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PRIVAÇÃO DO USO DE VEÍCULO
DANOS
ALUGUER DE VEÍCULO
Sumário
I - A privação da utilização de uma coisa pode gerar danos diversos, isto é, da privação do seu uso, poderão resultar: a) danos emergentes; b) lucros cessantes; c) um dano advindo da mera privação do uso que impossibilita o seu gozo e fruição, independente da verificação de concretos danos emergentes ou lucros cessantes, normalmente designado pelo dano da privação do uso. II – Se o lesado sofreu em consequência da privação do uso um dano concreto, designadamente decorrente do aluguer de um veículo (dano emergente), e prova a efetiva realização de despesas com o aluguer de um veículo de substituição, tem direito à reparação dos gastos que teve por via dessa privação.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:
I. Relatório
AA, melhor identificado nos autos, intentou a presente ação declarativa, sob a forma comum, contra EMP01... – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., melhor identificada nos autos, peticionando, a final, a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia global de €10.205,00, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais.
Alega, para tanto e em síntese que no dia 31 de julho de 2021, pelas 11h30, quando circulava na “Rotunda ...”, no sentido sul/norte, no exercício da sua atividade profissional, com o seu veículo automóvel de passageiros de matrícula TN.... (...), ao qual se encontrava acoplado o reboque de matrícula TX...., sofreu um acidente de viação. Nessas circunstâncias de tempo e lugar, quando se encontrava junto à saída da referida rotunda que dá acesso à cidade ..., ouviu um ruído estridente de um motor de um veículo motorizado e logo de seguida foi embatido na lateral esquerda e frente do para-choques do seu veículo automóvel pelo motociclo de marca ..., modelo ..., de matrícula ..-QZ-.., tripulado por BB, o qual faleceu em consequência das lesões resultantes do acidente, tendo a Ré seguradora assumido a culpa do condutor do motociclo que nela se encontrava segurado.
Mais, alega que o veículo automóvel por si conduzido ficou danificado tendo sido reparado por ordem e a cargo da seguradora e entregue ao Autor no dia 06/10/2021. Acontece que, o referido veículo era utilizado na atividade profissional do Autor, nas viagens entre Portugal e o ... e outros países da europa, pelo que durante o período em que esteve a reparar teve que alugar outro veículo com características idênticas ao seu para exercer a sua atividade económica, tendo suportado o custo de €6.460,00 e o custo de €80,00 de uma vistoria obrigatória ao seu veículo depois de reparado. Aos valores despendidos acresce a quantia de €615,00, a título de adiantamento de honorários.
Alega, ainda, que em consequência direta e necessária do sinistro, sofreu forte perturbação a nível psicológico, tendo inclusive recorrido a apoio na área da psicologia clínica, no que despendeu a quantia de €50,00, dano não patrimonial que deve ser compensado em valor equivalente a €3.000,00.
Regularmente citada, a Ré contestou alegando, em síntese, que o tempo estipulado pela oficina para reparação do veículo foi de 3 dias úteis e que o Autor nunca solicitou um veículo de substituição, nem informou a Ré que exercia a atividade profissional de transporte de pessoas e bens.
Mais, alega que a fatura e recibo relativo ao aluguer do veículo estão emitidos à empresa EMP02..., com um n.º de contribuinte do ... a qual não é parte na presente ação.
Veio a efetivar-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “Pelo exposto, julgo a acção parcialmente procedente e, em consequência: 5.1. Condeno a Ré a pagar ao Autor, a quantia de € 5.890,00 (cinco mil oitocentos e noventa euros), a título de dano patrimoniais, quantia acrescida dos juros de mora à taxa de 4% desde a citação até integral e efectivo pagamento. 5.2. Condeno a Ré a pagar à Autora a quantia de € 3.050,00 (três mil e cinquenta euros), a título de danos não patrimoniais, quantia acrescida de juros de mora a à taxa legal de 4% desde a citação até efectivo e integral pagamento. Custas repartidas entre Autor e Ré, na proporção do decaimento (art.º 527º, nº 1 e 2 do CPC). Registe e notifique.”
Inconformada, apelou a Ré concluindo as suas alegações da seguinte forma:
“1. Entende a Recorrente que não foi produzida prova para suportar a matéria dada como provada no ponto hh), e como tal, deve ser dado como não provado.
2. O ponto hh) foi dado como provado com base na prova documental junta à petição inicial sob os números 10 e 11, que são respetivamente, fatura e recibo emitidos pela empresa EMP03... à empresa EMP02..., ..., ..., e com o número de contribuinte do ....
3. A testemunha CC, Administrativa da EMP03..., residente em ... (depoimento gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 14:34minutos e o seu termo pelas14:56 minutos), prestou declarações nos presentes autos, e referiu que a fatura foi por si emitida com o ....
4. Não se tratam de documentos emitidos em nome do Autor – AA.
5. Com o devido respeito, deve ser dado como não provado o ponto hh) da matéria de facto dada como provada, e deve ser dado como provado o seguinte facto: Durante o período em que o veículo esteve a reparar, a empresa EMP02... contratou com a sociedade “EMP03..., Lda.”, NIPC ...85, com sede na Rua ..., ..., ..., o aluguer de um “minibus”.
