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ADMISSIBILIDADE DO RECURSO
VALOR DA CAUSA E DA SUCUMBÊNCIA
Sumário
I. Nos termos do artº 629º-nº1 do CPC, a admissibilidade do recurso está dependente da verificação cumulativa de um duplo requisito: que a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre; e, que a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade da alçada do tribunal que proferiu a decisão de que se recorre. II. A sucumbência, traduz-se no valor da desvantagem ou decaimento ou rejeição decorrente para o recorrente da decisão impugnada.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:
Nos presentes autos de Apelação em que é apelante a exequente AA, e, apelado/reclamado o executado BB, tendo sido proferido neste TRG despacho a não admitir o recurso de apelação, determinando a devolução dos autos ao Tribunal de 1ª instância, notificadas as partes, veio a apelante apresentar o Requerimento de fls., de 23/9/2024, reclamando para a CONFERÊNCIA do indicado despacho da relatora, nos termos do disposto no artº 652º-nº3 do Código de Processo Civil.
Notificada a parte contrária, nos termos e para os efeitos do artº 652º-nº3, parte final, do CPC, opôs-se à Reclamação.
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O indicado Despacho reclamado, proferido neste TRG, em 9/9/2024, tem o seguinte teor:
AA, exequente nos autos de processo executivo em curso, veio recorrer “da decisão proferida nos autos em 7/5/2024, que indeferiu o requerimento de 25.04.2024, com a referência citius ...72, mas com data de registo no sistema citius em 26.04.2024, referência ...24, concretamente:
a) O pedido de notificação do Banco de Portugal para que informasse a quem pertence o IBAN ...05, para o qual foi transferido, indevidamente, o montante de 1.649,67 euros;
b) Que, apurado a quem pertence o IBAN, se ordenasse a notificação da pessoa/entidade, para que proceda à devolução aos presentes autos da quantia de 1.649,67 euros;
c) e que, após isso, se ordenasse o pagamento do valor de 1.649,67 euros para o IBAN correcto da exequente ...23”,
tendo o recurso vindo a ser admitido por despacho de 13/6/2024, a fls. dos autos, como recurso de apelação, em separado, e efeito meramente devolutivo.
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Nos termos do disposto no art.º 629º-n.º1 do Código de Processo Civil, o recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do Tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse Tribunal, salvo as excepções previstas no nº2 do citado preceito legal, sendo o valor da alçada do Tribunal de 1ª instância, aplicável ao caso dos autos, de € 5.000, nos termos do disposto no artº 24º da LOFTJ, aprovada pela Lei nº 3/99, de 13/1, com a redacção conferida pelo DL nº 303/2007, de 23/10, e artº 31º da Lei nº 52/2008, de 28/8, e, actualmente art.º 44º da LOSJ, na redacção da Lei n.º 62/13, de 26 de Agosto.
Estando a recorribilidade da decisão condicionada à verificação dos pressupostos legais gerais de recorribilidade, nos termos do artº 629º do CPC, designadamente, o valor da causa superior à alçada do Tribunal de que se recorre, e, valor da sucumbência superior a metade do valor da alçada do Tribunal de 1ª instância, tal pressuposto no caso sub judice não se verifica, sendo o valor da sucumbência reportado, como resulta da decisão recorrida a € 1.649,67, quantia esta de valor inferior ao indicado valor legalmente fixado, sendo in casu aplicável a regra geral do nº1 do art.º 629º do Código de Processo Civil, não se mostrando verificadas quaisquer das excepções legalmente previstas á indicada regra, previstas, nomeadamente, nos nº 2 e 3 do citado preceito legal.
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Face ao exposto, e, ao abrigo do disposto nas disposições legais supra referidas, e art.º 652º-n.º1-alínea.b) do Código de Processo Civil, decide-se não admitir o recurso de apelação, determinando a devolução dos autos ao Tribunal de 1ª instância.
Custas pela apelante.
Notifique.
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Notificada veio a Apelante apresentar o Requerimento de fls., de 23/9/2024, nos termos do disposto no artº 652º-nº3, reclamando para a CONFERÊNCIA do Despacho da Relatora, concluindo nos seguintes termos:
1- A presente reclamação tem por objecto a decisão singular que não admitiu o recurso interposto por falta de verificação dos pressupostos legais gerais de recorribilidade, nos termos do art.º 629º do CPC, designadamente por o valor de 1.649,67 euros ser inferior ao valor legalmente fixado, para efeitos de sucumbência.
2- O recurso em causa foi admitido, em primeira instância, por despacho de 13.06.2024, a fls. dos autos, como recurso de apelação, em separado e efeito meramente devolutivo, nos termos do disposto nos artigos 853º, n.º 2, alínea a), 644º, n.º 2, alínea d), 645º, n.º 2 e 647º, n.º 1, todos do CPC, e atribuído ao mesmo o valor da execução, que é de 23.293,40 euros.
3- Assim, entendemos que não se decidiu bem, devendo o valor para efeitos de recurso ser considerado o valor da execução, ou seja, o valor de 23.293,40 euros, tal como entendeu o tribunal de primeira instância, e, nessa medida, deve o recurso interposto ser admitido.
4- No despacho de admissão, o Tribunal de primeira instância indicou como valor para efeitos de recurso o da execução, ou seja, o valor de 23.293,40 euros.
5- Nos termos do art.º 306º, n.º 2, do CPC, compete ao Meríssimo Juiz de 1ª Instância fixar o valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes, valor esse que será a base processual para a possibilidade de admissão de recurso.
