RESPONSABILIDADES PARENTAIS
RESIDÊNCIA DA CRIANÇA
DESADEQUAÇÃO DO REGIME DE RESIDÊNCIA ALTERNADA
Sumário


1 - Em Portugal o “superior interesse da criança” é o princípio fundamental que rege as jurisdições de família e menores e, portanto, será este valor que teremos em conta num processo em que está em discussão o destino do um menor, sobrepondo-se o mesmo a quaisquer valores de natureza diferente.
2 – Assim, a fixação pelo Tribunal da residência do filho é efetuada no único e exclusivo interesse deste.
3 - Sendo ambos os pais idóneos para exercer as responsabilidades parentais, mas tendo a criança sido diagnosticada com perturbação do espectro do autismo, encontrando-se bem integrada no agregado familiar da mãe, onde vivem também os avós com quem tem estabelecidos fortes laços de afeto, vivendo num ambiente estável com uma rotina adequada à sua faixa etária e às condicionantes relacionadas com a mencionada perturbação, a fixação do regime de residência alternada seria fator de instabilidade, prejudicial aos interesses da criança.

Texto Integral


Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:

Relatório:
           
AA intentou a presente ACÇÃO DE REGULAÇÃO DO EXERCÍCIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS, em representação do menor de idade BB contra CC, mãe daquele.

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Designada data para a realização da Conferência a que alude o art.º 35.º, n.º 1, do RGPTC, as partes não lograram obter acordo.
Atenta a impossibilidade de consenso e à oposição dos progenitores no recurso à Mediação, determinou-se, nos termos do disposto no artigo 38.º, do RGPTC, a suspensão da conferência, remetendo-se as partes, ao abrigo da alínea b) do aludido preceito legal, para audição técnica especializada (ATE).
Após pedido de prorrogação de prazo, foi apresentado relatório de ATE.
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Não tendo sido obtido acordo as partes foram notificadas para apresentaram alegações e juntarem prova.
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O requerente, ao abrigo do disposto na al. d), do nº 2, do art.º 21º do RGPTC requereu a realização de perícia de psicologia ao BB, a qual foi deferida, tendo em vista aferir: a)- Se face ao diagnóstico de perturbação do espectro do autismo (PEA) do menor BB, as rotinas e estabilidade emocional que este deve ter, exige um acrescido rigor de rotinas que determine/exija a limitação de maior convívio com o progenitor (pai)?; b)- Se, atendendo ao sobredito diagnóstico, um regime de rotinas que determine um menor e limitado convívio entre o menor BB e o seu progenitor (pai) poderá afetar a sua habituação a este e a relação de afeto entre ambos?; c)- Se um maior convívio e contacto entre o menor BB e o progenitor (pai) que, consequentemente, possibilite uma relação afetiva sólida entre ambos, poderá ser mais benéfico ou prejudicial para as necessidades e benefícios do menor, nomeadamente para o seu desenvolvimento e estabilidade emocional?;d)- Se para o equilíbrio emocional, desenvolvimento cognitivo, estabilidade psicomotora e estabilização das rotinas imprescindíveis ao equilíbrio homeostático do menor BB, a manutenção e presença do laço parental mais frequente com o pai se afigura recomendável e desejável?;e)- Se as rotinas, desenvolvimento e estabilidade emocional do menor BB, referidas no ponto anterior, poderão ser alcançadas num regime de responsabilidades parentais com guarda partilhada e residências alternadas.
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Foi solicitada à Segurança Social a elaboração de informação social relativa à situação económica e social dos progenitores.
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Junta a perícia e o relatório social foi designada data para a realização de audiência de discussão e julgamento, a qual teve lugar de acordo com o legal formalismo.
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Foi proferida decisão nos seguintes termos:
             
Pelo exposto, nos termos conjugados dos artigos 1905.º e 1906.º do Código Civil e 40.º do RGPTC, decido regular o exercício das responsabilidades parentais relativo ao menor de idade BB nos seguintes termos:

1.º - O menor ficará à guarda e cuidados da mãe, com ela se fixando a sua residência, cabendo o exercício das responsabilidades parentais, conjuntamente, a ambos os progenitores quanto às questões de particular importância, sendo que, as questões relativas aos atos da vida corrente serão decididas pelo progenitor que estiver com o menor.
2.º- De quinze em quinze dias, o BB passará o fim de semana com o progenitor, desde 6ª feira, no final das atividades escolares, até às 19h30m de domingo, devendo o progenitor levar a cabo a recolha e entrega do menor.
3.º- Na semana subsequente ao fim de semana da progenitora o pai poderá recolher o BB, às quartas-feiras, no final das atividades escolares, pernoitando com ele e entregá-lo-á no dia seguinte, no estabelecimento de ensino no reinício de tais atividades.
4.º- Nos períodos de férias escolares (Natal, Páscoa e Verão) vigorará o seguinte regime:
- O menor passará a semana que antecede a véspera de Natal com um dos progenitores, com quem consoará, devendo ser entregue ao outro progenitor pelas 11h00m horas do dia 25 de dezembro, permanecendo com este até ao início das actividades lectivas, alternando nos anos seguintes.
- No corrente ano de 2024 a véspera de Natal será passada na companhia da mãe e o dia de Natal na companhia do pai.
- Nas férias da Páscoa, o menor passará a semana que antecede o Domingo de Páscoa com um dos progenitores, devendo ser entregue ao outro às 11h00m de segunda-feira de Páscoa, permanecendo com este até ao início das actividades lectivas, alternando nos anos subsequentes.

