PODER DE GESTÃO E ADEQUAÇÃO PROCESSUAL
DISPENSA DE AUDIÊNCIA PRÉVIA
DEFESA POR IMPUGNAÇÃO
DEFESA POR EXCEÇÃO
Sumário

I - Nas acções de valor não superior a metade da alçada da Relação, o art.º 597º do CPC cabe ao juiz definir os trâmites processuais subsequentes à fase dos articulados. No amplo poder de gestão e adequação processual, norteado pela necessidade e a adequação do acto ao fim do processo, o juiz pode determinar a realização de audiência prévia ou avançar directamente para a audiência final. No caso de dispensar a audiência prévia, não carecer de prévia audição das partes.
II - Se já foi assegurado o contraditório quanto às questões suscitadas e se os fundamentos utilizados para a decisão de mérito não forem diferentes dos já discutidos entre as partes ou dos que as partes já tiveram possibilidade de discutir, o juiz não tem de ouvir as partes sobre a possibilidade de, findos os articulados, proferir decisão de mérito.
III - Há defesa por impugnação quando o réu contradiz os factos alegados pelo autor ou quando nega o efeito jurídico que este pretende extrair de tais factos. E há defesa por excepção quando o réu defende a impossibilidade de ser apreciado o mérito da causa ou quando alega factos que sirvam de causa impeditiva, modificativa ou extintiva do direito do invocado pelo autor, assim conduzindo à improcedência, total ou parcial, da acção, mas por decisão que aprecie o seu mérito; no primeiro caso a excepção é dilatória, no segundo é peremptória.
IV - A defesa por impugnação de facto, seja por simples negação, seja de forma motivada, caracteriza-se por uma incompatibilidade total ou parcial no plano factual. Na defesa por excepção peremptória, não ocorre incompatibilidade no plano factual entre as versões de cada parte, na medida em que se traduz na apresentação pelo réu de uma factualidade distinta da alegada pelo autor que, a par desta, é susceptível de operar uma incompatibilidade de direito, traduzida em efeito impeditivo, modificativo ou extintivo do efeito prático-jurídico pretendido pelo impetrante.
V - A petição dos embargos de executado tem formalmente a estrutura e conteúdo de uma petição da acção declarativa, mas no plano material a oposição consubstancia uma reacção à pretensão executiva, sendo substancialmente uma contestação.
VI - Nos embargos de executado, se na contestação nenhuma excepção foi deduzida quanto à oposição à execução, limitando-se a embargada a apresentar a sua versão, não há lugar à resposta da resposta à excepção deduzida pelo embargante.

Texto Integral

Processo nº 11573/22.7T8PRT-A.P1

Acordam os Juízes da 3.ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto, sendo

Relatora: Anabela Mendes Morais

Primeiro Adjunto: Desembargador António Mendes Coelho

Segunda Adjunta: Desembargadora Ana Paula Amorim

I_ Relatório

Por apenso à acção executiva intentada por AA, veio o Executado BB apresentar oposição à execução e oposição à penhora.

Alegou, em síntese, que:

_ Por requerimento, datado de 04/07/2022 - referência citius 32729504- veio a exequente desistir da instância;

_ Esse Requerimento foi notificado ao executado, por carta apresentada pelo Sr. Agente de Execução, em 07-07-2022, e em 08-07-2022, o Agente de Execução informou os autos que “O mandatário da exequente requereu a extinção da instância contra os executados, nos termos do disposto nos artigos 277.º, alínea d), 283.º e 285.º n.º 2, do CPC” informando que “que se encontram reunidos os pressupostos para a extinção da presente execução” e nesse seguimento notificou as partes do mesmo nos termos do artigo 849.º, n.º 2, do CPC com fundamento no artigo 849.º, nº1, alínea f), do CPC.

_ A exequente exerceu o seu direito de desistir da instância nos termos do artigo 283º, nº1, do CPC, dispondo o artigo 285.º do CPC que “a desistência do pedido extingue o direito que se pretendia fazer valer” (n.º 1) e assim “faz cessar o processo que se instaurara” (n.º 2), pelo que não podia, quatro meses depois, em 21-11-2022, requerer a renovação da instância e a penhora de bens móveis existentes no domicílio da executada, o que deu nota o Sr. Agente de Execução à executada em 22-11-2022 - referência Citius 33950643;

_ A desistência da instância faz cessar o processo, o que é reafirmado ainda na 1ª parte do n.º 1 do artigo 848.º do CPC, estipulando o artigo 291.º do CPC como pode ser declarada a nulidade ou anulabilidade da desistência – através de uma acção própria (n.º 2) e não através de um requerimento sem qualquer fundamento probatório.

_ Tendo a extinção da execução como fundamento a alínea f) do n.º 1 do artigo 849.º do CPC, nos termos do artigo 850.º do CPC, a instância não podia ser renovada.

_ Não podia o Tribunal proferir despacho deferindo a renovação da instância sem antes ter dado a possibilidade do executado sobre o mesmo se pronunciar.

_ O Tribunal decidiu com fundamento na correcção do lapso sem qualquer elemento que demonstre a existência do erro de escrita na peça apresentada ou sequer vicio ou omissões puramente formais de actos praticados, sem permitir que sobre o mesmo o executado tenha a possibilidade de se pronunciar, pelo que é nulo o despacho por violação do principio do contraditório.

_ Invoca a impenhorabilidade dos Subsídios de Natal e de Férias.

Concluiu, pedindo que sejam julgadas procedentes por provadas a oposição à execução e a oposição à penhora e, em consequência, determinada a extinção da execução.

I.1_ Por forma a possibilitar o acompanhamento dos actos praticados nos Embargos, far-se-á uma breve exposição dos actos praticados na acção executiva para pagamento de quantia certa à qual se encontram apensos os presentes embargos

I.1.a_ A acção executiva intentada pela Exequente contra os Executados tem como título executivo a sentença proferida no processo n.º 78043/18.3YIPRT que correu termos pelo Juízo Local Cível do Porto - Juiz 9 e no âmbito da qual foram os segundos condenados, solidariamente, no pagamento da quantia global de €11.275,00, acrescida de juros de mora contados desde a data de citação do último réu até integral pagamento, à taxa legal de 4%.

No requerimento inicial, a Exequente indicou como quantia exequenda, o capital de €11.275,00, acrescido do valor dos juros, calculados no montante de €1.307,77, até à data da propositura da acção.

I.1.b_ No âmbito da acção executiva, pelo Agente de Execução foram expedidas duas cartas, em 28/6/2022, para o Centro Nacional de Pensões, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 779º do Código Processo Civil, para penhora dos abonos, vencimentos, salários ou outros rendimentos periódicos devidos a cada um dos Executado e, ainda, para no prazo de dez dias, declarar qual o vencimento dos executados.

I.1.c._ Por requerimento de 4/7/2022, a Exequente veio desistir da instância com o seguinte fundamento: “uma vez que já corre termos execução contra os executados pelo mesmo crédito”.

I.1.d_ Nessa sequência o Agente de Execução, por carta expedida em 7/7/2022, deu conhecimento ao Centro Nacional de Pensões da perda de interesse na penhora das pensões/vencimentos dos Executados.

I.1.e_ Em 8/7/2022, o Agente de Execução informou que se encontravam reunidos “os pressupostos para a extinção da presente execução”, sendo o fundamentoO mandatário da exequente requereu a extinção da instância contra os executados, nos termos do disposto nos artigos 277.º, al. d), 283.º e 285.º n.º 2, do CPC”; e que ia “dar cumprimento ao disposto no n.º 2 do art.º 849.º do CPC”.

Juntou aos autos cópia da notificação expedida, em 8/7/2022, para o Ilustre Mandatário do Exequente dando conhecimento que “nos termos da alínea f), n.º 1, do art.º 849.º, do C.P.C., a presente execução se encontra extinta”.

Juntou, ainda, aos autos, cópia da carta expedida, em 7/7/2022, para o Executado com o seguinte teor: “vem pelo presente, informar V.ª Ex.ª, que não mantém interesse na penhora do executado BB - NIF ......, NISS ...”.

I.1.f_ Por requerimento de 21/11/2022, a Exequente veio informar “que teve conhecimento que a executada tem bens móveis no seu domicílio, susceptíveis de serem penhorados pelo que requer a renovação da instância com penhora dos bens móveis existentes no domicilio da executada”.

I.1.g _ Dado conhecimento desse requerimento ao Agente de Execução, este informou a Exequente, em 21/11/2022, que “Após analise da v/ comunicação, depreende-se que V.ª Ex.ª pretende a renovação dos autos nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 850.º do C.P.C., tendo em conta que indica bens a penhorar. Porém, o presente processo não poderá ser reaberto nesse sentido, uma vez que, o mesmo foi extinto por desistência, requerida pela exequente. Pelo exposto, caso a desistência dos autos se tenha tratado de um lapso, deve V.ª Ex.ª elaborar requerimento dirigido aos autos expondo a situação e requerendo junto dos mesmos a reabertura do processo.”.

I.1.h_ Por requerimento de 25/11/2022, a Exequente veio invocar ter existido lapso quando desistiu da instância, reiterado por requerimento de 11/1/2023, alegando que:

I.1.i_ Sobre esse requerimento foi proferido, em 9/2/2023, o seguinte despacho:

Atentos os fundamentos invocados, que aqui por economia se dão por integrados, considerando ainda que a “desistência” declarada se referia apenas à instância e não ao pedido, o que sempre permitiria à exequente lançar mão de nova execução exactamente com os mesmos fundamentos, defiro o requerido nos termos dos artigos 6º e 146º do Código de Processo Civil.”.

I.1.j _Na sequência do despacho de 9/2/2023, foi feita nova consulta à base de dados da Segurança Social, tendo sido apurado que a Executada auferia uma pensão mensal no valor de €487,56 e o Executado, uma pensão de €511,04.

