REPARAÇÃO DE VEÍCULO
ELIMINAÇÃO DE DEFEITOS
INDEMNIZAÇÃO PELA PRIVAÇÃO DO USO
Sumário


I - Em caso de não cumprimento da prestação a cargo do empreiteiro, como sucede sempre que a obra é entregue, mas não se encontra nas condições convencionadas e/ou apresenta anomalias objetivas ou estados patológicos, independentemente das características convencionadas, a lei confere ao dono da obra vários direitos, tal como previstos nos artigos 1221.º, 1222.º e 1223.º do CC.
II - Se os defeitos puderem ser suprimidos, o dono da obra tem o direito de exigir do empreiteiro a sua eliminação, o que não exclui o direito a ser indemnizado nos termos gerais.
III - Ao dono da obra bastará provar a existência do defeito (deficiência ou desconformidade, e não a causa do mesmo), enquanto ao empreiteiro competirá afastar a sua responsabilidade na produção do defeito, ou seja, que os defeitos ou vícios não advêm da sua responsabilidade, de forma a afastar a sua culpa na verificação dos enunciados vícios (a qual se presume), designadamente que tais deficiências se deveram a causas externas, não abrangidas pelo acordo celebrado e/ou posteriores à intervenção efetuada.
IV - O empreiteiro não pode, sem autorização do dono da obra, fazer alterações ao plano convencionado.
V - Considerando o período em que o autor/dono da obra não dispôs do veículo para as suas deslocações, vendo-se impedido de o utilizar, cujo início não foi posto em causa pela recorrente (desde o dia ../../2022), porém, temporalmente limitado pela data em que o autor passou a dispor de uma nova carrinha, a qual adquiriu em 09 de novembro de 2022, uma vez que necessitava de uma viatura para os seus afazeres diários, factos estes que não podem deixar de relevar na quantificação do dano em análise, mostra-se conforme à equidade o valor diário de 10 € para compensar o dano decorrente da privação do uso do veículo ainda que limitado ao período de 83 dias durante o qual a utilização que era dada ao veículo não foi suprida por outro meio.

Texto Integral


Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:

I. Relatório

AA e BB, casados entre si, intentaram a presente ação comum contra EMP01... - Comércio e Reparação Automóvel, Lda., pedindo a condenação desta no pagamento da quantia total de 8.000,00 € a título de danos patrimoniais (3.655,00 €), não patrimoniais (1.000,00 €) e privação do uso (3.345,00 €), acrescida de juros de mora sobre a quantia peticionada, desde a data da interpelação para pagamento (06-09-2022), até integral e efetivo pagamento.
Peticionaram, ainda, a condenação da ré na entrega da viatura identificada na petição inicial aos autores e na reparação dos danos que se venham a verificar na mesma viatura, em consequência da reparação defeituosa por si efetuada, designadamente os identificados na perícia a realizar nos autos.
Para tanto alegaram que entregaram a viatura com a matrícula ..-TM-.., da qual são proprietários, na oficina da ré, solicitando um diagnóstico prévio da viatura, bem como um orçamento para a reparação da mesma, tendo-lhe sido dito que a viatura havia ficado sem embraiagem e que teriam de proceder à sua substituição, bem como informaram o autor do valor orçamentado para a reparação; o autor aceitou o valor proposto pela ré e solicitou que procedessem à sua reparação; aquando da entrega da viatura foi efetuado o pagamento do valor orçamentado; porém, a caixa de velocidades apresentava desconformidades, pois iniciando a marcha, não logrou o autor mover, nem a primeira mudança, nem a marcha-atrás, sempre que tentava mover a primeira mudança ou a marcha-atrás, esta “arranhava”, algo que jamais tinha acontecido com o veículo; os funcionários da ré foram prontamente informados pelo autor do sucedido, respondendo que o autor devia carregar na embraiagem a fundo e andar com a viatura porque como a embraiagem era nova, com o tempo isso ia acabar por desaparecer; o autor, de boa-fé e acreditando na ré, levou a viatura para casa, mas como o problema persistia, voltou a contactar a ré dizendo que não aceitava que a viatura lhe fosse entregue desta forma, exigindo que a tal desconformidade fosse eliminada, após o que lhe foi garantido pela ré que iriam ver o que se passava e assumir o que necessário fosse, pelo que o réu levou a viatura à oficina da ré para reparação de tal desconformidade; em momento algum foi o autor informado de que a viatura iria necessitar de uma peça nova nem que teria de proceder ao pagamento do que quer que fosse; como os dias iam passando e a carrinha continuava sem ser entregue, o autor voltou a contactar a ré, solicitando a sua entrega imediata, mas sempre sem sucesso, em face do que, no dia 29-08-2022, deslocou-se à oficina da ré para levantar a viatura e levá-la para a oficina da marca ..., recusando-se contudo a ré a entregar-lhe a viatura; só mais tarde, no dia 02-09-2022, o autor foi contactado pela ré para levantar a viatura mas sem referir qualquer valor em dívida; porém, a ré recusou a sua entrega ao autor, alegando que para o efeito teria de pagar a quantia de 2.247,70 € referente à reparação da caixa de velocidades, impedindo o autor de utilizar a viatura desde o dia ../../2022 e apropriando-se indevidamente da viatura que havia sido entregue para a reparação da embraiagem, recusando-se a entregar-lhe a mesma e tendo procedido a alterações na mesma sem a autorização daquele; em consequência disso, o autor teve necessidade de comprar outra viatura para utilização diária; viu-se obrigado a pedir favores a terceiros, sentiu-se revoltado, transtornado e sofreu incómodos.
A ré contestou, impugnando os factos da petição inicial e arguindo a exceção de não cumprimento do contrato. Deduziu pedido reconvencional, peticionando o pagamento da quantia de 3.748,30 € acrescida de juros de mora, relativa à fatura de reparação do veículo e faturas de parqueamento do mesmo.
Alegou, em síntese, que quando a viatura chegou à oficina foi constatado que tinha a embraiagem partida, não tendo o autor solicitado um prévio orçamento e tendo apenas ficado acordada a reparação a embraiagem com a brevidade possível; que apesar de ser verdade que o autor, ao levantar a viatura, comunicou a desconformidade existente na caixa de velocidades, a ré apenas assumiu a garantia decorrente da reparação da embraiagem e não outra. Alegou, ainda, que nessa sequência, a ré constatou que o problema era na caixa de velocidades e quais as possibilidades de reparação a viatura através da substituição e peças, sendo que o autor aceitou logo a proposta da ré, tendo optado por uma caixa de velocidades usada porque tinha a intenção e vender a carrinha; foi-lhe apresentada a fatura no valor de 2.247,70 € após reparação, tendo o autor recusado o pagamento e a sua viatura permanece parqueada nas instalações da ré, até hoje, tendo a ré exercido o seu direito de retenção nos termos do artigo 754.º do Código Civil (CC).
Os autores apresentaram réplica, na qual reiteraram o alegado na petição inicial e impugnaram os factos vertidos na reconvenção.
Foi proferido despacho saneador, no qual se fixou o objeto do litígio e os temas da prova, admitiu-se a reconvenção, fixou-se o valor da ação.

Realizou-se a audiência final, após o que foi proferida sentença julgando a ação parcialmente procedente e a reconvenção improcedente, a qual se transcreve na parte dispositiva:
«Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a presente acção e, em consequência:
a) Condeno a ré, EMP01... - Comércio e Reparação Automóvel, Lda., no pagamento de uma indemnização ao Autor AA, a título de não danos patrimoniais sofridos, no montante de € 500,00 (quinhentos euros), acrescidos de juros de mora contabilizados desde a data da sentença até efectivo e integral pagamento;
b) Condeno a ré, EMP01... - Comércio e Reparação Automóvel, Lda., no pagamento de uma indemnização aos Autores AA e BB, a titulo de privação do uso do veículo, no montante de € 3.345,00 (três mil e trezentos e quarenta e cinco euros), acrescido de juros de mora, contados desde a data da interpelação (06.09.2022) até efectivo e integral pagamento;
c) Condeno a Ré a entregar a viatura melhor identificada em 2), conforme a mesma lhe foi entregue, aos autores;
d) Condeno a Ré na reparação nos danos que se venham a verificar na viatura identificada em 2), em consequência da reparação defeituosa por si efectuada;
e) Absolvo a ré dos restantes pedidos;
f) Julgo a reconvenção improcedente, por não provada, e em consequência, absolvo os reconvindos dos pedidos.

*
Custas da acção a cargo dos Autores e da Ré na proporção do respectivo decaimento (artigo 527.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil); custas da reconvenção a cargo da ré, atento a total improcedência».
Inconformada com tal decisão, a ré/reconvinte dela veio interpor recurso de apelação, pugnando no sentido da revogação da sentença.

Termina as alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem):
«1- A Recorrente considera que não foi realizada uma correta apreciação da prova produzida, nomeadamente dos depoimentos das testemunhas por si apresentadas e que não se procedeu a um correto enquadramento jurídico das questões a decidir de que resulta uma incorreta aplicação do direito aos factos;
2- Entendendo que face à prova produzida em sede de audiência de julgamento e ao Relatório Pericial de fls… (e com relevância para a decisão da causa) não deveria ter sido dado como provada a matéria constante dos pontos 13, 15, 20, 24, 25, 26, 40, 45 e, ao contrário, deveria ter sido dado como provado o ponto r) dos factos dados como não provados.
3- Antes considerando que resultou provado que o Autor foi o Autor quem por si decidiu não utilizar nenhum serviço de reboque para transportar a viatura para a oficina da Ré;
4- Que o Autor recebeu a viatura após a reparação da embraiagem e a aceitou tendo pago a respetiva fatura e circulado com a mesma vários dias até comparecer novamente nas instalações da Ré;   
5- Que o Autor compareceu nas instalações da Rá solicitando a realização de diagnóstico e reparação da caixa de velocidades da sua viatura, não tendo em nenhum momento apontado qualquer desconformidade à reparação anterior nem imputado à Ré qualquer responsabilidade pela prestação desses serviços.  
6- Mais considera a Recorrente, salvo o devido respeito, que deveria ter sido dada como provada a inexistência de qualquer relação entre a reparação realizada pela Ré e os problemas de engrenamento posteriores, não só porque foi essa a posição assumida pelo Senhor Perito mas também porque nenhuma outra prova se fez em sentido contrário.
7- Consequentemente, entende a Recorrente que existiu aceitação da viatura e por esse motivo e que a intervenção que realizou sobre a mesma aquando da reparação da embraiagem não provocou quaisquer danos que fossem geradores da sua responsabilidade,
8- Devendo por essa razão ser absolvida da condenação na reparação de eventuais danos que possam verificar-se e antes devendo o Autor/Reconvindo ser condenado no pagamento do valor dessa reparação e respetivo parqueamento, nos termos peticionados na Reconvenção.
9- Pelo exposto, é entendimento da Recorrente que não o direito de retenção que invoca é legítimo porque respaldado pelo incumprimento da obrigação de pagamento da reparação da viatura por parte do Autor e que não deve igualmente ser absolvida na condenação do pagamento de quaisquer quantias a título de privação do uso do veículo;
10- Mas ainda que assim não se entenda sempre o valor dessa condenação em pagamento deve ser revogado e substituído por outro que obedeça aos princípios da equidade e ao estabelecido nos artigo 562º e 566º n.º 3 do Código Civil, tanto mais que a quantia em que a Recorrente foi condenada a esse título é superior ao valor gasto pelo Auor na aquisição de outra viatura para substituir a reparada.
11- Assim, considera a Recorrente que a decisão proferida nos autos deve ser revogada com base no erro na apreciação da prova produzida e na violação dos artigos 217º, 227º, 483º, 496º, 562º, 566 n3, 754º, 798º, 1208º, 1211º n2, 1218º e 1219º do Código Civil, com as legais consequências.
Decidindo desta forma, se fará a habitual JUSTIÇA!»
Não consta que tenham sido apresentadas contra-alegações.
O recurso foi admitido como apelação, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
Os autos foram remetidos a este Tribunal da Relação, confirmando-se a admissão do recurso nos mesmos termos.

