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EMBARGOS DE EXECUTADO
FALTA DE CONTESTAÇÃO
EFEITO COMINATÓRIO
CONTRATOS DE MÚTUO BANCÁRIO
LIQUIDAÇÃO
Sumário
I. A falta de contestação dos embargos de executado produz os efeitos cominatórios previstos para o processo declarativo, não se considerando, porém, confessados os factos que estejam em oposição com os expressamente alegados no requerimento executivo. II. Dos títulos executivos dados à execução, presume-se a existência da obrigação nos mesmos configurada, devendo tal obrigação ser certa, exigível e liquida. III. A obrigação é certa quando esteja qualitativamente determinada, ainda que por liquidar ou individualizar, o que ocorre nas obrigações genéricas ou alternativas; a obrigação é exigível quando se encontra vencida, o seu vencimento depende de interpelação do devedor (artº 777º, nº 1 do Código Civil) e este já foi interpelado extrajudicialmente, ou não o sendo, é interpelado através da citação; a obrigação é ilíquida quando não se encontra determinada em relação à sua quantidade, carecendo da efetivação de cálculos aritméticos ou da alegação de factos que, submetidos ao contraditório, permitam a sua quantificação (artº 716º do Código de Processo Civil).
Texto Integral
Acordam na 3ª Secção do Tribunal da Relação de Guimarães
I. Relatório:
Banco 1..., S.A., melhor identificada nos autos veio deduzir execução para pagamento de quantia certa contra AA e BB, melhor identificados nos autos, peticionando o pagamento da quantia global de € 303.362,29 (trezentos e três mil e trezentos e sessenta e dois euros e vinte e nove cêntimos), alegando ter celebrado com os executados, a 26 de novembro de 2001 e 13 de setembro de 2004, quatro contratos de mútuo bancário, com hipoteca, dois em cada ocasião, internamente identificados como ...85, ...85, ...85 e ...85, contratos cujos clausulados foram revistos em 23 de julho de 2015.
Contudo, as prestações vencidas, respectivamente em 26 de dezembro de 2021, em 26 de agosto de 2022, em 13 de fevereiro de 2022 e em 13 de junho de 2022, não foram pontualmente liquidadas, motivos pelos quais em 24 de outubro de 2022, foram todos os contratos de mútuo bancário, com hipoteca, celebrados considerados resolvidos, com todas as consequências legais.
Como os executados supra identificados não pagaram voluntariamente, instauraram a competente e presente acção para cobrança coerciva, ascendendo o capital total em dívida ao montante de € 297.845,74 (duzentos e noventa e sete mil e oitocentos e quarenta e cinco euros e setenta e quatro cêntimos) e os juros de mora vencidos à quantia de € 5.516,55 (cinco mil quinhentos e dezasseis euros e cinquenta e cinco cêntimos).
Pediu, ainda, o pagamento dos juros de mora vincendos à taxa de 5,662%, ao ano, a calcular sobre o valor líquido (capital vencido) nos empréstimos nºs ...85 (€ 80.503,84) e ...85 (€ 110.694,48), e de 6,162%, ao ano, a calcular sobre o valor líquido (vg. capital vencido) nos empréstimos nºs ...85 (€ 35.842,89) e ...85 (€ 70.804,53), bem como o Imposto de Selo, se aplicável, e as despesas e custas judicias incorridas até integral pagamento da dívida.
Em 20 de dezembro de 2022, foram penhorados dois imóveis aos executados, um sito em ... e o outro em ..., melhor identificados no auto de penhora com a referência citius número 13908949
Por requerimento junto aos autos em 18 de janeiro de 2023, veio a executada AAapresentar embargos de executado peticionando a final que seja:
a)declarada a inexigibilidade da dívida;
b)declarados nulos os contratos ...85 e ...85 por falta de elementos essenciais à sua celebração;
c)devolvidas as quantias indevidamente entregues à exequente embargada acrescidas de juros à taxa legal em vigor;
d)recalculadas as quantias devidas de capital e juros no âmbito dos empréstimos ...85 e ...85 e compensadas nas quantias indevidamente entregues à exequente embargada;
e)levantada a penhora dos prédios mencionados nos artºs 4º e 5º do requerimento inicial;
f)a exequente embargada condenada a pagar à ora embargante executada a quantia de 14.000,00€ a título de danos não patrimoniais.
Alega, para o efeito que, além da exequente embargada não juntar qualquer documento que demonstre a liquidação da dívida reclamada, designadamente, o plano de pagamento com os valores das prestações desagregados de capital e de juros e a referência à taxa Euribor aplicada, o que redunda na inexigibilidade da dívida, entregou, a par com o seu marido, também executado, montantes que justificam a amortização de um capital muito superior ao registado.
Mais alega que, quanto ao contrato de mútuo número ...85, não foi feita qualquer referência ao montante mutuado, enquanto no contrato de mútuo número ...85, os valores a título de capital lá consignados não correspondem aos reais montantes em dívida, o que gera a nulidade de tais clausulados com a inerente obrigação de restituição das quantias pagas pela embargante executada, acrescida de juros de mora.
Montantes que requer sejam compensados nos empréstimos números ...85 e ...85, após recálculo das quantias devidas.
Por fim, invoca que, devido à situação financeira periclitante em que o seu agregado familiar se encontrava, a embargante executada, e marido (também executado), decidiu(ram) proceder à venda de um dos imóveis mencionados no requerimento executivo, venda que não se concretizou devido ao registo da penhora operada nos presentes autos, o que provocou um clima de medo, ansiedade, angústia e incerteza em relação ao futuro, condicionando-os no normal desenvolvimento do modo de vida de todo o agregado familiar, reclamando, assim, uma indemnização pelos danos morais sofridos.
Liminarmente admitidos os embargos foi a embargada exequente notificada para contestar e, não o tendo feito, os factos vertidos no requerimento inicial, corrigido pelo requerimento de 20 de janeiro de 2023, foram considerados assentes, sendo a embargante executada notificada para os termos constantes do nº 2 do artigo 567º do Código de Processo Civil.
Entretanto, veio o executado BB deduzir incidente de intervenção principal espontânea, aderindo ao(s) articulado(s) apresentados pela embargante executada.
Vieram posteriormente os embargantes executados apresentar as suas alegações reiterando, em suma, a posição já assumida no requerimento inicial.
Notificada a embargada exequente quanto ao referenciado pedido de intervenção, aquela não se opôs, requerendo a sua notificação da decisão de admissão para exercer o contraditório quanto à adesão aos articulados operada.
Foi admitida a requerida intervenção principal espontânea de BB e indeferido o pedido da embargada exequente.
Por despacho de 5 de dezembro de 2023, a embargada exequente foi notificada para “(…) em 10 (dez) dias, em complemento dos títulos executivos juntos com o requerimento executivo, juntar aos autos o plano de reembolso de cada um dos créditos hipotecários, na sequência da renegociação dos mesmos, com indicação dos montantes das prestações, juros a pagar por cada prestação, outros custos incluídos na prestação (se for caso disso), capital reembolsado por prestação e capital em dívida após cada prestação (…)”, convite a que respondeu, em 15 de janeiro de 2024, mediante junção aos autos de requerimento, pedindo, a título adicional, a audição da testemunha CC.
Sobre tal articulado exerceram os embargantes executados tempestivamente, a 29 de janeiro de 2024, o seu direito ao contraditório.
Foi produzido despacho saneador que julgou competente o Tribunal, as partes compersonalidade e capacidade judiciária, legítimas e devidamente representadas.
Fixaram-se as questões a decidir, a saber,
A. Da inexigibilidade da dívida exequenda, e suas consequências adjectivas;
B. Da nulidade dos contratos de mútuo bancário, com hipoteca, identificados pelos números ...85 e ...85, e suas consequências substantivas, e compensação de créditos;
C. Da responsabilidade civil da embargada exequente e as suas consequências substantivas.
Foi proferida decisão que julgou parcialmente procedentes os embargos de executado deduzidos pelos embargantes AA e BB e, consequentemente,
a)declarou-se extinta a execução movida pela embargada exequente “Banco 1..., SA” aos executados AA e BB, por verificação da excepção dilatória nominada da iliquidez da obrigação exequenda, não suprida na fase introdutória da execução,
b)declarou-se improcedente, por falta de verificação do pressuposto da ilicitude, o pedido de indemnização, por danos não patrimoniais, deduzido pelos embargantes executados.