6. Entende ainda a recorrida que, face à prova documental junta aos presentes autos pelo Autor e pela Ré, deveriam ter sido dados como provados os pontos 12º e 17º da contestação apresentada pela R.: 12º - O tempo estipulado pela oficina escolhida pelo A. para reparação do veículo era de 3 (três) dias úteis, conforme relatório de quantificação de danos; 17º - A fatura e recibo juntos à petição inicial sob os documentos n.º 10 e 11 estão emitidos à empresa EMP02..., ..., ..., e com o número de contribuinte do ....
7. Quanto ao ponto 12º resulta demonstrado e provado pelo documento Relatório de Peritagem da GEP junto pela R. à contestação, assim como pelas declarações prestadas pelo perito avaliador DD, residente na Rua ..., ..., em ... (depoimento gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 12:02 minutos e o seu termo pelas 12:09 minutos) que refere que o tempo acordado com a oficina escolhida pelo autor foi de 3 dias úteis para reparação do veículo do autor.
8. Quanto ao ponto 17º é confirmado pelos documentos números 10 e 11 juntos à petição inicial que são, respectivamente, fatura e recibo emitidos pela empresa EMP03... à empresa EMP02..., ..., ..., e com o número de contribuinte do ....
9. Assim como pela testemunha CC, Administrativa da EMP03..., residente em ... (depoimento gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 14:34 minutos e o seu termo pelas 14:56 minutos), que prestou declarações nos presentes autos e referiu que a fatura foi por si emitida com o ....
10.Pelo exposto, e face à prova documental junta aos presentes autos e da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento, devem resultar como provados os pontos 12º e 17º, da contestação apresentada pela R..
11.Quanto à condenação da Ré a pagar ao Autor a quantia de €5.890,00 a título de danos patrimoniais - paralisação/privação de uso, entende a recorrente que deve ser revogada a decisão que condena a Recorrente a pagar ao recorrido.
12.Não foi feita prova documental que o NIF ...67 está registado no ... e que pertence ao Autor, motivo pelo qual, na motivação da proferida consta “NIF aparentemente do ...”.
13.Nos presentes autos não foi junta qualquer certidão permanente que demonstre que a empresa EMP02... se encontra devidamente registada no ..., com o NIF indicado, e que o Autor é o seu legal representante.
14.A prova documental referida na motivação da sentença proferida – AUTORIZAÇÃO DE ESTABELECIMENTO DE ACTIVIDADE não refere o número de contribuinte associado à autorização de estabelecimento de actividade, nem sequer refere o nome da empresa EMP02....
15.Conforme mencionado, a fatura e recibo - documentos n.º 10 e 11 da petição inicial, emitidos pela empresa EMP03... no valor de 5.890,00 euros, a título de aluguer de minibus, são emitidas à empresa EMP02..., com o número de contribuinte do ....
16.A supra referida empresa EMP02..., número de contribuinte do ..., não é parte na presente acção, nem se demonstrou e provou, através de prova documental emitida pelas entidades ... que aquela pertence ao aqui A..
17.Não foi feita prova documental que demonstre que o Autor é o legal representante da empresa EMP02....
18.O Autor carece de legitimidade para peticionar o valor referente à fatura e recibo no valor de 5.890€ emitido pela empresa EMP03....
19.Pelo que, deve ser revogada a decisão proferida que condena a recorrente a pagar ao recorrido a quantia de 5.890€ a título de danos patrimoniais.
20.Sem prescindir, o veículo com a matrícula TN.... é uma carrinha ... com capacidade para transportar 9 passageiros.
21.A fatura e recibo juntos à petição inicial sob o documento 10 e 11 referem na descrição que se trata de um aluguer de um minibus, cujo documento único automovel junto pela EMP03... corresponde a um veículo Pesado de passageiros, com a capacidade para 24 passageiros.
22.Como devido respeito, não pode a recorrente ser condenada a suportar o valor de 5.890,00 euros correspondente à fatura e recibo junto à petição inicial sob os documentos 10 e 11 da petição inicial, pois o aluguer do veículo (24 passageiros) não corresponde a um veículo de iguais características ao do Autor (9 passageiros).
23.O contrato n.º ...1 tem data de 06/10/2021 – data que corresponde ao último dia do contrato de aluguer.
24.Não resulta como provado, na matéria de facto, que o Autor esteve privado do uso do seu veículo até ao dia ../../2023.
25.Com o devido respeito, a Ré não pode ser condenada a título de privação de uso até data não concretamente apurada, mas posterior a ../../2021.
26.Face à prova produzida em audiência de julgamento, e porque se entende que não é possível quantificar o dano do Autor em valores certos, o tribunal deverá recorrer à equidade para fixar a indemnização pela privação de uso ao Autor entre o dia do sinistro – ../../2021 e o dia 16/09/2021 (terceiro dia útil após a data de ordem de reparação-pontos bb) a dd) da matéria de facto dada como provada), no valor diário de 25€ euros e nos termos previstos no artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil.
27.Quanto à indemnização fixada ao A. a título de danos não patrimoniais, salvo o devido respeito, entende a ora recorrente que tal montante arbitrado na sentença recorrida se mostra também excessivo e desajustado.
28.Com o devido respeito, face à prova produzida em audiência de julgamento, entende a recorrente que não deve ser atribuída uma indemnização por danos não patrimoniais ao autor.
