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COMISSÃO DE SERVIÇO
FALTA DE FORMA
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
PRESSUPOSTOS DE APLICAÇÃO DE CONVENÇÃO COLECTIVA
Sumário
I - «Não se considera em regime de comissão de serviço o contrato que não tenha a forma escrita (…)» - artigo 162º, nº3 do Código do Trabalho. II - A exigência do documento escrito explica-se pela necessidade de consciencializar as partes, sobretudo o trabalhador, da precariedade do cargo - “a forma escrita tem em vista possibilitar uma maior reflexão das partes, uma formulação mais precisa e completa das declarações negociais e um maior elevado grau de certeza sobre os termos contratuais”. III - Nada ficando previsto no contrato de comissão de serviço para o período seguinte ao da sua cessação, em termos de local de trabalho, importa considerar o que no contrato inicial ficou previsto. IV - O princípio da igualdade no trabalho, faz apelo a uma igualdade material (deve tratar-se de igual modo o que é essencialmente igual e de forma desigual o que é desigual). V - Para que se possa aferir que uma relação laboral é regulada por uma determinada CCT, torna-se necessário que as partes se encontrem inscritas nas associações representativas que a outorgaram, a não ser que exista Regulamento de Extensão que nos termos permitidos pelo artigo 514º do Código de Trabalho, estenda a sua aplicabilidade aos empregadores do mesmo sector de atividade e a trabalhadores da mesma profissão ou profissão análoga. VI - Tendo ficado apenas provado que o Réu celebrou um contrato de trabalho com um outro trabalhador, onde foi estabelecido um horário de trabalho de 35 horas, não se mostra possível de tal facto aferir que o Réu assumiu, uma prática discriminatória, sem critério diferenciador objetivo e atendível, no que concerne aos tempos de trabalho, um tratamento distinto e desvantajoso para com o Autor, admitido por concurso para cargo em exercício de comissão de serviço, com um horário de 40 horas, relativamente aquele trabalhador.
(Da responsabilidade da Relatora)
Texto Integral
Processo nº 2227/22.5T8AVR.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca ... Juízo do Trabalho ... - Juiz 1
Recorrente: AA
Recorrida: Centro Hospitalar ..., E.P.E
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
1. Relatório:
Por esclarecedor, transcreve-se o relatório da sentença, consignando-se ainda que por decisão de 22.11.2022 o Tribunal de Conflitos considerou competentes para a ação os Tribunais Judiciais, concretamente, o Juízo do Trabalho ....
“AA (…), instaurou no tribunal Administrativo e Fiscal ..., ação administrativa com processo comum contra o Centro Hospitalar ..., E.P.E (…) e a Administração Regional de Saúde do Centro, I.P. (…), formulando o seguinte pedido - que se transcreve:
«1 - Ser declarada a nulidade da deliberação de 25 de Junho de 2020 emanada do Réu;
2 - Ser o R. condenado a reconhecer o A como trabalhador permanente da Instituição, liquidando-lhe todas as retribuições e prestações em conformidade com o que auferia mensalmente, conforme o relatado os autos, desde 01 de Setembro de 2020, e cujo apuramento deve ser relegado para liquidação de sentença;
3 - Se se entender de modo diferente, deve então o R. ser condenado a repor a situação que existia se o ato não tivesse sido praticado e nessa base ser renovada a comissão de serviço por mais três anos, com efeitos a partir do dia 01 de Setembro de 2020, e como o R. já abriu concurso para o efeito, deve ser condenado a liquidar o equivalente ao que o A iria auferir durante os três anos de vigência da nova renovação da comissão de serviço, o que ascende à quantia anual de € 51.641,93 e no total dos três anos de € 154.925,94, acrescida de juros à taxa legal até integral pagamento;
4 - Deve o R. ser condenado a reconhecer que o A laborava em regime de isenção de horário de trabalho, sem que alguma vez lhe tivesse sido pago o respetivo complemento por essa situação, o que mensalmente ascende a quantia não inferior a € 333,69, o que perfaz o montante global de € 12.012,84;
5 - Deve o R. ser condenado a liquidar cinco horas semanais extraordinárias, que o A realizou durante os três anos de vigência do contrato, o que ascende a um total de € 11.449,80;
6 - Ser a R. condenada a pagar ao A. a diferença de vencimento em virtude da deliberação do Conselho de Administração, no valor global de € 39.209,22;
7 - Ser A condenada a pagar ao A a título de danos morais a quantia de € 30.000,00;
8 - Quantias estas que devem ser acrescidas dos juros legais vincendos à taxa-legal desde a citação até efetivo e integral pagamento;».
Alegou para tanto, em síntese:
Em 11 de Novembro de 2016, foi aberto pelo R. CH... procedimento concursal para recrutamento de Auditor Interno, tendo em vista o exercício dessas funções em regime de comissão de serviço, referindo-se no aviso que o recrutamento constituído ao abrigo do procedimento se extinguia após a celebração do contrato individual de trabalho.
Concorreu ao referido concurso, tendo ficado classificado em primeiro lugar, sendo-lhe de imediato apresentado um contrato de trabalho por tempo indeterminado a celebrar com o R. CH..., com efeitos a partir de 1 de Agosto de 2017 - contrato esse que não chegou a ser assinado pelo R. CH..., por razões que se prenderam com a necessidade de desvinculação prévia do A. das funções que então exercia noutra instituição. Em 5 de Setembro de 2017, tomou posse no cargo de Auditor Interno, tendo assinado com o R. CH... um contrato denominado “Comissão de Serviço”, renovável por três anos.
Em 25 de Junho de 2018, o Conselho de Administração do R. CH... deliberou pela não renovação do referido contrato, baseando-se em alegadas irregularidades existentes no procedimento concursal, referenciadas num parecer emitido pela R. ARSC.
Deliberação essa que constitui um ato administrativo nulo, sem fundamentação, violador do art. 19º n.º 9 do Decreto-Lei (DL) n.º 18/2017, de 10/02, sendo errada, legalmente inadmissível e violadora dos princípios constitucionais da legalidade, proporcionalidade, certeza e segurança jurídicas e da separação de poderes, não tendo sido comunicada ao Ministério da Saúde, baseando-se num parecer intempestivo e emitido com desvio de poder, sobre o qual não teve oportunidade de exercer o contraditório.
Embora no contrato de comissão de serviço celebrado não tenha ficado a constar cláusula nesse sentido, o Conselho de Administração do R. CH..., desde momento anterior à sua outorga, criou a convicção no A. de que finda a comissão de serviço, iria lá ficar mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado, existindo acordo prévio sobre isso, expresso na minuta aprovada pelo referido R. e entregue ao A. para assinar, que equivale ao efetivo conteúdo de tal cláusula.
Por isso, sendo a deliberação nula, deve o R. CH... ser condenado a reconhecer o A. como seu trabalhador permanente e liquidar-lhe todas as retribuições em conformidade com o que auferia.
Caso não se entenda considerá-lo como trabalhador permanente do R. CH..., deve ser reposta a situação que existiria se o ato não tivesse sido praticado e, nessa medida, renovada a comissão de serviço por mais três anos, com efeitos a partir do dia 1 de Setembro de 2020; ou, alternativamente, liquidado o montante equivalente ao que iria auferir durante os três anos de vigência da nova renovação, atendendo a que já foi aberto concurso para o efeito. Laborava em regime de isenção de horário, sem que alguma vez lhe tivesse sido pago o respetivo complemento. Prestava 40 horas de trabalho semanal, quando devia prestar apenas 35 horas, pelo que lhe é devida retribuição por trabalho suplementar. A sua remuneração foi mal calculada, devendo corresponder a 80% do valor ilíquido auferido pelos vogais do Conselho de Administração a título de retribuição base e suplementos - o que não sucedeu. Sofreu danos não patrimoniais com a conduta dos RR..
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A ARSC excecionou na contestação a sua ilegitimidade processual passiva, alegando que o eventual provimento da ação não a poderá prejudicar e que não tem qualquer interesse contraposto ao do A. que fundamente a sua chamada à ação, pedindo que seja absolvida da instância.
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Também o R. CH... contestou, invocando a ineptidão da petição inicial, por ininteligibilidade do pedido e porque nela não são explicitadas as razões de direito que fundamentam os pedidos formulados.
Impugnando a versão dos factos alegada pelo A. e defendendo, no essencial:
O anúncio respeitante ao concurso em questão padecia de lapso, ao mencionar que o requisito da experiência profissional em auditoria era alternativo ao da qualificação técnica e competências na matéria, quando na realidade, de acordo com a lei e com o Regulamento Interno do R. CH..., se tratavam de requisitos cumulativos - o que o A. certamente sabia, visto ser licenciado em direito e especialista em matéria de gestão hospitalar.
A minuta de contrato de trabalho sem termo que os serviços administrativos do R. submeteram à consideração do A. constituiu um manifesto lapso, porque de acordo com a lei e com o objeto do concurso, o contrato a celebrar só podia ser de trabalho em regime de comissão de serviço. Razão pela qual tal minuta não foi subscrita pelo Conselho de Administração do R.. O contrato que veio a ser outorgado foi uma comissão de serviço externa, pelo prazo de três anos (eventualmente) renovável por mais dois ciclos de igual duração, sem garantia de emprego após a cessação.
Pelo que, com o fim da comissão de serviço, não houve, nem podia haver, qualquer conversão ou convolação em contrato individual de trabalho ou qualquer outra configuração laboral, pois nada foi estabelecido nesse sentido.
A fundamentação para a não renovação da comissão de serviço do A. consta expressamente do texto da deliberação do R. CH... e do parecer da ARSC, prendendo-se com a circunstância do regime legal que estava em vigor aquando da abertura do concurso exigir experiencia profissional em auditoria (que o A. não tinha) e de se encontrar precludida, pelo decurso do prazo, a possibilidade de anulação administrativa da admissão do A..
Razões pelas quais o R. CH... entendeu manter a decisão tomada pelo anterior órgão de gestão, reservando-se, no entanto, o direito de não renovar o contrato, logo que este atingisse o seu termo inicial, em nome dos princípios da transparência, imparcialidade e boa-fé e por entender que essa renovação constituiria uma aprovação tácita da manutenção de um processo de recrutamento que padecia de irregularidades.
Donde resulta que a deliberação em causa não só se encontra devidamente fundamentada, como é substancialmente inatacável.
E embora a comunicação à ARSC da decisão de não renovar o contrato de auditor interno com o A. tenha sido feita depois da deliberação - e não antes, como devia -, a verdade que tal decisão não está sujeita a qualquer parecer prévio vinculativo do Ministério da Saúde, pelo que o incumprimento do prazo não tem qualquer consequência sobre a validade do ato praticado.
Foi paga ao A. indemnização por caducidade do contrato de comissão de serviço, de valor superior ao que seria devido. Quantia que o A. fez sua, conformando-se tacitamente com a ausência de renovação do contrato. Constituindo má fé, na modalidade de “venire contra factum proprium”, vir reclamar o que quer que seja depois de se apropriar do referido valor.
Os alegados danos não patrimoniais sofridos pelo A. baseiam-se em circunstâncias alheias à atuação do R. CH..., pelo que não podem originar obrigação de indemnizar, mesmo que fossem verdadeiros.
Não foi acordado regime de isenção de horário de trabalho, pelo que não tem o A. direito a receber o que quer que seja a esse título.
Durante a vigência do contrato de comissão de serviço, o A. pugnou, por diversas vezes e recorrendo a diversos argumentos, pelo reconhecimento do seu horário como sendo de 35 horas semanais, o que o R. sempre recusou, informando-o que a duração semanal de trabalho era de 40 horas, conforme consta do aviso do procedimento concursal e do contrato de comissão de serviço.
Perante as recusas do R., o A. questionou a Administração Central do Sistema de Saúde sobre se lhe assistia o direito a algum abono remuneratório excecional a partir do momento em que o regime das 35 horas se passou a aplicar no Sistema Nacional de Saúde, tendo a resposta sido negativa, por não se aplicar ao cargo de auditor em regime de comissão de serviço, mas apenas ao regime de carreiras. Resposta essa com a qual o A. se conformou, disso dando conta ao R., pelo que a invocação na presente ação desse alegado direito, não só se encontra prescrita, como constitui um manifesto abuso de direito, na modalidade do “venire contra factum proprium”.
Quanto à alegação do A. de que estava a auferir um vencimento inferior ao que foi deliberado, a sua remuneração foi fixada em 80% da retribuição base ilíquida de um vogal de CA, sem incluir outros suplementos remuneratórios, nomeadamente despesas de representação, ao contrário do que é defendido [na] petição inicial. Sendo esse valor, que se cifrava em € 2.746,91, que ficou a constar do contrato, sem que alguma vez tenha sido objeto de reclamação ou impugnação. Pelo que é extemporânea a dedução de reclamação nesta sede e nesta altura.
Termina considerando que deve ser absolvido da instância, na procedência da exceção dilatória de ineptidão da petição inicial; caso assim não se entenda, absolvido do pedido, sendo a ação julgada improcedente; ou se for outro o entendimento do tribunal, reduzido o quantum indemnizatório aos limites justos e adequados da prova que se vier a produzir.
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Respondeu o A. à exceção da ilegitimidade invocada pela ARSC, afirmando que esta é parte legítima, porque emitiu um parecer cuja validade é aqui questionada e que determinou o ato administrativo final que é objeto da presente ação.
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O A. respondeu também à contestação do R. CH..., contrapondo que não ocorre a invocada ininteligibilidade do pedido e que o referido R. demonstrou, na defesa que apresentou, que compreendeu o fundamento do que foi peticionado, esclarecendo que o terceiro pedido é deduzido em alternativa ao segundo e reformulando esse terceiro pedido, nos seguintes termos: «Ou 3 - Se se entender de modo diferente, o R. ser condenado a repor a situação que existia se o ato não tivesse sido praticado e nessa base ser renovada a comissão de serviço por mais três anos, com efeitos a partir do dia 01 de Setembro de 2020, e, nessa hipótese, caso se mostre inviável a reposição em virtude do R. ter aberto concurso para o efeito, ser condenado a liquidar o equivalente a que o A. iria auferir durante os três anos de vigência da nova renovação da comissão de serviço, o que ascende à quantia anual de € 51.641,93 e no total dos três anos de € 154.925,94, acrescida de juros à taxa legal até integral pagamento».
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Foi proferido despacho saneador, onde se decidiu absolver da instância a ARSC, por ser parte ilegítima na ação e julgar improcedente a exceção da ineptidão da petição inicial invocada pelo R. CH..., dispensando-se a identificação do objeto do litígio e a enunciação dos temas de prova.”(realce introduzido)
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O Autor veio requerer a junção aos autos de 14 documentos.
O Réu CH..., E.P.E., pronunciou-se no sentido de que deve indeferir-se a requerida junção dos documentos apresentados e, consequentemente, ordenar-se o seu desentranhamento dos autos.
Em 19.09.2023, foi proferido despacho a indeferir a junção de documentos requerida pelo Autor e a determinar que devem ser oportunamente desentranhados dos autos.
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Foi realizada a audiência de discussão e julgamento.
Em 13.10.2023, foi proferida sentença a qual terminou com o seguinte dispositivo:
“Em face de todo o exposto, julga-se a ação improcedente, absolvendo-se a R. dos pedidos nela formulados pelo A..
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Custas a cargo do A. - art. 527º n.ºs 1 e 2 do Cód. de Processo Civil.”
Não se conformando com o assim decidido, o Autor interpôs o presente recurso, terminando as alegações com as seguintes conclusões:
1 – O Recorrente apresentou pedido de junção de documentos já com a audiência de julgamento em curso, entendendo que os mesmos esclarecem e provam os fundamentos da ação, sendo como contraprova ao fundamento do R.;
2 – Explicitou que a junção de tais documentos se justificava em virtude das declarações prestadas pela testemunha BB, para comprovar, e demonstrar, a experiência do Recorrente em auditoria antes da abertura do concurso público que deu origem ao contrato de trabalho em causa nos autos;
3 – Tais documentos não puderam ser juntos com a p.i., cujo conhecimento dependia de serem emitidos por entidades externas, a que só recentemente tinha conseguido aceder;
4 – O pedido de junção da certidão judicial do MP, e uma certidão de um processo aberto pelo MP, resulta do facto de só se ter tomado conhecimento dos mesmos em 31 de Janeiro de 2023, tratando-se de um procedimento investigatório a que se seguirá ação judicial do M.P. para declarar a nulidade de contratos;
5 – Tal documento contraria as declarações da Sra. Presidente, proferidas em audiência e tal documento contém e-mails nos quais se vem dizer que o C.A. retirou dos relatórios do auditor toda a “eficácia desejada e ideal, em matérias que consideram da maior relevância”;
6 – Requereu também a junção de documentos para prova de matérias com instruções do Ministério da Saúde ao A., da ARS, de planos de atividade relativos a funções de controlo interno;
7 - Requereu ainda a junção aos autos de documentos que apenas foi possível identificar na instituição anterior onde exerceu cargo público em resultado de depoimento de testemunha na última sessão de julgamento, a qual enquadrou a atividade no âmbito dos procedimentos de qualidade, como resultado da avaliação feita pela respetiva comissão, sendo que, como se depreendeu da interpelação feita pelo tribunal a essa testemunha, depois em CA tomavam-se as inerentes e necessárias decisões.”;
8 – Face às circunstâncias concretas explicitadas deveriam tais documentos ser admitidos, ao abrigo do princípio geral da prevalência da verdade material, pois, de outro modo, entende-se ser ilegal a denegação do meio de prova, em violação do preceituado no artigo 423º, nº 3, do CPC, que se mostra violado;
9 – Assim, a decisão a esse respeito proferida, deve ser revogada e substituída por outra que defira a pretensão do Recorrente, e em consequência tal deverá conduzir a nova reavaliação da prova, o que se invoca de acordo com o artigo 651º, nº 1, do CPC;
10 – A respeito desse facto nº 15, não se teve em consideração a posição que o próprio R. expressou em sede de contestação, quando alude a “que o Presidente do CA do R. não assinou o contrato de trabalho cuja minuta foi remetida ao A. por e-mail de 31/07/2017”, a que se alude no facto nº 16 dos factos provados, bem como o que resulta do artigo 55º da contestação do Réu;
11 – Sendo que, essa alegação do Réu é uma confissão do facto alegado pelo Autor, a que o Réu contrapôs apenas que o seu presidente não assinou esse contrato, “porque a data de início tinha que ser retificada”. Ou seja, recebeu o Réu o Autor, que iniciou funções e antes desse início apresentou ao Autor o contrato da minuta, que pelo Autor foi assinado e que a diretora de Recursos Humanos, que colheu a assinatura, levou ao presidente para ser assinado nessa manhã;
12 – Assim, o facto nº 15 deve passar a ter a seguinte redação: “O Ministério da Saúde não obteve, em tempo útil, substituto para exercer as funções de Presidente do CA do Hospital ..., questionando o Autor se poderia desempenhar funções em ... um mês mais até que o Ministério arranjasse substituto, ao que o Autor respondeu, desde que o Senhor presidente do Conselho de Administração do Réu autorizasse, dado que ele escreveu oficio ao Autor dizendo que se não viesse iria chamar o segundo, como aliás consta no facto 13”;
13 – O facto provado nº 18 deve ser alterado, passando a ter a seguinte redação: “Ao autor foi enviada uma minuta de contrato de trabalho por tempo indeterminado para celebração do contrato inicial de trabalho”;
14 – Tal resulta do documento de resposta ao e-mail da minuta conjugado com o depoimento de testemunhas e declarações de parte do A.;
15 – Sobre esta matéria foi inquirida a testemunha CC, que afirmou, nomeadamente, o seguinte: “Mas então já existia um contrato quando houve o pedido de prorrogação para entrada em funções do auditor (Dr. AA) – (10:30), ao que a testemunha respondeu: “sim, provavelmente os Recursos Humanos elaboraram um modelo de contrato que foi dado a conhecer ao interessado, Dr. AA”;
16 – Também foi inquirida a testemunha DD, que explicou que é diretora dos recursos humanos da Ré, que tinha muito conhecimento do procedimento, já que a maioria das peças do procedimento foram por si propostas para deliberação no conselho de administração da Ré e que era técnica superior e que, de “todo o caso, eu conheço o procedimento”;
17 – Foi ainda inquirida a testemunha BB, que declarou o seguinte: “ele ganhou um concurso para auditor em ..., e tinha que tomar posse desse lugar (9:54), na data especifica, foi uma situação muito frágil do ponto de vista do Dr. AA, que não tinha alternativa e não podia correr o risco de perder a oportunidade e por isso acabou para aceitar (10:15), dando cumprimento na data em que lhe foi proposto. Ele despede-se de ... para tomar posse em ... e nesse dia regressa (11:08), para continuar a trabalhar connosco um mês mais, em agosto. Ele explicou-nos as circunstâncias e ficámos todos muito satisfeitos, até porque era muito mais confortável fazer a passagem de dossiers para o novo conselho de administração com tempo.”;
18 – E a testemunha EE, ao ser inquirida declarou: “que substitui a minuta e contrato do Autor, que havia sido enviado pela Diretora do Serviço, disse: “apanhou o processo quando a Dra. DD estava de férias”, que situou em setembro de 2017, depois de ela testemunha gozar férias em agosto desse ano”;
19 – Tendo a mesma testemunha ainda afirmado: “O Dr. AA veio com o contrato para alterar a data (1.30) de inicio de funções, de agosto de 2017 para setembro de 2017”, que “esse contrato era um contrato sem termo. Eu disse que não podia assinar aquele contrato, que teria que ser um contrato em comissão de serviço. Pedi ajuda à Jurista do hospital, para saber se eu estava a interpretar da melhor forma. Ela veio ajudar-me”;
20 – E ainda, a mesma testemunha: “Mas então já existia um contrato quando houve o pedido de prorrogação para entrada em funções do auditor (Dr. AA) – (10:30), ao que a testemunha respondeu: “sim, provavelmente os Recursos Humanos elaboraram um modelo de contrato que foi dado a conhecer ao interessado, Dr. AA (10:42), acrescentando - em resposta à questão sobre se sabia se esse modelo chegou a ser assinado – “Não sei, confesso que não sei. Só tomei conhecimento da minuta /contrato quando veio a conselho para ser assinado (12:35), ao que a mandatária insistiu: “Mas então, que minuta é que lhe chegou para ser assinada? (12:44), ao que respondeu “do contrato que foi assinado.”;
21 – E inquirido o Recorrente, em declarações de parte, o mesmo afirmou: “Que no dia um de agosto chegou ao hospital ... (CH...) antes das 9 horas e dirigiu-se aos Recursos Humanos, onde assinou o contrato que lhe havia sido enviado como minuta pela diretora dos Recursos Humanos de véspera (31.07.2023), que era um contrato de trabalho a tempo indeterminado, em regime de comissão de serviço, que aceito imediatamente, logo informando nesse dia a diretora, igualmente por email, de que aceitava a minuta. E que após assinar o contrato foi para o gabinete que o hospital lhe destinou, mas que entre as 10 horas e as 11 horas desse dia recebeu um telefonema do presidente do CH... a informar que ele presidente recebera minutos antes uma comunicação do chefe de gabinete do Sr. Secretário de Estado pedindo ao presidente, Dr. CC, para autorizar que o auditor, ele autor, regressasse ao Hospital ..., mais um mês, até que o Ministério arranjasse substituto e que o presidente lhe disse que assim sendo teria que rasgar-se o contrato, já que seria necessário emendar a data, que passaria a ser o inicio do mês de Setembro”;
22 – O Recorrente ainda começou por explicar os cargos que exerceu, quer no Hospital 2... quer em ... e a forma como o Ministro FF lhe pediu para assumir o cargo, bem como as razões que o levaram a concorrer a auditor da Ré, depois de ter tirado um curso como auditor Interno para o SNS, explicando que não queria que lhe sucedesse o mesmo que sucedeu no tempo de GG, em que foi exonerado do cargo e ficou sem emprego, sem clientes, sendo que desta vez, já estava há um ano sem mandato em ..., tratava dos sogros doentes, esposa com um tumor e tinha dois filhos na Universidade, temendo ficar sem emprego, por isso concorreu. Que pediu várias reuniões para deixar o cargo de presidente de ..., que lhe foi pedido pelo Ministério na semana anterior a ingressar como auditor que ficasse mais um mês, ao que ele acedeu, até que se arranjasse substituto para ..., mas que apenas poderia fazer isso com a autorização do CH..., já que havia recebido um oficio que informava que se não assumisse o cargo de auditor iriam chamar o segundo;
23 – Tendo ainda declarado que como a data já não era coincidente, aceitou de bom grado de imediato isso, regressando às anteriores funções, apresentando-se no inicio do mês de setembro novamente na Ré: “acho que era dia 4 ou dia 5 de setembro” (10:00), mas que “de forma surpreendente ao chegar ao hospital os Recursos Humanos apresentaram-lhe um contrato que “não era aquele que havia acordado”;
24 – Neste contexto entende-se que o envio do primeiro contrato não se deveu a um mero erro, dado que o mesmo ia ao encontro da indicação no concurso à celebração de contrato individual de trabalho, tal como resulta dos documentos do concurso, devendo notar-se que não é por mero erro que se elabora um contrato de comissão de serviço, nem um contrato de trabalho por tempo indeterminado, contrato esse que foi elaborado, assinado pelo Autor e entregue no departamento de recursos humanos, tendo o Autor nesse mesmo dia iniciado funções, embora por umas breves horas;
25 - Em suma, o que fica provado é que a Ré recebeu o contrato assinado, entregue nessa manhã do dia 1.08 para assinatura do autor, cuja minuta remeteu a este de véspera, e remeteu-o ao respetivo presidente, que ao receber telefonema do chefe de gabinete do Secretário de Estado pedindo autorização para o Autor regressar a ... mais um mês, acordando de imediato com o Autor, por telefone, que a data do contrato teria que ser retificada (ou seja, para um mês depois do regresso do Autor à Ré, porque o Autor ia entretanto para as anteriores funções de presidente de ...);
26 – Em relação ao facto nº 35, deve ser especificado que no mandato do Recorrente, em ..., o hospital não tinha auditor interno, porquanto estes hospitais apenas passaram a ter obrigação legal de o ter com o Decreto-Lei nº 18/2017, de 10 de Fevereiro, pelo que tal matéria deve ser aditada à matéria provada;
27 – O facto nº 39 dos provados, deve ser eliminado por falte de competência para o Tribunal se substituir ao júri e por o aviso do concurso e os e-mails remetidos pela Direção dos Recursos Humanos comprovarem a experiência em auditoria do A,. o que também é comprovado pelos documentos entregues pelo A., comprovativos da sua experiência, tendo o mesmo sido presidente de duas instituições de saúde, Advogado durante mais de 30 (trinta) anos, tendo Mestrado e especializações, incluindo em auditoria interna;
28 – E se se entender de modo diferente, quanto ao facto nº 39, deve apenas dele constar que “O Autor sabia que era contratado em contrato individual de trabalho com a modalidade de comissão de serviços”;
29 – A menção, no facto nº 55, a flexibilidade de horário de trabalho encontra- se erradamente enquadrada, pois o Recorrente laborava em horário contínuo, donde legalmente incomportável com a modalidade de horário flexível;
30 – Pelo que, estando como está provado por documentos, que o Recorrente laborava com isenção de horário, ao facto nº 55 deve ser acrescentado de que esse requerimento junto pelo Ré como documento nº 9 apenas permite indicar que o mesmo requereu horário continuo, que lhe foi concedido, nada provando quando à isenção de horário;
31 – Acresce que em face de todo o acervo documental junto aos autos e depoimentos das testemunhas, devem passar a factos provados os seguintes:
- Que o R. CH... desde o início que criou a convicção no A. de que este iria ingressar no R. num cargo de dirigente intermédio, mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado.
