ACÇÃO POPULAR
INDEFERIMENTO LIMINAR
MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA
INFORMAÇÃO
PUBLICIDADE
REENVIO
Sumário

- De acordo com o art. 13º da Lei 83/95, regula o Direito de Participação Procedimental e Acção Popular (LPA), a petição deve ser indeferida quando o julgador entenda que é manifestamente improvável a procedência do pedido e feitas preliminarmente as averiguações que o julgador tenha por justificadas ou que o autor ou o Ministério Público requeiram;
- A manifesta improcedência do pedido que legitima o indeferimento liminar, analisada caso a caso, implica o juízo de inviabilidade da acção, contendendo com o seu mérito e não com requisitos de forma; para que assim seja, a alegação dos factos e razões de direito expostas na petição são sujeitas a uma averiguação sumária que culminará com uma pronúncia antecipatória quanto ao mérito da acção, se esta se mostra viável ou não atentas as possíveis soluções de direito;
- Num despacho de indeferimento liminar da petição inicial, necessariamente produzido numa fase anterior à citação e produção de prova (cfr. arts. 15º a 17º da LAP), não tinham de ser fixados factos provados e não provados; na apreciação antecipatória sobre a viabilidade do mérito da acção, o juiz basta-se com os factos alegados pelo autor;
- O documento que serve de base à acção é uma “informação” ou “publicidade” dos serviços da Ré, retirada da página da internet da Ré e, apesar de se referir a garantias, trocas e devoluções de equipamento por ela comercializados, não a vincula, na medida em que não existe qualquer declaração negocial, qualquer contrato ou compromisso do qual resulte a imposição de uma política quanto a garantias, trocas e devoluções;
- Mesmo que estivesse em causa uma publicidade ilícita (nos termos do art. 12º do DL 330/90), sempre teriam de estar alegados os eventuais danos decorrentes da mesma, passíveis de indemnização (ao abrigo do art. 30º do mesmo DL), o que não acontece nos autos;
- Não faz qualquer sentido o apelo ao art. 51º do DL 84/2001 que se refere ao “acordo ou cláusula contratual pelo qual se excluam ou limitem os direitos do consumidor” previstos no decreto lei, nem tão pouco ao Regime das Cláusulas Contratuais Gerais (DL 446/85 de 25 de Outubro), na medida em que não está alegada a celebração de qualquer contrato; assim, a referida “informação” veiculada pela Ré na sua página da internet, não configura uma cláusula contratual geral referente à garantia de qualquer um dos produtos comercializados pela Ré, não podendo proceder o pedido de “nulidade da cláusula em crise”;
- O processo de reenvio de uma ou mais questões a título prejudicial, para interpretação de uma ou mais normas jurídicas de direito comunitário, originário ou derivado, pressupõe a existência dúvidas sobre a interpretação do texto em causa; se, pelo contrário, o texto é perfeitamente claro, não se trata de interpretar, mas sim de o aplicar, o que é da competência do Tribunal incumbido da competência de julgar o caso concreto aplicando a lei, a nacional e/ou a comunitária se for esse o caso.

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa

I - Relatório
A autora A... e Autores Populares intentaram contra B... a presente acção popular, pedindo a final:
deve a presente ação ser julgada procedente, por provada, e ser declarado que a ré: A. teve o comportamento descrito no §3 supra;
B. violou qualquer uma das seguintes normas:
1. dos artigos 12 (1) e 13 (1), do decreto-lei 84/2021;
2. dos artigos 3 (a) (e) (f), 4 e 9 (1) da lei 24/96;
3. dos artigos 12 e 15, do decreto-lei 446/85;
4. dos artigos 473 e 483, do Código Civil (“CC”);
5. dos artigos 10 (1) e 11 (1), da diretiva (UE) 2019/771;
6. do artigo 3, da diretiva 93/13/CE.
C. teve o comportamento supra descrito em qualquer um dos pedidos anteriores e que o mesmo é ilícito e
1. doloso; ou, pelo menos,
2. grosseiramente negligente;
D. agiu com culpa e consciência da ilicitude no que respeita aos factos supra referidos, com os autores populares;
E. com a totalidade ou parte desses comportamentos lesou gravemente os interesses dos autores populares, nomeadamente os seus interesses económicos e sociais, designadamente os seus direitos enquanto consumidores;
F. causou danos aos interesses difusos de proteção do consumo de bens e serviços; e em consequência, deve a ré ser condenada a:
G. a indemnizar integralmente os autores populares pelos danos que lhes foram causados por estas práticas ilícitas nos últimos dois anos (a contar da entrada da ação em juízo) e no que respeita à redução do prazo da garantia, em montante global:
1. a determinar nos termos do artigo 609 (2), do CPC;
2. acrescido de juros vencidos e que se vencerem, à taxa legal em vigor a cada momento, contados desde de a data em que as práticas consideradas ilícitas foram praticadas, até ao seu integral pagamento, tendo como base para o cálculo dos juros os valores que a ré for condenada a indemnizar os autores populares pelo sobrepreço;
3. e com método para determinação e distribuição de indemnizações individuais determinado pelo tribunal;
H. subsidiariamente ao ponto anterior, ser a ré condenada a indemnizar integralmente os autores populares pelos danos que lhes foram causados por estas práticas ilícitas, no que respeita à redução do prazo da garantia, em montante global:
1. a fixar por equidade, nos termos do artigo 496 (1) e (4) do CC, determinado em 20 % da sua faturação anual, desde 20.09.2021;
2. acrescido de juros vencidos e que se vencerem, à taxa legal em vigor a cada momento, contados desde a data em que as práticas consideradas ilícitas foram praticadas até ao seu integral pagamento, tendo como base para o cálculo dos juros os valores que a ré for condenada a indemnizar os autores populares nos termos da alínea anterior;
3. e com método para determinação e distribuição de indemnizações individuais determinado pelo tribunal.
I. subsidiariamente ao ponto anterior, ser a ré condenada a indemnizar integralmente os autores populares pelos danos que lhes foram causados por estas práticas ilícitas, no que respeita à redução do prazo da garantia, em montante global a apurar em liquidação de sentença, caso tais danos não possam de imediato serem apurados.
