h30 do dia 17 de setembro e as 15h do dia 19 de setembro de 2021.
31. A requerida respondeu que não será possível conviver com CC naquele fim de semana, havendo apenas disponibilidade do fim de semana seguinte.
32. A requerida informou o requerente que nesse fim de semana não estaria em ..., já que teria de regressar a Portugal para atender à respetiva perícia de psicologia forense.
33. A requerida e CC embarcaram para Portugal no Domingo, 19 de setembro de 2021, no voo ...34, pelas 10h20.
34. Na semana de 4 de outubro de 2021, o requerente informou a requerida, com mais de 24 horas de antecedência, da intenção de passar o fim de semana com o menor.
35. O requerente foi informado pela mesma de que não seria possível ver o filho, não apresentando qualquer justificação para o sucedido.
36. A prima de CC, DD, celebrou o aniversário no fim-de-semana que o progenitor pretendia estar com o filho.
37. A 04.09.2021 a requerida deu conhecimento ao requerente do estabelecimento de ensino que o menor passaria a frequentar.
38. Em 26.10.2021 a requerida remeteu ao requerente um email onde lhe transmitiu que todas as informações por ele solicitadas poderiam ser por ele obtidas junto do estabelecimento de ensino, pois que aquando da inscrição do menor indicou todos os dados do requerente como sendo seu pai e, nessa qualidade, terá acesso a todas as informações escolares.
39. Nesse email referiu não ter o contacto do Diretor da Escola ou da Diretora de Turma, sendo que quando pretende agendar reunião escreve na caderneta do aluno. Referiu ainda, que sendo ela a residir com o menor é ela a sua encarregada de educação, como aliás já acontecia enquanto o menor esteve na Escola Básica ... e, por ser assim, apenas ela tem o acesso ao Portal Educativo, podendo o requerente solicitar junto da escola que lhe permitam também o acesso. Referiu que, o requerente sempre será informado dos resultados do CC; por fim explicou que, na qualidade de encarregada de educação, será ela a ser contactada em caso de emergência, o que de imediato lhe será comunicado, o mesmo sucedendo com qualquer ausência que se venha a verificar.
40. A requerida não proporcionou acesso ao horário do menor e à plataforma educacional com as informações escolares.
41. CC na data de 12 de outubro de 2021, foi submetido a 3 atos médicos e a mãe nada comunicou ao pai.
42. A 9-11-2021 a requerida enviou uma comunicação eletrónica a exigir uma dada quantia relativa a despesas escolares.
43. A 12 de Novembro de 2021 o progenitor enviou mensagem à progenitora dizendo que no dia seguinte ia buscar o CC.
44. Após o progenitor chegar ao local onde iria buscar o filho, a requerida negou-se a cumprir com a sua parte.
45. Embora antes tivesse reconhecido que o filho teria todo o gosto em ver o pai - conforme pode ser confirmado na mensagem enviada às 11:29 do dia 12 de novembro.
46. O Requerente chamou a polícia, que tratou de registar o sucedido.
47. No dia 18 de dezembro de 2021, o requerente dirigiu-se à residência da requerida por volta das 11 horas da manhã. Atento o habitual movimento da zona em causa, viu-se obrigado a estacionar a cerca de 15 metros da entrada da habitação, tendo, contudo, total visibilidade para a fachada do edifício.
48. Imbuído da vontade de estar com o filho e consciente de em momento algum o estaria a colocar em perigo, comunicou ao menor que havia chegado e que, portanto, ficaria a aguardar que este saísse. O menor, em resposta, e repetindo o que lhe dizia a requerida, colocou uma série de entraves.
49. Neste sentido, o Requerente viu-se obrigado a contactar a requerida que conseguiu que o requerente ficasse mais de 30 minutos numa situação de total incerteza, sem que houvesse qualquer justificação para tal.
50. No dia 18 de dezembro de 2021, dia em que CC foi entregue ao pai, pela mãe, cerca das 12.00h requerida ligou 6 vezes para o filho, tendo a última chamada ocorrido muito depois das 21:00 horas
51. No dia 19 de dezembro de 2021 a requerida até às 12:00, contactou mais de 12 vezes o menor, quer por chamada, quer via Whatsapp.
