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MARCA
IMITAÇÃO
SINAL DISTINTIVO
Sumário
I. A imitação, bem como o risco de confusão que a integra, são conceitos de Direito, legais e jurisprudenciais, que não factos, realidades constatáveis da vida susceptíveis de prova, designadamente, testemunhal. Encerram juízos conclusivos extraídos do elenco de factos concretos provados. II. Um sinal é descritivo quando o seu significado é imediatamente e sem qualquer reflexão adicional percebido pelo público relevante como fornecendo informação sobre os bens ou serviços assinalados. III. O facto de uma marca ter adquirido um carácter distintivo acrescido (ao inicialmente considerado normal) graças à sua implementação no mercado e a um certo grau de notoriedade junto de determinado público, não dispensa, no confronto com outro sinal, a apreciação da existência e do grau de risco de confusão.
Texto Integral
Acordam na Secção da Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa:
I. Relatório
A PANELITE N.V. instaurou uma acção contra a HILODI – HISTORIC LODGES & DISCOVERIES S.A. pedindo a sua condenação a: (i) abster-se de usar a expressão “CHOCOLATE STORY” independentemente do meio e/ou forma que esse uso possa revestir, nomeada, mas não exclusivamente, como marca, logótipo, nome de domínio, sinalética, publicidade e merchandising, contas de “social media” como por exemplo no Facebook e Instagram, conteúdo de sites oficiais da R., sites de reservas de bilhete, documentação comercial, etc., para designar produtos e/ou serviços como aqueles abrangidos pela marca prioritária da A. (art.º 249º, nº 1, alínea b), 2ª parte e nº 2 alíneas a), b) e e), e artigo 311º, nº 1, alíneas a) e c) do CPI); (ii) no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, no valor a determinar por este Tribunal, mas não inferir a 500€/dia por cada dia que a R. violar o disposto no anterior paragrafo, a contar da data do trânsito em julgado da sentença e até efetivo e integral cumprimento (cfr. art.º 349.º n.º 4 do CPI); (iii) indemnizar a A. no valor final a determinar por este Tribunal com recurso à equidade, tendo designadamente em conta o lucro auferido pela R. com a conduta descrita e as despesas incorridas pela A. descritas neste articulado, à qual devem acrescer os respetivos juros legais de mora a contar desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento, sendo que para esse efeito se requer que este tribunal ordene que a R. venha prestar informações sobre o lucro auferido no estabelecimento denominado “THE CHOCOLATE STORY” ( cfr artigo 347º do CPI); (iv) Por fim deve a R. ser condenada nas custas judiciais e custas de parte.
Julgada a causa, foi proferida sentença condenando a Ré: 1. A abster-se de usar a expressão “CHOCOLATE STORY” independentemente do meio e/ou forma que esse uso possa revestir, nomeadamente como marca, logótipo, nome de domínio, sinalética, publicidade e merchandising, contas de “social media” como por exemplo no Facebook e Instagram, conteúdo de sites oficiais da R., sites de reservas de bilhete, documentação comercial, etc., para designar produtos e/ou serviços como aqueles abrangidos pela marca prioritária da A. 2. A pagar à Autora, a título de indemnização pela violação do direito de exclusivo da Marca da União Europeia registada com o 013647722, o valor de € 8.065,69 (oito mil e sessenta e cinco euros e sessenta e nove cêntimos). Ao valor referido em 2.º acrescem juros de mora à taxa supletiva legal desde a data da citação até integral pagamento (art.º 805.º, nº 3, do Código Civil). Fixa-se a título de sanção pecuniária compulsória pelo incumprimento da obrigação referida em 1.º o montante de € 400,00/dia. Custas a cargo da Ré.
Inconformada com a sentença, dela apelou a HILODI – HISTORIC LODGES & DISCOVERIES, SA, formulando as seguintes conclusões:
A) A Recorrente não se pode conformar com a Sentença proferida em primeira instância, porquanto tal decisão sob censura padece de diversos vícios, que merecem tutela jurisdicional, designadamente, incorrecta interpretação e aplicação dos factos e do direito e falta de Fundamentação.
B) Por isso, interpôs a Recorrente o presente recurso da decisão proferida pelo Tribunal de Primeira Instância.
C) Ao contrário do entendimento expresso na douta sentença Recorrida, a Recorrente não infringe os direitos da Recorrida, nomeadamente os que lhe são conferidos pelo registo de marca da União Europeia.
D) No âmbito das actividades a que se dedica, a Recorrente criou um sinal para assinalar os seus serviços no mercado,
E) Esse sinal, misto, encontra-se protegido pelo registo de marca nacional nº 712016;
F) O registo de marca nacional nº 712026 não contém apenas elementos já protegidos que se encontram já protegidos através registo de maca da União Europeia nº 017886816;
G) A Recorrente faz uso de um sinal composto por elementos nominativos e figurativos, que não podem ser apreciados de forma individual;
H) A análise comparativa entre marcas notórias e marcas comuns não prescinde da verificação do erro ou confusão;
I) Dispõe o art.º 238º do CPI que uma marca se considera imitada ou usurpada por outra, no todo ou em parte quando, cumulativamente se verificarem os seguintes pressupostos:
c) Tenham tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto”.
J) Determina ainda o nº 3 do mesmo art.º 238ºdo CPI que “Considera se imitação ou usurpação parcial de marca o uso de certa denominação de fantasia que faça parte de marca alheia anteriormente registada”.
K) A sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância não teve em consideração o grau de atenção do consumidor, o local de aquisição nem o ambiente que rodeia o consumidor.
L) O juízo comparativo efectuado pelo Tribunal a quo não atendeu à impressão de conjunto dos sinais que são usados pela Recorrente e pela Recorrida.
M) A sentença recorrida reduz a sua fundamentação a decisões tomadas pelo Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia.
N) O sinal que a Recorrente usa no comércio diferencia-se do registo de marca da Recorrida, não a imitando.
O) A discordância da Recorrente reside também no facto de o Tribunal de primeira instância não ter considerado a prova testemunhal;
P) O Tribunal a quo não verificou o depoimento contraditório da testemunha da Recorrida, nomeadamente quanto ao facto de ter (ou não ter) estado no local;
Q) A testemunha da Recorrida mostrou um discurso incoerente e pouco convincente visto não ter conseguido descrever fisicamente o local;
R) A testemunha da Recorrida não conseguiu fazer prova da existência de erro ou confusão por parte do consumidor;
S) A produção de prova sobre confundibilidade faz-se através de factos/meios que a comprovem.