I.1.l_ Em 4/4/2023, pelo Agente de Execução foi junto ao processo executivo o “auto de penhora de pensão”, datado de 4/4/2023.

I.1.m._ Constam dos autos a informação obtida junto da Autoridade Tributária e da qual consta o registo de dois veículos automóveis em nome do Executado com o pagamento do último IUC no ano de 2008 e 2006; o reinício da actividade económica em 21/10/2016, na actividade ... – Com. Ret.. Bancas, Feiras, Unid. Móveis, Têxteis, Vest., Calç., Malas; e a apresentação da última declaração de rendimentos no ano de 2018, sendo a “categoria de rendimentos: pensões”.

I.1.n_ Em 4/4/2023, foram expedidas cartas registadas com aviso de recepção para notificação dos Executados e em 27/4/2023, os executados juntaram aos autos cópia do requerimento apresentado na Segurança Social para concessão de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono e dispensa do pagamento de taxa de justiça e de custas.

I.2_ Nos embargos de executado, por despacho de 10/10/2023, foram os mesmos recebidos e determinada a notificação da Exequente para contestar, no prazo de vinte dias - arts 732º, nº 2 do Código de Processo Civil.

I.3_ Em 26/10/2023, a Embargada apresentou contestação.

Por referência à oposição à execução, apresentou defesa por impugnação, alegando, em síntese, que em 21/5/2018, intentou acção executiva para pagamento de quantia certa contra o executado, processo ao qual foi atribuído o nº 12610/18.5T8PRT. Este processo teve nova distribuição com atribuição de um número diferente, passando a correr termos duas execuções contra o mesmo executado tendo por objecto créditos diferentes. Requereu a desistência da instância para que se mantivesse o processo nº12610/18.5T8PRT quando pretendia o prosseguimento da acção judicial com o nº 7833/18.3YIPRT que deu origem ao processo nº 11573/22.7T8PRT.

Pronunciando-se sobre a oposição à penhora, alegou, em síntese, que a penhora da pensão não viola o disposto no artigo 738º do CPC, podendo a pensão de €511,00 ser impenhorável caso inexistam outros rendimentos. Concluiu que o executado deduziu defesa cuja falta de fundamento não devia ignorar. Argumentou, ainda, que das diligências efectuadas resulta, de forma, inequívoca, que os Executados auferiram outros rendimentos; o Executado encontra-se registado como membro de órgão estatutário da sociedade comercial com o NIPC ..., sendo sócio gerente desta sociedade cuja constituição foi promovida em 2022.

Conclui, pugnando pela improcedência da oposição à penhora e dos embargos de executado.

I.4_ Por requerimento de 9/11/2023, a executada CC veio “aderir na integra à oposição à execução e à penhora apresentada nos autos pelo executado BB, a todos os factos alegados, bem como o de direito, excepções e defesa por impugnação, incluindo a prova”.

I.5_ Por requerimento de 9/11/2023, os executados BB e CC apresentaram requerimento, invocando:

_ Atento o facto de não se verificar nenhuma das situações que legitimam a apresentação de um articulado de resposta, a pronúncia quanto a excepções terá lugar na audiência prévia ou, na falta dela, na audiência final, ainda que pela Embargada não tenha sido especificado qualquer excepção;

_ Quanto ao mais alegado pela Embargada, por estar em causa apenas a impugnação dos factos alegados pelos Embargantes ou por não se tratar de factos pessoais dos mesmos, aos quais não pode responder, reiterou o já afirmado no articulado inicial.

_ Pronunciou-se sobre os documentos juntos com a contestação, sob os números 1, 2,3, 4, 5, 6 e 7, impugnando-os.

I.6_ Terminada a fase dos articulados, foi proferido o seguinte despacho, em 30/1/2024:

“Uma vez que o valor da acção não excede metade da alçada da Relação, que não se levanta nos autos nenhuma questão de facto que esteja dependente da produção de prova, e que as questões a apreciar foram já debatidas nos articulados, contêm estes já todos os elementos que permitem conhecer do seu mérito, mostrando-se desnecessária a realização de audiência prévia – art.s 597º, c) e 595º, nº 1 b) do Código de Processo Civil (aprovado pela Lei nº 41/2013 de 26 de Junho), pelo que dispenso a mesma.”.

De seguida, foi proferido saneador-sentença, constando do seu dispositivo:

Pelo exposto, julgo os presentes embargos e oposição à penhora totalmente improcedentes e consequentemente determino o prosseguimento da execução nos seus precisos termos.

Condeno o embargante nas custas do processo, sem prejuízo do apoio judiciário.

Fixo à presente causa o valor de 12 582,77 €.

Registe, notifique e comunique ao Agente de Execução”.

I.7_Inconformados com a decisão, os Executados interpuseram recurso da mesma, formulando as seguintes conclusões:

“1. As nulidades aqui arguidas, quando invocadas nos casos, como o dos autos, em que foi proferido saneador sentença, podem sê-lo nas alegações de recurso, porquanto, como se vem entendendo na jurisprudência e doutrina, estamos perante uma nulidade processual que se traduz na omissão de um acto que a lei prescreve o qual se comunica ao despacho saneador, pelo que a reacção a tal nulidade passa pela interposição de recurso da decisão proferida;

2. Andou mal o Tribunal a quo quando proferiu saneador sentença em 30/01/2024 (ref. Citius 456444432) sem permitir o exercício do contraditório quanto à excepção deduzida pela Exequente, ao arrepio do disposto na alínea a) do artigo 597.º do CPC, pelo que se verifica a omissão do prévio exercício do contraditório, perante uma questão de direito suscitada oficiosamente, a sentença é nula, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC, nulidade que ora se deixa invocada;

Sem prescindir, acresce que,

3.O Tribunal a quo proferiu uma decisão, sem que as partes tivessem sido notificadas para se pronunciarem sobre a pretensão do Tribunal em proferir já uma decisão, como também nem as partes notificadas de tal, e, portanto, coartando o direito ao contraditório das partes;

4.E assim, violou a Meritíssima Juiz a quo as formalidades da Audiência Prévia, prescrita na alínea a) do n.º 1 do artigo 591.º, 593.º do CPC, bem como o Princípio do Contraditório previsto no artigo 3.º n.º 3 do CPC;

5.Foi, portanto, a decisão recorrida, proferida ao arrepio do Princípio do Contraditório, e consubstanciando uma decisão-surpresa, sendo nula;

6.Verificando-se a omissão do prévio exercício do contraditório, a sentença é nula, nos termos do artigo 615.º, n.º 1 d) do CPC, nulidade que ora se deixa invocada;
Sem prescindir, acresce que, a douta decisão proferida quanto à matéria de facto padece de erro na apreciação da prova, e por isso:

7.Deve ser alterada a decisão proferida quanto à matéria de facto a respeito da alínea 6), determinando-se que a mesma passe a constar: 6. Em 07-07-2022 o Sr. Agente de Execução decidiu extinguir a execução «Desistência do pedido, nos termos da alínea d) do artigo 277.º e alínea f) do n.º 1 do artigo 849.º do CPC.», da qual notificou à exequente e ao executado;

8.Tal alteração encontra fundamento na prova documental, concretamente a missiva remetida pelo Sr. Agente de Execução junta nos autos principais com a referência 32773083 pela qual podemos constatar que o Sr. Agente de Execução notificou o executado do fim da execução e que nessa missiva a data indicada é o dia 07;

9. Deve ser alterada a decisão proferida quanto à matéria de facto a respeito da alínea 9), determinando-se que a mesma passe a figurar na íntegra nos factos não provados;

10.Tal alteração encontra fundamento desde logo na própria motivação da sentença onde o Tribunal a quo diz “não podia haver contraditório porque os executados ainda não eram parte”, bem como na prova documental, concretamente podemos verificar no processo principal que no dia 11/01/2023 apenas deu entrada de um requerimento elaborado pelo exequente (ref. Citius 34388375) e somente em 27/04/2023, após a notificação do auto de penhora, é que o executado vem pela primeira vez aos autos com um requerimento através do qual apenas junta o requerimento de apoio judiciário (ref. Citius 35478031);

11. Por fim, deve o facto 14) ser eliminado dos factos provados por se tratar de uma conclusão e não de um facto material concreto ou preciso;

12.Acresce que o mesmo não ter qualquer suporte material e ser contraditório com o desenrolar do processo – na verdade no interregno que mediou entre o auto de penhora e a prolação da sentença, diga-se de Abril de 2023 a Janeiro de 2024, quer os subsídios de férias quer o de natal já foram pagos tendo sido transferido, nesses dois momentos, para o Sr. Agente de Execução o valor que consta do auto de penhora – é que caso assim não fosse seria o Centro de Pensões o responsável pela divida, e que não o é;

Ainda e desta feita quanto à apreciação do direito:

13. Diz ainda a sentença agora em crise que: o embargante não invoca qualquer fundamento de nulidade da decisão em causa e que “Relativamente ao despacho propriamente dito, o embargante não invoca qualquer nulidade”;

14. Sucede que, atento os embargos apresentados, disse o recorrente por duas vezes o seguinte: “28º. Pelo que face à violação do principio do contraditório o referido despacho é nulo.” “39.º Pelo que o despacho proferido é nulo por violação da lei substantiva e processual (artigo 249.º do CC e artigo 146.º do CPC);

15. Tal como decorre da leitura dos embargos o recorrente diz que o despacho é nulo por violação do princípio do contraditório…e fê-lo logo no primeiro acto que teve no processo – nos embargos;

16. Nos termos do n.º 1 do artigo 195.º do CPC: “a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.”;

17. Claramente que a violação do direito ao contraditório influiu directamente na decisão da causa;

18. Por fim, caso se entenda que esteja esgotado o poder jurisdicional, os termos do artigo 613.º, n.º 2 do CPC é lícito ao juiz suprir nulidades, que no caso devia ter sido feito;

19. Face ao exposto, entende a recorrente que se impunha decisão de direito diversa da proferida, no sentido da procedência dos embargos, pelo que se apela a V. Exmos. Desembargadores que seja revogada a sentença a quo;

20. Com a decisão proferida, violou o Tribunal a quo o normativo constante da alínea a) do artigo 597.º, alínea a) do n.º 1 do artigo 591.º, 593.º, artigo 3.º, n.º 1 e n.º 3, artigo 6.º, n.º 1 e artigo 7.º, n.º 1, artigo 195.º, n.º 1, artigo 613.º, n.º 2 CPC e artigo 146.º do todos do CPC e artigo 249.º do CC.”.