52. No dia 20 de dezembro de 2021 a requerida manteve-se em chamada com o filho por mais de 65 minutos - divididos em 3 chamadas telefónicas distintas- e ainda o contactou por videochamada, tendo esta durado mais de 20 minutos.
1.2. O Tribunal recorrido considerou não provados os seguintes factos:
1. A requerida, à revelia do requerente e do Tribunal, inscreveu unilateralmente o menor numa escola francesa, escola essa que o requerente desconhece.
2. A requerida devia ter abordado com o requerente o futuro escolar do menor, informando-o sobre qual a escola a frequentar, perguntando-lhe se estava de acordo, bem como se entendia que a mesma se coaduna com as necessidades do menor. Todavia, a requerida nada informou, não sabendo o Requerente qual a escola nem tampouco se o menor está inscrito.
3. O requerente sente-se completamente alheado da vida do menor, uma vez que para além de não o conseguir ver por manifesto impedimento da requerida, não pode decidir nada quanto à vida do mesmo, fazendo a requerida tábua rasa do superior interesse do menor, que ficará para sempre prejudicado.
4. Quando a requerida matriculou o menor na escola indicou todos os dados do requerente, que na qualidade de pai, ali se poderá dirigir e obter toda a informação que quiser sobre a sua situação escolar.
5. A requerida informou a instituição de ensino do contacto eletrónico do requerente, para o qual remeterão, no final de cada período escolar, os resultados do aproveitamento escolar do menor.
6. A 2.12.2021 a progenitora confirma com a escola a existência e correção do registo dos dados do progenitor na escola.
7. A progenitora tenha impedido o progenitor de saber das reuniões escolares e sessões fotográficas.
8. O número que era utilizado pelo requerente para contactar com o menor, que sempre foi do menor, encontra-se permanentemente desligado, não conseguindo o requerente, sequer por telefone, contactar com o seu filho.
9. O requerente continua sem a possibilidade de contactar com o menor, não tendo assim a oportunidade de comunicar diariamente com o mesmo.
2. Apreciação sobre o objeto do recurso.
2.1. Impugnação da decisão relativa à matéria de facto.
A requerida/apelante defende a exclusão dos factos constantes dos pontos 50., 51., e 52., da matéria provada, os quais deverão considerar-se como não provados, alegando que dos documentos juntos aos autos em 25-01-2022 (requerimento com Ref.ª Citius ...89), como docs. 1, 2, 3, 4, 5 e 6, não decorre a matéria impugnada.
Em sede de impugnação, a ora recorrente vem ainda alegar que tais documentos estão escritos em língua francesa e que o recorrido não procedeu à respetiva tradução, mais sustentando que só não impugnou em tempo útil o respetivo conteúdo e força probatória em virtude de não ter sido notificada/citada do requerimento de inicio de processo, ou tão pouco do despacho que admitiu que o mesmo fosse incorporado no apenso C.
Porém, sobre esta última questão, a requerida/apelante não retira qualquer consequência, em termos processuais, do que alega, mais se constatando que toma efetiva posição sobre o teor dos documentos em referência, revelando a total e perfeita compreensão dos respetivos termos em língua francesa.
Ademais, resulta dos autos que, por despacho de 18-02-2022, devidamente notificado aos ora recorrente e recorrido, foi decidida a tramitação conjunta de todos os apensos de incidente suscitados pelo progenitor com o incidente deduzido no apenso C), no qual foram incorporados, e que após remessa dos progenitores para a audição técnica especializada foram os mesmos notificados para alegarem em relação a todos os incumprimentos suscitados no apenso C), com vista à simplificação e saneamento processual.
Mais se verifica que, em 19-02-2023 (requerimento com a Ref.ª ...91), a requerida invocou no processo a falta de notificação dos vários requerimentos de início de processo de incumprimento, entretanto incorporados nos autos, entre os quais indicou especificamente o requerimento de início de processo datado de 25-01-2022 (Ref.ª ...89) que contém os documentos agora em causa, suscitando então a anulação de todo o processado com esse fundamento.
