I - A integração de lacunas no processo penal pelas normas do processo civil tem limites, nomeadamente resultantes da compatibilização da norma do processo civil que se pretenda aplicar com os valores e a ideologia próprios do sistema processual penal vigente.
II - Para exercer os direitos que lhe assistem o arguido tem de ser capaz de entender e compreender as acusações que lhe são dirigidas e interagir em conformidade, pois a defesa assenta na sua própria vontade.
III - A representação do arguido nos termos previstos no C.P.C. é totalmente incompatível com os seus direitos de defesa, porque enquanto no processo civil a incapacidade de estar em juízo pode ser suprida, o arguido em processo penal é titular de um conjunto de direitos cujo intendido exercício pessoal, ou possibilidade disso, não é conciliável com a sua representação.
IV - A pessoalidade do direito de defesa do arguido afasta de todo a hipótese de ser exercido por outrem, porque estando em causa a averiguação factos cuja autoria é imputada ao arguido só ele pode decidir se os esclarece e só ele pode dar a sua versão dos mesmos.
V - A circunstância de o arguido estar obrigatoriamente representado no processo crime por advogado não altera aquela conclusão, porque esta é uma defesa de cariz técnico, que não se substitui à defesa pessoal, apenas pelo próprio exercitável.
VI - O recurso indevido ao C.P.C. para integração de lacunas provoca a irregularidade do acto, nos termos dos artigos 118.º, n.º 2, e 123.º do C.P.P.
VII - O suprimento da incapacidade do arguido através da nomeação de curador provisório integra uma irregularidade que influi na decisão da causa e que é, por isso, de conhecimento oficioso.
VIII - A incapacidade para prestar declarações e para compreender posterior à prática dos factos coloca uma questão eminentemente procedimental, que nada tem que ver com a substantiva (in)imputabilidade.
IX - A inimputabilidade é a falta de capacidade para «avaliar a ilicitude do facto e de se determinar por essa avaliação», e refere-se ao momento da prática do facto, e a incapacidade processual respeita ao momento da intervenção processual.
X - A nossa legislação penal e processual penal é totalmente omissa quanto à solução processual a tomar em caso de incapacidade processual do arguido ocorrida posteriormente à prática dos factos.
XI - As garantias de defesa do arguido, condensadas no artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, englobam todos os instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação, de modo a atenuar a desigualdade de armas face ao poder institucional do Estado, podendo e devendo esta norma ser fonte autónoma de garantias de defesa.
XII - Ao estabelecer que o arguido tem direito a escolher um defensor, e não apenas que tem direito a assistência de defensor, o artigo 32.º, n.º 3, da Lei Fundamental erige o arguido em verdadeiro sujeito do processo, com direito a organizar a sua própria defesa, e se o arguido não exercer o seu direito de escolher defensor a tutela processual objectiva dos seus direitos será garantida no plano técnico, e só nesse, através da nomeação de defensor oficioso.
XIII - Decorre da Constituição da República Portuguesa e dos instrumentos internacionais a que Portugal aderiu a imposição de considerar processualmente incapaz o arguido portador de anomalia psíquica que não possa, por essa razão, exercer a sua autodefesa.
XIV - No estrito cumprimento das exigências inerentes ao processo equitativo, o C.P.P. estabelece como regra a obrigatoriedade de o arguido estar presente na audiência de julgamento, dependendo da sua vontade expressa a realização da audiência na sua ausência, decisão pessoal do arguido assumida em consciência e ponderado o prejuízo que possa advir para a sua defesa, implicando isto, obviamente, que este se encontra no pleno exercício da sua capacidade processual penal.
XV - Desta obrigatoriedade da presença, que se estende a toda a audiência de julgamento e que impede o arguido de se afastar e permite ao tribunal tomar as medidas necessárias a evitar esse afastamento, decorre a importância que o legislador atribui à assistência do arguido a toda a produção de prova, incluindo instruir o seu defensor relativamente à sua posição quanto ao desenrolar das provas.
XVI - Em caso de ausência auto provocada, querida ou consentida, a lei permite a continuação do julgamento mas com limites, porque pressupõe que tenha sido dada oportunidade ao arguido de falar e exige, cumulativamente, que o juiz presidente entenda não ser indispensável a sua presença.
XVII - Não constando do relatório pericial se a incapacidade do arguido de prestar declarações em tribunal e de compreender e apreender é transitória ou definitiva/irreversível, tal terá que ser apurado em nova ou complementar perícia médico-psiquiátrica a realizar, devendo o procedimento ser suspenso entretanto.
XVIII - Apesar de não constar dos artigos 118.º e 127.º do Código Penal, a extinção/arquivamento do procedimento criminal em caso de comprovada incapacidade total, processual, definitiva e irreversível do arguido é a solução mais conforme aos princípios do processo equitativo, do direito pessoal de defesa e da dignidade humana.
…
Por requerimento com refª. 3488226, veio o arguido requerer a sustação do processo ou a exclusão do arguido do sistema criminal, por não se encontrar capaz de assegurar a sua defesa.
O Ministério Público promoveu o indeferimento do requerido, por falta de fundamento legal (refª. 36812376) e a demandante não se pronunciou.
Cumpre apreciar e decidir.
Acrescenta o referido relatório pericial que, desde a data da prática dos factos, a sua condição clínica se agravou, carecendo de apoio institucional, e mostrando-se incapaz de prestar declarações em tribunal e de compreender e apreender com as penas que eventualmente lhe venham a ser aplicadas.
Nos termos do art. 15.º do Código de Processo Civil ex vi art. 4.º do Código de Processo Penal, “[a] capacidade judiciária consiste na suscetibilidade de estar, por si, em juízo”, tendo “por base e por medida a capacidade para o exercício de direitos”.
No caso em apreço, afigura-se que o arguido não se encontra em condições de exercer, por si só, os seus direitos e de conduzir a sua defesa de forma inteligente e inteligível, o que não contende propriamente com a culpa, mas antes com a questão processual da sua capacidade para o processo.
Portanto, essa incapacidade deverá ser suprida, nos termos do art. 17.º do Código de Processo Civil ex vi art. 4.º do Código de Processo Penal, através da nomeação de curador provisório ao arguido (neste sentido, vide, conjugadamente, os acórdãos do Tribunal da Relação de Évora, de 28.11.2006, proc. n.º 1256/06-1, e de 13.07.2022, pro.c n.º 7/10.0IDFAR.E2, consultáveis em www.dgsi.pt).
O curador provisório poderá ratificar os atos anteriormente praticados, devendo o processo seguir como se o vício não existisse ou, pelo contrário, não os ratificar, ficando sem efeito todo o processado posterior ao momento em que a falta se deu ou a irregularidade foi cometida, correndo novamente prazos para a prática dos atos não ratificados (art. 27.º, n.º 2 do Código de Processo Civil ex vi art. 4.º do Código de Processo Penal).
Conforme resulta do relatório social com refª. 3540362, o arguido é apoiado pelos seus filhos, aos mais diversos níveis.
Desta forma, afigura-se que será adequada a nomeação do seu filho … como curador provisório, para assegurar os interesses do seu pai, arguido nestes autos.