- Que existiu um acordo entre o R. CH... e o A., no sentido deste permanecer como trabalhador subordinado do R. CH..., uma vez findo o contrato de comissão de serviço;
32 – Sendo que estes factos resultam, nomeadamentes, da minuta enviada ao Recorrente, do próprio colher da assinatura dessa minuta ao mesmo, em 1 de Agosto de 2017, além dos emails da minuta;
33 – Além disso, deve também passar também a elencar os factos provados os seguintes:
a) - Que o Presidente do CA do R. CH... não assinou o contrato de trabalho cuja minuta foi remetida ao A. por email de 31/07/2017, a que se alude no n.º 16 dos factos provados, porque a data de início tinha de ser retificada.
b) - Que apesar do mencionado contrato de trabalho não ter sido assinado pelo R. CH..., quando o A. assinou o contrato de comissão de serviço, ficou convencido que viria a integrar um vínculo por tempo indeterminado, ingressando num cargo de dirigente intermédio.
c) - Que o R. CH... desde o início que criou a convicção no A. de que este iria ingressar no R. num cargo de dirigente intermédio, mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado;
34 – A indicação destes factos resulta, também, do depoimento da testemunha BB, diretora clínica em ... entre 2013 e 2017, integrante pois do mesmo conselho de administração presidido pelo Autor, quando questionada sobre o que sabia dos aspetos relativos à contratação para o CH..., referiu que “sabe praticamente aquilo que na altura foi revelado pelo Autor, com quem trabalhou e, desde logo, a surpresa de ter chegado a ..., depois de se ter despedido do hospital no final de julho, sendo que no regresso às funções de presidente explicou às colegas da administração que havia assinado um contrato, mas que o Secretário de Estado falou com o presidente ... para este autorizar o Autor a regressar mais um mês às funções de presidente em ..., e que o contrato que havia assinado teria, pois, que ser alterado por ser necessário alterar a data, com o inicio de funções agora para o mês de setembro (de 2017)”;
35 - Explicou ainda que: “ele ganhou um concurso para auditor em ..., e tinha que tomar posse desse lugar (9:54), na data especifica, foi uma situação muito frágil do ponto de vista do Dr. AA, que não tinha alternativa e não podia correr o risco de perder a oportunidade e por isso acabou para aceitar (10:15), dando cumprimento na data em que lhe foi proposto. Ele despede-se de ... para tomar posse em ... e nesse dia regressa (11:08), para continuar a trabalhar connosco um mês mais, em agosto. Ele explicou-nos as circunstâncias e ficámos todos muito satisfeitos, até porque era muito mais confortável fazer a passagem de dossiers para o novo conselho de administração com tempo”;
36 - Questionada ainda a mesma testemunha, sobre se nessa data em que regressou a ... teve conhecimento que ele Autor tinha assinado algum contrato de trabalho (?), respondeu: “Isso não sei… espere, ele de facto disse isso, isso nós falámos, que lhe pediram para assinar o contrato mas quando foi no final de agosto teve que assinar um novo contrato (12:48), o que o deixou de facto muito inquieto relativamente a essa segunda opção. Mas também ele não tinha outra alternativa, porque ele já estava sem posto de trabalho”;
37 – E também da testemunha HH, declarou que era engenheiro informático, sendo técnico superior no Hospital ..., e tendo trabalhado com o Autor entre 2015 a 2017, altura em que o mesmo saiu da presidência do Hospital .... Disse que conhece a situação, até porque viveu com o mesmo entre 2015 e 2019, pernoitando na casa do Autor em ...;
38 - Questionado ainda sobre o que motivou a transição de ... para ..., explicou que isso foi motivado por maior estabilidade para ele Autor e sua família, que o mesmo trabalharia numa comissão de serviço mas que cessada esta permaneceria ao serviço da entidade, em ..., (o que não veio a acontecer – 04:25, porque não lhe renovaram a comissão de serviço).
39 – Por seu turno, a testemunha II, engenheiro civil, disse, no seu depoimento, que o Autor saiu do Hospital ... para ingressar como técnico e que isso se faz quando se quer procurar ter maior estabilidade. Ou seja, ingressar como quadro técnico para trazer maior estabilidade, sendo esse o objetivo da mudança, e ficar muito mais tempo;
40 – Deve também passar a constar que o Recorrente laborou em regime de isenção de horário de trabalho, devendo aditar-se facto nesse sentido;
41 – O que consta do seu recibo e foi concedido, não apenas no seu próprio interesse, mas também da instituição, e concedido porque figurava no regulamento interno da instituição e porque lhe permitia desempenhar funções de controlo interno, próprias de um auditor em horário fora do horário normal;
42 – Tal facto resulta, também, do teor do depoimento da testemunha DD, a qual, questionada sobre se existia algum documento relativamente a horário em laboração contínua, disse que “sim”, que “há um requerimento por causa da redução do intervalo de descanso”, que nessa altura o CH... estava a negociar com os Sindicatos a regulamentação do horário de trabalho e que os “timings do intervalo de descanso entre uma hora e hora e duas horas eram passíveis de ser “negociados com os profissionais, podendo o intervalo ser reduzido por mútuo acordo de 30 minutos” e que “foi nesse âmbito que o Dr. AA solicitou também a redução de horário de intervalo de descanso para 30 minutos”, por forma a que pudesse utilizar o meio de transporte público para regressar a casa no fim da jornada: “Ele chegava por volta das 8, 8 e 30 minutos e como lhe estava dado um horário muito fixo, o sistema (informático) automaticamente despreza os horários antes de iniciar o período normal de trabalho e a solução foi passá-lo para o regime de isenção de horário de trabalho, para que o sistema pudesse apanhar todos os tempos de trabalho (18:42) e não apenas o tempo de trabalho entre as 9 horas e as 17”;
43 – A mesma testemunha explicou ainda, quando questionada […] o regime do horário de trabalho do Recorrente que: “do ponto de vista mecânico, do instrumento de leitura do registo biométrico, efetivamente a única forma de introduzir essa flexibilidade era através do código de isenção de horário de trabalho”, mas à insistência da mandatária sobre se não era de jornada contínua, a diretora e testemunha respondeu dizendo que o autor fez um requerimento, e a jornada continua implica a perda do intervalo de almoço, insistindo que “o Dr. AA chegava bastante cedo ao hospital e todo o tempo antes era aproveitado com o código da isenção de horário”;
44 – Assim, não se concluindo que a situação jurídica do Autor está vinculado por um contrato de trabalho a tempo indeterminado, sempre haverá que fazer apelo à condenação extra vel ultra petitum, artigo 74º do Código de Processo de Trabalho, porquanto não pode ficar imune e sem censura a questão de uma entidade pública remeter uma minuta de um contrato de trabalho a tempo indeterminado;
45 – E, tratando-se de entidade pública, ainda por cima dizendo respeito a factos determinantes que fizeram com que o Recorrente deixasse o cargo de presidente da Instituição pública onde trabalhava para ingressar no Réu, tais factos são de uma ilicitude grave, deslealdade entre as partes contratantes, que põem em causa não apenas o bom nome da instituição pública que devia granjear no Réu, como o direito à estabilidade no emprego e direito ao trabalho, tendo pois carácter imperativo por violação de normas do Código de Procedimento Administrativo aplicável às empresas públicas;
46 - Assim, estando esses factos provados, dizendo eles respeito a princípios inderrogáveis como sejam a ordem pública, o direito à estabilidade no emprego, o direito à lealdade e boa fé, os princípios jurídicos de que o Réu tem estatuído no seu código de conduta ética, que são públicos, deve o mesmo ser condenado, vel ultra petitum, a assumir os danos causados, suportando indemnização por atos culposos dos seus agentes, nos mesmos termos em que responde um comitente por atos do seu comissário e por força da lei de responsabilidade extra contratual dos entes coletivos;
47 - Pelo que deve o R. ser condenado a suportar indemnização equivalente à reintegração no posto de trabalho, caso não proceda o pedido principal, o que deve fazer a título de indemnização, como reintegradora natural;
48 – Contudo, no mínimo, caso assim se não entenda, deve o R. ser condenada a pagar pelo menos dois anos de contrato de trabalho que sempre teria que suportar por força da alteração contratual em que inseriu o Recorrente, que tinha um procedimento concursal para uma comissão de serviço de cinco anos, e não de três anos, de um contrato que teve que assinar, por já não ter alternativa, conforme declarações da testemunha BB;
49 – O Tribunal a quo defendeu que não ocorre a falta de fundamentação invocada pelo Recorrente, nem a deliberação padece de vício passível de gerar nulidade ou anulabilidade, nos termos dos artigos 116º e 163º, do CPA, o que não se aceita;
50 - É que os fundamentos em si devem respeitar o princípio da legalidade, da proporcionalidade e da segurança e certeza jurídicas, o que não ocorreu no caso do Recorrente;
51 - Se a ARSC entendesse estar verificada alguma irregularidade no Concurso no âmbito do qual o Recorrente foi admitido como Auditor Interno, devia ter diligenciado junto dos Tribunais para que se decidisse se efetivamente existiu ou não algum ato inválido.
52 – E, o Conselho de Administração do CH..., pressionado pela existência de um Ofício daquela natureza, e apesar de ter na sua posse um Parecer Jurídico que não acompanha aquele ato da ARSC, utiliza o teor do mesmo como fundamento para a não renovação do contrato de comissão de serviço do Recorrente:
53 - Assim, a deliberação de 25 de Junho de 2020 ao assentar numa base de fundamentação, toda ela nula por violadora de princípios constitucionais, torna-se igualmente inválida, pois tal ato não é aproveitável;
54 – Sendo que, a não renovação do contrato de comissão de serviço é inválida, por violar o disposto na Constituição da República, quanto ao específico dever de fundamentação dos atos (artigo 268 nº 3), consagrando direito a tutela efetiva (nº 4);
55 – E, esse ato administrativo que levou à contratação do Recorrente, manteve-se durante tempo mais do que suficiente para que pudessem ser retiradas consequências negativas de qualquer irregularidade que possa ter ocorrido no Concurso;
56 – Em suma, a deficiente, ou nula fundamentação contraria as regras, desde logo do dever fundamental de fundamentação expressa de ato administrativo (ANDRADE, José Carlos Vieira de. O dever da fundamentação expressa de atos administrativos / José Carlos Vieira de Andrade.- Coimbra: Almedina, 1992.- 399 p. ; 23 cm. - (Teses);
57 – Neste contexto, a não renovação do contrato de comissão de serviço celebrado com o Recorrente, em virtude da fundamentação em que assenta, é manifestamente nula, por violar princípios de direito constitucional, em especial, os princípios da legalidade, da proporcionalidade, da certeza e segurança jurídicas, e de forma nítida, o da separação de poderes;
58 – Acontece que, na perspetiva do Recorrente, tendo este desempenhado o seu trabalho devidamente, seria de prever a renovação da comissão de serviço, pelo menos mais uma vez, o que se demonstrou pela inexistência de qualquer indicação ao mau exercício das funções na deliberação de não renovação;
59 - Contudo, foram causas totalmente exógenas à sua prestação de trabalho, mormente que a acontecerem resultaram de erros praticados pelo Recorrido, suscetíveis de mera anulabilidade e ocorridas há 3 anos, que levaram à não renovação do contrato do Recorrente, quando as inúmeras situações presentes naquele Centro Hospitalar, que nem sequer haviam sido precedidas de concurso se mantiveram incólume;
60 – Assim, aquela deliberação não é legal, na medida que faz produzir efeitos sobre um contrato de comissão de serviço, que não deixa de ser um contrato de trabalho, renovável por períodos de 3 anos, salvo existência de fundamento para a não renovação, de alegadas irregularidades num procedimento concursal ocorrido há mais de 3 anos e em relação às quais o principal interessado nada teve a dizer;
61 - Não pode considerar-se numa deliberação o que dela não consta, como é o caso do pretenso processo de falta de transparência do acesso do Recorrente, se inexistiu qualquer reclamação e se esse processo se consolidou na ordem jurídica, sendo o mesmo totalmente alheio às pretensas falhas do CH...;
62 - A retribuição mensal ilíquida do auditor interno, incluindo suplementos remuneratórios, não pode ser superior a 85% do vencimento mensal ilíquido estabelecido para o vogal do conselho de administração, significando que na remuneração do auditor se incluem todos os suplementos remuneratórios equivalentes ao de um vogal, com o limote de 85%.
63 - Assim: ou a remuneração incluiu esses suplentos, ou tem de se pagar ao auditor suplemento de cargo de direção, já que é legalmente um equiparado a dirigente intermédio, sendo que o Tribunal exclui da remuneração o valor da despesa de representação, tal como fez o hospital;
64 - O Recorrente mantém que a interpretação mais correcta é a que defende no sentido de que a sua remuneração foi mal calculada, porque devia corresponder a 80% do valor ilíquido auferido pelos vogais do CA a título de retribuição base e suplementos, e não apenas 80% do valor da retribuição base, o que mantém;
65 – O Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo considerou que não se demonstrou que o A. alguma vez tenha trabalhado em regime de isenção de horário de trabalho, ou que tenha acordado com o R. nesses termos, mas tal colide com o que resulta dos recibos de vencimento do A. que mencionavam tal contrato e assim se encontrava inserido no sistema informático;
66 – Não se pode concluir que o Recorrente tenha laborado em regime de horário flexível. Pois não se pode confundir a flexibilidade dom a isenção de horário, concedida esta por via das funções e expectável por via desse exercício;
67 – O Recorrente discorda da interpretação do Tribunal quanto à questão das 35 horas, dado que foi discriminado negativamente em relação a outros trabalhadores que foram admitidos por concurso para cargos em exercício de comissão de serviço, pois não é legalmente admissível que uns trabalhadores laborem em regime de 35 horas e outros em regime de 40 horas, com a mesma remuneração, o que viola o preceituado nos artigos 23º, 24º nº 1 e 25º nº 1, 5 e 6 do CT;
68 - Em conclusão, deve a sentença proferida pelo Tribunal a quo ser revogada, sendo julgadas procedentes as pretensões formulados pelo Recorrente, mostrando-se violado o disposto nos artigos:423º, nº 3 do CPC; 74º do CPT; 23º, 24º, 25º e 162º do CT; 113 e 53º da CRP; 224º e 228º do CC; 19º, nº 9 do DL nº 18/2017 e 615º do CPC.
JUSTIÇA!
Não foram apresentadas contra-alegações.
O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Subidos os autos a esta Relação, o Ex.º. Procurador-Geral-Adjunto, emitiu parecer no sentido da procedência parcial do recurso.
Aí se lê:
“2.1. Além de outras razões, impugna o Recorrente a decisão de direito, por entender que tinha direito, e por isso pediu, ao pagamento de 5 horas de trabalho suplementar, pois o horário de trabalho deveria ser de 35 horas semanais e ele fazia 40.
Salvo melhor opinião, entende-se que lhe assiste razão. Na verdade, o recorrente exercia as funções de Auditor Interno no Centro Hospitalar ..., EPE.
O horário de trabalho de todos trabalhadores do Recorrido, na área da saúde, era de 35 horas semanais.
O recorrente, por sua vez foi contratado para “prestar 40 (quarenta) horas semanais de trabalho ao Primeiro Outorgante.”
Cremos que, salvo sempre diferente e melhor opinião, o recorrente deveria ter um horário igual aos demais trabalhadores do Recorrido, em obediência ao principio da igualdade de tratamento de todos os trabalhadores, ou, em alternativa, ser-lhe pago o trabalho que exercia a mais, de 5 horas semanais.
As funções que o recorrente exercia de Auditor Interno, exercia-as para o R. Centro Hospitalar ..., que é uma pessoa colectiva de direito público, de natureza empresarial, integrada no Serviço Nacional de Saúde (SNS), onde se praticava, nos termos da Lei n.º 18/2016, de 01/07, o horário de trabalho de 35 horas semanais.
O que significa que, em confronto com o Código do trabalho se encontra numa relação de especialidade, sendo, por isso, a lei aplicável.
E, para além disso, como reconhecido, e pelo que se vê da leitura do processo, o horário de trabalho da generalidade ou totalidade dos trabalhadores do recorrido era de 35 horas semanais.
Na organização económica em que estava inserido o recorrente, praticava-se este horário de trabalho. Como trabalhador desta, também o recorrente deveria estar sujeito a este horário.
A aplicação do Código do Trabalho é de aplicação subsidiária, isto é, para os aspetos não previstos ou especialmente regulados.
E mesmo que a Comissão de Serviço, figura originária do Direito Administrativo, fosse regulada pelo Código do Trabalho, o que é certo é que o recorrente exercia funções num Centro Hospitalar, como os demais colaboradores, com obrigações e direitos, em tudo iguais aos demais trabalhadores.
Admitir horários de trabalho diferentes na mesma organização empresarial, no mesmo sector de atividade, sem qualquer justificação para tal prática, e sem ser pago como trabalho suplementar, violaria, salvo melhor opinião, o princípio da igualdade a que se refere o art.º 13º da CRP, 24º e 25º do Cód. do Trabalho.
Neste particular entende-se que assiste razão ao recorrente. Deveria, pois, ser o recorrido condenado a pagar ao recorrente a quantia pedida a este título, ou aquela que se apurar em posterior Liquidação.”
O Réu, CH.../Apelado veio responder ao parecer:
“1. No essencial e em relação ao segmento do pedido do Recorrente em que este reclama “o pagamento de 5 horas de trabalho suplementar, pois o horário de trabalho deveria ser de 35 horas semanais e ele fazia 40”, entende o MP que lhe assiste razão.
2. Fundamenta este seu entendimento no facto de o Recorrente ter exercido as funções de Auditor Interno no Centro Hospitalar ..., EPE e de o horário de trabalho de todos trabalhadores do Recorrido, na área da saúde, ser de 35 horas semanais.
3. Sendo que o Recorrente, por sua vez foi contratado para “prestar 40 (quarenta) horas semanais de trabalho ao Primeiro Outorgante (o aqui recorrido CH... EPE).”
4. Mas, no entendimento do MP, “o Recorrente deveria ter tido um horário igual aos demais trabalhadores do Recorrido, em obediência ao princípio da igualdade de tratamento de todos os trabalhadores, ou, em alternativa, ser-lhe pago o trabalho que exercia a mais, de 5 horas semanais.”
5. Pois “as funções que o recorrente exercia de Auditor Interno, exercia-as para o R. Centro Hospitalar ..., que é uma pessoa coletiva de direito público, de natureza empresarial, integrada no Serviço Nacional de Saúde (SNS), onde se praticava, nos termos da Lei nº 18/2016, de 01/07, o horário de trabalho de 35 horas semanais.”
6. O que significa que, “em confronto com o Código do Trabalho se encontra numa relação de especialidade, sendo, por isso, a lei aplicável. E, para além disso, como reconhecido, e pelo que se vê da leitura do processo, o horário de trabalho da generalidade ou totalidade dos trabalhadores do recorrido era de 35 horas semanais.”
7. E como “na organização económica em que estava inserido o Recorrente, praticava-se este horário de trabalho, como trabalhador desta, também o Recorrente deveria estar sujeito a este horário.”
8.Pois “admitir horários de trabalho diferentes na mesma organização empresarial, no mesmo sector de atividade, sem qualquer justificação para tal prática, e sem ser pago como trabalho suplementar, violaria, salvo melhor opinião, o princípio da igualdade a que se refere o art.º 13º da CRP, 24º e 25º do Cód. do Trabalho.
9.O Recorrido CH... EPE não pode estar mais em desacordo com tal entendimento.
Com efeito,
10. De acordo com o disposto na Cláusula 4.ª do contrato de trabalho celebrado entre recorrente e recorrido
1. “O Segundo Outorgante (aqui recorrente) comprometeu-se a prestar 40 (quarenta) horas semanais ao Primeiro Outorgante, sendo que
2. O horário de trabalho a cumprir pelo segundo outorgante, seria elaborado e afixado em local próprio pelo primeiro outorgante, dentro dos termos e limites legais, de acordo com a organização e o esquema de funcionamento do serviço em que o segundo outorgante iria exercer funções.”
11. Em 142º e ss. da douta p.i., veio o Autor (ora Recorrente) reclamar o direito a receber uma indemnização por horas extraordinárias trabalhadas para além das 35 horas a partir do momento em que este regime horário passou a aplicar-se no Sistema Nacional de Saúde.
12. Pedindo também a liquidação de “cinco horas semanais extraordinárias, que realizou durante os três anos de vigência do contrato”, o que contabiliza em 11.449,80€, embora também não explicite a forma de cálculo dessa quantia.