29.Caso assim não se entende, o montante a título de danos não patrimoniais ao A. deverá fixar-se sempre em valor próximo dos 500,00€ (quinhentos euros) – considerando os factos dados como provados dos pontos JJ) a OO), o sentido das decisões e concreto caso dos autos – quantia essa que já traduz de forma muito expressiva a gravidade do sinistro e que não ofende os valores usualmente arbitrados em situações de gravidade substancialmente superior.
30.A decisão ora posta em crise ofende o preceituado no artigo 496 n.º 1, do Código Civil.
31.Quanto à fixação dos juros de mora à taxa legal em vigor de 4% desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento, com o devido respeito, não pode igualmente a recorrente concordar.
32.A fixação dos juros quanto ao dano moral deve ser fixada a partir da prolação da decisão, e não desde a data da citação, conforme acórdão uniformizador de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de maio de 2002 (Diário da República – I Série-A, 27 de junho de 2002).
33.No caso vertente, entende-se que, caso a indemnização por danos não patrimoniais seja fixada e atualizada no acórdão que venha a ser proferido, os juros de mora contam-se a partir dessa data.
34.Se a indemnização fixada no acórdão recorrido se mantiver, os juros de mora devem contar-se a partir da data da prolação da sentença, por corresponder à decisão atualizadora, excluindo-se sempre a contagem a partir da citação.
35.A decisão ora posta em crise ofende o preceituado no artigo 804º e artigo 805º do Código Civil”.
Pugna a Ré pela integral procedência do recurso e consequentemente pela revogação da sentença recorrida e prolação de acórdão em conformidade com as suas alegações.
O Autor apresentou contra-alegações pugnando pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Delimitação do Objeto do Recurso
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso (artigo 639º do Código de Processo Civil, de ora em diante designado apenas por CPC).
As questões a decidir, tendo em conta o teor das conclusões formuladas pelo Recorrente, são as seguintes:
1 – Saber se houve erro no julgamento da matéria de facto provada;
2 – Saber se deve ser atribuída ao Autor indemnização por danos patrimoniais;
3 - Saber se deve ser alterado o montante indemnizatório fixado em 1ª Instância a título de danos não patrimoniais.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. Os factos Factos considerados provados em Primeira Instância:
a) Há mais de 40 anos, que o Autor se dedica ao transporte de pessoas e bens, como empresário em nome individual, segundo a designação de “EMP02...”.
b) Atividade que desenvolve entre Portugal e o ... e também abrange outros países da Europa.
c) No dia 31 de julho de 2021, pelas 11h30, o Autor, no exercício da sua atividade profissional, circulava com o seu veículo automóvel de passageiros, de matrícula TN.... (...), da marca ..., modelo ..., a que se encontrava acoplado o reboque de matrícula TX...., no qual transportava um veículo automóvel da marca ..., modelo Z 4, e um pequeno veículo de utilização em jardins.
d) Circulava pela via de trânsito da direita da designada “Rotunda ...”, no sentido sul/norte, na Estrada Nacional nº ...3 (ao Km 57,4), localizada em ..., concelho ....
e) O conjunto constituído pelo seu veículo automóvel de passageiros e respetivo reboque perfazia cerca de 14 metros de comprimento e o peso de 6.500 Kg.
f) Na sua retaguarda tinha colocada a placa de sinalização de “veículo longo”.
g) O tempo estava bom e o piso da faixa de rodagem encontrava-se seco e limpo.
h) O Autor imprimia ao seu veículo automóvel velocidade inferior a 30 Km/h.
i) O Autor circulava pela sua mão de trânsito, o mais próximo da berma.
j) E circulava com atenção ao trânsito existente.
k) Quando já se encontrava mesmo junto à saída da referida rotunda que dá acesso à cidade ... (EN ...3), ouviu um ruído estridente de um motor de um veículo motorizado e logo de seguida foi embatido na lateral esquerda e frente do para-choques do seu veículo automóvel.
l) Pelo motociclo da marca ... modelo ..., de matrícula ..-QZ-.., tripulado por BB, residente na Rua ..., ... de polícia, Habitação ...5, ..., ..., que circulava na mesma rotunda, no sentido sul/norte.
m) Imprimindo ao referido motociclo velocidade superior a 100 km/h.
n) E conduzindo sem atender ao trânsito de veículos e peões que se verificava na referida rotunda, designadamente que nela circulava o Autor com o seu veículo automóvel e atrelado.
o) O referido BB pretendendo sair da rotunda pela saída acima referida, que dá acesso à cidade ... pela EN ...3, e encontrando-se a circular na via de trânsito do lado esquerdo, sem que calculasse devidamente a manobra, designadamente que já não tinha espaço, disponível para aceder à dita saída, traçou uma trajetória longitudinal, saindo da via de trânsito da esquerda onde circulava e invadiu a via de trânsito da direita, onde o Autor transitava.
p) Vindo a embater no veículo tripulado pelo Autor, que circulava nas condições descritas, arrancando-lhe a parte lateral esquerda e frente do seu para-choques.
q) O Autor apesar de ter acionado o sistema de travagem do seu veículo automóvel não conseguiu evitar ser colidido pelo motociclo, atenta a forma súbita e inesperada com que este lhe surgiu.
r) Em resultado da dita manobra, o referido BB embateu nas guardas em metal existentes no lado esquerdo da referida saída, acabando por falecer em consequência das lesões daí resultantes.