Inconformados vieram da mesma recorrer os embargantes, formulando as seguintes conclusões:
A. Os Recorrentes celebraram com a Recorrida os contratos empréstimos n.º ...85, ...85, ...85 e ...85, no valor de 43.500,00€ (quarenta e três mil e quinhentos euros), 79.800,00€ (setenta e nove mil e oitocentos euros), 125.000,00€ (cento e vinte e cinco mil euros) e 77.500,00€ (setenta e sete mil e quinhentos euros), respetivamente;
B.A Recorrida intentou uma ação Executiva a reclamar um valor total 297.845,74€ (duzentos e noventa e sete mil, oitocentos e quarenta e cinco euros e setenta e quatro cêntimos) de capital total em divida, somado de juros e despesas num total de 5.516,55€ (cinco mil quinhentos e desaseis euros e cinquenta e cinco cêntimos), perfazendo o total de 303.362,29€ (trezentos e três euros e trezentos e sessenta e dois euros e vinte e nove cêntimos);
C.Os Recorrentes apresentaram a sua Oposição por Embargos de terceiro;
DEntre outros, pedindo que a Exequente, Embargada viesse condenada a pagar à Embargante, Executada a quantia de 14.000,00€ a título de danos não patrimoniais;
E.A Recorrida não apresentou a sua Contestação;
F.Num segundo momento, foi a Embargada, ora Recorrida, “em complemento dos títulos executivos juntos com o requerimento executivo, juntar aos autos o plano de reembolso de cada um dos créditos hipotecários, na sequência da renegociação dos mesmos, com indicação dos montantes das prestações, juros a pagar por cada prestação, outros custos incluídos na prestação (se for caso disso), capital reembolsado por prestação e capital em dívida após cada prestação”;
G.Não cumpriu esse ónus, nem em sede de contestação, nem convidados pelo Tribunal a quo, em fase ulterior, de forma a liquidarem a quantia exequenda;
H.Face ao não exercício do contraditório pela Embargada Exequente, os factos vertidos no requerimento inicial de Embargos de executado, foram considerados confessados;
I.Apenas os Recorridos podiam esclarecer a liquidação da divida exequenda trazida aos autos.
J.Os Recorrentes não têm qualquer forma possível de saber qual o montante concreto da divida, nem podem cegamente aceitar o pedido formulado pela Exequente.
K.Nos termos do n.º 2, do Artigo 344.º do Código Civil, “há também inversão do ónus da prova, quando a parte contrária tiver culposamente tornado impossível a prova ao onerado, sem prejuízo das sanções que a lei de processo mande especialmente aplicar à desobediência ou às falsas declarações”.
L.Os Embargados, deliberada e conscientemente, não forneceram os elementos pedidos pelo Tribunal a quo, e que anteriormente já haviam sido pedidos pelos próprios Executados.
M.Há-de dar-se como provada toda a factualidade vertida na Petição inicial de Embargos de Executado, designadamente que;
a)“14. Inexplicavelmente, decorridos quase dois terços do prazo inicial contratado com pagamento das prestações acordadas, os agora executados viram aumentado o capital em divida, no primeiro empréstimo ( ...85) em quase 10%.”; e b)“24. Inexplicavelmente, decorrida quase metade do prazo inicial contratado com pagamento das prestações acordadas, os agora executados viram amortizado apenas 3,15% no primeiro empréstimo e 0,48% no segundo.”;
N.A imputação injustificada de um valor em dívida determina, per si, uma atuação ilícita por parte da Embargada, ora Recorrida;
O.Deve a atuação descrita da Embargada, ora Recorrida ser tida como ilícita e verificados os pressupostos do regime da responsabilidade civil;
Nestes termos e nos demais de direito que V. Ex.as doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso, julgado procedente, a sentença recorrida ser revogada quanto à improcedência do pedido de indemnização cível, condenando a Embargada no pedido deduzido pelos Embargantes. com as legais consequências.
E assim fazendo, farão V. Ex.as, Venerandos Desembargadores, JUSTIÇA !!!
Também a embargada veio da decisão recorrer, formulando as seguintes conclusões:
A) Conforme dispõe o artigo 732º, nº 3 do Código de Processo Civil (doravante CPC), à falta de contestação será aplicável o disposto no nº 1 do artigo 567º e no artigo 568º do CPC, mas não se podem considerar confessados os factos que estiverem em oposição com os expressamente alegados pela Exequente no requerimento executivo.
B) Os factos articulados no Requerimento Executivo e a respetiva documentação em anexo permitiam considerar como tendo sido cabalmente contestados todos os factos
articulados pelos Executados e como provados todos os factos alegados e/ou documentados pela Exequente no Requerimento Executivo.
C) o Tribunal recorrido julgou os Embargos nos moldes articulados pelos Executados infundados, porque não provados, porquanto a única exceção julgada procedente (e mal!) baseou-se numa outra perspetiva adjetiva enunciada pelo Tribunal recorrido através da verificação de um pressuposto processual conexo com a liquidação da obrigação exequenda.
D) o Tribunal recorrido conclui erradamente a fls. 15, 4ª parágrafo que “Por outro lado, para além da exequente não ter apresentado contestação aos embargos (na qual poderia, eventualmente esclarecer a liquidação que fez), certo é que convidada para vir densificar fáctica e objectivamente a obrigação exequenda, mais uma vez, a embargada exequente não cumpriu o ónus de alegação que sobre si impedia, já que se limitou a alegar por remissão para os extensos e complexos documentos que juntou, o que, além de inviabilizar o cabal exercício do contraditório pelos embargantes executados, não permite apurar que cálculos foram realizados para concluir pelos valores que a mesma alega estarem em dívida e que verteu no requerimento executivo.”.
E) No despacho notificado em 05.12.2023 (sob a Referência ...66) não foi efetuado nenhum convite para densificar fáctica e objetivamente a obrigação exequenda na ótica duma clarificação dos cálculos subjacentes à liquidação da quantia exequenda, mas outrossim para “(…) juntar aos autos o plano de reembolso de cada um dos créditos hipotecários, na sequência da renegociação dos mesmos, com indicação dos montantes das prestações, juros a pagar por cada prestação, outros custos incluídos na prestação (se for caso disso), capital reembolsado por prestação e capital em dívida após cada prestação (…)” (negrito nosso).
F) Subjacente ao despacho notificado em 05.12.2023 (sob a Referência ...66) estavam as dúvidas enunciadas pelos Executados, nomeadamente a sua “(…) incredulidade ao aferirem que, em sede de execução, os montantes cujo pagamento são peticionados aumentaram entre 1% a 10%, em face dos valores que foram inicialmente mutuados pela embargada exequente (…)” a fls. 15, 3º parágrafo do aresto sob recurso.
G) A exequente ora recorrente considera que informou no Requerimento Executivo a descrição detalhada dos montantes relativos a capital vencido e não pago, aos juros remuneratórios, aos juros moratórios, às comissões e às despesas, respetivas datas de vencimento, taxas de uros e a base de incidência dos montantes devidos a título de juros remuneratório e moratórios, como melhor resulta da matéria de facto provada nos pontos 14. a 22. do aresto ora recorrido, devidamente conciliada com os documentos a que subjaz o julgamento que os considerou adentro da matéria de facto considerada provada e/ou assente.
H) As Notas de Débito (documentos nºs 6 e 7 e 13 e 14 juntos com o Requerimento Executivo) identificam de forma simples, clarividente e sindicável pelo homem médio, através de simples cálculo aritmético, com recurso uma simples confirmação das operações de soma dos resultados em cada prestação e/ou por tipologia de verba (vg. capital amortizado, taxa de juros remuneratórios aplicável, comissões, juros de mora e sobretaxa de mora legal, ordenados pelas respetivas datas de vencimento, até ao vencimento antecipado das demais prestações vincendas.
I) Não se pode pretender que a exequente ora recorrente replique no «Requerimento Executivo», no campo da «Liquidação da Obrigação» a informação de cada valor constante das Notas de Débito, copiando e colando cada uma das parcelas e os
respetivos resultados, porquanto estes estão plasmados de forma acessível e mais bem sindicável nas Demonstrações das Notas de Débito.
J) A transposição de tal informação para o campo da «Liquidação da Obrigação» causaria essa sim uma dificuldade acrescida aos Executados, ao Agente de Execução e ao julgador na sua interpretação, confirmação e/ou sindicância.