Em face do exposto, o Tribunal nomeia … como curador provisório do arguido e, em consequência, determina a citação deste para, no prazo de 10 dias, ratificar ou não o processado anterior, nos termos dos arts. 15.º, 17.º, 27.º, n.º 2 e 28.º, n.º 2 do Código de Processo Civil ex vi art. 4.º do Código de Processo Penal, ficando a instância suspensa durante o referido prazo (art. 28.º, n.º 2 do Código de Processo Civil ex vi art. 4.º do Código de Processo Penal).
Notifique.
I.O que cumpre apurar é se efetivamente a incapacidade judiciária reconhecida ao arguido, nos termos e com a abrangência que foi, pode – ou não – ser suprida através da nomeação de curador provisório ou representante geral por aplicação subsidiária das normas do processo civil.
II.Trata-se de saber se os seus direitos de defesa, na parte que respeita à sua autodefesa, se podem considerar como devidamente assegurados por um curador.
III.Ora contrariamente ao decidido no despacho recorrido, entende o arguido que, no caso concreto, face à impossibilidade de o mesmo exercer a sua auto defesa, ao Tribunal estava vedado a nomeação de qualquer curador, como estava vedado julgar sanável a incapacidade e, consequentemente, estava ainda vedado socorrer-se da aplicação subsidiária do art.º 17 do Cód de Processo Civil, que in casu não tem aplicação.
IV.Entende pois o Recorrente que, no caso concreto a nomeação de um curador não tem a virtualidade de suprir o direito de autodefesa que pressupõe não só a capacidade de compreender a natureza e objeto do processo e as possíveis consequências do mesmo, mas também a capacidade de, deforma racional e efetiva comunicar e conferenciar com o seu defensor, avaliar os cursos possíveis da ação de acordo com os seus interesses e possibilidade.
V.Conforme se transcreveu supra, resulta à saciedade do relatório da perícia médico legal que o arguido tem oitenta anos e sofre de uma síndrome demencial, …
VIO que significa que chamado o arguido a tribunal, o mesmo não pode, por facto que lhe não é imputável, exercer o seu direito de defesa.
VII. E se o não pode exercer, representando este direito um direito central dos arguidos (vid art. 20 e 30 da CRP) também não pode ser sujeito a julgamento
VIII. Tem sido entendimento unanime da Jurisprudência do referido Tribunal que a “participação efetiva” no processo, por parte do arguido exige, cumulativamente que se verifiquem as seguintes condições:
1) estar presente;
2) ouvir e acompanhar o processo – o que exige “que o arguido tenha uma compreensão ampla da natureza do processo e do que está em jogo para a sua pessoa, incluindo o significado de qualquer pena que lhe possa ser imposta”;
3) a ser assistido, se necessário, por intérprete, advogado, assistente social ou amigo”,
4) “a acompanhar o que é dito pelas testemunhas de acusação”
5) A apontar ao advogado as declarações de que discorda, explicar-lhe a sua versão dos factos e dar-lhe conhecimento dos que devam ser apresentados em sua defesa”.
IX.Ora, como resulta dos relatórios pericial e social, no caso concreto, o arguido não reúne, nenhuma das condições enunciadas e consequentemente, não pode ser submetido a julgamento, sob pena de nulidade, a qual é insanável.
X.E nesta medida e tal como tem defendido a Jurisprudência do TEDH, “a garantia de um processo justo, tal como consagrado no art.º 6 da CEDH só pode realizar-se com o sustar do processo ou com a exclusão do suspeito do sistema criminal.”
…
…
…
II. Objeto e conhecimento do recurso.
… ([1]).
O objeto do presente recurso, tendo em conta as conclusões formuladas, resume-se a apurar:
- Se, perante a incapacidade do arguido, há lugar à nomeação de curador; e
- Quais as consequências para o processo da incapacidade de que atualmente é portador.
«…, advogada de …, arguido nos autos à margem referenciados e aí já melhor identificado, devidamente notificada da designação da data para audiência de julgamento vem, mui respeitosamente, expor e requerer a V. Exª se digne suspender os presentes autos, o que faz, nos termos dos n.º 1 , 3, 5 in fine e n.º 6 do art.º 32 da CRP, art.º 6 da CEDH e com os seguintes fundamentos:
Resulta à saciedade do relatório da perícia médico legal que o arguido tem oitenta anos e sofre de uma síndrome demencial, processo que se iniciou em 2011 após ter sofrido o primeiro acidente vascular cerebral e que se tem vindo a agravar ao longo do tempo.
Resulta ainda do dito relatório que o arguido:
…
Dito de outra forma, entenderam os senhores peritos e expressamente o afirmaram no relatório, que o arguido e não obstante ser imputável, ainda que de modo diminuto, não apresenta capacidade para estar em juízo, não tem capacidade judiciária. (veja-se ponto 7 das conclusões do relatório, pag. 6)
Ora, é entendimento unanime da jurisprudência, doutrina que a possibilidade de a um indivíduo ser aplicada uma pena ou uma medida de segurança criminal pressupõe que, ao mesmo, lhe seja conferido, no processo em causa, umo estatuto de arguido.
O estatuto enunciado pressupõe que o individuo seja maior de 16 anos (no caso português) e que as suas caraterísticas pessoais o não impeçam de exercer a sua posição de sujeito no processo.
Ou seja, pressupõe, que o arguido tem condições de sanidade mental, físicas, ou de outra natureza, que o não impeçam de participar com plena autonomia e esclarecimento nos atos do processo, e aí usar os direitos de defesa e de contradição que lhe são conferidos por lei.
…
Na verdade, contrariamente ao juízo de imputabilidade cuja aferição remonta ao momento da prática do facto e que se prende com a faculdade do arguido de avaliar a ilicitude do ato por si perpetrado e de se determinar de acordo com essa avaliação (art. 20.º, n.º 1 do CP);
A incapacidade judiciária reportar-se ao momento em que o arguido em que é chamado a intervir no processo e que por razões, no caso de doença demencial, não tem condições para “providenciar por uma defesa inteligente e inteligível.
Dito de outra forma a incapacidade judiciária traduz-se na falta de condições do arguido providenciar à sua defesa em toda a extensão do direito que lhe é conferido pelo art.º 20 da CRP.
No caso que ora nos ocupa e tal como resulta do relatório pericial junto aos autos, a doença de que o arguido padece anula as suas capacidades cognitivas e restringe o seu raciocínio ao ponto de este se mostrar “incapaz de prestar declarações em tribunal e de compreender e apreender com as penas que eventualmente lhe venham a ser aplicadas”.
Mais, não apresenta um discurso coerente o que, impossibilita o exercício da autodefesa.
O que significa que chamado o arguido a tribunal, o mesmo não pode e por facto que lhe não é imputável exercer o seu direito de defesa.
Neste sentido se tem pronunciado a Jurisprudência do TEDH que, chamada a determinar o sentido e abrangência do estatuído no art.º 6 do CEDH, se tem pronunciado:
“que consagra o direito a um fair trial, do qual se retira a necessidade de ao arguido ser garantida uma efetiva participação processual. Em geral, isso inclui, não apenas o direito a estar presente, como também “a verificação (...) de capacidade para compreender a natureza do processo e o que neste se joga relativamente à sua pessoa (...), para acompanhar a produção de prova e (ainda) para trocar impressões com o seu defensor”
Jurisprudência disponível em: “https://hudoc.echr.coe.int/”.