13. A verdade é que, durante a vigência do (seu) contrato de comissão de serviço, o Autor (ora Recorrente) pugnou, por diversas vezes e recorrendo a diversos argumentos, pelo reconhecimento do seu horário como sendo de 35 horas semanais.
14. Ora, o artigo 19.º/7 do Anexo II - Estatutos dos Hospitais, Centros Hospitalares e Institutos Portugueses de Oncologia, E.P.E., aprovado pelo DL n.º 18/2017, de 10 de Fevereiro, estabelece que
“7- O auditor interno exerce as respetivas funções a tempo inteiro, de acordo com as normas internacionais para a prática profissional de auditoria interna e gestão de riscos.”
15. O Autor (ora Recorrente) foi informado, desde o início que a duração semanal de trabalho era de 40 horas. Assim o dispunham
a) o Aviso do Procedimento Concursal para Recrutamento de Auditor Interno (cfr. DOC. 2 junto com a douta PI);
b) o contrato de comissão de serviço (cfr. DOC. 6 junto com a douta PI).
16. Pelo que o Réu (ora Recorrido) sempre se recusou a satisfazer-lhe aquela sua pretensão.
17. Mas, não satisfeito com as recusas do Réu (ora Recorrido) em aceder aos seus intentos, e como refere em 143º e ss. da douta p.i., o Autor (ora Recorrente) teve já oportunidade de questionar a ACSS Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) sobre se lhe assistia o direito à perceção de algum abono remuneratório excecional a partir do momento em que o dito regime das 35 horas se passou a aplicar no Sistema Nacional de Saúde.
18. Sendo que a resposta negativa a essa pretensão referida em 144º da douta PI é a que consta do DOC. 10 em anexo à contestação, cujo teor integral aqui se dá por reproduzido e se subscreve.
19. Afirmando-se aqui, como ali, que o exercício do cargo de auditor em regime de comissão de serviço não é abrangido pelo regime das 35 horas que se aplica apenas ao regime de carreiras.
20. De forma clara, explícita e evidente, em 26OUT2018 a ACSS respondeu ao Autor, dizendo que (cfr. DOC. 10 em anexo à contestação).
21. Nesse mesmo dia 26OUT2018, minutos depois de ter recebido o email que dava conta da aplicação da regra geral das 40 horas para os contratos de direito privado, o Autor encaminhou-o para a Sra. Presidente do Conselho de Administração do CH..., E.P.E., no qual, de forma nítida, referiu que (cfr DOC 10 em anexo à contestação)
22. Ou seja: não só, pelo menos desde 28OUT2018, o Autor sabe que não tem (ou lhe foi negado) qualquer direito a abonos adicionais pelo facto de trabalhar 40 horas semanais, como expressamente se conformou com essa solução que se obrigou a “cumprir religiosamente”.
23. Pelo que, a invocação desse alegado direito, não só se encontra prescrita, como como constitui um manifesto abuso de direito na modalidade do “venire contra factum proprium”.
24. Por outro lado, e como resulta entre o mais da douta sentença recorrida que, também neste particular, se acompanha e subscreve, “a Lei n.º 18/2016, de 01/07, entrada em vigor em 01/07/2016, veio definir as 35 horas de trabalho como limite máximo semanal dos períodos normais de trabalho dos trabalhadores da função pública, salvaguardando no seu art. 4º que «Da redução do tempo de trabalho prevista na presente lei não pode resultar para os trabalhadores a redução do nível remuneratório ou qualquer alteração desfavorável das condições de trabalho.».
25. Por força da entrada em vigor da citada lei, o art. 105º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP) passou a estabelecer que
1. O período normal de trabalho é de:
a) Sete horas por dia, exceto no caso de horários flexíveis e no caso de regimes especiais de duração de trabalho;
b) 35 horas por semana, sem prejuízo da existência de regimes de duração semanal inferior previstos em diploma especial e no caso de regimes especiais de duração de trabalho.
2. O trabalho a tempo completo corresponde ao período normal de trabalho semanal e constitui o regime regra de trabalho dos trabalhadores integrados nas carreiras gerais, correspondendo-lhe as remunerações base mensais legalmente previstas.
3. A redução dos limites máximos dos períodos normais de trabalho pode ser estabelecida por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, não podendo daí resultar para os trabalhadores a redução do nível remuneratório ou qualquer alteração desfavorável das condições de trabalho.».
26. Acontece que o contrato de comissão de serviço que o A. mantinha com a R., celebrado já na vigência da Lei n.º 18/2016, de 01/07, é regulado pelo direito laboral privado, concretamente pelas normas do Código do Trabalho, não lhe sendo diretamente aplicável a citada lei, que se dirige especificamente aos trabalhadores da função pública, nem a LGTFP.
27. Não obstante, como decorre do n.º 3 do art. 105º da LGTFP, a redução do período normal de trabalho semanal para as 35 horas pode ser estabelecida por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.
28. Foram publicados no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE) n.º 23, de 22/06/2018, Acordos Coletivos de Trabalho (ACT) outorgados entre o R. CH... e outros, do lado dos empregadores; e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais - FNSTFPS, o Sindicato dos Trabalhadores da Administração Pública e de Entidades Com Fins Públicos - SINTAP, o Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado e Entidades com Fins Públicos - STE, a Associação Sindical do Pessoal Administrativo da Saúde - ASPAS e o Sindicato Independente dos Técnicos Auxiliares de Saúde - SITAS, por banda dos trabalhadores.
29. Os referidos ACT vieram tornar aplicáveis a trabalhadores com contrato individual de trabalho de direito privado, determinadas regras específicas dos trabalhadores titulares de contrato de trabalho em funções públicas, nomeadamente - e no que agora releva - respeitantes ao tempo de trabalho, estabelecendo a Cláusula 11.ª n.º 1 dos ACT que «1- O período normal de trabalho é o previsto na Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aplicável a trabalhadores com vínculo de emprego público, integrados em carreiras gerais.».
Sucede que, como resulta do disposto na Cláusula 1.ª n.º 2, que rege sobre o respetivo âmbito de aplicação, os ACT em questão obrigam apenas, por um lado, as entidades públicas empresariais prestadoras de cuidados de saúde e integradas no SNS que os subscrevem (como é o caso do aqui R. CH...); e por outro lado, os trabalhadores que desenvolvam funções correspondentes às estabelecidas para as carreiras de técnico superior, assistente técnico e assistente operacional, a elas vinculados por contrato de trabalho de direito privado, que sejam representados pelas associações sindicais outorgantes.
30. De acordo com o princípio da dupla filiação, consagrado no art. 496º, as convenções coletivas de trabalho (de que os ACT constituem uma modalidade) abrangem apenas os empregadores e os trabalhadores inscritos nas associações signatárias.
31. Pelo que, para que se possa concluir que uma relação laboral é regulada por uma determinada convenção coletiva de trabalho, torna-se necessário que as partes se encontrem inscritas nas associações representativas que a outorgaram. Ou então, que exista portaria de extensão que, nos termos permitidos pelo art. 514º, estenda a sua aplicabilidade aos empregadores do mesmo sector de atividade e a trabalhadores da
mesma profissão ou profissão análoga.
32. No caso, não se provou - nem tão pouco foi alegada - a filiação do A. em nenhuma das associações representativas de trabalhadores que outorgaram os ACT em apreço.
33. Consequentemente, não pode concluir-se pela aplicabilidade dos ACT à relação laboral que vinculou o A. e o R. CH..., nem, por essa via, que o limite máximo do período normal de trabalho semanal do A. fosse de 35 horas.
34. Finalmente “o A. argumenta que se sente discriminado em relação a outros trabalhadores que alega terem sido admitidos por concurso para cargos em exercício de comissão de serviço, que ficaram sujeitos ao horário de 35 horas semanais, sem redução remuneratória.
35. Porém, apenas se provou a esse respeito que o R. CH... celebrou um contrato de trabalho com um jurista, onde foi estabelecido um horário de trabalho de 35 horas.
36. Desconhecendo-se que tipo de vínculo foi em concreto acordado entre o referido trabalhador e o R. (nomeadamente se contrato de trabalho em funções públicas, ou contrato de trabalho de direito privado), não pode afirmar-se que a situação é equiparável à do A.. E mesmo admitindo que se trata de contrato de trabalho de direito privado, não se sabe se o trabalhador em questão é ou não filiado nalguma das associações representativas dos trabalhadores, nem por consequência, se os ACT lhe são ou não aplicáveis.
37.Pelo que não há elementos de facto que permitam afirmar que o A. foi negativamente discriminado em relação a outro que estava nas mesmas condições ou em situação equiparável.”
Por seu turno, o Autor/Apelante veio dizer:
“1º O Digno Magistrado do Ministério Público emitiu Parecer apenas quanto à questão do horário de trabalho de 35 horas.
2º E quanto a esse aspeto, o ora Recorrente acompanha o entendimento do Ministério Público na íntegra.
Efetivamente,
3º Em causa o princípio “a trabalho igual, salário igual”. Princípio com assento constitucional (Artº 59º/1-a) da CRP) e com desenvolvimento infra constitucional no Artº 270º do CT.
4º Dispõe-se aqui que na determinação do valor da retribuição deve ter-se em conta a quantidade, natureza e qualidade do trabalho, observando-se o princípio de que, para trabalho igual, salário igual.
5º Quando se fala em condições de igualdade salarial quanto à natureza compreende-se a dificuldade, penosidade e perigosidade do trabalho; quanto à qualidade, o grau de responsabilização, de exigência técnica, de conhecimento, capacidade, prática, experiência… e no que se refere á quantidade, o conceito abrange a duração e intensidade do trabalho prestado.
6º Os trabalhadores que laboravam para a Recorrida ao abrigo de contrato de trabalho em funções públicas cumpriam um horário de 35 horas, sendo a situação do Recorrente a exceção.
7º O que consubstancia uma violação do principio da igualdade e da proporcionalidade,
8º Maria do Rosário Palma Ramalho salienta que “a aplicação deste princípio passa pela conjugação de várias ideias-chave: a afinação dos critérios de avaliação de funções, que permitem qualificá-las como “trabalho igual” ou “trabalho de valor igual”; a afinação do conceito de remuneração a ter em conta para este efeito; a aplicação precisa dos conceitos de discriminação direta e indireta; e a definição rigorosa das justificações objetivas para o tratamento remuneratório diferenciado, uma vez que apenas estas são admissíveis” (Tratado de Direito do Trabalho, Parte II, 6ª Ed., Almedina, 518).
9º Os distintos regimes jurídicos aplicáveis à contratação, mas existindo trabalhadores em idênticas situações ao Recorrente, então a aplicação da distinção remuneratória em função do regime legal subjacente à contratação tem de ter-se como discriminatória e violadora da CRP.
10º No demais alegado pelo Recorrente, mantém-se na íntegra, devendo o recurso julgado integralmente procedente.”
Foram os autos a vistos.
O objeto do recurso, delimitado pelas conclusões das alegações (artigo 635º, nº4 e 639º, nº1 do Código de Processo Civil), consubstancia-se nas seguintes questões:
- saber se ocorreu erro de julgamento ao indeferir-se a junção de documentos requerida pelo Autor;
- impugnação da matéria de facto;
- saber se:
- É nula a deliberação do Conselho de Administração do R. CH... de 25 de Junho de 2020, de não renovar a comissão de serviço do A. e, em caso afirmativo, que consequências daí decorrem.
- Se o Autor devia ter auferido retribuição superior à que lhe foi paga, durante o período de tempo em que perdurou o vínculo que manteve com o R. CH....
- Se o Autor laborava ou não em regime de isenção de horário de trabalho e, na afirmativa, se lhe são devidos os € 12.012,84.
- Se o Autor prestou trabalho suplementar durante a vigência do contrato e, se prestou, qual a retribuição que lhe cabe receber por via disso.
2. Fundamentação:
- Fundamentação de facto:
Foi a seguinte a fundamentação de facto do Tribunal a quo (em realce a matéria de facto alterada):
“Provados estão os seguintes factos:
1. O R. CH... é uma pessoa de direito público com natureza empresarial, integrada no Serviço Nacional de Saúde.
2. Em 19 de Maio de 2015, o Serviço de Gestão de Recursos Humanos do R. CH... solicitou, por ofício, ao Conselho de Administração (CA), a abertura de procedimento concursal para recrutamento de um Auditor Interno.
3. Em 1 de Julho de 2015, foi homologado pelo CA do R. CH... o procedimento concursal para recrutamento de Auditor Interno e a proposta de composição do Júri, apresentada pelo então Presidente do CA, Dr. CC.
4. Em 31 de Agosto de 2016, foi proposta e aprovada a alteração da composição do júri desse concurso.
5. Foi publicado pelo R. CH... “Aviso do Procedimento Concursal para Recrutamento de Auditor Interno”, datado de 27 de Outubro de 2016, de que figura cópia a fls. 31 a 33 dos autos, dele constando, além do mais:
«1. Em cumprimento da deliberação do Conselho de Administração de 30 de agosto de 2016, faz-se público que se encontra aberto até às 16:00 horas do dia 11 de novembro de 2016, o procedimento concursal para recrutamento de Auditor Interno (m/f), tendo em vista o exercício de funções em regime de comissão de serviço, pelo período de 5 anos, eventualmente prorrogável por iguais períodos, até ao limite máximo de três renovações seguidas ou interpoladas.
O recrutamento constituído ao abrigo do presente procedimento extingue-se após a celebração do contrato individual de trabalho. (…)
2. Enquadramento legal
Artigo 14.º, n.º 4 do Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29 de dezembro e artigo 17.º do referido diploma, alterado e republicado pelo Decreto-lei n.º 244/2012, de 09 de novembro; Decreto-Lei n.º 30/2011, de 27 de janeiro; e Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.
3. Caracterização do posto de trabalho e perfil de competências
3.1. Caracterização do posto de trabalho:
Avaliar os processos de controlo interno e de gestão de riscos, nos domínios contabilístico, financeiro, operacional, informático e de recursos humanos, contribuindo para o seu aperfeiçoamento contínuo, na dependência hierárquico-funcional do Presidente do Conselho de Administração.
3.2. Perfil de competências:
a) Grau de Licenciatura/Mestrado ou Doutoramento;
b) Qualificação técnica, competências ou experiência em auditoria.
4. Duração semanal de trabalho
A duração semanal de trabalho é de 40 horas, distribuídas de segunda a sexta-feira.
5. Vencimento e local de trabalho:
O vencimento mensal é fixado nos termos previstos no n.º 10, do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 233/2005, 29 de dezembro, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 244/2012, de 09 de novembro. (…)
6. Requisitos de admissão
6.1. São requisitos gerais de admissão ao processo de recrutamento:
a) Possuir 18 anos completos de idade;
b) Deter as habilitações profissionais legalmente exigidas para o exercício das funções a que se candidata;
b) Possuir a robustez física e o perfil psíquico indispensáveis ao exercício da função e ter cumprido as leis da vacinação obrigatória;
c) Não estar inibido ou interdito para o exercício das funções a que se candidata;
d) Declaração Entidade Empregadora do tempo do exercício profissional e comprovativo dos descontos para a Segurança Social durante o mesmo período (Os candidatos que exerçam ou exerceram funções no CH... estão dispensados de apresentação destes documentos para o período invocado)
e) Ter cumprido os deveres militar ou de serviço cívico, quando obrigatório;
6.2. São requisitos específicos de admissão ao processo de recrutamento:
a) Ter o grau de Licenciatura, Mestrado ou Doutoramento, preferencialmente, nas áreas de ciências económico-financeiras, jurídicas, auditoria, gestão e administração pública;
b) Formação profissional especializada.
(…)
9. Métodos de selecção
- Avaliação Curricular
- Entrevista Profissional de Seleção
A avaliação final será obtida através da seguinte fórmula:
CF=60% AC+ 40% ENT
Fórmula: AC= Habilitações Literárias+ Formação Profissional
Em que:
CF- Classificação Final
AC- Avaliação Curricular (pontuda de 0 a 20 valores)
ENT- Entrevista (pontuada de 0 a 20 valores)
AVALIAÇÃO CURRICULAR
Pontuação AC= HL+FPE+FP+ 2EP
Em que:
AC- Avaliação curricular
HA- Habilitações Literárias
EPE- Formação Profissional Especializada
FP- Formação Profissional
EP- Experiência Profissional
O Item Habilitações Literárias é pontuado de acordo com a seguinte grelha:
Licenciatura Pós-Bolonha - 14
Licenciatura Pré-Bolonha ou Mestrado Integrado pós Bolonha - 16
Mestrado e Licenciatura Pré-Bolonha - 17
Doutoramento - 20
As licenciaturas/mestrados, nas áreas das ciências económico-financeiras, jurídicas, auditoria, gestão e administração pública, serão valorizadas com 2 pontos (com excepção do doutoramento)
O Item Formação Profissional Especializada será pontuado de acordo com a seguinte grelha:
Especialização ou pós-graduação com duração superior a l50 horas - 5
Pós-graduação ou especialização com duração superior a 300 horas - 7
Programa doutoral ou formação especializada em auditoria - 8
A Formação Profissional Especializada pretende valorizar a frequência de cursos de especialização, pós-graduação, mestrados e programas doutorais, que o candidato tenha frequentado e sejam adequadas à função.
O Item Formação Profissional será pontuado de acordo com as seguintes grelhas:
A - Gestão e Organização de empresas em geral e em serviços de saúde em particular:
Até 7 horas - 0,3
De 8 a 22 horas - 1
De 22 a 35 horas - 2
Superior a 35 horas - 2
B - Formação em auditoria interna e sistema de controlo interno:
Até 14 horas - 1
De 15 a 28 horas - 2
De 29 a 35 horas - 3
Superior a 35 horas - 5
C - Ferramentas de suporte à atividade de auditoria interna, como o direito e a informática:
Até 14 horas - 1
De 15 a 28 horas - 2
De 29 a 35 horas - 3
Superior a 35 horas - 5
(….)
Cada curso ou acção formativa será pontuada de acordo com a respectiva carga horária. A pontuação obtida será acrescida de 0,25 pontos, sempre que a respetiva temática se reporte à gestão e organização dos serviços de saúde.
A pontuação obtida em cada item será cumulativa, até ao limite de 20 pontos, sendo as somas obtidas nos itens, dividida por 3.
O Item Experiência Profissional será pontuado de acordo com a seguinte grelha:
Atividade Técnica em serviços de saúde - 0,25
Atividade Técnica superior na administração pública ou empresas em geral - 0,50
Atividade Técnica Superior em serviços de saúde - 0,75
Funções de: Direção intermédia em organismos da administração pública - 1,5
Funções de Direção Superior em organismos da administração pública - 2. (…)».
6. O Regulamento Interno do R. CH..., homologado por despacho do Conselho Diretivo da ARSC, IP, de 27/07/2013 e publicado na intranet do R. CH... em 02/10/2013, estabelece, no seu art. 22º, sob a epígrafe “Serviço de Auditoria Interna”: 1. O auditor interno é recrutado pelo CA de entre as individualidades que reúnam os seguintes requisitos:
a) Qualificação técnica, competência e experiência em auditoria;
b) Inscrição no organismo nacional que regule a actividade de auditoria interna.
2. O serviço de Auditoria Interna depende, em temos orgânicos, do Presidente do Conselho de Administração.
3. As competências, a direção do “serviço de Auditoria Interna”, a duração do mandato do Auditor Interno e a sua retribuição mensal (entre outros aspetos) constam do disposto no artigo 17.º dos Estatutos dos Hospitais E.P.E. (Anexo II ao Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29 de dezembro, na redacção atualizada pelo Decreto Lei n.º 244/2012, de 9 de novembro).».
7. O A. concorreu ao supra-referido concurso, tendo ficado classificado em primeiro lugar, conforme classificação datada de 16 de Fevereiro de 2017.
8. O resultado final do concurso não foi objeto de reclamação, oposição ou impugnação judicial por parte dos demais concorrentes.
9. O projeto de lista de classificação final do concurso foi remetida ao CA para homologação em 28 de Março de 2017, após publicação e audiência prévia.
10. Foi deliberada a “Conclusão do procedimento concursal para recrutamento de Auditor Interno”, tendo o Serviço de Recursos Humanos solicitado ao CA do R. CH..., em 4 de Abril de 2017, autorização para a “celebração do contrato de trabalho em comissão de serviço, pelo período de três anos” nos seguintes termos:
«Exm.º Senhor
Presidente do Conselho de Administração
Dr. CC
ASSUNTO: Conclusão do procedimento concursal para recrutamento de Auditor Interno
Serve a presente para solicitar a V. Ex.ª que se digne autorizar a celebração de contrato de trabalho em comissão de serviço, pelo período de três anos, eventualmente renovável por iguais períodos, até ao limite máximo de três renovações consecutivas ou interpoladas, do candidato classificado em primeiro lugar, abaixo identificado, nos termos do n.º 3, do artigo 19º dos Estatuto dos Hospitais, Centros Hospitalares e Institutos de Oncologia, EPE, anexos ao Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de fevereiro.
Mais solicitamos a indicação da data de início de funções, bem como a fixação da remuneração mensal ilíquida, a qual não poderá ser superior a 85% do vencimento mensal ilíquido estabelecido para o Vogal do Conselho de Administração, tendo assim como limite máximo o valor de 2.918,59€ (3.433,64 x 85%); de acordo com o disposto no n.º 10, da norma legal acima mencionada,
1º classificado AA».
11. No dia 27 de Abril de 2017, às 08:46 horas, a Técnica Superiora de Recursos Humanos do R. CH..., EE, remeteu email ao A., com o seguinte teor:
«Bom Dia, Exmo. Sr. Dr. AA
Serve o presente email para dar conhecimento da deliberação do Conselho de Administração de 05/04/2017 “Aprove-se o início de funções à 1 de Maio de 2017 e aprove-se a remuneração do Auditor Interno em 80% (2746,91€) do Vogal do CA.
Aguarda-se confirmação do início de funções (…)».
12. No mesmo dia 27 de Abril de 2017, pelas 12:16 horas, o A. enviou email para a referida Técnica Superiora de Recursos Humanos do R. CH..., EE, com o seguinte teor:
«(…) Assunto: Procedimento Concursal para Recrutamento de Auditor Interno
Bom dia Sra. Dra.
Informei telefonicamente o Sr. presidente de que vou entregar na ARS Centro IP, pedido de autorização para deixar cargo público, nos termos da lei.
Amanhã, depois de formalizar esse, remeterei por esta via com assinatura digital cópia desse pedido, acompanhado de requerimento ao CA dessa unidade de saúde, no sentido de aguardar-se a autorização em conformidade (…)».
13. No dia 21/06/2017, o R. CH... enviou ao A., por carta registada com aviso de receção, comunicação com o seguinte teor:
«ASSUNTO: Procedimento concursal para recrutamento de Auditor Interno - início de funções
Considerando a relevância que a atividade de auditoria interna assume na orgânica hospitalar, conforme o disposto no artigo 19.º dos Estatutos dos Hospitais anexo ao Decreto-lei n.º 18/2017, de 10 de Fevereiro, solicitamos a V. Ex.ª, que se digne confirmar-nos a sua disponibilidade para assumir o exercício de funções no próximo dia 01 de agosto de 2017.
Mais se informa que a Instituição se encontra obrigada ao cumprimento do prazo legal de 180 dias para conclusão do procedimento concursal, atento o disposto no artigo 128.º do Código de Procedimento Administrativo, pelo que após a data acima indicada, será contactado o candidato classificado em 2º lugar, tendo em vista a celebração de um contrato individual de trabalho, em regime de comissão de serviço.».
14. Quando concorreu ao cargo de Auditor Interno do R. CH..., o A. exercia funções de Presidente do CA do Hospital ..., pelo que teria que se desvincular previamente desse cargo, para poder ocupar o de Auditor Interno do R. CH....
15. O Ministério da Saúde não obteve, em tempo útil, substituto para exercer as funções de Presidente do CA do Hospital ..., tendo o Secretário de Estado da Saúde solicitado ao R. CH... o adiamento do início do exercício do cargo de Auditor Interno pelo prazo de um mês, pedindo ao A. que se mantivesse nesse período de tempo nas funções de Presidente do CA do Hospital ....