I.8_ Não foi apresentada resposta pela Embargada/Recorrida.

I.9_ Por despacho de 23/4/2024, foi admitido o recurso.

I.10_ Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II_ Questões a decidir:

Nos termos dos artigos 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil, são as conclusões das alegações de recurso que estabelecem o thema decidendum do mesmo, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso que resultem dos autos.

Assim, há que apreciar as seguintes questões:

1_ Nulidade do saneador-sentença, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC, com fundamento na não realização da audiência prévia e na violação do princípio do contraditório por ausência de audição das partes prévia à dispensa daquela diligência, consubstanciando o saneador-sentença uma decisão-surpresa.

2_ Nulidade do saneador-sentença, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC, por omissão do prévio exercício do contraditório quanto às excepções deduzidas pela Exequente, ao arrepio do disposto na alínea a) do artigo 597.º do CPC.

3_ Impugnação da matéria de facto considerada assente por referência aos seguintes factos:

i. O facto ínsito na alínea 6) [Em 08-07-2022 o Sr. Agente de Execução decidiu extinguir a execução «Desistência do pedido, nos termos da alínea d) do artigo 277.º e alínea f) do n.º 1 do artigo 849.º do CPC.», que que só notificou à exequente.] deve passar a ter a seguinte redacção: “Em 07-07-2022 o Sr. Agente de Execução decidiu extinguir a execução «Desistência do pedido, nos termos da alínea d) do artigo 277.º e alínea f) do n.º 1 do artigo 849.º do CPC.», da qual notificou à exequente e ao executado”.

ii. O facto ínsito na alínea 9) [9. Em 11-01-2023 os executados responderam a tal requerimento, opondo-se ao mesmo.]: deve ser carreado para os factos não provados.

iii.O facto ínsito na alínea 14) [14.Ainda não há notícia na execução de que tenha sido penhorada qualquer quantia a título de penhora de pensão.]: deve ser eliminado dos factos provados por se tratar de uma conclusão e não de um facto.

4_ Da nulidade do despacho proferido na acção executiva, em 9/272023 com fundamento na violação do princípio do contraditório e da lei substantiva e processual (artigo 249.º do CC e artigo 146.º do CPC).

III_ Fundamentação de facto

Pelo Tribunal a quo foram considerados “assentes com relevo para a decisão”, os seguintes factos:

1. A exequente deu à execução uma sentença proferida em 08/12/2020, pelo Juízo Local Cível do Porto - Juiz 9 no âmbito da Ação Esp. Cump. Obrig. DL269/98 (superior Alçada 1ªInstª) que ali correu termos como processo nº 78043/18.3YIPRT, em que era autora AA e réus CC e BB.

2. Nessa sentença foi decidido: « Nestes termos, julgo a ação parcialmente procedente e, em consequência: - condeno os réus CC BB, solidariamente a pagarem à autora AA a quantia global de 11.275,00 euros (onze mil duzentos e setenta e cinco euros), acrescida dos juros de mora contados desde a data da citação do último réu a ser citado até integral pagamento e contabilizados à taxa legal, que se situa em 4%, - no mais, vão os réus absolvidos do pedido.».

3. A dita sentença transitou em julgado no dia 05/02/2021.

4. No dia 04/07/2022 a exequente remeteu ao processo de execução de que estes embargos dependem um requerimento em que declarava desistir da instância «uma vez que já corre termos execução contra os executados pelo mesmo crédito.»

5. Tal requerimento nunca foi notificado aos executados, que ainda não estavam citados.

6. Em 08-07-2022 o Sr. Agente de Execução decidiu extinguir a execução «Desistência do pedido, nos termos da alínea d) do artigo 277.º e alínea f) do n.º 1 do artigo 849.º do CPC.», que só notificou à exequente.

7. Em 21/11/2022 (REFª: 43933898) a exequente pede a renovação da instância.

8. Em 25/11/2022 (REFª: 43991563) a exequente alega e pede que o requerimento de desistência da instância seja desconsiderado, dizendo que o mesmo se deveu a mero lapso com o nº do processo.

9. Em 11-01-2023 os executados responderam a tal requerimento, opondo-se ao mesmo.

10. No dia 09/02/2023 foi proferido o seguinte despacho: «Atentos os fundamentos invocados, que aqui por economia se dão por integrados, considerando ainda que a “desistência” declarada se referia apenas à instância e não ao pedido, o que sempre permitiria à exequente lançar mão de nova execução exactamente com os mesmos fundamentos, defiro o requerido nos termos dos artigos 6º e 146º do Código de Processo Civil.»

11. O embargante foi notificado após penhora (art. 626º) em 10/04/2023.

12. No dia 2023 / 04 / 04 o Sr. Agente de Execução procedeu à penhora da pensão do executado nos seguintes termos «Parte da pensão mensal auferida pelo executado, atribuída pelo Centro Nacional de Pensões, ficando esta entidade responsável pelos descontos e entregas a efetuar ao AE, sempre que á penhora houver lugar.».

13. À data da notificação para penhora, o executado auferia uma pensão de velhice no valor de 511,04€.

14. Ainda não há notícia na execução de que tenha sido penhorada qualquer quantia a título de penhora de pensão.

15. Após requerimento, foi concedido ao executado apoio judiciário na modalidade da nomeação de patrono, que foi nomeado em 07/09/2023.

16. Os presentes embargos foram deduzidos em 03/10/2023.”.

IV_ Fundamentação de Direito

1ª Questão

Invocam os Recorrentes a nulidade do saneador-sentença, nos termos do artigo 615.º, n.º 1 d), do CPC, por (i) as partes não terem sido notificadas para se pronunciarem sobre a dispensa de audiência prévia e/ou sobre a discussão do mérito da causa, coartando o direito ao contraditório o que consubstancia uma decisão-surpresa (artigo 3.º, n.º 3 do CPC); e (ii) por violação da alínea a) do n.º 1 do artigo 591.º do CPC, ao não ter sido realizada a audiência prévia.

Advogam, ainda, que o actual Código de Processo Civil, no artigo 591.º, veio estabelecer a regra da realização da audiência prévia, pelo que esta diligência só pode ser dispensada nos casos em que a lei o admite expressamente e no uso da faculdade da gestão processual, caso em que deve ser sempre respeitado o princípio do contraditório (artigos 6.º, nº 1, e 547.º do CPC).

Os preceitos seguintes são os que se ocupam das excepções àquele princípio geral, quer elencando os casos em que pura e simplesmente a audiência prévia não tem lugar (592.º), quer definindo os casos em que a audiência prévia pode ser dispensada (593.º). Em todas as demais situações a lei prevê a audiência prévia, pelo que em regra a mesma deve ser realizada só podendo deixar de o ser nos casos em que a própria lei permite a sua dispensa (artigo 593.º).

O conhecimento do mérito da causa está incluído na alínea b) do artigo 591º do CPC, não podendo, por isso, ser a audiência prévia em tal caso dispensada como fez o Tribunal a quo, citando em apoio da posição por si defendida o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 15-12-2021, proferido no processo nº 2577/20.5T88AGD-A.P1; os Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 09-10-2014, de 05-05-2015, de 08-02-2018 e de 20-12-2018, proferidos no processo nº 2164/12.1TVLSB.L1, no processo nº1386/13.2TBALQ.L1-7, no processo nº3054-17.7T8LSB-A.L1-6 e no processo nº11749/17.9T8LSB.L1-7, respectivamente; o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 10-05-2018, proferido no processo nº 239/15.5T8ENT-A.E1; e o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17-01-2019, proferido no processo nº4833/15.5T8GMR-A.

Concluem que pretendendo conhecer do mérito da causa, o Tribunal a quo devia proporcionar às partes a discussão dessa decisão, bem como a possibilidade de carrear para os autos os elementos necessários para a sua efectivação ou não.

A questão suscitada pelos Recorrentes consiste em saber se o Tribunal a quo podia dispensar a realização da audiência prévia e podendo fazê-lo, se essa decisão tinha de ser precedida do cumprimento do princípio do contraditório, conferido às partes a oportunidade para se pronunciarem sobre a dispensa de audiência prévia e/ou sobre a discussão do mérito da causa.

Importa, no entanto, apreciar e decidir se a nulidade invocada podia ser suscitada por via recursiva ou se devia ser objecto de reclamação perante o tribunal onde o vício se consumou e se foi tempestivamente arguida.

A preterição do direito ao exercício do contraditório tem motivado soluções distintas quanto à sua natureza e regime de arguição.

Uma posição defende que se trata de uma nulidade da sentença por excesso de pronúncia, impugnável por via recursiva. Para esta posição, a “nulidade processual traduzida na omissão de um acto que a lei prescreve (…) comunica[-se] ao despacho saneador, de modo que a reacção da parte vencida passa pela interposição de recurso da decisão proferida em cujos fundamentos se integre a arguição da nulidade da decisão por excesso de pronúncia, nos termos do art. 615º, nº 1, al. d), in fine, do CPC.” [1].