Mais, tem sido entendimento unanime da Jurisprudência do referido Tribunal que a “participação efetiva” no processo, por parte do arguido exige, cumulativamente que se verifiquem as seguintes condições:
1) estar presente;
2) ouvir e acompanhar o processo – o que exige “que o arguido tenha uma compreensão ampla da natureza do processo e do que está em jogo para a sua pessoa, incluindo o significado de qualquer pena que lhe possa ser imposta”;
3) a ser assistido, se necessário, por intérprete, advogado, assistente social ou amigo”,
4) “a acompanhar o que é dito pelas testemunhas de acusação”
5) A apontar ao advogado as declarações de que discorda, explicar-lhe a sua versão dos factos e dar-lhe conhecimento dos que devam ser apresentados em sua defesa”.
Ora, como resulta do relatório pericial, no caso concreto, o arguido não reúne, nenhuma das condições enunciadas e consequentemente, não pode ser submetido a julgamento, sob pena de nulidade.
Vejamos:
O arguido não logra ter um discurso coerente, não consegue auxiliar na sua defesa, não consegue fornecer os elementos necessários à sua mandatária para que a mesma o possa aconselhar, sequer expressar a sua versão do sucedido. Como não compreende o que lhe está a ser imputado e não logra contraditar aquilo que venha contra si a ser referido em sede de audiência.
Mais o arguido não logra responder com um mínimo de racionalidade e/ou lógica a questões que lhe venham a ser efetuadas quanto à factualidade enunciada e ao crime que lhe está a ser imputado.
E nesta medida e tal como tem defendido a Jurisprudência do TEDH, “a garantia de um processo justo, tal como consagrado no art.º 6 da CEDH só pode realizar-se com o sustar do processo ou com a exclusão do suspeito do sistema criminal, o que se requer.»
Não está em causa a situação de incapacidade do arguido, que o tribunal a quo expressamente aceitou.
Na verdade, o arguido foi submetido a perícia médico-legal de psiquiatria forense ainda em sede de inquérito, constando as seguintes conclusões do relatório elaborado por instituto oficial:
«1-O examinado é portador de uma síndroma demencial
…
4-Medico-legalmente, nada obsta a que seja declarado como possuindo uma imputabilidade diminuída para os factos que lhe são imputados.
…
7-Revela-se igualmente incapaz de prestar declarações em tribunal e de compreender e apreender com as penas que eventualmente lhe forem aplicadas.»
Perante esta situação do arguido, decidiu o tribunal a quo que a incapacidade do arguido era suprível, aplicando subsidiariamente o Código de Processo Civil e nomeando-lhe um curador provisório, no caso um seu filho.
Ora, nos termos do art. 15º, n.º 1, do Código de Processo Civil a capacidade judiciária “consiste na suscetibilidade de estar, por si, em juízo”, correspondendo à capacidade de exercício de direitos no âmbito do direito civil, conforme dispõe o n.º 2. Sucede que a capacidade de exercício respeita à possibilidade de as pessoas serem sujeitos de relações jurídicas (art. 67º do Código Civil), podendo assim a incapacidade ser suprida por terceira pessoa – tudo à semelhança do previsto no Código Civil e ainda no Regime do Maior Acompanhado.
Por essa razão, impõe o art. 16º, n.º 1, do Código de Processo Civil que “Os menores e os maiores acompanhados sujeitos a representação só podem estar em juízo por intermédio dos seus representantes, exceto quanto aos atos que possam exercer pessoal e livremente”. Na sequência desta previsão, o art. 17º prevê a representação do incapaz por curador especial ou provisório: “Se o incapaz não tiver representante geral deve requerer-se a nomeação dele ao tribunal competente, sem prejuízo da imediata designação de um curador provisório pelo juiz da causa, em caso de urgência”.
Foi ao abrigo desta norma que o tribunal a quo nomeou um curador provisório ao arguido. Sem qualquer fundamento ([2]).
O art. 4º do Código de Processo Penal (diploma a que se referem as restantes normas mencionadas sem menção de origem) refere-se à integração de lacunas no processo penal do modo seguinte: “Nos casos omissos, quando as disposições deste Código não puderem aplicar-se por analogia, observam-se as normas do processo civil que se harmonizem com o processo penal e, na falta delas, aplicam-se os princípios gerais do processo penal.” (sublinhado nosso). A integração de lacunas tem, assim, limites, nomeadamente a compatibilização de determinada norma do processo civil que se pretenda aplicar com os valores e a ideologia próprios do sistema processual penal vigente.
Desde logo, a representação do arguido nos termos previstos no Código de Processo Civil (que só ocorre em casos urgentes, como se prevê expressamente no art. 17º, e enquanto não for nomeado representante pelo modo normal – v.g., o processo de maior acompanhado) é, em nossa opinião, totalmente incompatível com os direitos de defesa do arguido.
Vejamos:
Enquanto no processo civil a incapacidade de estar em juízo pode ser suprida, o arguido em processo penal é titular de um conjunto de direitos cujo intendido exercício pessoal (ou possibilidade disso) não é conciliável com a sua representação: os direitos a estar presente nos atos processuais que lhe respeitem, a ser ouvido pelo tribunal sempre que estejam em causa decisões que o afetem, a ser informado dos factos imputados antes de prestar declarações, a ser assistido por defensor, incluindo o de comunicar com ele em privado – art. 61º, n.º 1.
Por outro lado, o arguido tem o direito de prestar declarações no julgamento, e em qualquer momento do mesmo, caso o pretenda – constituindo este momento o auge do seu direito de defesa.
Estes direitos podem ser exercidos por um representante legal?
Obviamente que não.
A pessoalidade do direito de defesa do arguido, e a correspondente refração no efetivo respeito pela correspondente dignidade, afasta de todo a hipótese de ser exercido por outrem, não sendo equiparável ao exercício de direitos civis: aqui está em causa a possibilidade de condenação em pena de natureza criminal, incluindo a sua liberdade física. Acresce que no processo crime encontram-se em averiguação factos cuja autoria é imputada ao arguido, pelo que além de decidir se os esclarece, só o próprio pode nessa hipótese elucidar qual a sua versão dos factos em que terá, alegadamente, participado. Nunca o poderá fazer um seu representante – o que conduziria ao absurdo de poder o representante confessar a prática dos factos no lugar do arguido.
À conclusão, nada altera a circunstância de o arguido já se encontrar no processo crime obrigatoriamente representado, através da constituição ou nomeação de advogado que o defenda, uma vez que se trata com isso de uma defesa de cariz técnico, que se não substitui à defesa pessoal, apenas pelo próprio exercitável.
É por este conjunto de razões que não podia ter sido nomeado ao arguido um curador provisório, por as normas correspondentes do Código de Processo Civil aplicadas serem incompatíveis com o processo penal – art. 4º do Código de Processo Penal.
Estabelece o art. 118º:
“1- A violação ou inobservância das disposições da lei do processual penal só determina a nulidade do ato quando esta for expressamente cominada na lei.
2- Nos casos em que a lei não cominar a nulidade, o ato ilegal é irregular”.