16. No dia 31/07/2017, foi remetido ao A., através do email da Diretora dos Recursos Humanos do R. CH..., DD, a seguinte comunicação: «Junto se envia para análise minuta do contrato», bem assim como, em anexo, a minuta do “contrato individual de trabalho sem termo” que consta de fls. 35 v.º a 37 dos autos, datado de 01/08/2017, para produzir efeitos nesse mesmo dia.
17. Em resposta, o A. enviou para o email da Diretora dos Recursos Humanos do R. CH..., DD, em 31/07/2017, a seguinte comunicação:
«Muito obrigada
Amanhã assinarei em conformidade.
Com os meus cumprimentos».
18. O envio ao A. da minuta do “contrato individual de trabalho sem termo” deveu-se a erro de quem a enviou, porque não correspondia ao tipo contratual previsto no aviso de abertura do concurso, que era de “contrato de trabalho em comissão de serviço”. Alterado para: - O envio ao A. da minuta do “contrato individual de trabalho sem termo” não correspondia ao tipo contratual previsto no aviso de abertura do concurso, que era de “contrato de trabalho em comissão de serviço”.
19. No dia 5 de Setembro de 2017, o A. compareceu no CH..., em ..., com a minuta do contrato que lhe tinha sido enviada por email, assinada por si, solicitando que a data fosse alterada (01/08/2017), porque já tinha, entretanto, decorrido.
20. Tal contrato não foi assinado por ninguém em representação do R. CH..., tendo nesse mesmo dia sido elaborado pelos serviços do R. CH... o contrato denominado de “Comissão de Serviço” que figura, em cópia, a fls. 37 v.º a 39 dos autos, que ainda no mesmo dia foi assinado pelo A. e pelo Presidente do CA do R..
21. Do referido contrato, denominado de “Comissão de Serviço”, consta, além do mais, o seguinte clausulado:
«1ª Cláusula (Objecto)
A presente Comissão de Serviço tem por objeto o exercício de funções de Auditor Interno, nos termos do artigo 19.º, dos Estatutos dos Hospitais, Centros Hospitalares e Institutos Portugueses de Oncologia, E.P.P., anexos ao Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de fevereiro. (…)
3ª Cláusula (Retribuição)
1. O Primeiro Outorgante pagará mensalmente ao Segundo Outorgante, a retribuição (ilíquida) de 2.746,91€ (dois mil, setecentos e quarenta e seis euros e noventa e um cêntimos) que, deduzidos os descontos legais, será depositada, por transferência bancária, na conta da Segundo Outorgante.
2. À retribuição referida no número anterior acresce um subsídio de refeição diário, nos mesmos termos que se encontrem em vigor para os trabalhadores titulares de contratos de trabalho em funções públicas.
3. À retribuição referida no número 1 acrescem ainda os subsídios de férias e de Natal calculados nos termos do Código de Trabalho.
4ª Cláusula (Horário de Trabalho)
1. O Segundo Outorgante compromete-se a prestar 40 (quarenta) horas semanais de trabalho ao Primeiro Outorgante.
2. O horário de trabalho a cumprir pelo Segundo Outorgante, será elaborado e afixado em local próprio pelo Primeiro Outorgante, dentro dos termos e limites legais, de acordo com a organização e o esquema de funcionamento do serviço em que a Segundo Outorgante irá exercer as suas funções. (…)
7.ª Cláusula (Produção de Efeitos e Vigência)
A presente Comissão de Serviços produz efeitos no dia 1 de setembro de 2017, por um período de três anos, renovável por iguais períodos, até ao limite máximo de três renovações consecutivas ou interpoladas.
8.ª Cláusula (Alterações de Cláusulas Contratuais)
As alterações à presente Comissão de Serviço serão objeto de acordo mútuo que deverá revestir sempre a forma escrita.
9.ª Cláusula (Denúncia, Revogação e Rescisão Contratual)
1. Qualquer das partes pode pôr termo à comissão de serviço, mediante aviso prévio por escrito, com a antecedência mínima de 30 ou 60 dias, consoante aquela tenha durado, respetivamente, até dois anos ou período superior.
2. A falta de aviso prévio não obsta à cessação da comissão de serviço, constituindo a parte faltosa na obrigação de indemnizar a contraparte nos termos do artigo 401.º do Código do Trabalho. (…)
Depois de lerem esta Comissão de Serviço, os outorgantes expressamente declaram que o mesmo foi livremente negociado e por eles aceite de forma consciente e voluntária, correspondente à sua vontade, e que, por isso, o vão assinar.
Feito em ..., no dia 05 de setembro de 2017, em duplicado, destinando-se um exemplar ao primeiro outorgante e outro ao segundo outorgante.».
22. O A. não se insurgiu contra o facto de ter sido reduzido dos cinco anos previstos no anúncio, para os três anos que figuraram no contrato, o prazo de duração da comissão de serviço.
23. Foi apresentada ao então Sr. Ministro da Saúde uma exposição anónima relativa ao procedimento concursal no âmbito do qual o A. foi admitido como Auditor Interno do R. CH..., em conjunto com outras queixas relativamente a médicos e procedimentos internos do referido R..
24. Essa exposição anónima foi encaminhada pelo Sr. Ministro da Saúde para a ARSC, que remeteu ao então Presidente do CA do R. CH..., Dr. CC, o ofício n.º ...10, datado de 18/03/2018, com o seguinte teor - no que ao aqui A. respeita:
«Assunto: Exposição anónima - pedido de esclarecimentos
Tendo sido remetido pelo Senhor Ministro da Saúde uma exposição anónima, referindo nomeadamente que poderá haver irregularidades no concurso para auditor interno em que foi selecionado o Dr. AA (…) solicita-se a V. Ex.ª esclarecimentos em conformidade.
Mais se solicita o envio de todo o processo concursal para recrutamento do auditor.».
25. A ARSC remeteu à então Presidente do CA do R. CH..., Dr.ª JJ, o ofício n.º ...58, de 13/06/2018, de que figura cópia a fls. 172 a 177 dos autos, onde consta, além do mais:
«Assunto: Exposição anónima - nomeação de auditor
Relativamente ao assunto mencionado em epigrafe, e na sequência de uma denúncia anónima dirigida ao Senhor Chefe de Gabinete do Senhor Ministro da Saúde e oportunamente remetida a esta ARC Centro, foram solicitados esclarecimentos ao então Presidente do Conselho de Administração dessa entidade sobre a nomeação (…) do Auditor Interno, Dr. AA. (…)
Assim, analisada toda a documentação, informa-se V.Ex.ª que o Conselho Directivo desta ARCS em 8 de Junho pp, concordou com a informação n.º ...00, do Gabinete Jurídico e do Cidadão que se transcreve e que se deixa à consideração de V.Ex.ª (…)
Este concurso teve como suporte legal o D.L. 233/2005, de 29/12 n.º 1 e 2 do art.º 17 com a redação dada pelo D.L. 244/2012, de 9/12, dos estatutos anexos ao referido diploma.
Vejamos o que referia este diploma no art.º 17 com a epígrafe “Serviço de auditoria interna”:
1. Ao serviço de auditoria interna compete a avaliação dos processos de controlo interno e de gestão de riscos, nos domínios contabilístico, financeiro, operacional, informático e de recursos humanos, contribuindo para o seu aperfeiçoamento continuo.
2 - Ao serviço de auditoria interna compete em especial:
a) Fornecer ao conselho de administração análises e recomendações sobre as atividades revistas para melhoria do funcionamento dos serviços;
b) Receber as comunicações de irregularidades sobre a organização e funcionamento do hospital E. P. E. apresentadas pelos demais órgãos estatutários, trabalhadores, colaboradores, utentes e cidadãos em geral;
c) Elaborar o plano anual de auditoria interna;
d) Elaborar anualmente um relatório sobre a atividade desenvolvida, em que se refiram os controlos efetuados, as anomalias detetadas e as medidas corretivas a adotar.
3 - A direção do serviço de auditoria interna compete a um auditor interno, que exerce as respetivas funções pelo período de cinco anos, renovável por iguais períodos, até ao limite máximo de três renovações consecutivas ou interpoladas, e que é apoiado tecnicamente nas suas funções por um máximo de três técnicos auditores.
4 - O auditor interno é recrutado pelo conselho de administração, de entre individualidades que reúnam os seguintes requisitos:
a) Qualificação técnica, competências e experiência em auditoria;
b) Inscrição no organismo nacional que regule a atividade de auditoria interna.
5. Os técnicos que integrem o serviço de auditoria interna devem possuir curso superior adequado ao exercício das suas funções.
6 - Não pode ser recrutado como auditor interno ou técnico do serviço de auditoria interna quem tenha exercido funções de administração no próprio hospital E.P.E., nos últimos três anos, ou em relação ao qual se verifiquem outras incompatibilidades e impedimentos previstos na lei, sendo aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 414.º-A do Código das Sociedades Comerciais.
5 - Os técnicos que integrem o serviço de auditoria interna devem possuir curso superior adequado ao exercício das suas funções (…)
Com estes elementos, iremos verificar se o candidato aprovado no concurso, AA, tem as competências adequadas ao cargo.
Análise
Sem prescindir da liberdade que assiste ao júri para elaborar os critérios de admissão para as funções de Auditor, não podemos deixar de salientar o seguinte:
Resulta da análise do curriculum do Dr. AA que é licenciado em Direito, Pós-Graduado em Direito da Saúde, Mestre em Saúde Pública com especialização em Políticas e Administração de Saúde, Doutorando em Políticas Públicas.
Refere que tem uma formação básica em auditoria clínica e é Especializado em Estudos Avançados de Políticas Públicas.
Em outras competências refere - Curso de Auditoria Interna para auditores no setor da saúde (IPAI, Instituto Português de Auditora Básica, e que é associado).
Curiosamente, o candidato remete certidão do curso de Formação Avançada do Programa Doutoral em Políticas Públicas, Certidão do Grau de Mestre, onde refere que “Mestrado em Saúde Pública - especialização em politica e administração de saúde” fotocópia (ilegível) da licenciatura, certificado do PADIS, MAS nenhum documento que ateste que efetuou as auditoras que refere no curriculum (nota 1 Um dos candidatos foi excluído porque não apresentou o certificado de habilitação, pese embora tenha formação em auditoria), nem um documento que ateste a Especialização em Estudos Avançados de Politicas Públicas.
No entanto, e pela análise do curriculum, o júri validou e contabilizou estas sem qualquer documento que as atestasse, aliás, terá considerado que o mesmo efetuou 14h de auditoria ... !.
Refira-se que os outros candidatos remetem a documentação que invocam no concurso.
Da ata n.º 4
No item Formação Profissional Especializada estabelece uma valorização na área da Auditoria (adequadas à função). Refere que:
“A Formação Profissional Especializada pretende valorizar a frequência de cursos de especialização, pós-graduação, mestrados ou programas doutorais, que o candidato tenha frequentado e sejam adequadas à função." (sublinhado nosso)
Ora, o que se verifica é que o candidato AA, neste item, tem 10 pontos, por ter “2 especializações ou pós graduação em direito da saúde” ... e que foram consideradas adequadas à função!
Ou seja, o júri valorizou a formação especializada em outras áreas, mesmo que não tenham diretamente a ver com a área de auditoria, pois o que o candidato apresentou foi uma especialização em Estudos Avançados de Politicas Públicas sendo que esta especialização integra o seu mestrado, ou seja, o seu mestrado versou sobre estas matérias.
Outra situação valorizada pelo júri foi ser “Especializado em Políticas e Administração de Saúde” e uma pós-graduação em direito da saúde.
Considera-se que as áreas a valorizar deviam ser relacionadas com a auditoria, pois o que se pretendia era escolher o melhor candidato para o desempenho das funções e, por conseguinte, defender o interesse público.
Por outro lado, não tendo o candidato apresentado qualquer certificado junto ao Curriculum, exceto o certificado de Mestrado (e licenciatura), não se percebe como o júri valorou 2 especializações e uma pós-graduação ...
Pelo que os candidatos que possuíssem apenas formação da área da auditoria, tiveram menos pontuação. Veja-se o candidato KK.
Nesta ata, ao analisarmos, ainda, a valoração do júri ao candidato AA verificamos que tem uma pontuação de 3,63 na Formação Profissional porque foi valorizado na área de gestão e organização de empresas em geral e em serviços de saúde, em particular (9,35), e pela formação em auditoria interna e sistema de controlo interno 1,25.
Contudo, não se retira da ata o que foi concretamente valorado. Foram as especializações? Quais? Não há documentação .... Não se sabe ... até porque os parâmetros a valorar seriam:
“A. Gestão e organização de empresas em geral e em serviços de saúde, em particular”;
“B- Formação em auditoria interna e sistemas de controlo interno”;
"C. Ferramentas de suporte à atívidade de auditoria interna, como o direito e a informática"
Ora, como já foi referido, não consta do curriculum do Candidato AA, qualquer certificado de auditoria (com ou sem indicação da carga horária) ... como concluíram que valeria 1,25 pontos?
No que respeita à Experiência profissional, o candidato AA tem 13 pontos resultante de atividade técnica superior em empresas em geral (5 pontos) e 4 anos de direção superior em organismo da administração pública (8 pontos).
Já o segundo candidato, KK, tem 11,25 resultante da experiência profissional de 4 anos de atividade técnica em serviços de saúde, 3 anos de atividade técnica em serviços de saúde mais 5 anos de funções de direção intermédia, em organismos da administração pública, majorada em 0,25 pontos por cada 2 anos por ter desempenhado a atividade na área de auditoria.
Resulta claro, que pese embora o aviso de abertura refira que “O auditor interno é recrutado pelo conselho de administração, de entre individualidades que reúnam os seguintes requisitos:
“a) Qualificação, técnica, competências e experiência em auditoria;” b) …
O que foi valorizado pelo júri foram as funções de direção superior. Pois, caso contrário, quem exercia funções de auditoria teria de ser mais valorizado, o que não aconteceu ...
Veja-se que no atual quadro legislativo os quadros superiores, nomeadamente os elementos dos Conselho de Administração/Diretivo, não fazem ou coordenam sequer auditorias.
Pelo que não se entende, uma vez que o júri também não fundamenta esta valorização para estas funções, aquela experiência em atividade técnica superior em geral.
Entrevista Ata n.º 5
Com data de 24 de janeiro de 2017
Refere o júri que pretende numa relação interpessoal e de forma objetiva e sistemática, determinar e avaliar as aptidões profissionais e pessoais dos candidatos (sublinhado nosso).
Assim, depois de refletirem, consideraram de uma forma unânime que se refletira:
"(1)Conhecimentos Técnicos
(domínio de conceitos e auditoria interna e sua aplicação prática; prática e experiência profissional; outros conhecimentos relevantes no contexto hospitalar)
(2) Perfil/caraterísticas do candidato
(liderança; espírito de análise e sentido critico; rigor; orientação estratégica e orientação para resultados; metódico, postura de Independência).
(3) Atitude Comportamental
(Relacionamento interpessoal e gestão de conflitos; gosto pelo trabalho em equipa).
(4) Capacidade de comunicação
(discernimento intelectual e assertividade)
Avaliação: Resulta do somatório dos pontos atribuídos aos itens da avaliação 1, 2, 3, 4.
Ora, acontece que, nesta ata onde estão refletidos os pontos da entrevista, refere que nesse mesmo dia foram efetuadas 4 entrevistas!!! Ou seja, no mesmo dia foi feita ata com os critérios e a seguir fizeram-se as entrevistas. É ilegal?
Julgamos que sim. Num concurso ao abrigo da Portaria n.º 83-A/2009, de 22 de janeiro, as questões/temas a abordar na entrevista, bem como a pontuação a dar, já têm de estar definidos logo na 1.ª ata, sob pena de ao fazerem-no posteriormente, a conhecer os curriculum e os candidatados, o júri já não estar completamente independente.! Viola o principio da legalidade e imparcialidade.
As restantes ocorrem no dia 26 de janeiro e constam da Ata n.º 6.
Resulta da grelha final, que esta na ata n.º 6, que o candidato AA tem 18 pontos, sendo que tem 5 pontos nos conhecimentos técnicos.
Não se pode deixar de estranhar esta pontuação, dado que o ponto 1 refere “(1)Conhecimentos Técnicos (domínio de conceitos e auditoria interna e sua aplicação prática; prática e experiência profissional; outros conhecimentos relevantes no contexto hospitalar)” e do Curriculum Vitae não está demonstrada quaisquer experiências nesta área.
Como é que o candidato pode ter demonstrado experiência profissional em auditoria se nunca fez nenhuma? Isto é o que se retira pelo seu curriculum.
Ter a mesma pontuação de quem já é auditor é um pouco estranho. Acresce que estando em funções de direção superior, pelo qual foi valorizado, não efetua auditorias... no tempo em que esteve na privada, não tinha competências para as fazer, dado que só tirou o curso de auditoria em 2014.
Cremos, e ao contrário do que alega o júri, não houve critério de equidade.
Assim, a pontuação da Avaliação Curricular e a Entrevista Profissional deram a pontuação suficiente para o candidato AA, que nunca exerceu funções de auditor, ter ficado em 1.º lugar, à frente de um candidato já auditor e de outros candidatos que demonstraram ter competências na área. (nota 3 Sem prejuízo do que o júri considerou, não pode deixar de estranhar que o candidato AA tenha dirigido um e-mail em de 27 de janeiro de 2017, ao júri complementando a sua entrevista ...)
Em face do exposto, e tendo presente o art.º 17 dos Estatutos anexos ao D.L. n.º 233/05, de 2005, entretanto revogado pelo D.L. n.º 17/2018, as orientações da ACSS, nomeadamente vertidas no Manual de Auditoria, ao interesse público que está aqui subjacente, não se acompanha a decisão do júri ao nomear este candidato como auditor.”
Remete-se o processo de concurso.
Com os melhores cumprimentos
O Vogal do Conselho Diretivo (…)».
26. Quando recebeu o ofício da ARSC, o CA do R. CH... solicitou um parecer jurídico interno, que concluiu que quando esse ofício foi recebido, estava já precludida, pelo decurso do prazo, a possibilidade de anulação administrativa, por parte do R. CH..., da lista de ordenação final dos candidatos.
27. O CA do R. CH... decidiu não renovar o contrato de comissão de serviço firmado com o A., através da deliberação n.º 22/2020, de 25 de Junho de 2020, com o seguinte teor:
«Em cumprimento do disposto no n.º 9, do artigo 19.º, dos Estatutos dos Hospitais, Centros Hospitalares e IPO, EPE, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de fevereiro, o Conselho de Administração delibera não proceder à renovação da comissão de serviço do Sr. Dr. AA, Auditor Interno, atentos os seguintes fundamentos:
1. O procedimento concursal para recrutamento de um auditor interno, autorizado por deliberação do Conselho de Administração de 01/07/2015, do qual resultou a celebração de um contrato individual de trabalho, em regime de comissão de serviço, com o Sr. Dr. AA, foi alvo de uma exposição anónima ao Ministério da Saúde, conforme o ofício da ARSCentro, IP, n.º ...10, de 19/03/2018, tendo sido remetida a esta entidade toda a documentação relativa ao procedimento;
2. Do parecer emitido pela ARSCentro, IP, conforme ofício n.º ...58, de 13/06/2018, conclui-se que o procedimento concursal enferma de diversas irregularidades;
3. Porém, considerando que o referido parecer não se pronunciou quanto à nulidade ou anulabilidade do processo, e não tendo ocorrido a interposição de qualquer ação judicial, o atual Conselho de Administração optou por manter a decisão tomada pelo anterior órgão de gestão, após solicitação de parecer jurídico que concluiu “se encontrar precludida, pelo decurso do prazo, a possibilidade de anulação administrativa, por parte do CH..., da lista de ordenação final dos candidatos”;
4. Contudo, sendo agora chamado a pronunciar-se quanto à eventual renovação do contrato em regime de comissão de serviço, entende-se que em nome dos princípios da transparência, imparcialidade e da boa-fé, não se encontram reunidas as condições para a sua renovação, pois que tal decisão constituiria uma aprovação tácita na manutenção de um processo de recrutamento sobre o qual recaíram irregularidades, conforme acima mencionado.»
28. Após a notificação da decisão de não renovação da comissão de serviço, o A. veio a tomar conhecimento formal de que teria havido uma denúncia anónima relativa ao procedimento concursal no âmbito do qual foi admitido, apresentada ao Ministro da Saúde, em conjunto com outras queixas relativamente a médicos e procedimentos internos ao CH....
29. O A. não foi notificado pela ARSC do teor do ofício a que se reporta o n.º 25 dos factos provados, não tendo tido, consequentemente, oportunidade de sobre ele exercer o contraditório, antes da deliberação do R. CH... de não renovar a sua comissão de serviço.
30. Em 09/07/2020, o R. CH... comunicou à ARSC a decisão de não renovar o contrato de auditor interno com o A.
31. Em 23/09/2020, o R. CH... enviou a mesma comunicação à Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), juntando cópia do ofício enviado à ARSC em 09/07/2020.
32. Findo o contrato de comissão de serviço, o R. CH... processou e pagou ao A. indemnização pela cessação da comissão de serviço, incluída no recibo de vencimento de Setembro de 2020, no valor de € 6.872,98, montante que o A. fez seu.
33. O R. CH... abriu novo procedimento, no Aviso n.º 14590/2020 (DR 187/2020, Série II), passando a exigir “experiência comprovada em Auditoria”, que mantém a idêntica deliberação quanto a valores de remuneração.
34. O A. foi Presidente do CA do Hospital ... durante 4 anos, desde 2013 até 2017 e, antes disso, foi Presidente do CA do Hospital 2..., entre 2003 e 2005.
35. Na época em que o A. foi Presidente do CA do Hospital ..., não existia Auditor Interno no referido Hospital.
36. O A. é titular de Curso de Auditoria Interna para auditores do sector da Saúde, ministrado pelo Instituto Português da Auditoria Básica, do qual é associado, e direcionado para a Auditoria Hospitalar, obtido mais de um ano antes do aviso do concurso.
37. O A. frequentou uma formação sobre “Normas Profissionais de Auditoria Interna”, no dia 19 de Março de 2018, das 09:00h às 17:30h, e uma formação sobre “Data Privacy Management - O Sistema de Resposta ao RGPD”, nos dias 7 e 8 de Março de 2018, das 09:00h às 17:30h, ministradas, em ambos os casos, pelo IPAI - Instituto Português de Auditoria Interna.
38. Tanto o A. como a atual Presidente do Conselho de Administração do CH..., Dr.ª JJ, são licenciados em direito.
39. Quando se candidatou ao concurso para Auditor Interno do R. CH..., o A. sabia que ter experiência em auditoria constituía um requisito legal para a admissão ao referido cargo e sabia que o contrato a celebrar por quem fosse admitido era um contrato individual de trabalho em comissão de serviço, e não um contrato de trabalho por tempo indeterminado. Alterado para: 39. Quando se candidatou ao concurso para Auditor Interno do R. CH..., o A. sabia que ter experiência em auditoria constituía um requisito legal para a admissão ao referido cargo e sabia que o contrato a celebrar por quem fosse admitido era um contrato individual de trabalho em comissão de serviço.
40. Antes de se candidatar ao referido concurso, o A. nunca tinha exercido as funções de auditor.
41. Pessoas que o conhecem e que com ele trabalharam, consideram que o A. foi um bom advogado e um bom Presidente do CA do Hospital ....
42. A não renovação da comissão de serviço gerou grande ansiedade, tristeza, perturbação e angustia ao A..
43. Quando assumiu a comissão de serviço como Auditor Interno no R. CH..., o A. mudou-se de ... para ..., juntamente com o seu agregado familiar, composto pela sua mulher, dois filhos universitários e os sogros, que sofrem de problemas de saúde.
44. O A. requereu o subsídio de desemprego, que lhe veio a ser concedido.
45. As remunerações dos membros do Conselho de Administração do R. CH... são determinadas no despacho de nomeação.
46. À data da celebração da contrato de comissão de serviço, um vogal do R. CH... tinha a remuneração de € 3.433,64, 14 vezes por ano, mais despesas de representação no valor de € 1.373,46, 12 vezes por ano.