II. Delimitação do objeto do recurso
Face às conclusões das alegações da recorrente e sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso - artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC) -, o objeto do presente recurso circunscreve-se às seguintes questões:
A) impugnação da decisão sobre a matéria de facto;
B) aferir se a sentença recorrida incorreu em erro na interpretação e aplicação do direito quanto ao mérito da ação.
Corridos os vistos, cumpre decidir.

III. Fundamentação
1. Os factos
1.1. Os factos, as ocorrências e elementos processuais a considerar na decisão deste recurso são os que já constam do relatório enunciado em I. supra relevando ainda os seguintes factos considerados provados pela 1.ª instância na decisão recorrida:
1. Os Autores encontram-se casados entre si, desde ../../1993, no regime da comunhão geral de bens;
2. Encontra-se registada a aquisição da viatura ligeira de mercadorias ca marca ..., com a matrícula ..-TM-.., do ano de 2017, a favor do autor;
3. A referida viatura está na posse dos Autores há 5 anos, de forma pública, pacífica e à vista de toda a gente e sem oposição de quem quer que seja; 
4. Procedendo ao pagamento do imposto de circulação anualmente de forma ininterrupta;
5. E circulando com a mesma diariamente para fins laborais e pessoais;
6. Não possuindo qualquer outro veículo com as características do veículo identificado em 2);  
7. A viatura em causa nunca teve qualquer avaria, por se tratar de um veículo novo e bem estimado;  
 8. O Autor sempre teve o cuidado de executar todas as revisões periódicas na oficina da ..., em ..., na EMP02...;  
9. Sucede que, entre o final do mês de julho e o início do mês de agosto, quando se encontrava na EMP03..., isto é, no ..., ... I, ... ..., tentou colocar a sua viatura automóvel melhor identificada em 2) em marcha sem sucesso;    
10. Percebeu que se tratava de um problema na embraiagem da viatura, pelo que imediatamente ligou, como habitualmente, para a marca da mesma, a ..., em ..., para repararem a viatura;
11. Ao que lhe responderam que estavam com excesso de trabalho naquela altura e que não iriam conseguir atender à solicitação do Autor com a brevidade desejável;  
12. No entanto, foi-lhe referido, pela própria ... que caso se tratasse da embraiagem poderia procurar alguma oficina perto, pois seria uma intervenção simples;
13. Contactou telefonicamente a Ré, por forma a perceber se teriam disponibilidade para verem e repararem a viatura e se poderiam enviar um reboque;  
14. Por sua vez, a Ré é uma sociedade comercial que se dedica à reparação de veículos automóveis e motociclos, comércio, manutenção e reparação;   
15. Imediatamente foi-lhe transmitido que estavam disponíveis e que poderia levar a viatura à oficina naquele momento e que como estavam a cerca de 2 km não necessitava de reboque;   
16. O Autor deslocou-se, então, à oficina e solicitou um diagnóstico prévio da viatura, bem como um orçamento para a reparação da mesma; 
17. Tendo lhe sido dito que a viatura havia ficado sem embraiagem e que teriam de proceder à sua substituição, bem como o informaram do valor orçamentado para a reparação;
18. O Autor aceitou o valor proposto e solicitou que procedessem à sua reparação;
19. Aquando da entrega da viatura, entre a primeira ou segunda semana de agosto, o Autor fez o pagamento de € 600,00 (seiscentos euros) em numerário;
20. No entanto, quando o Autor procedeu ao levantamento da viatura e tentou colocá-la em marcha, percebeu que a caixa de velocidades demonstrava claras desconformidades, pois iniciando a marcha, não logrou mover nem a primeira mudança, nem a marcha-atrás;
21. Sempre que tentava mover a primeira mudança ou a marcha-atrás, esta “arranhava”;
22. Algo que jamais tinha acontecido com o veículo;
23. Sem sair da oficina, prontamente informou um dos funcionários da Ré do descrito em 20) a 22);  
24. Ao que lhe responderam que deveria carregar na embraiagem até ao fundo e andar com a viatura porque como a embraiagem era nova e isso ia acabar por desaparecer;
 25. O Autor, de boa-fé e acreditando na Ré, levou a viatura para casa, mas como o problema persistia e o mesmo não era de todo normal, mesmo para o seu parco conhecimento de mecânica, voltou a contactar a Ré dizendo que não aceitava que a viatura lhe fosse entregue desta forma, exigindo que a tal desconformidade fosse eliminada;
26. Pelo que prontamente lhe foi garantido pela mesma que iriam ver o que se passava e assumir o que necessário fosse;
27. A Ré solicitou apenas que o Autor levasse a viatura à oficina no dia ../../2022 e este fê-lo em tal data; 
28. Depois de vários telefonemas, sem sucesso, por parte do Autor, a fim de saber se já poderia levantar a carrinha, decidiu deslocar-se até à oficina;
29. Nunca foi o Autor informado que a viatura iria necessitar de uma peça nova;
30. Muito menos que o Autor teria de proceder ao pagamento do que quer que fosse e que a Ré não assumiria;
31. Como os dias se iam passando e a carrinha continuava sem ser entregue, o Autor voltou a contactar a Ré solicitando a entrega da mesma imediatamente, mas sempre sem sucesso;
32. Pelo que no dia 29 de agosto de 2022, e já claramente desagradado, impaciente com a presente situação, deslocou-se com a sua filha para levantar a viatura na oficina da Ré e levá-la, definitivamente, para a ...; 
33. No entanto, a Ré recusou-se a entregar a viatura; 
34. Aliás, na verdade, nem recebeu o Autor e a sua filha na oficina;
35. Apenas no dia 2 de setembro é que a Ré contactou o Autor para levantar a viatura, e nunca referiu qualquer valor em dívida;  
36. Nessa altura, a Ré comunicou a uma das filhas do Autor que se deslocou, à oficina para levantar a viatura, que teria de proceder ao pagamento do montante de €2.247,70, referente à reparação da caixa de velocidades;  
37. A Ré não autorizou a filha do Autor a levar a viatura sem que fosse efetuado aquele pagamento;
38. Nunca foi o Autor informado da necessidade de proceder à substituição da caixa de velocidades e que seria responsável por essa reparação;
39. Neste circunspecto, o Autor, na pessoa da sua mandatária, interpelou a Ré, no dia 06 de setembro de 2022, para procederem à entrega da viatura, uma vez que tal reparação da caixa de velocidades não havia sido solicitada, muito menos tendo autorizado a colocação de qualquer peça usada;  
40. Solicitando, igualmente, fosse a fatura-recibo da reparação da embraiagem, - que efetivamente tinha sido solicitada e paga aquando da entrega da viatura - emitida e entregue com a maior brevidade possível;
41. Tendo a mesma sido emitida e enviada, apenas em 07.09.22, quando o serviço foi prestado e pago no início do mês de agosto;
42. Desde o dia 18 do mês de agosto de 2022 que a Ré impede que o Autor usufrua da sua viatura;
43. O Autor necessita do referido veículo para os seus afazeres diários;
44. O único serviço solicitado à Ré foi pago, como se percebe pela Fatura-Recibo n.º ...42, emitida no dia 07.09.22;
45. O único que o Autor solicitou à Ré foi a reparação da embraiagem e a eliminação dos defeitos que resultaram dessa reparação;
46. O Autor viu-se obrigado a viver de favores de outras pessoas, o que lhe causou transtornos e incómodos;
47. Sentiu-se revoltado;
48. A utilização do seu automóvel facilitava-lhe o acesso a sua atividade profissional e, naturalmente, contribuiria para a fruição de momentos livres;
49. Com a privação dele, o acesso ao trabalho tornou-se mais penoso e cessou a utilização e fruição que da viatura poderiam fazer em tempo de lazer;
50. O Autor tem-se sentido impotente perante toda a situação descrita, passando por verdadeiros momentos de humilhação, aborrecimento e desgaste; 
51. E uma vez que necessitava de uma viatura para os seus afazeres diários, adquiriu uma nova carrinha;
52. O que o fez no dia 09 de novembro de 2022, recorrendo à ajuda económica da sua filha;
53. A referida viatura foi comprada pelo montante de €3.000,00 (três mil euros); 
54. Tendo ainda procedido ao pagamento do registo automóvel no montante de € 55,00;
55. Foram enviados pela Ré vários pedidos de orçamento de peças originais e disponibilidade aos seus fornecedores;
56. Acontece, porém, que os fornecedores só conseguiam entregar as peças originais (da marca) solicitadas sete dias depois;
57. No dia 30 de agosto de 2022, a Ré remeteu mensagem ao autor, via whatsapp, de que continuava a aguardar a entrega da caixa;
58. A Ré encetou novos contactos com outros fornecedores e no dia 02 de setembro de 2022, um representante da Ré deslocou-se a um fornecedor para comprar e transportar para a oficina uma outra caixa de velocidades (usada) para que fosse possível finalizar a reparação da viatura do Autor;
59. O Autor recebeu a fatura n. º...29 no valor de € 2.247,70, não a devolveu e não a liquidou;
60. A Ré procedeu já à emissão e envio ao autor das faturas n.º ...08 no valor de € 750,30 e n.º ...31 no valor de € 750,30 cada, referentes ao parqueamento da viatura do Autor nas instalações da Ré, e que se encontram por liquidar.
1.2. Factos considerados não provados pela 1.ª instância na sentença recorrida:
a) Que o autor percorresse diariamente trinta a seis quilómetros com a viatura aludida em 2);
b) Que o Autor tenha perguntado na EMP03... se conheciam uma oficina perto;
c) Que o representante da ré tenha dito que “não era por isso que se iriam zangar”;
d) Que tenha sido garantido ao autor que no dia seguinte, sexta-feira, dia 19 de Agosto, a viatura estaria operacional novamente, o que não se veio a verificar;
e) Que os representantes legais da Ré, bastante desconfortáveis, tenham assumido perante o Autor, que iriam necessitar de mais tempo para verificar o problema que haviam causado, mas que no prazo de uma semana a entregariam; 
 f) Que o Autor seja uma pessoa humilde que viva, exclusivamente, do seu trabalho, necessitando planear todas as suas despesas mensais;
g) Que no dia 22 de Agosto o Autor se tenha deslocado novamente à oficina da Ré para questionar pela viatura;
h) Tendo visto que lhe haviam desmontado a caixa de velocidades sem a sua autorização, o que o deixou muito preocupado;
i) Que o Autor tenha acabado por assentir; 
j) Que a Ré tenha tranquilizado o Autor dizendo-lhe que a caixa de velocidades iria ser verificada por uma empresa especializada e para o mesmo não se preocupar;
k) Que ambas as filhas do autor se tenham deslocado à oficina da ré para levantar a viatura;
l) Que a Autora se tenha sentido impotente perante toda a situação descrita, passando por verdadeiros momentos de humilhação, aborrecimento e desgaste;
m) Que a existir qualquer desconformidade na caixa de velocidades, seria pré-existente à reparação realizada;  
n) Que a Ré tenha informado o autor que se viesse a verificar algum problema decorrente da reparação da embraiagem, a ré garantiria/assumiria a sua correção;
o) E que com a embraiagem partida, era impossível à ré, verificar a existência, ou inexistência, de qualquer problema na caixa de velocidades;
p) Que dado ser necessário desmontar a caixa de velocidades para avaliar o problema e a sua origem, a Ré tenha informado o Autor que o diagnóstico poderia demorar alguns dias;
q) Que a 22 de Agosto de 2022 o Autor tenha sido chamado pela ré às suas instalações onde lhe foi mostrado e explicado o problema existente na caixa de velocidades;
r) Bem como a inexistência de qualquer relação com a intervenção realizada pela Ré na embraiagem, e quais as possibilidades de reparação da viatura substituição de peças;
s) Que o Autor tenha aceite de imediato a proposta da ré;
t) Que sabendo que o Autor tinha manifestado alguma pressa na reparação, a ré o tenha contactado no dia 24 de Agosto de 2022, informando-o do estado em que se encontrava a mesma;
u) Que o autor tenha solicitado à ré que lhe fossem apresentadas outras possibilidades, ordenando-lhe que cancelasse o envio das peças, por não querer esperar muito tempo;
v) Que a ré, após vários contactos com fornecedores, no dia 25 de Agosto tenha contactado o Autor propondo-lhe que ao invés de substituir apenas peças se substituísse a caixa de velocidades completa, propondo-lhe uma caixa de velocidades recondicionada com garantia de um ano ou uma caixa de velocidades usada com garantia de três meses;
w) Que o autor tenha respondido que pretendia uma caixa usada já que era sua intenção vender a carrinha;
x) Que perante a decisão tomada pelo autor, a ré tenha procedido à encomenda de uma caixa de velocidades usada;
y) Que a Ré estivesse preocupada em dar explicação ao cliente;
z) Que no dia 01 de Setembro de 2022 uma caixa de velocidades destinada ao veículo do Autor chegou às instalações da Ré, porém, foi danificada pela transportadora, vendo-se a Ré obrigada a encomendar uma nova a caixa de velocidades; 
aa) Que nessa mesma data, 01 de Setembro de 2022, a ré tenha contactado telefonicamente com o Autor AA, explicando-lhe o sucedido;
bb) Que o Autor tenha começado a insultar os seus representantes, apelidando-os de aldrabões, mentirosos, e outros impropérios…;
cc) Que no dia 2 de Setembro de 2022 (ainda a caixa de velocidades estava a caminho da oficina da Ré), o Autor tenha comparecido com a sua filha nas instalações da ré (e não a 29 de Agosto), com novas acusações e insultos; 
dd) Que os funcionários da Ré tenham voltado a explicar todo o sucedido e informaram que a caixa de velocidades a aplicar no seu veículo se encontrava a caminho da oficina para ser prontamente aplicada.