T) A testemunha da Recorrida limitou-se a fundamentar a “sua confusão” na palavra “Story” que é comum aos dois sinais;
U) A testemunha da Recorrida não descreveu o complexo sinal que identifica o local (museu) da Recorrente;
V) O Tribunal a quo não valorou a prova testemunhal da Recorrente;
W) Todas as testemunhas da Recorrente descreveram de forma precisa o local;
X) Todas as testemunhas da Recorrente descreveram a forma complexa como é identificado/assinalado o museu do chocolate;
Y) Nunca houve qualquer ocorrência sobre situações de confundibilidade;
Z) O Tribunal a quo forma a sua convicção com base em prova documental;
AA) A audiência de julgamento mostrou não ter alcançado os seus propósitos;
BB) Tudo considerado, torna-se evidente que do uso dos sinais em apreço não advirão prejuízos, sendo possível manter um tráfego comercial leal e honesto;
CC) Termos em que a sentença proferida pelo Mm Juiz à quo deverá ser substituída por outra que indefira o peticionado pela Recorrida.
A PANELITE N.V. apresentou contra-alegações, concluído o seguinte:
1) A Recorrente coloca em causa a Douta Sentença do Tribunal da Propriedade Intelectual, que julgou procedente a ação, condenando-a nos termos da decisão exarada.
2) A Douta Sentença não merece reparo ou censura, devendo o presente recurso ser julgado improcedente.
3) A Recorrente vem em sede de Recurso de Apelação invocar incorreta interpretação dos factos e aplicação do Direito (relativamente à confusão entre os sinais distintivos), alegando erros de julgamento, e finalmente, dissecando passagens dos depoimentos das testemunhas, os quais não se verificam.
4) O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”, tal como determina o artigo 607º, nº 5 do CPC.
5) Como corolário lógico deste princípio, o que é fundamental é a motivação que subjaz à sentença apelada, consubstanciada no elenco dos factos provados.
6) No caso em apreço, é considerável o elenco dos factos assentes, sendo certo que os mesmos não careceram da prova testemunhal para a sua comprovação, como claramente resulta da Douta Sentença recorrida.
7) À data de propositura da ação, e como a Recorrente muito bem sabe, esta não usava qualquer sinal misto, usava sim a expressão “CHOCOLATE STORY”.
8) O sinal misto a que a Recorrente se refere não é a marca a considerar, uma vez que se trata de uma marca mista, cujo registo a recorrente só pediu no decurso do processo.
9) Cujo registo foi devidamente impugnado, aguardando-se ainda, à presente data, por uma decisão final por parte do Instituto Nacional da Propriedade Industrial.
10) O Tribunal a quo não errou, como a Recorrente sustenta, pois na verdade, não era este sinal misto, que a Recorrente registou já na pendência da causa, após ter tomado conhecimento da ação que contra si foi apresentada pela Autora, o que tem de ser aqui considerado.
11) O que aqui importa relevar é que está correto o entendimento de que o Tribunal a quo forma a sua convicção com base no princípio de que o sinal usado pela Recorrente é um sinal nominativo, porque era efetivamente.
12) Estava em causa, e está, a comparação entre os sinais THE CHOCOLATE STORY vs. CHOCO-STORY.
13) A Recorrente socorre-se da prova gravada para contrariar, impugnar ou pôr em causa as conclusões do Tribunal a quo, concluindo por vários erros de julgamento.
14) Porém, o recurso à prova gravada apenas tem lugar quando a Recorrente impugne a decisão quanto à matéria de facto, nos termos dos artigos 638º, nº 7, e 640º, ambos do CPC, sendo que em nenhum passo da peça processual se descortina a impugnação da matéria de facto.
15) E se assim fosse, devia então a Recorrente especificar, obrigatoriamente, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, e finalmente a decisão que, em seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, o que não fez.
16) Para os devidos efeitos, devem considerar-se como não escritas as alegações da Recorrente no que respeita a passagens da prova gravada.
17) O que está em causa, pois, no presente caso, é saber se o sinal THE CHOCOLATE STORY é idêntico ou semelhante à marca CHOCO-STORY, e se se destina a identificar no mercado produtos e/ou serviços afins aos da marca anterior, havendo assim possibilidade de risco de confusão.
18) No que respeita aos serviços assinalados pelas marcas em confronto os mesmos são idênticos, destinando-se ambos à apresentação de serviços de Museu.
19) Por outro lado, e no que respeita à semelhança entre os sinais marcários, a mesma resulta também manifesta, quer do ponto de vista nominativo, quer conceptual, quer visual: THE CHOCOLATE STORY vs. CHOCO-STORY.
20) A Recorrente pretende iludir este Venerando Tribunal com alegações que não são corretas, comparando, designadamente, um sinal que não usava (nem tinha registado), à data de propositura da ação, com uma versão mista da marca da Recorrida que não foi invocada no processo como marca anterior, da sua titularidade. De facto, a marca da União Europeia da titularidade da Recorrida é a marca nominativa CHOCO-STORY.
21) A marca prioritária da Recorrida adquiriu notoriedade em parte do território Comunitário – particularmente, na Bélgica – onde adquiriu um elevado grau de carácter distintivo, o que aumenta o risco de confusão.
22) A prova testemunhal não é o único meio de prova à disposição do Tribunal, sendo que in casu foi exaustiva a prova documental, e, além do mais, suficiente para a convicção do Tribunal a quo.
23) Não cabe aqui, em sede de recurso de Apelação e sem que a Recorrente impugne a matéria de facto, tecer juízos de valor sobre o depoimento das testemunhas, o que em todo o caso sempre caberia ao Tribunal fazê-lo, não à Recorrente.
24) As considerações da Recorrente neste domínio são inusitadas e impróprias, não cabendo a este Venerando Tribunal da Relação, apreciar depoimentos de testemunhas
25) Havendo factos que, no entender da Recorrente, não foram corretamente julgados, ou se em face da prova produzida outro deveria ter sido o entendimento do Tribunal a quo, à Recorrente só lhe restaria recorrer da matéria de facto, o que não fez!