s) Na sequência do choque provocado pelo motociclo de matrícula ..-QZ-.., o veículo do Autor ficou imobilizado na mesma via de trânsito da rotunda por onde circulava, logo a seguir à saída acima mencionada e após o local onde se produziu o embate.
t) O motociclo ficou imobilizado caído sobre o seu lado esquerdo no início da referida saída.
u) No âmbito do inquérito judicial que foi instaurado pelo Departamento de Investigação e Ação Penal da 1ª Secção de ..., foi determinado o seu arquivamento, por se ter concluído inexistir qualquer responsabilidade do Autor em tal acidente de viação (cfr. cópia do despacho de arquivamento junto como doc. nº 6 com a petição inicial).
w) Entre a Ré Seguradora e o referido BB existia contrato de seguro titulado pela apólice nº ...04, através do qual aquele transferiu para a Ré Seguradora a responsabilidade civil por acidente de viação que envolvesse o identificado motociclo.
v) O veículo automóvel de passageiros de matrícula TN.... é propriedade do Autor que é residente na ..., ..., ....
x) O Autor está habilitado a conduzir o referido veículo, através da carta de condução nº ...41 emitida pelo Instituto de Mobilidade e dos Transportes, categoria B e BE.
y) Como consequência necessária e direta do acidente, o veículo do Autor sofreu danos na parte lateral esquerda e frente do seu veículo, consistentes na danificação do para-choques frontal, longarinas, parte lateral esquerda e dianteira.
z) O veículo foi reparado por ordem e a cargo da Seguradora na sociedade comercial por quotas designada por “EMP04...”, Lda.” NIPC ...50, com sede na Rua ..., ..., ..., que se dedica entre outras atividades à manutenção e reparação de veículos automóveis e motociclos.
aa) A referida reparação traduziu-se na substituição (incluindo trabalhos de desmontagem e montagem), do para-choques da frente e dos respetivos suportes de para-choques, do módulo/travessa da frente, da proteção do degrau do para-choques frontal, da conduta de ar central do para-choques da frente, dos resguardos das cavas das rodas (dianteiras) direita e esquerda, do isolamento do ruído (insonorização) da parte inferior do motor, da sua matrícula, dos grupos óticos da frente esquerda e direita, na pintura do revestimento inferior da grelha de ar, da travessa da frente, do estrutura da frente esquerda, das fachas, e de outras peças da frente dianteira do veículo do Autor.
bb) O veículo automóvel do Autor deu entrada na oficina em 20/08/2021.
cc) A peritagem da Ré foi realizada no dia 23/08/2021.
dd) A ordem de reparação foi dada em 10/09/2021, tendo chegado ao conhecimento da oficina no dia 13/09/2021.
ee) A reparação importou o valor total de € 2.750,85 (dois mil setecentos e cinquenta euros e oitenta e cinco cêntimos).
ff) O referido veículo foi entregue ao Autor reparado em data não concretamente apurada posterior a ../../2021.
gg) Por referência à data do acidente, o Autor utilizava sempre o referido veículo nas viagens realizadas no exercício da sua atividade profissional.
hh) Durante o período em que o veículo esteve a reparar, o Autor contratou com a sociedade “EMP03..., Lda.”, NIPC ...85, com sede na Rua ..., ..., ..., o aluguer de um “minibus”.
ii) O referido aluguer, entre o dia ../../2021 e ../../2021, importou a quantia de € 5.890,00.
jj) Como consequência direta e necessária do sinistro em apreço nos autos, o Autor sofreu forte perturbação ao nível psicológico.
kk) O sinistro afetou-o, além do mais, por ter verificado o falecimento do condutor do motociclo.
ll) A imagem deste acidente, frequentemente, lhe surge na sua mente.
mm) Levando a que tenha crises de ansiedade e dificuldade em conciliar o sono.
nn) Teve que se socorrer de apoio na área da psicologia clínica, tendo despendido a quantia de € 50,00 em consulta dessa especialidade.
oo) Afetação psicológica de que continua a padecer apesar de já ter decorrido mais de 2 anos após o sinistro.
pp) A Ré Seguradora, não obstante as várias interpelações que lhe foram feitas pelo Autor para que liquidasse as despesas que teve que suportar e decorrentes do referido acidente, designadamente com a paralisação do veículo automóvel, apenas liquidou o valor da reparação do veículo.
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Factos considerados não provados em Primeira Instância:
a) O veículo foi disponibilizado ao Autor, depois de reparado, no dia 06/10/2021.
b) Na sequência do acidente dos autos, o Autor teve que pagar a um Centro de Inspeções Automóvel a quantia de € 80,00 pela nova vistoria obrigatória a que o referido veículo automóvel teve que ser sujeito para poder circular novamente.
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3.2. Da modificabilidade da decisão de facto
A Ré veio impugnar a decisão sobre a matéria de facto.
O n.º 5 do artigo 607º do Código de Processo Civil preceitua que o “juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”, o que resulta também do disposto nos artigos 389º, 391º e 396º do Código Civil, respectivamente para a prova pericial, para a prova por inspecção e para a prova testemunhal; desta livre apreciação do juiz o legislador exclui os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, aqueles que só possam ser provados por documentos ou aqueles que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes (2ª parte do referido nº 5 do artigo 607º).