J. ser a ré condenada a indemnizar integralmente os autores populares pelos danos morais causado pelas práticas ilícitas, em montante global:
1. a fixar por equidade, nos termos do artigo 496 (1) e (4) do CC, mas nunca inferior a 10 euros por autor popular;
2. acrescido de juros vencidos e que se vencerem, à taxa legal em vigor a cada momento, contados desde a data em que as práticas consideradas ilícitas foram praticadas até ao seu integral pagamento, tendo como base para o cálculo dos juros os valores que a ré for condenada a indemnizar os autores populares pelos danos morais;
3. e com método para determinação e distribuição de indemnizações individuais determinado pelo tribunal;
K. ser a ré condenada a indemnizar integralmente os autores populares, in casu, todos os consumidores em geral, medidos por agregados familiares privativos, pelos danos de distorção da equidade das condições de concorrência, e montante global:
1. nos termos do artigo 9 (2) da lei 23/2018 ou por outra medida, justa e equitativa, que o tribuna considere adequada, mas nunca menos que 1 euro por autor popular, in casu, agregados familiares privativos;
2. acrescido de juros vencidos e que se vencerem, à taxa legal em vigor a cada momento, contados desde a data em que as práticas consideradas ilícitas foram praticadas até ao seu integral pagamento, tendo como base para o cálculo dos juros os valores que a ré for condenada a indemnizar os autores populares pelos danos de distorção da equidade das condições de concorrência;
3. e com método para determinação e distribuição de indemnizações individuais determinado pelo tribunal;
L. ser a ré condenada a pagar todos os encargos que a autora representante da classe tiver ou venha ainda a ter com o processo e com eventual incidente de liquidação de sentença, nomeadamente, mas não exclusivamente, com os honorários advocatícios, pareceres jurídicos de professores universitários, pareceres e assessoria necessária à interpretação da vária matéria técnica [tanto ao abrigo do artigo 480 (3), do CPC, como fora do mesmo preceito], que compreende uma área de conhecimento jurídico-económico complexa e que importa traduzir e transmitir com a precisão de quem domina a especialidade em causa e em termos que sejam acessíveis para os autores e seu mandatário, de modo a que possam assim (e só assim) exercer eficazmente os seus direitos, nomeadamente de contraditório, e assim como os custos com o financiamento do litígio (litigation funding) que venha a ser obtido pela autora representante da classe;
M. porque o artigo 22 (2), da lei 83/95, estatui, de forma inequívoca e taxativa, que deve ser fixada uma indemnização global pela violação de interesses dos titulares ao individualmente identificados, mas por outro lado é omissa sobre quem deve administrar a quantia a ser paga, nomeadamente quem deve proceder à sua distribuição pelos autores representados na ação popular, vêm os autores interveniente requerer que declare que A..., agindo como autora representante da classe neste processo e em representação dos restantes autores populares, têm legitimidade para exigir o pagamento das supras aludidas indemnizações, incluindo requerer a liquidação judicial nos termos do artigo 609 (2), do CPC e, caso a sentença não seja voluntariamente cumprida, executar a mesma, sem prejuízo do requerido nos pontos seguintes.
subsidiariamente, e nos termos do §4 (j),:
N. o comportamento da ré, tido com todos os autores populares e descritos no §3, subsidiariamente, para o caso de não se aplicar nenhum dos casos supra, deve ser considerado mediante o instituto do enriquecimento sem causa e os autores populares indemnizados pela redução do prazo da garantia , tal como sustentando em § 4 (j) supra.
em qualquer caso, deve:
O. o comportamento da ré, tido com todos os autores populares e descritos no §3, sempre deve ser considerado com abuso de direito e, em consequência, paralisado e os autores populares indemnizados por todos os danos que tal comportamento lhes causou em qualquer caso, deve:
P. ser declarada nula as cláusulas contratuais que eliminam a garantia ou a reduzem de três anos para um ano para bens como as baterias e carregadores.
requer-se ainda que Vossa Excelência:
Q. decida relativamente à responsabilidade civil subjetiva conforme § 15, apesar de tal decorrer expressamente da lei 83/95, sem necessidade de entrar no pedido;
R. decida relativamente ao recebimento e distribuição da indemnização global nos termos do § 16, apesar de tal decorrer expressamente da lei 83/95, sem necessidade de entrar no pedido;
S. seja publicada a decisão transitadas em julgado, a expensas da parte vencida e sob pena de desobediência, com menção do trânsito em julgado, em dois dos jornais presumivelmente lidos pelo universo dos interessados, apesar de tal decorrer expressamente do artigo 19 (2), da lei 83/95, sem necessidade de entrar no pedido, e com o aviso da cominação em multa de € 100.000 (cem mil euros) por dia de atraso no cumprimento da sentença a esse respeito;
T. declare que a autora representante da classe tem legitimidade para representar os consumidores lesados na cobrança das quantias que a ré venha a ser condenada, nomeadamente, mas não exclusivamente, por intermédio da liquidação judicial das quantias e execução judicial de sentença;
U. declare, sem prejuízo do pedido imediatamente anterior, que a ré deve proceder ao pagamento da indemnização global a favor dos consumidores lesados diretamente à entidade designada pelo tribunal para proceder à administração da mesma tal como requerido em infra em §16, fixando uma sanção pecuniária compulsória adequada, mas nunca inferior a € 100.000 (cem mil euros) por cada dia de incumprimento após o trânsito em julgado de sentença que condene a ré nesse pagamento;
V. declare uma remuneração, com uma taxa anual de 5% sobre o montante total da indemnização global administrada, mas nunca inferior a € 100.000 (cem mil euros) nos termos do requerido infra em §16, a favor da entidade que o tribunal designar para administrar as quantias que a ré for condenada a pagar;
W. declare que a autora representante da classe tem direito a uma quantia a liquidar em execução de sentença, a título de procuradoria, relativamente a todos os custos que teve com a presente ação, incluindo honorários com todos os serviços prestados, tanto de advogados, como de técnicos especialistas, como com a obtenção e produção de documentação e custos de financiamento e respetivo imposto de valor acrescentado nos termos dos artigos 21 e 22 (5), da lei 83/95, sendo tais valores pagos exclusivamente daquilo que resultarem dos montantes prescritos nos termos do artigo 22 (4) e (5), da lei 83/95.