47. De acordo com a deliberação do R. de 05-04-2017, a remuneração do A. foi fixada “em 80% da de vogal de CA”.
48. O A. auferia a retribuição ilíquida de € 2.746,91, acrescida do subsídio de refeição diário previsto para os trabalhadores titulares de contratos de trabalho em funções públicas.
49. Enquanto durou o contrato de comissão de serviço com o R. CH..., o A. não reclamou da retribuição que lhe era processada e paga.
50. Por email de 28/08/2018, o A. questionou a Administração Central do Sistema de Saúde, I.P. (ACSS), sobre se o regime das 35 horas de trabalho semanais que se passou a aplicar no Sistema Nacional de Saúde, lhe era ou não aplicável.
51. Em resposta, a ACSS enviou ao A., por email de 26/10/2018, a comunicação de que consta cópia a fls. 109 e v.º dos autos, transmitindo-lhe, entre o mais, que:
«(…) Assim, as 35 horas semanal estabelecidas como período normal de trabalho para os trabalhadores em funções públicas e, aplicáveis aos trabalhadores com CIT integrados nas careiras abrangidas por aquelas ACT por força das cláusulas 11.ªs, não são aplicáveis ao cargo de direção do Serviço de Auditoria Interna, aplicando-se, sim, a regra geral das 40 horas semanais em vigor para os contratos de direito privado.».
52. Nesse mesmo dia 26/10/2018, depois de ter recebido a referida comunicação, o A. encaminhou-a via email para a Presidente do CA do R. CH..., com a seguinte comunicação:
«(…) Tendo recebido a nota em anexo da ACSS, relativa a entendimento jurídico sobre horário de trabalho, esclareço o seguinte:
1. Tendo em conta a relação institucional entre departamentos de auditoria, telefonicamente coloquei a questão de saber qual o entendimento do da ACSS sobre tal assunto.
2. O que não olvida a que outro seja efetivamente o meu entendimento (mas isso não está sequer em causa).
3. Perante o telefonema, o SAI da ACSS solicitou-me se eu me importaria de passar a escrito as ideias, no sentido de clarificar posição, por onde todos os hospitais se regulassem.
4. Nesse sentido, assim fiz.
5. Considerando que a ACSS se pronunciou agora, o referido entendimento prevalece sobre o meu e nesse sentido, como aliás já vinha sendo prática, se cumpre religiosamente. (…)».
53. Para efeitos de processamento dos respetivos recibos de vencimento, o A. é enquadrado na categoria e no grupo profissional de “Técnico Superior”.
54. O R. CH... celebrou um contrato de trabalho com um jurista, onde foi estabelecido um horário de trabalho de 35 horas.
55. O A., em 17 de Novembro de 2017, requereu ao R. CH... a flexibilidade de horário de trabalho, «(…) para entrar e sair ou meia hora mais cedo ou meia hora mais tarde», por «(…) dificuldades de transporte ficando dependente de acessibilidade, desde casa ou trabalho, aos horários praticados nos transportes públicos». Alterado para: - O A., em 17 de Novembro de 2017, requereu ao R. CH... «(…) para entrar e sair ou meia hora mais cedo ou meia hora mais tarde», por «(…) dificuldades de transporte ficando dependente de acessibilidade, desde casa ou trabalho, aos horários praticados nos transportes públicos».
56. Tendo-lhe sido respondido pelos serviços do R. CH... que «o estatuto do auditor interno confere-lhe o uso de horário flexível, pelo que parece não carecer de autorização».
*
Não se provaram quaisquer outros factos, de entre os alegados na petição inicial e contestação, nomeadamente:
- Que o Presidente do CA do R. CH... não assinou o contrato de trabalho cuja minuta foi remetida ao A. por email de 31/07/2017, a que se alude no n.º 16 dos factos provados, porque a data de início tinha de ser retificada.
- Que a referida minuta foi aprovada pelo CA do R. CH....
- Que apesar do mencionado contrato de trabalho não ter sido assinado pelo R. CH..., quando o A. assinou o contrato de comissão de serviço, ficou convencido que viria a integrar um vínculo por tempo indeterminado, ingressando num cargo de dirigente intermédio.
- Que a Presidente do CA do R. CH... disse ao A. que contava com ele, depois do A. se ter disponibilizado para cargo superior ou intermédio ou manter-se em função de Auditor.
- Que por ter sido afirmado pela Presidente do Presidente do CA do R. CH... que contavam com o A. para exercer as suas funções de Auditor, o A. não concorreu a outros concursos externos, como o do Hospital 3....
- Que o R. CH... desde o início que criou a convicção no A. de que este iria ingressar no R. num cargo de dirigente intermédio, mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado.
- Que existiu um acordo entre o R. CH... e o A., no sentido deste permanecer como trabalhador subordinado do R. CH..., uma vez findo o contrato de comissão de serviço.
- Que o A. nunca foi notificado do parecer da ARSC, a que se reporta o n.º 25 dos factos provados.
- Que o parecer jurídico pedido pelo novo Conselho de Administração do R. CH... em consequência do oficio da ARSC, concluiu que o A. estava ainda no período experimental, pelo que o R. podia, se o desejasse, fazer cessar a comissão de serviço
- Que a Presidente do CA do R. CH... indicou verbalmente ao A. que o contrato firmado entre ele e o R. CH... ainda se encontrava no período experimental.
- Que o A. desempenhou as funções de Auditor Interno do R. CH... de forma “exemplar e produtiva”.
- Que a comissão de serviço do A. não foi renovada por razões políticas, tendo-lhe a Diretora do SGRH dito para recorrer ao LL, dirigente partidário e presidente da Camara Municipal ....
- Que na época em que foi aberto o concurso, a profissão de Auditor tinha ainda pouca representação em Portugal, sendo inexistente nos SPA, tendo sido de criação recente nos EPE e ULS.
- Que na época em que decorreu o concurso para Auditor Interno lançado pelo R. CH..., eram quase inexistentes as pessoas com experiência efetiva em Auditoria no SNS.
- Que o A., aquando do concurso lançado pelo R. CH... para Auditor Interno, tinha mais experiência e conhecimentos do funcionamento interno de um Hospital, do que qualquer outro dos candidatos.
- Que na época em que o A. foi Presidente do CA do Hospital ..., o A. muitas vezes desempenhava funções próprias de auditoria.
- Que o A. fez parte de conselhos fiscais.
- Que no âmbito do procedimento concursal, o A juntou todos os documentos comprovativos das qualificações técnicas, académicas e profissionais que indicou no seu currículo.
- Que o A. teve várias intervenções processuais na Ordem dos Médicos, em defesa de médicos e intervenções e mandatos no âmbito da profissão de advogado, por actos médicos.
- Que a equipa de gestão do A. no Hospital ... assegurou a estabilidade em contexto de acentuada redução orçamental, de 40%, tendo resultado financeiro positivo nos anos de 2014 e 2016, mantendo a quase totalidade das prestações de saúde, merecendo da tutela (Ministro) uma carta de motivação e agradecimento, por ocasião de aniversário do SNS.
- Que o A., nos três anos que exerceu as funções de Auditor Interno no R. CH..., obteve “resultados de excelência”, tendo prestado um “serviço exemplar”.
- Que o A. informou de imediato e por escrito o CA do R. CH... que um utente oncológico que foi à consulta e não tinha resultados de exames, tendo em consequência o R. CH... ordenado uma auditoria aos tempos de exames de anatomia patológica;
- Que a filha de um utente que veio a falecer, questionou o A. acerca do atraso numa consulta, tendo-se o A. dirigido aos serviços, que corrigiram de imediato a situação.
- Que um médico queixou-se de discriminação, tendo o A. com base em ordem formal do CA do R. CH..., aberto uma auditoria especifica e apresentado resultados, que provocaram algum desgosto nos membros do CA.
- Que o A. detetou um erro de processamento de incentivos a profissionais de mais de 50.000,00€, que foram repostos, e auditou matérias relativas à implementação das políticas de proteção de dados do Regulamento Europeu, cuja violação podia fazer incorrer o R. CH... em milhões de euros de coimas.
- Que o A. levantou questões de irregularidades e discrepâncias nos vencimentos dos dirigentes intermédios, assim como nos pagamentos a médicos da VMER, e que a não renovação da comissão esteve relacionada com isso.
- Que o parecer emitido pelo Departamento Jurídico do R. CH... “não conferiu qualquer validade e eficácia à conclusão do ofício da ARSC”.
- Que a decisão de não renovação da comissão de serviço foi motivada por razões políticas e pelos incómodos que o bom desempenho do A. começava a levantar.
- Que o A. laborava em regime de isenção de horário.
- Que vários concursos abertos para cargos em exercício de comissão de serviço, em vários hospitais, foram sujeitos ao horário de 35 horas, sem qualquer redução remuneratória.
*
A matéria de facto dada como assente sob os números 3, 4, 5, 7, 14, 15, 23, 28, 33, 36, 45, 46, 47 e 48 resultou da sua expressa aceitação ou não impugnação por parte do R. CH..., tendo-se considerado ainda, quanto aos n.ºs 3 e 4, a certidão constante de fls. 30, emitida pelo R. CH...; no que se refere ao n.º 5, a cópia do aviso em apreço, a fls. 31 a 33 dos autos; e em relação aos n.ºs 14 e 15, o depoimento da testemunha CC (Gestor Público, na área hospitalar, que exerceu as funções de Presidente do CA do R. CH... de Março de 2015 a Maio de 2018 e, antes disso, noutros hospitais, em 2011 e 2012), que disse que do Gabinete do então Secretário de Estado da Saúde foi solicitado o adiamento do início do exercício do cargo de Auditor Interno por parte do A., face à necessidade de diligenciar pela sua substituição no cargo que ocupava, de Presidente do CA do Hospital ....
No que concerne à demais matéria de facto dada como provada, a convicção do tribunal baseou-se:
N.º 2: Na comunicação dirigida pelo Serviço de Gestão de Recursos Humanos do R. CH... ao respectivo CA, datada de 19/05/2015, constante de fls. 98 dos autos.
N.º 6: Na cópia que do Regulamento em questão consta a fls. 121 a 135 dos autos.
N.º 8: No depoimento da testemunha DD (Administradora Hospitalar de carreira, sendo desde 2015 Diretora do Departamento de Recursos Humanos do R. CH..., tendo antes disso trabalhado no Departamento de Formação - Apoio Geral do Hospital 4...), que disse não ter havido reclamação quanto à decisão final. Embora se extraia dos emails e documentos juntos a fls. 148 v.º a 150 dos autos, que um dos candidatos (MM) se insurgiu contra o facto de ter sido excluído do concurso, por falta de entrega de documentação.
N.º 9: Na “Informação” dirigida pelos Recursos Humanos do R. CH... ao respectivo CA, a fls. 102 e v.º dos autos.
N.º 10: Na cópia da comunicação em apreço, junta a fls. 103 dos autos.
N.ºs 11 e 12: Nos email em questão, constantes de fls. 104.
N.º 13: Na cópia da comunicação em causa, a fls. 105.
N.ºs 16 e 17: No teor dos emails e do contrato em apreço, constantes de fls. 34 v.º a 37 dos autos.
N.º 18: Nos depoimentos das testemunhas CC, DD e EE (que trabalha no Hospital ... do R. CH... desde 2006, como Técnica Superiora dos Recursos Humanos), que o disseram. Parecendo-nos evidente que se o aviso do concurso se reportava ao recrutamento de Auditor Interno, tendo em vista o exercício de funções em comissão de serviço, não poderia vir a ser celebrado, no âmbito desse mesmo concurso, um contrato de trabalho por tempo indeterminado, o que sempre seria ilegal, face ao disposto no art. 19º n.º 3 do Anexo II ao DL n.º 18/2017, de 10/02, que estabelece limites temporais ao exercício de tais funções.
N.ºs 19, 20 e 21: Nos depoimentos nesse sentido prestados pelas testemunhas CC e EE, em conjugação com o contrato denominado de “Comissão de Serviço” que figura, em cópia, a fls. 37 v.º a 39 dos autos.
Tendo a testemunha EE afirmado que no dia em causa, o A. compareceu no CH..., em ..., com o contrato de trabalho por tempo indeterminado assinado por si, solicitando que a data fosse alterada, por já ter, entretanto, decorrido; que a responsável pelos Recursos Humanos (no caso, a testemunha DD) não se encontrava presente, por estar de férias; e que depois de consultar a jurista do R. CH... e de falar com o Presidente do CA, CC, disse ao A. que não podia ser assinado um contrato de trabalho por tempo indeterminado para aquelas funções, tendo então sido elaborado, com a ajuda da jurista do R. CH..., um contrato de trabalho em comissão de serviço, que foi no mesmo dia assinado pelo A. e pelo Presidente do CA, CC.
N.º 22: No depoimento da testemunha EE, que referiu, no entanto, que o A. ficou aborrecido com a situação, visto o contrato apresentado ser diferente do que anteriormente lhe enviaram. Tendo a testemunha BB (médica no Hospital ..., onde trabalha há 18 anos, tendo integrado o CA do referido hospital entre 2013 e 2017, como Diretora Clínica, sendo o A. o Presidente) dito que o A. lhe transmitiu que ficou inquieto quando foi colocada a questão de ter que ser assinado um contrato diferente do primeiro, porque as condições eram diferentes, mas que não tinha alternativa e, por isso, assinou.
N.º 24: No teor do ofício em causa, junto a fls. 171 v.º dos autos.
N.º 25: Na cópia do ofício em apreço, constante de fls. 172 a 177 dos autos.
N.º 26: No art. 164º da contestação, o R. CH... aceitou o alegado pelo A. no art. 15º da petição inicial, na parte em que se diz que quando recebeu o ofício da ARSC, solicitou um parecer jurídico. Mas contrapôs o R. CH... que no parecer solicitado se concluiu apenas que estava já precludida, pelo decurso do prazo, a possibilidade de anulação administrativa da lista de ordenação final dos candidatos - o que foi afirmado em julgamento pela Presidente do CA do R. CH... desde 11/05/2018 e sua legal representante, JJ, no depoimento de parte que prestou, onde acrescentou que não vigorava período experimental.
N.º 27: Na cópia que da deliberação em questão figura a fls. 40 dos autos.
N.º 29: É o que se extrai dos emails e requerimento dirigidos pelo A. ao R. CH..., constantes de fls. 179 a 181. Resultando do “protocolo de entrega e receção de documentos” de fls. 183 v.º que só em 06/07/2020 terá sido entregue ao A. pelo R. CH... cópia do ofício da ARSC em causa.
N.ºs 30 e 31: Na cópia das comunicações em referência, a fls. 110 e 111.
N.ºs 32 e 52: No recibo de vencimento do A. de Setembro de 2020, a fls. 49 v.º dos autos
N.º 34: Nas declarações de parte do A., que o afirmou.
N.º 35: No depoimento da testemunha BB.
N.º 37: Nas declarações constantes de fls. 191 v.º e 192 dos autos, emitidas pela Direção do IPAI.
N.º 38: Nas declarações do A. e da legal representante do R..
N.ºs 39 e 40: Nas declarações de parte do A., que reconheceu que sabia que ter experiência em auditoria constituía um requisito legal para a admissão ao cargo de Auditor Interno e que o concurso se destinava à celebração de contrato de trabalho em regime de comissão de serviço - como aliás constava do respetivo anúncio. Mal se compreenderia, aliás, que o A. não o soubesse, uma vez que é licenciado em direito e exerceu cargos de Presidência de CA dos Hospitais de ... e de ....
Decorrendo dessas declarações de parte e do alegado pelo A. na petição inicial que o A. nunca tinha exercido as funções de auditor, quando se candidatou ao cargo de Auditor Interno no R. CH..., sem que se tenha provado que, como alegou, na época em que foi Presidente do CA do Hospital ..., desempenhou funções próprias de auditoria. Parecendo-nos, de resto, que não as poderia ter exercido, por incompatibilidade de cargos, como foi dito em julgamento pela testemunha KK, que foi um dos concorrentes ao cargo de Auditor Interno do R. CH... e exerceu funções de Auditor Interno no Hospital 5... de 2011 a 2022.
N.º 41: Nos depoimentos das testemunhas NN, Magistrada do Ministério Público, que disse conhecer o A. há muitos anos, tendo enaltecido o trabalho por este desenvolvido como advogado, em .... E BB - que como já acima se disse - fez parte do CA do Hospital ..., a que o A. presidiu.
N.ºs 42, 43 e 44: Nas declarações do A., nos depoimentos das testemunhas BB, OO (Engenheiro Informático de profissão e primo do A. em 2º grau, em casa de quem viveu de 2015 a 2019) e PP (Engenheiro Civil reformado, amigo do A., que conhece há 38/39 anos), e no teor do ofício do ISS. IP de fls. 48 v.º.
N.º 49: No depoimento da testemunha DD, que o disse; e nas declarações do A., que referiu que aceitou o valor da retribuição e dele não reclamou, porque não sabia que não correspondia a 80% da retribuição de um vogal, incluindo suplementos, e desconhecia a deliberação do CA do R. que a fixou.
N.ºs 50, 51 e 52: Na cópia dos emails em questão, a fls. 108/109 dos autos.
N.º 54: No depoimento de parte da legal representante do R., que o disse.
N.ºs 55 e 56: Na cópia do requerimento em referência, constante de fls. 107 e v.º dos autos, e no depoimento da testemunha DD, que esclareceu que o pedido do A. de entrar ao serviço meia hora mais cedo ou meia hora mais tarde, se deveu às dificuldades que tinha com os horários dos transportes públicos que usava para se deslocar de casa para o trabalho e vice versa; que para dar operacionalidade prática a esse pedido no sistema de controle biométrico de entradas e saídas, não tinham outra forma, em termos informáticos, se não introduzir o código respeitante à isenção de horário de trabalho; e que o próprio A. disse na altura que não pretendia receber nada respeitante a isenção de horário de trabalho.
No tocante à matéria de facto controvertida que foi considerada não provada, a convicção do tribunal assentou, para além do que ficou já dito, na ausência de prova produzida em julgamento passível de a demonstrar, sendo de salientar em particular:
- Quanto à alegação de que o Presidente do CA do R. CH... não assinou o contrato de trabalho cuja minuta foi remetida ao A. por email de 31/07/2017, porque a data de início tinha de ser retificada, que no depoimento que prestou em julgamento, o Presidente do CA do R. CH... disse que nunca poderia ser legalmente outorgado com o A. um contrato de trabalho por tempo indeterminado. Tendo a testemunha EE afirmado - como já acima se referiu - que quando o A. compareceu no CH..., em ..., com o contrato de trabalho por tempo indeterminado assinado por si, solicitando que a data fosse alterada, transmitiu-lhe, depois de falar com o Presidente do CA e com a jurista do R., que não podia ser assinado um contrato de trabalho por tempo indeterminado para aquelas funções.
- No que se refere à alegação de que apesar do contrato de trabalho por tempo indeterminado não ter sido assinado pelo R. CH..., quando assinou o contrato de comissão de serviço, o A. ficou convencido que viria a integrar um vínculo por tempo indeterminado, ingressando num cargo de dirigente intermédio, que isso contraria as regras da experiência comum e da normalidade das coisas, até porque o A., como já atrás se fez notar, é licenciado em direito e exerceu cargos de Presidência de CA dos Hospitais de ... e de ..., sendo de todo inverosímil, perante o teor do anúncio do concurso (nomeadamente do seu ponto 1) e do contrato de comissão de serviço que assinou, que se pudesse ter convencido que finda a comissão de serviço, passaria a vigorar um contrato de trabalho por tempo indeterminado.
Sendo de assinalar que o próprio A. reconheceu, nas declarações de parte que prestou, que de acordo com o regime legal do Auditor, as respetivas funções têm necessariamente que ser exercidas em comissão de serviço.
Tendo a testemunha BB dito em julgamento que o A. sabia que o trabalho que prestava como Auditor no R. CH... era a prazo, em comissão se serviço.
- Relativamente à alegação de que na época em que decorreu o concurso para Auditor Interno lançado pelo R. CH..., eram quase inexistentes as pessoas com experiência efetiva em Auditoria no SNS, que a testemunha KK disse que já existiam Auditores há muitos anos e que todos os Hospitais tinham na altura Auditores, pelo que, só por aí, seriam mais de 40, segundo a referida testemunha.
- No tocante à alegação de que na época em que o A. foi Presidente do CA do Hospital ..., desempenhava muitas vezes funções de auditoria, que como já acima se mencionou, em sede de motivação dos n.ºs 39 e 40 dos factos provados, foi dito em julgamento pela testemunha KK que quando não há auditores num Hospital, esse trabalho não é executado por ninguém, não devendo ser exercido em acumulação, nomeadamente pelo Diretor ou Presidente. Referindo a testemunha BB, que enquanto Presidente do CA do referido Hospital, o A. não fez auditorias propriamente ditas, nem as poderia fazer, embora existisse a preocupação do A. e restante CA em avaliar os procedimentos em vigor no estabelecimento, para depois poderem tomar as melhores decisões, havendo uma espécie de comissão informal que se dedicava a isso, composta designadamente pelo A., pela testemunha, por um economista e por responsáveis pelo aprovisionamento e pelos recursos humanos.
- Quanto à alegação de que a decisão do R. CH... de não renovação da comissão de serviço se deveu a razões políticas e a incómodos que o bom desempenho do A. suscitava, nenhuma prova se fez nesse sentido.
Tendo, ao invés, sido dito quer pela legal representante da R., quer pelas testemunhas DD e EE, que essa decisão foi motivada pelas irregularidades que o parecer da ARSC apontou ao procedimento concursal e ao facto do A. nele ter ficado classificado em primeiro lugar, de forma indevida, na ótica da ARSC, nomeadamente por não ter experiência em auditoria. Tendo o CA do R. CH..., mormente a sua Presidente, perante o entendimento manifestado no parecer jurídico interno que pediu, no sentido de que já não era possível a anulação administrativa do resultado do concurso, optado por manter a comissão de serviço do A. até ao fim dos 3 anos iniciais, mas não a renovar, porque tal corresponderia, no seu entender, a manter uma situação ilegalidade e de falta de transparência. Tendo inclusivamente sido afirmado em julgamento pela testemunha DD, responsável pelos Recursos Humanos do R., que a ideia era a de que o A. concorresse ao novo concurso para Auditor Interno que o R. CH... iria lançar, e como já tinha, entretanto, adquirido 3 anos de experiência no exercício do cargo, já não se colocaria a questão da falta de experiência.
- No que se reporta à alegação do A. de que nunca foi notificado do parecer da ARSC, a que se reporta o n.º 25 dos factos provados, que como se extrai do “protocolo de entrega e receção de documentos” constante de fls. 183 v.º, assinado pelo A., foi-lhe entregue pelo R. CH..., em 06/07/2020, cópia do ofício da ARSC em causa.” -A primeira questão a decidir no âmbito do presente recurso, prende-se com a admissibilidade da junção dos documentos, requerida pelo Autor/Apelante.
Lê-se no despacho de 19.09.2023:
“Através de requerimento entrado em juízo a 04/07/2023, o A. veio requerer a junção aos autos de 14 documentos, alegando que a necessidade dessa junção surgiu:
- na sequência das declarações prestadas pela testemunha BB na sessão de audiência de julgamento realizada no dia 19/06/2023, e para comprovar o que a testemunha disse, nomeadamente no que concerne à demonstração da prévia experiência em auditoria do A., antes da abertura do concurso público que deu origem à sua contratação, e para contrariar as declarações prestadas a esse respeito em julgamento pela legal representante do R.. Acrescentando que tais documentos são importantes para a clarificação da relação jurídica em causa e não podiam ter sido juntos com a petição inicial, por só agora os ter podido identificar e terem serem emitidos por entidades externas, a que só recentemente conseguiu aceder.
Instado a pronunciar-se, o R. defendeu que os documentos em causa não devem ser admitidos, por não se mostrarem preenchidos os requisitos legalmente estabelecidos para tanto, dado que se tratam de documentos emitidos pelo próprio A. ou que lhe foram dirigidos, muito antes da propositura da presente ação, nada permitindo concluir que a sua junção só agora se tornou necessária.”