2. Apreciação sobre o objeto do recurso.
2.1. Impugnação da decisão relativa à matéria de facto.
A apelante/ré impugna a decisão relativa à matéria de facto incluída na decisão recorrida, nos seguintes termos:
i) os pontos 13., e 15., dos factos provados, na parte em que aludem à solicitação pelo autor à ré do envio de um reboque e à circunstância de a ré ter transmitido ao autor que para levar a viatura à oficina não necessitava de reboque, deveriam ter sido dados como não provados;
ii) os factos provados 20., 24., 25., 26., 40., e 45., deveriam ter sido dados como não provados;
iii) o Tribunal deveria ter dado como provada a al. r) dos factos dados como não provados.

Relativamente à impugnação enunciada em i), a apelante alega ter resultado da prova produzida em audiência final que o autor decidiu por si próprio deslocar-se à oficina da ré sem recurso a reboque. Para o efeito, procede à transcrição no corpo da alegação de curtos segmentos do depoimento de parte do legal representante da ré, CC, dos quais alega resultar que o autor decidiu por si só deslocar-se à oficina da ré sem recurso a reboque, inexistindo qualquer outra prova que infirmasse aquele depoimento, por ser este a única pessoa que conversou telefonicamente com o autor nessa data.
Em primeiro lugar, não se vislumbra que a pretendida alteração da matéria que consta dos pontos 13., e 15., dos factos provados, na hipótese de proceder, permita obter um efeito juridicamente útil ou relevante no quadro das concretas pretensões formuladas pelas partes nos presentes autos, nem de tal matéria foi extraída qualquer consequência pertinente no âmbito da sentença impugnada.
Por outro lado, a recorrente também não retira da pretendida alteração qualquer consequência jurídica em sede de recurso.
Deste modo, a alteração pretendida revela-se manifestamente inconsequente e irrelevante à luz do objeto da presente ação, atendendo à restante matéria de facto já pacificamente assente nos autos e ponderadas as várias soluções plausíveis da questão de direito.
Não obstante, foi reapreciado o concreto meio probatório indicado pela recorrente sobre esta matéria - o depoimento de parte do legal representante da ré, CC. Além disso, uma vez que a recorrente alude de forma genérica à falta de prova que permita infirmar as referências que decorrem do depoimento de parte do legal representante da ré sobre esta matéria, foram revistos e analisados criticamente todos os meios probatórios produzidos em sede de audiência final (o que envolve a globalidade dos depoimentos nela produzidos) e os documentos apresentados pelas partes no processo, tudo no intuito de evitar conclusões descontextualizadas sobre a matéria impugnada e permitir a completa perceção dos factos impugnados.
Reapreciada a prova produzida, julgamos que a mesma não é suficiente para considerar assentes os concretos segmentos impugnados dos pontos 13., e 15., dos factos provados.
Com efeito, o legal representante da ré negou ter dito ao autor que a viatura podia circular sem reboque, referindo até que o aconselhou a não o fazer sem embraiagem, mais esclarecendo que a ré não tem serviço de reboque e que o autor apareceu na oficina da ré com a carrinha a circular, sendo que tais relatos não foram postos em causa por qualquer dos restantes meios de prova produzidos nos autos.
Em conformidade com a ponderação antes efetuada, importa julgar procedente a impugnação da decisão de facto relativamente aos pontos 13., e 15., da matéria de facto provada, que passarão a vigorar com a seguinte redação:
13. «Contactou telefonicamente a Ré, por forma a perceber se teriam disponibilidade para verem e repararem a viatura».
15. «Imediatamente foi-lhe transmitido que estavam disponíveis e que poderia levar a viatura à oficina naquele momento».
Defende a apelante o aditamento à matéria não provada dos pontos 20., 24., 25., 26., 40., e 45., dos factos provados.
Porém, no que concerne ao impugnado ponto 40., não se vislumbra que tenha a recorrente cumprido o ónus de alegação constante da alínea b) do n.º 1, conjugada com a alínea a) do n.º 2, do artigo 640.º do CPC[1], já que da análise da correspondente alegação de recurso não é possível identificar o(s) concreto(s) meios de prova constantes do processo que, segundo a apelante, implica/m decisão diversa sobre a matéria indicada.
Ademais, trata-se de matéria que pretende reproduzir o teor da comunicação escrita que se mostra identificada no ponto 39., dos factos provados e cujo teor está devidamente provado nos autos por documento - cf. o documento n.º 6 junto com a petição inicial, não impugnado pela ora recorrente.
Como tal, improcede a impugnação da decisão relativa ao ponto 40., dos factos provados.
Retomando agora a impugnação dos pontos 20., 24., 25., 26., e 45., dos factos provados, observa-se que a recorrente indica, como meio de prova a atender, o depoimento de parte do legal representante da ré, CC, com transcrição de curtos segmentos das respetivas declarações, que alega terem sido corroboradas pelas testemunhas DD e EE, das quais entende resultar que a viatura foi entregue e aceite pelo autor em perfeitas condições de circulação e que em nenhum momento da entrega da viatura foi estabelecido qualquer conexão entre as desconformidades então detetadas e a reparação feita pela ré na embraiagem. Mais alega não ser verdade que o autor não tenha logrado engrenar a 1.ª velocidade nem a marcha-atrás, caso contrário a viatura não teria sequer circulado para fora da oficina da ré, como resulta do ponto 21., dos factos provados.
No que concerne às declarações de DD, sócio da ré, e ao depoimento da testemunha EE, funcionário da mesma, verificamos que a recorrente se limita a remeter para a totalidade do registo de gravação dos depoimentos em causa, posto que indica a localização do início e termo dos respetivos depoimentos.
Como tal, não pode considerar-se que o recorrente tenha procedido à rigorosa delimitação das concretas passagens dos depoimentos que baseiam o recurso nesta parte.
Atendendo, porém, que a exigência da indicação exata das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, integra um ónus secundário[2], entendemos que o incumprimento da enunciada exigência relativamente a alguns meios de prova não leva à rejeição liminar da impugnação da matéria de facto no caso em apreciação, ainda que dificulte a tarefa deste Tribunal de recurso na identificação dos fundamentos e dos meios probatórios em que a recorrente se baseia para concluir de forma diferente daquilo que a 1.ª instância decidiu, sobretudo tendo em conta a circunstanciada motivação da decisão de facto que consta da sentença recorrida.
Também aqui foram revistos e analisados criticamente todos os meios probatórios produzidos em sede de audiência final (o que envolve a globalidade dos depoimentos nela produzidos) o relatório da perícia realizada nos presentes autos, subscrito pelo perito FF (de 23-06-2023), os esclarecimentos por este prestados em sede de audiência final, a ponderação dos documentos juntos pelas partes ao processo, sem esquecer os factos já devidamente consolidados no autos, sendo que da respetiva análise não decorrem motivos consistentes que imponham a alteração preconizada pela apelante quanto aos impugnados pontos 24., 25., 26., e 45.
Porém, relativamente ao impugnado ponto 20., julgamos assistir razão à recorrente quanto à circunstância de não ter resultado com a necessária suficiência dos meios de prova analisados que o autor, quando procedeu ao levantamento da viatura e tentou iniciar a marcha, não logrou mover nem a primeira mudança, nem a marcha-atrás.
Assim, os únicos intervenientes que revelaram conhecimento direto e relevante sobre tal matéria - o declarante/legal representante da ré, CC, o declarante/sócio da ré, DD, e a testemunha GG -, foram unânimes quanto à perceção de que, logo quando o autor entrou na sua viatura para iniciar a marcha, sentiu dificuldades em engrenar as mudanças pois, quando tentava mover a primeira mudança ou a marcha-atrás estas “arranhavam”, circunstância que de imediato reportou ao legal representante da ré, CC, na presença do sócio da ré, DD, e foi de imediato confirmada por estes no local.
Por outro lado, analisando o elenco dos factos impugnados, verificamos que parte da formulação que o tribunal a quo integrou no ponto 20 - «(…) a caixa de velocidades demonstrava claras desconformidades (…)» -, não estão em causa simples ocorrências objetivas ou eventos materiais e concretos, antes consubstanciando juízos conclusivos e de direito.
Significa isto que, com tais referências, está a resolver-se, em sede de enunciação de facto, parte das questões de direito colocadas na ação, consistindo por isso em matéria de direito/conclusiva.
Tal constatação implica, desde já, que tal segmento da matéria de facto seja retirado do elenco dos factos provados, devendo ser declarado como não escrito.
Desta forma, impõe-se considerar parcialmente procedente a impugnação deduzida quanto ao ponto 20., dos factos provados, compatibilizando-o com os pontos 21., a 23., dos factos já definitivamente assentes nos autos, à luz dos meios de prova reapreciados, o qual passa a ter a seguinte redação:
20. «No entanto, quando o Autor procedeu ao levantamento da viatura e tentou colocá-la em marcha, sentiu dificuldades em engrenar as mudanças pois quando tentava mover a primeira mudança ou a marcha-atrás estas “arranhavam”».
Importa, ainda, proceder à reapreciação dos factos vertidos nos pontos 24., - «Ao que lhe responderam que deveria carregar na embraiagem até ao fundo e andar com a viatura porque como a embraiagem era nova e isso ia acabar por desaparecer»; - 25., - «O Autor, de boa-fé e acreditando na Ré, levou a viatura para casa, mas como o problema persistia e o mesmo não era de todo normal, mesmo para o seu parco conhecimento de mecânica, voltou a contactar a Ré dizendo que não aceitava que a viatura lhe fosse entregue desta forma, exigindo que a tal desconformidade fosse eliminada» - 26., - «Pelo que prontamente lhe foi garantido pela mesma que iriam ver o que se passava e assumir o que necessário fosse» - e 45., - «O único que o Autor solicitou à Ré foi a reparação da embraiagem e a eliminação dos defeitos que resultaram dessa reparação» - dos factos provados, com vista a aferir se tais factos deveriam ter sido dado como não provados, tal como pretende a ré/apelante, sustentando que, em nenhum momento da entrega da viatura as partes estabeleceram qualquer ligação entre o problema detetado e a reparação realizada pela ré na embraiagem.
Para o efeito, a apelante alude a um concreto segmento do depoimento do legal representante da ré, mais alegando que com a honestidade com que o depoimento do representante da Ré foi prestado, é até feita referência a uma primeira expressão de “isto não está bem” mas que explicada demonstra que foi imediatamente esclarecido entre A. e Ré que o tal “arranha de mudanças” poderia ter várias explicações, nomeadamente ser simplesmente o ajuste inicial aos componentes novos da embraiagem ou uma outra avaria na caixa de velocidades.
Na realidade, de acordo com o legal representante da Ré esta seria a explicação mais provável já que a existir alguma desconformidade com a embraiagem colocada pela Ré, ela seria notada em todas as mudanças e não apenas na primeira velocidade e marcha atrás.
Ora, sobre esta matéria, o Tribunal recorrido ponderou criticamente a prova produzida, designadamente o depoimento do legal representante da ré, CC, à luz das regras da experiência comum e do normal proceder, em conjunto com o depoimento da testemunha GG e com os esclarecimentos prestados pelo perito FF sobre o relatório pericial que elaborou e se encontra junto aos autos, o qual não vem relevantemente questionado pela ora apelante e se mostrou determinante para alicerçar a convicção do Tribunal na apreciação da factualidade provada e não provada, o que se mostra explicitado de forma que julgamos adequada nas seguintes passagens da correspondente motivação da decisão sobre a matéria de facto:
«(…)
Referiu que na sua oficina substituíram o Kit de embraiagem e telefonaram ao autor para vir buscar a viatura, sendo que quando este entrou na mesma, referiu logo que as mudanças “arranhavam”, tendo o depoente referido, nessa altura, ao autor, que isso nada tinha a ver com a embraiagem, mas sim com a caixa de velocidades.