X. declare a autora representante da classe isenta de custas;
Y. condene a ré em custas”.
Para tanto, alega que a presente acção popular é uma acção de defesa dos direitos dos consumidores, que assenta na violação dos direitos destes e em práticas comerciais desleais, discriminando os seguintes factos:
- a ré dedica-se comercialmente à reparação de telemóveis, tablets, computadores e smartwatches, produtos estes que têm baterias;
- a ré, por intermédio das suas lojas da Ré, procede à reparação das baterias dos dispositivos eletrónicos supra referidos ou à sua substituição por novas ou recondicionais;
- a ré contabiliza mais de dez mil reparações por mês em equipamentos multimarca para os mais diversos tipos de avaria, incluindo baterias e carregadores;
- a ré, por intermédio de do seu sítio da internet e nas suas lojas da Ré espalhadas pelo país declara (sublinhado nosso) que os iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch recondicionados da Ré estão cobertos por garantia limitada de até 3 anos, excepto baterias (1 ano de garantia) (cf. documento 3 junto);
- ré não aceita reparar as baterias de iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch recondicionados por si, ao abrigo do direito de garantia, cuja falta de conformidade se manifesta depois de um ano a contar da entrega do bem;
- a ré, por intermédio de do seu sítio da internet e nas suas lojas espalhadas pelo país declara que a Garantia Limitada não abrange (…) as baterias, carregadores ou peças e acessórios específicos ao visual do equipamento. (cf. documento 3 junto);
- ré não aceita reparar as baterias ou carregadores que não sejam de iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch recondicionados por si, ao abrigo do direito de garantia, cuja falta de conformidade se manifesta até três anos a contar da entrega do bem;
- a ré adopta este comportamento para com todos os consumidores, seus clientes, os aqui autores populares.
Com base nestes factos, conclui que a ré viola os direitos dos consumidores na compra de bens e numa prática comercial desleal e restritiva da concorrência, sendo que nos termos do art. 51º, 1 do DL 84/2021, é nulo o acordo, informação ou cláusula contratual pelo qual se reduza o prazo de garantia estabelecido no art. 12º, nº 1 do DL 84/2021 e viola o disposto nos arts. 12º, 1 e 13º, nº 1 do DL 84/2021, arts. 3º, a), e) e f), 4º e 9º, nº 1 da Lei 24/96, 12º e 15º do DL 446/85 e arts. 473º e 483º do CC e os arts. 10º, 1 e 11º, 1 da Directiva (UE) 2019/771, 3º da Directiva 93/13/CE, Directiva 2014/104/UE – quanto às regras que regem às acções de indemnização por infracção do direito da concorrência, pelo que a presente acção é uma “acção de defesa dos direitos dos consumidores, para declaração de comportamento ilícito, a titulo doloso ou negligente, declaração de uma cláusula contratual como sendo proibida e por tanto nula e indemnização por danos causados aos consumidores representados por um comportamento da ré, violador das normas supra indicadas”, sendo que aqueles têm direito à reparação integral dos danos sofridos por violações de tais regras, a saber, os danos resultantes da redução do direito à garantia; danos morais; a distorção da equidade das condições de concorrência e, concomitantemente, danos para os consumidores em geral, danos esses causados de modo homogéneo a todos os autores populares, seja os que já conhecem a prática ilegal da ré e que os afectou, como aqueles que ainda não conhecem e aqueles que vão acabar por conhecer por via desta acção.
Com a petição inicial a autora A... e Autores Populares juntou o documento nº 3
Pesquisa
Garantia, Trocas e Devoluções
Política de Garantia dos Equipamentos Recondicionados da Ré
Todos os produtos comercializados na loja da Ré incluem uma garantia standard limitada ao abrigo do DL n.º 84/2021, de 21 de Outubro. Os iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch Recondicionados na loja da Ré estão cobertos por garantia limitada de até 3 anos, exceto baterias (1 ano de garantia).
O período da garantia tem início na data de compra. A fatura de compra original (recibo de venda), que inclui a data de compra, serve como prova de compra e garantia. Esta garantia cobre os encargos com peças de substituição e mão-de-obra necessários para restabelecer o bom funcionamento do equipamento.
A Garantia Limitada não abrange:
· Danos causados por água ou humidade, descargas eléctricas, pancadas e/ou quedas, danos físicos, ecrã partido, capa traseira partida, rachada ou torta.
· Danos cosméticos, como por exemplo, riscos e amolgadelas, teclas e símbolos das teclas arranhados, apagados ou descolorados, tampas e componentes de plástico, ou danos causados por má utilização, como por exemplo LCD partido ou manchas causadas por produtos abrasivos ou à base de álcool, ou marcas de pressão.
· Defeitos causados por desgaste normal (ex: riscos no ecrã, folgas, folgas em conectores usb, entradas de alimentação).
· Se o produto foi alterado, reparado e/ou modificado (incluindo ampliações) por pessoas não autorizadas.
· Intervenção por conta própria (incluindo ampliações) ou de terceiros e/ou reparações realizadas por técnicos não autorizados. As avarias e as consequências relacionadas à intervenção de uma empresa, ou conta própria, não autorizada pela da Ré, reparação ou tentativa de reparação, intervenção técnica por pessoas ou centros de reparação, alheias ao Departamento Técnico e os serviços da Ré.
· Se o número de serie do equipamento (IMEI), portátil, componentes ou acessórios forem alterados, cancelados ou removidos, ou tornados ilegíveis.
· Se o selo de garantia estiver rasgado ou alterado, qualquer equipamento ou peças do mesmo cujas etiquetas ou números de série tenham sido modificados ou tornados ilegíveis;
· Se há um dano causado por uma falha eléctrica externa, acidente, desastre natural, mau uso intencional ou acidental, abuso, negligência ou manutenção imprópria, ou uso sob condições anormais, em virtude da utilização do Equipamento para outro fim que não a sua utilização normal.
· Se há um dano causado por uma instalação indevida ou uma conexão incorrecta a um dispositivo periférico (impressora, leitor óptico, etc).