26) A marca CHOCO-STORY, da titularidade da Autora, beneficia do direito de exclusivo que lhe confere o art.º 9.º do Regulamento (UE) 2017/1001 do Parlamento Europeu e do Conselho, e, tendo adquirido notoriedade junto de parte do público relevante da União Europeia, deve estar protegida contra o risco de confusão, que é, por esse facto, mais elevado, como muito bem sustenta a Douta Sentença recorrida
27) Em suma, pois, andou bem o Tribunal a quo, condenado a Recorrente, devendo a decisão ser mantida in totum.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
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II. Questões a decidir
Nos termos dos artigos 635.º, nº4 e 639.º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de actuação do tribunal, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial. Esta limitação objectiva da actuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (artigo 5.º, nº3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.
Assim, sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões do apelante, as questões a decidir são a impugnação da matéria de facto e o erro de julgamento.
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III. Fundamentação
III.1. Os factos
Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos:
1. A A. é titular, entre outros, da Marca da União Europeia registada com o 013647722, CHOCO-STORY, marca verbal, pedida em 03/02/2015 e concedida em 13/05/2015, e que assinala:
- Na classe 30, Chocolate; Cacau; Produtos de chocolate e de cacau; Aromas de chocolate; Bebidas à base de café; Pós de chocolate para fazer bebidas; Café, Chá, Café aromático, preparações vegetais para substituir o café, Confeitaria, Massa para bolos [pastelaria], Confeitaria, Bolos, Baunilha.
- Na classe 41, Educação; Formação; Divertimento; Atividades desportivas e culturais; Educação, formação e estágios, em especial em matéria de nutrição e nutrientes.
- Na classe 43, Catering.
2. Sob o sinal distintivo CHOCO-STORY, a A. detém e explora museus dedicados ao chocolate, com loja de venda de produtos, possuindo vários estabelecimentos na União Europeia e fora dela e bem assim uma loja online de venda de produtos no endereço eshop.choco-story.com.
3. O primeiro museu CHOCO-STORY foi estabelecido na cidade belga de Bruges em 2004.
4. E mais tarde a Autora abriu estabelecimentos nas cidades de Praga, Paris, Uxmal (México), Valladolid (México 2013), Bruxelas (2014), Beirute (2018) e também em Colmar e Lourdes (França), entre outros.
5. Todos os estabelecimentos contêm sites próprios como eshop.choco-story.com (Loja online) https://choco-story-brugge.be/en/, https://www.choco-story-praha.cz, https://www.museeduchocolat.fr, https://choco-story-brussels.be/, http://choco-storyme.com/(Beirute), https://www.choco-story-colmar.fr, https://www.choco-storymexico.com/en/.
6. Os estabelecimentos da A. “CHOCO-STORY”, visam responder a todas as perguntas relacionadas com o fabrico de chocolate, ao mesmo tempo que trazem à vida a história do chocolate em palavras, imagens e sabores.
7. Com efeito para além de contarem a origem e história do chocolate, com especial atenção para as diversas matérias-primas e processo de produção do passado e do presente, no centro de demonstração os visitantes poderão descobrir o segredo por detrás do chocolate sedoso e provar por si mesmos os produtos de chocolate feitos no local.
8. A R., sociedade constituída em 24.09.2014 tem o seguinte objeto social: “A conceção, criação, construção, gestão, manutenção e exploração de atrações turísticas de elevada qualidade, destinadas a desenvolver o turismo ao nível local e internacional incluindo especificamente a promoção das tradições históricas e dos valores culturais do setor do Vinho do Porto e de outros tipos de vinhos, bem como de outros setores relevantes da atividade nacional e internacional; b) O exercício direto ou indireto de atividades lúdicas, recreativas, desportivas ou culturais, destinadas predominantemente a turistas, que se configurem como atividade de animação e de promoção turística, tais como o turismo cultural ou ao ar livre, designadamente de índole cultural, ambiental, gastronómica, enológica, de lazer e bem estar e de animação; c) A prestação de serviços e organização de eventos recreativos e a exploração de estabelecimentos comerciais, destinados à comercialização de quaisquer produtos relacionados com as atividades referidas, designadamente, lembranças, bebidas alcoólicas, tabacos, artesanato, bijutaria, vestuário, calçado e produtos alimentares; d) A atividade de hotelaria, restauração e diversão em todas as suas modalidades; e) Atividade de promoção imobiliária, nela se incluindo a compra e venda de bens imóveis e a compra para revenda, bem como a revenda dos adquiridos para esse fim, assim como a coordenação, o desenvolvimento, a exploração, a administração e a gestão imobiliária, e ainda a celebração de contratos de arrendamento, o sub-arrendamento e outros tipos de contratos de ocupação, cedência e utilização de bens imóveis, incluindo a cessão da exploração das respetivas atividades, nomeadamente através da exploração de empreendimentos hoteleiros, destinados a proporcionar alojamento temporário e outros serviços acessórios ou de apoio, diretamente ou por terceiros, incluindo mediante a celebração de contratos de franquia ou de cessão de exploração, bem como a afetação de espaços físicos ao lazer e à prática de atividade física com carácter recreativo e de bem estar; f) A gestão, promoção, aquisição, alienação, cessão e, em geral, exploração de direitos de propriedade intelectual e industrial, bem assim como as atividades de gestão da sua carteira de títulos; g) A prestação de quaisquer serviços por alguma forma conexos com qualquer uma das atividades acima elencadas.”
9. A Ré é ainda titular do nome de domínio Wow.pt, com data de registo 19.06.2006, data de expiração 26.05.2024.
10. A Ré explora um museu do chocolate designado por “CHOCOLATE STORY”.
11. Através do conteúdo do website existente sob o referido nome de domínio, redes sociais, e da própria sinalética aposta no exterior e interior do seu estabelecimento, a Ré faz publicidade ao estabelecimento que explora.
12. O estabelecimento explorado pela R., tal como a própria o apresenta no seu website em wow.pt, visa dar a conhecer a história do cacau, revelando os bastidores de uma verdadeira fábrica de chocolate.
13. Toda a comunicação do website está redigida em português e inglês, apelando a um público não exclusivamente português, designadamente o público estrangeiro visitando Portugal.