 Segundo o depoente, o autor foi embora e mais tarde trouxe a viatura para consertar a caixa de velocidades.
Ora, analisando esta primeira parte do depoimento, aqui começam as discrepâncias que são contrárias aos juízos da normalidade. Ou seja, se um cliente deixa uma viatura para consertar a embraiagem e a oficina lhe telefona para ir buscar a mesma, é suposto que os mecânicos da oficina tenham testado a mesma viatura. E se assim é, não é suposto que entreguem um veículo ao cliente que não está consertado, seja o problema da embraiagem ou da caixa de velocidades. O normal e expectável era que lhe tivessem telefonado explicando que para além da embraiagem, o veículo estava com problema na caixa de velocidades (a ser verdade) e darem-lhe um orçamento para que o autor pudesse escolher livremente se queria também consertar a caixa ou não. Todavia, não foi isto que aconteceu, pois segundo o depoente, telefonaram ao autor para levantar a viatura, mesmo sabendo que a mesma não estava em conformidade para poder circular e o autor levou-a, não tendo o legal representante da ré logrado explicar cabalmente, em tribunal, afinal o que é que foi acordado entre as partes…
(…)
Ora, este depoimento não nos convenceu (com excepção dos factos que confessou), pela forma despiciente e pouco assertiva com que foi prestado.
Em tribunal prestou esclarecimentos o senhor perito FF, de forma clara e honesta, sobre o relatório pericial que elaborou e se encontra junto aos autos a fls. 55 e seguintes.
FF explicou que efectivamente havia danos na embraiagem e foi sensata a sua substituição e, para além disso, as mudanças primeira e marcha-atrás arranhavam.
Sucede que, conforme explicou, “previamente à desmontagem da caixa de velocidades, é necessários efectuar outro tipo de diligências e testes, pelos mecânicos para eliminar outras causas, pois o desmonte e substituição da caixa é muito oneroso para o cliente”. Mais à frente nos seus esclarecimentos, referiu, também, que o desgaste da embraiagem não justificava a substituição da caixa de velocidades, embora perceba que a tenham substituído, pelo facto de já estar aberta (tendo sido aberta por opção da oficina da ré) e da viatura ter mais de cem mil quilómetros.
Após a abertura da caixa, o Sr. Perito entende que a é ré fez bem em substituir a caixa, na medida em que mais tarde iriam ter que a substituir e aparentemente solucionaram o problema, pois a viatura foi posta a funcionar aquando da peritagem.
Conclui, referindo que os procedimentos da oficina foram todos correctos, com a excepção da necessidade de desmontar a caixa de velocidades, perante as evidências que encontrou, pois no limite, deveriam ter mandado vir uma embraiagem nova para ver se o problema viria dali ou não.
Estes esclarecimentos são muito relevantes, assim como a análise do relatório pericial junto aos autos que, no fundo, corroboram a tese vertida na petição inicial.
(…)
Por outro lado, o sintoma de dificuldade em engrenar as mudanças é compatível com problemas na embraiagem e/ou na caixa de velocidades. E mais à frente, o senhor perito escreveu “tendo-se substituído a embraiagem é natural que se desconfie da caixa. No entanto, a cautela e a prudência técnica deve-nos aconselhar a verificar bem se a embraiagem está, apesar de nova, a funcionar como deve. Desmontar a caixa de velocidades e abri-la, como feito, só deve ser a solução com todos os testes necessários e suficientes de que tudo até ali está conforme. Porque após abrir-se a caixa mesmo que esteja boa, há desde logo, custos elevados para a sua remontagem”.
E concluiu que não se evidenciam causas que levassem à substituição da caixa de velocidades!
(…)».
Acrescente-se o que resultou das declarações prestadas por DD, sócio da ré, assumindo que o seu colega, CC, terá dito ao autor para carregar bem no pedal e que “nós estamos cá para resolver seja o que for”, mais esclarecendo que o Senhor AA (ora autor) foi embora com a carrinha, sempre com o compromisso de que, se necessário, ligaria para trazer a carrinha e resolver aquele problema, o que reiteraram mais tarde, quando o autor insistiu que a carrinha não estava bem, realçando que tal indicação foi no sentido de testar a viatura para verem o que tinha, o que diverge do teor das declarações prestadas pelo seu sócio CC ao referir que, logo no dia em que o autor veio buscar a carrinha lhe referiu que a causa da anomalia nada tinha a ver com a embraiagem, porque se fosse, o problema surgiria com as mudanças todas e não apenas com a primeira velocidade e com a marcha-atrás, referindo mesmo, noutro ponto do seu depoimento, que logo quando fizeram a reparação da embraiagem (portanto, antes de entregarem a viatura ao autor) detetaram que as mudanças arranhavam.
Além disso, a conclusão extraída pelo legal representante da ré em face da circunstância de o problema surgir apenas com a primeira velocidade e com a marcha-atrás não se mostra corroborada nas conclusões vertida no relatório elaborado ao abrigo da perícia efetuada nos autos pelo perito FF e esclarecimentos por ele prestados em sede de audiência de julgamento, designadamente quando refere:
«(…)
Perguntar-se-á legitimamente, mas então se for na embraiagem não deveriam ser afectadas todas as velocidades e não só a 1ª e a marcha a trás? É uma boa pergunta na medida em que estas duas marchas, velocidades, são as que requerem absolutamente que o veio primário da caixa pare para que exista um engrenamento suave e sem rascanhar usando um termo corriqueiro mas perceptível. Nas outras marchas, velocidades, praticamente com a rotação certa consiguimos engrenar sem dificuldade até sem o apoio da embraiagem. Não é um bom procedimento mas é possível, isto para justificar que a embraiagem tem particular relevância na 1ª e na marcha a trás.
É claro que perante uma situação em que há dificuldades de engrenar a 1ª velocidade e a marca a trás e tendo-se substituído a embraiagem é natural que se desconfie da caixa. No entanto a cautela e a prudência técnica deve-nos aconselhar a verificar bem se a embraiagem está, apesar de nova, a funcionar como deve. Desmontar a caixa de velocidades e abri-la, como feito, só deve ser a solução com todos os testes necessários e suficientes de que tudo até ali está conforme. Porque após abrir-se a caixa mesmo que esteja boa, há desde logo, custos elevados para a sua remontagem.
(…)
Em termos gerais a caixa de velocidades tem um desgaste condizente com o número de quilómetros apresentados pela viatura. Não há nada de anormal que nos pudesse justificar a necessidade da sua substituição. Refira-se que não estavam todos os componentes da caixa, nomeadamente algumas peças mais pequenas e que se aceita que se percam entre desmontagens. Isso condiciona o nosso trabalho de montagem da mesma, no entanto foi possível montar a caixa na zona da 1ª e 2ª velocidade e simular o seu funcionamento, que se reitera, é normal. Há um desgaste nos carretos das várias velocidades, que é um padrão condizente com o uso da viatura. Em concreto vejamos o carreto da 1ª velocidade cujo print colocamos na fig.8.
(…)
R - Não há danos evidentes que nos mostrem que tenham sido provocados pela prestação de serviços da Ré. Quanto ao bombito da embraiagem, faz sentido ter sido susbtituído, dado o seu estado. Quanto à embraiagem não tivemos acesso às peças velhas e daí não comentar o seu estado e assim não avaliar a pertinência da sua mudança, mas que se aceita em função do estado do bombito. Quanto à caixa de velocidades não existem evidências claras da necessidade da sua substituição, o desgaste é normal e não é coerente com a dificuldade de engrenamento da 1ª velocidade e da marcha a trás».
Ademais, verifica-se que a recorrente nem sequer impugna diversos outros pontos da matéria de facto assente que sustentam a versão alegada pelos apelados/autores, designadamente os pontos 29 - «Nunca foi o Autor informado que a viatura iria necessitar de uma peça nova» - 30 - «Muito menos que o Autor teria de proceder ao pagamento do que quer que fosse e que a Ré não assumiria» - 38 - «Nunca foi o Autor informado da necessidade de proceder à substituição da caixa de velocidades e que seria responsável por essa reparação» - e 44 - «O único serviço solicitado à Ré foi pago, como se percebe pela Factura-Recibo n.º ...42, emitida no dia 07.09.22» - dos factos provados, o que delimita necessariamente o poder de cognição do Tribunal ad quem e infirma de forma relevante a credibilidade da versão apresentada pelo legal representante da ré.
 Daí que não existam razões para censurar a decisão da matéria de facto quanto aos pontos 24., 25., 26., e 45., dos factos provados.
A apelante insurge-se contra a resposta negativa dada à al. r) dos factos não provados, sustentando que o Tribunal recorrido deveria ter dado como provada a inexistência de qualquer relação entre o problema da caixa de velocidades e a reparação realizada pela ré na embraiagem, o que fundamenta na conclusão vertida no relatório pericial no sentido de que «Não há danos evidentes que nos mostrem que tenham sido provocados pela prestação de serviços da Ré» reiterada pelo mesmo perito nos esclarecimentos prestados em audiência final.
Sucede que o facto vertido na impugnada al. r) dos factos não provados surge na sequência ou foi alegado em complemento da matéria vertida na al. q), com o seguinte teor: «q) Que a 22 de Agosto de 2022 o Autor tenha sido chamado pela ré às suas instalações onde lhe foi mostrado e explicado o problema existente na caixa de velocidades; r) Bem como a inexistência de qualquer relação com a intervenção realizada pela Ré na embraiagem, e quais as possibilidades de reparação da viatura substituição de peças».
Nestes termos, o contexto da materialidade vertida em r) dos factos não provados encontra-se circunscrito a aferir se a 22 de agosto de 2022 o autor foi chamado pela ré às suas instalações onde, além do que se mostra vertido na aludida al. q), lhe foi explicado a inexistência de qualquer relação com a intervenção realizada pela ré na embraiagem, e quais as possibilidades de reparação da viatura substituição de peças.
Como tal, não se vislumbra que tal facto possa ser dado como provado com recurso ao relatório da perícia realizada nos presentes autos, subscrito pelo perito FF, e/ou aos esclarecimentos por este prestados em audiência final, tanto mais que a ré nem sequer impugna na presente apelação a resposta negativa também dada pelo Tribunal a quo à aludida al. q) dos factos não provados.
Em todo o caso, também não vemos que o resultado do relatório da perícia realizada nos autos permita consubstanciar o concreto juízo conclusivo agora enunciado pela apelante a propósito da inexistência de qualquer relação entre o problema da caixa de velocidades e a reparação realizada pela ré na embraiagem.
Com efeito, o que resulta do relatório pericial é apenas que não há danos evidentes que revelem terem tido como causa os serviços prestados pela ré, não tendo o referido relatório pericial firmado qualquer conclusão no sentido pretendido pela recorrente.
Aliás, resulta do relatório da perícia que não existem evidências claras da necessidade da substituição pela ré da caixa de velocidades, aludindo mesmo o perito a um desgaste normal que não é coerente com a dificuldade de engrenamento da 1.ª velocidade e da marcha-atrás, pelo que das conclusões da perícia nem sequer é possível extrair que tais anomalias ou desconformidades tenham resultado de um problema na caixa de velocidades.
Pelo exposto, entendemos que não existe erro de julgamento no que respeita à impugnada al. r) dos factos não provados, improcedendo nesta parte a impugnação da decisão relativa à matéria de facto.
Em conclusão, procede parcialmente a impugnação da decisão relativa à matéria de facto deduzida pelo recorrente/réu quanto aos pontos 13., 15., e 20., dos factos provados, nos termos antes enunciados.
2.2. Reapreciação do mérito da decisão de direito.
Atenta a parcial procedência da impugnação da decisão sobre a matéria de facto deduzida pela apelante/ré, os factos a considerar na apreciação da questão de direito são os que se mostram enunciados em 1.1., supra, com alteração da redação dos pontos 13., 15., e 20., dos factos provados, que passam a ter a seguinte redação:
13. «Contactou telefonicamente a Ré, por forma a perceber se teriam disponibilidade para verem e repararem a viatura».
15. «Imediatamente foi-lhe transmitido que estavam disponíveis e que poderia levar a viatura à oficina naquele momento».