· Reparação de danos resultantes de uma causa externa ao aparelho (por exemplo, um acidente, choque, flutuação de corrente, oxidação, presença de areia, etc).
· Alteração, por motivos estéticos, de componentes, chassi e display não autorizadas pela loja da Ré.
· Danos causados por transporte efectuado pelo Cliente, ou terceiros em sua representação.
· A utilização nociva à conservação do aparelho.
· Instalação imprópria de software, e actualizações mal efectuadas ou não efectuadas quando o sistema operativo assim o solicita, mau funcionamento de software terceiro;
· Se há dano ou perda de qualquer programa, dados ou armazenamento removível, ou se há custos de recuperação de dados ou programas.
· Infecções por vírus informáticos, instalação e utilização de software não fornecido ou incorrectamente instalado. Desgaste normal e natural de produtos, incluindo consumíveis, peças que exigem uma substituição periódica durante a utilização normal do equipamento ou cuja vida útil possa ser inferior à duração da Garantia Limitada, incluindo, sem qualquer tipo de limitação, as baterias, carregadores ou peças e acessórios específicos ao visual do equipamento.
· Por questões de higiene, não são aceites auriculares.
O cliente poderá proceder à troca/devolução dos produtos adquiridos, num prazo máximo de 14 dias após a recepção dos equipamentos desde que:
· Os produtos não tenham sido utilizados.
· Os dispositivos mantenham as suas características originais e etiquetas intactas.
· Os produtos se encontrem completos. Todo o material (equipamento adquirido e acessórios, como por exemplo o carregador) que acompanha a encomenda deve ser devolvido, juntamente com a fatura.
· O equipamento não deverá apresentar qualquer dano causado pela má utilização do mesmo e deverá estar formatado com as definições de origem do dispositivo (sem código de desbloqueio e/ou iCloud desativa, no caso dos smartphones recondicionados).
O Cliente deverá solicitar a devolução da encomenda ou dos serviços de garantia
através do e-mail lojaonline@da Ré.pt indicando o(s) artigo(s) que quer devolver ou reparar, assim como o número ou referência da encomenda.
Após a receção do equipamento, a equipa especializada de técnicos da loja da Ré irá realizar um conjunto de testes, de forma a apurar o estado de conservação do dispositivo. Caso se verifique o cumprimentos de todos os requisitos, anteriormente mencionados, a da Ré poderá proceder das seguintes formas:
· Realizar o reembolso, no prazo de 10 (dez) dias úteis, os montantes pagos, através do mesmo método de pagamento anteriormente utilizado pelo cliente.
· Proceder à troca do dispositivo, caso surja algum problema com o equipamento, que não seja da responsabilidade do utilizador.
· Reparação do dispositivo, sem quaisquer custos adicionais, dos elementos protegidos pela bateria.
A loja da Ré reserva-se ao direito de não aceitar a devolução e de recusar o reembolso dos mesmos nos seguintes casos:
· Caso os artigos devolvidos estejam danificados, com marcas de uso ou gastos.
· Cujo Serial Number já tenha sido registado/associado a uma conta de utilizador.
A Ré não se responsabiliza por quaisquer danos resultantes de manuseamento inadequado, utilização indevida, negligências, desgaste por utilização habitual uma vez que este tipo de incidências não estão incluídas na garantia e anulam a mesma.
Estas condições são válidas para devoluções e trocas em Portugal.
Política de Entrega Pré-Reparação
A loja da Ré aconselha sempre a salvaguardar os seus dados antes de qualquer reparação realizada nas nossas instalações. Consulte a nossa política de pré-reparação.
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DEFINIÇÕES:
Equipamento Novo: 3 Anos de garantia limitada de acordo DL n.º 84/2021, de 21 de Outubro.
Equipamento Seminovo ou Usado: 2 Anos de garantia limitada de acordo DL n.º 84/2021, de 18 de Outubro.
Equipamento Recondicionado: 3 Anos de garantia limitada de acordo DL n.º 84/2021, de 21 de Outubro.
(Definições ao abrigo do DL n.º 84/2021, de 18 de Outubro)
Insira, por favor, o contacto para o qual deseja ser contactado:
(…)”
*
Foram os autos ao Ministério Público, nos termos e para os efeitos do artigo 13º da Lei nº 83/95, de 31 de Agosto, tendo o mesmo dito nada a opor ao prosseguimento dos autos.
*
A 24/11/2023, foi proferido o seguinte despacho:
A... intentou a presente acção popular contra B..., formulando os seguintes pedidos:
(…)
* * *
O Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
*
Valor processual da causa: tendo em conta o disposto no n.º 3 do artigo 303.º do Código de Processo Civil, fixo o valor da presente acção em € 60.000,00.
* * *
Não se procede à enunciação de factos provados nem factos não provados, porquanto estamos na fase da prolação de um despacho de indeferimento liminar da petição inicial, proferido ao abrigo do disposto no artigo 13.º da Lei n.º 83/95.
Assim, sendo um despacho proferido numa fase anterior às fases da citação e da produção de prova (artigos 15.º a 17.º da citada Lei), ainda não foram fixados os factos provados nem os factos não provados e nessa medida impõe-se ao Tribunal apreciar os factos alegados pelo autor, para concluir que, ainda que tais factos se viessem a provar, não poderiam os mesmos conduzir à procedência do pedido.
Efectuada a apreciação dos factos alegados, analisado o enquadramento jurídico e conjugados estes com o teor do documento que está na origem das conclusões extraídas pela Autora em relação à existência de fundamento para instauração de uma acção popular, importa apreciar se existe probabilidade de procedência do pedido, nos termos do artigo 13.º da Lei n.º 83/95, de 31 de Agosto.
Cumpre apreciar e decidir
A Autora enuncia os factos que fundamentam a sua acção popular nas páginas 7 a 11 da sua petição inicial (conforme consta da sua “Tabela de conteúdos”) composta por 93 páginas.
Dessas 5 páginas, são alegados os seguintes factos, os quais são relevantes para o apuramento da probabilidade ou não da procedência do pedido:
- A Ré dedica-se comercialmente à reparação de telemóveis, tablets, computadores e smartwatches (artigo 14.º).