14. A R. faz ainda publicidade nas redes sociais como o Facebook ao “Chocolate Story”, In https://www.facebook.com/wowporto.
15. A Autora despendeu em assessoria jurídica, análise jurídica, preparação e envio de cartas de interpelação pelo seu agente oficial de propriedade industrial à Ré, a quantia de 2.863,83 EUR.
16. A Autora despendeu ainda a quantia de 201,86€ com a obtenção do certificado notarial junto ao presente como documento numero18.
17. A Ré conta com cerca de 14 registos de marcas nacionais, conforme se comprova pelo Doc. nº 10 extraído da base de dados do INPI.
18. A nível da União Europeia a Ré é titular de 13 registos de marca e 21 desenhos conforme se comprova pelo Doc. nº 11 e nº 12 extraídos da base de dados do EUIPO.
19. O THE CHOCOLATE STORY conta com uma fábrica de chocolate, a qual tem marca própria em nome de “Y NOT CHOCOLATE, S.A”: “20 20 N S” e “VINTE VINTE”, nomeadamente, a marca da União Europeia nº 018136454 e nº 018136731.
20. Os museus da Autora são visitados por inúmeras pessoas todos os anos e são amplamente divulgados entre o público da União Europeia em geral, designadamente em sites e revistas de viagens com indicação de locais de interesse a visitar.
21. Os museus Choco-Story do oponente foram abordados inúmeras vezes na imprensa ao longo dos anos e figuram em muitas listas de itens imperdíveis ao visitar as cidades de Bruges, Bruxelas, Paris e Praga.
22. O museu The Choco-Story Brussels aparece entre os cinco museus mais visitados pelos portadores do Brussels Card (que é usado por 100 nacionalidades diferentes).
23. Dos extratos que se juntam das contas anuais da A. resultando os seguintes resultados e lucros de 2018 e 2019 e 2020 e 2021:
Ano
Resultado bruto €
Lucro €
Documento
2018
3.026.739
795.627
8
2019
3.152.105
915.428
9
2020
2.005.661
567.677
10
2021
2.406.850
625.393
24. Nas redes sociais como Facebook, Google e Trip advisor foram reportados os seguintes “likes” (gostos), “check-ins” (visitas), “rankings” (classificações) e “reviews” (comentários e recomendações) existentes:
Bruges
Bruxelas
Paris
Praga
Total
Facebook
3.589 likes
7.237 check-ins
1807 likes
874 check-ins
15.351 likes
3.913 check-ins
8.748 likes
4.644 check-ins
29.495 likes
16.668 check-ins
TripAdvisor
3.441 reviews
Classificado em 42 de 141 coisas a fazer em Bruges
747 reviews
Classificado em 82 de 462 coisas a fazer em Brussels
515 reviews
Classificado em 161 de 2.917 coisas a fazer em Paris
825 reviews
Classificado em 77 de 1.088 coisas a fazer em Prague2
5.528 reviews
Google
3.507 reviews
1.701 reviews
1.848 reviews
1.239 reviews
8.295 reviews
25. O Instituto Europeu da Propriedade Intelectual no processo de oposição número B 003084470 - oposição apresentada pela Autora contra o registo da marca número 017998382 “CHOCO MUSEO” decidiu que “In section c) it has been stated that the combination ‘CHOCO-STORY’ has a normal distinctive character for all the goods and services. However, having examined the material listed above, the Opposition Division concludes that the earlier mark ‘CHOCOSTORY’ has acquired a high degree of distinctiveness through its use on the market at least in Belgium in relation to museum services relating to chocolate. (…) It is clear from the evidence that the earlier trade mark ‘CHOCO-STORY’ has been subject to long-standing and intensive use and is generally known in the relevant market, where it enjoys a consolidated position, as has been attested by diverse independent sources. The number of visitors to the opponent’s museums, the marketing expenditure, the reports elaborated by the Brussels Tourism Observatory and the various references in the press to its success, all unequivocally show that the mark enjoys a high degree of recognition among the relevant public in relation to museum services relating to chocolate.”
(Tradução) “Na seção c) foi afirmado que a combinação ‘CHOCO-STORY’ tem um caráter distintivo normal para todos os produtos e serviços. No entanto, após examinar os elementos acima enumerados, a Divisão de Oposição conclui que a marca anterior «CHOCOSTORY» adquiriu um elevado grau de caráter distintivo através da sua utilização no mercado, pelo menos na Bélgica, em relação aos serviços museológicos relacionados com o chocolate. (…) Resulta claramente dos elementos de prova que a marca anterior «CHOCO-STORY» foi objeto de uma utilização intensiva e de longa data e é geralmente conhecida no mercado relevante, onde goza de uma posição consolidada, como foi atestado por diversas fontes independentes. O número de visitantes dos museus do oponente, as despesas de marketing, os relatórios elaborados pelo Observatório de Turismo de Bruxelas e as diversas referências na imprensa ao seu sucesso, mostram inequivocamente que a marca goza de um elevado grau de reconhecimento entre o público relevante em relação aos serviços museológicos relacionados ao chocolate.”
26. No âmbito das atividades a que se dedica, a Autora criou um projeto classificado de Potencial Interesse Nacional (PIN) o qual tem como missão reforçar a oferta cultural e museológica da cidade do Porto bem como enaltecer o potencial da região em áreas estratégicas como o vinho, a indústria e o património.
27. Este empreendimento foi inaugurado ao público em 31/07/2020 e teve como investimento cerca de €106 milhões.
28. O referido projeto tem o nome de WOW e consiste em seis experiências, nove restaurantes, bares e cafés, uma escola de vinho, várias lojas, em espaço para exposições e outro para eventos, tal como se pode confirmar pelo Doc. nº 4, extraído do site institucional da Ré.
29. O WOW é um quarteirão cultural, situado em pleno coração histórico de Vila Nova de Gaia, onde se homenageia a cultura e valoriza a história e as principais indústrias portuguesas.
30. Por forma a concretizar os seus objetivos de enaltecimento do potencial da região nas mais diversas áreas, o WOW conta com sete museus.
31. Desses sete museus, um deles é dedicado ao cacau e ao chocolate, sendo denominado de “THE CHOCOLATE STORY”.
32. Trata-se de um museu sobre o chocolate onde o visitante pode aprender sobre as origens e significado do cacau e sobre a evolução do chocolate, bem como ter acesso aos bastidores de uma verdadeira fábrica de chocolate.