Cumpre realçar que a “livre apreciação da prova” não se traduz obviamente numa “arbitrária apreciação da prova”, pelo que impõe ao juiz que identifique os concretos meios probatórios que serviram para formar a sua convicção, bem como a “menção das razões justificativas da opção pelo Julgador entre os meios de prova de sinal oposto relativos ao mesmo facto” (cfr. Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição, Coimbra Editora, Limitada, 1985, p. 655).
Assim, “(…) o Tribunal ao expressar a sua convicção, deve indicar os fundamentos suficientes que a determinaram, para que através das regras da lógica e da experiência se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento dos factos provados e não provados, permitindo aferir das razões que motivaram o julgador a concluir num sentido ou noutro (…), de modo a possibilitar a reapreciação da respectiva decisão da matéria de facto pelo Tribunal de 2ª Instância” (Ana Luísa Geraldes, Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, Volume I, pág. 591).
De facto, dispõe o n.º 1 do artigo 662º do CPC que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
A impugnação da decisão sobre a matéria de facto é expressamente admitida pelo artigo 640º, n.º 1 do CPC, segundo o qual o recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, os concretos meios de prova, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre essas questões de facto.
O legislador impõe por isso ao recorrente que impugna a decisão relativa à matéria de facto tal ónus de especificar, sob pena de rejeição do recurso.
No caso concreto, a Recorrente cumpriu o ónus de impugnação da matéria de facto, indicando os pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados, o sentido da decisão que em seu entender se impõe e os elementos de prova em que fundamenta o seu dissenso.
Sustenta que houve erro no julgamento da matéria de facto quanto ao facto julgado provado na alínea hh), que entende deve ser julgado não provado, e que devem ainda ser julgados provados os factos por si alegados nos artigos 122º e 17º da petição inicial.
Analisemos então os motivos da discordância da Recorrente. O ponto hh) dos factos provados tem a seguinte redação: “hh) Durante o período em que o veículo esteve a reparar, o Autor contratou com a sociedade “EMP03..., Lda.”, NIPC ...85, com sede na Rua ..., ..., ..., o aluguer de um “minibus”.
Entende a Recorrente que dos documentos juntos à petição inicial sob os números 10 e 11 (fatura e recibo emitidos pela empresa EMP03...) e do depoimento da testemunha CC, resulta não se tratarem de documentos emitidos em nome do Autor, pelo que não pode ser julgada provada a matéria de facto constante do ponto hh), antes devendo ser julgado provado que durante o período em que o veículo esteve a reparar, a empresa EMP02... contratou com a sociedade “EMP03..., Lda.”, NIPC ...85, com sede na Rua ..., ..., ..., o aluguer de um “minibus”.
A este propósito consta da decisão recorrida: “No que respeita aos danos patrimoniais alegados, concretamente aos danos derivados da paralisação e privação do veículo conduzido pelo Autor, importa primeiramente analisar a prova realizada quanto à titularidade do direito que é questionada pela Ré, com a alegação de que a factura/recibo referente ao contrato de aluguer de uma viatura de substituição da sinistrada está emitida a favor da empresa EMP02..., com domicílio no ... e com um número de contribuinte daquele país e que essa empresa não é parte na acção. A este propósito, o Autor esclareceu que se dedica à actividade de transporte de passageiros/mercadorias, enquanto empresário em nome individual e que tem a actividade registada naquele país. Por seu turno, a testemunha EE, filho do Autor, confirmou que o pai tem actividade registada no .... As declarações do Autor e do filho do Autor são confirmadas pelos documentos juntos com a petição inicial, resultando do teor do documento nº 7 respeitante ao certificado de matrícula da viatura TN...., que está registada no ... em nome do Autor. Mais, resulta do documento “autorização de estabelecimento de actividade” que o Autor tem a actividade de transporte de mercadorias registada no ..., como comerciante em nome individual, estando autorizado a exercê-la. Acresce que a factura e recibo relativamente ao aluguer do veículo de substituição estão emitidas a favor da entidade “EMP02...”, com a morada no ... e NIF aparentemente do ... o que se infere da sigla “...” que antecede o número. Da referida prova documental infere-se que o Autor é comerciante em nome individual, assim registado naquele país, actuando sob a designação social de “EMP02...”. Assim, resulta da prova produzida que o Autor exerce a actividade em nome individual, ainda que actuando sobre a denominação de “EMP02....” De tais elementos de prova resultam provados os factos enunciados nas als. a) e b) dos factos provados”.
Vejamos então, começando por referir que não vemos que as declarações prestadas pela testemunha CC e os referidos documentos imponham decisão distinta, pois o que resulta da prova é efetivamente que o Autor exerce a atividade em nome individual, ainda que atuando sobre a denominação de “EMP02...”.
É o que decorre, aliás, dos pontos a) e b) dos factos provados (matéria não impugnada pela Recorrente) onde consta que o Autor há mais de 40 anos se dedica ao transporte de pessoas e bens, como empresário em nome individual, segundo a designação de “EMP02...”, atividade que desenvolve entre Portugal e o ... e também abrange outros países da Europa.
De facto, a denominação pela qual a atividade do Autor, enquanto empresário individual, é conhecida, não atribui a essa designação, em Portugal, qualquer autonomia, não estando em causa uma pessoa coletiva dotada de personalidade jurídica.
Deve, por isso manter-se o ponto hh) dos factos provados, não sendo de julgar provado qualquer outro facto com a redação proposta pela Recorrente.