Concluiu, o Apelante, em suma:
– Face às circunstâncias concretas explicitadas deveriam tais documentos ser admitidos, ao abrigo do princípio geral da prevalência da verdade material;
- Entende-se ser ilegal a denegação do meio de prova, em violação do preceituado no artigo 423º, nº 3, do CPC;
- A decisão a esse respeito proferida, deve ser revogada e substituída por outra que defira a pretensão do Recorrente, e em consequência tal deverá conduzir a nova reavaliação da prova, o que se invoca de acordo com o artigo 651º, nº 1, do CPC.
Vejamos:
Começamos por referir que a invocação do artigo 651º, nº1 do Código de Processo Civil carece de fundamento uma vez que tal normativo se reporta à possibilidade de as partes poderem juntar documentos às alegações, o que não foi o caso.
Entende ainda o Apelante que a admissibilidade da junção dos documentos em causa deveria ter sido apreciada nos termos do nº 3 do artigo 423º do Código de Processo Civil.
Consignando o princípio geral relativamente ao momento da apresentação de prova por documentos, sob a epígrafe «Momento da apresentação», dispõe o artigo 423º do Código de Processo Civil:
«1 - Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes. 2 - Se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado. 3 - Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior.».
Conforme se lê no Acórdão da Relação de Coimbra de 24.03.2015, (Relator Fonte Ramos, in www.dgsi.pt), “(…), partindo da regra geral da apresentação dos documentos com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes (n.º 1), refere-se, depois, que a apresentação poderá ter lugar até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final [fixando-se um termo final para o efeito, em paralelismo com o limite temporal traçado, no n.º 2 do art.º 598º, para a apresentação do rol de testemunhas][6] mas, neste caso, a parte é condenada em multa, exceto se provar que não os pôde oferecer com o articulado respetivo (n.º 2); a junção poderá ocorrer posteriormente (aos mencionados 20 dias), até ao encerramento da discussão em 1ª instância mas, neste caso, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até aquele momento (e os que provem factos posteriores a ele ou que, provando factos anteriores, se formem posteriormente) ou se tornem necessários em virtude de ocorrência posterior (n.º 3).(…).
(…) O ónus de provar os factos alegados em fundamento da acção e da defesa e o dever de apresentar ab initio os documentos que os provem com o articulado em que a alegação seja feita, não colidem com a liberdade que a parte mantém de observar ulteriormente aquele ónus probatório que sobre ela impende, sujeitando-se, contudo, às limitações e sanções pecuniárias que emergem do disposto nos n.ºs 2 e 3 do art.º 423º[8], a saber: até ao vigésimo dia que antecede a data da realização da audiência final, pode juntar o documento livremente, sujeitando-se ao pagamento de uma multa, a não ser que demonstre não ter podido oferecer o documento com o articulado; ulteriormente, é necessário demonstrar a impossibilidade da apresentação até então ou que a apresentação se tornou necessária em virtude de ocorrência posterior.(…).”, (realce e sublinhado nosso).
Em concreto, o Autor requereu apenas em sede de audiência de julgamento, a junção dos documentos, em causa, reportando-se, como se lê na decisão recorrida, às “declarações prestadas pela testemunha BB na sessão de audiência de julgamento realizada no dia 19/06/2023, e para comprovar o que a testemunha disse, nomeadamente no que concerne à demonstração da prévia experiência em auditoria do A., antes da abertura do concurso público que deu origem à sua contratação, e para contrariar as declarações prestadas a esse respeito em julgamento pela legal representante do R..”
Porém como resulta, nomeadamente, dos artigos 46º, 50º a 53º, 57º a 60º, 64º a 66º, 71º a 78º, 81º e 82º, 89º e 90º da petição inicial e também se refere na mesma decisão, “A questão da existência ou não de experiência prévia do A. na realização de auditorias foi alegada e tratada na petição inicial, sendo essa a sede processual própria para junção de meios de prova sobre a matéria, nomeadamente documental.
O facto da legal representante do R. e das testemunhas arroladas (nomeadamente a concretamente identificada pelo A.) terem prestado declarações sobre o assunto, não legitima a apresentação de documentos já depois de iniciado o julgamento, nem há razão para concluir que a sua apresentação se tornou necessária em virtude dessas declarações.”. Nenhum reparo merece o assim ponderado no despacho em crise. Outrossim sucede, com o demais argumentado pelo Apelante.
Transcreve-se novamente a decisão recorrida, a cuja fundamentação aderimos, nada de relevante sendo de acrescentar à mesma:
“No que se refere alegada impossibilidade de terem sido juntos em data anterior, importa notar, quanto à certidão apresentada pelo A. como documento n.º 1, que o facto de ter sido emitida apenas em 20/03/2023, a requerimento do A., não significa que não podia ter sido requerida e emitida em data anterior.
De resto, a nosso ver e salvo o devido respeito por diferente entendimento, nenhum relevo tem para o que se discute nos presentes autos, a circunstância de estar pendente nos Serviços do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo e Fiscal ..., um processo administrativo, na sequência de exposições escritas apresentadas pelo aqui A., com vista à eventual instauração de ações tendentes a declarar a nulidade de contratos celebrados pelo R. com terceiros.
Salientando-se que a certidão em causa é integrada sobretudo por exposições e missivas trocadas pelo A. com diversas entidades, de cujo teor o A. já tinha necessariamente conhecimento 20 dias antes de 27/03/2023 (data em que se iniciou o julgamento).
O mesmo sucedendo com os demais documentos que o A. pretende juntar ao processo, que remontam aos anos de 2016/2017 e dizem respeito ao Hospital ..., de que o A. era na altura, segundo se supõe, Presidente do Conselho de Administração, pelo que os podia certamente ter solicitado ao referido Hospital e junto com a petição inicial.
Em suma, não se mostram preenchidos os requisitos previstos no n.º 3 do art. 423º do Cód. de Processo Civil, nem o tribunal entende que os documentos revestem relevância que justifique subverter a regra prevista na citada norma legal e determinar oficiosamente que fiquem a constar dos autos.
Pelo que se indefere a junção de documentos requerida pelo A., que devem ser oportunamente desentranhados dos autos.” Improcede como tal nesta parte a Apelação.
- Impugnação da matéria de facto:
De harmonia com o disposto no artigo 662º, nº1 do Código de Processo Civil (ex vi do artigo 1º, nº 2, al. A) do Código de Processo do Trabalho), o Tribunal da Relação deve alterar a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto, “se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Os poderes da Relação sobre o julgamento da matéria de facto foram reforçados na atual redação do Código de Processo Civil.
Abrantes Geraldes, (in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2014, 2ª edição, pág. 230) refere que, “… a modificação da decisão da matéria de facto constitui um dever da Relação a ser exercido sempre que a reapreciação dos meios de prova (sujeitos à livre apreciação do tribunal) determine um resultado diverso daquele que foi declarado na 1.ª instância”. Apesar de (obra citada, pág. 245), “… a reapreciação da matéria de facto no âmbito dos poderes conferidos pelo art. 662º não poder confundir-se com um novo julgamento, pressupondo que o recorrente fundamente de forma concludente as razões por que discorda da decisão recorrida, aponte com precisão os elementos ou meios de prova que implicam decisão diversa da produzida e indique a resposta alternativa que pretende obter”.
Na reapreciação da força probatória das declarações de parte, dos depoimentos das testemunhas e dos documentos, importa ter presente o princípio da livre apreciação, como resulta do disposto nos artigos 607º, nº5 e 466º, nº3, ambos do Código de Processo Civil e 396º e 366º.
Preceitua ainda o artigo 640º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil: «1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; (…)».
Analisaremos o cumprimento de tais ónus pelo Recorrente, começando pela factualidade provada.
É este o teor do item 15 dos factos provados: - O Ministério da Saúde não obteve, em tempo útil, substituto para exercer as funções de Presidente do CA do Hospital ..., tendo o Secretário de Estado da Saúde solicitado ao R. CH... o adiamento do início do exercício do cargo de Auditor Interno pelo prazo de um mês, pedindo ao Autor que se mantivesse nesse período de tempo nas funções de Presidente do CA do Hospital ....
Lê-se na motivação da decisão de facto:
“A matéria de facto dada como assente sob os números 3, 4, 5, 7, 14, 15, 23, 28, 33, 36, 45, 46, 47 e 48 resultou da sua expressa aceitação ou não impugnação por parte do R. CH..., (…)”.
Entende o Apelante que o facto nº 15 deve passar a ter a seguinte redação:
- O Ministério da Saúde não obteve, em tempo útil, substituto para exercer as funções de Presidente do CA do Hospital ..., questionando o Autor se poderia desempenhar funções em ... um mês mais até que o Ministério arranjasse substituto, ao que o Autor respondeu, desde que o Senhor presidente do Conselho de Administração do Réu autorizasse, dado que ele escreveu oficio ao Autor dizendo que se não viesse iria chamar o segundo, como aliás consta no facto 13”;
Conclui a este respeito que na sentença não se teve em consideração a posição que o Réu expressou na contestação, nomeadamente, o que resulta do artigo 55º da contestação e que é uma confissão do Réu do alegado pelo Autor, a que o Réu contrapôs apenas que o seu presidente não assinou esse contrato, “porque a data de início tinha que ser retificada”.
Analisando:
Foi este o teor do artigo 55º da contestação:
A matéria que o Apelante pretende seja suprimida - tendo o Secretário de Estado da Saúde solicitado ao R. CH... o adiamento do início do exercício do cargo de Auditor Interno pelo prazo de um mês, pedindo ao A. que se mantivesse nesse período de tempo nas funções de Presidente do CA do Hospital ...- foi alegada pelo Apelante na petição inicial – cfr. artigo 8º desse articulado - e não impugnada pelo Réu, CH... – cfr. artigos 33º (“33. Impugnam-se todos os factos que estejam em contradição com a contestação ora apresentada”) e 55º da contestação.
A matéria que o Apelante pretende ver aditada - questionando o Autor se poderia desempenhar funções em ... um mês mais até que o Ministério arranjasse substituto – é matéria essencialmente idêntica, ou seja dita por outras palavras, aquela que consta já do item 15): pedindo ao A. que se mantivesse nesse período de tempo nas funções de Presidente do CA do Hospital ....
A matéria que o Autor respondeu, desde que o Senhor presidente do Conselho de Administração do Réu autorizasse, não foi alegada.
A restante matéria - que ele [Senhor presidente do Conselho de Administração do Réu] escreveu oficio ao Autor dizendo que se não viesse iria chamar o segundo - é matéria que consta como o Apelante refere no item 13:
13. No dia 21/06/2017, o R. CH... enviou ao A., por carta registada com aviso de receção, comunicação com o seguinte teor:
«ASSUNTO: Procedimento concursal para recrutamento de Auditor Interno - início de funções
Considerando a relevância que a atividade de auditoria interna assume na orgânica hospitalar, conforme o disposto no artigo 19.º dos Estatutos dos Hospitais anexo ao Decreto-lei n.º 18/2017, de 10 de Fevereiro, solicitamos a V. Ex.ª, que se digne confirmar-nos a sua disponibilidade para assumir o exercício de funções no próximo dia 01 de agosto de 2017.
Mais se informa que a Instituição se encontra obrigada ao cumprimento do prazo legal de 180 dias para conclusão do procedimento concursal, atento o disposto no artigo 128.º do Código de Procedimento Administrativo, pelo que após a data acima indicada, será contactado o candidato classificado em 2º lugar, tendo em vista a celebração de um contrato individual de trabalho, em regime de comissão de serviço.». Improcede nesta parte a Apelação.
É este o teor do item 18 dos factos provados:
- O envio ao A. da minuta do “contrato individual de trabalho sem termo” deveu-se a erro de quem a enviou, porque não correspondia ao tipo contratual previsto no aviso de abertura do concurso, que era de “contrato de trabalho em comissão de serviço”.
A convicção do tribunal a quo, baseou-se, no que da motivação da decisão de facto consta:
“N.º 18: Nos depoimentos das testemunhas CC, DD e EE (que trabalha no Hospital ... do R. CH... desde 2006, como Técnica Superiora dos Recursos Humanos), que o disseram. Parecendo-nos evidente que se o aviso do concurso se reportava ao recrutamento de Auditor Interno, tendo em vista o exercício de funções em comissão de serviço, não poderia vir a ser celebrado, no âmbito desse mesmo concurso, um contrato de trabalho por tempo indeterminado, o que sempre seria ilegal, face ao disposto no art. 19º n.º 3 do Anexo II ao DL n.º 18/2017, de 10/02, que estabelece limites temporais ao exercício de tais funções."
Entende o Apelante que o facto nº 18 deve passar a ter a seguinte redação:
- Ao autor foi enviada uma minuta de contrato de trabalho por tempo indeterminado para celebração do contrato inicial de trabalho.
Invoca o e-mail da minuta conjugado com depoimentos de testemunhas das CC, DD, BB, EE - e declarações de parte do Autor, indicando minutos da gravação e transcrevendo excertos tidos por relevantes que integralmente lemos.
Analisando:
Sem que se entre na apreciação do cumprimento dos ónus de impugnação, bem como da suficiência dos meios de prova invocados pelo Apelante, desde logo se consigna quanto à matéria que o Apelante pretende aditar ao elenco dos factos que a primeira parte ficou já assente no item 16.: No dia 31/07/2017, foi remetido ao A., através do email da Diretora dos Recursos Humanos do R. CH..., DD, a seguinte comunicação: «Junto se envia para análise minuta do contrato», bem assim como, em anexo, a minuta do “contrato individual de trabalho sem termo” que consta de fls. 35 v.º a 37 dos autos, datado de 01/08/2017, para produzir efeitos nesse mesmo dia.
A restante matéria - para celebração do contrato inicial de trabalho – é matéria conclusiva.
“Só acontecimentos ou factos concretos podem integrar a seleção da matéria de facto relevante para a decisão, sendo, embora, de equiparar aos factos os conceitos jurídicos geralmente conhecidos e utilizados na linguagem comum, verificado que esteja um requisito: não integrar o conceito o próprio objeto do processo ou, mais rigorosa ou latamente, não constituir a sua verificação, sentido, conteúdo ou limites objeto de disputa das partes”, - Acórdão do S.T.J. de 12.03.2014, in www.dgsi.pt. Improcede nesta parte a pretensão do Apelante. Ainda assim, ao abrigo dos poderes oficiosos contemplados no artigo 662º, nº1 do Código de Processo Civil, impõe-se alterar a decisão sobre a matéria de facto dada como provada, eliminando-se a matéria “deveu-se a erro de quem a enviou”, também conclusiva. A redação deste item 18º passa a ser: - O envio ao A. da minuta do “contrato individual de trabalho sem termo” não correspondia ao tipo contratual previsto no aviso de abertura do concurso, que era de “contrato de trabalho em comissão de serviço”.
É este o teor do item 35º: - Na época em que o A. foi Presidente do CA do Hospital ..., não existia Auditor Interno no referido Hospital.
Entende o Apelante que deve ser aditado ao teor deste item que estes hospitais apenas passaram a ter obrigação legal de o ter com o Decreto-Lei nº 18/2017, de 10 de Fevereiro.
Sem razão também nesta parte.
Com efeito, o que resulta de lei não é matéria que deva constar dos factos provados. Improcede, como tal, nesta parte a pretensão do Apelante.
É este o teor do item 39º: - Quando se candidatou ao concurso para Auditor Interno do R. CH..., o A. sabia que ter experiência em auditoria constituía um requisito legal para a admissão ao referido cargo e sabia que o contrato a celebrar por quem fosse admitido era um contrato individual de trabalho em comissão de serviço, e não um contrato de trabalho por tempo indeterminado.
Na motivação, consta da sentença a este respeito, “N.ºs 39 e 40: Nas declarações de parte do A., que reconheceu que sabia que ter experiência em auditoria constituía um requisito legal para a admissão ao cargo de Auditor Interno e que o concurso se destinava à celebração de contrato de trabalho em regime de comissão de serviço - como aliás constava do respetivo anúncio. Mal se compreenderia, aliás, que o A. não o soubesse, uma vez que é licenciado em direito e exerceu cargos de Presidência de CA dos Hospitais de ... e de ....”
Sem alegar não ter nas suas declarações reconhecido que sabia que ter experiência em auditoria constituía um requisito legal para a admissão ao cargo de Auditor Interno, entende o Apelante que este facto deve ser eliminado.
Sobre as suas declarações de parte, prestadas “sob a gravação 20230327154503_4166267_287”, relatou o que explicou e declarou, sem questionar, como já dito, ter reconhecido que sabia que ter experiência em auditoria constituía um requisito legal para a admissão ao cargo de Auditor Interno e sem transcrever o que efetivamente por si foi dito, nem indicar os minutos da gravação onde os excertos relevantes a esse respeito ficaram registados.
Assinalou apenas como minutos da gravação onde ficaram registados os excertos das suas declarações “(10.00)”, procedendo à transcrição “acho que era dia 4 ou dia 5 de setembro”, “de forma surpreendente ao chegar ao hospital os Recursos Humanos apresentaram-lhe um contrato que “não era aquele que havia acordado” e “11.15”.
Não cumpriu os ónus a que estava adstrito, nos termos do artigo 640º, nº2, alínea a) do Código de Processo Civil, o que por si só justifica a rejeição nesta parte da impugnação.
Como expressamente decorre da letra daquela norma, se impugnada a factualidade com base em depoimentos gravados deverá também o Recorrente indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
Sem prejuízo, consigna-se ainda:
O Apelante alega, para aquela sua pretensão de eliminação da matéria do item 39º do elenco dos factos provados, ainda a “falta de competência para o Tribunal se substituir ao júri e por o aviso do concurso e os e-mails remetidos pela Direção dos Recursos Humanos comprovarem a experiência em auditoria do A,. o que também é comprovado pelos documentos entregues pelo A., comprovativos da sua experiência, tendo o mesmo sido presidente de duas instituições de saúde, Advogado durante mais de 30 (trinta) anos, tendo Mestrado e especializações, incluindo em auditoria interna”.
Ainda que a ser entendido de modo diferente, deve apenas constar que “O Autor sabia que era contratado em contrato individual de trabalho com a modalidade de comissão de serviços”.
Analisando:
Não se pronunciou o Tribunal a quo sobre as competências do Autor para Auditor interno.
O que de relevante ficou dado como assente foi o conhecimento do Autor sobre o concurso a que se candidatou, concretamente sobre ser requisito legal para o efeito ter experiência em auditoria e relativamente ao contrato a celebrar por quem fosse admitido ser um contrato individual de trabalho em comissão de serviço.
Como referido, o Apelante não questionou, como já dito, ter nas suas declarações reconhecido que sabia que ter experiência em auditoria constituía um requisito legal para a admissão ao cargo de Auditor Interno. Ainda assim, por incluir “conclusão fáctica” quanto a questão de direito, justifica-se, a alteração deste item, passando a sua redação a ser: - Quando se candidatou ao concurso para Auditor Interno do R. CH..., o A. sabia que ter experiência em auditoria constituía um requisito legal para a admissão ao referido cargo e sabia que o contrato a celebrar por quem fosse admitido era um contrato individual de trabalho em comissão de serviço. Procede assim, apenas parcialmente, nesta parte a pretensão do Apelante.
É este o teor do item 55º dos factos provados: - O A., em 17 de Novembro de 2017, requereu ao R. CH... a flexibilidade de horário de trabalho, «(…) para entrar e sair ou meia hora mais cedo ou meia hora mais tarde», por «(…) dificuldades de transporte ficando dependente de acessibilidade, desde casa ou trabalho, aos horários praticados nos transportes públicos».
Na motivação, consta da sentença a este respeito: “N.ºs 55 e 56: Na cópia do requerimento em referência, constante de fls. 107 e v.º dos autos, e no depoimento da testemunha DD, que esclareceu que o pedido do A. de entrar ao serviço meia hora mais cedo ou meia hora mais tarde, se deveu às dificuldades que tinha com os horários dos transportes públicos que usava para se deslocar de casa para o trabalho e vice versa; que para dar operacionalidade prática a esse pedido no sistema de controle biométrico de entradas e saídas, não tinham outra forma, em termos informáticos, se não introduzir o código respeitante à isenção de horário de trabalho; e que o próprio A. disse na altura que não pretendia receber nada respeitante a isenção de horário de trabalho.”
Conclui o Apelante que a flexibilidade de horário de trabalho encontra- se erradamente enquadrada, pois o Recorrente laborava em horário contínuo, donde legalmente incomportável com a modalidade de horário flexível.
Entende o Apelante que ao teor deste item deve ser acrescentado que esse requerimento junto pelo Ré como documento nº 9 apenas permite indicar que o mesmo requereu horário continuo, que lhe foi concedido, nada provando quando à isenção de horário.
Sem razão também a este respeito.
No item 55º dos factos provados nada consta a respeito de isenção de horário.
A interpretação do que foi solicitado no requerimento, em causa, pelo Autor, não deve constar da factualidade provada, mas sim ser apreciado em sede de fundamentação de direito. Improcede, nesta parte, a pretensão do Apelante.
Para além disso, ao abrigo dos poderes oficiosos contemplados no artigo 662º, nº1 do Código de Processo Civil, impõe-se alterar a decisão sobre a matéria de facto dada como provada, eliminando-se a matéria “a flexibilidade de horário de trabalho”, também conclusiva. Consigna-se, ainda que a respeito deste item se considera assente o teor integral do requerimento, em causa. A redação deste item 55ºº passa a ser: - O A., em 17 de Novembro de 2017, requereu ao R. CH... «(…) para entrar e sair ou meia hora mais cedo ou meia hora mais tarde», por «(…) dificuldades de transporte ficando dependente de acessibilidade, desde casa ou trabalho, aos horários praticados nos transportes públicos».
Entende ainda o Apelante “que em face de todo o acervo documental junto aos autos e depoimentos das testemunhas, devem passar a factos provados os seguintes: - Que o R. CH... desde o início que criou a convicção no A. de que este iria ingressar no R. num cargo de dirigente intermédio, mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado. - Que existiu um acordo entre o R. CH... e o A., no sentido deste permanecer como trabalhador subordinado do R. CH..., uma vez findo o contrato de comissão de serviço; - Que o Presidente do CA do R. CH... não assinou o contrato de trabalho cuja minuta foi remetida ao A. por email de 31/07/2017, a que se alude no n.º 16 dos factos provados, porque a data de início tinha de ser retificada. - Que apesar do mencionado contrato de trabalho não ter sido assinado pelo R. CH..., quando o A. assinou o contrato de comissão de serviço, ficou convencido que viria a integrar um vínculo por tempo indeterminado, ingressando num cargo de dirigente intermédio.
Na sentença foi considerada matéria não provada:
- Que o R. CH... desde o início que criou a convicção no A. de que este iria ingressar no R. num cargo de dirigente intermédio, mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado.
- Que existiu um acordo entre o R. CH... e o A., no sentido deste permanecer como trabalhador subordinado do R. CH..., uma vez findo o contrato de comissão de serviço.
- Que o Presidente do CA do R. CH... não assinou o contrato de trabalho cuja minuta foi remetida ao A. por email de 31/07/2017, a que se alude no n.º 16 dos factos provados, porque a data de início tinha de ser retificada.
- Que apesar do mencionado contrato de trabalho não ter sido assinado pelo R. CH..., quando o A. assinou o contrato de comissão de serviço, ficou convencido que viria a integrar um vínculo por tempo indeterminado, ingressando num cargo de dirigente intermédio.
Na motivação, consta da sentença a este respeito: “No tocante à matéria de facto controvertida que foi considerada não provada, a convicção do tribunal assentou, para além do que ficou já dito, na ausência de prova produzida em julgamento passível de a demonstrar, sendo de salientar em particular:
- Quanto à alegação de que o Presidente do CA do R. CH... não assinou o contrato de trabalho cuja minuta foi remetida ao A. por email de 31/07/2017, porque a data de início tinha de ser retificada, que no depoimento que prestou em julgamento, o Presidente do CA do R. CH... disse que nunca poderia ser legalmente outorgado com o A. um contrato de trabalho por tempo indeterminado. Tendo a testemunha EE afirmado (…) que quando o A. compareceu no CH..., em ..., com o contrato de trabalho por tempo indeterminado assinado por si, solicitando que a data fosse alterada, transmitiu-lhe, depois de falar com o Presidente do CA e com a jurista do R., que não podia ser assinado um contrato de trabalho por tempo indeterminado para aquelas funções.