Ora, sobre esta questão concreta da relação processual incidiu oportunamente decisão, conforme decorre do despacho proferido em ata, de 23-01-2023, que indeferiu a nulidade suscitada.
Neste enquadramento, cumpre concluir que sobre tal questão incidiu o juízo formulado pelo Tribunal recorrido no despacho proferido em ata, de 23-01-2023, sendo certo que a apelante não interpôs recurso de tal despacho, ficando precludida a possibilidade da sua reapreciação por força da verificação do caso julgado formal, nos termos previstos no artigo 620.º, n.º 1 do CPC.
Como tal, nada mais cumpre determinar a propósito.
Tal como resulta da análise conjugada do disposto nos artigos 639.º e 640.º do CPC, os recursos para a Relação tanto podem envolver matéria de direito como de facto, sendo este último o meio adequado e específico legalmente imposto ao recorrente que pretenda manifestar divergências quanto a concretas questões de facto decididas em sede de sentença final pelo Tribunal que realizou o julgamento, o que implica o ónus de suscitar a revisão da correspondente decisão.
Resulta do disposto no artigo 662.º, n.º 1, do CPC, com a epígrafe Modificabilidade da decisão de facto, que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
Tal como ressalta deste preceito, a reapreciação da decisão proferida sobre determinados pontos da matéria de facto deve ter a mesma amplitude que o julgamento efetuado em 1.ª instância, dispondo para tal a Relação de autonomia decisória de forma a assegurar o duplo grau de jurisdição.
A este propósito, refere Abrantes Geraldes[1]: «(…) sem prejuízo do ónus de impugnação que recai sobre o recorrente e que está concretizado nos termos previstos no art. 640º, quando estejam em causa a impugnação de determinados factos cuja prova tenha sido sustentada em meios de prova submetidos à livre apreciação, a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência».
Relativamente à impugnação referente ao ponto 52., da matéria de facto provada, a apelante sustenta não resultar dos documentos juntos como n.º 4 , n.º 5 e n.º 6 que no dia 20 de dezembro de 2021 a requerida/recorrente se tenha mantido em chamada com o filho por mais de sessenta e cinco minutos - divididos em três chamadas telefónicas distintas - e ainda que o tenha contactado por videochamada, tendo esta durado mais de 20 minutos, pois de tais documentos não resulta qualquer data sobre o histórico de chamadas que permita com segurança concluir que os registo ai inscritos respeitem aos dias alegados pelo requerente/recorrido.
Reapreciada a prova produzida, julgamos que a mesma não é suficiente para considerar assente o facto vertido no impugnado ponto 52., dos factos provados.
Como decorre da motivação da decisão de facto constante da decisão recorrida, a prova do facto em questão baseia-se essencialmente na análise do teor dos fotogramas juntos aos autos pelo requerente/progenitor a 25-01-2022, sendo que as respetivas declarações de parte sobre esta matéria apenas relevam quando vistas em conjugação com o teor de tais documentos e na medida em que forem suficientemente corroboradas por estes.
No âmbito do incidente em que suscitou a questão a que se reporta o facto em apreciação (requerimento apresentado em 25-01-2022, à data autuado como apenso S), o ora recorrido requereu a junção de seis fotogramas, reportando-se o primeiro ao dia 18 de dezembro, enquanto o segundo e o terceiro respeitam ao dia 19 de dezembro, conforme datas neles evidenciadas.
Por seu turno, do fotograma junto como documento 4 resultam dois registos de chamadas referentes a 20 de dezembro. Porém, apenas um desses registos se reporta a chamada recebida da requerida/progenitora (às 20h00), pois o outro corresponde, aparentemente, a chamada que foi efetuada para a mesma (às 20h04 do mesmo dia), sendo certo que em nenhuma delas há qualquer referência ao tempo de duração das respetivas chamadas.
Por último, da análise dos fotogramas juntos como documentos 5 e 6 do aludido requerimento não resulta qualquer referência à(s) data(s) do histórico de chamadas que mencionam, nem deles decorre quaisquer registos de chamadas que perfaçam a duração alegada.
Em conformidade com a ponderação antes efetuada, importa julgar procedente a impugnação da decisão de facto relativamente ao ponto 52., da matéria de facto provada, que passará a integrar o elenco dos factos não provados.