20. «No entanto, quando o Autor procedeu ao levantamento da viatura e tentou colocá-la em marcha, sentiu dificuldades em engrenar as mudanças pois quando tentava mover a primeira mudança ou a marcha-atrás estas “arranhavam”».
Como se vê, o quadro fáctico relevante com vista à subsequente subsunção jurídica é sensivelmente idêntico ao que serviu de base à prolação da sentença recorrida
A sentença recorrida considerou - e bem - que autor/apelado e ré/apelante celebraram um contrato de empreitada, tal como o define o artigo 1207.º do CC, através do qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço.
Com efeito, a doutrina e jurisprudência vêm caracterizando a reparação de uma viatura automóvel numa oficina como uma das situações típicas de realização de uma obra[3].
No caso, a ré é uma sociedade comercial que se dedica à reparação de veículos automóveis e motociclos, comércio, manutenção e reparação, sendo que o aqui autor se deslocou à oficina da ora ré, solicitando um diagnóstico prévio da viatura, bem como um orçamento para a reparação da mesma, tendo lhe sido dito que a viatura havia ficado sem embraiagem e que teriam de proceder à sua substituição, bem como o informaram do valor orçamentado para a reparação.
Também não vem posto em causa, como decidido, que o autor aceitou o valor proposto e solicitou que procedessem à sua reparação, mais se provando que, aquando da entrega da viatura, entre a primeira ou segunda semana de agosto, o autor fez o pagamento de € 600,00 (seiscentos euros) em numerário e que o único serviço solicitado à ré foi pago, como se percebe pela Fatura-Recibo n.º ...42, emitida no dia 07-09-22.
Do acordo celebrado resultam obrigações recíprocas para ambas as partes: a obrigação de realização da obra para o empreiteiro, ora apelante, e a obrigação de pagamento do preço para o dono da obra, ora apelado, pelo que se trata de um contrato sinalagmático.
Como se refere no citado acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 19-11-2020: «O contrato de empreitada tem, como vimos, por objecto a realização de uma obra. É um contrato sinalagmático, oneroso, comutativo e consensual, porque dele emergem, por um lado, obrigações recíprocas e interdependentes: a obrigação de realizar a obra e a obrigação de pagar o preço, sua contrapartida directa».
Tal como decorre do disposto no artigo 1208.º do CC, o empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato.
Assim, é obrigação do empreiteiro executar a obra sem defeitos, compreendendo-se nestes os vícios que excluam ou reduzam o valor da obra, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato, e as desconformidades com o que foi convencionado, sendo que os vícios são anomalias objetivas da obra, traduzindo-se em estados patológicos desta, independentemente das características convencionadas[4].
Neste domínio, a decisão recorrida considerou que o cumprimento do contrato de empreitada por parte da ré se revela defeituoso, consignando que a ré não logrou provar a sua versão dos factos, pois o autor pagou, na íntegra, o serviço contratado (substituição da embraiagem que estava danificada), tendo cumprido a sua parte no contrato de prestação de serviços celebrado. E, pelo contrário, a ré incumpriu a sua prestação, pois prestou um serviço defeituoso, tendo entregue o veículo ao autor, entre a primeira ou segunda semana de Agosto de 2022 e tendo este último de trazer a viatura novamente à oficina, para nova reparação, porquanto o veículo não ficou correctamente reparado inicialmente, mais entendendo que, estando provado que há ainda coisas a reparar e outras a cumprir, não há lugar a extrapolação para a aceitação definitiva da obra por parte do dono da obra, os ora autores/recorridos, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 1218.º, n.º1, e 1219.º, a contrario sensu do CC.
Em consequência, o Tribunal recorrido julgou improcedente a exceção de incumprimento do contrato e o direito de retenção da viatura invocados pela ré/empreiteira, por considerar que este pressupõe que o detentor/devedor da entrega da coisa (ora ré), seja simultaneamente credor daquele a quem ela é devida (e que o crédito do detentor, esteja diretamente relacionado com a coisa detida, devendo resultar de despesas feitas por causa dela ou de danos por ela causados), o que no caso entendeu não se verificar visto não ser devido o valor reclamado pela ré dos autores a título de preço relativo à fatura de fls. 43-verso (no montante total de 2.247,70 €) em função do cumprimento defeituoso da prestação efetivamente contratada e paga pelo autor e uma vez que a ré não logrou provar que a embraiagem substituída estava a funcionar como deveria ser, nem tendo feito os testes necessários e suficientes - conforme concluiu o Sr. Perito no relatório pericial -, tendo optado por substituir a caixa de velocidades, abrindo-a, sem autorização e consentimento do autor.
A recorrente discorda do assim decidido, sustentando, no essencial, que o facto de se fazer referência a que a primeira mudança “arranhava” no momento da entrega da viatura não significa a não aceitação da mesma, até por se tratar de componentes diferentes, e não tendo a avaria na caixa de velocidades nenhuma relação com a substituição da embraiagem, dúvidas não há da responsabilidade do autor proceder ao pagamento da caixa de velocidades adquirida para ser colocada e da respetiva mão de obra, assim como das faturas de parqueamento, no valor do pedido reconvencional, e bem assim do direito de retenção que assiste à ré, ao abrigo do disposto no artigo 754.º do CC, legitimado pelo incumprimento pelo autor da sua obrigação de pagamento do preço pelo serviço que lhe foi prestado.
Vejamos se lhe assiste razão.
Conforme já vimos resultar do citado artigo 1208.º do CC, o empreiteiro está adstrito a uma obrigação de resultado, estando obrigado a realizar a obra conforme o acordado e segundo os usos e as regras da arte. Se a obra apresenta defeitos, não foi alcançado o resultado prometido[5].
Assim, ocorre uma situação de cumprimento defeituoso na empreitada sempre que o empreiteiro entrega a obra no prazo acordado, mas esta não é realizada nos termos devidos, devendo o cumprimento considerar-se defeituoso quando a obra foi realizada com deformidades ou com vícios, sendo as deformidadesas discordâncias com o plano convencionado e correspondendo os vícios às imperfeições que excluem ou reduzem o valor da obra ou a sua aptidão para o uso ordinário ou o previsto no contrato[6].
Tal como esclarece ainda Pedro Romano Martinez[7], «[a] falta de elementos legais específicos permite a aplicação de regras gerais que conduzem à aceitação do princípio da qualidade normal.
Sendo devida uma obrigação específica, a qualidade normal resulta de factos que derivam da experiência social e, não sendo esta elucidativa, tem de se recorrer a juízos de valor».
Tal como se refere no citado acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 19-11-2020, «a obrigação do empreiteiro é essencialmente uma obrigação de resultado, ele vincula-se a realizar a obra convencionada, nos termos acordados e segundo os usos e as leges artis, sob pena de falhar ao cumprimento da sua obrigação. A obra que constitui elemento constitutivo do contrato de empreitada tanto pode consistir na realização de uma coisa (corpórea) nova, como na modificação de uma coisa existente, e, mesmo na fabricação de qualquer outro produto, mediante prestação de trabalho ou de serviços.
Na empreitada o trabalho não é devido enquanto tal, mas apenas como meio de realização da obra ou da produção do resultado que constitui o objecto nuclear da prestação obrigacional. Por essa razão, aliás, o trabalho não tem de ser prestado pelo próprio empreiteiro a título pessoal - salvo tratando-se de obra caracterizada como infungível: v.g. um quadro de um determinado pintor -, o qual intervém no contrato como agente económico autónomo, não subordinado, independente de ordens e instruções do dono da obra.
A reparação de um veículo automóvel que sofreu um dano ou avaria e funciona mal, através da reparação e substituição de peças e colocação do veículo de novo em condições de normal funcionamento, é uma obra, mais especificamente uma obra de reparação de uma coisa móvel, razão pela qual o contrato celebrado entre as partes é um contrato de empreitada e rege-se pelas respectivas regras e não pelas regras do mandato (com excepção das que o próprio regime da empreitada manda aplicar: v.g. artigo 1211.º do Código Civil)».
No caso, a patologias evidenciadas nos pontos 20., a 22., independentemente das alterações introduzidas em sede de impugnação da matéria de facto no impugnado ponto 20., enquadram-se indiscutivelmente no conceito de vício, tal como previsto no artigo 1208.º do CC posto que impedem ou reduzem a realização do fim normal, e do previsto no contrato, a que a obra de reparação da viatura é destinada: a colocação do veículo de novo em condições de normal funcionamento.
Ora, no âmbito da responsabilidade contratual do empreiteiro por defeitos da obra tem aplicação a presunção prevista no artigo 799.º, n.º 1 do CC, segundo o qual, incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua.
Deste modo, ao dono da obra bastará provar a existência do defeito (deficiência ou desconformidade nos termos supra aludidos, e não a causa do mesmo), enquanto ao empreiteiro competirá afastar a sua responsabilidade na produção do defeito[8], ou seja, que os defeitos ou vícios não advêm da sua responsabilidade, de forma a afastar a sua culpa na verificação dos enunciados vícios (a qual se presume)[9], designadamente que tais deficiências se deveram a causas externas, não abrangidas pelo acordo celebrado e/ou posteriores à intervenção efetuada.
Assim, «ao dono da obra bastará provar a existência do defeito, presumindo-se a culpa do empreiteiro, o qual, para afastar a sua responsabilidade terá que demonstrar que o cumprimento defeituoso não procede de culpa sua.
Este ónus da prova não se satisfaz com a simples demonstração que o empreiteiro, na realização da obra, agiu diligentemente, ficando o tribunal na ignorância de qual a causa e quem merece ser censurado pela verificação do defeito apontado pelo dono da obra. Nesta situação, continua a funcionar a presunção de que o devedor da prestação é o culpado. O empreiteiro tem que provar a causa do defeito, a qual lhe deve ser completamente estranha, o que bem se compreende pelo domínio que este necessariamente teve do processo executivo da prestação. Só assim se exonerará da responsabilidade pelo defeito existente na obra por si realizada»[10].
Por conseguinte, atendendo à factualidade provada, resta concluir que os vícios verificados na obra em apreciação permitem consubstanciar o incumprimento defeituoso da empreitada, imputável à ré, posto que relativamente aos mesmos esta não logrou ilidir a presunção da falta de conformidade à data da entrega.
Assim sendo, a decisão recorrida não merece censura quando julgou verificado o cumprimento defeituoso da prestação efetivamente contratada e paga pelo autor e uma vez que a ré não logrou provar que a embraiagem substituída estava a funcionar como deveria ser, nem tendo feito os testes necessários e suficientes - conforme concluiu o Perito no relatório pericial -, tendo optado por substituir a caixa de velocidades, abrindo-a, sem autorização e consentimento do autor, como também decorre dos factos apurados nos autos.
Neste domínio, a apelante defende em sede de recurso que o facto de se fazer referência a que a primeira mudança “arranhava” no momento da entrega da viatura não significa a não aceitação da mesma por parte do dono da obra, aqui autor.
Porém, a solução que a recorrente defende para o litígio pressupunha, no mínimo, o prévio aditamento à matéria de facto não provada de factos tidos como provados, o que não se verificou.
Nos termos do disposto no artigo 1218.º, n.º 1 do CC, o dono da obra deve verificar, antes de a aceitar, se ela se encontra nas condições convencionadas e sem vícios.
Por seu turno, a verificação deve ser feita dentro do prazo usual ou, na falta de uso, dentro do período que se julgue razoável depois de o empreiteiro colocar o dono da obra em condições de a poder fazer (n.º 2), sendo que os resultados da verificação devem ser comunicados ao empreiteiro (n.º 4). E, nos termos do n.º 5 do mesmo preceito, a falta da verificação ou da comunicação importa aceitação da obra.