A lei processual penal é omissa quanto ao recurso indevido ao Código de Processo Civil para integração de lacunas, não integrando o despacho recorrido qualquer das nulidades expressamente previstas nos arts. 119º (nulidades insanáveis) ou 120º, n.º 2 (nulidades dependentes de arguição).
Assim, o ato encontra-se ferido de irregularidade, nos termos dos arts. 118º, n.º 2, e 123º.
Estabelece esta última norma:
“1- Qualquer irregularidade do processo só determina a invalidade do ato a que se refere e dos termos subsequentes que possa afetar quando tiver sido arguido pelos interessados no próprio ato ou, se a este não tiverem assistido, nos três dias a contar daquele em que tiverem sido notificados para qualquer para qualquer termo do processo ou intervindo em algum ato nele praticado.
2- Pode ordenar-se oficiosamente a reparação de qualquer irregularidade, no momento em que da mesma se possa tomar conhecimento, quando ela puder afetar o valor do ato praticado.”
A irregularidade cometida influi, necessariamente, na decisão da causa, face à impossibilidade de suprir a incapacidade do arguido no processo penal através da nomeação de curador provisório – donde decorre ser inclusive de conhecimento oficioso, nos termos do n.º 2 do preceito transcrito ([3]).
Termos em que será declarada a irregularidade do despacho proferido, com a sua consequente revogação.
No requerimento junto pela Exma. Defensora do arguido que originou o despacho recorrido foi requerida a suspensão do processo ou a exclusão do arguido do sistema criminal.
Entendeu o tribunal a quo que a nomeação de um curador provisório ao arguido era suficiente, tendo sido determinada a citação deste “para, no prazo de 10 dias, ratificar ou não o processado anterior, nos termos dos arts. 15º, 17º, 27º, n.º 2, e 28º, n.º 2, do Código de Processo Civil, ex vi art. 4º do Código de Processo Penal, ficando a instância suspensa durante o referido prazo (art. 28º, n.º 2, do Código de Processo Civil, ex vi art. 4º do Código de Processo Penal).
Indevidamente, como se viu, e nem tem razão de ser a suspensão da instância crime com aquele fundamento: ratificação de quais atos? E se o curador não declarar ratificar os atos no prazo concedido? Os “atos” do arguido e do defensor ficam sem efeito?
Não tem cabimento, com todo o respeito.
Enfim, a questão que resta conhecer prende-se com a suspensão do processo devido à (reconhecida) incapacidade do arguido, conforme requerido pela sua Exma. Defensora – o que veio a ser indeferido, mesmo que de forma tácita, pelo tribunal a quo, através da posição adotada no despacho sob recurso.
O tratamento deste tema rareia na doutrina e na jurisprudência, o que impõe uma pronúncia mais cuidada.
Na verdade, o arguido foi acusado da prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152º, n.º 1, al. b), do Código Penal. Consta da acusação que “o arguido é portador de síndroma demencial; tal perturbação, presente à data da prática dos factos, condiciona de forma ligeira a autodeterminação do arguido, na medida em que AA é capaz de distinguir o certo do errado e apresenta capacidade, ainda que limitada, no seu autocontrolo e capacidade de se autodeterminar”. Ou seja, à data da prática dos factos o arguido seria penalmente imputável – embora de forma diminuída.
Sucede que o seu quadro clínico se agravou após a prática dos factos e, à data da realização do exame pericial da especialidade de psiquiatria, revelava incapacidade de prestar declarações em tribunal, de compreender e apreender com as penas que lhe forem aplicadas. Este exame não foi objeto de contestação por qualquer dos sujeitos processuais, não foi objeto de pedido de esclarecimentos e foi suficiente para que o tribunal a quo concluísse encontrar-se o arguido incapaz de estar, por si, em audiência de julgamento.
Esta incapacidade para prestar declarações e para compreender, sendo posterior à prática dos factos, nada tem que ver com a substantiva (in)imputabilidade. O arguido encontra-se, hoje, incapaz de estar em juízo, o que coloca uma questão eminentemente procedimental.
Como de forma clara refere Pedro Soares de Albergaria ([4]), “a capacidade processual, não concetualizada na nossa lei, nada tem que ver imediatamente com o facto criminoso, o qual só lhe importa em termos mediatos: enquanto razão de ser de instauração de processo-crime. Quer dizer, a capacidade processual é a aptidão do arguido para exercer pessoalmente a sua defesa independentemente da questão de se saber se no momento da prática do facto era ou não suscetível de um juízo de culpa. Em termos tais que a pessoa será processualmente incapaz quando, em razão de anomalia, não tenha condições para, no momento em que tenha de intervir no processo e ao longo dele, providenciar por uma defesa inteligente e inteligível”.
Assim, se a inimputabilidade se refere ao momento da prática do facto, nos termos do art. 20º, n.º 1, do Código Penal, a incapacidade processual respeita ao momento da intervenção processual.
Dito de outra forma: a inimputabilidade é a falta de capacidade para «avaliar a ilicitude do facto e de se determinar por essa avaliação», sendo necessariamente referida ao passado (momento da prática do facto), enquanto a incapacidade judiciária “toma como referência já não o facto descrito como crime, mas os termos do processo em que se discute a responsabilidade pelo seu cometimento, devendo ser aferida a cada momento (ou, pelo menos, ao momento decisivo) em que, no processo, a defesa se exerce” ([5]).
Historicamente ([6]), o Código Penal de 1852 consagrava no § único do art. 93º: “nos que eloucerem depois de commettido o crime, se sobre-estará, ou no processo de acusação, ou na execução da pena, até que eles recuperem as suas faculdades intellectuaes”, tendo a mesma redação o art. 114º do Código Penal de 1886. Neste, dispunha o art. 26º que “Somente podem ser criminosos os indivíduos que teem a necessária inteligência e liberdade”, considerados elementos da voluntariedade ([7]).
Posteriormente, o art. 13º, § único, do Código de Processo Penal de 1929 dispôs, sobre o incidente de alienação mental, que na eventualidade de se concluir por uma situação de anomalia psíquica sobrevinda à infração de que resultasse a irresponsabilidade ou dúvida sobre a responsabilidade do réu, era possível suspender o processo a partir do despacho de pronúncia, incluindo a execução da pena e o cumprimento da pena, até que o réu recuperasse o pleno uso das suas capacidades mentais.
Estranhamente, esta possibilidade de suspensão do processo em virtude de anomalia psíquica incapacitante superveniente aos factos deixou de se encontrar prevista no Código Penal de 1982, “passando a ser apenas expressamente admitidas, nos arts. 105º e 106º, a substituição da pena de prisão pela medida de internamento ou a suspensão da execução da pena de prisão, pressupondo ambas as medidas, naturalmente, o trânsito em julgado da sentença que conheça do mérito da causa” ([8]).
Em suma, a nossa legislação penal e processual penal é totalmente omissa quanto à solução processual que caberá tomar em caso de incapacidade processual do arguido ocorrida posteriormente à prática dos factos.