Escreve António Santos Abrantes Geraldes[2] «sempre que o juiz, ao proferir a decisão, se abstenha de apreciar uma situação irregular ou omita uma formalidade imposta por lei, a parte interessada deve reagir através da interposição de recurso sustentado na nulidade da própria decisão, nos termos do artº 615 nº1 d). Afinal, designadamente quando a sentença traduza para a parte uma verdadeira decisão-surpresa (não precedida do contraditório imposto pelo art. 3º, nº 3), a mesma nem sequer dispôs da possibilidade de arguir a nulidade processual correspondente à omissão do acto, pelo que o recurso constitui a via ajustada a recompor a situação, integrando-se no seu objeto a arguição daquela nulidade.”.

Refere Miguel Teixeira de Sousa[3], em comentário ao Acórdão de 2/12/2019, proferido por esta Relação, no processo nº14227/19.8T8PRT.P1, “[o] vício decorrente da falta da audição prévia das partes é - como é indiscutível e indiscutido - o proferimento de uma decisão-surpresa; há, assim, uma decisão-surpresa, mas não uma "nulidade-surpresa"; basta este aspecto linguístico para justificar que o vício não é a nulidade processual, mas antes a decisão-surpresa; esta expressão indicia um desvalor da decisão, pelo que não é compreensível desconhecer este desvalor e recorrer ao da nulidade processual (e menos ainda pretender duplicar o desvalor da decisão-surpresa com o da nulidade processual); acresce que o CPC trata diferentemente as nulidades processuais (arts. 186.º ss.) e as nulidades da decisão (arts. 615.º, 666.º, n.º 1, e 685.º), pelo que fica por justificar como é que, contra a sistemática do CPC, um decisão viciada é uma nulidade processual;

O objecto do recurso é (sempre) uma decisão (não pode ser outra coisa); há uma decisão recorrida, mas não uma "nulidade recorrida"; logo, o objecto do recurso é a decisão-surpresa, o que significa que o recorrente tem de fundamentar a interposição do recurso num vício dessa decisão; em concreto, a decisão-surpresa é uma decisão nula por excesso de pronúncia, dado que conhece de matéria que, perante a omissão da audição das partes, não podia conhecer (arts. 615.º, n.º 1, al. d), 666.º, n.º 1, e 685.º CPC).”.

Outra posição defende que estamos perante uma nulidade procedimental, sujeita ao regime geral dos artigos 195.º e 199.ºdo Código de Processo Civil. A omissão da audição das partes constitui uma nulidade processual secundária que se integra na previsão do n.º 1 do art. 195.º do CPC, devendo ser arguida perante o tribunal onde se alega ter sido cometida, só cabendo ao tribunal de recurso conhecê-la no recurso que for interposto do despacho que a aprecie. Quando a nulidade só é arguida em sede recursiva, para além do decêndio legal, contado a partir do conhecimento da decisão-surpresa, essa nulidade já se encontra sanada e não deve ser atendida.

Neste sentido, decidiu o Tribunal da Relação de Coimbra, no Acórdão de 3/5/2021[4]:

“i) Proferida decisão-surpresa, com violação do princípio do contraditório, em desrespeito pelo estatuído no art. 3º, nº 3, do NCPC, incorre-se numa nulidade processual, nos termos do art. 195º, nº 1, do mesmo diploma, e não numa nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, do art. 615º, nº 1, c), do referido código;

ii) Uma coisa é a nulidade processual, por ex. a omissão de um acto que a lei prescreva, relacionada com um acto de sequência processual, e por isso um vício atinente à sua existência, outra bem diferente é uma nulidade da sentença ou despacho, e por isso um vício do conteúdo do acto, por ex. a omissão de pronúncia, um vício referente aos limites; tão pouco se confundindo a dita nulidade com um erro de julgamento, que se caracteriza por um erro de conteúdo;

iii) “Das nulidades reclama-se, dos despachos recorre-se”, pelo que o recorrente devia ter arguido a respetiva nulidade perante o juiz da causa, e não interpor recurso, invocando aquela nulidade da sentença, já que não é invocável o esgotamento do poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa, o qual só ocorre quanto ao objecto da decisão, nem o trânsito em julgado se dando enquanto a arguição estiver pendente, para se dever entender que o juiz deixa de poder conhecer da nulidade oportunamente arguida; e se a nulidade vier a ser declarada, a sentença deixa de poder subsistir (art. 195º, nº 2, 1ª parte do NCPC);”.

Sobre a questão, pronunciou-se o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 4/4/2024 [5], que permitimo-nos respeitosamente transcrever:

«quando o tribunal profere uma decisão sem observância do contraditório, em contravenção com o disposto no n.º 3 do artigo 3.º do CPC, não está a conhecer de uma questão de que não pudesse tomar conhecimento. Ao invés, tratando-se de uma situação que não é regulada por norma especial, deverá ser-lhe aplicada a regra geral do n.º 1 do artigo 195.º do CPC, na parte em que dispõe que a omissão de uma formalidade que a lei prescreve produz nulidade quando a irregularidade cometida possa influir na decisão da questão. Neste caso, a eventual nulidade da decisão decorre de um efeito consequencial, obtido por via do n.º 2 do art. 195.º do CPC, e não da subsunção às causas autónomas de nulidade das decisões previstas no art. 615.º do mesmo diploma (assim, cfr. o referido acórdão de 12-07-2011).

Em abono desta tese é de afirmar, nas palavras do recente acórdão de 29-02-2024, que “se, na realidade, a decisão proferida sem observância do princípio do contraditório configurasse um caso de excesso de pronúncia, sujeito ao regime das nulidades da sentença, o que faria sentido é que a nulidade fosse suprida nos mesmos termos em que é suprida a nulidade causada por excesso de pronúncia, o que não acontece”, já que, para suprir a nulidade causada pela inobservância do princípio do contraditório, não se considera sem efeito a parte viciada, antes se anula a decisão recorrida com o objectivo de determinar o cumprimento do formalismo que foi omitido e de proferir nova decisão sobre a questão.

Acrescenta-se, por fim, como argumento corroborante – e acompanhando, também aqui, o acórdão de 29-02-2024 – que “o n.º 2 do artigo 630.º do CPC, na parte em que dispõe que não é admissível recurso das decisões proferidas sobre as nulidades previstas no n.º 1 do artigo 195.º, salvo se contenderem com os princípios da igualdade ou do contraditório, aponta no sentido de que o legislador configura a omissão de formalidades que contendam com o princípio do contraditório como nulidade prevista no n.º 1 do artigo 195.º do CPC”.».

Conclui o Supremo Tribunal de Justiça, «Em suma, o meio processual próprio para a arguição da nulidade (processual) decorrente da violação do contraditório devido é a reclamação perante o tribunal que proferiu a decisão, no prazo de dez dias (arts. 149.º e 199.º, n.º 1, do CPC), podendo ser interposto recurso da decisão que incida sobre a mesma reclamação.

Assim sendo, acompanha-se o entendimento do acórdão deste Supremo Tribunal de 02-06-2020 (proc. nº 496/13.0TVLSB.L1.S1), não publicado, no sentido de que a nulidade processual arguida apenas nas alegações de recurso de revista se deverá considerar sanada, por não respeitar a vício do acórdão recorrido e na medida em que não se reporte ao indeferimento de uma reclamação oportunamente apresentada.

Deste modo, a nulidade processual decorrente da preterição do contraditório invocada pelo recorrente deveria ter sido objecto de reclamação, no prazo de dez dias desde a notificação da decisão, perante o Tribunal da Relação nos termos da segunda parte do art. 196.º e arts. 197.º, n.º 1 e 199.º, n.º 1, todos do CPC, uma vez que não se coloca a hipótese prevista no n.º 3 da última disposição.

Não tendo sido deduzida tempestivamente tal reclamação perante o tribunal a quo, verifica-se o efeito preclusivo de perda da faculdade de exercício.»

A terceira posição entende que se trata de uma nulidade processual que não deve ser objecto de reclamação para o juiz onde alegadamente foi cometida, mas impugnável através da interposição de recurso [6].

Como ensinava José Alberto dos Reis,[7]a arguição da nulidade só é admissível quando a infracção processual não está ao abrigo de qualquer despacho judicial”. Se a infracção cometida foi efeito do despacho, então, “estamos em presença dum despacho ilegal, dum despacho que ofendeu a lei de processo. Portanto a reacção contra a ilegalidade traduz-se num ataque ao despacho que a autorizou ou ordenou; ... Se em vez de recorrer do despacho, se reclamasse contra a nulidade, ir-se-ia pedir ao juiz que alterasse ou revogasse o seu próprio despacho, o que é contrário ao princípio de que, proferida decisão, fica esgotado o poder jurisdicional de quem decidiu (artigo 666º)”.

No mesmo sentido, escreve Anselmo de Castro[8],“Tradicionalmente entende-se que a arguição da nulidade só é admissível quando a infracção processual não está, ainda que indirecta ou implicitamente, coberta por um qualquer despacho judicial; se há um despacho que pressuponha o acto viciado, diz-se, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade cometida, não é a arguição ou reclamação por nulidade, mas a impugnação do respectivo despacho pela interposição do competente recurso, conforme a máxima tradicional – das nulidades reclama-se, dos despachos recorre-se. A reacção contra a ilegalidade volver-se-á então contra o próprio despacho do juiz; ora, o meio idóneo para atacar ou impugnar despachos ilegais é a interposição do respectivo recurso.”.

Acompanhando este tribunal a última posição mencionada e revertendo para os presentes autos, o Tribunal a quo pronunciou-se expressamente sobre a dispensa da audiência prévia. Assim, a nulidade por omissão da audiência prévia ou por omissão da audição das partes deixa de ter o tratamento das nulidades processuais para seguir o regime do erro de julgamento, considerando que a alegada nulidade está coberta por decisão judicial que determinou a dispensa da audiência prévia, pelo que o meio próprio para a arguir não é a simples reclamação, mas a impugnação da decisão mediante recurso.