Retomando agora a impugnação dos pontos 50., e 51., dos factos provados, observa-se que a recorrente indica, como meio de prova a atender, o teor dos fotogramas juntos como documentos 1 e 2 com o requerimento apresentado em 25-01-2022, alegando que dos mesmos resulta, quanto ao dia 18 de dezembro de 2021, que a requerida/recorrente tentou contactar o filho dentro do horário fixado para o efeito, sempre infrutiferamente, pois que todas as chamadas foram recusadas e, por tal motivo, insistiu para além daquele horário, tendo a última tentativa ocorrido pelas 21h40m.
Já quanto às tentativas de contacto ocorridas no dia 19 de dezembro de 2021, alega a recorrente que do documento n.º 2 decorre tão só que nesse dia, pelas 11h44, terá a requerida insistido em contactar o menor, com quem não havia conseguido estabelecer contacto no dia anterior, somando-se às seis chamadas constantes do documento 1 esta última, perfazendo o total de sete chamadas, sendo todas elas não atendidas.
Ora, do registo que consta do fotograma junto como documento n.º 1, reportado a 18 de dezembro, resulta que a requerida efetuou seis chamadas para o filho, a última das quais às 21h40.
Porém, conforme também resulta de forma clara do aludido documento, tais chamadas não foram atendidas pelo destinatário, o mesmo sucedendo a todas as chamadas que constam do documento n.º 2, relativo ao dia seguinte (19 de dezembro), do qual consta que a requerida tentou contactar por 12 vezes o filho, sempre sem sucesso, entre chamadas por WhatsApp (5 chamadas) e chamadas telefónicas (7 chamadas).
Como tal, ainda que os meios de prova disponíveis permitam sustentar parte da materialidade vertida nos impugnados pontos 50., e 51., revela-se evidente que os referidos pontos devem reproduzir de forma objetiva os termos que decorrem dos documentos que os suportam, posto resultar dos mesmos que nenhuma das chamadas registadas foi atendida e as referências plasmadas nos factos impugnados não permitem traduzir de forma rigorosa e inequívoca tal circunstância, como se impõe em sede de discriminação dos factos provados.
Nesta medida, atendendo às deficiências detetadas, determina-se a alteração dos impugnados pontos 50., e 51., dos factos provados, que passarão a vigorar com a seguinte redação:
50. «No dia 18 de dezembro de 2021, dia em que CC foi entregue pela mãe ao pai cerca das 12h00, a requerida dirigiu seis chamadas ao filho, todas não atendidas, tendo a última delas ocorrido pelas 21h40».
51. «No dia 19 de dezembro de 2021 a requerida até às 12h00, tentou contactar por 12 vezes o menor, quer por chamada, quer via Whatsapp.
2.2. Reapreciação do mérito da decisão de direito.
Os factos a considerar na apreciação da questão de direito são os que se mostram enunciados em 1.1., supra, com as alterações antes determinadas em relação aos pontos 50., e 51., dos factos provados, e a eliminação do correspondente ponto 52., que passou a integrar o elenco dos factos não provados.
Está em causa na presente apelação a decisão proferida em 30-05-2024 na providência tutelar cível de incumprimento da regulação do exercício das responsabilidades parentais intentada pelo ora apelado contra a apelante, ao abrigo do disposto no artigo 41.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, aprovado pela Lei n.º 141/2015, de 8-09 (RGPTC).
A decisão recorrida começou por enquadrar as questões de natureza jurídica relevantes para o objeto do procedimento, enunciando - e bem - que o processo de incumprimento do regime do exercício de responsabilidades parentais constitui uma instância incidental, tramitada por apenso ao processo principal, o de regulação dessas responsabilidades, destinada à verificação de uma concreta situação de incumprimento culposo ou censurável das obrigações decorrentes de regime do exercício das responsabilidades parentais previamente estabelecido, bem como à realização de diligências tendentes, designadamente, ao seu cumprimento coercivo.
No caso, os autos iniciaram-se com requerimento apresentado pelo ora recorrido, no qual imputava à requerida a violação do regime de convívios do progenitor com o filho, requerendo a intimação da requerida a abster-se de colocar qualquer entrave ao direito de visitas e convívio previsto no regime provisório.