- A Ré, por intermédio das suas lojas da Ré, procede à reparação das baterias dos dispositivos eletrónicos supra referidos ou à sua substituição por novas ou recondicionais (artigo 15.º).
- A Ré contabiliza mais de dez mil reparações por mês em equipamentos multimarca para os mais diversos tipos de avaria, incluindo baterias e carregadores (artigo 16.º).
- A Ré, por intermédio de do seu sítio da internet e nas suas lojas espalhadas pelo país declara que [o]s iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch recondicionados na loja da Ré estão cobertos por garantia limitada de até 3 anos, exceto baterias (1 ano de garantia) (artigo 17.º).
- A ré, por intermédio de do seu sítio da internet e nas suas lojas espalhadas pelo país declara que a Garantia Limitada não abrange (…) as baterias, carregadores ou peças e acessórios específicos ao visual do equipamento (artigo 20.º).
Refere assim que a Ré reduz o prazo de garantia previsto no artigo 10.º da Directiva (EU) 2019/771 e do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 84/2021, de três anos para um ano no caso de se tratarem de baterias de iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch recondicionados por si, concluindo que a Ré não aceita reparar as baterias de iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch recondicionados por si, ao abrigo do direito de garantia, cuja falta de conformidade se manifesta depois de um ano a contar da entrega do bem.
Refere ainda que a Ré elimina a garantia prevista no artigo 10.º da Directiva (EU) 2019/771 e do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 84/2021 no caso de se tratarem de baterias ou carregadores que não sejam de iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch recondicionados por si, concluindo que a Ré não aceita reparar as baterias ou carregadores que não sejam de iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch recondicionados por si, ao abrigo do direito de garantia, cuja falta de conformidade se manifesta até três anos a contar da entrega do bem.
Impõe-se assim verificar o documento n.º 3 junto com a petição inicial, no qual se funda a pretensão da Autora.
Do mesmo consta o seguinte:
“Pesquisa
Garantia, Trocas e Devoluções
Política de Garantia dos Equipamentos Recondicionados da Ré
Todos os produtos comercializados na loja da Ré incluem uma garantia standard limitada ao abrigo do DL n.º 84/2021, de 21 de Outubro. Os iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch Recondicionados na loja da Ré estão cobertos por garantia limitada de até 3 anos, exceto baterias (1 ano de garantia).
(…)
A Garantia Limitada não abrange:
- (…)
- Desgaste normal e natural de produtos, incluindo consumíveis, peças que exigem uma substituição periódica durante a utilização normal do equipamento ou cuja vida útil possa ser inferior à duração da Garantia Limitada, incluindo, sem qualquer tipo de limitação, as baterias, carregadores ou peças e acessórios específicos ao visual do equipamento.
(…)
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DEFINIÇÕES:
Equipamento Novo: 3 Anos de garantia limitada de acordo DL n.º 84/2021, de 21 de Outubro.
Equipamento Seminovo ou Usado: 2 Anos de garantia limitada de acordo DL n.º 84/2021, de 18 de Outubro.
Equipamento Recondicionado: 3 Anos de garantia limitada de acordo DL n.º 84/2021, de 21 de Outubro.
(Definições ao abrigo do DL n.º 84/2021, de 18 de Outubro).”.
Ora, o direito de acção popular, que autoriza qualquer cidadão a exercer um direito com repercussões na esfera jurídica de um conjunto de cidadãos em situação similar, tem uma base altruística, permitindo que, com isenção inicial de preparos e custas, o cidadão que considera que uma actuação de terceiros é lesiva, não só do seu direito, como do direito de todo um universo de consumidores que contrate com a infractora, possa pôr termo a essa actuação em seu nome e em nome de todos os demais que se encontrem na mesma situação.
Porém, sendo uma acção que acarreta elevados custos para o Estado – pelo universo de citações e pela dimensão e complexidade de julgamento que abstractamente pode ter –, reclama um crivo criterioso para o prosseguimento da acção, nomeadamente para a fase de citação.
Nesta senda, o artigo 13.º da Lei n.º 83/95, de 31 de Agosto justifica que o julgador proceda às averiguações preliminares que entenda por justificadas, a fim de se pronunciar sobre a probabilidade da procedência do pedido.
Verifica-se que o documento acima reproduzido (junto pela Autora sob o documento n.º 3) se encontra numa página da internet “https://da Ré.pt/pagina/garantia-trocas-e-devolucoes”.
Desse documento surge uma referência expressa ao Decreto-Lei n.º 84/2021, de 18 de Outubro (regula os direitos do consumidor na compra e venda de bens, conteúdos e serviços digitais, transpondo as Diretivas (UE) 2019/771 e (UE) 2019/770).
Na parte final desse documento que consta da página da internet - e que não é mencionado pela Autora na sua petição inicial - consta também expressamente as “DEFINIÇÕES” de Equipamento Novo, Equipamento Seminovo ou Usado e Equipamento Recondicionado, com a indicação expressa, nesse último caso dos 3 anos de garantia limitada de acordo DL n.º 84/2021, de 21 de Outubro.
Podemos concluir que o documento que serve de base à presente acção é uma “informação”, não se podendo considerar, enquadrar ou qualificar como sendo um acordo ou uma cláusula contratual. E sendo uma informação a mesma não se encontra prevista no artigo 51.º do Decreto-Lei n.º 84/2021 que refere expressamente “acordo ou cláusula geral”.
Ora, estando claro que a Ré, no documento junto pela Autora sob o n.º 3, faz alusão expressa ao Decreto-Lei n.º 84/2021, não existe nenhuma redução do prazo de garantia, conforme alega a Autora, apenas podendo induzir em erro os consumidores, quando reduz esse prazo no caso das baterias de iPhones, MacBooks, iPads e Apple ou elimina a garantia no caso de se tratarem de baterias ou carregadores que não sejam de iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch recondicionados por si.
Para além disso, sem prejuízo de quaisquer questões que, em concreto, se possam verificar em relação a cada específica situação do consumidor colocado na posição de cidadão que exerce o seu direito de garantia, não podemos ter por verificada a invocada lesão geral e abstracta aos consumidores, no sentido de “a Ré não aceita reparar as baterias de iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch recondicionados por si” e “as baterias ou carregadores que não sejam de iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch recondicionados por si, ao abrigo do direito de garantia” ou que, em caso de verificação dos pressupostos de activação da garantia, se negue a efectuar a reparação ou substituição no prazo de três anos.