O art. 61º, n.º 1, estabelece os seguintes direitos do arguido, enquanto sujeito processual:
1 - O arguido goza, em especial, em qualquer fase do processo e salvas as exceções da lei, dos direitos de:
a) Estar presente aos atos processuais que diretamente lhe disserem respeito;
b) Ser ouvido pelo tribunal ou pelo juiz de instrução sempre que eles devam tomar qualquer decisão que pessoalmente o afete;
c) Ser informado dos factos que lhe são imputados antes de prestar declarações perante qualquer entidade;
d) Não responder a perguntas feitas, por qualquer entidade, sobre os factos que lhe forem imputados e sobre o conteúdo das declarações que acerca deles prestar;
e) Constituir advogado ou solicitar a nomeação de um defensor;
f) Ser assistido por defensor em todos os atos processuais em que participar e, quando detido, comunicar, mesmo em privado, com ele;
g) Intervir no inquérito e na instrução, oferecendo provas e requerendo as diligências que se lhe afigurarem necessárias;
h) Ser informado, pela autoridade judiciária ou pelo órgão de polícia criminal perante os quais seja obrigado a comparecer, dos direitos que lhe assistem;
i) Ser acompanhado, caso seja menor, durante as diligências processuais a que compareça, pelos titulares das responsabilidades parentais, pelo representante legal ou por pessoa que tiver a sua guarda de facto ou, na impossibilidade de contactar estas pessoas, ou quando circunstâncias especiais fundadas no seu interesse ou as necessidades do processo o imponham, e apenas enquanto essas circunstâncias persistirem, por outra pessoa idónea por si indicada e aceite pela autoridade judiciária competente;
j) Tradução e interpretação, nos termos dos artigos 92.º e 93.º;
k) Recorrer, nos termos da lei, das decisões que lhe forem desfavoráveis.
Por sua vez, no tocante às garantias de defesa do arguido dispõe o art. 32º da Constituição da República Portuguesa:
“1. O processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso.
2. Todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa.
3. O arguido tem direito a escolher defensor e a ser por ele assistido em todos os atos do processo, especificando a lei os casos e as fases em que a assistência por advogado é obrigatória.
(…) 5. O processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os atos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório. (…)”
Tal norma condensa os princípios mais importantes do processo penal, resumidos no seu n.º 1: todas as garantias de defesa. Estas englobam todos os instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação, de modo a atenuar a desigualdade material de armas face ao poder institucional do Estado. Assim, esta norma constitucional pode, e deve, ser fonte autónoma de garantias de defesa: “a «orientação para a defesa» do processo penal revela que ele não pode ser neutro em relação aos limites fundamentais (um processo em si, alheio aos direitos do arguido), antes tem neles um limite infrangível” ([9]).
Assim, quando o n.º 3 prevê o direito do arguido a escolher um defensor, e não apenas um direito a assistência de defensor, a Lei Fundamental erige o arguido em verdadeiro sujeito do processo, com direito a organizar a sua própria defesa – sendo certo que se o arguido não exercer o seu direito de escolha do defensor, a tutela processual objetiva dos seus direitos será no plano técnico, e só nesse, garantida através da nomeação de defensor oficioso (art. 64º do Código de Processo Penal).
O que não dispensa a intervenção pessoal do arguido: é o arguido o titular do direito de defesa, não o defensor; é ao arguido, não ao defensor, “que cabe dirigir a sua defesa, em termos tais que se defesa técnica e defesa pessoal são entre si complementares, a primeira está ao serviço, é instrumental, ancilar, relativamente à segunda e, por decorrência, aquela não pode exaurir ou consumir esta”. Assim, “a lei prevê como suscetíveis de preencherem o núcleo da defesa pessoal do arguido um compacto conjunto de direitos a exercer pessoalmente por ele, ainda que coadjuvado ou aconselhado pelo defensor… que visa garantir, em conformidade com a feição acusatória do processo, uma efetiva intervenção, e intervenção conformadora, do arguido no que tange ao desfecho do processo e, assim, ao seu destino” ([10]).
Sucede que para exercer os direitos que lhe assiste, o arguido tem de ser capaz de entender e compreender as acusações que lhe são dirigidas, e interagir em conformidade, oque tudo é condição de satisfação da exigência de que a defesa assente na sua própria vontade.
Ainda como afirma Pedro Soares de Albergaria ([11]), “o critério para aferir da capacidade do arguido para estar em juízo só pode ser um: o de estarem ou não reunidas as condições de o arguido exercer pessoalmente a sua defesa. Da mesma forma que, como refração do direito constitucional à autodefesa, a quem é arguido é reconhecida, como princípio, a capacidade de praticar todos os atos processuais próprios dessa condição, sem que quem quer que seja o represente em coisa tão decisiva para o seu destino, também onde lhe faltem condições de saúde mental cuja verificação é pressuposto necessário da organização da própria defesa, nos termos sobreditos, terá de concluir-se que ele não pode ser submetido a julgamento.” (destacado e sublinhado nossos). E conclui da seguinte forma: “ter ou não capacidade para estar em juízo é ter ou não condições para se autodefender” ([12]).
Posição com a qual concordamos na íntegra.
Naturalmente que não basta que o arguido seja portador de uma qualquer anomalia psíquica, impondo-se concluir, em concreto, que tal anomalia, pela sua gravidade, afeta de forma sensível as capacidades intelectuais e de raciocínio do arguido, a ponto de lhe impossibilitar o exercício da autodefesa ([13]).
1 - Qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei, o qual decidirá, quer sobre a determinação dos seus direitos e obrigações de carácter civil, quer sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela. O julgamento deve ser público, mas o acesso à sala de audiências pode ser proibido à imprensa ou ao público durante a totalidade ou parte do processo, quando a bem da moralidade, da ordem pública ou da segurança nacional numa sociedade democrática, quando os interesses de menores ou a proteção da vida privada das partes no processo o exigirem, ou, na medida julgada estritamente necessária pelo tribunal, quando, em circunstâncias especiais, a publicidade pudesse ser prejudicial para os interesses da justiça.
2 - Qualquer pessoa acusada de uma infração presume-se inocente enquanto a sua culpabilidade não tiver sido legalmente provada.
3 - O acusado tem, como mínimo, os seguintes direitos:
a) Ser informado no mais curto prazo, em língua que entenda e de forma minuciosa, da natureza e da causa da acusação contra ele formulada;
b) Dispor do tempo e dos meios necessários para a preparação da sua defesa;
c) Defender-se a si próprio ou ter a assistência de um defensor da sua escolha e, se não tiver meios para remunerar um defensor, poder ser assistido gratuitamente por um defensor oficioso, quando os interesses da justiça o exigirem;
d) Interrogar ou fazer interrogar as testemunhas de acusação e obter a convocação e o interrogatório das testemunhas de defesa nas mesmas condições que as testemunhas de acusação;
e) Fazer-se assistir gratuitamente por intérprete, se não compreender ou não falar a língua usada no processo. ([16])
Desde logo, consagra a Convenção, na 1ª parte do n.º 1 transcrito, o princípio do processo equitativo, que “exige, como elemento conatural, que cada uma das partes tenha possibilidades razoáveis de defender os seus interesses numa posição não inferior à da parte contrária” ([17]). Este encontra-se expressamente consagrado, igualmente, na nossa Lei Fundamental, no n.º 4 do art. 20º: «Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objeto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo».