K) O Tribunal recorrido ignorou por completo as contas elaboradas pela Exequente nos documentos referidos nos pontos 14. a 22. da matéria de facto provada, ao afirmar no aresto a fls. 15, 6º parágrafo, que “(…) nada disto foi feito pela embargada exequente que, limitando-se a remeter para as notas de débito explicitadas em 15, 17, 19 e 21, limita-se a concluir que estão em dívida determinados montantes, sem que, em adequado cumprimento do disposto no artigo 716.º, n.º 1, do CPC, efectue os cálculos aritméticos necessários a alcançar o valor que a mesma alega (mediante documentos unilateralmente emitidos) estarem em dívida, inviabilizando, assim, aos embargantes executados o exercício do contraditório sobre esses cálculos, bem como ao Tribunal aferir da bondade dessa conclusão.(…)”.
L) O Tribunal recorrido ao conseguir dar como provados os factos nos pontos 14. a 22. do aresto ora recorrido com base nos documentos juntos com o «Requerimento Executivo» sob os nºs 6, 7, 13 e 14, não poderia deixar de vislumbrar que tais documentos contêm de forma clara e sistematizada a base dos cálculos efetuados pela Exequente para a conclusão de que as somas das parcelas deram origem aos valores indicados como tendo sido somados com base nesses mesmos documentos na «Liquidação da Obrigação» efetuada no «Requerimento Executivo».
M) As notas de débito juntas com o «Requerimento Executivo» sob os nºs 6, 7, 13 e 14 foram emitidas ao abrigo dos contratos onde se consignou que constituem documentos suficientes para prova e determinação dos montantes em dívida, tendo em vista a exigência, justificação ou reclamação judicial dos créditos que deles resultarem em qualquer processo, conforme prescrito na cláusula 14ª do documento complementar em anexo à escritura junta como documento nº 1 com o RE, na cláusula 13ª do documento complementar em anexo à escritura junta como documento nº 2 com o RE, e nas cláusulas 14ª nos documentos complementares em anexo às escrituras juntas como documentos nºs 8 e 9 com o RE).
N) Os Executados embargantes não impugnaram a documentação autuada pela Embargada Exequente no Requerimento Executivo, conforme melhor decorre de fls. 10 do aresto sob recurso, ponto C. MOTIVAÇÃO DE FACTO.
O) No contexto de um requerimento executivo não cabem informaticamente os quadros elaborados pela Exequente nas Notas de Débito, pois a informação que nestas está consignada não é reproduzível nos mesmos moldes no formulário eletrónico.
P) Foram juntas quatro notas de débito com o Requerimento Executivo sob os nºs 6, 7, 13 e 14, as quais, na respetiva “Demonstração da Nota de Débito”, demonstram inequivocamente, prestação a prestação, a data de vencimento da prestação, o nº da prestação com referência aos planos de reembolso em cada empréstimo, a taxa de juros remuneratórios em vigor, o valor monetário do capital vencido, o valor monetário dos juros remuneratórios, o valor monetário dos juros de mora (compostos pela taxa de juros em vigor a que é somada a sobretaxa de mora legal) e o valor monetário da comissão de cobrança, todos ordenados por tipologia em colunas, e concluem com os valores somados por tipologias, os quais surgem depois resumidos na primeira página de cada Nota de Débito como sendo o resultado das referidas somas de capital, de juros e de comissões.
Q) A fundamentação de facto do aresto recorrido deveria ter incluído, não só a indicação dos elementos de prova que foram utilizados para formar a convicção do Tribunal recorrido, como a sua apreciação crítica, de forma a ser possível à ora recorrente
conhecer as razões por que decidiu no sentido de que tais notas de débito (documentos juntos sob os nºs 6, 7, 13 e 14 com o Requerimento Executivo) não lhe permitiram concluir pela liquidação da dívida exequenda de forma correta.
R) Não poderia o Tribunal recorrido ter julgado a exceção dilatória nominada de iliquidez ou de insuficiente determinação quantitativa da obrigação exequenda, sem oferecer previamente à Exequente, de forma clara, a oportunidade de corrigir essa concreta irregularidade (ademais não alegada pelos Executados Embargantes) sanável, pelo que, não o tendo feito, violou o disposto nos artigos 726º, nº 4, 729º, alínea e) e 6º, nº 2, todos do CPC.
S) O Tribunal recorrido tinha todas as condições jurídico processuais para não decretar a verificação da exceção nominada de iliquidez da obrigação exequenda, não só
porque os elementos de prova em que sustentou a sua convicção lhe permitiam uma conclusão diversa, como também porque, contrariamente ao afirmado, não formulou qualquer convite dirigido à sua concreta sanação.
Em face do acima exposto e com o douto suprimento de V. Exas., a douta sentença proferida deverá ser revogada e, consequentemente, substituída por outra onde se julgue
improcedente a exceção dilatória de iliquidez e/ou de insuficiente determinação quantitativa da obrigação exequenda.
Alternativamente, caso assim se não entende, deverão V. Exa. ordenar o reenvio do processo para o Tribunal recorrido dar cumprimento ao disposto nos artigos 726º, nº 4, 729º, alínea e) e 6º, nº 2, todos do CPC, convidando a Exequente a sanar a exceção dilatória de iliquidez e/ou de insuficiente determinação quantitativa da obrigação exequenda.
Como é de Justiça!
Responderam os embargantes às alegações da embargada, concluindo:
Os Executados deduziram oposição por Embargos de Executado alegando a incerteza, inexigibilidade e iliquidez da dívida reclamada pela Exequente, ora Recorrente.
No Requerimento Executivo apenas apresentou os contratos de crédito e as respetivas notas de débito.
A Exequente, regularmente citada, não apresentou a sua contestação.
Por despacho de 05/12/2023 foi a Recorrente, notificada para juntar aos autos o plano de reembolso de cada um dos créditos hipotecários, na sequência da renegociação dos mesmos, com indicação dos montantes das prestações, juros a pagar por cada prestação, outros custos incluídos na prestação, capital reembolsado por prestação e capital em dívida após cada prestação.
A Embargada, aqui Recorrida, apenas apresentou os extratos de conta corrente.
Não veio, assim, responder ao Tribunal a quo, sobre a forma como chegou aos valores dados a execução.
Desde logo, não justifica: O aumento do capital em divida no primeiro empréstimo ( ...85) em quase 10%, aquando da celebração dos últimos contratos;
A ausência de indicação do montante em divida na operação e crédito ...85, em oposição aos restantes contratos; A quase ausência de amortização de capital nos referidos contratos desde a sua celebração inicial; O aumento do capital total em dívida desde a sua renegociação em 20/07/2015, em 13.261,05€ em oposição à amortização de capital num total de 43.773,71€.
· Não obstante, analisados os extratos apresentados, em oposição aos extratos contas n.º ...85 e ...85, os saldos finais dos extratos contas n.º ...85 e ...85 não correspondem aos capitais em dívida pedidos nos autos.
· Os extratos dos créditos das contas n.º ...85 e ...85, apresentados pela aqui Recorrente, não apresentam a evolução do capital em divida após pagamento de cada prestação.
· A invocada clarividência dos cálculos não é sindicável pelo homem médio, através de simples cálculo aritmético, pois é a própria Recorrente a pedir a audição de uma testemunha para a auxiliar o Tribunal na análise e interpretação dos documentos apresentados, pela sua extensão e complexidade.
· A Recorrente, encontra-se em revelia, não contestou os embargos, não apresentou alegações finais, nem veio juntar o pedido pelo douto Tribunal a quo de forma a esclarecer qual a real divida dos Embargantes.
· O reenvio do processo para o Tribunal a quo, a fim de sanar a exceção dilatória de iliquidez e/ou insuficiente determinação quantitativa da obrigação exequenda, viola Princípio da Concentração da Defesa e os limites do Princípio da Adequação Formal.
Pelo exposto, deve improceder a pretensão da Recorrente, confirmando-se a Sentença recorrida.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar.
*
II: Objeto do recurso:
O objeto do recurso é definido pelas conclusões das alegações, impondo-se conhecer das questões colocadas pelos recorrentes, bem como as que sejam de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas, cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, sendo certo que o tribunal não se encontra vinculado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes e que visam sustentar os seus pontos de vista, isto atendendo à liberdade do julgador na interpretação e aplicação do direito.