Sendo que no ano de 2025, o Domingo de Páscoa será passada na companhia do pai, sendo entregue à mãe pelas 11h00m de segunda-feira.
5.º - No período de férias - de infantário e escolares - de verão o menor passará metade das férias com cada progenitor, em períodos nunca superiores a 8 dias consecutivos, a acordar entre ambos até ao dia ../../.... de cada ano civil.
Em caso de desacordo, nos anos pares prevalece a vontade da mãe e em anos ímpares a do pai.
6.º - Sem prejuízo dos horários escolares e de infantário, o menor passará o respectivo dia de aniversário com ambos os progenitores, partilhando uma das refeições principais (almoço e jantar) com cada um deles, a acordar entre ambos.
7.º - O menor passará o dia de aniversário de cada um dos progenitores com o respectivo aniversariante;
8.º - O progenitor pagará a título de pensão de alimentos a quantia de €120,00 mensais a atualizar anualmente, segundo o IPC a publicar pelo INE, a partir de janeiro de 2025.
9.º - As despesas escolares extraordinárias, do início do ano lectivo, relacionadas com a aquisição de livros e de material escolar, as despesas médicas e medicamentosas extraordinárias na parte não comparticipada por qualquer seguro ou pelo Estado, nestas se incluindo as despesas relacionadas com as terapias que o BB frequente, em virtude do TEA que padece, serão suportadas em partes em partes iguais por cada um dos progenitores, devendo o progenitor que as realize enviar cópia dos recibos em nome do menor ao outro progenitor, até ao final de cada mês a que dizem respeito, que terá 15 (quinze) para transferir metade do valor para o IBAN do outro progenitor..”
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Inconformado veio o Progenitor recorrer formulando as seguintes Conclusões:

A. Vem o presente recurso interposto da sentença final, proferida pelo douto Tribunal a quo, na qual fixou, quanto à regulação do exercício das responsabilidades parentais relativo ao menor BB, além do mais, os termos da residência desta criança, o exercício das responsabilidades parentais, bem como o regime de contactos/convívios entre a criança e o progenitor não residente, ora Recorrente, e a obrigação de alimentos deste a favor da criança, conforme fixado no segmento em 1.º, 2.º, 3º., 4º (neste, apenas primeiro e terceiro parágrafo), 5º e 8º, da respetiva decisão inserta no ponto V), da sentença recorrida, cujo, por brevidade e na íntegra, se dá por integralmente reproduzida;
B. Salvo o devido respeito, entende o Recorrente que o Tribunal a quo julgou mal na sentença recorrida, porquanto não se procedeu aí a uma escorreita, cuidada, integral e apreciação objetiva de toda a prova produzida nestes autos, tendo, assim, parte dos factos sido incorretamente julgados e, bem assim, procedido a uma desadequada subsunção jurídica dos factos e respetiva aplicação do Direito atinente;
C. Assim sendo, as questões suscitadas no presente recurso pelo ora Recorrente são as seguintes:
a)- 1ª questão: Impugnação da decisão (de parte) da matéria de facto dada como provada e a não provada;
b)- 2ª questão: Subjunção jurídica do respetiva matéria de facto provada - e a provar - ao Direito aplicável e, consequentemente, saber se, in casu, o regime de responsabilidades parentais de guarda partilhada, com residências alternadas, propugnado pelo Requerente (aqui Recorrente) é o que melhor salvaguarda os superiores interesses do menor.