Aqui chegados, vejamos se se verifica a nulidade invocada pelos Recorrentes.

Compulsados os autos, verifica-se que finalizada a fase dos articulados, o Tribunal a quo decidiu:

Uma vez que o valor da acção não excede metade da alçada da Relação, que não se levanta nos autos nenhuma questão de facto que esteja dependente da produção de prova, e que as questões a apreciar foram já debatidas nos articulados, contêm estes já todos os elementos que permitem conhecer do seu mérito, mostrando-se desnecessária a realização de audiência prévia – art.s 597º, c) e 595º, nº 1 b) do Código de Processo Civil (aprovado pela Lei nº 41/2013 de 26 de Junho), pelo que dispenso a mesma.”.

Dispõe o nº1 do artigo 591º do Código de Processo Civil que “Concluídas as diligências resultantes do preceituado no n.º 2 do artigo anterior, se a elas houver lugar, é convocada audiência prévia, a realizar num dos 30 dias subsequentes, destinada a algum ou alguns dos fins seguintes:

a) Realizar tentativa de conciliação, nos termos do artigo 594.º;

b) Facultar às partes a discussão de facto e de direito, nos casos em que ao juiz cumpra apreciar exceções dilatórias ou quando tencione conhecer imediatamente, no todo ou em parte, do mérito da causa;

c) Discutir as posições das partes, com vista à delimitação dos termos do litígio, e suprir as insuficiências ou imprecisões na exposição da matéria de facto que ainda subsistam ou se tornem patentes na sequência do debate;

d) Proferir despacho saneador, nos termos do n.º 1 do artigo 595.º;

e) Determinar, após debate, a adequação formal, a simplificação ou a agilização processual, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 6.º e no artigo 547.º;

f) Proferir, após debate, o despacho previsto no n.º 1 do artigo 596.º e decidir as reclamações deduzidas pelas partes;

g) Programar, após audição dos mandatários, os atos a realizar na audiência final, estabelecer o número de sessões e a sua provável duração e designar as respetivas datas.”.

Do confronto dos artigos 591º, nº1, 592º, nº1, 593º, nº1, 593º, nº3 e 597º do CPC resulta que a tramitação de uma acção declarativa comum de valor superior a metade da alçada da Relação inclui, em curso normal, a realização de uma audiência prévia, regra que apenas comporta duas excepções tipificadas: quando a lei assim o estabeleça, o que sucede nos casos indicados no artigo 592º, nº1, do CPC; e quando o juiz dispense a realização da audiência, ao abrigo do disposto no artigo 593º, nº1, do CPC. Com tais ressalvas a audiência prévia é obrigatória.

Escrevem António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa [9], “Quando o juiz entender que dispõe de condições para apreciar já o mérito da causa no despacho saneador (artigo 595º, º1, alínea b), a diligência será destinada a facultar às partes uma discussão sobre as vertentes do mérito da causa que o juiz projeta decidir. É de toda a conveniência que o juiz não decida, no todo ou em parte, aspectos materiais do litigio sem um debate prévio, no qual os advogados das partes tenham a oportunidade de produzir alegações orais acerca do mérito da causa. Estas alegações poderão servir também para as partes tomarem posição sobre eventuais exceções perentórias não discutidas nos articulados e que o juiz entenda poder conhecer oficiosamente, prevenindo decisões – surpresa. Além disso, deve ser concedida às partes a possibilidade de produzirem alegações quando o juiz se proponha decidir o mérito da causa num enquadramento jurídico diverso do assumido e discutido pelas partes nos articulados.

Em todas estas situações está em jogo o respeito pelo princípio do contraditório, garantido às partes pronúncia sobre questões que o juiz irá decidir na fase intermédia do processo, de modo a evitar decisões-surpresa (artigo 3º nº3)”.

Tratando-se de acções de valor não superior a metade da alçada da Relação, o artigo 597º do Código de Processo Civil confere alguma latitude decisória ao juiz.

Dispõe o artigo 597º do CPC que “Nas ações de valor não superior a metade da alçada da Relação, findos os articulados, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 590.º, o juiz, consoante a necessidade e a adequação do ato ao fim do processo:
a) Assegura o exercício do contraditório quanto a exceções não debatidas nos articulados;
b) Convoca audiência prévia;
c) Profere despacho saneador, nos termos do no n.º 1 do artigo 595.º;
d) Determina, após audição das partes, a adequação formal, a simplificação ou a agilização processual, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 6.º e no artigo 547.º;
e) Profere o despacho previsto no n.º 1 do artigo 596.º;
f) Profere despacho destinado a programar os atos a realizar na audiência final, a estabelecer o número de sessões e a sua provável duração e a designar as respetivas datas;
g) Designa logo dia para a audiência final, observando o disposto no artigo 151.”.

Resulta do citado artigo que nas acções de valor não superior a metade da alçada da Relação – como é a situação dos presentes autos -, a realização da audiência prévia não é obrigatória – cfr. alínea b) do nº1 do artº 597 do C.P.C. Nestas acções, findos os articulados, é ao juiz “que cabe definir quais os trâmites processuais que devem ser seguidos, tendo em conta a natureza e a complexidade da ação e a necessidade e a adequação dos atos ao seu julgamento”[10].

Assim, consoante a necessidade e a adequação do acto ao fim do processo, o juiz pode determinar a realização de audiência prévia ou avançar directamente para a audiência final (artigo 597º, alínea g), referindo António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa[11] que “Entre estes dois limites, o juiz poderá deparar-se com as mais variadas situações, ou seja, em que será preciso assegurar o contraditório quanto a exceções não debatidas nos articulados, em que será útil convocar audiência prévia, em que se imporá proferir despacho saneador, em que se justificarão outras medidas de adequação formal, de simplificação ou de agilização processual, em que se mostrará conveniente proferir despacho destinado a identificar o objeto do litígio e a enunciar os temas da prova ou ainda casos em que será aconselhável proferir despacho destinado a programar os atos a praticar na audiência final, a estabelecer o número de sessões e a sua provável duração e a designar as respetivas datas. As hipóteses previstas nas diversas alíneas do art. 597.º não são alternativas, isto é, não se excluem reciprocamente, podendo o juiz conjugá-las entre si”.

Pronunciando-se sobre a questão, decidiu o Tribunal da Relação de Coimbra, no Acórdão de 22/9/2021[12]:

Excluídas as situações em que o juiz a possa dispensar nos termos do art.º 593º, n.º 1 e a previsão do art.º 592º, a audiência prévia terá de ser realizada, sendo ilegal a sua dispensa, salvo na situação particular do art.º 597º.

Trata-se do caso dos autos.

Na interpretação/aplicação do art.º 597º também se deverá concluir que a ponderação acerca da necessidade da realização da audiência prévia é uma decisão levada a cabo no uso dos poderes de gestão e adequação processual (art.ºs 6º e 547º).

Contudo, enquanto nas acções de valor superior a metade da alçada da Relação o juízo de ponderação tem de ser feito em interacção com as partes, que em última análise têm de ser convencidas do bem fundado da decisão do juiz (sendo-lhes atribuído o poder de impor a realização da audiência prévia), nas acções que não atinjam aquele valor, diminuem as necessidades de interacção com as partes e os poderes destas na conformação do resultado (eliminando-se a possibilidade prevista no n.º 3 do art.º 593º), aproximando (se não equiparando) a actividade de ponderação do juiz nesse caso do ‘uso legal de um poder discricionário’ (art.º 630º, n.º 1).

O art.º 597º regula os termos posteriores aos articulados nas acções de valor não superior a metade da alçada da Relação, conferindo ao juiz um amplo poder de gestão e adequação processual, norteado pela necessidade e a adequação do acto ao fim do processo.

No entanto, mesmo em tais situações, a audiência prévia deve ser convocada sempre que seja a forma mais eficiente de obter a satisfação dos princípios processuais que dela carecem (nesta fase) - maxime, os princípios do contraditório e da cooperação processual

A decisão é discricionária, mas a satisfação dos princípios não o é, pelo que, se o juiz não convocar a audiência, deve oferecer o contraditório por escrito, sempre que, por exemplo, seja necessário ouvir as partes.”.

Nesse Acórdão, concluiu o Tribunal da Relação que “perante os factos, a documentação junta aos autos, a descrita actuação processual e o apontado quadro normativo, era manifestamente desnecessário (inútil e excessivo) realizar quaisquer outras diligências ou audiências…”.

No mesmo sentido, decidiu esta Relação, no Acórdão de 19/12/2023[13]: “Nas ações de valor não superior a metade da alçada da Relação, o art. 597º CPC regula os termos posteriores aos articulados, conferindo ao juiz um amplo poder de gestão e adequação processual, norteado pela necessidade e a adequação do ato ao fim do processo, podendo dispensar a audiência prévia, sem carecer de prévia audição das partes.”.

Revertendo aos presentes autos, como referido pelo Tribunal a quo, o valor dos embargos “não excede metade da alçada da Relação”, pelo que por força do disposto no disposto no artigo 597º do CPC, cabe ao juiz definir os trâmites processuais subsequentes à fase dos articulados. No amplo poder de gestão e adequação processual, decidiu o Tribunal a quo dispensar a realização da audiência prévia por entender que: “não se levanta nos autos nenhuma questão de facto que esteja dependente da produção de prova” e “as questões a apreciar foram já debatidas nos articulados, contêm estes já todos os elementos que permitem conhecer do seu mérito, mostrando-se desnecessária a realização de audiência prévia – art.s 597º, c) e 595º, nº 1 b) do Código de Processo Civil (aprovado pela Lei nº 41/2013 de 26 de Junho), pelo que dispenso a mesma.”.