Consabidamente, o referido princípio manifesta-se, desde logo, através dos princípios do contraditório, da igualdade de armas, do respeito pela dignidade humana e da igualdade – não se tratando de uma igualdade “perante a lei”, mas “através da lei”, constituindo a lei um instrumento “ao serviço de intenção normativa que a ultrapassa” ([18]).
O n.º 3 do art. 6º da CEDH, referente de forma expressa ao processo de natureza criminal, confere ao acusado, nomeadamente, o direito a defender-se a si próprio ou ter a assistência de um defensor da sua escolha, o que constitui manifestação do processo equitativo: o acusado tem o direito de se defender de modo adequado e de forma concreta e efetiva.
Se o acusado se encontra incapaz (em sentido processual, como se viu) de exercer o direito à autodefesa, de natureza eminentemente e essencialmente pessoal, não pode dar a sua versão ao tribunal (encontrando-se impedido, por razão alheia à sua vontade, de prestar declarações), de preparar a sua defesa com o seu defensor, discernindo as possibilidades que se lhe deparam e optando conscientemente por uma, de confessar, de perceber os riscos do processo crime e da condenação… Enfim, de proporcionar ao seu defensor a possibilidade de defender efetivamente, do ponto de vista técnico, o arguido que representa e enquanto verdadeiro sujeito – que sem essa intervenção pessoal não deixaria de ser tratado como mero objeto do processo pelo facto de lhe ser nomeado um “curador”...
Uma posição distinta da que aqui defendemos – ou seja, que o arguido se encontra suficientemente defendido com a nomeação do defensor ([19]) – conduziria a situações extremas que chocam a consciência jurídica de qualquer cidadão médio, mesmo leigo em matéria de leis, v.g. procedendo-se a julgamento de arguido que se encontrasse à data da audiência num estado de coma irreversível. Sem que um hipotético curador ou, em todo o caso, o defensor pudessem tomar conhecimento da sua posição relativa aos factos de que se encontraria acusado, da sua versão ou até da posição a assumir, ferir-se-ia de morte uma defesa consciente que pretendessem exercer, mesmo o segundo e no mero plano técnico.
Na senda do que vimos defendendo se pronunciou já o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, nos casos T. e V. vrs. Reino Unido (1999), S. e C. vrs. Reino Unido (20049, que afirmaram que a representação por defensor de arguido sem capacidade processual pode não ser suficiente para assegurar um “fair trial” à luz da CEDH, concluindo que um arguido, em razão da sua menoridade e também do seu estado mental não tem condições para “participar efetivamente” no processo, “em especial não tinham condições para cooperar em termos suficientes com os seus defensores, providenciando-lhes informação preordenada à sua defesa” ([20]).
Na última decisão referida (S.C. vrs. Reino Unido), para além de pressupor os direitos do arguido a estar presente e a ouvir e acompanhar o processo – o que exige “que o arguido tenha uma compreensão ampla da natureza do processo e do que está em jogo para a sua pessoa, incluindo o significado de qualquer pena que lhe possa ser imposta” -, o TEDH enunciou outros direitos do arguido, nomeadamente “a acompanhar o que é dito pelas testemunhas de acusação” e ainda a, “se representado, apontar ao advogado as declarações de que discorda, explicar-lhe a sua versão dos factos e dar-lhe conhecimento dos que devam ser apresentados em sua defesa”.
Em ambos os casos, o TEDH entendeu existir uma violação do art. 6.º da CEDH.
Paulo Pinto de Albuquerque ([21]) convoca ainda uma outra decisão do TEDH: “Especiais cautelas justificam-se no julgamento de pessoas com anomalia psíquica (acórdão Vaudelle v. França, de 30.1.2001)…, de modo a garantir uma efetiva participação destas no julgamento. Participação efetiva para este efeito significa que o arguido tem uma compreensão do que se está a passar na audiência e das consequências do que nela é dito e pode interferir, fazendo valer a sua versão dos factos, se necessário com a assistência de um familiar, amigo, psicólogo ou técnico social”.
Mas a necessidade de resolução deste problema não constitui preocupação exclusiva do TEDH:
A Resolução da Assembleia da República n.º 56/2009 adotou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência das Nações Unidas de 2007 (CDPD), que impõe aos Estados a obrigação de efetuarem as “modificaç[ões] e ajustes necessários e apropriados (…) para garantir que as pessoas com incapacidades gozem ou exerçam, em condições de igualdade com as demais, de todos os direitos (…) e liberdades fundamentais” (artigo 2.º). Nomeadamente, no art. 13º, prevê que o acesso à justiça de pessoas com deficiência, para ser efetivo, far-se-á através de “adaptações processuais (…) de modo a facilitar o seu papel efetivo enquanto participantes diretos ou indiretos (…), em todos os processos judiciais, incluindo as fases de investigação e outras fases preliminares”.
O Conselho da União Europeia, por seu turno, aprovou uma Resolução, a 30.11.2009, em que estabeleceu um “Roteiro para reforço dos direitos fundamentais dos suspeitos ou acusados em processos penais”, constando da Medida E que “[p]ara garantir a equidade do processo, é importante que se dê especial atenção aos suspeitos ou acusados incapazes de compreender ou de acompanhar o conteúdo ou o significado do processo devido, por exemplo, à sua idade ou ao seu estado mental ou físico”. «Este “Roteiro” foi depois incorporado no Programa de Estocolmo (2009), do Conselho Europeu (cf. ponto 2.4, relativo aos “direitos do indivíduo no processo penal”), tendo sido emitida uma Recomendação pela Comissão a 27 de Novembro de 2013, recomendando aos Estados Membros que tomem medidas para suprir a dita incapacidade. «No entanto, no artigo 39.º/1/b do Regulamento (UE) 2017/1939, do Conselho, de 12 de Outubro de 2017, que dá execução a uma cooperação reforçada para a instituição da Procuradoria Europeia, dispõe-se, como hipótese fundamento do arquivamento do processo, a “demência do suspeito ou do arguido”» ([22]).
Entendemos, assim, decorrer da nossa Lei Fundamental e dos instrumentos internacionais referidos a imposição de considerar processualmente incapaz o arguido portador de anomalia psíquica que não possa, por essa razão, exercer a sua autodefesa – única forma de cumprir os princípios da autodefesa, da dignidade do arguido e da integridade ou dignidade do próprio processo ([23]).
Aqui chegados, que consequência devemos extrair dessa incapacidade processual do arguido?
Vejamos quais as soluções preconizadas nos escritos disponíveis ([24]):
· O Acórdão da Relação de Évora de 13.7.2022 ([25]), discorre o seguinte:
“perante uma incapacidade de facto, grave, total e permanente – posterior à prática dos factos, mas sem se enquadrar na previsão do art. 105º do C. Penal -, que afetava a recorrente, os autos não deviam ter prosseguido para julgamento, na parte que a ela respeita, devendo ter ficado suspensos pelo menos a partir da data em que, com a junção do relatório pericial, se adquiriu nos autos o conhecimento de tal incapacidade.
Faltando esse pressuposto processual, que a representação por advogado constituído ou defensor oficioso não colmata na medida em que o tipo de representação que oferece não pode suprir a capacidade judiciária, enquanto suscetibilidade de um arguido estar por si, em juízo, tudo se passa como se a recorrente “não estivesse em juízo” quando foi submetida a julgamento. (…) foi praticada a nulidade insanável prevista na al. c) do art. 119º do C.P.P. (sublinhado nosso).