Entretanto foi determinada a tramitação conjunta de todos os apensos incidentais que foram sendo suscitados pelo progenitor, os quais foram incorporados no apenso C).
Na sentença recorrida foi decidido, a título de questão prévia, que o assunto respeitante à necessidade de acompanhamento psicológico, suscitado num dos articulados que foram incorporados, deve ser discutido em processo próprio, e que outros três incidentes respeitam à questão dos convívios do CC com a família paterna, matéria já decidida no âmbito de outro apenso - apenso X -, em face do que se decidiu absolver a requerida da instância quanto aos correspondentes procedimentos, por estarem abrangidos pelo caso julgado.
No que concerne aos restantes incidentes incorporados nos autos, o Tribunal recorrido entendeu que as questões suscitadas nos mesmos se circunscreviam à violação do direito do progenitor à informação e participação nas questões médicas e escolares do menor, bem como à violação do regime convivial do progenitor com o filho, as quais apreciou, acabando por concluir que a requerida praticou atos voluntários, ilícitos e culposos a respeito dos factos 21 a 25., 41., 43 a 46 e 50 a 52., os quais entendeu serem suscetíveis, por si e em conjunto, de levar à conclusão de que a requerida incumpriu o regime do exercício das responsabilidades parentais fixado, o que decretou em conformidade.
Relativamente aos incumprimentos referentes aos factos 21 a 25 (incumprimento do regime de convívios do progenitor com o filho com referência aos dias 22 e 24 de julho de 2021), facto 41 (violação do direito do progenitor à informação e participação nas questões médicas, reportado a três atos médicos realizados em 12 de outubro de 2021) e 43 a 46 (incumprimento do regime de convívios do progenitor com o filho com referência a 13 de novembro de 2021) não subsiste controvérsia, uma vez que tais segmentos do dispositivo da sentença recorrida não se mostram concretamente impugnados no âmbito da presente apelação nem existem razões que levem à sua alteração ou revogação em face da matéria de facto apurada nos autos.
Insurge-se, contudo, a recorrente contra o segmento da decisão que declarou ter incumprido o regime do exercício das responsabilidades parentais, a respeito dos factos 50 a 52., por serem suscetíveis, por si e em conjunto, de consubstanciar a violação de tal regime mediante a prática de atos voluntários, ilícitos e culposos, sustentando a ora apelante que a respetiva atuação não pode ser considerada censurável e/ou geradora de condenação.
Neste contexto, a sentença recorrida entendeu que o conjunto factual enunciado nos pontos 50 a 52., dos factos provados traduzia uma ação voluntária da requerida, ilícita e culposa, conforme decorre do seguinte excerto da respetiva fundamentação:
«(…) Os factos 50 a 52. A situação reporta-se aos dias 18, 19 e 20 de Dezembro de 2021, portanto o início do regime provisório. À data vigorava, para o que ora releva, o seguinte regime (decorrente da alteração do dia 29.11.2021): “Contatos telefónicos: o CC poderá contatar diariamente por videochamada, por um período de 10 minutos, com o progenitor com quem não está, entre as 20:00 e as 21:00 horas.” Os factos, objectivamente considerados, claramente, violam o regime estipulado. Relembre-se que a existência de um período entre o qual devem as comunicações ser feitas e a duração máxima dessas comunicações, no envolvimento fáctio à época, resulta da necessidade de evitar comportamentos desajustados pelo progenitor com quem a criança não está de molde a evitar que este imponha sua presença, mesmo quando não está fisicamente com o filho. Tenha-se em nota que os factos são de Dezembro de 2021, sendo que à data CC tinha 11 anos de idade (hoje tem 14 anos de idade, o que representa uma mudança total em CC - constatado pelo Tribunal quando o ouviu; CC deixou de ser criança e passou a ser um jovem adolescente). Mas mais. Dezembro de 2021 era ainda um período em que a progenitora tinha de se habituar à ideia de CC estar com o pai. Agora, imagine-se: período de Natal, em que CC estava com o pai e a família paterna, e a requerida não se refreia e impõe a sua presença ligando uma e outra vez. Tudo conjugado, não pode deixar de ser um conjunto factual em que uma acção voluntária da requerida, consubstanciadora de ilicitude porque violadora do regime do exercício das responsabilidades parentais legalmente vigente e culposa pois que a requerida podia e deveria ter agido de forma a respeitar o regime estabelecido e não o fez, bem sabendo que estava a violar o por si acordado».