Pelo exposto, não se mostra violado o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 591.º do CPC. Conforme se explicou, nos presentes autos, não se verifica a obrigatoriedade de realização de audiência prévia, pelo que a sua não realização não constitui fundamento de nulidade. Sendo aplicáveis ao processo as normas do artigo 597º do CPC, a necessidade de audiência prévia não pode ser colocada nos termos previstos no artigo 591º do CPC, esclarecendo-se que a jurisprudência citada pelos Recorrentes em apoio da posição por si defendida não aprecia a questão da realização da audiência prévia nas acções de valor não superior a metade da alçada da Relação.

Em segundo lugar, se já foi assegurado o contraditório quanto às questões suscitadas e se os fundamentos utilizados para a decisão de mérito não forem diferentes dos já discutidos entre as partes ou dos que as partes já tiveram possibilidade de discutir, o juiz não tem de ouvir as partes sobre a possibilidade de proferir decisão de mérito, de imediato.

Assim, no caso dos autos, salvo o devido respeito por entendimento contrário, o Tribunal a quo não tinha de facultar às partes a possibilidade de se pronunciarem sobre a dispensa da audiência prévia ou sobre o conhecimento imediato do mérito da causa, por entender que os autos ofereciam os elementos necessários à prolação de decisão final, findos que estavam os articulados.

Advogam, ainda, os Recorrentes que não tendo as partes sido notificadas para se pronunciarem sobre a dispensa de audiência prévia e/ou sobre a discussão do mérito da causa, foi-lhes coartado o direito ao contraditório, consubstanciando o saneador-sentença uma decisão-surpresa que é legalmente proibida (artigo 3.º, n.º 3 do CPC).

O princípio do contraditório é um princípio estruturante do processo civil. Escrevem Lebre de Freitas e Isabel Alexandre[14], «Os nºs 3 e 4, ambos do CPC (…), consagram o princípio do contraditório, o primeiro em geral e na vertente proibitiva da decisão surpresa e o segundo no aspeto da alegação dos factos em causa. Resultam estes preceitos duma conceção moderna do princípio do contraditório, mais ampla do que a do direito anterior à sua introdução no nosso ordenamento. Não se trata já apenas de, formulando um pedido ou tomada uma posição por uma parte, ser dada à contraparte a oportunidade de se pronunciar antes de qualquer decisão e de, oferecida uma prova por uma parte, ter a parte contrária o direito de se pronunciar sobre a sua admissão ou de controlar a sua produção. Este direito à fiscalização recíproca das partes ao longo do processo é hoje entendido como corolário duma conceção mais geral da contraditoriedade, como garantia da participação efetiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, em termos de, em plena igualdade, poderem influenciar todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação, direta ou indireta, com o objeto da causa e em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão.».

Referem os mesmos Autores que «No plano das questões de direito, é expressamente proibida, desde a revisão de 1995-1996 do CPC de 1961, a decisão-surpresa, isto é, a decisão baseada em fundamento que não tenha sido previamente considerado pelas partes. Esta vertente do contraditório tem fundamentalmente aplicação às questões de conhecimento oficioso que as partes não tenham suscitado, pois as que estejam na disponibilidade exclusiva das partes, tal como as que sejam oficiosamente cognoscíveis mas na realidade tenham sido levantadas por uma das partes, são naturalmente objeto de discussão antes da decisão, sem que o facto de a parte que as não tenha levantado não ter exercido o direito de resposta (desde que este lhe tenha sido facultado)implique falta de contraditoriedade.».

Revertendo aos presentes autos, pese embora os Recorrentes qualifiquem o saneador-sentença como uma decisão-surpresa, todas as questões apreciadas e decididas pelo Tribunal a quo foram suscitadas pelas partes, nos articulados.

Ensina o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 11/02/2015[15], “Apenas se pode considerar que o juiz proferiu uma decisão-surpresa quando o mesmo de forma inopinada e apartado de qualquer aportamento factual ou jurídico envereda por uma solução — ainda que seja mais correcta ou adequada ao caso — que os sujeitos processuais não quiseram submeter a juízo — i.e. por uma terceira via —, o que não sucede quando o despacho se limita a dar resposta a uma questão suscitada pelas partes.”.

Refere o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 12/7/2018[16], «a decisão-surpresa que a lei pretende afastar, afoitamente, contende com a solução jurídica que as partes não tinham a obrigação de prever, para evitar que sejam confrontadas com decisões com que não poderiam contar e não com os fundamentos não expectáveis de decisões que já eram previsíveis, não se confundindo a decisão-surpresa com a suposição que as partes possam ter concebido quanto ao destino final do pleito, nem com a expectativa que possam ter realizado quanto à decisão, quer de facto, quer de direito, sendo certo que, pelo menos, de modo implícito, a poderiam ou tiveram em conta, designadamente, quando lhes foi apresentada uma versão fáctica não contrariada e que, manifestamente, não consentiria outro entendimento.»

No saneador-sentença, as questões apreciadas pelo Tribunal a quo foram suscitadas na petição dos embargos de executados e sobre as quais pronunciou-se a Embargada, ou seja, foram debatidas nos articulados existentes nos autos. Assim sendo, o contraditório mostra-se assegurado, não existindo qualquer decisão-surpresa.

Pelo exposto, nenhuma formalidade foi preterida, pelo que improcede a nulidade arguida pelos Recorrentes.

2ª Questão

Insurgem-se, ainda, os Executados/Embargantes contra o saneador-sentença sustentando que o Tribunal a quo não permitiu o exercício do contraditório quanto à excepção deduzida pela Exequente, ao arrepio do disposto na alínea a) do artigo 597.º do CPC, pelo que se verifica a omissão do prévio exercício do contraditório. Concluem que a decisão é nula, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC.

Cumpre apreciar e decidir, convocando-se o acima referido quanto à impugnação da decisão mediante recurso.

Pelos Recorrentes não foi identificada qualquer excepção invocada pela Embargada.

Analisada a contestação oferecida pela Embargada, não se vislumbra qualquer excepção.

O direito processual prevê a defesa por impugnação e a defesa por excepção - art. 571º do CPC.

De acordo com o disposto no nº 2 do artigo 571º do CPC, há defesa por impugnação quando o réu contradiz os factos alegados pelo autor ou quando nega o efeito jurídico que este pretende extrair de tais factos. E há defesa por excepção quando o réu defende a impossibilidade de ser apreciado o mérito da causa ou quando alega factos que sirvam de causa impeditiva, modificativa ou extintiva do direito do invocado pelo autor, assim conduzindo à improcedência, total ou parcial, da acção, mas por decisão que aprecie o seu mérito; no primeiro caso a excepção é dilatória, no segundo é peremptória.

A defesa por impugnação de facto, seja por simples negação, seja de forma motivada, caracteriza-se por uma incompatibilidade total ou parcial no plano factual. Na defesa por excepção peremptória, não ocorre incompatibilidade no plano factual entre as versões de cada parte, na medida em que se traduz na apresentação pelo réu de uma factualidade distinta da alegada pelo autor que, a par desta, é susceptível de operar uma incompatibilidade de direito, traduzida em efeito impeditivo, modificativo ou extintivo do efeito prático-jurídico pretendido pelo impetrante.

Como explicitam Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora[17], na defesa por excepção, o réu “sem negar propriamente a realidade dos factos articulados na petição, nem atacar isoladamente o efeito jurídico que deles se pretende extrair, assenta na alegação de factos novos tendentes a repelir a pretensão do autor”.

Assim, a diferença entre a defesa por impugnação motivada e a defesa por excepção peremptória está em que esta, pressupondo e aceitando, ao menos para efeito de raciocínio - já que é cumulável com a defesa por impugnação -, os factos constitutivos alegados pelo autor, acrescenta algo que obsta a que os mesmos produzam o efeito jurídico que lhes seria próprio.

A petição dos embargos de executado tem formalmente a estrutura e conteúdo de uma petição da acção declarativa, mas no plano material a oposição consubstancia uma reacção à pretensão executiva, sendo substancialmente uma contestação.

Analisando o conteúdo da contestação apresentada pela embargada, facilmente se constata que nenhuma excepção foi deduzida quanto à oposição à execução, limitando-se a apresentar a sua versão quanto ao motivo que determinou o requerimento de desistência da instância, não sendo a desistência da instância facto extintivo da obrigação exequenda (cfr. artigo 729º, alínea g), do CPC) mas causa de extinção da acção executiva.

E quanto à oposição à penhora? Na petição de embargos, o executado admitiu receber uma pensão no valor de €511,04, mas invocou a impenhorabilidade dos subsídios de Natal e de férias por o respectivo valor ser inferior ao valor do rendimento mínimo nacional. Alegou, em síntese, que aufere uma pensão no valor de €511,04. O valor do subsídio auferido é de €511,04:12 meses = €42,58. Assim sendo, mensalmente, tem direito a receber a pensão, acrescida do correspondente duodécimo do subsídio de férias e de Natal, ou seja, €511,04 + €42,58€ +€42,58 o que perfaz o valor de €596,20 que é inferior ao RMN (€760,00) pelo que que é impenhorável, nos termos do artigo 738º do CPC.

À excepção deduzida, na petição de embargos, de impenhorabilidade da pensão auferida pelo Executado, a Embargada respondeu, dizendo que as pensões podem ser impenhoráveis, caso inexistam outros rendimentos, uma vez que são de valor inferior ao salário nacional que, para o ano de 2022, se encontrava fixado na quantia de €705,00, mas “o Executado tem outros rendimentos” para além das pensões: “é sócio gerente da sociedade com o NIPC ...”. Não indicou qualquer rendimento concreto, auferido pelo Executado, além da pensão (o que se mostra reflectido na decisão da matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo pois, não consta da factualidade considerada assente, qualquer facto alegado na resposta apresentada pela Embargada à oposição à penhora).

Em suma, a excepção foi deduzida pelo Executado, na petição dos Embargos. A Embargada limitou-se a responder à excepção deduzida na petição, não havendo lugar à resposta da resposta à excepção.