Quanto aos artigos 12º e 17º da contestação, neles a Recorrente alegou o seguinte: “12º O tempo estipulado pela oficina escolhida pelo A. para reparação do veículo era de 3 (três) dias úteis, conforme relatório de quantificação de danos. 17º A fatura e recibo juntos à petição inicial sob os documentos n.º 10 e 11 estão emitidos à empresa EMP02..., ..., ..., e com o número de contribuinte do ...”.
Relativamente ao facto da fatura e recibo se encontrarem em nome de “EMP02...”, tendo em consideração o já exposto quanto à situação do Autor exercer atividade em nome individual, ainda que atuando sobre a denominação de “EMP02...”, nada releva para a decisão a proferir pelo que a pretensão da Recorrente traduzir-se-ia na prática de um ato inútil.
Relativamente ao tempo estipulado pela oficina de três dias úteis, decorre da própria motivação constante da sentença recorrida que a testemunha FF, responsável pela oficina onde foi reparado o veículo pertencente ao Autor, confirmou que o prazo de reparação foi fixado em 3 dias, tendo esclarecido que respeitou esse prazo, tendo iniciado a reparação somente no dia 28/09/2021 por ter sido necessário encomendar material que não estava disponível em stock na ... e teve que ser pedido para a fábrica, e ter terminado a reparação no dia ../../2021.
Assim, adita-se à matéria de facto o seguinte ponto: “cc-A) O tempo estipulado pela oficina para reparação do veículo foi de 3 (três) dias úteis”.
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3.3. Reapreciação da decisão de mérito da acção
Importa agora apreciar se deve manter-se a decisão jurídica da causa, analisando os demais argumentos invocados pela Recorrente relativamente aos danos patrimoniais decorrentes da privação do uso do veículo e ao valor da indemnização devida a título de danos não patrimoniais.
Sustenta a Recorrente que não é devida a quantia de €5.890,00, fixada a título de danos patrimoniais decorrentes da privação do uso do veículo.
Vejamos.
O princípio geral referente à obrigação de indemnização, o princípio da reconstituição natural, mostra-se consagrado no artigo 562º do Código Civil onde se estabelece que quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação.
Podemos dizer, de uma forma muito simples, que a indemnização se deverá, por isso, traduzir em termos prioritários na reconstituição natural de forma a que o lesado, em termos ideais, possa efetivamente ser colocado na posição em que se encontraria, se não tivesse ocorrido o evento lesivo e danoso.
Assim, a possibilidade de reparar o dano mediante o pagamento de indemnização em dinheiro apenas ocorre quando a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou quando seja excessivamente onerosa para o devedor, assumindo, por isso, caracter excecional ou subsidiário, ainda que na prática se revele normalmente a forma mais usual de indemnizar por força da impossibilidade de reconstituir o estado anterior à lesão.
Revelando-se inviável proceder à reconstituição natural “prevê a lei a atribuição ao lesado de um valor pecuniário que, na balança dos interesses, restabeleça o equilíbrio patrimonial perdido, na medida da diferença entre a situação presente e a que provavelmente existiria (art. 566º, nº 2)” (v. António Santo Abrantes Geraldes, Temas da Responsabilidade Civil, I Volume Indemnização do dano da privação do Uso, 3ª Edição, Almedina, 2007, p. 14).
De salientar ainda que o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão (cfr. artigo 564º do Código Civil), isto é o que correntemente se designa por danos emergentes e lucros cessantes, correspondendo os primeiros aos “prejuízos sofridos, ou seja à diminuição do património (já existente) do lesado” e o segundos “aos ganhos que se frustraram, aos prejuízos que lhe advieram por não ter aumentado, em consequência da lesão, o seu património” (v. Pires de Lima/Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume I, 4ª Edição, Coimbra Editora, p. 579).
De forma singela podemos dizer que os danos emergentes se traduzirão numa desvalorização do património, enquanto os lucros cessantes na sua não valorização; enquanto o dano emergente inclui o prejuízo causado nos bens, ou direitos existentes aquando da lesão, os lucros cessantes compreendem a perda de benefícios que a lesão impediu de auferir e que ainda não tinham existência à data do facto lesivo.
Na presente ação o Autor veio invocar que, em consequência do sinistro, sofreu danos decorrentes da privação do uso do veículo, concretamente decorrentes do aluguer de um veículo enquanto o seu veículo esteve imobilizado até ser reparado.
A privação da utilização de uma coisa pode gerar danos diversos, isto é, da privação do seu uso, poderão resultar:
a) danos emergentes;
b) lucros cessantes;
c) um dano advindo da mera privação do uso que impossibilita o seu gozo e fruição, independente da verificação de concretos danos emergentes ou lucros cessantes, normalmente designado pelo dano da privação do uso.
Só ocorrendo esta última hipótese é que a privação do uso, a impossibilidade do gozo e fruição de uma coisa ou de um bem, constitui em si mesmo um dano autónomo a ser ressarcido dessa forma.
Ou, dito de outra forma, só numa situação em que o lesado não sofreu danos concretos (danos emergentes ou lucros cessantes) tendo apenas ficado impedido da utilização, faz sentido abordar a questão da privação do seu uso como dano autónomo indemnizável (v. neste sentido o Acórdão da Relação de Lisboa de 11/12/2019, Processo n.º 19826/18.2T8LSB.L1-7, Relator Desembargador José Capacete, disponível em www.dgsi.pt).