A partir deste conjunto de factos e ponderados os factores em conflito, teremos que concluir que existe uma elevada improbabilidade de procedência do pedido, já que a pretensão de, com efeitos em relação a todo um conjunto indiferenciado de consumidores, a Ré causou danos aos interesses difusos de protecção do consumo de bens e serviços, implicaria que em algum momento, o tribunal pudesse fundadamente concluir que, pela informação tida no documento junto sob o n.º 3 com a petição inicial a Ré nega o direito de garantia no prazo de três anos no caso de baterias e carregadores (e os consequentes danos em relação a cada e indiferenciado consumidor).
A Autora requer ainda que seja declarada nula a cláusula contratual em causa contida no documento n.º 3 junto com a petição inicial (e que fundamenta a presente acção popular).
Ora, como ficou dito, o documento em causa insere em si informações, pelo que o Tribunal nunca poderia apreciar essa informação no prisma do artigo 51.º do Decreto-Lei n.º 84/2021 e dos artigos 12.º e 15.º do Decreto-Lei n.º 446/85.
Para além disso, o consumidor individualmente pode questionar a informação que é prestada, accionando a Ré em cada situação concreta em que se tenha por justificado o exercício do direito, pelo que cremos que não existe base suficiente para que se possa concluir pela probabilidade mínima de procedência da acção, já que, por um lado, os pedidos deduzidos não têm base factual/documental que suporte a concreta pretensão jurídica deduzida e, por outro lado, não existe um desequilíbrio de prestações ou uma especial oneração do consumidor que se antecipe resultar da informação prestada, sendo que as “Garantias, Trocas e Devoluções” não reduzem o referido prazo de garantia no caso de baterias e carregadores dos equipamentos recondicionados (face a uma leitura total e global do documento que suporta a presente acção).
Dito isto e pelos fundamentos acima expostos, não é possível concluir por um juízo de prognose favorável à possibilidade de procedência futura da acção proposta.
Deste modo, pelos motivos expostos, por ser manifestamente improvável a procedência dos pedidos, conclui-se pelo indeferimento da petição.
* * *
Pelo exposto, por ser manifestamente improvável a procedência do pedido, conclui-se pelo indeferimento da petição.
Custas pela Autora, que se fixam em 2/10 das custas que normalmente seriam devidas, nos termos do artigo 20.º, n.º 3 da Lei n.º 83/95, de 31 de Agosto.
Notifique e registe”.
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A... e Autores Populares, inconformados com esta decisão, interpuseram recurso de apelação apresentando as seguintes conclusões, que se transcrevem:
1. Os autores populares, ora apelantes, notificados da douta sentença proferida nos presentes autos e não se conformando com a mesma, vêm interpor recurso de apelação, sobre a matéria de facto e de direito, nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 627, 629 (1), 631, 637, 639, 644 (1,a) e 647 (1), todos do CPC.
2. O tribunal a quo, ponderada toda a matéria de facto e de direito, decidiu julgar improcedente a ação, indeferindo a mesma, por considerar ser manifestamente improvável a procedência do pedido (cf. artigo 13 da Lei 83/95).
3. Tal juízo liminar, foi sustentado no entendimento que a ação é manifestamente inviável por se não verificarem os pressupostos da proposta ação popular. Isto porque entendeu que a Política de Garantia dos Equipamentos Recondicionados da ré, escrita e disponibilizada ao público, onde consta a redução da garantia legal de três anos para um ano, no caso das baterias recondicionadas, é uma mera informação e que por isso não vincula a ré e concomitantemente não se pode considerar, enquadrada ou qualificar com sendo um acordo ou uma cláusula contratual. Deste modo, entende o tribunal a quo que os efeitos negativos de tal declaração, podem ser questionados por cada consumidor individualmente e, se necessário, acionando individualmente a ré em cada situação concreta, pondo então em causa a homogeneidade dos interesses da classe.
4. Ressalvado o devido respeito, que é o maior, o tribunal recorrido decidiu sem o acerto e ponderação que se lhe exigia o caso sub judice.
5. As questões a resolver circunscrevem-se a saber se:
a. se a Política de Garantia de Equipamentos Recondicionados da Ré que reduz a garantia legal de três anos para um ano no caso de baterias é uma informação prestada ao consumidor sem vincular o declarante e, por isso, não representa uma compressão dos direitos dos consumidores à garantia legal;
b. se não existe homogeneidade da classe aqui representada;
c. se, face a uma leitura total e global do documento que suporta a presente ação, não se pode concluir que a dita informação reduz a garantia legal de três anos para um ano.
6. Importa também saber se a declaração em causa é ou não uma cláusula contratual geral que, por contraria à lei, deve ser declarada nula.
7. O tribunal recorrido não deu como provados ou não provados quaisquer factos provados, baseando-se no entendimento de que, na fase de indeferimento liminar da petição inicial, tal é dispensável. No entanto, um olhar mais atento, permite verificar que a sentença deu como provado que a Política de Garantia de Equipamentos Recondicionados na loja da Ré não reduz o prazo de garantia legal para as baterias, com base na análise integral do documento relevante – embora tal pareça resultar de uma interpretação de direito.
8. Assim, por elevado dever de patrocínio, os autores consideram esse fato incorretamente julgado e para sustentar tal entendimento apresentam no § 2 supra, para onde se remente por uma questão de proficiência, os meios probatórios específicos, conforme o artigo 640 do CPC, indicando-se a decisão alternativa que se considera adequada.
9. Sem prejuízo, em jeito conclusivo, sempre se dirá que o documento 3 junto com a petição inicial, relativamente a política de garantias da ré, é claro quando declara que a garantia dos produtos recondicionados comercializados pela ré é de 3 anos após a compra, exceto para baterias recondicionadas que têm apenas 1 ano de garantia.