Porém, o quadro fáctico que releva para a subsunção jurídica da causa é sensivelmente diferente daquele que serviu de base à prolação da decisão recorrida, por força das alterações agora decididas em sede de impugnação da matéria de facto, em especial tendo presente que a matéria vertida pelo Tribunal a quo no ponto 52., dos factos provados, não pode ter-se como demonstrada com base na prova produzida.
É certo que persistem as circunstâncias enunciadas nos pontos 50 e 51., dos quais resulta que a requerida/progenitora, nos dias 18 e 19 de dezembro de 2021, dirigiu chamadas ao filho fora do horário estipulado no regime então em vigor para os contactos telefónicos diários com a criança, fixado entre as 20h00 e as 21h00, contudo, o que também resulta dos autos é que nenhuma dessas chamadas foi atendida, circunstância que não pode deixar de ser considerada no âmbito da ponderação da ilicitude e da censurabilidade do comportamento assumido pela progenitora.
Por outro lado, também não resulta da matéria de facto apurada que as primeiras chamadas que a requerida dirigiu ao seu filho no dia 18 de dezembro de 2021 tenham sido efetuadas fora do período estipulado para o efeito, ou seja, entre as 20h00 e as 21h00, pois o que se provou relativamente a essa data foi o seguinte: «No dia 18 de dezembro de 2021, dia em que CC foi entregue pela mãe ao pai cerca das 12h00, a requerida dirigiu seis chamadas ao filho, todas não atendidas, tendo a última delas ocorrido pelas 21h40», o que confere razoabilidade à alegação apresentada pela recorrente a propósito do ocorrido nas aludidas datas: «a requerida/recorrente, tentou contactar o menor dentro do horário fixado para o efeito, sempre infrutiferamente, pois que todas as chamadas foram recusadas e, por tal motivo, insistiu para além daquele horário, tendo a última tentativa ocorrido pelas 21h40m» e que no dia 19 de dezembro terá insistido em contactar o menor, com quem não havia conseguido estabelecer contacto no dia anterior.
Ora, para declarar verificado o incumprimento da regulação das responsabilidades parentais não basta a ocorrência de chamadas dirigidas ao filho fora do horário estipulado no regime então em vigor para os contactos telefónicos diários com a criança, sobretudo quando se constata que as mesmas não foram atendidas e surgem em sequência, sendo ainda necessário a formulação de um juízo objetivo de censura ao comportamento do progenitor em causa.
Como se refere no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10-01-2012[2], «[a] verificação do incumprimento da regulação das responsabilidades parentais exige um comportamento grave e reiterado por parte do progenitor remisso, não bastando uma ou outra falta sem antecedentes nem consequentes, de forma a apurar se ele criou intencionalmente uma situação que permita assacar-lhe um efectivo juízo de censura».
Assim sendo, não podemos concluir pela verificação de uma situação de incumprimento culposo por parte da requerida/mãe relativamente às situações invocadas a respeito dos pontos 50 e 51., dos factos provados, tanto mais que a matéria vertida pelo Tribunal a quo no ponto 52., dos factos provados não pode ter-se como demonstrada com base na prova produzida.
Em suma, quanto ao incumprimento do regime do exercício das responsabilidades parentais imputado à requerida a respeito dos factos 50 a 52., o recurso procede, sendo de revogar, nessa parte, a sentença recorrida.