Neste domínio, prevê o n.º 1 do artigo 1219.º do CC que o empreiteiro não responde pelos defeitos da obra, se o dono a aceitou sem reserva, com conhecimento deles, acrescentando o n.º 2 do mesmo preceito que, presumem-se conhecidos os defeitos aparentes, tenha ou não havido verificação da obra.
Por outro lado, o n.º 1 do artigo 1220.º do CC dispõe que o dono da obra deve, sob pena de caducidade dos direitos conferidos naqueles preceitos, denunciar ao empreiteiro os defeitos da obra dentro dos trinta dias seguintes ao seu descobrimento.
Tal como esclarece João Serras de Sousa, em anotação ao artigo 1218.º do CC[11]: «Verificada a obra, tem o dono da obra o ónus de comunicar o seu resultado ao empreiteiro (n.º 4).
(…)
A comunicação do resultado, indicando no sentido de ter sido a obra realizada em conformidade com o plano convencionado e sem vícios, incorpora tacitamente (art. 217.º) uma aceitação da obra sem reservas.
Caso a comunicação seja feita no sentido de ter vícios ou de padecer de defeitos, terá o significado de recusa ou de aceitação sem reserva, em qualquer caso, importando sempre a denúncia dos defeitos da obra (…)».
Assim, «inexistindo aceitação da obra, se houver comunicação dos defeitos ou se estes foram denunciados, atempadamente, o que equivale a recusa, a prestação do empreiteiro não se considera, plenamente, realizada, sendo certo que, nesta hipótese, o comitente só é obrigado a aceitá-la, depois de a mesma se encontrar concluída, e desde que tivesse sido executada, sem defeitos e nos termos acordados.
(…)
E a comunicação consiste numa declaração, mediante a qual o dono da obra transmite ao empreiteiro os resultados da sua verificação, em conformidade com o disposto pelo artigo 1218º, nº 4, do CC, sendo certo que quando nela se indicam os defeitos concretos de que a obra padece, o comitente está a proceder a uma denúncia, devendo, então, a obra considerar-se como não aceita, salvo indicação em contrário»[12].
Por outro lado, o conceito de “entrega da obra” há-de corresponder a uma entrega com a obra terminada, sem qualquer necessidade, previsível, de efetuar qualquer trabalho no âmbito da mesma empreitada[13].
Revertendo ao caso dos autos, observa-se que, logo quando o autor procedeu ao levantamento da viatura e tentou colocá-la em marcha, sentiu dificuldades em engrenar as mudanças pois quando tentava mover a primeira mudança ou a marcha-atrás estas “arranhavam” (ponto 20 dos factos provados), sempre que tentava mover a primeira mudança ou a marcha-atrás, esta “arranhava”, algo que jamais tinha acontecido com o veículo (pontos 21 e 22 dos factos provados), pelo que, sem sair da oficina, prontamente informou um dos funcionários da Ré do descrito em 20) a 22), ao que lhe responderam que deveria carregar na embraiagem até ao fundo e andar com a viatura porque como a embraiagem era nova e isso ia acabar por desaparecer.
A este propósito, há ainda a considerar a seguinte matéria de facto que se mostra assente nos autos: O Autor, de boa-fé e acreditando na Ré, levou a viatura para casa, mas como o problema persistia e o mesmo não era de todo normal, mesmo para o seu parco conhecimento de mecânica, voltou a contactar a Ré dizendo que não aceitava que a viatura lhe fosse entregue desta forma, exigindo que a tal desconformidade fosse eliminada (ponto 25); Pelo que prontamente lhe foi garantido pela mesma que iriam ver o que se passava e assumir o que necessário fosse (ponto 26); a Ré solicitou apenas que o Autor levasse a viatura à oficina no dia ../../2022 e este fê-lo em tal data (ponto 27 dos factos provados).
Deste modo, face à matéria de facto definitivamente assente nos autos, não pode deixar de se concluir que o autor, em resultado da verificação preliminar que efetuou, logo comunicou à ré a existência de defeitos, o que veio a reiterar após ter constatado que o problema persistia, comunicando então que não aceitava que a viatura lhe fosse entregue desta forma, exigindo que a tal desconformidade fosse eliminada, devendo assim a obra considerar-se como não aceite, tal como concluiu o Tribunal recorrido.
Note-se que o pagamento do preço, salvo disposição ou acordo nesse sentido, não corresponde a uma aceitação tácita (a aceitação faz vencer o pagamento, mas o pagamento não corresponde a aceitação)[14], pelo que não está excluída a responsabilidade do empreiteiro pela existência destes defeitos, assim improcedendo nesta parte as correspondentes conclusões da apelação.
Em caso de não cumprimento integral da prestação a cargo do empreiteiro, como sucede sempre que a obra é entregue, mas não se encontra nas condições convencionadas e/ou apresenta anomalias objetivas ou estados patológicos, independentemente das características convencionadas, a lei confere ao dono da obra vários direitos, tal como previstos nos artigos 1221.º, 1222.º e 1223.º do CC.
Se os defeitos puderem ser suprimidos, o dono da obra tem o direito de exigir do empreiteiro a sua eliminação e, se não puderem ser eliminados, pode exigir nova construção, cessando estes direitos se as despesas forem desproporcionadas em relação ao proveito, conforme decorre do artigo 1221.º, n.º 2 do CC. Não sendo eliminados os defeitos ou construída de novo a obra, dispõe o artigo 1222.º do CC, que o dono pode exigir a redução do preço ou a resolução do contrato, se os defeitos tornarem a obra inadequada ao fim a que se destina. Esclarece ainda o artigo 1223.º do CC que o exercício dos direitos conferidos nos artigos antecedentes não exclui o direito a ser indemnizado nos termos gerais.
Tal como esclarece João Serras de Sousa, em anotação ao artigo 1221.º do CC[15]: «Da articulação do regime das medidas previstas nos arts. 1221.º e ss., decorre não constituir exercício destes direitos uma escolha. Há, assim, um encadeamento no exercício destes direitos, não estando em relação de alternatividade (…). Nestes termos, o dono da obra terá, em primeiro lugar, direito à eliminação dos defeitos e, caso esta se revele impossível (art. 1221, n.º 1) ou desproporcionada, o direito à realização de obra nova (art. 1221.º, n.º 2).
(…)
Em caso de recusa na eliminação de defeitos ou na realização de nova obra, poderá o dono da obra exigir o seu cumprimento (art. 817.º). Caso o empreiteiro persista nesse incumprimento e a prestação seja fungível, poderá esta ser cumprida por terceiro (art. 828.º). Em caso de infungibilidade, resta a possibilidade conferida pelo art. 829.º-A, pedindo o dono da obra a condenação em sanção pecuniária compulsória (…)».
No âmbito do direito preferencial do dono da obra de exigir do empreiteiro a sua eliminação, face à realização desta com defeitos, tal como consagrado no artigo 1221.º, n.º 1, do CC, refere João Cura Mariano[16]: «a possibilidade de ser exigida ao empreiteiro a eliminação dos defeitos satisfaz não só o interesse do dono da obra em ver a prestação a que tem direito fielmente cumprida, mas também o interesse do empreiteiro em ser ele a efetuar essa obra e reparação, permitindo-lhe o controlo dos seus custos e evitar o agravamento dos prejuízos causados pelo defeito.
Este direito tanto existe se o dono da obra já a aceitou, como se ele a recusou, após ter verificado a existência de defeitos.
(…)
O direito à eliminação dos defeitos é uma das possíveis consequências legais sancionatórias do cumprimento inexato da prestação do empreiteiro, traduzindo-se num direito à reparação do dano, inerente ao cumprimento defeituoso.
(…)
É o modo ideal de ressarcimento que mais afinidades tem com o próprio cumprimento da prestação, atuando como seu equivalente, pelo que o legislador lhe deu primazia».
No caso em análise, a empreiteira, ora ré, solicitou apenas que o autor levasse a viatura à oficina no dia ../../2022 e este fê-lo em tal data, sendo que, após diversas vicissitudes descritas em 28., a 34., dos factos provados, apenas no dia 2 de setembro é que a ré contactou o autor para levantar a viatura, e nunca referiu qualquer valor em dívida. Porém, nessa altura, a ré comunicou a uma das filhas do autor que se deslocou, à oficina para levantar a viatura, que teria de proceder ao pagamento do montante de 2.247,70 €, referente à reparação da caixa de velocidades, não autorizando a filha do autor a levar a viatura sem que fosse efetuado aquele pagamento.
Decorre do exposto que a ré/empreiteira invocou o direito de retenção previsto no artigo 754.º do CC sobre o veículo que lhe foi entregue para reparação, com base no crédito resultante do alegado incumprimento pelo autor da sua obrigação de pagamento do preço pelo serviço que lhe foi prestado.
Nos termos do disposto no artigo 754.º do CC, o devedor que disponha de um crédito contra o seu credor goza do direito de retenção se, estando obrigado a entregar certa coisa, o seu crédito resultar de despesas feitas por causa dela ou de danos por ela causados.
São, pois, requisitos deste direito: - que alguém retenha licitamente uma coisa cuja entrega é devida a outrem (citado preceito do C.C. conjugado com art.º 756.º, do mesmo diploma legal); - que o detentor, devedor da entrega da coisa, seja simultaneamente credor daquele a quem ela é devida; que o crédito do detentor, esteja diretamente relacionado com a coisa detida, devendo resultar de despesas feitas por causa dela ou de danos por ela causados[17].
No caso, o Tribunal recorrido julgou improcedente a exceção de incumprimento do contrato e o direito de retenção da viatura invocado pela ré/empreiteira, por considerar que este pressupõe que o detentor/devedor da entrega da coisa (ora ré), seja simultaneamente credor daquele a quem ela é devida (e que o crédito do detentor, esteja diretamente relacionado com a coisa detida, devendo resultar de despesas feitas por causa dela ou de danos por ela causados), o que no caso entendeu não se verificar visto não ser devido o valor reclamado pela ré dos autores a título de preço relativo à fatura de fls. 43-verso, no montante total de 2.247,70 € em função do cumprimento defeituoso da prestação efetivamente contratada e paga pelo autor e uma vez que a ré não logrou provar que a embraiagem substituída estava a funcionar como deveria ser, nem tendo feito os testes necessários e suficientes - conforme concluiu o Sr. Perito no relatório pericial -, tendo optado por substituir a caixa de velocidades, abrindo-a, sem autorização e consentimento do autor.
Ora, como se viu, o direito à eliminação dos defeitos é uma das possíveis consequências legais sancionatórias do cumprimento inexato da prestação do empreiteiro, traduzindo-se num direito do dono da obra, ora autor, à reparação do dano, inerente ao cumprimento defeituoso.
Em face disso, o aqui autor não estava efetivamente obrigado a proceder ao pagamento do montante de 2.247,70 €, referente à reparação da caixa de velocidades, tanto mais que o empreiteiro não pode, sem autorização do dono da obra, fazer alterações ao plano convencionado (artigo 1214.º, n.º 1 do CC), sendo que no caso resultou provado que, nunca foi o autor informado da necessidade de proceder à substituição da caixa de velocidades e que seria responsável por essa reparação, bem como que o único serviço solicitado à ré foi pago, como se percebe pela Fatura-Recibo n.º ...42, emitida no dia 07-09-22 e que o único que o autor solicitou à ré foi a reparação da embraiagem e a eliminação dos defeitos que resultaram dessa reparação.
Por todo o exposto, em face dos factos definitivamente assentes nos autos, não existia qualquer incumprimento imputável ao dono da obra, pelo que não estão reunidos os pressupostos para a apelante exercer o direito de retenção sobre o veículo dos autores, tal como entendeu a sentença recorrida, o que importa a confirmação da sentença recorrida na parte em que julgou improcedente o pedido reconvencional formulado pela ré e procedentes os pedidos constantes das alíneas b) e c) da petição inicial.
Improcede, assim, a apelação, nesta parte.
Restam os pedidos indemnizatórios formulados.
Os autores peticionaram o pagamento da quantia de 1.000,00 € a título de ressarcimento por todos os incómodos, aborrecimentos e desgaste por não poderem usar o seu veículo e desconhecerem o estado em que se encontra.
A decisão recorrida apreciou este pedido de indemnização, tendo considerado que perante a factualidade vertida nos autos a situação do autor merecia a tutela do direito, julgando preenchidos os pressupostos da obrigação da ré indemnizar o autor por danos não patrimoniais, que quantificou em 500,00 €, aduzindo, entre outros os seguintes fundamentos:
«(…)
No que respeita a estes danos, provou-se que, como os dias se iam passando e a carrinha continuava sem ser entregue, o Autor voltou a contactar a Ré solicitando a entrega da mesma imediatamente, mas sempre sem sucesso; no dia 29 de Agosto de 2022, e já claramente desagradado, impaciente com a presente situação, deslocou-se com a sua filha para levantar a viatura na oficina da Ré e levá-la, definitivamente, para a ..., no entanto, a Ré recusou-se a entregar a viatura; a Ré não autorizou a filha do Autor a levar a viatura sem que fosse efectuado o pagamento de mais de dois mil euros; o Autor necessita do referido veículo para os seus afazeres diários; o Autor viu-se obrigado a viver de favores de outras pessoas, o que lhe causou transtornos e incómodos e sentiu-se revoltado.