Assim sendo, tendo em atenção as alegações/conclusões apresentadas pelos recorrentes importa aos autos aferir se:
a)perante os factos alegados no requerimento executivo pela exequente, embargada e documentação junta, se devem entender não confessados os factos alegados pelos executados, embargantes no seu requerimento de oposição;
b)da (in)existência, por parte do Tribunal a quo, de um convite à exequente/embargada para vir densificar fáctica e objectivamente a obrigação exequenda;
c)se tinha o Tribunal recorrido todas as condições jurídico processuais para não decretar a verificação da exceção nominada de iliquidez da obrigação exequenda, não só porque os elementos de prova em que sustentou a sua convicção lhe permitiam uma conclusão diversa, como também porque, contrariamente ao afirmado, não formulou qualquer convite dirigido à sua concreta sanação;
d)se face aos factos apurados e à não contestação dos mesmos por parte da exequente embargada, deveria o Tribunal a quo considerar procedente o pedido de indemnização cível formulado.
*
III. Fundamentação de facto:
A. FACTOS PROVADOS
Examinada a tramitação processual constante do portal citius resulta provado que:
1. Por escritura pública outorgada em vinte e seis de novembro de dois mil e um, os executados celebraram com a exequente um contrato de mútuo com hipoteca, a que corresponde o empréstimo bancário nº ...85.
2. No âmbito do contrato de mútuo referenciado em 1, os executados receberam a título de quantia mutuada o montante de € 79.800,00, do qual se confessaram solidariamente devedores e que se obrigaram a pagar à exequente através de 264 prestações mensais e no prazo de 22 anos a contar da data do contrato, acrescido das taxas de juros então acordadas (inicialmente TAE de 5,641%) e nas demais condições estipuladas, destinando-se a financiar a aquisição de habitação própria permanente.
3. Por escritura pública outorgada em vinte e seis de novembro de dois mil e um, os executados celebraram com a exequente um contrato de mútuo com hipoteca, a que corresponde o empréstimo bancário nº ...85.
4. No âmbito do contrato de mútuo referenciado em 3, os executados receberam a título de quantia mutuada o montante de € 43.500,00, do qual se confessaram solidariamente devedores e que se obrigaram a pagar à exequente através de 264 prestações mensais e no prazo de 22 anos a contar da data do contrato, acrescido das taxas de juros então acordadas (inicialmente TAE de 5,641%) e nas demais condições estipuladas, destinando-se a financiar investimentos múltiplos, não especificados, em bens imóveis.
5. Para garantia do bom cumprimento dos mútuos referenciados em 1 e em 3, foram sucessivamente constituídas duas hipotecas sobre o bem imóvel fração autónoma designada “...”, correspondente ao terceiro andar, um fogo, com entrada pelo lote ..., destinado a habitação, do prédio urbano, constituído em propriedade horizontal, sito na Avenida ..., lotes ..., ... e ..., na freguesia ... (...), concelho ..., descrito na ... Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...69, da referida freguesia e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...80º, da freguesia ..., ..., registadas a favor da exequente pelas apresentações AP. ...4 de 2001/10/15 e AP. ...5 de 2001/10/15 e para garantia dos capitais mutuados [de € 79.800,00 e de € 43.500,00], dos respetivos juros anuais contratualmente acordados até 9,544%, e, em caso de mora, acrescidos de sobretaxa de mora, ao ano, a título de cláusula penal, bem como das despesas até aos montantes de € 3.192,00 e de € 1.740,00, com de cláusula penal, bem como das despesas até aos montantes de € 3.192,00 e de € 1.740,00, com os montantes máximos assegurados de € 115.416,34 e de € 62.914,92.
6. Por documentos particulares outorgados em 23 de julho de 2015 os executados e a exequente acordaram a introdução de diversas alterações ao clausulado dos contratos de mútuo referenciados em 1 e em 3, nomeadamente o alargamento do prazo de reembolso para 41 anos e, no empréstimo mencionado em 1, com fixação do capital em dívida no valor global de € 87.386,50 e alteração da finalidade para habitação secundária, entre outras alterações.
7. Os executados, apesar de instados pela exequente por diversas vezes, não efetuaram o pagamento da prestação mensal vencida em 26/12/2021, nem das seguintes no empréstimo nº ...85, e em 26/08/2022, nem das seguintes no empréstimo nº ...85, sendo os contratos resolvidos e as quantias vincendas antecipadamente vencidas em 24/10/2022, mantendo-se a situação de incumprimento contratual.
8. Por escritura pública outorgada em treze de setembro de dois mil e quatro, os executados celebraram com a exequente um contrato de mútuo com hipoteca, a que corresponde o empréstimo bancário nº ...85.
9. No âmbito do contrato de mútuo referenciado em 8, os executados receberam a título de quantia mutuada o montante de € 125.000,00, do qual se confessaram solidariamente devedores e que se obrigaram a pagar à exequente através de 300 prestações mensais e no prazo de 25 anos a contar da data do contrato, acrescido das taxas de juros então acordadas (inicialmente TAE de 4,334%) e nas demais condições estipuladas, destinando-se a financiar a aquisição de habitação própria permanente.
10. Por escritura pública outorgada em treze de setembro de dois mil e quatro, os executados celebraram com a exequente um contrato de mútuo com hipoteca, a que corresponde o empréstimo bancário nº ...85.
11. No âmbito do contrato de mútuo referenciado em 10, os executados receberam a título de quantia mutuada o montante de € 77.500,00, do qual se confessaram solidariamente devedores e que se obrigaram a pagar à exequente através de 300 prestações mensais e no prazo de 25 anos a contar da data do contrato, acrescido das taxas de juros então acordadas (inicialmente TAE de 4,334%) e nas demais condições estipuladas, destinando-se a financiar investimentos múltiplos, não especificados, em bens imóveis.
12. Para garantia do bom cumprimento dos mútuos referenciados em 8 e em 10, foram sucessivamente constituídas duas hipotecas sobre o seguinte bem imóvel prédio urbano, composto de casa de cave, ... e andar e logradouro, sito em ..., na Freguesia ..., Concelho ..., descrito na ... Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...98, da referida freguesia e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...74º, da referida freguesia, registadas a favor da exequente através das inscrições correspondentes às apresentações AP. ...5 de 2004/08/27 e AP. ...6 de 2004/08/27 – Hipotecas Voluntárias, para garantia dos capitais mutuados [de € 125.000,00 e de € 77.500,00], dos respetivos juros anuais contratualmente acordados até 8,246%, e, em caso de mora, acrescidos de sobretaxa de mora, ao ano, a título de cláusula penal, bem como das despesas até aos montantes de € 5.000,00 e de € 3.100,00, com os montantes máximos assegurados de € 175.922,50 e de € 109.071,95.
13. Por documentos particulares outorgados em 23 de julho de 2015, os executados e a exequente acordaram a introdução de diversas alterações ao clausulado dos contratos mencionados em 8 e em 10, nomeadamente o alargamento do prazo de reembolso para 38 anos e o diferimento parcial de pagamento do capital para a última prestação contratada, entre outras alterações.
14. Os executados, apesar de instados pela exequente por diversas vezes, não efetuaram o pagamento da prestação mensal vencida em 13/02/2022, nem das seguintes no empréstimo nº ...85, e em 13/06/2022, nem das seguintes no empréstimo nº ...85, pelo que os contratos foram considerados resolvidos e as quantias vincendas antecipadamente vencidas em 24/10/2022, mantendo-se a situação de incumprimento contratual.
15. Em 4 de novembro de 2022, a exequente elaborou um documento particular que denominou de “Nota de débito n.º ...22”, no qual contabilizou a dívida relativa ao contrato nº ...85 no montante global de € 82.393,89 (oitenta e dois mil trezentos e noventa e três euros e oitenta e nove cêntimos), sendo a dívida de capital de € 80.503,84, os juros vencidos, contabilizados desde 26/12/2021 a 04/11/2022, de € 1.740,13; e as comissões devidas no montante de € 149,92.
16. Às quantias mencionadas em 15, a partir de 5 de novembro de 2022, acrescem os juros vincendos calculados à taxa anual de 5,662% até ao integral e efectivo pagamento da dívida.
17. Em 4 de novembro de 2022, a exequente elaborou um documento particular que denominou de “Nota de débito n.º ...22, no qual contabilizou a dívida relativa ao contrato nº ...85), no montante global de € 36.133,05 (trinta e seis mil cento e trinta e três euros e cinco cêntimos), sendo a dívida de capital de € 35.842,89, juros vencidos, contabilizados desde 26/08/2022 a 04/11/2022, de € 260,66, e as comissões devidas de € 29,50.