· Sandra Oliveira e Silva ([26]) defende que sendo a anomalia psíquica posterior à prática dos factos e, por isso, insuscetível de determinar a inimputabilidade do agente, a incapacidade judiciária dará lugar à suspensão da tramitação do processo até melhoria da situação clínica do arguido, que poderá, nesse período intermediário, ser submetido às medidas administrativas consagradas na Lei da Saúde Mental. Na fase da audiência de julgamento – “onde, por excelência o arguido exerce a sua defesa e expõe os seus argumentos aos perigos e virtudes do contraditório” –, a suspensão será, de certo modo, “absoluta”.
· Pedro Soares de Albergaria defende a suspensão pura e simples do processo ([27]), com base (que reconhece ser dúbia) no art. 336º, n.º 6, do Código de Processo Penal, única norma deste código que se refere à “incapacidade” do arguido em ato processual: «uma correta leitura dela deve levar à conclusão de que se o arguido ficar, no decurso da audiência, incapaz de nela participar por razões que lhe não são imputáveis, a título de dolo ou negligência, a audiência não pode prosseguir. O que vale para o decurso da audiência tem de valer, por força, para o momento antes dela começar. Por isso, se o juiz receber acusação para efeitos de designar dia para a audiência já havendo notícia no processo de que o arguido se acha incapaz de se defender — ou se o juiz tiver razões para suspeitar dessa incapacidade e a confirmar16 — não deve designar essa data e deve suster os termos do processo. Nesta fase, da audiência de julgamento — onde, por excelência, o arguido exerce a sua defesa e expõe os seus argumentos aos perigos e virtudes do contraditório — a suspensão é, por assim dizer, “absoluta”» ([28]).
· Pedro do Carmo conclui da seguinte forma: “no caso do arguido que padeça de anomalia psíquica irreversível que o tenha tornado incompetente para ser julgado, na medida em que não é expectável que, no futuro, tais circunstâncias se venham a alterar, a suspensão do processo não passará de um ato inútil, de um mero exercício de ficção, próprio de um justiça que privilegia a forma sobre a substância – e, se assim é, como nos parece ser, então, tomando de empréstimo a elucidativa síntese conclusiva o arquivamento do processo nos parece ser a solução «mais justa e adequada», porventura a única que respeita a dignidade do arguido e a dignidade do processo” ([29]).
Que dizer?
Recorrendo ao art. 4º do Código de Processo Penal (porque de incapacidade processual se trata), normal legal com que iniciámos o presente aresto, recordemos o que nos diz sobre a integração de lacunas:
“Nos casos omissos, quando as disposições deste Código não puderem aplicar-se por analogia, observam-se as normas do processo civil que se harmonizem com o processo penal e, na falta delas, aplicam-se os princípios gerais do processo penal.”
Já concluímos não serem compatíveis com o processo penal as normas do Código de Processo Civil que versam sobre o suprimento da incapacidade (civil). Impõe-se, deste modo, recorrer ou a normas do próprio Código de Processo Civil que se possam aplicar por analogia, ou aos princípios gerais do processo penal.
Ora, em estrito cumprimento das exigências inerentes ao processo equitativo, o nosso Código de Processo Penal estabelece como regra a obrigatoriedade de o arguido estar presente na audiência de julgamento (art. 332º, n.º 1), dependendo de sua vontade expressa a realização da audiência na sua ausência (art. 334.º, n.º 2: “Sempre que o arguido estiver praticamente impossibilitado de comparecer à audiência, nomeadamente por idade, doença grave ou residência no estrangeiro, pode requerer ou consentir que a audiência tenha lugar na sua ausência”). É uma decisão pessoal do arguido, assumida em consciência e ponderado o prejuízo que possa advir para a sua defesa, implicando, obviamente, que este se encontre no pleno exercício da sua capacidade processual penal.
Mais: o arguido tem de estar presente em toda a audiência de julgamento, não podendo da mesma afastar-se e devendo o julgador tomar todas as medidas necessárias e adequadas a evitar esse afastamento, incluindo a detenção do arguido – decorrendo o n.º 4 daquele art. 332º a importância que o legislador atribui à assistência do arguido a toda a produção de prova, possibilitando-lhe a oportunidade de defesa, incluindo instruir o seu defensor relativamente à sua posição quanto ao desenrolar das provas.
No entanto, o n.º 6 daquele preceito permite a continuação da audiência de julgamento do “arguido que, por dolo ou negligência, se tiver colocado numa situação de incapacidade para continuar a participar na audiência” – significando que aquela ausência foi auto provocada, querida ou consentida pelo próprio, o que justifica a continuação da audiência, mantendo o arguido o direito de se apresentar a qualquer momento, sendo-lhe dado conhecimento do que se passou na sua ausência, sob pena de nulidade (n.º 7).
É aqui que tem razão de ser a possibilidade (posição) aventada por Pedro Soares de Albergaria, a saber, a aplicação analógica (que é anterior às restantes possibilidades previstas no art. 4º) e a contrario daquele art. 332º, n.º 6, por se tratar da única referência na lei processual penal a uma situação de incapacidade do arguido em comparecer no julgamento: é que prevendo a lei que o julgamento prossiga no caso em que o arguido provoca a sua incapacidade, terá de se extrair que na hipótese em que a incapacidade do arguido ocorra de forma involuntária a audiência de julgamento não pode prosseguir – única conclusão compatível com o espírito da lei, ponderada no seu conjunto.
Na realidade, aquele afastamento do arguido permite a continuação da audiência de julgamento na sua ausência com limites, uma vez que pressupõe que já lhe tenha sido dada oportunidade de falar, exigindo-se cumulativamente que o juiz presidente entenda não ser indispensável a sua presença – tudo em cumprimento do n.º 1 do art. 32º da Constituição da República Portuguesa. Sucede que, no caso de incapacidade processual, nos termos referidos, o arguido não tem sequer capacidade para, no exercício de um direito que lhe é pessoalmente reservado, declarar ao tribunal se pretende prestar declarações, de as prestar, de preparar a sua defesa…
Por estas razões, concordamos com a necessária suspensão da audiência de julgamento nos casos em análise, sob pena de se violarem princípios básicos da nossa Lei Fundamental e normas essenciais do direito internacional aplicável em Portugal com força constitucional, como se viu.
Poder-se-ia ponderar, no caso de incapacidade total definitiva e irreversível, a extinção do procedimento criminal, conforme defende Pedro do Carmo ([30]), mas esbarramos na taxatividade das causas de extinção previstas nos arts. 118º e 127º do Código Penal.
É certo que a suspensão do procedimento não deve ser por período indefinido, nomeadamente nos casos em que se não encontra comprovada a definitividade da incapacidade do arguido. No extremo, o prazo de suspensão tem como limite legal o prazo da prescrição do procedimento pelo crime em causa, nos termos do art. 118º do Código Penal ([31]).
No entanto, admitimos como boa e mais conforme aos princípios do processo equitativo, do direito pessoal de defesa e da dignidade humana uma extinção/arquivamento do procedimento criminal em caso de comprovada incapacidade total processual definitiva e irreversível.