Provou-se, ainda, que o Autor tem-se sentido impotente perante toda a situação descrita, passando por verdadeiros momentos de humilhação, aborrecimento e desgaste. E, uma vez que necessitava de uma viatura para os seus afazeres diários, adquiriu uma nova carrinha.
Ora, estes sentimentos, transtornos, revolta e estado anímico do autor, como já vimos, resultam de uma actuação da ré, existindo assim um nexo de causalidade entre a actuação ilícita da ré e os danos sofridos pelo autor.
Já relativamente à autora, nada se provou a este respeito.
Assim, e atendendo aos critérios plasmados no art. 494º do CC (ex vi art. 496º, nº 3 do CC), entendemos que a factualidade acima vertida, em relação ao autor, merece a tutela do direito.
Termos em que, fixamos em € 500,00 (quinhentos euros) a compensação devida pela ré ao autor, a título de danos não patrimoniais, absolvendo a ré da demais quantia peticionada, por falta de prova dos factos alegados relativamente à pessoa da autora.
(…)».
A recorrente pugna pela revogação da sentença recorrida quanto a este segmento, sustentando não se mostrarem reunidos os pressupostos de que a lei faz depender a responsabilidade civil pelo pagamento de qualquer indemnização ao autor.
Cumpre apreciar.
Cumulável com o direito de exigir do empreiteiro a eliminação dos defeitos, pode existir o direito do dono da obra a ser indemnizado pelos prejuízos não acautelados pelos remédios específicos conferidos ao dono da obra pelo cumprimento defeituoso da prestação (artigo 1223.º do CC): «na medida em que proliferem outros danos na esfera jurídica do dono da obra, a indemnização deve ser cumulada com os outros remédios. A indemnização assumirá, neste caso, uma dimensão complementar»[18].
No âmbito da responsabilidade por factos ilícitos, o artigo 496.º, n.º 1 do CC prevê que na fixação da indemnização se atenda aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Trata-se de indemnização que visa compensar o lesado pela dor ou sofrimento, de ordem física ou psicológica, ou outras consequências de natureza não patrimonial, através do recebimento de uma quantia pecuniária que possa mitigar os efeitos do ato lesivo. Deste modo, «ante a imaterialidade dos interesses em jogo, a indemnização dos danos não patrimoniais não pode ter por escopo a sua reparação económica. Visa sim, por um lado, compensar o lesado pelo dano sofrido, em termos de lhes proporcionar uma quantia pecuniária que permita satisfazer interesses que apaguem ou atenuem o sofrimento causado pela lesão; e, por outro lado, servir para sancionar a conduta do agente»[19].
Tal como referem Pires de Lima e Antunes Varela[20], «o Código Civil aceitou, em termos gerais, a tese da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais, embora limitando-a àqueles que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
A gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos», cabendo assim ao tribunal, em cada caso, dizer se o dano é ou não merecedor da tutela jurídica.
A este propósito os Autores antes citados enunciam ainda algumas situações possivelmente relevantes, como a dor física, a dor psíquica resultante de deformações sofridas, a ofensa à honra ou reputação do indivíduo ou à sua liberdade pessoal, o desgosto pelo atraso na conclusão dum curso ou duma carreira, sublinhando ainda a propósito, que os simples incómodos ou contrariedades não justificam a indemnização por danos não patrimoniais, citando para o efeito vários acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça.
Neste enquadramento, «a gravidade do dano afere-se, no entendimento da jurisprudência e da doutrina, segundo critérios objetivos - de acordo com um padrão de valorações ético-culturais aceite numa determinada comunidade, num certo momento histórico, e tendo em conta o circunstancialismo do caso - e não de harmonia com perceções subjetivas ou de uma particular sensibilidade do lesado (…). O recurso a um critério objetivo na apreciação da gravidade do dano justifica-se para negar as pretensões ressarcitórias por meros incómodos, contrariedades ou prejuízos insignificantes, que cabe a cada um suportar na vida em sociedade, evitando-se, deste modo, uma extensão ilimitada da responsabilidade. (…) Apelando aos critérios supra referidos, a jurisprudência tem considerado que os meros incómodos ou as simples contrariedades não são indemnizáveis (…)»[21].
Densificando os critérios legais aplicáveis, em termos que entendemos de sufragar, refere-se no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10-01-2022[22]: «um dano considerável é aquele que, no mínimo, espelha a intensidade de uma dor, angústia, desgosto, um sofrimento moral que, segundo as regras da experiência e do bom senso, se tornam inexigíveis em termos de resignação».
Por outro lado, atualmente a doutrina e jurisprudência dominantes acolhem um princípio favorável à compensação do dano não patrimonial na responsabilidade contratual, a aplicar com certa prudência e segundo uma específica valoração do dano contratual: deve ser balizado por critérios de adequação e previsibilidade do dano para o devedor[23].
Para tanto impõe-se que, para além da verificação dos demais requisitos da obrigação de indemnizar, se demonstre que os danos são objetivamente graves[24].
Revertendo ao caso dos autos, julgamos que os factos dados como provados, em especial nos respetivos pontos 31., a 50., não são suficientes para permitir reconhecer a existência de danos diretos, de cariz não patrimonial, com gravidade suficiente para merecerem a tutela do direito.
Assim, entendemos que dos factos dados como provados não resultam evidenciadas consequências que a conduta da ré tenha produzido sobre a integridade física e/ou psicológica do autor e que sejam suscetíveis de ressarcimento autónomo, sendo evidente que o quadro factual antes enunciado apenas permite consubstanciar a produção de incómodos, aborrecimentos, inquietações ou contrariedades cuja gravidade e consequências restaram indemonstradas.
Termos em que a pretensão indemnizatória formulada pelos autores a título de indemnização por danos não patrimoniais terá que improceder, com a consequente revogação da sentença recorrida nesta parte.
Resta apreciar se estão verificados os pressupostos do arbitramento aos autores da reclamada indemnização pela privação do uso do veículo, no montante de 3.345,00 €.
Neste domínio, verifica-se que o Tribunal de 1.ª Instância entendeu adequado fixar em 10 €/dia o montante da compensação devida ao autor pela perda de utilidades concretas derivadas da privação do uso do veículo, desde a data de ../../2022 até à efetiva entrega do mesmo.
Todavia, uma vez que o montante global ultrapassava o montante peticionado pelos autores a título de dano de privação do uso, e o tribunal não pode condenar além do pedido, o Tribunal recorrido condenou a ré no pagamento aos autores da quantia de 3.345,00 €, acrescida de juros de mora contados desde a data da interpelação (06-09-2022) até efetivo e integral pagamento.
Já a ré/recorrente entende que tal indemnização deveria ter sido fixada num valor inferior, sustentando que o Tribunal recorrido não obedeceu às regras de equidade e proporcionalidade ao determinar uma compensação pela privação de uso de um veículo por 83 dias no valor de 3.345,00 € quando o autor adquiriu, em sua substituição, um veículo pelo montante de 3.000,00 €.
Neste domínio, cumpre assinalar que a questão de saber se a indemnização pela privação do uso de determinado bem depende da prova da existência de um dano específico ou de prejuízos concretos[25] ou se a simples privação do uso constitui, só por si, um dano indemnizável[26] mostra-se controvertida na jurisprudência.
Porém, se é certo que na generalidade dos casos a privação do uso impede o proprietário de dispor da coisa e de a usar como entender, situações poderão ocorrer em que o proprietário não tenha interesse em usá-la, não pretendendo dela retirar qualquer utilidade, caso em que não poderá considerar-se verificada qualquer alteração da respetiva situação decorrente da privação do uso, assim não existindo dano.
Neste contexto, encontramos ainda uma corrente intermédia, que se afigura como maioritária na jurisprudência, que vem entendendo que a privação do uso de um veículo constitui um dano autónomo indemnizável na medida em que o seu dono fica impedido do exercício dos direitos de usar, fruir e dispor inerentes à propriedade, que o artigo 1305.º do CC lhe confere de modo pleno e exclusivo, tornando-se porém necessário que o lesado alegue e demonstre, para além da impossibilidade de utilização do bem, que esta privação gerou perda de utilidades que o mesmo lhe proporcionava, frustrando um propósito real - concreto e efetivo - de proceder à sua utilização[27].
No caso presente, verifica-se que o autor colocou a sua viatura na oficina da ré para que a mesma fosse reparada, no início de agosto de 2022, sendo que o referido veículo se mantém na posse da ré, encontrando-se o autor impedido de usufruir do mesmo desde o dia ../../2022. Mais se provou que o autor necessita do referido veículo para os seus afazeres diários, sendo que a utilização do seu automóvel lhe facilitava o acesso a sua atividade profissional e, naturalmente, contribuiria para a fruição de momentos livres. Com a privação dele, o acesso ao trabalho tornou-se mais penoso e cessou a utilização e fruição que da viatura poderiam fazer em tempo de lazer, do que decorre a perda da concreta utilidade da utilização daquele veículo na esfera do autor, o que, associado ao preenchimento dos demais pressupostos da responsabilidade civil, basta para conferir ao autor a respetiva indemnização.
Como tal, mostra-se demonstrada a existência de prejuízos diretamente decorrentes da não utilização do bem, tal como concluiu a decisão recorrida.
Este dano é indemnizável, devendo o cálculo da correspondente indemnização ser efetuado com base na equidade, considerando que não pode ser averiguado o valor exato dos danos, tal como dispõe o artigo 566.º, n.º 3, do CC, implicando que o Tribunal deva decidir dentro dos limites que tiver por provados[28].
Por conseguinte, impõe-se encontrar a solução mais equilibrada, tendo em conta o que decorre da factualidade provada e atendendo aos padrões seguidos em decisões jurisprudenciais recentes, uma vez que a quantificação do montante indemnizatório em causa é efetuada com recurso à equidade, nos termos que decorrem do disposto no artigo 8.º, n.º 3, do CC, ao prever que, nas decisões a proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito.
Ora, recorrendo ao método comparativo ao nível dos critérios utilizados na determinação da indemnização pela privação do uso de veículo, verificamos que o valor diário de 10,00 € constitui o padrão indemnizatório predominantemente adotado, nos casos em que não é possível quantificar o dano decorrente de o lesado ter que recorrer a outras alternativas para se fazer transportar a si e à sua família, desde que essa privação não seja (totalmente) suprível pelos meios próprios já disponíveis[29].
Considerando, então, o período em que o autor não dispôs do veículo para as suas deslocações, vendo-se impedido de o utilizar, cujo início não foi posto em causa pela recorrente (desde o dia ../../2022), porém, temporalmente limitado pela data em que o autor passou a dispor de uma nova carrinha, a qual adquiriu em 09 de novembro de 2022, uma vez que necessitava de uma viatura para os seus afazeres diários (pontos 51 ., a 53., dos factos provados), factos estes que não podem deixar de relevar na quantificação do dano em análise, mostra-se conforme à equidade o valor diário de 10 € para compensar o dano decorrente da privação do uso do veículo ainda que limitado ao período de 83 dias durante o qual a utilização que era dada ao veículo não foi suprida por outro meio.
Assim, a indemnização global a este título importa no montante de 830,00 € (83 x 10 €) a qual se mostra adequada e equitativa para compensar o autor pela privação do uso do veículo que sofreu.
Procedem, assim, nesta parte, as conclusões da apelação.
Tal como resulta da regra enunciada no artigo 527.º, n.º 1 do CPC, a responsabilidade por custas assenta num critério de causalidade, segundo o qual, as custas devem ser suportadas, em regra, pela parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento, pela parte que tirou proveito do processo. Neste domínio, esclarece o n.º 2 do citado preceito, entende-se que dá causa às custas a parte vencida, na proporção em que o for.
No caso em apreciação, como a apelação foi julgada parcialmente procedente, ambas as partes ficaram parcialmente vencidas no recurso, pelo que devem as mesmas ser responsabilizadas pelo pagamento das custas do recurso (bem como da ação).

IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a presente apelação e, revogando na mesma medida a sentença recorrida, decidem:

A) revogar a sentença recorrida na parte em que condenou a ré no pagamento de uma indemnização ao autor de uma indemnização no montante de 500,00 € a título de danos não patrimoniais e respetivos juros, absolvendo a ré de tal segmento do pedido;
B) Alterar a al. b) do dispositivo da sentença recorrida, o qual se substitui por outra decisão a condenar a ré no pagamento de uma indemnização aos autores, a titulo de privação do uso do veículo, no montante de 830,00 € (oitocentos e trinta euros), acrescido de juros de mora, contados desde a data da interpelação (06-09-2022) até efetivo e integral pagamento;
C) Confirmar a sentença recorrida no restante.
Custas na proporção do decaimento/vencimento.
Guimarães, 07 de novembro 2024
(Acórdão assinado digitalmente)

Paulo Reis (Juiz Desembargador - relator)
Maria dos Anjos Melo Nogueira (Juíza Desembargadora - 1.º adjunto)
Joaquim Boavida (Juiz Desembargador - 2.º adjunto)



[1] Enunciando os ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, dispõe o artigo 640.º do CPC, o seguinte:
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
(…)».
[2] Tendente a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado aos meios de prova gravados relevantes para a apreciação da impugnação deduzida - neste sentido, cf., por todos, o Ac. do STJ de 21-03-2019 (relatora: Rosa Tching), p. 3683/16.6T8CBR.C1. S2, disponível em www.dgsi.pt.
[3] Neste sentido cf., por todos, Pires de Lima/Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. II, 3.ª edição, p. 788; na jurisprudência, os Acs. TRL de 14-03-2023 (relator: José Capacete), p. 731/18.9T8AMD.L1-7; TRP de 19-11-2020 (relator: Aristides Rodrigues de Almeida), p. 24904/18.5T8PRT.P1; TRG de 24-11-2016 (relatora: Maria dos Anjos Melo Nogueira), p. 134724/15.7YIPRT.G1; disponíveis em www.dgsi.pt.
[4] Cf. João Cura Mariano, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, 7.ª edição, Coimbra, 2020 - p. 54.
[5] Cf. Pedro Romano Martinez, Direito das Obrigações, Lições Coordenadas pelo Prof. Doutor António Menezes Cordeiro, III volume, 2.ª edição, revista e ampliada, AAFDL, 1991, pg. 528.
[6] Cf. Pedro Romano Martinez - obra citada -, p. 527.
[7] Cf. Pedro Romano Martinez, Cumprimento Defeituoso - Em Especial na Compra e Venda e na Empreitada, Coimbra, 1994, Almedina, p. 187.
[8] Neste sentido, cf. entre outros, acórdãos TRL de 23-11-2023 (relatora: Vera Antunes), p. 87/22.5T8RGR.L1-6; TRG de 27-04-2017 (Relator: Espinheira Baltar), p. 309.11.8TBVPA. G1; TRC de 13-09-2016 (Relator: Moreira do Carmo), p. 59/15.6T8OLR.C1; acessíveis em www.dgsi.pt.
[9] Cf. o acórdão do STJ de 9-04-2019 (Relator: José Rainho), revista n.º 2673/12.2T2AVR.P1. S1 - 6.ª Secção, acessível em www.dgsi.pt.
[10] Cf. João Cura Mariano - obra citada -, p. 71.
[11] Cf. Código Civil Anotado, Vol. I, Ana Prata (Coord.); Almedina, 2017, p. 1513.
[12] Cf. o acórdão do STJ de 08-09-2015 (Relator: Hélder Roque), p. 477/07.3TCGMR.G1. S1; disponível em www.dgsi.pt.
[13] Cf. o acórdão TRC de 17-12-2014 (relatora: Anabela Luna de Carvalho), p. 157/12.8TBALD.C1, disponível em www.dgsi.pt.
[14] Neste sentido, cf., o citado acórdão do STJ de 08-09-2015; o acórdão do TRG de 4-04-2024 (relatora: Conceição Sampaio), p. 6321/17.6T8BRG.G1; disponíveis em www.dgsi.pt.
[15] Obra citada, p. 1517.
[16] Cf. obra citada, pgs. 113-114;
[17] Cf., o acórdão do TRP de 08-05-2008 (relator: Madeira Pinto), p. 0830526; disponível em www.dgsi.pt.
[18] Cf. João Serras de Sousa - obra citada - p. 1520.
[19] Cf. o Ac. do STJ de 13-07-2017 (relator: Manuel Tomé Soares Gomes), p. n.º 3214/11.4TBVIS.C1. S1 - 2.ª Secção, disponível em www.dgsi.pt.
[20] Cf. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4.ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, 1987, pg. 499.
[21] Cf. Gabriela Páris Fernandes, Comentário ao Código Civil, Direito das Obrigações - Das Obrigações em Geral - Coord. José Brandão Proença, Lisboa, Universidade Católica Editora, 2021 - p. 359.
[22] Relator Miguel Baldaia de Morais, p. 8064/18.4T8SNT.P2, disponível em www.dgsi.pt.
[23] Cf. Gabriela Páris Fernandes - Obra citada -, p. 357.
[24] Cf., por todos, o acórdão TRE de 04-11-2004 (relator: Bernardo Domingos), p. 1873/04-22, disponível em www.dgsi.pt.
[25] Neste sentido, cf. entre outros, os Acs. do STJ de 12-01-2012 (relator: Fernando Bento), p. 1875/06.5TBVNO.C1. S1; de 28-10-2010 (relator: Lopes do Rego) - p. 272/06.7TBMTR.P1. S1 - 7.ª Secção; de 30-10-2008 (relator: Salvador da Costa), p. 07B2131; todos acessíveis em www.dgsi.pt.
[26] Neste sentido, cf. entre outros, os Acs. do STJ de 12-01-2010 (relator: Paulo Sá), p. 314/06.6TBCSC.S1 - 1.ª Secção; de 08-10-2009 (relator: Oliveira Rocha), p. n.º 1362/06.1TBVCD.S1 - 2.ª Secção; ambos acessíveis em www.dgsi.pt.
[27] Neste sentido, cf. entre outros, os Acs. do STJ de 14-12-2016 (relatora: Fernanda Isabel Pereira), p. 2604/13.2TBBCL.G1. S1; de 10-01-2012 (relator: Nuno Cameira) p. 189/04.0TBMAI.P1. S1 - 6.ª Secção; ambos acessíveis em www.dgsi.pt.
[28] Cf. por todos, o acórdão do STJ de 05-08-2013 (relatora: Maria dos Prazeres Pizarro Beleza) Proferido na Revista n.º 3036/04.9TBVLG.P1.S1disponível em www.dgsi.pt.
[29] Cf., o acórdão do TRG de 24-03-2022 (relator: Joaquim Boavida), p. 2093/20.5T8VNF.G1 e a jurisprudência nele citada; disponível em www.dgsi.pt.