18. Às quantias mencionadas em 17, a partir de 5 de novembro de 2022, acrescem os juros vincendos calculados à taxa anula de 6,162% até ao integral e efectivo pagamento da dívida.
19. Em 4 de novembro de 2022, a exequente elaborou um documento particular que denominou de “Nota de débito n.º ...22, no qual contabilizou a dívida relativa ao contrato nº ...85), no montante global de € 112.901,49 (cento e doze mil novecentos e um euros e quarenta e nove cêntimos), sendo a dívida de capital de € 110.694,48, os respetivos juros vencidos, contabilizados desde 13/02/2022 a 04/11/2022, de € 2.047,43; e as comissões devidas de € 159,56.
20. A partir de 5 de novembro de 2022, à quantia mencionada em 19, acrescem os juros vincendos calculados à taxa anual de 5,662% até ao integral e efetivo pagamento da dívida.
21. Em 4 de novembro de 2022, a exequente elaborou um documento particular que denominou de “Nota de débito n.º ...22, no qual contabilizou a dívida relativa ao contrato n.º ...85), no montante global de € 71.933,86 (setenta e um mil novecentos e trinta e três euros e oitenta e seis cêntimos), sendo a dívida de capital de € 70.804,53, os respetivos juros vencidos, contabilizados desde 13/06/2022 a 04/11/2022, de € 1.053,36, e as comissões devidas de € 75,97.
22. A partir de 5 de novembro de 2022, à quantia referenciada em 21., acrescem os juros vincendos calculados à taxa anual de 6,162% até ao integral e efectivo pagamento da dívida.
23. Em 20.12.2022, foram penhorados o “(…) Prédio urbano, composto de casa de cave, ... e andar e logradouro, destinada a habitação, sito em Lugar ..., ..., ..., ..., descrito na 1ª Conservatória ... sob o nº ...98, da Freguesia ..., Concelho ... e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o nº ...74 (…)” e a “(…) Fracção ..., correspondente ao terceiro andar,um fogo, destinada a habitação, que faz parte do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito no Parque ..., ..., ..., descrito na ... Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...69, da freguesia ... (...), concelho ... e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o nº ...80 da União das Freguesias ... (..., ... e ...). (…)”, que deu lugar à apresentação n.º 415 de 30.11.2022.
24. A embargante e seu marido têm dois filhos menores deficientes que requerem cuidados especiais que representam encargos acrescidos para o agregado familiar.
25. O marido da embargante é motorista e desde 2015 é o único rendimento do agregado familiar.
26. Em consequência do referenciado em 1 a 22, a embargante e seu marido encontram-se numa situação iminente de insolvência e vivem num clima de medo, ansiedade, angústia e incerteza em relação ao futuro, condicionando-os no normal desenvolvimento do modo de vida de todo o agregado familiar.
27. A embargada e o seu marido ficaram limitados no seu poder de compra de bens essenciais ao agregado familiar.
28. As dificuldades económicas vividas nos últimos anos, levaram a embargante e seu marido à decisão de colocar à venda um dos prédios penhorados nos presentes autos.
29. O registo da penhora mencionada em 23 inviabilizou a venda do prédio urbano composto por casa, cave, ..., e logradouro, sito na Rua ..., da Freguesia ..., Concelho ..., descrito na ... Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...98, e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...74, da Freguesia ..., o que acarreta riscos para o futuro imediato, isto é, para a sobrevivência da família da Embargante, com a iminência de despejo.
B. FACTOS NÃO PROVADOS: inexistem com relevo para a presente decisão.
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IV. Do direito:
Aqui chegados importa aos autos dar resposta às questões suscitadas pelos recorrentes e enumeradas em sede de objeto do recurso.
Assim sendo, importa aferir, antes de mais se, perante os factos alegados no requerimento executivo pela exequente, embargada e documentação junta, se devem entender não confessados os factos alegados pelos executados, embargantes no seu requerimento de oposição.
Efetivamente, perante os embargos deduzidos pelos executados/embargantes e face à não apresentação de contestação, por parte da exequente/embargada, devidamente notificada para o efeito, foram os factos alegados considerados assentes, sendo a embargante executada notificada para os termos constantes do nº 2 do artigo 567º do Código de Processo Civil.
Ora, os embargos de executado constituem um modo de oposição à execução, sendo através dos mesmos que aquele procura demonstrar que a obrigação documentada no título trazido à execução não pode subsistir.
Efetivamente, citado o executado recebe, nos termos do disposto no artº 227º, nº 1 do Código de Processo Civil, o duplicado do requerimento inicial e cópias do titulo executivo e documentos que o acompanham, para, em 20 dias pagar ou se opor à execução, nos termos do disposto no nº 6, do artº 726º do Código de Processo Civil.
Assim, a oposição à execução é o meio processual pelo qual o executado exerce o seu direito de defesa perante o pedido do exequente, visando a extinção da execução, mediante o reconhecimento da actual inexistência do direito exequendo ou da falta dum pressuposto, específico ou geral, da acção executiva, conforme refere o Dr José Lebre de Freitas, in A Acção Executiva, pág. 141.
Ora, como refere o Dr Rui Pinto, in Acção Executiva, 2020, Reimpressão, Almedina, pág. 366 se “Na ação declarativa o direito de defesa corporiza-se num ato, quase sempre articulado – a contestação – e visa obviar à declaração do direito alegado pelo autor.”, “Já na ação executiva o direito de defesa não pode ser reduzido à simples contestação, seja pelo conteúdo, seja pela sua expressão processual”, sendo que “quanto ao conteúdo (…) o direito de defesa corporiza-se num pedido de extinção da execução (cf. artigo 732º, nº 4) com fundamentos que para os títulos diversos de sentença, além de mais restritos, se aproximam dos fundamentos do recurso de revisão por ilegalidade e das ações de reabertura do contraditório, i.e., dos meios de defesa contra uma decisão judicial”, “Processualmente, a defesa do executado não integra o procedimento de execução: tem a natureza e a função de uma petição inicial que impulsiona uma ação declarativa, incidental à execução, fisicamente correndo por apenso”.
Diversamente da contestação da acção declarativa, a oposição por embargos de executado, constitui, do ponto de vista estrutural, algo de extrínseco à ação executiva, toma o carácter de uma contra-acção tendente a obstar à produção dos efeitos do título executivo e (ou) da acção que nele se baseia, conforme refere o Dr José Lebre de Freitas, na obra atrás citada, págs. 156/157.
É pois, ao embargante que incumbe, nos termos do nº 2 do artº 342º do Código de Processo Civil, o ónus da prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito que, pelos embargos, pretende fazer valer contra o exequente.
Ora, recebidos os embargos, resulta do nº 2 do artº 732º do Código de Processo Civil que é o exequente notificado para contestar, dentro de 20 dias, seguindo-se, sem mais articulados, os termos do processo declarativo.
Dispõe porém o nº 3, do preceito citado que “à falta de contestação dos embargos é aplicável o disposto no n.º 1 do art.º 567.º e no art.º 568.º, não se considerando, porém, confessados os factos que estiverem em oposição com os expressamente alegados pelo exequente no requerimento executivo.”.
Ou seja, a falta de contestação dos embargos produz os efeitos cominatórios previstos para o processo declarativo, não se considerando, porém, confessados os factos que estejam em oposição com os expressamente alegados no requerimento executivo, explicando-se tal regime, conforme referem os Drs Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Vol II, Almedina, pág. 90, “(…) porque o titulo executivo estabelece a presunção da existência do direito de crédito, de modo que os factos impeditivos, modificativos ou extintivos da obrigação exequenda invocados na petição inicial de embargos se encontrarão, virtualmente contraditados pelos factos constitutivos do direito exequendo vertidos no requerimento executivo”. Esta especificidade aplicável aos embargos de executado faz com que o julgador, para ajuizar se os factos articulados pelo embargante, devem ou não ser considerados confessados nos termos do disposto nos artºs 732º, nº 3 e 567º, nº 2 do Código de Processo Civil, “(…)tenha de valorar se os factos adiantados pelo exequente, deduzidos na sua petição executiva, contrariam já a alegação do executado manifestada no articulado de embargos; e só se este circunstancialismo jurídico-processual se não confirmar é que se poderá lançar mão da disciplina ínsita naqueles preceitos legais e julgar confessados os factos assim expostos”, conforme refere o Acordão da Relação do Porto de 10 de Julho de 2019, relatado pelo Sr Desembargador Paulo Dias da Silva, in www.dgsi.pt.