No caso, resulta da perícia médica realizada ao arguido em momento prévio ao terminus da fase de inquérito (e portanto já nos autos quando foi designada a audiência de julgamento) que o mesmo não se encontra capaz de se defender – uma vez que se encontra igualmente incapaz de prestar declarações em tribunal e de compreender e apreender com as penas que eventualmente lhe forem aplicadas.
Não consta do relatório pericial se esse estado de incapacidade do arguido é transitório ou definitivo/irreversível – o que carece de ser apurado em nova ou complementar perícia médico-psiquiátrica a realizar.
Em conclusão, na procedência do recurso, deverá o procedimento dos autos ser suspenso, sem prejuízo da sujeição do arguido a novo exame médico-legal a fim de aferir da definitividade e irreversibilidade ou não da sua incapacidade, reconhecida no relatório pericial já constante dos autos.
Procede, nesta medida, o recurso interposto.
III. Decisão
Pelas razões expostas, concede-se provimento ao recurso e, em consequência:
a) Revoga-se a decisão recorrida;
b) Determina-se a suspensão do processo, devendo todavia o arguido ser submetido a nova perícia psiquiátrica a fim de verificar se a sua incapacidade é transitória ou definitiva e irreversível, decidindo-se ulterior e oportunamente em conformidade.
Sem tributação.
Ana Carolina Cardoso (relatora – processei e revi)
Cristina Pêgo Branco (1ª adjunta)
Maria Alexandra Guiné (2ª adjunta)
[1] v. Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português, vol. 3, 2015, págs. 335-336
[2] - Sendo certo que o aresto referido na decisão recorrida – Ac. da Rel. de Évora de 28.11.2006, rel. Orlando Afonso, em www.dgsi.pt – incide sobre a incapacidade da ofendida, e não do arguido, o que é totalmente distinto, por não ser comparável às exigências de defesa do arguido. Já o outro aresto – Ac. da mesma Relação de 13.7.2022, rel. Maria Leonor Esteves, na mesma base de dados – não defende esta solução, como adiante se verá, o que naquele recurso é defendido pela recorrente.
[3] No mesmo sentido, Paulo Pinto de Albuquerque, “Comentário do Código de Processo Penal”, 4ª ed., pág. 805 (em anotação ao art. 309º).
[4] “Incapacidade do arguido para, em razão de anomalia psíquica, providenciar pela sua defesa”, em “Anomalia Psíquica e Direito – Colóquio Comemorativo dos 20 Anos da Entrada em Vigor da Lei de Saúde Mental”, coordenação de Maria João Antunes, edição do Instituto Jurídico da FDUC, 2020.
[5] Cf. Sandra Oliveira e Silva, “Saúde Mental e Processo Penal: a Tutela do Arguido Portador de Anomalia Psíquica”, in “Livro em Memória do Professor Doutor João Curado das Neves”, AAFDL, 2020, p. 485 a 510, ainda referido em Pedro do Carmo, artigo mencionado na nota seguinte.
[6] Seguindo aqui Pedro do Carmo, “Anomalia Psíquica e Processo Penal: Breve Retrato de uma Encruzilhada”, Revista Julgar, n.º 50 – 2023, e Luís Osório, na obra cit. na nota seguinte.
[7] Luís Osório, “Notas ao Código Penal Português”, I vol. Pág. 68.
[8] A. e loc. cit. n nota anterior, destacado e sublinhado nossos.
[9] Cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, “Constituição da República Portuguesa Anotada”, 1º vol., 2ª ed., págs. 214-215..
[10] Pedro Soares de Albergaria, ob. cit.
[11] Em “Anomalia Psíquica e Capacidade para Estar em Juízo”, Revista Julgar, n.º 1, 2007, e também no site www.julgar.pt .
[12] Sendo a conclusão coincidente com a dos restantes autores que sobre a matéria expressamente se pronunciaram, a saber, Sandra Oliveira e Silva e Pedro do Carmo. Remete-se ainda para a legislação comparada, nos EUA, Reino Unido, Países Baixos, Itália, Suíça e Brasil, referidos nos artigos já citados, que prevêem na generalidade a suspensão ou extinção do processo em caso de incapacidade do arguido.
[13] Pedro Soares de Albergaria, ob. cit., 2020.
[14] Que vigoram diretamente em Portugal, nos termos previstos no art. 8º da Constituição da República Portuguesa.
[15] Aprovada pela Assembleia da República para ratificação pela Lei n.º 65/78, de 13 de outubro.
[16] No mesmo sentido dispõe o art. 14º do Pacto Internacional Sobre os Direitos Civis e Políticos aprovado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 16.12.1966, de que Portugal faz parte.
[17] Irineu Cabral Barreto, “A Convenção Europeia dos Direitos do Homem”, 5ª ed., págs. 169-170.
[18] A. e ob.cit. na nota anterior, referindo Castanheira Neves, pág. 173.
[19] Não se conhece qualquer outra decisão ou doutrina que defenda posição contrária, podendo apenas excetuar-se, com a limitação decorrente da dúvida concreta sobre a total incapacidade processual do arguido, o Ac. da Relação de Lisboa proferido a 24.5.2023, no proc. 9153/21.3T8LSB.L1 (não encontrámos publicação), que defendeu que “as consequências decorrentes da doença de Alzheimer de que padece o arguido, nomeadamente a diminuição das suas capacidades cognitivas, designadamente de memória, também não são fundamento de suspensão dos presentes autos ou de arquivamento por extinção do procedimento criminal por inutilidade superveniente da lide”; por não se encontrar expressa no Código Penal tal causa de suspensão ou extinção. No entanto, como observa o Ac. do S.T.J que sobre o mesmo incidiu, proferido a 29.2.2024 e publicado em www.juris-stj.pt, a prova da incapacidade não pode ter lugar em recurso, obviamente.
[20] Referido por Pedro Soares de Albergaria, ob. e loc. cit, 2020, bem como outras decisões do mesmo Tribunal Europeu.
[21] Comentário do Código de Processo Penal”, 4ª ed., pág. 193.
[22] Resenha extraída do estudo de Pedro Soares de Albergaria de 2020. Muito interessante se mostra igualmente o “Relatório de Estágio no Juízo Central Criminal de Évora – O arguido portador de anomalia psíquica e a sua tutela em processo penal”, de Mariana Lino Ferraz Van Ossenbruggen, Março de 2023, Nova School of Law, disponível na internet.
[23] Pedro do Carmo, artigo cit.
[24] Reportando-nos em exclusivo à fase de julgamento.
[25] Rel. Maria Leonor Esteves, proc. 7/10.0IDFAR.E2, em www.dgsi.pt, único sobre a matéria que encontrámos publicado.
[26] Ob. Cit.
[27] Convocando ainda, no mesmo sentido, pese embora não especifique o regime de tal paralisação processual, Germano Marques da Silva, “Curso de Processo Penal”, I, 1994, pág. 262.
[28] Obs. Citadas.
[29] Ob. cit.
[30] Que refere um aresto desta Relação de 27.1.2021, rel. Frederico Cebola, que perante a situação de anomalia psíquica superveniente irreversível do arguido decidiu declarar extinta a pena aplicada, por considerar a solução “mais justa e adequada”.
[31] No mesmo sentido, a nota 27 do artigo de Pedro do Carmo.