- No que se refere à alegação de que apesar do contrato de trabalho por tempo indeterminado não ter sido assinado pelo R. CH..., quando assinou o contrato de comissão de serviço, o A. ficou convencido que viria a integrar um vínculo por tempo indeterminado, ingressando num cargo de dirigente intermédio, que isso contraria as regras da experiência comum e da normalidade das coisas, até porque o A., como já atrás se fez notar, é licenciado em direito e exerceu cargos de Presidência de CA dos Hospitais de ... e de ..., sendo de todo inverosímil, perante o teor do anúncio do concurso (nomeadamente do seu ponto 1) e do contrato de comissão de serviço que assinou, que se pudesse ter convencido que finda a comissão de serviço, passaria a vigorar um contrato de trabalho por tempo indeterminado.
Sendo de assinalar que o próprio A. reconheceu, nas declarações de parte que prestou, que de acordo com o regime legal do Auditor, as respetivas funções têm necessariamente que ser exercidas em comissão de serviço.
Tendo a testemunha BB dito em julgamento que o A. sabia que o trabalho que prestava como Auditor no R. CH... era a prazo, em comissão se serviço.”
O Apelante nada refere a propósito dos meios de prova atendidos e explicados pelo Tribunal a quo para considerar como não provada a matéria em causa, por forma a justificar que os mesmos não permitem tal convicção, quer quanto às suas próprias declarações, quer às do Presidente do CA do R. CH..., ou ao depoimento da testemunha EE, ou mesmo juízo de experiência consignado na motivação da sentença, a respeito da convicção sobre esta matéria.
Não cumpriu assim integralmente os ónus a que estava adstrito nesta sede.
Ainda assim, sempre se consigna:
O Apelante limitou-se, quanto à primeira metade da matéria que no seu entender seria para aditar, a invocar que estes factos resultam, nomeadamente, da minuta enviada ao Recorrente, do próprio colher da assinatura dessa minuta ao mesmo, em 1 de Agosto de 2017, além dos emails da minuta.
Procedemos à leitura destes documentos e não chegamos a uma convicção diversa no sentido almejado pelo Apelante.
Invocou ainda o Apelante, quanto à restante matéria que no seu entender seria para aditar, os depoimentos das testemunhas BB, HH e II, transcrevendo excertos tidos por relevantes, que integralmente lemos, indicando minutos da gravação onde ficaram registados e relatando parte do que foi dito por algumas dessas testemunhas.
Não chegamos a uma convicção que permita dar a mesma matéria como provada.
Aliás ficou assente nos itens 16, 17, 19, 20, 21 dos factos provados que não foram objeto de impugnação – matéria contrária à que o Apelante pretende seja aditada -, não ter a minuta do contrato enviada no dia 31/07/2017 sido assinada por ninguém em representação do Réu, CH..., tendo nesse mesmo dia sido elaborado pelos serviços do Réu, CH... o contrato denominado de “Comissão de Serviço” e assinado pelo Autor e pelo Presidente do CA do Réu.
Ainda que, o Autor pediu tão só a alteração da data da primeira minuta, mas assinou outro contrato, denominado de “Comissão de Serviço”, do qual consta, além do mais, o seguinte clausulado, com destaque para o que vai em realce:
«1ª Cláusula (Objecto)
A presente Comissão de Serviço tem por objeto o exercício de funções de Auditor Interno, nos termos do artigo 19.º, dos Estatutos dos Hospitais, Centros Hospitalares e Institutos Portugueses de Oncologia, E.P.P., anexos ao Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de fevereiro. (…)
3ª Cláusula (Retribuição)
1. O Primeiro Outorgante pagará mensalmente ao Segundo Outorgante, a retribuição (ilíquida) de 2.746,91€ (dois mil, setecentos e quarenta e seis euros e noventa e um cêntimos) que, deduzidos os descontos legais, será depositada, por transferência bancária, na conta da Segundo Outorgante.
2. À retribuição referida no número anterior acresce um subsídio de refeição diário, nos mesmos termos que se encontrem em vigor para os trabalhadores titulares de contratos de trabalho em funções públicas.
3. À retribuição referida no número 1 acrescem ainda os subsídios de férias e de Natal calculados nos termos do Código de Trabalho.
4ª Cláusula (Horário de Trabalho)
1. O Segundo Outorgante compromete-se a prestar 40 (quarenta) horas semanais de trabalho ao Primeiro Outorgante.
2. O horário de trabalho a cumprir pelo Segundo Outorgante, será elaborado e afixado em local próprio pelo Primeiro Outorgante, dentro dos termos e limites legais, de acordo com a organização e o esquema de funcionamento do serviço em que a Segundo Outorgante irá exercer as suas funções. (…)
7.ª Cláusula (Produção de Efeitos e Vigência) A presente Comissão de Serviços produz efeitos no dia 1 de setembro de 2017, por um período de três anos, renovável por iguais períodos, até ao limite máximo de três renovações consecutivas ou interpoladas.
8.ª Cláusula (Alterações de Cláusulas Contratuais)
As alterações à presente Comissão de Serviço serão objeto de acordo mútuo que deverá revestir sempre a forma escrita.
9.ª Cláusula (Denúncia, Revogação e Rescisão Contratual) 1. Qualquer das partes pode pôr termo à comissão de serviço, mediante aviso prévio por escrito, com a antecedência mínima de 30 ou 60 dias, consoante aquela tenha durado, respetivamente, até dois anos ou período superior.
2. A falta de aviso prévio não obsta à cessação da comissão de serviço, constituindo a parte faltosa na obrigação de indemnizar a contraparte nos termos do artigo 401.º do Código do Trabalho. (…) Depois de lerem esta Comissão de Serviço, os outorgantes expressamente declaram que o mesmo foi livremente negociado e por eles aceite de forma consciente e voluntária, correspondente à sua vontade, e que, por isso, o vão assinar.
Feito em ..., no dia 05 de setembro de 2017, em duplicado, destinando-se um exemplar ao primeiro outorgante e outro ao segundo outorgante.». Improcede como tal, também nesta parte e sede, a pretensão do Apelante.
Por último, entende o Apelante que deve também passar a constar que o Recorrente laborou em regime de isenção de horário de trabalho, devendo aditar-se facto nesse sentido.
Na sentença foi considerado matéria não provada:
- Que o A. laborava em regime de isenção de horário.
Na motivação, nada em específico foi consignado ainda que conste da motivação a ausência de prova produzida em julgamento passível de demonstrar a matéria de facto controvertida que foi considerada não provada.
Invoca o Apelante o que consta do seu recibo e foi concedido, não apenas no seu próprio interesse, mas também da instituição, e concedido porque figurava no regulamento interno da instituição e porque lhe permitia desempenhar funções de controlo interno, próprias de um auditor em horário fora do horário normal;
Ainda que tal facto resulta, também, do teor do depoimento da testemunha DD, transcrevendo excertos tidos por relevantes, que integralmente lemos, indicando minutos da gravação onde ficaram registados.
Não chegamos a uma convicção diferente, desde logo tendo a testemunha relacionado o “o código da isenção de horário” com uma vicissitude mecânica: “do ponto de vista mecânico, do instrumento de leitura do registo biométrico, efetivamente a única forma de introduzir essa flexibilidade era através do código de isenção de horário de trabalho” .
Aliás, do contrato, assinado, consta:
“4ª Cláusula (Horário de Trabalho)
1. O Segundo Outorgante compromete-se a prestar 40 (quarenta) horas semanais de trabalho ao Primeiro Outorgante.
2. O horário de trabalho a cumprir pelo Segundo Outorgante, será elaborado e afixado em local próprio pelo Primeiro Outorgante, dentro dos termos e limites legais, de acordo com a organização e o esquema de funcionamento do serviço em que a Segundo Outorgante irá exercer as suas funções. (…)” Improcede como tal, também nesta parte e sede, a pretensão do Apelante.
2.3.Fundamentação de direito:
Começa por ler-se na sentença, em sede de enquadramento factual inicial, o que se transcreve por pertinente:
“Na sequência de deliberação do CA do R. CH... de 30/08/2016, foi aberto um procedimento concursal para recrutamento de Auditor Interno, em regime de comissão de serviço, publicitado através de anúncio datado de 27/10/2016, decorrendo o concurso até às 16:00 horas do dia 11/11/2016.
O A. ficou graduado em primeiro lugar, não tendo o resultado final do concurso sido objeto de reclamação, oposição ou impugnação judicial por parte dos demais concorrentes, vindo a ser homologado pelo CA do R. CH... em 28/03/2017.
Tendo no dia 5 de Setembro de 2017 sido assinado pelo A. e pelo Presidente do CA do R. contrato denominado de “Comissão de Serviço”, parcialmente transcrito no n.º 21 dos factos provados, tendo por objeto «(…) o exercício de funções de Auditor Interno, nos termos do artigo 19.º, dos Estatutos dos Hospitais, Centros Hospitalares e Institutos Portugueses de Oncologia, E.P.P., anexos ao Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de fevereiro.», produzindo efeitos «(…) no dia 1 de setembro de 2017, por um período de três anos, renovável por iguais períodos, até ao limite máximo de três renovações consecutivas ou interpoladas.».
Funções essas que o A. exerceu durante 3 anos, tendo sido deliberado pelo CA do R. CH..., em 25/06/2020, não renovar a comissão de serviço.”
Importa também começar por referir que relativamente ao pedido principal que formulou - Ser o R. condenado a reconhecer o A como trabalhador permanente da Instituição -, o Apelante fez depender o mesmo da alteração da factualidade provada, sendo que o que desta foi suprimido, não justifica uma conclusão diversa da consignada na sentença recorrida, no sentido de que “(…) o único contrato formalizado entre as partes no âmbito do concurso para recrutamento de Auditor Interno, foi o de comissão de serviço, outorgado no dia 5 de Setembro de 2017.”
Perante tal, carece de razão o Apelante quando conclui que:
- Não pode ficar imune e sem censura a questão de o Réu, entidade pública, remeter uma minuta de um contrato de trabalho a tempo indeterminado, fazendo com que o Recorrente deixasse o cargo de presidente da Instituição pública onde trabalhava para ingressar no Réu.
- Estando esses factos, de uma ilicitude grave, provados, dizendo respeito a princípios inderrogáveis como sejam a ordem pública, o direito à estabilidade no emprego, direito ao trabalho, o direito à lealdade e boa fé, deve o Réu ser condenado, vel ultra petitum - artigo 74º do Código de Processo de Trabalho -, a assumir os danos causados, suportando indemnização por atos culposos dos seus agentes.
- Pelo que deve o Réu ser condenado a suportar indemnização equivalente à reintegração no posto de trabalho, caso não proceda o pedido principal.
Aproveitamos as considerações do recente acórdão desta secção de 15.01.2024, proferido no Processo nº 13469/18.8T8PRT.P1 (mesma relatora, com intervenção como Adjuntos do Desembargadora António Luís Carvalhão e a Conselheira Paula Leal de Carvalho, in www.dgsi.pt):
Sob a epígrafe «Regime de contrato de trabalho em comissão de serviço», dispõe o artigo 162º, nº1 do Código do Trabalho que «Pode exercer cargo ou funções em comissão de serviço um trabalhador da empresa ou outro admitido para o efeito».
Dispõe ainda o artigo 162º, nº3 que «Não se considera em regime de comissão de serviço o contrato que não tenha a forma escrita (…)».
Não se olvida a razão da exigência do documento escrito prescrito no artigo 162º, nº3 do Código do Trabalho - necessidade de consciencializar as partes, sobretudo o trabalhador, da precariedade do cargo.
Acolhemos os ensinamentos da doutrina, a este propósito, de que “a forma escrita tem em vista possibilitar uma maior reflexão das partes, uma formulação mais precisa e completa das declarações negociais e um maior elevado grau de certeza sobre os termos contratuais” (cfr. IRENE GOMES, “Principais aspetos do regime jurídico do trabalho exercido em comissão de serviço”, Estudos de Direito do Trabalho em Homenagem ao Prof. Manuel Alonso Olea, Almedina, 2004, pp. 241 e ss, citação também incluída no Ac. do STJ de 24.01.2018, inwww.dgsi.pt
Em conformidade, é à declaração negocial que foi objeto do contrato assinado pelo Autor e pelo Réu CH... e não à primeira minuta do mesmo entregue ao Autor sem estar assinada por este último que importa atender como declaração negocial eficaz - artigo 224º do Código Civil.
Pela mesma ordem de razão, não acolhemos a conclusão do Apelante de que deve o Réu ser condenado a pagar pelo menos dois anos de contrato de trabalho que sempre teria que suportar por força da alteração contratual em que inseriu o Recorrente, que tinha um procedimento concursal para uma comissão de serviço de cinco anos, e não de três anos.
Não ocorreu uma alteração contratual, antes sim o contrato de comissão de serviço foi celebrado para “um período de três anos, renovável por iguais períodos, até ao limite máximo de três renovações consecutivas ou interpoladas.”
Aliás ficou também provado que o Autor não se insurgiu contra o facto de ter sido reduzido dos cinco anos previstos no anúncio, para os três anos que figuraram no contrato, o prazo de duração da comissão de serviço. - (item 22 dos factos provados)
Transcreve-se agora o enquadramento legal da sentença e as considerações aí efetuadas a esse respeito, (sem incluir as referências jurisprudenciais e doutrinais ainda que tidas também por nós também como pertinentes):
“A comissão de serviço constitui uma das modalidades de contrato de trabalho legalmente previstas, estando o seu regime consagrado no art. 162º do Cód. do Trabalho, que estabelece, no que para aqui importa, que «1 - Pode exercer cargo ou funções em comissão de serviço um trabalhador da empresa ou outro admitido para o efeito. 2 - No caso de admissão de trabalhador para exercer cargo ou funções em comissão de serviço, pode ser acordada a sua permanência após o termo da comissão. 3 - O contrato para exercício de cargo ou funções em comissão de serviço está sujeito a forma escrita e deve conter: a) Identificação, assinaturas e domicílio ou sede das partes; b) Indicação do cargo ou funções a desempenhar, com menção expressa do regime de comissão de serviço; c) No caso de trabalhador da empresa, a atividade que exerce, bem como, sendo diversa, a que vai exercer após cessar a comissão; d) No caso de trabalhador admitido em regime de comissão de serviço que se preveja permanecer na empresa, a atividade que vai exercer após cessar a comissão. 4 - Não se considera em regime de comissão de serviço o contrato que não tenha a forma escrita ou a que falte a menção referida na alínea b) do número anterior. (…)».
No que respeita à respetiva cessação, preceitua o art. 163º n.º 1 que qualquer das partes lhe pode pôr termo, por escrito, mediante aviso prévio, com a antecedência mínima de 30 ou 60 dias, consoante tenha durado, respetivamente, até dois anos ou período superior.
Acrescentando o n.º 2 do mesmo artigo que a falta de aviso prévio não obsta à cessação da comissão de serviço, mas constitui a parte faltosa na obrigação de indemnizar a contraparte nos termos do artigo 401º.
A figura jurídica da comissão de serviço, introduzida inicialmente no âmbito do direito laboral privado através do DL n.º 404/91, de 16/10, é oriunda do direito administrativo, tendo subjacente a ideia do preenchimento transitório de um lugar permanente, por escolha baseada em razões de confiança, caracterizando-se pela circunstância de poder cessar a todo o tempo, por mera manifestação de vontade de qualquer das partes, inclusivamente do empregador, sem necessidade de invocação de justa causa.
(…)
Assim, quando a comissão de serviço é contratada com trabalhador externo, que não pertencia anteriormente aos quadros da empregadora, e o contrato não preveja a sua permanência na empresa após a cessação da comissão de serviço, quando esta finda, a relação laboral também se extingue. Tendo o trabalhador direito à indemnização calculada nos termos do artigo 366º, caso a comissão de serviço tenha cessado por iniciativa do empregador, nos termos do art. 164º n.º 1, al. c).
Mas apesar de no âmbito do direito laboral privado qualquer das partes poder pôr termo à comissão de serviço, mediante aviso prévio, sem necessidade de invocação de motivo, será ilícita a cessação, se for operada com abuso de direito ou determinada por fator discriminatório em relação ao trabalhador (nomeadamente por razões de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual), porque tal implicaria a violação do princípio constitucional da igualdade e da proibição da discriminação, ínsito nos arts. 13º e 53º da Constituição da República Portuguesa, bem assim como, no plano legal, dos arts. 24º e 25º .
Acresce que a natureza jurídica do R. CH... faz com que o regime legal a considerar na situação que nos ocupa não se circunscreva ao que resulta das citadas normas do Código do Trabalho.
Na verdade, o R. CH... é uma pessoa colectiva de direito público, de natureza empresarial, integrada no Serviço Nacional de Saúde (SNS), dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial, regendo-se pelo DL n.º 30/2011, de 02/03, que o criou; pelos respetivos Estatutos, publicados em anexo ao DL n.º 233/2005, de 29/12, posteriormente revogado e substituído pelo DL n.º 18/2017, de 10/02, com efeitos desde 01/01/2017; e pelo regime jurídico do sector público empresarial, vertido no DL n.º 133/2013, de 03/10, com as especificidades previstas no citado DL n.º 18/2017, de 10/02, entretanto também revogado pelo DL n.º 52/2022, de 04/08.
Revestindo a normatividade sucessivamente fixada nos DL n.º 233/2005, de 29/12 e n.º 18/2017, de 10/02 e nos Estatutos a eles anexos, carácter especial relativamente ao disposto no regime jurídico do sector público empresarial, que é subsidiariamente aplicável, com as devidas adaptações - cfr. arts. 5º n.º 3 e 18º n.º 3, respetivamente, dos referidos DL.
Estando os trabalhadores do R. CH... sujeitos ao estabelecido no Código do Trabalho (embora possam subsistir trabalhadores com vínculo de função pública), mas devendo a respetiva contratação, em qualquer caso, ser precedida de processo de recrutamento tendente a assegurar os princípios da igualdade de oportunidades, imparcialidade, não discriminação e publicidade - cfr. arts. 14º n.ºs 1 e 4 e 15º do DL n.º 233/2005, de 29/12 e 27º e 28º do DL n.º 18/2017, de 10/02.
Aquando da publicitação do procedimento concursal, através do anúncio (parcialmente) transcrito no n.º 5 dos factos provados, datado de 27/10/2016, ainda vigorava o DL n.º 233/2005, de 29/12, na redação do DL n.º 244/2012, de 09/11, sendo o “Enquadramento legal” do concurso, de acordo com o ponto 2 do aviso, feito com referência aos arts. 14º e 17º do referido diploma, pelo DL n.º 30/2011, de 27/01 e pelo Cód. do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12/02.
O citado art. 14º estabelecia, sob a epígrafe “Regime de pessoal”, na parte que para o caso releva, que «1 - Os trabalhadores dos hospitais E. P. E. estão sujeitos ao regime do contrato de trabalho, nos termos do Código do Trabalho, bem como ao regime disposto em diplomas que definam o regime legal de carreira de profissões da saúde, demais legislação laboral, normas imperativas sobre títulos profissionais, instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho e regulamentos internos. (…) 4 - Os processos de recrutamento devem assentar na adequação dos profissionais às funções a desenvolver e assegurar os princípios da igualdade de oportunidades, da imparcialidade, da boa fé e da não discriminação, bem como da publicidade, exceto em casos de manifesta urgência devidamente fundamentada.».
“E o art. 17º, na parte que para o caso releva, que «1 - Ao serviço de auditoria interna compete a avaliação dos processos de controlo interno e de gestão de riscos, nos domínios contabilístico, financeiro, operacional, informático e de recursos humanos, contribuindo para o seu aperfeiçoamento contínuo. 2 - Ao serviço de auditoria interna compete em especial: a) Fornecer ao conselho de administração análises e recomendações sobre as atividades revistas para melhoria do funcionamento dos serviços; b) Receber as comunicações de irregularidades sobre a organização e funcionamento do hospital E. P. E. apresentadas pelos demais órgãos estatutários, trabalhadores, colaboradores, utentes e cidadãos em geral; c) Elaborar o plano anual de auditoria interna; d) Elaborar anualmente um relatório sobre a atividade desenvolvida, em que se refiram os controlos efetuados, as anomalias detetadas e as medidas corretivas a adotar. 3 - A direção do serviço de auditoria interna compete a um auditor interno, que exerce as respetivas funções pelo período de cinco anos, renovável por iguais períodos, até ao limite máximo de três renovações consecutivas ou interpoladas, e que é apoiado tecnicamente nas suas funções por um máximo de três técnicos auditores. 4 - O auditor interno é recrutado pelo conselho de administração, de entre individualidades que reúnam os seguintes requisitos: a) Qualificação técnica, competências e experiência em auditoria; b) Inscrição no organismo nacional que regule a atividade de auditoria interna. 5 - Os técnicos que integrem o serviço de auditoria interna devem possuir curso superior adequado ao exercício das suas funções. (…) 9 - A não renovação ou cessação antecipada de funções do auditor interno ocorre por deliberação fundamentada do conselho de administração, precedida de comunicação ao membro do Governo responsável pela área da saúde, ou de quem, para o efeito, detenha poderes delegados. (…)».
Deste modo, por força do transcrito n.º 9 do art. 17º do DL n.º 233/2005, de 29/12 (vigente aquando do lançamento do concurso) e da natureza jurídica do R. CH..., quer a cessação antecipada, quer a não renovação da comissão de serviço do Auditor Interno, carecem de deliberação fundamentada por parte do respectivo CA.
E apesar da posterior revogação do citado DL n.º 233/2005, de 29/12, idêntica imposição passou a constar do art. 19º n.º 9 dos Estatutos dos Hospitais, Centros Hospitalares e Institutos Portugueses de Oncologia, EPE, publicados no Anexo II ao DL n.º 18/2017, de 10/02.
Estando a necessidade de fundamentação da deliberação da cessação da comissão de serviço do Auditor Interno em consonância com as regras gerais vigentes no direito administrativo, designadamente com o disposto no art. 152º n.º 1 al. a) do Código do Procedimento Administrativo (CPA), de acordo com o qual devem ser fundamentados os actos administrativos que, total ou parcialmente, neguem, extingam, restrinjam ou afetem, por qualquer modo, direitos ou interesses legalmente protegidos.
Essa fundamentação deve ser enunciada de forma clara, de modo a poderem determinar-se, de modo inequívoco, o sentido, alcance e efeitos jurídicos do ato, em conformidade com o disposto no art. 151º n.ºs 1, al. d) e 2 do CPA.
Estabelecendo o artigo 153º do CPA que «1 - A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituem, neste caso, parte integrante do respetivo ato. 2 - Equivale à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato. (…)».
Sintetizando, o que verdadeiramente importa é que a fundamentação permita ao destinatário da decisão conhecer e perceber as razões que em concreto a motivaram, de modo a estar em condições de avaliar, de forma consciente, se com ela se conforma ou não.”
Num outro segmento, concluiu ainda, em suma o Apelante:
– Na perspetiva do Recorrente, tendo desempenhado o seu trabalho devidamente, seria de prever a renovação da comissão de serviço, pelo menos mais uma vez, o que se demonstrou pela inexistência de qualquer indicação ao mau exercício das funções na deliberação de não renovação.
- A não renovação do contrato de comissão de serviço do Recorrente, em 25 de Junho de 2020, é inválida, por violar o disposto no artigo 268º, nº 3 da Constituição da República, quanto ao específico dever de fundamentação.
- A ARSC entendendo verificada alguma irregularidade no Concurso no âmbito do qual o Recorrente foi admitido como Auditor Interno devia, para que se decidisse se efetivamente existiu ou não, ter diligenciado junto dos Tribunais. O Conselho de Administração do CH... não podia considerar numa deliberação alegadas irregularidades num procedimento concursal, ocorrido há mais de 3 anos, se inexistiu qualquer reclamação e se esse processo se consolidou na ordem jurídica.