2.3. Reapreciação da condenação relativa a custas.
A recorrente defende a alteração da condenação sobre as custas por outra que condene o requerente/recorrido e requerida/recorrente na proporção de ¾ e ¼ respetivamente, sustentando que a decisão que a vem condenar em custas na proporção de metade encerra errada aplicação de Direito, desconsiderando aquela que vem sendo a “perseguição judicial” preconizada pelo Requerente/Recorrido, pois que, socorrendo-se da via judicial de forma absolutamente irrefletida, intentou 16 incidentes, alguns deles submetidos com intervalos de segundos, sobre tudo e sobre nada, alguns dos quais, veio repetida a sua factualidade em incidente autónomo, como sucedeu com o Apenso X, sendo que, a Requerida/Recorrente não teve qualquer impulso processual em 10 (dez) dos referidos incidentes, pois que, não apresentou Alegações/Oposição, por não ter sido citada/notificada para o efeito.
Na sentença em referência, e em matéria de custas, foi decidido o seguinte: «(…) Condenar requerente e requerida, na proporção de metade, nas custas do processo».
No que se reporta às regras que disciplinam as questões relativas à determinação dos responsáveis pelas custas e à repartição dessa responsabilidade em função do julgado, que deve constar da decisão que julgue a ação, o incidente ou recurso, importa considerar o artigo 527.º do CPC, enquanto preceito essencial, o qual, com a epígrafe «Regra geral em matéria de custas», estabelece o seguinte:
1 - A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito.
2 - Entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.
3 - No caso de condenação por obrigação solidária, a solidariedade estende-se às custas.
Tal como resulta da regra enunciada no n.º 1 do citado preceito legal, a responsabilidade por custas assenta num critério de causalidade, segundo o qual, as custas devem ser suportadas, em regra, pela parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento, pela parte que tirou proveito do processo.
Neste domínio, esclarece o n.º 2 do citado preceito, entende-se que dá causa às custas a parte vencida, na proporção em que o for.
Tal como decorre do enunciado regime legal, «[o] critério para determinar quem dá causa à acção, incidente ou recurso prescinde, em princípio, de qualquer indagação autónoma: dá-lhe causa quem perde. (…) [n]o caso dos recursos, as custas ficam por conta do recorrido ou do recorrente, conforme o recurso obtenha ou não provimento. (…) [s]e o êxito (procedência ou provimento) for apenas parcial, o encargo das custas é repartido entre ambas as partes, na proporção em que cada uma tenha ficado vencida»[3].
Deste modo, «à responsabilidade pelo pagamento das custas é indiferente a ideia de culpa relativamente à ocorrência do litígio. Culpada ou não pelo facto de o tribunal ser chamado a dirimir um conflito de interesses, é a parte vencida ou, não existindo vencimento, a parte que da acção retira o proveito, que deve suportar os encargos derivados dessa intervenção, sem qualquer gravame que reflicta a maior ou menor quota de responsabilidade pela génese do processo»[4].
Como salienta o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24-02-2015[5], «[q]uer isto dizer que o aludido princípio vale para a generalidade dos processos: paga as custas a parte vencida; paga as custas a parte que embora não tenha ficado vencida, tirou proveito da lide; e suportarão as custas, todos os intervenientes processuais, na proporção do respectivo decaimento (…)».
Na presente apelação está em causa decisão proferida em providência tutelar cível de incumprimento da regulação do exercício das responsabilidades parentais intentada pelo ora apelado contra a apelante, ao abrigo do disposto no artigo 41.º do RGPTC.
O processo de incumprimento do regime do exercício de responsabilidades parentais configura um processo de jurisdição voluntária, nos termos que decorrem do disposto nos artigos 1.º, 3.º, al. c), e 12.º do RGPTC e artigo 989.º do CPC, sendo que, na falta de regulamentação específica sobre esta matéria, mostram-se concretamente aplicáveis as regras gerais em matéria de custas, designadamente a regra geral prevista no artigo 527.º do CPC, o que decorre da aplicação subsidiária das regras de processo civil, com as devidas adaptações, tal como prevê o artigo 33.º, n.º 1 do RGPTC.
Sucede que a natureza do processo em causa torna inoperante o índice do proveito.
Como já assinalámos, o processo de incumprimento do regime do exercício de responsabilidades parentais constitui uma instância incidental, tramitada por apenso ao processo principal, o de regulação dessas responsabilidades, no qual deve o julgador procurar encontrar a solução mais conveniente a uma equitativa composição dos interesses em presença, atendendo ao princípio fundamental que deve nortear todas as decisões sobre esta matéria, que é o do bem-estar e desenvolvimento harmonioso da/o criança/jovem. Tal significa que nele só há um interesse a regular, embora possa haver um conflito de opiniões ou representações acerca do mesmo interesse[6].