Pelo exposto, improcede a nulidade arguida pelos Recorrentes.

3ª Questão

Insurgem-se os Recorrentes contra a decisão proferida quanto à matéria de facto, por referência aos seguintes factos:

i. O facto ínsito na alínea 6) [Em 08-07-2022 o Sr. Agente de Execução decidiu extinguir a execução «Desistência do pedido, nos termos da alínea d) do artigo 277.º e alínea f) do n.º 1 do artigo 849.º do CPC.», que só notificou à exequente.] deve passar a ter a seguinte redacção: “Em 07-07-2022 o Sr. Agente de Execução decidiu extinguir a execução «Desistência do pedido, nos termos da alínea d) do artigo 277.º e alínea f) do n.º 1 do artigo 849.º do CPC.», da qual notificou à exequente e ao executado”.

ii. O facto ínsito na alínea 9) [9. Em 11-01-2023 os executados responderam a tal requerimento, opondo-se ao mesmo.]: deve ser carreado para os factos não provados.

iii. O facto ínsito na alínea 14) [14.Ainda não há notícia na execução de que tenha sido penhorada qualquer quantia a título de penhora de pensão.]: deve ser eliminado dos factos provados por se tratar de uma conclusão e não de um facto concreto.

Facto ínsito na alínea 6) [Em 08-07-2022 o Sr. Agente de Execução decidiu extinguir a execução «Desistência do pedido, nos termos da alínea d) do artigo 277.º e alínea f) do n.º 1 do artigo 849.º do CPC.», que só notificou à exequente.]

Os Recorrentes sustentam que:

_ por carta de 7/7/2022 junta aos autos de execução com a referência 32773083, o Sr. Agente de Execução notificou o executado do fim da execução;

_ do teor das missivas juntas à acção executiva resulta que no dia 07/07/2022, o Sr. Agente de Execução não tomou a decisão no dia 08, mas no dia 07 de Julho.

Pugnam, assim, pela alteração da redacção do facto vertido no ponto 6 passando a constar do mesmo:

“6. Em 07-07-2022, o Sr. Agente de Execução decidiu extinguir a execução «Desistência do pedido, nos termos da alínea d) do artigo 277.º e alínea f) do n.º 1 do artigo 849.º do CPC.», da qual notificou à exequente e ao executado.”.

Não há lugar à reapreciação da matéria de facto quando o facto concreto objecto da impugnação não for susceptível de, à luz das diversas soluções plausíveis das questões de direito, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente, o que contraria a proibição legal da prática no processo de actos inúteis[18].

No caso dos autos, considerando que os Recorrentes alicerçam a sua construção jurídica de nulidade do despacho de 9/2/2023, proferido na acção executiva, na omissão da notificação do Executado/Embargante para se pronunciar, em momento prévio à prolação dessa decisão – ainda que não se acompanhe esse entendimento -, assume pertinência a apreciação da impugnação da matéria de facto assente por referência aos pontos 6) e 9).

Compulsados os autos de execução – através da plataforma Citius – facilmente se constata que a carta datada de 7/7/2022, enviada pelo Sr. Agente de Execução e junta com a referência 32773083, não contém qualquer referência à desistência da instância.

Vejamos.

Por requerimento de 4/7/2022, com a referência 42763909, a Exequente veio desistir da instância com o seguinte fundamento: “uma vez que já corre termos execução contra os executados pelo mesmo crédito”.

Nessa sequência, o Agente de Execução, juntou aos autos de execução:

_ uma carta por si expedida, em 7/7/2022, dirigida ao Centro Nacional de Pensões, informando que não mantinha interesse na penhora das pensões/vencimentos dos Executados.

_ uma carta por si expedida, em 7/7/2022, dirigida ao Executado com o seguinte teor: “vem pelo presente, informar V.ª Ex.ª, que não mantém interesse na penhora do executado BB - NIF ......, NISS ...”.

Em 8/7/2022, o Sr. Agente de Execução procedeu à junção aos autos de um requerimento de cujo teor consta:

“DD, Agente de Execução vem informar que se encontravam reunidos os pressupostos para a extinção da presente execução pelos factos a seguir mencionados:

- O mandatário da exequente requereu a extinção da instância contra os executados, nos termos do disposto nos artigos 277.º, al. d), 283.º e 285.º n.º 2, do CPC….

Face ao exposto, o A.E irá dar cumprimento ao disposto no nº2 do artigo 849º do CPC ”.

Em 6/9/2022, foi junto aos autos o documento elaborado com data de 8/7/2022, pelo Sr. Agente de Execução de cujo teor consta:

“Estado do processo/Informação estatística

Extinção: desistência.

Desistência do pedido, nos termos da alínea d) do artigo 277.º e alínea f) do nº1 do artigo 849º do CPC ”.

Pelo Sr. Agente de Execução foi ainda junto, aos autos de execução, cópia da notificação expedida, em 8/7/2022, para o Ilustre Mandatário do Exequente dando conhecimento que “nos termos da alínea f), n.º 1, do art.º 849.º, do C.P.C., a presente execução se encontra extinta”.

Sendo esta a prova documental junta à acção executiva, não assiste razão aos Recorrentes, o que já resultava da reprodução da carta, datada de 7/72022, na peça de recurso. Do teor dessa carta nada consta quanto à desistência – da instância ou do pedido -, mas, apenas, a referência à não manutenção de interesse na penhora da pensão. Por último, a decisão de extinção da instância executiva, do Sr. Agente de Execução, está datada de 8/7/2022.

Improcede, assim, a impugnação da decisão da matéria de facto, nesta parte.

ii. Facto ínsito na alínea 9) [9. Em 11-01-2023 os executados responderam a tal requerimento, opondo-se ao mesmo.]

Os Recorrentes sustentam que o facto ínsito na alínea 9) deve ser carreado para os factos não provados porquanto, no dia 11/1/2023, foi junto à acção executiva um requerimento da Exequente e não dos Executados.

Compulsados os autos de execução – através da plataforma Citius –, assiste razão aos Recorrentes.

Procede, assim, a impugnação da decisão da matéria de facto, quanto à alínea 9), eliminando-se o facto em causa da matéria de facto assente [o facto em causa não foi alegado por qualquer das partes pelo que não há que transferi-lo para a matéria de facto não provada - cfr. artigo 5º, nº1, do CPC].

iii. Facto ínsito na alínea 14) [14.Ainda não há notícia na execução de que tenha sido penhorada qualquer quantia a título de penhora de pensão.]

Os Recorrentes sustentam que da alínea 14) da matéria de facto assente consta uma conclusão e não um facto material concreto, pelo que deve ser eliminada dos factos provados.

Efectivamente, há que aplicar o direito à matéria de facto e não a juízos conclusivos apresentados como sendo factos, pelo que devem ser eliminados os juízos conclusivos que constam da matéria de facto[19].

No entanto, salvo o devido respeito, na alínea 14) não consta um juízo conclusivo, mas um facto, embora inócuo pois, não assume relevância jurídica, à luz das diversas soluções plausíveis de direito. Relevante é a data na qual foi determinada a penhora da pensão e qual o valor da pensão auferida.

Pelo exposto, improcede a impugnação da decisão da matéria de facto nesta parte.

4ª Questão

Os Recorrentes insurgem-se contra a decisão proferida pelo Tribunal a quo quanto ao despacho proferido em 9/2/2023, na acção executiva, sustentando que o mesmo enferma de nulidade que foi arguida na petição dos embargos de executado.

Advogam que embora do saneador-sentença conste que “o embargante não invoca qualquer fundamento de nulidade da decisão em causa” e que “Relativamente ao despacho propriamente dito, o embargante não invoca qualquer nulidade”, no artigo 28º da petição dos embargos foi alegado “face à violação do principio do contraditório o referido despacho é nulo” e no artigo 39.º, “o despacho proferido é nulo por violação da lei substantiva e processual (artigo 249.º do CC e artigo 146.º do CPC)”.

Analisada a petição dos embargos, da mesma consta:

(i) a arguição de nulidade do despacho proferido em 9/2/2023 por violação do princípio do contraditório ao não ser concedida a possibilidade de o executado se pronunciar sobre a renovação da instância, em momento prévio à sua determinação – artigos 26º e 28º da petição;

(ii) arguição da nulidade do despacho com fundamento na violação da lei substantiva e processual: ausência de fundamento para, ao abrigo do disposto no artigo 146.º do CPC e no artigo 249.º do Código Civil, permitir a correcção da peça processual apresentada pela Exequente considerando que por esta não foi alegada a existência de lapso material resultante do teor dos próprios articulados, mas recorrendo a elementos de prova que não constam do processo – artigos 29º a 35º.

Lida a decisão recorrida constata-se que pelo Tribunal a quo foi analisada e apreciada a questão da nulidade processual por violação do contraditório; a questão da nulidade da decisão recorrida com fundamento em vícios formais bem como a questão da aplicação incorrecta da lei, no despacho de 9/2/2023, proferido na acção executiva.

Foi entendido pelo Tribunal a quo – com o que se concorda, conforme acima já se expôs pois, não se acompanha a posição que defende que é nula por excesso de pronúncia [art. 615.º, 1, d)] a decisão proferida sem ser precedida da audição das partes - que as causas de nulidade da sentença, aplicáveis aos despachos por força do disposto no artigo 613º, nº3, do CPC, encontram-se taxativamente previstas no artigo 615º do CPC e nenhuma das causas aí enunciadas foi invocada na petição de embargos.

Seguidamente, pelo Tribunal a quo foi feita a destrinça entre causas de nulidade da sentença e ilegalidades que ditam a revogação da decisão, com o que se concorda também pois, o regime das nulidades destina-se a remover aspectos de ordem formal que inquinem a decisão, não se confundindo com erros de julgamento (errores in iudicando), seja em matéria de facto seja em matéria de direito.