Revertamos aos autos.
No seu requerimento inicial a exequente/embargada, peticionando o pagamento da quantia global de € 303.362,29 (trezentos e três mil e trezentos e sessenta e dois euros e vinte e nove cêntimos) e ainda, o pagamento dos juros de mora vincendos à taxa de 5,662%, ao ano, a calcular sobre o valor líquido (capital vencido) nos empréstimos nºs ...85 (€ 80.503,84) e ...85 (€ 110.694,48), e de 6,162%, ao ano, a calcular sobre o valor líquido (vg. capital vencido) nos empréstimos nºs ...85 (€ 35.842,89) e ...85 (€ 70.804,53), bem como o Imposto de Selo, se aplicável, e as despesas e custas judicias incorridas até integral pagamento da dívida, vem alegar ter celebrado com os executados, a 26 de novembro de 2001 e 13 de setembro de 2004, quatro contratos de mútuo bancário, com hipoteca, dois em cada ocasião, internamente identificados como ...85, ...85, ...85 e ...85, contratos cujos clausulados foram revistos em 23 de julho de 2015.
Contudo, as prestações vencidas, respectivamente em 26 de dezembro de 2021, em 26 de agosto de 2022, em 13 de fevereiro de 2022 e em 13 de junho de 2022, não foram pontualmente liquidadas, motivos pelos quais em 24 de outubro de 2022, foram todos os contratos de mútuo bancário, com hipoteca, celebrados considerados resolvidos, com todas as consequências legais.
Ora, este circunstancialismo fáctico, contrapondo-se às razões aduzidas em sua defesa pelos executados/embargantes que para além de alegarem que a exequente embargada não juntou qualquer documento que demonstre a liquidação da dívida reclamada, designadamente, o plano de pagamento com os valores das prestações desagregados de capital e de juros e a referência à taxa Euribor aplicada, o que redunda na inexigibilidade da dívida, entregaram, montantes que justificam a amortização de um capital muito superior ao registado.
Mais alega que, quanto ao contrato de mútuo número ...85, não foi feita qualquer referência ao montante mutuado, enquanto no contrato de mútuo número ...85, os valores a título de capital lá consignados não correspondem aos reais montantes em dívida, o que gera a nulidade de tais clausulados com a inerente obrigação de restituição das quantias pagas pela embargante executada, acrescida de juros de mora.
Montantes que requer sejam compensados nos empréstimos números ...85 e ...85, após recálculo das quantias devidas.
Pelo que a falta de contestação dos embargos não pode determinar a confissão dos factos alegados pelos executados/embargantes e que sejam contrários ao alegado no requerimento executivo.
Aqui chegados importa aos autos aferir se tinha o Tribunal recorrido todas as condições jurídico processuais para não decretar a verificação da exceção nominada de iliquidez da obrigação exequenda, não só porque os elementos de prova em que sustentou a sua convicção lhe permitiam uma conclusão diversa, como também porque, contrariamente ao afirmado, não formulou qualquer convite dirigido à sua concreta sanação.
Ora, no caso sub judice, veio o exequente, embargado dar à execução quatro escrituras públicas de mútuo, a saber:
a)escritura pública outorgada em vinte e seis de novembro de dois mil e um, os executados celebraram com a exequente um contrato de mútuo com hipoteca, a que corresponde o empréstimo bancário nº ...85, sendo que, no âmbito do contrato de mútuo referenciado, os executados receberam a título de quantia mutuada o montante de € 79.800,00, do qual se confessaram solidariamente devedores e que se obrigaram a pagar à exequente através de 264 prestações mensais e no prazo de 22 anos a contar da data do contrato, acrescido das taxas de juros então acordadas (inicialmente TAE de 5,641%) e nas demais condições estipuladas, destinando-se a financiar a aquisição de habitação própria permanente.
b)escritura pública outorgada em vinte e seis de novembro de dois mil e um, os executados celebraram com a exequente um contrato de mútuo com hipoteca, a que corresponde o empréstimo bancário nº ...85, sendo que, no âmbito do contrato de mútuo referenciado, os executados receberam a título de quantia mutuada o montante de € 43.500,00, do qual se confessaram solidariamente devedores e que se obrigaram a pagar à exequente através de 264 prestações mensais e no prazo de 22 anos a contar da data do contrato, acrescido das taxas de juros então acordadas (inicialmente TAE de 5,641%) e nas demais condições estipuladas, destinando-se a financiar investimentos múltiplos, não especificados, em bens imóveis.
Por documentos particulares outorgados em 23 de julho de 2015 os executados e a exequente acordaram a introdução de diversas alterações ao clausulado dos contratos de mútuo referenciados em 1 e em 3, nomeadamente o alargamento do prazo de reembolso para 41 anos e, no empréstimo mencionado em 1, com fixação do capital em dívida no valor global de € 87.386,50 e alteração da finalidade para habitação secundária, entre outras alterações.
c)escritura pública outorgada em treze de setembro de dois mil e quatro, os executados celebraram com a exequente um contrato de mútuo com hipoteca, a que corresponde o empréstimo bancário nº ...85, sendo que, no âmbito do contrato de mútuo referenciado, os executados receberam a título de quantia mutuada o montante de € 125.000,00, do qual se confessaram solidariamente devedores e que se obrigaram a pagar à exequente através de 300 prestações mensais e no prazo de 25 anos a contar da data do contrato, acrescido das taxas de juros então acordadas (inicialmente TAE de 4,334%) e nas demais condições estipuladas, destinando-se a financiar a aquisição de habitação própria permanente.
d)escritura pública outorgada em treze de setembro de dois mil e quatro, os executados celebraram com a exequente um contrato de mútuo com hipoteca, a que corresponde o empréstimo bancário nº ...85, sendo que, no âmbito do contrato de mútuo referenciado, os executados receberam a título de quantia mutuada o montante de € 77.500,00, do qual se confessaram solidariamente devedores e que se obrigaram a pagar à exequente através de 300 prestações mensais e no prazo de 25 anos a contar da data do contrato, acrescido das taxas de juros então acordadas (inicialmente TAE de 4,334%) e nas demais condições estipuladas, destinando-se a financiar investimentos múltiplos, não especificados, em bens imóveis.
Por documentos particulares outorgados em 23 de julho de 2015, os executados e a exequente acordaram a introdução de diversas alterações ao clausulado dos contratos mencionados em 8 e em 10, nomeadamente o alargamento do prazo de reembolso para 38 anos e o diferimento parcial de pagamento do capital para a última prestação contratada, entre outras alterações.
Ou seja, os documentos dados à execução pela exequente/embargada tem força executiva resultante da al. b), do nº 2 do artº 703º do Código de Processo Civil e que, como referem os Drs Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Vol II, Almedina, pág. 15 e 16 “Nas palavras de Castro Mendes (…)constitui a “chave que abre a porta da ação executiva”, o que pode também traduzir-se na afirmação de que o título executivo é o “bilhete de ingresso” na ação executiva, de tal modo que, independentemente de quaisquer circunstâncias, não haverá ação executiva sem título executivo”.
Face aos títulos executivos dados à execução, presume-se a existência da obrigação nos mesmos configurada, sendo certo que, como referem os autores atrás citados, a pág 41, da obra citada, “(…)a demanda executiva implica outras condições: que a obrigação seja certa, exigível e liquida”.
Efetivamente, decorre do artº 713º do Código de Processo Civil que “a execução principia pelas diligências, a requerer pelo exequente, destinadas a tornar a obrigação certa, exigível e liquida, se o não for em face do título executivo”.
Ou seja, o direito a uma prestação, para poder ser objeto de uma execução deve corresponder a uma obrigação que o executado deva cumprir ao tempo da citação e que se mostre qualitativa e quantitativamente determinada.
Assim, a obrigação é certa quando esteja qualitativamente determinada, ainda que por liquidar ou individualizar, o que ocorre nas obrigações genéricas ou alternativas; a obrigação é exigível quando se encontra vencida, o seu vencimento depende de interpelação do devedor (artº 777º, nº 1 do Código Civil) e este já foi interpelado extrajudicialmente, ou não o sendo, é interpelado através da citação; a obrigação é ilíquida quando não se encontra determinada em relação à sua quantidade, carecendo da efetivação de cálculos aritméticos ou da alegação de factos que, submetidos ao contraditório, permitam a sua quantificação (artº 716º do CPC) (neste sentido os Autores e obra atrás citada, pág. 41.