1ª questão:
D. Entende o Recorrente que deve haver alteração (de parte) da matéria de facto dada como provada e a não provada fixada na sentença recorrida;
E. Assim, a matéria de facto dada como provada que considera incorretamente julgada são os pontos 12º, 13º e 14º da sentença recorrida; e, por sua vez, a do ponto único dos factos não provados;
F. Quanto à reapreciação do facto provado no ponto 12º, o Tribunal a quo deu como assente que: “A progenitora tem total flexibilidade de gerir os seus horários laborais conforme as necessidades do BB.”;
G. Sucede que, resulta da prova produzida que o progenitor (aqui Recorrente) também tem flexibilidade de gerir os seus horários laborais conforme as necessidades do menor BB.
H. Assim, e relativamente a tal factualidade, impõe-se uma reanálise conjugada dos seguintes elementos probatórios:
- doc. nº 3 junto aos autos, em 11/10/2022, com o requerimento de prova, com a referência Citius 13587348;
- doc. Informação sobre Audição Técnica Especializada junto aos autos em 13/09/2022, com a referência Citius 13461418, e a fls._; - doc. Informação Social relativa à Situação Económica e Social do progenitor, ora Recorrente, junta aos autos em 13/06/2023, com a referência Citius 14707983; - da Informação Social relativa à sua Situação Económica e Social do Recorrente (no penúltimo parágrafo da pág. 4, junta aos autos em 13/06/2023, com a referência Citius 14707983, e a fls._),
- depoimento prestado a testemunha do Requerente DD, na sessão de julgamento, do dia 20/11/2023, com início às 11:52 e 12:23;
- do depoimento da testemunha EE, prestado na sessão de julgamento do mesmo dia 20/11/2023, com início às 11:22 e fim 11:51;
- declarações de parte prestadas pelo Requerente (aqui Recorrente), na audiência de julgamento de 19/10/2023, com início às 11:05 a 15:48;
I. Por sua vez, a mãe não beneficia da total flexibilidade de horários para fazer face às necessidades do BB, conforme se entendeu na sentença recorrida, o qual está, inclusivamente, em contradição com os restantes factos provados, designadamente, com os pontos 13, 19 e 20 da referida decisão;
J. Como ainda resulta do depoimento prestado pela testemunha FF, na audiência de julgamento do dia 19/12/2023, com início às 15:46 e fim 15:56;
K. Face ao exposto, a redação do ponto 12º deve ser alterado e, consequentemente, ser dado como provado que:
- Ambos os progenitores têm flexibilidade de gerir os seus horários laborais conforme as necessidades do BB.
L. Quanto à reapreciação do facto provado no ponto 13º, o Tribunal a quo deu aqui como provado que: “É esta quem, com o apoio e retaguarda dos avós maternos e demais família alargada, tem vindo a assegurar maior acompanhamento do BB, no que se refere ao bem-estar e desenvolvimento global do filho.”;
M. Não obstante, na sentença recorrida, não se concretizar que específica prova referida se alicerçou concretamente para formar a sua convicção e dar como provado a redação dada a este ponto 13º ora em análise, de forma a termos conhecimento da lógica do raciocínio seguido pelo Tribunal a quo alicerçantes da sua convicção
N. A prova produzida nestes autos impõe, de forma clara e inequívoca, que se dê como provado que o progenitor, ora Recorrente, também tem vindo a assegurar, de igual medida, com a mãe, o acompanhamento do BB, quanto ao seu bem-estar e desenvolvimento global.
O. Para o efeito, impõe-se uma reapreciação conjugada dos seguintes elementos probatórios: - doc. Informação sobre Audição Técnica Especializada, junta aos autos em 13/09/2022, com a referência Citius 13461418, e a fls._; e - doc. pág. 2 da Informação Social relativa à Situação Económica e Social do progenitor, ora Recorrente, junta aos autos em 13/06/2023, com a referência Citius 14707983, e a fls._.
- doc. Relatório Pericial, junto aos autos em 10/05/2023, com a referência Citius 14545098.
P. Assim sendo, impõe-se alterar o ponto 13º, devendo, consequentemente, dar-se como provado a seguinte redação:
- Ambos os progenitores reúnem as condições globais adequadas para a assegurar o devido acompanhamento do BB, no que se refere ao bem-estar, necessidades básicas e educativas específicas da criança, de forma a salvaguardar a manutenção da boa evolução do seu processo de desenvolvimento global;
Q. Quanto à reapreciação do facto provado no ponto 14º, o Tribunal a quo deu aqui como provado que: “A Mãe evidencia uma preocupação consciente em potenciar o máximo de ferramentas para que BB possa desenvolver-se o mais amplamente, tendo em consideração as suas características fisiológicas.”;
R. Mais uma vez, o Tribunal a quo não concretiza aqui que específicos documentos juntos com os articulados teve em conta e que evidenciam tal preocupação exclusiva da mãe para que, deste modo, possamos ficar cientes da respetiva lógica do raciocínio por ele seguido alicerçante da sua convicção;
S. Sem prescindir, antes de mais, é de referir que não foram juntos aos autos quaisquer documentos com os articulados que pudesse levar a Meritíssima Juíza a quo a chegar à conclusão que tal preocupação exclusiva da mãe;
T. Ademais, importa referir que, desde logo, resulta já inequívoco dos factos provados da sentença recorrida que a aludida preocupação é de ambos progenitores, designadamente dos factos provados em 10º e 11º, dos quais resulta que, a Requerente e Requerida demonstram possuir como seu foco principal o bem-estar do BB, conseguindo, no essencial, adotar estratégias junto do filho, face à perturbação de que padece; e que, têm capacidade de comunicar os assuntos essenciais à vida do filho, designadamente quanto às terapias que frequenta, o pedido para atraso na entrada para o 1ºciclo, nas brincadeiras a adotar e nos estímulos de linguagem a realizar;
U. Como, igualmente, resulta da demais prova produzida, cujo se impõe a sua reapreciação, a saber: – doc. Informação Social relativa à Situação Económica e Social referente ao progenitor, junta aos autos em 13/06/2023, com a referência Citius 14707983, e a fls._; – doc. Informação sobre Audição Técnica Especializada, junta aos autos em 13/06/2023, com a referência Citius 14707983, e a fls._,
- doc. Relatório Pericial, junto aos autos em 10/05/2023, com a referência Citius 14545098, e a fls._.
- quesitos da requerida perícia constantes no ponto IV do requerimento de prova junto aos autos em 11/10/2022, sob a referência Citius 13587348, e a fls._.
- das declarações de parte prestadas pelo Requerente (aqui Recorrente), na audiência de julgamento de 19/10/2023, com início às 11:05 a 15:48;
- do depoimento prestado a testemunha do Requerente DD, na sessão de julgamento, do dia 20/11/2023, com início às 11:52 e 12:23;
- do depoimento da testemunha EE, prestado na sessão de julgamento do mesmo dia 20/11/2023, com início às 11:22 e fim 11:51,
V. Assim sendo, impõe-se também alterar o ponto 14º, devendo, consequentemente, ser dado como provado a seguinte redação:
- Ambos os progenitores evidenciam uma preocupação consciente em potenciar o máximo de ferramentas para que o BB possa desenvolver-se o mais amplamente, tendo em consideração as suas características fisiológicas.
W. Quanto à reapreciação da matéria de facto do ponto único dado como não provado, o Tribunal a quo deu como não provado que: “A requerida, desde a separação do casal, obstaculizou e limitou os convívios entre o pai e o menor BB, não permitindo que ele continuasse a ter uma participação ativa e efetiva na vida do filho.”.
X. Para o efeito, na sentença recorrida, nada se refere quanto à razão de ciência para dar como não provado este ponto.
Y. Contudo, atendendo à prova produzida, resulta claro uma decisão distinta da proferida, cujo, para o efeito, deve-se atender a uma reanálise conjugada dos seguintes elementos probatórios:
- doc. Relatório Pericial junto aos autos em 10/05/2023, com a referência Citius 14545098, e a fls._;
- doc. Informação sobre Audição Técnica Especializada, junta aos autos em 13/09/2022, com a referência Citius 13461418, e a fls._, e, - doc. Informação Social relativa à Situação Económica e Social do progenitor, ora Recorrente, junta aos autos em 13/06/2023, com a referência Citius 14707983, e a fls._;
- declarações de parte prestadas pela progenitora/requerida, na sessão de julgamento do mesmo dia 19/10/2023, com início às 16:27 a 17:48;
Z. Face ao exposto, impõe-se alterar o ponto único do facto dado como não provado, e, assim, se dar como provado que:
- Desde a separação do casal, obstaculizou e limitou os convívios entre o pai e o menor BB, não permitindo que ele continuasse a ter uma participação ativa e efetiva na vida do filho.