33. Um dos objetivos do “THE CHOCOLATE STORY” é dar a conhecer o papel fundamental de Portugal na história do chocolate.
34. Há ainda que acrescentar que a integração deste museu no grupo The Fladgate Partnership prende-se com área de atividade deste mesmo grupo – produção de vinho do Porto, conforme se pode consultar no site institucional em https://fladgatepartnership.com/pt
35. Considerando as três harmonizações clássicas com o vinho do Porto – o queijo, os charutos e o chocolate – seria impossível deixar esquecida a referência ao chocolate e a sua harmonização com o vinho do Porto, a qual é a mais consensual e abrange um universo maior de consumidores.
36. O “THE CHOCOLATE STORY” proporciona ao seu visitante uma história completa do chocolate ligando-o a Portugal, do início ao fim, razão pela qual se encontra dividido em 12 salas temáticas.
37. A Ré contou com o mestre chocolateiro AA para pensar e dar forma ao THE CHOCOLATE STORY.
38. O THE CHOCOLATE STORY conta ainda com uma fábrica de chocolate, a qual tem marca própria em nome de outra empresa do grupo The Fladgate Parternship: “20 20 N S” e “VINTE VINTE”, nomeadamente e entre outras, a marca da União Europeia nº 018136454 e nº 018136731.
39. Desde a sua inauguração, em 2020, o Museu teve (e tem) a oportunidade de receber diversos visitantes, tanto portugueses quanto estrangeiros.
40. No Reino Unido existe um museu dedicado ao chocolate com a designação “YORK’S CHOCOLATE STORY”.
41. A Autora no uso do comércio que faz do seu sinal junta ao elemento nominativo um elemento gráfico, passando a utilizar o seguinte sinal:
42. A expressão CHOCOLATE STORY que a Ré utiliza é acompanhada do símbolo que caracteriza o projeto WOW e que se encontra registado através da marca da União Europeia nº 017886816.
43. Para aceder aos espaços da Autora e da Ré é necessário que o consumidor (visitante) adquira um bilhete.
44. O consumidor que compra fisicamente ou on-line um bilhete para aceder ao espaço WOW da Ré.
45. A Ré requereu junto do INPI o registo da marca nº 712016, com o sinal:
46. O INPI concedeu o referido registo, tendo sido apresentado pela Autora um pedido de modificação da decisão, o qual ainda se encontra pendente.
47. A Ré “HILODI – HISTORIC LODGES & DISCOVERIES, SA”, é detida a 100% pela sociedade “The Fladgate Partnership – Vinhos, SA, conforme certidão comercial junta no req. com a REFª: 47646840.
48. A Autora auferiu a título de receitas com a exploração do Museu “The Chocolate Story” as quantias de € 22.461,25 em 2020, € 47.308,85 em 2021, €105.438,34 em 2022 e € 157.229,17 em 2023. E os seguintes factos como não provados:
1. O THE CHOCOLATE STORY é a experiência alusiva ao chocolate mais completa do mundo, já que o visitante, para além do chocolate como produto, tem acesso a uma visita à cidade do Porto e à descrição da sua natureza envolvente, tendo em conta os diversos períodos históricos até à Era Moderna.
2. A Ré pode afirmar que até ao momento do recebimento da presente ação não tinha conhecimento da existência da Autora.
3. A Fábrica de chocolate da Ré produziu em 2022 cerca de 8,5 toneladas de chocolate.
*
III.2. Do mérito do recurso
2.1. Matéria de facto
2.1.1. questão prévia
Começaremos por rectificar, ao abrigo do art.º 614.º e 662.º, n.º 1 do CPC, alguns manifestos lapsos de escrita que a sentença contém na redacção da matéria de facto, acrescentando ainda, com base nos documentos juntos aos autos, as marcas tal como registadas (factos 19, 25 e 42):
10. A Ré explora um museu do chocolate designado por THE CHOCOLATE STORY.
11. Através do conteúdo do website existente sob o nome de domínio referido em 9., redes sociais, e da própria sinalética aposta no exterior e interior do seu estabelecimento, a Ré faz publicidade ao estabelecimento que explora.
14. A R. faz ainda publicidade nas redes sociais como o Facebook ao “The Chocolate Story”, in https://www.facebook.com/wowporto.
19. O THE CHOCOLATE STORY conta com uma fábrica de chocolate, a qual tem marca própria em nome da sociedade “Y NOT CHOCOLATE, S.A”: nomeadamente, a marca da União Europeia nº 018136454 VINTE VINTE e nº 018136731 .
21. Os museus Choco-Story da Autora foram abordados inúmeras vezes na imprensa ao longo dos anos e figuram em muitas listas de itens imperdíveis ao visitar as cidades de Bruges, Bruxelas, Paris e Praga.
22. O museu Choco-Story Brussels aparece entre os cinco museus mais visitados pelos portadores do Brussels Card (que é usado por 100 nacionalidades diferentes).
25. O Instituto Europeu da Propriedade Intelectual no processo de oposição número B 003084470 - oposição apresentada pela Autora contra o registo da marca da União Europeia número 017998382 decidiu que (…).
26. No âmbito das atividades a que se dedica, a Ré criou um projeto classificado de Potencial Interesse Nacional (PIN) o qual tem como missão reforçar a oferta cultural e museológica da cidade do Porto bem como enaltecer o potencial da região em áreas estratégicas como o vinho, a indústria e o património.
42. A expressão THE CHOCOLATE STORY que a Ré utiliza é acompanhada do símbolo que caracteriza o projeto WOW e que se encontra registado através da marca da União Europeia nº 017886816 .
48. A Ré auferiu a título de receitas com a exploração do Museu “The Chocolate Story” as quantias de € 22.461,25 em 2020, € 47.308,85 em 2021, €105.438,34 em 2022 e € 157.229,17 em 2023.
Porque repetido, elimina-se o facto provado 38., que já consta como facto provado 19. Quanto à impugnação da matéria de facto feita pela Recorrente:
Dispõe o art.º 640.º, n.º 1 do CPC, sobre o ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto que, quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Ónus que não foi cumprido pela Recorrente, desde logo quanto aos concretos pontos de facto que considera terem sido erradamente julgados, limitando-se a expressar a sua discordância da sentença no que respeita à existência de imitação bem como, na sua tese, ao facto de o Tribunal a quo não ter considerado a prova testemunhal relativamente à confusão/confundibilidade.