Conforme resulta dos autos veio a exequente/embargada deduzir execução para pagamento de quantia certa contra os executados/embargantes, dando à execução quanto contratos de mútuo bancário, com hipoteca, dois em cada ocasião, internamente identificados como ...85, ...85, ...85 e ...85, contratos cujos clausulados foram revistos em 23 de julho de 2015, alegando que as prestações vencidas, respectivamente em 26 de dezembro de 2021, em 26 de agosto de 2022, em 13 de fevereiro de 2022 e em 13 de junho de 2022, não foram pontualmente liquidadas, motivos pelos quais em 24 de outubro de 2022, foram todos os contratos de mútuo bancário, com hipoteca, celebrados considerados resolvidos, com todas as consequências legais.
Alega o mesmo que, como os executados supra identificados não pagaram voluntariamente, instauraram a competente e presente acção para cobrança coerciva, ascendendo o capital total em dívida ao montante de € 297.845,74 (duzentos e noventa e sete mil e oitocentos e quarenta e cinco euros e setenta e quatro cêntimos) e os juros de mora vencidos à quantia de € 5.516,55 (cinco mil quinhentos e dezasseis euros e cinquenta e cinco cêntimos).
Pediu, ainda, o pagamento dos juros de mora vincendos à taxa de 5,662%, ao ano, a calcular sobre o valor líquido (capital vencido) nos empréstimos nºs ...85 (€ 80.503,84) e ...85 (€ 110.694,48), e de 6,162%, ao ano, a calcular sobre o valor líquido (vg. capital vencido) nos empréstimos nºs ...85 (€ 35.842,89) e ...85 (€ 70.804,53), bem como o Imposto de Selo, se aplicável, e as despesas e custas judicias incorridas até integral pagamento da dívida.
Deduzidos embargos de executado peticionou-se que fosse declarada a inexigibilidade da dívida, porquanto para além da exequente embargada não juntar qualquer documento que demonstre a liquidação da dívida reclamada, designadamente, o plano de pagamento com os valores das prestações desagregados de capital e de juros e a referência à taxa Euribor aplicada, o que redunda na inexigibilidade da dívida, entregou, a par com o seu marido, também executado, montantes que justificam a amortização de um capital muito superior ao registado.
Salvo o devido respeito por contrária opinião e concordando, nesta parte, com a decisão em crise, apesar de, da alegação dos executados/embargantes, se enunciar a inexigibilidade da obrigação, resulta sim a invocação de que a mesma se mostra ilíquida.
Ora, como se refere na decisão em crise, “(…)considerando que o Tribunal não está adstrito à qualificação jurídica operada pelas partes, como decorre do disposto no artigo 5.º, n.º 3, do CPC, mantendo, incólume o substracto jurídico alegado pelas partes, a mesma passa a ser apreciada sobre a perspectiva adjectiva da verificação do pressuposto processual conexo com a liquidação da obrigação exequenda”.
Como refere o Dr Rui Pinto, in Acção Executiva, 2020, Reimpressão, Almedina, pág. 240 “(…)a liquidez é a qualidade da obrigação que esteja quantitativamente determinada. O acertamento da obrigação cujo objeto não esteja quantificado em face do título é um dos pressupostos da execução, já que ele irá dar medida do ataque ao património do executado – cf. o principio da proporcionalidade estabelecido no artº 735, nº 3”, o que impede o exequente de formular pedido ilíquido, sem proceder à sua liquidação, liquidação que, nos termos do nº 1 do artº 10º do Código de Processo Civil, será levada a cabo “dentro dos limites que lhe são fixados pelo título executivo”.
E continua aquele Autor, na obra citada, pág. 244 “Toda a liquidação consiste num conjunto de operações de cálculo aritmético, mas, necessariamente, um cálculo aritmético juridicamente relevante, tanto nos factos em que assenta, como nos efeitos que dele decorrem. Ora, a diferente natureza jurídica dos factos em que assente, determina o seu regime processual sedeado no artigo 716º, em articulação, quando necessário, com os artigos 358º a 361º”.
Assim pode a liquidação ser feita por simples cálculo aritmético quando assenta em factos abrangidos pela segurança do título ou que o Tribunal pode conhecer oficiosamente (factos notórios), como é o caso dos juros moratórios.
Tal liquidação tem de ser feita pelo exequente no requerimento executivo podendo o valor liquidado ser impugnado em sede de oposição à execução.
A liquidação pode não depender de simples cálculo aritmético quando assenta em factos que, por não estarem abrangidos pela segurança do título ou não serem notórios e, como tal, não poderem ser conhecidos oficiosamente pelo Tribunal, se mostram passíveis de controversão.
Ora, efetivamente, como flui da decisão em crise, aqui chegados, pode concluir-se, “(…)ante a factualidade supra dada como provada que, as obrigações pecuniárias cujo pagamento coercivo se pretende obter com a instauração da presente acção, são liquidáveis quer por simples cálculo aritmético, quanto aos juros de mora vincendos, quer por operações de liquidação mais robustas que passam, após determinação do valor de cada prestação, de acordo com a taxa de juro vigente à data de cada vencimento, pela aplicação do critério suplectivo previsto nos artigos 784.º e 785.º do Código Civil. Isto é, como a própria exequente embargada admite ao longo do requerimento executivo, a taxa de juro aplicável ao longo da execução contratual voluntária dos termos acordados era variável, pois é a própria que emprega as expressões “8…) acrescido das taxas de juros então acordadas (inicialmente TAE de 5,641%) (…)” e “(…) acrescido das taxas de juros então acordadas (inicialmente TAE de 4,334%) (…)”. Variabilidade que, consequentemente, vai se reflectir em sede de montante peticionado a título de juros e de capital, pois cada prestação pecuniária mensalmente liquidada, era variável consoante a taxa vigente à data do seu vencimento”.
Ora, a 5 de dezembro de 2023 foi a exequente/embargada notificada para “(…) juntar aos autos o plano de reembolso de cada um dos créditos hipotecários, na sequência da renegociação dos mesmos, com indicação dos montantes das prestações, juros a pagar por cada prestação, outros custos incluídos na prestação (se for caso disso), capital reembolsado por prestação e capital em dívida após cada prestação (…)”
Em cumprimento do ordenado veio a mesma juntar:
a)o Extrato de vencimento das prestações – que inclui a data e montante da prestação, os juros a pagar e outros custos incluídos na prestação e respetivas taxas aplicadas;
b)o extrato da cobrança das prestações – que inclui a data da cobrança, capital reembolsado por prestação e capital em dívida após cada prestação … e outros dados adicionais e relevantes como juros reembolsados, remuneratórios e de mora, comissões de pagamento fora de prazo, etc.
Adicionalmente a Exequente junta uma folha elaborada em Excel com o extrato da cobrança das prestações para facilitar a visualização por cada empréstimo.
Notificados dos mesmos documentos, os executados/embargantes impugnaram os montantes ali referidos.
Diga-se pois que, se quanto à quantia global de € 303.362,29 (trezentos e três mil e trezentos e sessenta e dois euros e vinte e nove cêntimos), relativa ao capital total em dívida ao montante de € 297.845,74 (duzentos e noventa e sete mil e oitocentos e quarenta e cinco euros e setenta e quatro cêntimos) e os juros de mora vencidos à quantia de € 5.516,55 (cinco mil quinhentos e dezasseis euros e cinquenta e cinco cêntimos), dúvidas não existem de que a mesma se encontra liquidada, quantitativamente determinada (embora quanto a estes últimos não é possível ao Tribunal aferir das taxas de juro aplicadas e da forma como foram os mesmos calculados). E o mesmo se diga quanto às comissões peticionadas pela exequente. O seu montante encontra-se liquidado pelo exequente, desconhecendo-se, porque tal não é mencionado de onde resultam as mesmas, de que comissões se trata.