2ª questão:
AA. Assim sendo, impunha-se, como se impõe, uma decisão diversa da proferida na sentença recorrida;
BB. Em consequência da matéria de facto provada, nos termos acima pugnados, será forçoso concluir que o regime de residência da criança e o exercício das responsabilidades parentais mais adequado para o caso sub judicie é o de guarda partilhada, com residências alternadas. Se não vejamos:
CC. Pois, desde logo, este regime é o que melhor permite a manutenção de uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, de afeto e qualidade significativas com o menor, promovendo, deste modo, amplas oportunidades de contacto com ambos, e de partilha de responsabilidades, sendo, consequentemente, o que melhor defende os interesses superiores das crianças, e os demais princípios consagrados nos arts. 1906º, nº 5 e 8 do Código Civil, com as alterações introduzidas pela Lei 65/2020, de 4 de novembro, aos quais se deve atender e orientar na fixação da residência do menor;
DD. Neste sentido invoca-se uma das passagens do Comentário Geral nº 14 (2013) do Comité sobre os Direitos da Criança, no qual se pugna a prevenção da separação familiar e preservar a unidade familiar como componentes no sistema de proteção da criança e no qual baseia-se no direito previsto no art. 9º, parágrafo 1, que garante “que a criança não é separada dos seus pais contra a vontade destes”;
EE. Por outro lado, numa perspetiva científica, o princípio do superior interesse da criança atribuiu prevalência nítida à residência alternada sobre a residência única, por melhor acautelar as necessidades da criança;
FF. Por tudo isso, a guarda partilhada do menor, com residências alternadas, é o regime preferencial no quadro do sistema jurídico português e europeu, existindo várias normas jurídicas que apontam nesse sentido, como o Princípio da Inseparabilidade entre Pais e Filhos no art. 9º, § 1º, da Convenção sobre os Direitos da Criança, art. 24º, nº 3, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e art. 36º, nº 6 da Constituição da República Portuguesa, bem como o Princípio da Igualdade dos Progenitores consagrado no art. 18º, nº 1, da Convenção sobre os Direitos da Criança e arts. 13º, 36º, nº 3 e 5 e 68º, nº 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa;
GG. Acresce que, a doutrina também é do mesmo entendimento;
HH. Por fim, no mesmo sentido, têm-se pronunciado a nossa jurisprudência;
II. Posto isto, e face ao enquadramento fáctico pugnado nos presentes autos, é inequívoco que o regime que regime de guarda partilhada do menor, com residências alternadas, é o que melhor salvaguarda os interesses superiores do menor, por permitir promover amplas oportunidades de contacto do menor com ambos os progenitores, beneficiando o desenvolvimento e estabilidade emocional do menor;
JJ. Porquanto, conforme resulta do entendimento técnico- cientifico inserto no referido relatório pericial, no caso em apreço, é possível, além do mais, assegurar as rotinas e previsibilidade do menor, inclusivamente, num regime de guarda partilhada com residência alternada;
KK. E, consequentemente, o regime de guarda partilhada do menor, com residências alternadas, permite reunir as condições globais adequadas para a assegurar o seu bem-estar e necessidades básicas e educativas específicas, salvaguardando-se, assim, a manutenção da boa evolução do seu processo de desenvolvimento global;
LL. Pelo que, mais uma vez, com o devido respeito, resulta que a sobredita decisão, além de contraditória, é ilegal e, sobretudo, profundamente injusta e parece ter sido decidido com base num juízo pré-concebido;
MM. Face ao exposto, o regime de contactos/convívios entre o menor BB e o progenitor não residente, e, bem assim, a prestação de alimentos aí fixado na douta sentença recorrida, deve ser revogado, cujo respetivos termos do segmento da decisão constam em 1º, 2º, 3º, 4º (neste, o primeiro e terceiro parágrafo), 5º e 8º, do segmento do ponto V- Decisão, constante da sentença recorrida;
NN. Porquanto a sobredita decisão viola, nomeadamente, os arts. 1906º, nº 5, 6 e 8 do Código Civil, e o Princípio da Inseparabilidade entre Pais e Filhos no art. 9º, § 1º, da Convenção sobre os Direitos da Criança, art. 24º, nº 3, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e art. 36º, nº 6 da Constituição da República Portuguesa, bem como o Princípio da Igualdade dos Progenitores consagrado no art. 18º, nº 1, da Convenção sobre os Direitos da Criança e arts. 13º, 36º, nº 3 e 5 e 68º, nº 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa;
OO. E, consequentemente, ser proferida a decisão, quanto à regulação do exercício das responsabilidades parentais, de fixar o regime de guarda partilhada, com residências cada um dos progenitores, com contacto a meio da semana com o outro progenitor com quem não está na respetiva semana; com as demais devidas e legais consequências;
PP. Devendo ainda fixar-se o regime de convívio relativo ao Ano Novo, por a sentença nada ter decidido quanto a esta situação.
QQ. Quanto ao mais fixado na sentença recorrida, dever-se-á manter, nomeadamente, quanto ao regime relativo às festividades de Natal e Páscoa, dias de aniversário do menor, dias de aniversário de cada um dos progenitores, despesas extraordinárias, conforme resulta, respetivamente, no primeiro, segundo e quarto parágrafo do ponto 4º, 6º, 7º e 9º do segmento da decisão da página 18 da douta sentença recorrida).

Pelo exposto:
Deve este recurso ser julgado procedente, revogando-se a sentença recorrida, nos termos peticionados nas conclusões que antecedem.
Contudo, Vossas Excelências, Venerandos/as Juízes/as Desembargadores/as, como quer que decidam farão seguramente Justiça!
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A progenitora apresentou contra-alegações, com as seguintes conclusões:

a) - O que o Recorrente, através da impugnação dos pontos 12°, 13° e 14° dos factos provados, pretende que outros factos não elencados na fundamentação da sentença recorrida sejam igualmente dados como provados, factos esses que não foram devidamente alegados nos autos nem possuem suporte probatório suficiente.
b) - No que respeita ao ponto 12, a declaração emitida pela Polícia de Segurança Pública diz-nos que o horário de trabalho do Requerente é rígido, logo não flexível.
c) - O vertido na informação social de 13/06/2024 relativamente ao cumprimento das sessões de terapia, tratamentos e atividades extracurriculares do menor, não passa de uma declaração de intenções por parte do Requerente, não se podendo daí depreender que o mesmo, objetivamente, tenha flexibilidade de horários.
d) - Os depoimentos das testemunhas DD e EE, para além de imprecisos e pouco fundamentados, não são aptos a sustentar a alegada flexibilidade de horários.
e) - A verdade é que do depoimento destas duas testemunhas, resulta precisamente o inverso do alegado pelo Recorrente, isto é, a pouca flexibilidade dos seus horários laborais e as consequências que necessariamente decorrerão para as rotinas do menor.
t) - Veja-se, a este propósito, as respostas dadas por DD e EE quando questionados sobre o modo como o Recorrente, em função do respetivo horário de trabalho, iria gerir a rotina do menor nos dias em que este tem as tardes livres (todas as quintas e sextas-feiras).
g) - Quanto à testemunha DD, ouvido na sessão de 20/11/2023, entre as Ilh52 e as 12h23, a única solução que consegue encontrar passa precisamente pelo recurso aos serviços de ATL que tanto se pretende evitar - dos 00:16:00 aos 00:17:49 minutos.
h) - No mesmo sentido, a testemunha EE também ouvida na sessão de 20/11/2023 entre as llh22 e as llh51, quando aponta como únicas soluções, o recurso aos serviços de ATL ou a manutenção do atual regime, ou seja, continuando a avó materna a ir buscar o menor à escola, com o qual passaria a tarde, onde o progenitor, depois do seu dia de trabalho, o iria buscar dos 00:16:00 aos 00:17:49 minutos.
i) - Os horários de trabalho do Requerente e da Requerida não são equiparáveis em termos de flexibilidade.
j) - A testemunha FF, enfermeira chefe da equipa da Requerida, valorada pelo Tribunal a quo, asseverou que a Requerida tem total flexibilidade de horários, desde que cumpra o objetivo mensal, sendo a mesma quem escolhe o seu horário.
k) - Não existe qualquer contradição entre o ponto 12 dos factos provados e o teor dos pontos 13, 19 e 20.
1) - A Requerida exerce uma atividade profissional e nos períodos em que está a trabalhar é de extrema importância a existência de uma retaguarda familiar, que o Requerente, aliás, não possui.
m) - O teor do ponto 13° consubstancia um facto objetivo que decorre aliás do facto de o menor, desde a separação dos pais, ter continuado a viver com a Requerida e os pais desta.
n) - A questão de saber quem possui condições para assegurar o acompanhamento do menor não faz parte da factualidade constante do ponto 13°. o) - As referências ao relatório pericial e à informação sobre a audição técnica especializada feitas pelo Recorrente dizem respeito às competências e capacidades que os progenitores apresentam, não pondo em causa o preciso facto constante do ponto l30•
p) - Resultou claramente da prova produzida que a Requerida passa mais tempo com o menor, acompanha-o mais, e beneficia de uma retaguarda familiar permanente, pelo que a factualidade do ponto 13° teria necessariamente de ser julgada provada.
q) - Relativamente ao ponto 14°, o Recorrente não põe em causa que a Requerida evidencie uma preocupação consciente em potenciar o máximo de ferramentas para que o menor se possa desenvolver.
r) - A prova na qual o Recorrente se sustenta para impugnar este ponto não alude em concreto à preocupação na potenciação de ferramentas para um desenvolvimento mais amplo do menor.
s) - O simples facto de a Requerida entender que o regime convivial em curso é o que melhor serve o interesse do menor não configura qualquer obstáculo e limite nos termos mencionados no ponto único dos factos não provados.
t) - Não há nos autos qualquer indício de algum comportamento da Requerida que restrinja os contactos do menor com o pai.
u) - Relativamente à questão de direito, todas as referências mencionadas pelo Recorrente são no essencial genéricas não tendo aplicação ao caso concreto em discussão nestes autos.
v) - Nenhum dos acórdãos citados diz respeito a casos de menores portadores de transtorno do espetro do autismo.
w) - A salvaguarda do interesse superior da criança terá de ser alcançada através das circunstâncias concretas de cada caso.
x) - A fixação de um regime de residência alternada será opção desde que se faça um juízo de prognose favorável quanto ao que será a vida do menor, suportada em elementos de facto evidenciados no processo.
y) - A patologia de que o menor padece exige um apoio e acompanhamento acrescidos, para além de uma maior atenção a fatores como a estabilidade e as rotinas.
z) - A Requerida reúne melhores condições para proporcionar uma rede de apoio mais alargada ao menor, assegurando-lhe a estabilidade que o menor necessita.
aa) - O menor já residia na casa dos avós matemos antes da separação dos pais e continuou a aí viver até ao presente.
bb) - A Requerida tem possibilidade de organizar o seu horário perante a rotina e as necessidades específicas do menor.
cc) - Os avós matemos do menor estão aptos a prestar-lhe todos os cuidados e atenção necessárias.
dd) - Além dos avós maternos, existe também uma retaguarda por parte da madrinha e dos primos do menor.
ee) - O Requerente não possui essa retaguarda, pois vive sozinho em ... e o seu núcleo familiar mais próximo reside em ..., só se encontrando com o menor em almoços de fim de semana ou férias.
ff) - Tendo em conta as necessidades particulares do menor, assume igualmente relevância o facto de o mesmo frequentar uma escola situada na zona de residência da mãe.
gg) - A solução constante da douta sentença do Tribunal a quo é aquela que garante ao menor um melhor e mais próximo acompanhamento, que lhe confere, de modo permanente, uma retaguarda familiar alargada permanente, e é a única que assegura a estabilidade que o menor necessita.
hh) - o relatório pericial elaborado nos autos é absolutamente claro quanto à relevância fundamental das rotinas em crianças como o BB.
ii) - Manter rotinas é essencial e quaisquer mudanças a operar devem ser graduais e lentas, sob pena de se desencadear uma desregulação e a criança reagir de forma frustrada.
jj) - A pretensão manifestada pelo Requerente constituiria uma mudança significativa e brusca, ou seja tudo aquilo que é de evitar para o bem desenvolvimento do menor.
kk) - De um momento para o outro as rotinas do menor alterar-se-iam radicalmente e a retaguarda familiar do menor, essencial para a manutenção de tais rotinas, seria fortemente restringida.
11) - A solução adotada pelo Tribunal a quo não só garante a manutenção das rotinas do menor, como também promove mudanças graduais e lentas como defende a perícia realizada nos autos.
mm) - Contrariamente ao que alega o Recorrente, a decisão do Tribunal a quo alarga os contactos do menor com o pai não os limitando.
nn) - O Tribunal a quo, atenta a factual idade provada e considerando a situação específica do menor, tomou uma decisão equilibrada e que salvaguarda, como nenhuma outra, o superior interesse da criança, pelo que deve a mesma ser mantida.