10. Sendo que as definições finais no documento 3, alinhadas com o decreto-lei 84/2001, não alteram a interpretação de que as baterias estão excluídas da garantia após um ano sobre a sua compra, pois era essa a interpretação que um consumidor médio, baseado na declaração ali constante, entenderia.
11. Em resumo, a declaração da ré leva os consumidores a não exercerem seus direitos à garantia, especialmente no que diz respeito às baterias após um ano da compra.
12. Vinculação Contratual da Declaração de Garantia: a Política de Garantia de Equipamentos Recondicionados da ré, que reduz a garantia legal de três anos para um ano no caso de baterias, é considerada vinculativa segundo as diretivas (UE) 2019/771 e (UE) 2011/83/UE. As informações sobre garantias fornecidas aos consumidores devem ser consideradas parte dos termos do contrato de venda.
13. De acordo com os artigos 2 (12) e 17 da diretiva 2019/771, qualquer informação fornecida sobre a garantia comercial torna-se um compromisso do vendedor e é interpretada como parte integrante do contrato.
14. Sob a ótica do direito interno, a declaração em questão é uma declaração negocial expressa, válida nos termos do artigo 219 do CC, e torna-se eficaz conforme o artigo 224 (1) do mesmo código.
15. Mesmo sendo uma informação publicitária, a declaração enquadra-se no âmbito do artigo 3 do decreto-lei 330-90, sendo igualmente vinculativa e a sua violação pode resultar inclusivamente resultar em responsabilidade civil nos termos do artigo 30 do mesmo decreto-lei.
16. A política de garantia da ré, conforme declarado, efetivamente comprime os direitos dos consumidores, limitando indevidamente o período de garantia estabelecido por norma legal imperativa.
17. Falta de Homogeneidade dos Interesses em Causa: Aborda-se a questão da homogeneidade dos interesses da classe na ação popular, argumentando contra a posição do tribunal a quo, que sugere a necessidade de avaliar individualmente cada caso de garantia para tal chama-se à colação a mais ilustre e recente jurisprudência e a mais autorizada doutrina. Para o efeito citam-se decisões e entendimentos relevantes do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa e do Colendo Supremo Tribunal de Justiça, bem como pareceres jurídicos, para reforçar a posição de que os interesses dos consumidores são homogéneos e a ação popular é viável, os quais se em 3.2.1. a 3.2.4. e que aqui se dão como reproduzidos por uma questão de proficiência, aderindo em absoluto aos mesmos.
18. Sem prejuízo do acerto da citada jurisprudência e doutrina, a qual não se consegue ofuscar com o que de seguida será concluído, face à singela sintetize conclusiva que se passa a verter:
a. apesar dos consumidores terem adquirido baterias recondicionadas diferentes (para iPhones, MacBooks, iPads, Apple Watch), isso não impede uma avaliação uniforme da situação de cada um deles. Todos os autores populares foram afetados pelo mesmo tipo de dano – a supressão do direito à garantia – que possui uma génese comum, ou seja, o comportamento ilícito da ré em reduzir o prazo de garantia;
b. o objeto da ação é o comportamento ilícito da ré, que é homogéneo em relação a todos os consumidores representados na classe, caracterizando-se por uma violação comum a todos os autores populares.
c. deve-se abstrair as diferenças individuais relacionadas aos diferentes produtos (baterias) comprados, pois o processo não visa atacar as condições específicas de cada autor popular ou as condições da compra ou do produto. O objeto da ação é sempre a redução do prazo da garantia legal de três anos para um ano para as baterias recondicionadas.
d. a ação popular visa tutelar um interesse individual homogéneo, aplicável a todos os consumidores que adquiriram baterias recondicionadas no período especificado, sem que haja uma situação individual particularizada.
e. o tribunal deve exercer controle sobre os interesses do universo indeterminado de consumidores, sem se ater demasiadamente às particularidades de cada um. Ou não o fazer, poderia frustrar a intenção do legislador em relação ao direito de ação popular.
f. a ação não se concentra na violação do dever de informação, mas ataca diretamente a declaração emitida pela ré, interpretada de forma homogênea pelos autores populares como uma compressão de seus direitos à garantia legal no caso das baterias recondicionadas.
g. a declaração da ré não é contingente, pois a sua interpretação não varia conforme o cliente específico ou as suas circunstâncias. Regula-se pela perspetiva de um consumidor medianamente diligente e informado, que interpretaria a declaração da mesma forma, independentemente das circunstâncias individuais.
19. Declaração de Nulidade da Cláusula: argumenta-se pela declaração de nulidade da cláusula que limita a garantia das baterias, com base na imperatividade do direito à garantia legal estabelecido no decreto-lei 84/2001 e na natureza do contrato de garantia como contrato de adesão, nos termos do §4, que aqui se dá como reproduzido por uma questão de proficiência.
20. Os apelantes requerem o reenvio para interpretação prejudicial pelo TJUE para interpretação as diretivas (UE) 2019/771 e (UE) 2011/83/UE à luz da factualidade apresentada, dissertando e justificando melhor esse reenvio no §5 supra, para onde se remente por razões de proficiência.
21. Assim, para a eventualidade de entenderem Vossas Excelências, Venerandos(as) Juízes(as) Desembargadores(as), que é necessária a intervenção do TJUE, como se demonstrou ser, nos termos e para os efeitos supra requeridos, entendem os apelantes, que a pronúncia do TJUE, no caso sub judice, será indispensável para a decisão da controvérsia jurídica que constitui objeto da presente ação. Por essa razão, requerem a suspensão da presente instância até que o TJUE se pronuncie, a título prejudicial, expressa e especificamente, sobre tais questões.
§7 Pedido
Termos em que, para a eventualidade de entenderem Vossas Excelências, Venerandos(as) Juízes(as) Desembargadores(as), que é necessária a intervenção do TJUE, nos termos e para os efeitos supra requeridos, entendem os apelantes, que a pronúncia do TJUE, no caso sub judice, nos termos do artigo 267 do TFUE, será indispensável para a decisão da controvérsia jurídica que constitui objeto da presente ação. Por essa razão, requer-se a suspensão da presente instância até que o TJUE se pronuncie, a título prejudicial, expressa e especificamente, sobre tais questões.