Também o índice do vencimento ou da sucumbência surge de difícil aplicação porquanto o processo de incumprimento do regime do exercício de responsabilidades parentais não é um processo de partes que vise solucionar ou compor um conflito de interesses disponíveis.
É certo que o ora recorrido instaurou contra a ora recorrente diversos/sucessivos incidentes de incumprimento das responsabilidades parentais.
Sucede que o Tribunal recorrido, por despacho de 18-02-2022, determinou a tramitação conjunta de todos os apensos de incidente suscitados pelo progenitor com o incidente deduzido no apenso C), no qual foram incorporados, passando a constituir um único processo.
Mais se verifica que no âmbito da tramitação única que veio a ser determinada pelo Tribunal recorrido, este entendeu - e bem - que as questões suscitadas nos mesmos se circunscreviam à violação do direito do progenitor à informação/participação nas questões médicas/escolares do menor, bem como à violação do regime convivial do progenitor com o filho, as quais apreciou, acabando por concluir que a requerida praticou atos voluntários, ilícitos e culposos a respeito dos factos 21 a 25 (incumprimento do regime de convívios do progenitor com o filho com referência aos dias 22 e 24 de julho de 2021), facto 41 (violação do direito do progenitor à informação e participação nas questões médicas, reportado a três atos médicos realizados em 12 de outubro de 2021), 43 a 46 (incumprimento do regime de convívios do progenitor com o filho com referência a 13 de novembro de 2021) e 50 a 52 (incumprimento do regime convivial atinente aos contactos telefónicos), os quais entendeu serem suscetíveis, por si e em conjunto, de levar à conclusão de que a requerida incumpriu o regime do exercício das responsabilidades parentais fixado, o que decretou em conformidade.
Deste modo, considerando a tramitação conjunta de todos os apensos de incidente suscitados pelo progenitor, a delimitação das questões a decidir e o desfecho do procedimento, entendemos que razões de equidade justificam a repartição igualitária das custas por ambos os progenitores, mesmo considerando a alteração agora determinada em sede de apelação, porquanto não se pode concluir que os progenitores tenham decaído em proporção diversa sobre as questões em referência.
Como tal, não existem razões para censurar a solução adotada na decisão impugnada relativamente a custas.
Improcede, assim, nesta parte, a apelação.
IV. Decisão
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a presente apelação e, revogando na mesma medida a sentença recorrida, decidem:
A) revogar a sentença recorrida na parte em que julgou verificado o incumprimento do regime do exercício das responsabilidades parentais imputado à requerida a respeito dos factos 50 e 51 (e anterior 52) relativos ao regime fixado para os contactos à distância/telefónicos;
B) confirmar a sentença recorrida no restante.
Custas da apelação a cargo da recorrente/requerida e do recorrido/requerente, na proporção de metade.
Guimarães, 21 de novembro de 2024
(Acórdão assinado digitalmente)
Paulo Reis (Juiz Desembargador - relator)
Ana Cristina Duarte (Juíza Desembargadora - 1.º adjunto)
Maria dos Anjos Melo Nogueira (Juíza Desembargadora - 2.º adjunto)
[1]Cf. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Coimbra, Almedina, 2013, p. 224. [2] Relatora Maria Cecília Agante, p. 336/09.5TBVPA-B.P1, disponível em www.dgsi.pt. [3]Cf. Lebre de Freitas/Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 3.ª edição, Coimbra, Almedina, 2017, p. 419. [4]Cf. Abrantes Geraldes, Temas Judiciários, I Volume, Coimbra, Almedina, 1998, pgs. 177. [5] Relatora Ana Paula Boularot, p. 116/14.6YLSB, disponível em www.dgsi.pt. [6]Cf. o Ac. TRC de 04-04-2017 (Relator: António Domingos Pires Robalo), p. 94/16.7T8PNH-A.C1, disponível em www.dgsi.pt.