NESTES TERMOS
E nos demais que Vossas Excelências doutamente suprirão será feita
JUSTIÇA
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O MºPº apresentou contra-alegações pedindo a improcedência do recurso.
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Questões a decidir:

- Verificar se devem ser aditados os factos pretendidos pelo Recorrente e se o facto não provado deve ser considerado provado;
- Em qualquer caso, analisar qual o regime das responsabilidades parentais que mais se adequa ao menor.
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Cumpre apreciar e decidir:
A Matéria de Facto fixada na primeira instância é a seguinte:

1.º AA e CC contraíram casamento no dia ../../2014, na ... paroquial de ..., concelho ....
2.º Na constância do casamento, a ../../2016, nasceu BB.
3.º Nos primeiros meses, após o nascimento do menor, o casal viveu em casa do Requerente, sita na Praça ...., ....
4.º Posteriormente, foram residir para casa dos pais da Requerida sita na Travessa ..., freguesia ..., concelho ....
5.º Devido a desentendimentos entre ambos, fruto de divergências que se revelaram inultrapassáveis, no dia 17 de outubro de 2021 o requerente deixou de habitar na casa dos pais da requerida tendo passado a residir na casa referida em 3), cessando em
6.º Após essa data, o BB continuou a viver com a Requerida juntamente com os pais desta, na casa dos avós maternos, sita em ....
7.º Este agregado familiar é composto pela progenitora, CC, GG, avó materna, nascida a ../../1950 e HH, avô materno, nascido a ../../1948.
8.º O menor BB foi diagnosticado com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), apresentando um desenvolvimento global que carece de maior acompanhamento, com dificuldades notórias ao nível da comunicação e alguma agitação motora, próprias do quadro que apresenta.
9.º Apesar de tal perturbação, o BB é uma criança autónoma e com capacidades cognitivas, apresentando significativas e assinaláveis evoluções no seu desenvolvimento comportamental, comunicacional e na interação social, em resultado da sua integração e acompanhamento num plano terapêutico programado para o efeito.
10.º Requerente e Requerida demonstram possuir como seu foco principal o bem-estar do BB, conseguindo, no essencial, adotar estratégias junto do filho, face à perturbação de que padece.
11.º Têm capacidade de comunicar os assuntos essenciais à vida do filho, designadamente quanto às terapias que frequenta, o pedido para atraso na entrada para o 1ºciclo, nas brincadeiras a adotar e nos estímulos de linguagem a realizar.
12.º A progenitora tem total flexibilidade de gerir os seus horários laborais conforme as necessidades do BB.
13.º É esta quem, com o apoio e retaguarda dos avós maternos e demais família alargada, tem vindo a assegurar maior acompanhamento do BB, no que se refere ao bem-estar e desenvolvimento global do filho.
14.º - A Mãe evidencia uma preocupação consciente em potenciar o máximo de ferramentas para que BB possa desenvolver-se o mais amplamente, tendo em consideração as suas características fisiológicas.
15.º O estabelecimento de ensino que o BB frequenta insere-se na zona de residência da mãe.
16.º Entre a residência do Requerente e a residência da Requerida e entre aquela e o meio escolar do menor, distam, sensivelmente, 17 km e 14 km.
17.º A requerida é enfermeira, exercendo funções no Hospital ... em ..., auferindo um rendimento médio/mensal de €1.215.93€.
18.º A avó e avô maternos encontram-se aposentados auferindo, respetivamente, o valor mensal de €440,56 e de €355.88, a título de pensão.
19.º Os avós maternos estão aptos a prestar todos os cuidados e atenção necessários ao BB, tendo disponibilidade para se deslocarem à escola para recolher o neto, para que ele faça a maioria das refeições em casa e permaneça o mínimo tempo em ambiente escolar, após as horas letivas.
20.º A madrinha do BB e primos que residem próximo disponibilizam-se para ir buscá-lo à escola, quando a progenitora não tem possibilidades para tal.
21.º O agregado familiar da mãe reside numa moradia tipo T3, onde o BB dispõe de um jardim.
22.º O pai vive em ... e, quer os seus pais, pessoas de avançada idade, sendo que a mãe é doente e é apoiada pelo pai, quer a sua irmã e cunhado, residem em ....
23.º Estes familiares apenas convivem com o BB em almoços de fim de semana ou férias, chegando a permanecer três semanas sem contactarem com o BB.
24.º O Progenitor exerce funções como Agente da PSP, auferindo como vencimento-base cerca de €1385,99 e suplementos variáveis, em média, de €150,00/mês.
25.º- Reside sozinho num apartamento de sua pertença, de tipo T2, reunindo condições de habitabilidade e conforto, onde a criança dispõe de quarto próprio.
26.º O progenitor apresenta as seguintes despesas médias mensais: Amortização da casa €320,81; Pensão de alimentos €110,00; Seguro de vida €28,99; Seguro multirriscos €12,82; Terapia da fala 114,00€; Condomínio 36,01€ Terapia ocupacional 80,00€; Eletricidade e gás 47,84€; Refeições escolares 4,50€; Água 24,05€; Telemóvel 14,96€ Internet e televisão 25,90€ Transportes (combustível) 150,00€ Ginásio 19,99€; Seguro automóvel (206,92€/ano) 17,24€; Seguro mota (158,36€/ano); 13,20€ Alimentação 250,00€.
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Factos não provados:

- A requerida, desde a separação do casal, obstaculizou e limitou os convívios entre o pai e o menor BB, não permitindo que ele continuasse a ter uma participação ativa e efetiva na vida do filho.
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Apreciando o recurso:

O Recorrente refere pretender a reapreciação dos pontos 12, 13 e 14 dos factos provados por os considerar incorretamente julgados, no entanto, analisando as respetivas alegações, vemos que o que, efetivamente, pretende é aditar a matéria em causa.
Assim, lendo-se no ponto 12 que “A progenitora tem total flexibilidade de gerir os seus horários laborais conforme as necessidades do BB.”, pretende que deste ponto fique a constar que: “Ambos os progenitores têm flexibilidade de gerir os seus horários laborais conforme as necessidades do BB.”
No ponto 13º considerou-se privado que “É esta quem, com o apoio e retaguarda dos avós maternos e demais família alargada, tem vindo a assegurar maior acompanhamento do BB, no que se refere ao bem-estar e desenvolvimento global do filho.”, requerendo o Progenitor que se adite à matéria de facto que “O Progenitor tem vindo a assegurar, de igual medida, como a mãe, o acompanhamento do BB quanto ao seu bem estar e desenvolvimento global.
Relativamente ao ponto 14º refere que a preocupação aí mencionada é de ambos os progenitores e não só da mãe do menor.

Vejamos:
Relativamente a este último ponto, a matéria que se pretende aditar, encontra-se já consignada na matéria de facto, ainda que por outras palavras, nos pontos 10º e 11º dos factos provados sendo, pois, desnecessário proceder ao seu aditamento.

No que concerne ao ponto 12, decorreu do depoimento da testemunha II, primo, amigo e também colega do Requerente/Recorrente, que este é agente da PSP e que trabalha às 2ºS, 4ªs e 6ªs das 9h às 17h, às 3ªs e 5ªs das 9h às 17h30. Em cada mês faz dois “piquetes”, que são dois turnos alargados que podem ser das 17h às 9h do dia seguinte, se coincidirem com um dia de semana e das 21h às 7h, ou das 7h às 21h, se coincidirem com um fim de semana. Estes turnos alargados são comunicados com muita antecedência e há facilidade em trocá-los.  Por vezes, quando é necessário o Requerente acompanhar o menor a terapias, este entra mais cedo e abdica da hora de almoço para conseguir sair mais cedo.

Relativamente à Requerida, a testemunha FF, enfermeira-chefe, que chefia a equipa de enfermagem do hospital de ... onde a mãe do menor está inserida, referiu que dá possibilidade à Requerida de “fazer” o seu horário conforme a sua disponibilidade, tendo em atenção as necessidades do menor BB, nomeadamente para poder acompanhá-lo às terapias. A Requerida tem facilidade de horários. Quase sempre faz os turnos da manhã e faz pouquíssimos turnos da tarde. Dantes não fazia turnos à noite, mas agora já faz, uma vez ou outra. Referiu que a equipa é grande por isso não há problema em escolher os horários mais convenientes. Os turnos têm os seguintes horários: 8h às 14h (turno da manhã); 14h às 20h30h (tarde), 20h às 8h30 (noite).
O que resulta destes depoimentos é que os horários do pai não são flexíveis, embora possa, por vezes, sair do trabalho mais cedo, em circunstâncias especiais. Por outro lado, a mãe do menor pode escolher os dias de trabalho e que horário quer fazer, dos três turnos disponíveis.
Assim, não se pode concluir, como pretende o Requerente que os seus horários também são flexíveis, improcedendo a sua pretensão de alterar o ponto em análise.

Quanto à matéria do ponto 13º, tivemos relativamente ao pai, os depoimentos da testemunha acima referida, seu primo e da testemunha EE, irmã daquele. Destes testemunhos resultou que, embora os primos se visitem, mais na altura do Verão ou alturas festivas, é difícil, devido às circunstâncias da sua vida, prestarem-lhe auxílio no que respeita ao cumprimento das rotinas do BB, tal como ir busca-lo e levá-lo à escola ou às terapias, tendo ambos dito que solução possível nos dias em que o BB sai da escola mais cedo (dois dias por semana sai antes do almoço) seria arranjar um ATL onde a criança pudesse ficar. Estas testemunha referiram que o pai é um pai presente e preocupado, que prepara as refeições do BB e assegura as suas rotinas, quando o menor está a seu cargo. A testemunha EE disse também que dois dias por semana são os avós maternos que vão buscar o BB à escola e que se o menor ficasse com o pai nesses dias, teria de ir para um ATL até que o pai pudesse ir busca-lo. No que respeita à mãe, ouviram-se os depoimentos da mãe da Requerida, GG, de JJ e de KK, primas da mesma. Do depoimento destas testemunhas resultou que o menor, desde pequenino, sempre foi criado junto dos avós, tendo com eles uma relação muito próxima e sendo estes que tomam conta dele nas ausências dos pais, vão buscá-lo à escola, dão-lhe as refeições quando é necessário, sendo que o menino tem restrições alimentares. Duas vezes por semana o BB sai da escola antes do almoço, a conselho das terapeutas e são os avós que tomam conta dele, principalmente a avó que falou do neto com grande desvelo, explicando que o BB é uma criança traquina que requer muita atenção, tem de ter uma alimentação especial, pois não come de tudo e gosta de rotinas. A criança nunca fica no ATL porque as terapeutas o desaconselharam por considerarem que eram horas a mais na escola para uma criança como o BB que é portador de Perturbação do Espetro do Autismo. A mãe do menor vive com os seus pais e assegura as suas rotinas, incluindo levá-lo às terapias quando não está a trabalhar.