Concluiu o Tribunal a quo que a afirmação que “a decisão em causa aplicou mal a lei” não constitui “fundamento de nulidade, é fundamento de recurso. Que não foi interposto.”, com o que se concorda também.

Como ensina o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 3/3/2021[20], “É, desde há muito, entendimento pacífico, que as nulidades da decisão não incluem o erro de julgamento seja de facto ou de direito: as nulidades típicas da sentença reconduzem-se a vícios formais decorrentes de erro de actividade ou de procedimento (error in procedendo) respeitante à disciplina legal; trata-se de vícios de formação ou actividade (referentes à inteligibilidade, à estrutura ou aos limites da decisão) que afectam a regularidade do silogismo judiciário, da peça processual que é a decisão e que se mostram obstativos de qualquer pronunciamento de mérito, enquanto o erro de julgamento (error in judicando) que resulta de uma distorção da realidade factual (error facti) ou na aplicação do direito (error juris), de forma a que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou à normativa, traduzindo-se numa apreciação da questão em desconformidade com a lei, consiste num desvio à realidade factual [nada tendo a ver com o apuramento ou fixação da mesma] ou jurídica, por ignorância ou falsa representação da mesma.”

Lida, na íntegra, a fundamentação da decisão recorrida, constata-se que com a afirmação “o embargante não invoca qualquer nulidade”, o Tribunal a quo estava a reportar-se às causas de nulidade da sentença previstas no artigo 615º do CPC.

Contrariamente ao defendido pelos Recorrentes, o Tribunal a quo referiu-se expressamente à nulidade processual com fundamento na violação do princípio do contraditório, arguida pelo embargante. Consta da decisão recorrida, por referência ao despacho de 9/2/2023, que “a dita nulidade tinha que ser invocada no processo principal e não em sede de embargos”, explicando o Tribunal a quo que “o embargante diz que foi violado o contraditório, mas tal não tem qualquer fundamento, porque quando o despacho foi proferido os executados ainda não haviam sido chamados à instância executiva, por via da notificação a que alude o art. 626º do Código de Processo Civil, que apesar de ter o seu início no processo declarativo é uma instância completamente nova e por isso a notificação reveste a forma de citação. Logo, não podia haver contraditório porque os executados ainda não eram parte.”.

Conforme já explicitado, por este tribunal é perfilhado o entendimento que a preterição do exercício do contraditório consiste numa nulidade processual. Estando a nulidade coberta pelo despacho de 9/2/2023, o meio próprio para a arguir não é a simples reclamação, mas o recurso do próprio despacho que não foi interposto pelos Executados, ora Recorrentes. O Executado impugnou o despacho na oposição à execução deduzida nos Embargos de Executado. Porém, os embargos de executado são o meio de oposição à execução com fundamentos respeitantes à inexequibilidade do título executivo, à falta de pressupostos processuais da acção executiva e, ainda, à inexequibilidade da obrigação que a Exequente pretende realizar coactivamente, enunciados no artigo 729º do CPC, no caso de o título executivo ser uma decisão judicial.

Em conclusão, com fundamento na preterição do contraditório, o meio próprio para impugnar o despacho era a interposição de recurso do despacho de 9/2/2023; com fundamento na apreciação da questão em desconformidade com o disposto nos artigos 146º do CPC e 249º do CC, o meio próprio para impugnar o despacho era o recurso. Os Recorrentes não interpuseram recurso do despacho. Optaram por deduzir embargos de executado. Como refere o Tribunal a quo, “[o] título dado à execução é uma sentença, cuja exequibilidade não foi posta em causa”. Tratando-se de decisão judicial, “o legislador limitou os fundamentos passíveis de serem alegados, em sede de embargos de executado, aos aludidos taxativamente no art. 729º do Código de Processo Civil” e os fundamentos invocados – a nulidade do despacho de 9/2/2023, proferido na acção executiva, com fundamento na violação do exercício do contraditório; e o erro de julgamento – não se enquadram em nenhum dos legalmente previstos no citado artigo 729º do CPC, o que determina a improcedência da oposição à execução deduzida nos embargos.

Por último, ainda que se enunciasse a hipótese de os Recorrentes, com o presente recurso, pretenderem impugnar o despacho de 9/2/2023 e não a decisão proferida sobre o mesmo, nos embargos de executado, considerando a data na qual os mesmos tomaram conhecimento desse despacho, seria intempestivo pois, em 5/3/2024, já havia decorrido o prazo legal que dispunham para interpor recurso.

Não tendo sido impugnada a decisão proferida quanto à oposição à penhora e considerando que o objecto do recurso é definido pelas conclusões, não existe qualquer outra questão a apreciar.

Improcede, assim, o recurso, impondo-se a confirmação da decisão recorrida.


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Custas

Considerando que os Recorrentes não obtiveram provimento, as custas do recurso são a seu cargo, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficiam – artigo 18º, nº4, da Lei nº34/2004, de 29 de Julho, com as alterações introduzidas pela Lei nº 47/2007, de 28 de Agosto.


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V_ Decisão

Pelos fundamentos expostos, acorda-se em julgar improcedente o recurso, confirmando-se a decisão recorrida, sem prejuízo da eliminação da alínea 9) dos factos considerados assentes, nos termos enunciados.

Custas do recurso a cargo dos Recorrentes, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficiam – artigo 527º do CPC.


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Sumário:

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Porto, 11/11/2024
Anabela Morais
Mendes Coelho
Ana Paula Amorim
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[1] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23/06/2016, proferido no processo nº 1937/15.8T8BCL.S1; no mesmo sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17/3/2016, proferido no processo nº1129/09.5TBVRL-H.G1.S1; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16/12/2021, proferido no processo nº 4260/15.4T8FNC-E.L1.S1; Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 23/09/2021, proferido no processo nº 1502/20.8T8PTM.E1; Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 25/03/2021, proferido no processo nº2935/11.6T13BCL.G1; Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 04/11/2021, proferido no processo nº344/20.5T8VFX.L1; Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 22/06/2021, proferido no processo nº 1431/ /20.5T8PVZ.P1; todos acessíveis em www.dgsi.pt.
[2] António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 7ª edição actualizada, Almedina, 2022, pág. 26.
[3] https://blogippc.blogspot.com/search?q=decis%C3%A3o+surpresa.
[4] Acórdão de 3/5/2021, proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, no processo nº 1250/20.9T8VIS.C1; no mesmo sentido, Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 01/.04/2004, proferido no processo nº 2737/03-2, Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 24/10/2019, proferido no processo nº 80/18.2T8TMC.E.G1; Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 03/05/2021, proferido no processo nº 1259/20.9T8VIS.C1; e Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11/12/2014, proferido no processo nº 116/13.3YXLSB.L1-2; todos acessíveis em www.dgsi.pt.
[5] Sobre a questão, pronunciou-se o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 4/4/2024 proferido no processo nº 5223/19.6T6STB.E1.S1, acessível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/9d2db3b917bac75280258af5005351cf?OpenDocument.
[5] Acórdão de 14 de Julho de 2020, do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no processo nº 3278/16.4T8GMR.G1.S1, acessível em https://jurisprudencia.pt/acordao/196036/..
[6] Neste sentido, Acórdão de 22/10/2020 do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no processo nº 2648/17.5T8ALM.L1-6, acessível em http://www.gde.mj.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/d6c27ebe177ea14380258614004ab3fc.
[7] José Alberto dos Reis, “Comentário ao Código de Processo Civil”, Vol. II, pág. 507.
[8] Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, Coimbra, Almedina, 1982, pág. 13.
[9] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa; Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 3ª edição, Almedina, 2022, pág. 739.
[10] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa; Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 3ª edição, Almedina, 2022, pág. 755.
[11] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa; obra cit., págs. 755 e 756.
[12] Acórdão de 22/9/2021, proferido no processo nº3854/18.0T8PBL-A.C1, acessível em https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/6c2703c263a709838025875f0029a7b6?OpenDocument.. No mesmo sentido, decidiu o Tribunal da Relação de Coimbra, no Acórdão de 6/2/2024, proferido no processo 629/23.9T8LRA.C1, acessível em https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/167febf67cc15d5980258acf003cb657?OpenDocument, e jurisprudência aí citada
[13]Acórdão de 19/12/2023, proferido no processo nº22473/22.0T8PRT-A.P1, acessível em https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/d6a50fa5fe8caaf080258aaf003ac3a3?OpenDocument
[14] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, 4ª edição, Almedina, Coimbra, 2021, pág. 29.
[15] Acórdão de 11/02/2015, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no processo 201/05.5TBFZZ.-C.C1.S1, acessível em sumários, 2015, pág.73
[16] Acórdão de 12/7/2018, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no processo nº177/15.0t8CPV.A.P1.S1, acessível em www.dgsi.pt.
[17] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, 1985, pág. 291.
[18] Como ensina o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 3 de Novembro de 2023, proferido no processo nº 835/15.0T8LRA.C4.S1, acessível em www.dgsi.pt, “de acordo com os princípios da utilidade e pertinência a que estão submetidos todos os atos processuais, o exercício dos poderes de controlo sobre a decisão da matéria de facto só é admissível se recair sobre factos com interesse para a decisão da causa, segundo as diferentes soluções plausíveis de direito que a mesma comporte (cfr. arts. 6.º, n.º 1, 30.º, n.º 2, e 130.º, do CPC).”.
[19] Apesar de a norma constante do art.º 646.º, n.º 4, do anterior C.P.C., não ter norma inteiramente corresponde no C.P.C. em vigor, nem por isso se pode considerar o que seja matéria conclusiva e de direito, pois que a decisão é sobre a matéria de facto.
[20] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 3/3/2021, proferido no processo n.º 3157/17.8T8VFX.L1.S1, acessível em dgsi.pt.