6- Ou seja, é ao Tribunal de primeira instância que cabe fixar o valor da causa, estando vedado aos tribunais de recurso a possibilidade de o alterarem.
7- Esse é o entendimento do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça - processo 4255/15.8T8VCT-A.G1.S1, de 08.03.2018, do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo 5468/19.9T8MTS-B.P1.S1 de 22.06.2022, e do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 31.01.2023, processo 479/17.1T8LSB.L1.S1, todos in dgsi.
8- Está vedado ao tribunal de recurso a alteração do valor da causa definido em 1ª Instância, ou seja, não é permitido aos tribunais de recurso as faculdades previstas no art.º 306º do CPC, razão pela qual, sendo o valor para efeitos de recurso o da execução (23.293,40 euros) deve o mesmo ser admitido.
Ainda que assim não se entenda, o que não se concebe:
9- O processo em causa trata-se de uma execução, cujo valor é de 23.293,40 euros, valor superior à alçada do Tribunal de que se recorre.
10- No caso dos autos, não se trata de impugnar uma decisão desfavorável à recorrente no valor de 1.649,67 euros, inexistindo qualquer decisão a reduzir a quantia exequenda naquele montante.
11- Pelo contrário, não há dúvidas que o montante em causa pertence à recorrente, existindo nos autos despacho a determinar a adjudicação do mesmo à recorrente, e, nessa medida, é óbvio que não se pode falar em sucumbência.
12- Conforme decorre da lei, o valor da sucumbência corresponde à determinação da medida em que uma decisão judicial é desfavorável relativamente a uma das partes no processo.
13- In casu, não existe qualquer decisão desfavorável à recorrente no sentido de determinar a redução da quantia exequenda de 23.293,40 euros para 21.643,73 euros (23.293,40 euros – 1.649,67 euros), isto é, inexiste sucumbência.
14- O que se passou foi um lapso na indicação do IBAN da exequente e aquilo que se pediu ao tribunal de primeira instância e, através do presente recurso, o que se pede é que se notifique o Banco de Portugal para que informe a quem pertence o IBAN para quem foi transferido, indevidamente, o montante de 1.649,67 euros,
15- que, apurado a quem pertence o IBAN, se ordene a notificação da pessoa/entidade, para que proceda à devolução aos presentes autos da quantia de 1.649,67 euros,
16- e que, após isso, se ordene o pagamento do valor de 1.649,67 euros para o IBAN correcto da exequente ...23.
17- A entender-se de outro modo, tal representaria uma enorme injustiça para a recorrente, pois que, não obstante a decisão que lhe dá direito ao referido valor penhorado, não o pode receber por falta de colaboração do tribunal, em primeira instância e, agora, pela alegada falta de pressupostos processuais de recorribilidade, o que, salvo melhor entendimento, não se verifica.
18- Assim, não se podendo, in casu, falar-se em sucumbência, deve ser admitido o recurso interposto.
19- A decisão singular proferida violou, por errada interpretação e aplicação, o disposto nos art.ºs 306º e 629º, ambos do CPC.
NESTES TERMOS,
e nos demais de direito aplicáveis, deve a presente reclamação
ser julgada procedente, e, em consequência, admitido o recurso
interposto pela recorrente
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Alegando a Reclamante que “No despacho de admissão, o Tribunal de primeira instância indicou como valor para efeitos de recurso o da execução, ou seja, o valor de 23.293,40 euros, e, nos termos do art.º 306º, n.º 2, do CPC, compete ao Meríssimo Juiz de 1ª Instância fixar o valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes, valor esse que será a base processual para a possibilidade de admissão de recurso, sendo ao Tribunal de primeira instância que cabe fixar o valor da causa, estando vedado aos tribunais de recurso a possibilidade de o alterarem”, como claramente decorre do despacho reclamado, a decisão, por via de aplicação do artº 629º-n.º1 do Código de Processo Civil, atendeu ao valor da sucumbência, sendo esta, in casu, inferior a metade do valor da alçada do Tribunal de 1ª instância, mantendo-se inalterado o valor da causa, nenhuma questão se suscitando relativamente a este.
E, relativamente à sucumbência, traduzindo-se esta, para efeitos da citada norma, no valor da desvantagem ou decaimento ou rejeição decorrente para o recorrente da decisão impugnada, atento o concreto objecto do recurso e decisão do tribunal de 1ªinstância recorrida (decisão proferida nos autos em 7/5/2024, que indeferiu o requerimento de 25.04.2024, com a referência citius ...72, mas com data de registo no sistema citius em 26.04.2024, referência ...24, cfr. supra indicado), tal valor é, expressamente, de € 1.649,67, sendo este o valor a atender para efeitos de admissibilidade do recurso, a qual, nos termos das disposições legais aplicáveis, designadamente do artº 629º-nº1 do CPC, está dependente da verificação cumulativa de um duplo requisito: - que a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre; - que a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade da alçada do tribunal que proferiu a decisão de que se recorre ( v. Ac. STJ de 24/6/2008, P. 08A17136, in www.dgsi.pt).
Consequentemente, se julgando improcedente a reclamação deduzida. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a “Reclamação” deduzida nos termos do art.º 652º-nº3 do Código de Processo Civil, mantendo-se o Despacho Reclamado.
Custas pela requerente.
Guimarães, 21 de Novembro de 2024
( Luísa D. Ramos ) ( Eva Almeida ) ( Joaquim Boavida )