Já quanto ao pagamento dos juros de mora vincendos à taxa de 5,662%, ao ano, a calcular sobre o valor líquido (capital vencido) nos empréstimos nºs ...85 (€ 80.503,84) e ...85 (€ 110.694,48), e de 6,162%, ao ano, a calcular sobre o valor líquido (vg. capital vencido) nos empréstimos nºs ...85 (€ 35.842,89) e ...85 (€ 70.804,53), bem como o Imposto de Selo, se aplicável, e as despesas e custas judicias incorridas até integral pagamento da dívida, os autos não nos permitem conhecer qual a quantia que o exequente/embargado pretende obter com a execução, até à data da entrada em juízo do requerimento inicial, sendo certo que, o seu montante depende unicamente de cálculos aritméticos que incumbe ao exequente proceder (e não deixar para os executados e para o Tribunal calcular), não se podendo dizer que a mesma resulta dos documentos juntos na sequência do despacho de 5 de dezembro de 2023, uma vez que na resposta dada, não conseguiu a exequente/embargada indicar o montante exato da mesma. Temos pois, nesta parte e apenas nesta parte, ilíquida a obrigação exequenda.
Ora, conforme resulta do nº 8 do artº 716º do Código de Processo Civil “se uma parte da obrigação for ilíquida e outra liquida, pode esta executar-se imediatamente”.
Ou seja, quanto à parte liquida da obrigação, nada obstava, ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, o prosseguimento dos autos, a saber, dos embargos, no que ao montante concretamente devido ao exequente/embargado, e isto porque impugnaram os executados/embargantes aquele montante (o que como atrás já se referiu, se mostra legítimo), invocando pagamentos efetuados (mas não concretizados).
Assim sendo, devem os autos, nesta parte prosseguir para se apurar das quantias efetivamente pagas pelos executados (e a quem cabe alegar e demonstrar as mesmas), e, posteriormente, aplicar os critérios fixados em cada contrato às prestações devidas.
E a assim ser, nesta parte se julga procedente o recurso da exequente/embargada. Assim sendo, vejamos, do atrás referido, as consequências para os autos: 1. Liquidados que se encontram o capital, juros vencidos e as comissões, vieram os embargantes no seu requerimento de embargos alegar, para o efeito que, além da exequente embargada não juntar qualquer documento que demonstre a liquidação da dívida reclamada, designadamente, o plano de pagamento com os valores das prestações desagregados de capital e de juros e a referência à taxa Euribor aplicada, o que redunda na inexigibilidade da dívida, entregaram, montantes que justificam a amortização de um capital muito superior ao registado. Ou seja, no âmbito dos embargos foi invocado pagamento de parte do capital peticionado que não terá sido tido em conta na liquidação do mesmo. Da leitura do requerimento de embargos não resulta, porém, porque tal não é invocado pelos embargantes, quais os montantes que estes terão pago para além daqueles que a exequente aceita como tendo sido e, por tal motivo, não fazerem parte da quantia exequenda. Ora, comoreferem os Drs Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Vol II, Almedina, pág. 77 “a apresentação de um documento dotado de força executiva justifica a presunção de existência e persistência do direito de crédito nele configurado e da correspetiva obrigação (…).Mas isso não afasta a possibilidade de tal presunção ser rebatida pelo executado, sendo os embargos o mecanismo ajustado a combater execuções injustas ou destituídas dos respetivos pressupostos gerais ou específicos”. Assim, iniciam-se os embargos de executado com uma petição na qual os executados/embargantes devem alegar os factos que fundamentam a oposição à execução, culminando num pedido que pode traduzir-se na extinção parcial ou total da instância executiva. Ou seja, cabe ao embargante no âmbito da petição inicial de embargos alegar os factos ou razões de direito que conduzam à inexistência, modificação ou extinção da obrigação exequenda. Como referem os autores atrás citados, na obra e página referida “Apesar de a lei nada referir acerca da petição, não se duvida que, tratando-se de uma peça processual com que se inicia um procedimento declarativo, deve buscar-se o seu regime nas regras da ação declarativa”. Assim sendo, cabe ao embargante expor os factos essenciais que constituem a causa de pedir e as razões de direito que servem de fundamento à oposição à execução. Encontrando-se o nosso sistema processual civil marcado pela teoria da substanciação, torna-se exigível, também no âmbito dos embargos de executado, a indicação específica ou concreta dos factos que constituem o direito que se pretende fazer valer ou que se opõe ao direito que o exequente/embargado pretende fazer valer. Assim sendo, o cumprimento do ónus da alegação não se basta com a mera alegação do direito em causa ou com a reprodução da norma ou normas jurídicas de que aquele emana, mas sim com a alegação especifica e concreta dos factos que o conformam. Ora, no caso sub judice e como já atrás se referiu, vieram os embargantes alegar mais pagamentos de capital do que aqueles que a exequente terá assumido, sendo certo que, não indicam quais os concretos montantes pagos e as datas em que os mesmos terão ocorrido. Ou seja, incidindo sobre os mesmos o ónus da alegação de factos que servem de fundamento à oposição à execução, não deram os embargantes cumprimento ao mesmo, uma vez que se limitaram a alegar genericamente o pagamento. Ora, perante falhas de alegação, como é o caso sub judice, deve ser a parte convidada a providenciar pelo aperfeiçoamento dos articulados, conforme resulta da al. b) do nº 2 e dos nºs 3 e 4 do artº 590º do Código de Processo de Civil.
Assim sendo, antes de mais, e tendo sido invocado, pelos embargantes/executados, pagamentos, devem os mesmos ser convidados a aperfeiçoar o seu requerimento de embargos, devendo concretizar tais pagamentos (montantes e datas dos mesmos). 2.Conforme ficou atrás referido, uma vez que, quanto aos juros liquidados não se consegue aferir da forma como alcançou o valor peticionado, deve o embargado/exequente ser convidado a esclarecer qual a taxa de juro aplicada, por referência às cláusulas contratuais e como fez tal cálculo. 3.Também conforme atrás se referiu, apesar de liquidadas, as comissões peticionadas desconhecendo-se, porque tal não é mencionado, de que comissões se trata. Assim, deve o embargado/exequente ser convidado a esclarecer de que comissões se tratam, de onde resultam as mesmas, por referência às cláusulas contratuais. 4.Quanto aos juros vincendos à taxa de 5,662%, ao ano, a calcular sobre o valor líquido (capital vencido) nos empréstimos nºs ...85 (€ 80.503,84) e ...85 (€ 110.694,48), e de 6,162%, ao ano, a calcular sobre o valor líquido (vg. capital vencido) nos empréstimos nºs ...85 (€ 35.842,89) e ...85 (€ 70.804,53), bem como o Imposto de Selo, se aplicável, e as despesas e custas judicias incorridas até integral pagamento da dívida, e uma vez que apenas se não encontram liquidados os juros contados até à data da entrada do requerimento exequendo, dependendo os mesmos de simples cálculo aritmético, deve o embargado/exequente ser convidado a proceder à sua liquidação.
Atento o referido, entendemos prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas, designadamente da questão suscitada pelos executados/embargantes quanto ao pedido de indemnização.
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V. Decisão:
Nestes termos, acordam as Juízas deste Tribunal da Relação julgar parcialmente procedente o recurso do exequente/embargado e, em consequência, revogar a decisão recorrida, ordenando o prosseguimento da execução e dos embargos, designadamente,
a) antes de mais, e tendo sido invocado, pelos embargantes/executados, pagamentos, devem os mesmos ser convidados a aperfeiçoar o seu requerimento de embargos, devendo concretizar tais pagamentos (montantes e datas dos mesmos); b) uma vez que, quanto aos juros liquidados não se consegue aferir da forma como alcançou o valor peticionado, deve o embargado/exequente ser convidado a esclarecer qual a taxa de juro aplicada, por referência às cláusulas contratuais e como fez tal cálculo; c) relativamente às comissões peticionadas deve o embargado/exequente ser convidado a esclarecer de que comissões se tratam, de onde resultam as mesmas, por referência às cláusulas contratuais; d) quanto aos juros vincendos à taxa de 5,662%, ao ano, a calcular sobre o valor líquido (capital vencido) nos empréstimos nºs ...85 (€ 80.503,84) e ...85 (€ 110.694,48), e de 6,162%, ao ano, a calcular sobre o valor líquido (vg. capital vencido) nos empréstimos nºs ...85 (€ 35.842,89) e ...85 (€ 70.804,53), bem como o Imposto de Selo, se aplicável, e as despesas e custas judicias incorridas até integral pagamento da dívida, e uma vez que apenas se não encontram liquidados os juros contados até à data da entrada do requerimento exequendo, dependendo os mesmos de simples cálculo aritmético, deve o embargado/exequente ser convidado a proceder à sua liquidação.
Custas a final.
Guimarães, 14 de novembro de 2024
Relatora: Margarida Pinto Gomes
Adjuntas: Paula Ribas
Fernanda Proença Fernandes