Em face destes depoimentos, não é difícil concluir que é a mãe e os pais desta que têm vindo a maioritariamente a assegurar o acompanhamento do BB, pelo que é de manter, no essencial a redação do ponto em causa, eliminando, no entanto, o segmento relativo à “demais família alargada”, já que não se provou que, além dos avós, alguém mais da família da mãe prestasse auxílio nos cuidados ao BB, embora, pelo menos, uma das primas tivesse manifestado disponibilidade para isso. Quanto à matéria respeitante à participação do pai da vida do menor, já consta do ponto 10º que o pai é um pai presente e interessado no bem-estar do seu filho, não se vendo razão para aditar o ponto 13º com matéria semelhante.

No que respeita ao facto não provado, a matéria respetiva não resultou de qualquer da prova produzida, designadamente dos depoimentos das testemunhas indicadas pelo Requerente ou até do depoimento deste.

Improcede, assim, totalmente a alteração da matéria de facto pretendida pelo Recorrente.
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O Direito:

Tendo em conta o objeto do presente recurso, delimitado pelas conclusões das alegações dos Recorrentes, cabe aqui analisar se o regime fixado na sentença recorrida relativo à residência do menor, deve ser alterado, fixando-se a residência alternada.
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No que concerne às responsabilidades parentais relativas à pessoa do filho, dispõe o art.º 1885º n.º 1 do C. Civil que, cabe aos pais, de acordo com as suas possibilidades, promover o desenvolvimento físico, intelectual e moral dos filhos.
Em Portugal o “superior interesse da criança” é o princípio fundamental que rege as jurisdições de família e menores e, portanto, será este valor que teremos em conta num processo em que está em discussão o destino do menor BB, sobrepondo-se o mesmo a quaisquer valores de natureza diferente.
           
Como se refere no Acórdão da Relação do Porto de 7/4/11 (in www.dgsi.pt ), o superior interesse da criança deve estar sempre presente em cada caso concreto e com ele pretende-se assegurar um desenvolvimento harmonioso da criança ou do jovem, tendo em conta as suas necessidades.“
Também internacionalmente tal princípio é reconhecido, como por exemplo no art. 3º, nº 1 da Convenção sobre os direitos da Criança, adotada pelas Nações Unidas em 20 de novembro de 1989 e ratificada por Portugal em 21/9/1990, e no art. 3º da Convenção de Haia relativa ao Rapto Internacional de Crianças, também ratificada pelos dois países (v. https://www.hcch.net/en/instruments/conventions/status-table/?cid=24 ).

No caso, a sentença recorrida estabeleceu que o menor deve residir com a mãe, sem prejuízo do direito ao convívio com o outro progenitor, atentas as especificidades decorrentes de o menor ter Perturbação do Espectro do Autismo, contudo, o progenitor do menor entende que o regime mais adequado é o de residência alternada.
           
Conforme resulta do disposto no nº 5 do art. 1906º do C. Civil, o tribunal determina a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes.
Assim, a fixação pelo Tribunal da residência do filho é efetuada no único e exclusivo interesse deste.
Helena Bolieiro e Paulo Guerra (A Criança e a Família, Uma questão de Direito(s), 2ª ed., pág. 205), citando Clara Sottomayor na obra Exercício do Poder Paternal, relativamente à pessoa do filho após o divórcio ou a separação judicial de pessoas e bens, 2ª ed, pág. 37-62, referem vários critérios de que o juiz se deve socorrer para a determinação desse interesse da criança, entre os quais, a sua idade, o seu grau de desenvolvimento físico e psíquico, a continuidade das relações afetivas da criança, a adaptação da criança ao ambiente extra-familiar de origem (escola, amigos, comunidade, atividades não escolares), os efeitos de uma eventual mudança de residência causados por uma rutura com esse ambiente, a sua preferência (verbalizada ou intuída).
Não se põe em causa a idoneidade e competências de cada um dos pais do menor BB para exercer as responsabilidades parentais (v. arts. 1878º e 1885º do C. Civil), no entanto, o BB encontra-se bem integrado no agregado familiar da mãe, onde vivem também os avós com quem tem estabelecidos fortes laços de afeto desde que nasceu e que apoiam a mãe no cumprimento das rotinas da criança, que vive num ambiente estável, com uma rotina adequada à sua faixa etária e às condicionantes relacionadas com a perturbação de que padece. A alteração do regime respeitante à residência, seria fator de instabilidade, prejudicial aos interesses da criança.

Na verdade, como resulta do relatório de Perícia Psicológica Forense junto aos autos:
“As crianças com espectro de autismo lidam melhor com a previsibilidade e as rotinas por se sentirem mais seguras no dia a dia. Perante a alteração dessas rotinas, pode desencadear-se uma desregulação e expressarem-se de forma mais frustrada. Desta forma manter rotinas é essencial para crianças com estas características. O mesmo contexto, os mesmos locais de passeio, a mesma escola, criando mudanças graduais e lentas para a adaptação até que seja criado um novo quadro de rotinas.”
           
Deste modo, ponderando tudo o que acima foi dito e especialmente o superior interesse do menor BB, entendemos que a solução que melhor salvaguarda o seu desenvolvimento harmonioso físico e psíquico, nomeadamente a sua estabilidade emocional é que o mesmo continue a residir junto da sua mãe, tal como se decidiu na sentença recorrida.
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Relativamente ao pedido do progenitor no sentido de fixar o regime de convívios relativos ao “Ano Novo”, por se entender que, atenta a idade do menor, não faz sentido, para já, regular com quem este passará a passagem de ano, pois estará certamente a dormir, determina-se que o BB passará o primeiro dia de cada ano com o progenitor a quem está confiado nessa data, nos termos do ponto 5º da parte dispositiva da sentença.

Confirma-se, no mais, a sentença recorrida.
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DECISÃO:

Pelo exposto, acorda-se nesta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar parcialmente procedente a apelação, aditando-se o regime de visitas nos seguintes termos:

- O BB passará o primeiro dia de cada ano com o progenitor a quem está confiado nessa data, nos termos do ponto 5º da parte dispositiva da sentença.
Confirma-se, no mais a sentença recorrida.

Custas na proporção de 5/6 pelo Requerente e 1/6 pela Requerida.
           
Guimarães, 21 de novembro de 2024

Alexandra Rolim Mendes
António Beça Pereira
Ana Cristina Duarte