A imitação, bem como o risco de confusão que a integra, são conceitos de Direito, legais e jurisprudenciais, que não factos, realidades constatáveis da vida susceptíveis de prova, designadamente, testemunhal. Encerram juízos conclusivos extraídos do elenco de factos concretos provados.
Não tendo a Recorrente cumprido o ónus que lhe cabia na impugnação da matéria de facto, não se conhecerá do alegado nas suas alegações de recurso a esse respeito.
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2.2. violação da marca
A questão a decidir é se o sinal usado para distinguir o museu explorado pela Recorrente desde 2020 em Vila Nova de Gaia, THE CHOCOLATE STORY, viola a marca da EU n.º 013647722 CHOCO-STORY da Recorrida, concedida em 2015, assinalando, nomeadamente, chocolate, educação, divertimento, actividades culturais, catering, e que é usada pela Recorrida para distinguir museus dedicados ao chocolate que explora, desde 2004, em várias cidades nomeadamente da União Europeia.
Nos termos do artigo 9.º do Regulamento (UE) 2017/1001 do Parlamento Europeu e do Conselho de 14 de Junho de 2017, sobre a marca da União Europeia: 1. O registo de uma marca da UE confere ao seu titular direitos exclusivos. 2. Sem prejuízo dos direitos dos titulares adquiridos antes da data de depósito ou da data de prioridade da marca da UE, o titular dessa marca da UE fica habilitado a proibir que terceiros, sem o seu consentimento, façam uso, no decurso de operações comerciais, de qualquer sinal em relação aos produtos ou serviços caso o sinal seja: a) Idêntico à marca da UE e seja utilizado para produtos ou serviços idênticos àqueles para os quais a marca da UE foi registada; b) Idêntico ou semelhante à marca da UE e seja utilizado para produtos ou serviços idênticos ou afins àqueles para os quais a marca da UE foi registada, se existir risco de confusão no espírito do público; o risco de confusão compreende o risco de associação entre o sinal e a marca; c) Idêntico ou semelhante à marca da UE, independentemente de ser utilizado para produtos ou serviços idênticos, ou afins àqueles para os quais a marca da UE foi registada, sempre que esta última goze de prestígio na União e que a utilização injustificada do sinal tire indevidamente partido do caráter distintivo ou do prestígio da marca da UE ou lhe cause prejuízo.
A marca da EU titulada pela Recorrida é nominativa, tal como o sinal THE CHOCOLATE STORY usado pela Recorrente, sendo ambos compostos por vocábulos em língua inglesa.
Conceptualmente, THE CHOCOLATE STORY e CHOCO-STORY são semelhantes, referindo-se ambos a história do chocolate (CHOCO de chocolate), ainda que no caso da marca, seja “história do chocolate” e, no caso do museu da Recorrente, “A história do chocolate”.
Graficamente, têm as mesmas letras CHOCO e STORY mas, no caso da marca, contém um hífen e, no caso do sinal usado para identificar o museu da Recorrente, para além de não ter hífen e de não ser CHOCO e sim CHOCOLATE, tem ainda o elemento THE.
Visualmente têm as semelhanças referidas mas, no caso da marca, trata-se apenas de duas palavras separadas por um hífen e, no caso do sinal usado pela Recorrida, três palavras isoladas. No caso da marca, cinco+cinco letras separadas por um traço e, no caso do sinal usado pela Recorrente, três+nove+cinco letras.
Foneticamente têm as semelhanças de STORY e CHOCO. Mas o sinal usado pela Recorrida começa com o som THE (de) e não é cho-co e sim cho-co-la-te. Ou seja, no caso da marca da Recorrida será cho-co-stó-ri e no caso do sinal usado pela Recorrente de-cho-co-lá-te-stó-ri.
Assim, se conceptualmente têm uma semelhança acima da média, as semelhanças gráfica, visual e fonética serão medianas, ou menos.
Um sinal é descritivo quando o seu significado é imediatamente e sem qualquer reflexão adicional percebido pelo público relevante como fornecendo informação sobre os bens ou serviços assinalados. Não sendo totalmente descritivos (como seria “Museu do Chocolate”), podendo dizer-se que os museus contam histórias, um espaço identificado com os sinais CHOCO-STORY ou THE CHOCOLATE STORY não surpreende que sejam museus dedicados ao chocolate. O público intuirá facilmente, mesmo sem conhecer os espaços assim assinalados, que ambos os sinais, ainda que não contenham a palavra “museu”, distinguem museus sobre o chocolate. Em Portugal por ex. são conhecidos o Lisboa Story Center e o Madeira Story Center, museus sobre a história da cidade de Lisboa e da ilha da Madeira.
O que distingue a marca CHOCO-STORY de um sinal como o usado pela Recorrente é o diminutivo usado para chocolate (CHOCO – que em língua portuguesa é um molusco marinho, embora seja perceptível para o consumidor médio português que CHOCO é, no caso da marca, um diminutivo de chocolate) e o hífen (-), que conferem à marca a arbitrariedade/criatividade suficientes, permitindo distinguir os produtos e serviços assim assinalados dos dos seus concorrentes e, nomeadamente, os museus CHOCO-STORY de outros museus dedicados ao chocolate.
A sentença considerou, em síntese, que “Quanto à similitude de sinais, a mesma resulta também manifesta, quer do ponto de vista nominativo, quer conceptual, quer visual: THE CHOCOLATE STORY vs CHOCO-STORY De facto, a marca registada prioritária é simplesmente uma forma sintética ou abreviada da expressão “The CHOCOLATE STORY”, visando ambas apresentar serviços de divulgação da história do chocolate através de um Museu aberto ao público. (…) a marca da titularidade da Autora – CHOCO-STORY – beneficia do direito de exclusivo que lhe confere o art.º 9.º do Regulamento (UE) 2017/1001 do Parlamento Europeu e do Conselho, e, tendo adquirido notoriedade junto de parte do público relevante da União Europeia, deve estar protegida contra o risco de confusão, que é, por esse facto, mais elevado. Assim, e ao incorporar no seu comércio a designação «THE CHOCOLATE STORY», para apresentar serviços de Museu de Chocolate – a mesma atividade sinalizada pela Autora com a expressão CHOCO-STORY – a Ré infringiu o direito de exclusivo da Autora.”