– Neste contexto, a não renovação do contrato de comissão de serviço celebrado com o Recorrente que não deixa de ser um contrato de trabalho, renovável por períodos de 3 anos, salvo existência de fundamento para a não renovação, em virtude da fundamentação em que assenta, é manifestamente nula, nos termos dos artigos 116º e 163º, do CPA, por violar princípios de direito constitucional, em especial, os princípios da legalidade, da proporcionalidade, da certeza e segurança jurídicas, e de forma nítida, o da separação de poderes.
Vejamos o que a este respeito foi ponderado na sentença recorrida, para além do enquadramento legal que se deixou já transcrito:
“No caso, lendo a deliberação do CA do R. CH..., que decidiu pela não renovação do contrato de comissão de serviço firmado com o A., percebe-se que se deveu ao facto do procedimento concursal que culminou com a contratação do A. ter sido alvo de um processo de averiguações por parte da ARSC, originada por uma exposição anónima dirigida ao Ministério da Saúde; que o parecer emitido pela ARSC foi no sentido de que o procedimento concursal enfermou de diversas irregularidades; que com base no parecer jurídico interno que pediu, o R. CH... concluiu que se encontrava precludida, pelo decurso do prazo, a possibilidade de anulação administrativa da lista de ordenação final dos candidatos; mas chegada a altura da eventual renovação da comissão de serviço, entendeu o CA do R. CH... que essa renovação afrontaria os princípios da transparência, imparcialidade e da boa-fé e constituiria uma aprovação tácita da manutenção de um processo de recrutamento afectado de irregularidades.
O «parecer emitido pela ARSCentro, IP, conforme ofício n.º ...58, de 13/06/2018», a que a deliberação faz expressa menção, não terá acompanhado a notificação da deliberação ao A., que teve lugar em 29/06/2020 (cfr. fls. 178 dos autos). Mas foi entregue ao A. pelo R. CH... cópia do parecer, poucos dias depois, em 06/07/2020, como está documentado a fls. 183 v.º dos autos. Ficando o A. em condições, a partir daí, de conhecer as razões de facto e de direito que motivaram a deliberação e de contra ela reagir - como veio efectivamente a fazer, mediante a propositura da presente acção.
Razão pela qual não ocorre a falta de fundamentação invocada pelo A., nem a deliberação padece, a nosso ver, de vício passível de gerar a sua nulidade ou anulabilidade, nos termos dos arts. 161º e 163º do CPA.
E apesar do R. CH... só depois de tomada a decisão de não renovar o contrato de Auditor Interno com o A., a comunicou à ARSC e a ACSS - e não antes, como prevê o art. 19º n.º 9 dos Estatutos dos Hospitais, Centros Hospitalares e Institutos Portugueses de Oncologia, EPE, publicados no Anexo II ao DL n.º 18/2017, de 10/02 - tal falha não é de molde a afectar a validade da deliberação, que não dependia de consentimento, aprovação ou parecer prévio das referidas entidades.” (realce e sublinhado introduzidos) Não merece reparo o assim ponderado.
Uma coisa é o procedimento concursal para recrutamento de Auditor Interno, em regime de comissão de serviço, em que o Apelante ficou graduado em primeiro lugar, (resultado homologado em 28/03/2017), se ter, como aquele refere, “consolidado na ordem jurídica”, por decurso do prazo de anulação administrativa da lista de ordenação final dos candidatos.
Outra, é a alegada falta de fundamentação, na decisão de não renovação do contrato de comissão de serviço, por aí se ter atendido ao parecer emitido pela ARSC, no sentido de que aquele procedimento concursal enfermou de diversas irregularidades e se ter considerado aí que “essa renovação afrontaria os princípios da transparência, imparcialidade e da boa-fé e constituiria uma aprovação tácita da manutenção de um processo de recrutamento afetado de irregularidades.”
Pode não se concordar com a fundamentação, mas daí não é possível concluir-se pela sua falta.
Em suma, não tem razão o Apelante, atenta a forma como ficou fundamentada, em nosso entender, com justificada transparência, a decisão de não renovação do contrato de comissão de serviço.
Outrossim não ocorre a violação de «Direitos e garantias dos administrados», nos termos consagrados no artigo 268º, nº3 da Constituição da República Portuguesa.
Como ficou dito na sentença recorrida, o Autor teve a possibilidade de se insurgir quanto à fundamentação da decisão de não renovação do contrato de comissão de serviço, concretamente quanto às irregularidades apontadas no parecer e a que tal deliberação faz expressa menção, uma vez que lhe foi assegurado o acesso ao teor do mesmo parecer.
Aliás, excluir o conteúdo do mesmo parecer aquando da ponderação da renovação da comissão de serviço – pressupondo que as irregularidades pondo em causa “os princípios da transparência, imparcialidade e da boa-fé” não tivessem sido identificadas – seria sim impedir que nesse momento da renovação, se obviasse/pusesse cobro, às mesmas irregularidades tidas como verificadas naquela decisão, com referência para o mesmo parecer.
Em suma, implicaria que a renovação fosse “uma aprovação tácita da manutenção de um processo de recrutamento afetado de irregularidades”, a nosso entender inadmissível também pelo que mais por diante se salienta na sentença recorrida, a propósito do conteúdo do aviso através do qual o concurso foi publicitado, “(…) embora o A. não tenha responsabilidade alguma pelo erro existente no anúncio, a sua admissão ao concurso e graduação em primeiro lugar podem efetivamente ter sido condicionadas pela inobservância dos requisitos legais e regulamentares estabelecidos nessa matéria, como se refere no parecer da ARSC, tanto mais que pelo menos um dos candidatos (no caso, a testemunha KK) exercia as funções de Auditor Interno no Hospital 5... desde 2011, ao passo que o A., como se refere no parecer, não as poderia ter exercido, por incompatibilidade de cargos, enquanto foi Presidente do CA do Hospital ... (desde 2013 até ocupar o cargo de Auditor Interno do R.), e só terá tirado o curso de auditoria em 2014, pelo que não teria qualificação técnica para as ter exercido antes. Tendo-se efetivamente provado que antes de se candidatar ao referido concurso, o A. nunca tinha exercido as funções de auditor.” (sublinhado introduzido)
Justifica-se assim acompanhar o sentenciado no sentido de que “Com a não renovação da comissão de serviço - que era na modalidade externa e sem garantia de emprego após a cessação - cessou concomitantemente o vínculo laboral que o A. manteve com o R. CH... (…)”.
Entendendo ainda que não se verifica a apontada violação do artigo 53º da Constituição da República Portuguesa, na garantia constitucional do direito à «Segurança no emprego».
Noutro segmento conclui o Apelante:
- A sua remuneração foi mal calculada, porque devia corresponder a 80% do valor ilíquido auferido pelos vogais do CA a título de retribuição base e suplementos, e não apenas 80% do valor da retribuição base. Carece também nesta parte de razão.
Nada de relevante se justifica acrescentar à fundamentação consignada na sentença que se transcreve:
“Defendendo o A. que a sua remuneração foi mal calculada, porque devia em seu entender corresponder a 80% do valor ilíquido auferido pelos vogais do CA a título de retribuição base e suplementos - e não apenas a 80% do valor da retribuição base.
Segundo publicitava o aviso do concurso, no seu ponto 5, «O vencimento mensal é fixado nos termos previstos no n.º 10, do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 233/2005, 29 de dezembro, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 244/2012, de 09 de novembro.».
Dispunha o citado normativo que «A retribuição mensal ilíquida do auditor interno, incluindo suplementos remuneratórios, não pode ser superior a 85% do vencimento mensal ilíquido estabelecido para o vogal do conselho de administração».
Disposição idêntica à que passou depois a constar do n.º 10 do art. 19º dos Estatutos publicados no Anexo II ao DL n.º 18/2017, de 10/02, dela se extraindo, apenas, que a retribuição ilíquida do auditor interno, entendida em sentido lato (incluindo suplementos remuneratórios) tinha o limite máximo que nela se refere.
Na sequência da conclusão do procedimento concursal, o Serviço de Recursos Humanos do R. CH... remeteu ao respetivo CA, em 4 de Abril de 2017, pedido de autorização para a celebração do respetivo contrato com o candidato classificado em primeiro lugar (no caso, o aqui A.), bem como a fixação da remuneração mensal ilíquida, aí assinalando que «não poderá ser superior a 85% do vencimento mensal ilíquido estabelecido para o Vogal do Conselho de Administração, tendo assim como limite máximo o valor de 2.918,59€ (3.433,64 x 85%)».
E no dia 27/04/2017, a Técnica Superiora de Recursos Humanos do R. CH..., EE, remeteu email ao A., com o teor transcrito no n.º 11 dos factos provados, através do qual lhe deu conhecimento da deliberação do CA de 05/04/2017, que fixou a remuneração do A. em «80% (2746,91€) do Vogal do CA».
Vindo no dia 05/09/2017 a ser assinado pelas partes o contrato de comissão de serviço, em cuja Cláusula 3ª se estabeleceu o pagamento da referida retribuição mensal ilíquida de € 2.746,91, a que acresceria um subsídio de refeição diário previsto para os trabalhadores titulares de contratos de trabalho em funções públicas.
À data da celebração da contrato de comissão de serviço, os vogais do R. CH... tinham a Remuneração de € 3.433,64, 14 vezes por ano, mais despesas de representação no valor mensal de € 1.373,46 euros, 12 vezes por ano.
O A. recebeu efetivamente a retribuição mensal ilíquida de € 2.746,91 e enquanto durou a comissão de serviço, nada reclamou em relação a isso.
Esses € 2.746,91 correspondiam a 80% da retribuição base mensal ilíquida de um vogal do CA, não subsistindo dúvidas que foi esse o montante que o CA do R. CH... entendeu fixar, no âmbito das suas competências e que foi essa a remuneração contratada pelas partes.
Pelo que não há sustentação alguma para se considerar, como pretende o A., que tem direito a retribuição superior, correspondente a 80% da soma da retribuição base com as despesas de representação auferidas por um vogal do CA.” (sublinhado introduzido) Improcede também nesta parte a Apelação.
Entende ainda o Recorrente que não se pode concluir que tenha laborado em regime de horário flexível, pois não se pode confundir a flexibilidade com a isenção de horário, concedida esta por via das funções e expectável por via desse exercício.
Bastando-nos, uma vez mais, como explicação para tal conclusão, com a decisão recorrida:
“Alega o A. que trabalhava em regime de isenção de horário de trabalho e que lhe é devida, por essa razão, a respetiva retribuição, que quantifica no montante global de € 12.012,84.
Estabelece o art. 218º n.º 1 que por acordo escrito, pode ser isento de horário de trabalho o trabalhador que se encontre numa das situações aí especificamente previstas, podendo essa isenção revestir qualquer uma das três modalidades enunciadas no n.º 1 do art. 219º, a saber: a) Não sujeição aos limites máximos do período normal de trabalho; b) Possibilidade de determinado aumento do período normal de trabalho, por dia ou por semana; c) Observância do período normal de trabalho acordado.
Implicando o trabalho em regime de isenção de horário o pagamento de uma retribuição especial, nos termos previstos no art. 265º. No caso concreto, não se demonstrou que o A. alguma vez tenha trabalhado em regime de isenção de horário de trabalho ou tenha acordado com o R. trabalhar nesses termos.
Em matéria de tempo de trabalho, consta apenas do contrato de comissão de serviço, na sua cláusula 4ª, que o período normal de trabalho semanal era de 40 horas e que o horário de trabalho seria elaborado pelo R., dentro dos termos e limites legais, de acordo com a organização e o esquema de funcionamento do serviço em que o A. iria exercer as suas funções.
Tendo o A., em 17/11/2017, requerido ao R. CH... a flexibilidade de horário de trabalho, «(…) para entrar e sair ou meia hora mais cedo ou meia hora mais tarde», por «(…) dificuldades de transporte ficando dependente de acessibilidade, desde casa ou trabalho, aos horários praticados nos transportes públicos», obtendo como resposta que «o estatuto do auditor interno confere-lhe o uso de horário flexível, pelo que parece não carecer de autorização».
A possibilidade de entrar e sair ou meia hora mais cedo ou meia hora mais tarde, foi requerida pelo A., por razões da própria conveniência, não tendo enquadramento em nenhuma das modalidades previstas no n.º 1 do art. 219º para a isenção de horário de trabalho.
Pelo que nada tem o A. direito a receber, desta proveniência.” (sublinhado introduzido) Adere-se, como adianto, integralmente a tal fundamentação, improcedendo também a este respeito a pretensão do Apelante.
A derradeira questão a analisar é se, por via do princípio da igualdade, não é legalmente admissível a invocada diferenciação relacionada com os tempos de trabalho, concluindo o Apelante que uns trabalhadores foram admitidos por concurso para cargos em exercício de comissão de serviço para laborem em regime de 35 horas e outros em regime de 40 horas, com a mesma remuneração, o que viola o preceituado nos artigos 23º, 24º nº 1 e 25º nº 1, 5 e 6 do Código do Trabalho.
Salientamos, desde logo que “Na verdade, o princípio constitucional da igualdade não significa uma exigência de igualdade absoluta em todas as situações, nem proíbe diferenciações de tratamento.
Como ensinam Gomes Canotilho e Vital Moreira, «[o] que se exige é que as medidas de diferenciação sejam materialmente fundadas sob o ponto de vista da segurança jurídica, da proporcionalidade, da justiça, da praticabilidade e da solidariedade e não se baseiem em qualquer motivo constitucionalmente impróprio. As diferenciações de tratamento podem ser legítimas quando:
a) - se baseiam numa distinção objetiva de situações;
b) - não se fundamentam em qualquer dos motivos indicados no n.º 2 do art. 13º;
c) - tenham um fim legítimo segundo o ordenamento constitucional positivo;
d) – se revelem necessárias, adequadas e proporcionadas à satisfação do seu objetivo.”
(…)
(…) o princípio da igualdade no trabalho, designadamente em matéria de retribuição, faz apelo a uma igualdade material (deve tratar-se de igual modo o que é essencialmente igual e de forma desigual o que é desigual), (…).
(…)» - Acórdão da Relação de Guimarães de 17.12.2018, proferido no processo nº 6196/16.2T8GMR.G1 (Relatora Desembargadora Alda Martins (inwww.dgsi.pt).
Foi esta, nesta parte, a fundamentação da sentença:
“A Lei n.º 18/2016, de 01/07, entrada em vigor em 01/07/2016, veio definir as 35 horas de trabalho como limite máximo semanal dos períodos normais de trabalho dos trabalhadores da função pública, salvaguardando no seu art. 4º que «Da redução do tempo de trabalho prevista na presente lei não pode resultar para os trabalhadores a redução do nível remuneratório ou qualquer alteração desfavorável das condições de trabalho.».
Por força da entrada em vigor da citada lei, o art. 105º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP) passou a estabelecer que «1 - O período normal de trabalho é de: a) Sete horas por dia, exceto no caso de horários flexíveis e no caso de regimes especiais de duração de trabalho; b) 35 horas por semana, sem prejuízo da existência de regimes de duração semanal inferior previstos em diploma especial e no caso de regimes especiais de duração de trabalho. 2 - O trabalho a tempo completo corresponde ao período normal de trabalho semanal e constitui o regime regra de trabalho dos trabalhadores integrados nas carreiras gerais, correspondendo-lhe as remunerações base mensais legalmente previstas. 3 - A redução dos limites máximos dos períodos normais de trabalho pode ser estabelecida por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, não podendo daí resultar para os trabalhadores a redução do nível remuneratório ou qualquer alteração desfavorável das condições de trabalho.».
Acontece que o contrato de comissão de serviço que o A. mantinha com a R., celebrado já na vigência da Lei n.º 18/2016, de 01/07, é regulado pelo direito laboral privado, concretamente pelas normas do Cód. do Trabalho, não lhe sendo diretamente aplicável a citada lei, que se dirige especificamente aos trabalhadores da função pública, nem a LGTFP.
Não obstante, como decorre do n.º 3 do art. 105º da LGTFP, a redução do período normal de trabalho semanal para as 35 horas pode ser estabelecida por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.
Foram publicados no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE) n.º 23, de 22/06/2018, Acordos Coletivos de Trabalho (ACT) outorgados entre o R. CH... e outros, do lado dos empregadores; e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais - FNSTFPS, o Sindicato dos Trabalhadores da Administração Pública e de Entidades Com Fins Públicos - SINTAP, o Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado e Entidades com Fins Públicos - STE, a Associação Sindical do Pessoal Administrativo da Saúde - ASPAS e o Sindicato Independente dos Técnicos Auxiliares de Saúde - SITAS, por banda dos trabalhadores. Os referidos ACT vieram tornar aplicáveis a trabalhadores com contrato individual de trabalho de direito privado, determinadas regras específicas dos trabalhadores titulares de contrato de trabalho em funções públicas, nomeadamente - e no que agora releva - respeitantes ao tempo de trabalho, estabelecendo a Cláusula 11.ª n.º 1 dos ACT que «1- O período normal de trabalho é o previsto na Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aplicável a trabalhadores com vínculo de emprego público, integrados em carreiras gerais.».
Sucede que, como resulta do disposto na Cláusula 1.ª n.º 2, que rege sobre o respetivo âmbito de aplicação, os ACT em questão obrigam apenas, por um lado, as entidades públicas empresariais prestadoras de cuidados de saúde e integradas no SNS que os subscrevem (como é o caso do aqui R. CH...); e por outro lado, os trabalhadores que desenvolvam funções correspondentes às estabelecidas para as carreiras de técnico superior, assistente técnico e assistente operacional, a elas vinculados por contrato de trabalho de direito privado, que sejam representados pelas associações sindicais outorgantes.
De acordo com o princípio da dupla filiação, consagrado no art. 496º, as convenções coletivas de trabalho (de que os ACT constituem uma modalidade) abrangem apenas os empregadores e os trabalhadores inscritos nas associações signatárias.
Pelo que, para que se possa concluir que uma relação laboral é regulada por uma determinada convenção coletiva de trabalho, torna-se necessário que as partes se encontrem inscritas nas associações representativas que a outorgaram. Ou então, que exista portaria de extensão que, nos termos permitidos pelo art. 514º, estenda a sua aplicabilidade aos empregadores do mesmo sector de atividade e a trabalhadores da mesma profissão ou profissão análoga.
No caso, não se provou - nem tão pouco foi alegada - a filiação do A. em nenhuma das associações representativas de trabalhadores que outorgaram os ACT em apreço.
Consequentemente, não pode concluir-se pela aplicabilidade dos ACT à relação laboral que vinculou o A. e o R. CH..., nem, por essa via, que o limite máximo do período normal de trabalho semanal do A. fosse de 35 horas.
O A. argumenta que se sente discriminado em relação a outros trabalhadores que alega terem sido admitidos por concurso para cargos em exercício de comissão de serviço, que ficaram sujeitos ao horário de 35 horas semanais, sem redução remuneratória.
Porém, apenas se provou a esse respeito que o R. CH... celebrou um contrato de trabalho com um jurista, onde foi estabelecido um horário de trabalho de 35 horas.
Desconhecendo-se que tipo de vínculo foi em concreto acordado entre o referido trabalhador e o R. (nomeadamente se contrato de trabalho em funções públicas, ou contrato de trabalho de direito privado), não pode afirmar-se que a situação é equiparável à do A.. E mesmo admitindo que se trata de contrato de trabalho de direito privado, não se sabe se o trabalhador em questão é ou não filiado nalguma das associações representativas dos trabalhadores, nem por consequência, se os ACT lhe são ou não aplicáveis.
Pelo que não há elementos de facto que permitam afirmar que o A. foi negativamente discriminado em relação a outro que estava nas mesmas condições ou em situação equiparável.
Razões pelas quais improcede o pedido, também nesta parte.”
Nada há a apontar quanto ao julgado não poder “concluir-se pela aplicabilidade dos ACT à relação laboral que vinculou o A. e o R. CH..., nem, por essa via, que o limite máximo do período normal de trabalho semanal do A. fosse de 35 horas.”
O artigo 496º do Código do Trabalho consagra o princípio da dupla filiação, ou seja, as Convenções Coletivas de Trabalho abrangem apenas os empregadores e os trabalhadores inscritos nas associações signatárias.
Pelo que, para que se possa aferir que uma relação laboral é regulada por uma determinada CCT, torna-se necessário que as partes se encontrem inscritas nas associações representativas que a outorgaram, a não ser que exista Regulamento de Extensão que, nos termos permitidos pelo artigo 514º do Código de Trabalho estenda a sua aplicabilidade aos empregadores do mesmo sector de atividade e a trabalhadores da mesma profissão ou profissão análoga.
Ser ou não o Trabalhador sócio ou membro das Associações representativas de trabalhadores que outorgaram os ACT identificados na sentença recorrida, era matéria relevante para se aferir sobre a sua aplicabilidade.
Não tendo sido matéria alegada pelo Autor, não se impunha ao Mm.º Juiz a quo, assumir um papel mais interventivo e no âmbito dos respetivos poderes inquisitórios – artigo 411º do Código de Processo Civil -, sobre tal matéria recolher os elementos comprovativos de que o Trabalhador era ou não sócio ou membro das mesmas Associações - pelos meios legalmente previstos e suscetíveis de serem utilizados. (não se tratando assim de situação idêntica à colocada no Acórdão proferido nesta secção em 07.10.2019, no processo nº 1575/16.8T8VLG.P1, mesma relatora, com intervenção como Adjuntos da Desembargadora Fernanda Soares e do Conselheiro Domingos Morais).
Foi ainda ponderado na sentença recorrida que “não há elementos de facto que permitam afirmar que o A. foi negativamente discriminado em relação a outro que estava nas mesmas condições ou em situação equiparável.”
Com efeito, o Autor não invocou um tratamento desigual por parte do Réu “(…) assente em ascendência, idade, sexo, orientação sexual, identidade de género, estado civil, situação familiar, situação económica, instrução, origem ou condição social, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência, doença crónica, nacionalidade, origem étnica ou raça, território de origem, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas, filiação sindical ou outra categoria subjetiva que comungue de idêntico desvalor ético ou social.
(…)
Assim, não estando em causa a invocação de tratamento discriminatório em sentido próprio, tal como definido e entendido nos arts. 23.º, n.º 1, als. a) e b), 24.º, n.º 1 e 25.º, n.ºs 1 e 5 do Código do Trabalho (…), cabia aos autores demonstrar, nos termos do art. 342.º, n.º 1, do Código Civil, os factos constitutivos do direito alegado, (…)” – supra já citado Acórdão da Relação de Guimarães de 17.12.2018.
Em concreto, ficou apenas provado que o Réu CH... celebrou um contrato de trabalho com um jurista, onde foi estabelecido um horário de trabalho de 35 horas. (item 54 dos factos provados).
Não se mostra possível de tal facto aferir que o Réu assumiu, uma prática discriminatória, ou seja, sem critério diferenciador objetivo e atendível, no que concerne aos tempos de trabalho, um tratamento distinto e desvantajoso para com o Autor, admitido por concurso para cargo em exercício de comissão de serviço, relativamente aquele trabalhador, o que foi também bem julgado na sentença recorrida:
“Desconhecendo-se que tipo de vínculo foi em concreto acordado entre o referido trabalhador e o R. (nomeadamente se contrato de trabalho em funções públicas, ou contrato de trabalho de direito privado), não pode afirmar-se que a situação é equiparável à do A.. E mesmo admitindo que se trata de contrato de trabalho de direito privado, não se sabe se o trabalhador em questão é ou não filiado nalguma das associações representativas dos trabalhadores, nem por consequência, se os ACT lhe são ou não aplicáveis.”
Em conformidade, entende-se que não há que considerar a prestação de trabalho suplementar durante a vigência do contrato, no que excedeu o tempo de 35 horas semanais de trabalho, pelo cumprimento das 40 horas semanais de trabalho que o Autor se comprometeu a prestar, nos termos previstos na 4ª Cláusula do Contrato de Comissão de serviço, celebrado com o Réu, CH....
Improcede, em conformidade, a Apelação.
3. Decisão:
Em conformidade, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.
Custas pelo Apelante.
Porto, 5 de Novembro de 2024.
Teresa Sá Lopes (relatora)
Nélson Fernandes
Germana Lopes Ferreira