Se, pelo contrário, o lesado sofreu em consequência da privação danos concretos, designadamente danos emergentes, peticiona uma indemnização a esse título e demonstra tais danos, não se coloca a questão da mera privação do uso como dano autónomo indemnizável.
É o que ocorre no caso dos autos: o Autor veio alegar ter sofrido em consequência do sinistro, e da impossibilidade de utilizar o veículo até à sua reparação, um dano decorrente do aluguer de veículo.
Como bem se afirma na sentença recorrida “mais se justifica a adequada compensação se o veículo é utilizado no exercício de uma atividade económica lucrativa. No caso da sua privação, devem ser ressarcidos os prejuízos efetivos decorrentes da sua imobilização, seja por causa de atividades que deixaram de ser exercidas e auferidas as respetivas receitas, seja porque o lesado teve despesas acrescidas para compensar os prejuízos decorrentes da privação do veículo sinistrado, como é o caso do recurso a um veículo de aluguer para substituir aquele. Em qualquer destes casos terá o lesado o direito de indemnização de acordo com a aplicação direta da teoria da diferença, considerando não apenas os danos emergentes como ainda os lucros cessantes; tratando-se de veículo automóvel de pessoa singular ou de empresa utilizado como instrumento de trabalho ou no exercício de atividade lucrativa”.
No caso sub judice, provou-se que o veículo do Autor ficou imobilizado até à sua reparação.
Sustenta a Recorrente que não pode ser condenada a título de privação de uso até data não concretamente apurada, mas posterior a ../../2021 e que o período a considerar deve ser entre o dia do sinistro – ../../2021 e o dia 16/09/2021.
Vejamos.
Importa precisar que a Ré não foi condenada a pagar uma indemnização “até data não concretamente apurada, mas posterior a ../../2021”, mas apenas o aluguer do veículo no período entre a data do acidente (../../2021) e ../../2021.
Por outro lado, resulta da matéria de facto provada que, o veículo deu entrada na oficina no dia 20/08/2021, a peritagem foi realizada no dia 23/08/2021 e a ordem de reparação foi conhecida da oficina no dia 13/09/2021 e que o veículo foi entregue ao Autor reparado em data não concretamente apurada posterior a ../../2021, tendo sido considerado pelo tribunal a quo que tendo a reparação ficado concluída no dia ../../2021, desde essa data ficou disponível para ser entregue ao Autor.
Mais resultou demonstrado que, por referência à data do acidente, o Autor utilizava sempre o referido veículo nas viagens realizadas no exercício da sua atividade profissional e durante o período em que o veículo esteve a reparar, o Autor contratou com a sociedade “EMP03..., Lda.”, o aluguer de um “minibus”, o que importou, entre o dia ../../2021 e ../../2021, a quantia de €5.890,00.
Resulta, por isso, de forma inequívoca da matéria de facto provada que o Autor, em consequência do acidente, sofreu um dano concreto correspondente ao valor que teve de gastar com o aluguer de um veículo, o qual, em nosso entender, deve ser indemnizado, tal como consta da sentença recorrida desde a data do acidente até ao dia ../../2021 (data em que o veículo ficou reparado), ainda que a reparação não tenha sido imediatamente iniciada quando foi dada a respetiva ordem pela Seguradora, e o período da reparação tenha sido estipulado em três dias úteis, pois que não se apurou que tal tenha ocorrido por qualquer motivo imputável ao Autor (pelo contrário o responsável pela reparação esclareceu ter cumprido o prazo de três dias mas não ter podido inicial logo a reparação por as peças de substituição necessárias não estarem disponíveis em stock, tendo de ser solicitadas à fábrica).
Sustenta ainda a Recorrente que as características do veículo do Autor (9 passageiros), não corresponde às características do veículo que alugou (24 passageiros) e que o veículo foi alugado desde o dia ../../2021 ao dia ../../2023, o que deu origem à fatura e recibo no valor de €5.890,00, não tendo resultado como provado que o Autor esteve privado do uso do seu veículo até ao dia ../../2023.
Porém, a argumentação da Recorrente assenta em premissas que se não mostram corretas, atenta a prova produzida nos autos e a sentença recorrida.
Assim:
- A fatura e recibo a que se refere a Recorrente não são no valor de €5.890,00, mas de €6.460,00;
- O valor do aluguer de €95,00/dia, foi o correspondente a um veículo de 9 lugares;
- O aluguer durou 68 dias, tendo terminado no dia 06/10/2021;
- Pelo tribunal a quo foi considerado apenas o período de 62 dias, até ../../2021.
Aliás decorre expressamente do ponto ii) dos factos provados (matéria não impugnada pela Recorrente) que o aluguer, entre o dia ../../2021 e ../../2021, importou a quantia de €5.890,00.
Conforme consta da sentença recorrida “[a] quantificação do dano é facilmente mensurável, tendo em conta que o Autor alugou um veículo de substituição, com um custo diário de € 95,00/dia, valor que se afigura adequado tendo em conta que estava em causa um veículo de transporte de passageiros com capacidade de 9 lugares (embora o veículo disponibilizado tivesse uma capacidade para 24 lugares, mas que não implicou um custo acrescido em relação ao veículo de 9 lugares) licenciado para o transporte rodoviário internacional de passageiros. Ao Autor assiste o direito de ser ressarcido do custo do aluguer, uma vez que este se tratou de uma despesa acrescida que teve que suportar em virtude da privação do seu veículo, e que Ré está obrigada a indemnizar, ascendendo ao montante de € 5.890,00 (62 dias x € 95,00)”.