Não consideramos manifesta a similitude dos sinais em confronto do ponto de vista nominativo ou gráfica e visualmente, nem fonético, sendo-o apenas do ponto de vista conceptual ou semântico e, ainda assim, com a diferença de que, no caso do museu da Recorrente, é THE (A história do chocolate) e não apenas CHOCO-STORY ((uma) história de/o chocolate).
Quanto à afirmação da sentença de que a marca CHOCO-STORY adquiriu notoriedade junto de parte do público relevante da União Europeia – conclusãoda decisão da Divisão de Oposição do EUIPO no caso da marca - afigura-se que não pode ser extraída, sem mais, daquela decisão (não judicial), desconhecendo-se os elementos de prova que foram juntos ao referido processo de oposição no caso concreto que dele era objecto. Sublinhe-se que, nesse caso, estavam em análise as marcas CHOCO-STORY e CHOCO MUSEO, começando ambas com o vocábulo CHOCO (sendo de cacau os elementos figurativos da marca mista).
Percorrendo a referida decisão (que foi junta com a petição inicial), o que dela decorre é que a combinação de sinais CHOCO-STORY foi considerada, num primeiro momento (secção c) como tendo um carácter distintivo normal para todos os bens e serviços que assinala. Contudo, examinados os documentos juntos a esse processo pela titular da marca, a Divisão de Oposição do EUIPO concluiu que a marca CHOCO-STORY adquiriu um elevado grau de distintividade através do seu uso, pelo menos na Bélgica, em relação a serviços de museu relacionado com chocolate. Concluindo ainda, pelos mesmos elementos de prova, que ficou demonstrada a reputação da marca para serviços relacionados com chocolate na Bélgica, o que constitui uma “parte substancial da população da União Europeia”.
Vejamos.
Da matéria de facto provada nestes autos resulta que a Autora/Recorrida possui vários estabelecimentos na União Europeia e fora dela e bem assim uma loja online de venda de produtos; o primeiro museu CHOCO-STORY foi estabelecido na cidade belga de Bruges em 2004; mais tarde a Autora abriu estabelecimentos nas cidades de Praga, Paris, Bruxelas, Colmar e Lourdes, bem como fora da União Europeia; todos os estabelecimentos contêm sites próprios como eshop.choco-story.com (loja online); os museus da Autora são visitados por inúmeras pessoas todos os anos e são amplamente divulgados entre o público da União Europeia em geral, designadamente em sites e revistas de viagens com indicação de locais de interesse a visitar; tendo sido referidos inúmeras vezes na imprensa ao longo dos anos e figuram em muitas listas de itens imperdíveis ao visitar as cidades de Bruges, Bruxelas, Paris e Praga; aparecendo o Choco-Story Brussels entre os cinco museus mais visitados pelos portadores do Brussels Card; e tem várias interacções positivas nas redes sociais.
Os seus museus integram uma loja de venda de produtos, sendo de presumir que quer os produtos aí vendidos, quer nas várias lojas online, são produtos marcados CHOCO-STORY, que (facto 41) a Recorrida usa como .
Quanto ao museu THE CHOCOLATE STORY explorado pela Recorrida está integrado num “projecto” (classificado como de Potencial Interesse Nacional, tendo por missão reforçar a oferta cultural e museológica da cidade do Porto bem como enaltecer o potencial da região em áreas estratégicas como o vinho, a indústria e o património – cfr. facto 26; inaugurado ao público em 31/07/2020, que teve um investimento cerca de €106 milhões – cfr. facto 27; consiste num “quarteirão cultural” situado na zona histórica de Vila Nova de Gaia – cfr. facto 28; integra seis “experiências”, nove restaurantes, bares e cafés, uma escola de vinho, várias lojas, em espaço para exposições e outro para eventos, e sete museus – cfr. factos 28 e 30), distinguido com a marca da União Europeia n.º 017886816 .
Resultou provado (facto 42.) que a expressão (THE) CHOCOLATE STORY usada pela Recorrente, é acompanhada do sinal que constitui a marca da União Europeia nº 017886816 , sendo o THE CHOCOLATE STORY um dos sete museus integrados no espaço WOW (facto 30.) Dos documentos juntos aos autos consta que as letras WOW correspondem às iniciais de “World of Wine”, e que os restantes museus são o “Wine Experience”, “Pink Palace”, “Porto Region Across The Ages”, “The Art of Drinking – The Bridge Collection” e “Planet Cork”.
O THE CHOCOLATE STORY proporciona ao seu visitante uma história completa do chocolate ligando-o a Portugal, do início ao fim, encontrando-se dividido em 12 salas temáticas (facto 36). O visitante pode aprender sobre as origens e significado do cacau e sobre a evolução do chocolate, bem como ter acesso aos bastidores de uma verdadeira fábrica de chocolate, tendo por objectivo dar a conhecer o papel fundamental de Portugal na história do chocolate (factos 32. e 33), evocando a referência à harmonização do chocolate com o vinho do Porto (facto 35).
A fábrica de chocolate que integra o museu explorado pela Recorrente é distinguida com as marcas União Europeia nº 018136454 VINTE VINTE e nº 018136731 , tituladas por outra empresa que não a Recorrente.
Não são os únicos museus dedicados ao chocolate a usarem os elementos CHOCOLATE e STORY, resultando da matéria de facto provada que existe pelo menos um, no Reino Unido, com a designação YORK’S CHOCOLATE STORY (facto 40).
Referindo a sentença que “apesar de estruturalmente (ou intrinsecamente) o carácter distintivo da marca prioritária ser reduzido (porque o termo Chocolate é descritivo e o termo “Story” é próximo dos serviços prestados por Museus – embora não necessariamente sinónimo de Museu)” concluiu, subscrevendo a citada passagem da decisão da Divisão de Oposição do EUIPO, que a marca CHOCO-STORY “adquiriu um carácter distintivo acrescido graças à sua implementação no mercado e a um certo grau de notoriedade junto do público belga e dos serviços com ela relacionados, ou seja, serviços de Museu do Chocolate. Esta circunstância é relevante na medida em que o carácter distintivo da marca anterior é um dos elementos a ter em conta na apreciação do risco de confusão.”