Assim, a Ré não foi condenada a pagar o valor peticionado pelo Autor de €6.460,00, constante da fatura e recibo juntos aos autos e referente a um período de aluguer até 06/10/2021, mas o valor de €5.890,00, correspondente a 62 dias (até ../../2021) a um quantitativo diário de €95,00.
Improcede, por isso, e nesta parte o recurso.
*
Entende ainda a Recorrente que a quantia de €3.000,00 arbitrada para compensar os danos não patrimoniais do Autor é excessiva, defendendo que o valor da indemnização seja fixado em valor próximo dos €500,00.
A sentença recorrida foi considerada adequada e equitativa uma compensação no montante de €3.000,00 (três mil euros), com acréscimo do valor da consulta de psicologia, no montante de € 50,00, condenando a Ré a pagar à Autora a quantia de €3.050,00 (três mil e cinquenta euros), a título de danos não patrimoniais.
Vejamos então.
Importa começar por referir que o Autor peticionou, para além do mais, a título de danos patrimoniais, a quantia de €50,00 paga em consulta de psicologia e a título de danos não patrimoniais a quantia de €3.000,00.
Em face da factualidade provada de onde decorre que o Autor se teve de se socorrer de apoio na área da psicologia clínica, tendo despendido a quantia de €50,00 em consulta dessa especialidade.
Tem, pois, o Autor direito a receber a esse título (danos patrimoniais) a quantia de €50,00.
No que toca aos danos não patrimoniais o montante da indemnização será fixado também equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º (artigo 496º n.º 3 do Código Civil).
Estabelece-se, pois, um critério de mera equidade, que deve atender ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e do lesado e às demais circunstâncias do caso, designadamente a gravidade e a extensão da lesão.
Assim, o montante da reparação há-de ser proporcionado à gravidade do dano, devendo ter-se em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida.
Relativamente a estes danos, o prejuízo, na sua materialidade, não desaparece, mas é economicamente compensado ou, pelo menos, contrabalançado: o dinheiro não tem a virtualidade de apagar o dano, mas pode este ser contrabalançado, mediante uma soma capaz de proporcionar prazeres ou satisfações à vítima, que de algum modo atenuem ou, em todo o caso, compensem esse dano (v. Pinto Monteiro, Sobre a Reparação dos Danos Morais, Revista Portuguesa do Dano Corporal, Setembro 1992, n.º 1, 1.º ano, APADAC, p. 20).
Quanto à questão da fixação de indemnização por danos não patrimoniais, relevam no caso concreto e no essencial, os seguintes factos provados:
- Como consequência direta e necessária do sinistro em apreço nos autos, o Autor sofreu forte perturbação ao nível psicológico.
- O sinistro afetou-o, além do mais, por ter verificado o falecimento do condutor do motociclo.
- A imagem deste acidente, frequentemente, lhe surge na sua mente.
- Levando a que tenha crises de ansiedade e dificuldade em conciliar o sono.
- Teve que se socorrer de apoio na área da psicologia clínica.
- Afetação psicológica de que continua a padecer apesar de já ter decorrido mais de 2 anos após o sinistro.
Perante esta factualidade da qual, ainda que não decorram sequelas ao nível físico, decorrem sequelas a nível psicológico e emocional, é de concluir que as mesmas se apresentam relevantes e são, por isso, dignas da tutela do direito; contudo, julgamos mais adequado e equitativo, fixar o montante compensatório do dano não patrimonial na quantia de €2.500,00, valor já reportado à presente data (e, por isso, atualizado nos termos do n.º 2 do artigo 566º do Código Civil), pelo que os juros são apenas devidos a partir da mesma. Procede, por isso, apenas parcialmente, o presente recurso, alterando-se a sentença recorrida para que da mesma passe a constar, a condenação da Ré a pagar ao Autor a quantia de €50,00 paga em consulta de psicologia, a título de danos patrimoniais, acrescida dos juros de mora à taxa de 4% desde a citação até integral e efetivo pagamento e a quantia de €2.500,00 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora a à taxa legal de 4% desde a presente data e até integral pagamento, confirmando-se no mais a sentença recorrida.
As custas do recurso e da ação são da responsabilidade do Autor e da Ré na proporção do respetivo decaimento (artigo 527º do CPC).
***
IV. Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente o recursoe, consequentemente:
1) Em alterar a sentença recorrida e condenar a Ré a pagar ao Autor:
a) a quantia de €50,00 (cinquenta euros) paga em consulta de psicologia, a título de danos patrimoniais acrescida dos juros de mora à taxa de 4% desde a citação até integral e efetivo pagamento;
b) a quantia de €2.500,00 (dois mil e quinhentos euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde a presente data e até integral pagamento;
1) Confirmar, no mais, a sentença recorrida.
As custas do recurso e da ação são da responsabilidade do Autor e da Ré na proporção do respetivo decaimento (artigo 527º do CPC).
Guimarães, 21 de novembro de 2024 Texto elaborado em computador e integralmente revisto pela signatária
Raquel Baptista Tavares (Relatora) António Figueiredo de Almeida (1º Adjunto) José Cravo (2º Adjunto)