O facto de a marca CHOCO-STORY ter adquirido um carácter distintivo acrescido (ao inicialmente considerado normal) graças à sua implementação no mercado e a um certo grau de notoriedade junto do público Belga, não dispensa, no confronto com outro sinal, a apreciação da existência e do grau de risco de confusão. Não estando em causa a identidade dos sinais em confronto e sim a sua semelhança, a al. b) do art.º 9.º do Regulamento da Marca da EU não dispensa a avaliação do risco de confusão no espírito do público, compreendendo tal risco o de associação entre as marcas.
Não é que a marca tenha adquirido um secondary meaning, como bem decidiu a sentença. A regra do secondary meaning destina-se a permitir a protecção de sinais originalmente genéricos que, após um uso prolongado sem beneficiarem de qualquer registo, vieram a tornar-se de tal modo conhecidos do público que este passou a reconhecê-los como verdadeiros sinais distintivos de produtos ou serviços. Embora originariamente inadmissível, o registo dessas marcas vem a tornar-se viável devido a esse “significado secundário”, que o uso prolongado lhes trouxe. Fala-se de secondary meaning quando um sinal, originariamente privado de capacidade distintiva, se converte, por consequência do uso e de mutações semânticas ou simbólicas, num sinal distintivo de produtos ou serviços, reconhecido como tal, no tráfico económico, através do seu significado secundário – Cfr. acórdão do STJ, 10.09.2009, proc. n.º 118/09.4YFLSB.
Não é o caso da marca CHOCO-STORY. Quando uma marca tem originariamente carácter distintivo, como é o caso, não faz sentido falar-se em aquisição (superveniente) de secondary meaning. Se não está sujeita ao n.º 1 do art.º 209º do CPI, também não está sujeita ao n.º 2.
No fundo, a questão de mérito é a de saber se o público relevante pode, ao deparar-se com o museu da Recorrente THE CHOCOLATE STORY, ser induzido em confusão com o museu da Recorrida, distinguido com a sua marca registada da UE CHOCO-STORY, incluindo a associação com esta marca e com os museus da Recorrida.
Não é relevante, como parece pretender a Recorrente, o uso da marca CHOCO-STORY no mercado como ,uma vez que o que está em causa é a violação dos direitos conferidos pelo registo da marca da EU n.º 13647722.
Quanto ao uso do sinal THE CHOCOLATE STORY acompanhado da marca da União Europeia, reduz em grande medida o risco de confusão que possa resultar das semelhanças entre a marca prioritária da Recorrida e o sinal usado pela Recorrente, na medida em que o associa, também, a esta marca.
A Recorrente faz publicidade ao estabelecimento que explora no website com o nome de domínio «Wow.pt» , nas redes sociais, como https://www.facebook.com/wowporto e na própria sinalética aposta no exterior e interior do seu estabelecimento (factos provados 11 e 14). Ou seja, associado à sua marca . Associação essa que se manteve no pedido de registo da marca referida nos factos provados 45 e 46.
No confronto entre CHOCO-STORY e THE CHOCOLATE STORY não vemos que as semelhanças sejam tais que induzam o consumidor médio de serviços museológicos relacionados com o chocolate em erro ou confusão, ou que compreendam um risco de associação com a marca anteriormente registada.
Tanto CHOCO (de chocolate) como STORY (história) são elementos fracos para distinguir um museu sobre o chocolate. Visualmente o consumidor apercebe-se facilmente da diferença entre CHOCO-STORY e THE CHOCOLATE STORY. Percebendo que se trata em ambos os casos de museus sobre o chocolate, não terá razões para os associar, nem à mesma origem empresarial. Não são, de resto, os únicos museus a usar os vocábulos choco/chocolate e story para distinguir um museu sobre o chocolate (cfr. facto 40).
No caso do THE CHOCOLATE STORY, está inserido num quarteirão cultural onde se homenageia a cultura e valoriza a história e as principais indústrias portuguesas (facto 29) distinguido com a marca , para acesso ao qual o visitante precisa de adquirir um bilhete (facto 44) e é THE CHOCOLATE e não CHOCO(–), apesar de serem ambos STORY, o que entenderá que fará sentido por se tratar de um museu; faz parte de um grupo de sete museus integrados no mesmo espaço WOW (“world of wine”), situado no coração histórico de Vila Nova de Gaia, cuja ligação aos vinhos e em particular ao vinho do Porto é conhecida, aí se situando as famosas caves de vinho do Porto (sendo o chocolate uma das três harmonizações clássicas com o vinho do Porto – cfr. facto 35); “a história do chocolate” no museu da Recorrida contém a sua ligação a Portugal (factos 33 a 36); integra uma fábrica de chocolate distinguida com as marcas VINTE VINTE e , sem qualquer semelhança com as marcas aqui em confronto.
Ligações (quarteirão cultural/vinho do Porto/Portugal) que não estão presentes no espírito do consumidor do CHOCO-STORY e sim ao prestigiado chocolate Belga, visando os museus assinalados com a referida marca responder a todas as perguntas relacionadas com o fabrico de chocolate - matérias-primas, processo de produção e “segredo” do chocolate sedoso (factos 6 e 7).
No caso, a semelhança conceptual já apontada não é de molde, ponderadas as dissemelhanças e as circunstâncias supra referidas, para gerar confusão no espírito do consumidor médio de serviços museológicos relacionados com o chocolate que, conhecendo por ex. o CHOCO-STORY Brussels, se depare, no interior do espaço , com sete museus, sendo um deles sobre chocolate e distinguido pelo sinal THE CHOCOLATE STORY.
Pelo que, conclui-se, o recurso deve ser julgado procedente. A sentença recorrida, por padecer de erro de julgamento, deve ser revogada e acção intentada pela Recorrida ser julgada improcedente.
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IV. Decisão
Pelo exposto, acordam em julgar o recurso procedente, revogando a sentença recorrida e julgando improcedente a acção intentada pela PANELITE, NV contra a HILODI – HISTORIC LODGES & DISCOVERIES, SA.
Custas pela Recorrida (art.º 527.º do CPC).
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Lisboa, 13.11.2024
Eleonora Viegas
Bernardino Tavares
Armando Cordeiro