Caso Vossas Excelências, Venerandos(as) Juízes(as) Desembargadores(as), decidam de tal forma que não se verifique o obstáculo de dupla conforme prevista no artigo 671 (3) do CPC e consequente seja ainda admitida revista do acórdão desse Venerando Tribunal da Relação, então o reenvio requerido deve ser considerado meramente facultativo e não obrigatório (cf. artigo 267 § 2 do TFUE).
Em qualquer caso, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser concedida apelação, assim, revogada a decisão recorrida, ordenando que os autos voltem à primeira instância, devendo a ação prosseguir os seus ulteriores termos”.
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Citada a ré nos termos e para os efeitos do art. 641º, nº 7 do CPC, a mesma veio apresentar as suas contra-alegações, terminando com as seguintes conclusões:
1.ª — Tendo o douto despacho recorrido a natureza de um despacho liminar proferido ao abrigo do disposto no artigo 13.º da Lei da Acção Popular, não cabe fixar neste despacho a matéria da causa mas antes apurar, em face da alegação da Autora, se da mesma poderia, num juízo de probabilidade razoável, resultar a procedência do pedido.
2.ª — Não tem fundamento, por isso, a pretensão da Recorrente de que se dê como provados factos para efeitos do despacho de indeferimento liminar.
3.ª — Ainda que assim não fosse, a matéria que a Recorrente pretende que se dê liminarmente como provada — saber se da “Política de Garantia dos Equipamentos Recondicionados da Ré” anunciada no site da Ré resulta um efeito vinculante em matéria de prazos de garantia e se esse efeito é o de redução do prazo de garantia contratual face ao previsto em determinado diploma legal — não tem a natureza de um facto mas de uma conclusão de Direito e, por isso, sempre teria de estar arredada de uma suposta fundamentação de facto do douto despacho recorrido.
4.ª — A Recorrente procura demonstrar, com amplas citações jurisprudenciais e doutrinárias, que os interesses invocados na acção seriam interesses homogéneos, do tipo daqueles cuja tutela pode ser objecto de uma acção popular; sucede, porém, que  o Tribunal a quo não se pronunciou sobre a essa questão, e a mesma não integrou a ratio decidendi do douto despacho recorrido.
5.ª — Consequentemente, não pode conhecer-se dessa questão em sede de recurso, porque não interessa à impugnação e reapreciação da decisão recorrida.
6.ª — A Recorrente procura sustentar na sua alegação a tese de que o Documento n.º 3 junto com a petição inicial constitui declaração vinculante que reduz o prazo legal de garantia no caso das baterias de iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch recondicionados pela Recorrida e que, por isso, não se verificaria a manifesta improbabilidade de procedência da acção que esteve na base do indeferimento liminar, mas também aqui, ressalvado o devido respeito, se verifica que a Recorrente não acerta com aquilo que é realmente o fundamento da decisão de indeferimento liminar.
7.ª — A acção proposta pela Recorrente é uma acção que assenta na suposta redução, nuns casos, e exclusão, noutros, da garantia que é prestada pela Recorrida aos seus clientes na venda de baterias e carregadores de telemóveis, tablets, computadores e smartwatches, por referência ao prazo mínimo de garantia que seria imposto por lei, pelo que o que estaria em causa seria uma alegada prática contratual ilegal por parte da Recorrida.
8.ª — Ora, verifica-se que a Autora, ao alegar na petição inicial a factualidade destinada a integrar a causa de pedir da acção, não invoca factos concretos que revelem que na prática contratual da Recorrida ocorra a alegada redução ou eliminação do prazo de garantia legal.
9.ª — A Autora, na petição inicial, não se reporta nem alude a quaisquer contratos de compra e venda celebrados entre a Ré e consumidores, seus Clientes, que pudessem dar corpo à alegação da existência de uma prática contratual no sentido da redução ou eliminação do prazo de garantia legal dos produtos comercializados, e também não alega, sequer, que o conteúdo dos contratos integre efetivamente cláusulas violadoras das disposições legais que invoca em seu apoio.
10.ª — Não tendo a Autora dado satisfação ao ónus que sobre si recaía de alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir, ao abrigo do artigo 5.º, número 1, do Código de Processo Civil, e de os alegar em termos que permitam, se provados tais factos, conduzir à procedência da acção, é manifesto que a acção não deve prosseguir, porque não existe qualquer probabilidade séria de ela poder ser julgada procedente.
11.ª — Foi esse mesmo o juízo feito pelo Tribunal a quo no despacho recorrido: a Mma. Juíza a quo confrontada com os fundamentos de facto constantes da petição inicial – que assentam essencialmente na existência de uma informação constante do site da Recorrida, parcialmente transcrita na petição inicial e no Documento n.º 3 da petição inicia – foi procurar a referida informação diretamente ao site da Recorrida; fez, assim, as indagações complementares previstas na Lei da Acção Popular que lhe permitiram apurar o teor integral dessa informação e verificou que esta não tinha natureza contratual e que,  de todo o modo, nem sequer revelava a propalada redução do prazo legal de garantia; e daí concluiu, fundadamente, que os pedidos deduzidos não têm base factual bastante que os suporte, pelo que não é possível afirmar um juízo de prognose minimamente favorável à possibilidade de procedência da acção.
12.ª — Assim, bem vista a decisão recorrida, o ponto discutido pela Recorrente, de saber se da informação parcialmente reproduzida no Documento n.º 3 resulta ou não uma declaração de redução do prazo legal de garantia, não é, efectivamente, relevante ou pelo menos essencial para essa decisão — sem prejuízo de, como bem se demonstra no despacho recorrido, a análise do teor integral dessa informação infirmar até as acusações da Recorrente.
13.ª — O que é essencial e decisivo é, antes, a constatação que é feita no despacho de indeferimento liminar, de que a acção, assentando unicamente na informação contida no mencionado Documento n.º 3, não dispõe de uma base factual integradora da sua causa de pedir que, ainda que provada, pudesse servir de base à procedência dos pedidos.
14.ª — Não tem fundamento a alegação da Recorrente, também, quando impugna a decisão de indeferimento liminar na parte em que nesta se considera manifestamente improvável a procedência do pedido de declaração de nulidade da “cláusula que limita a garantia das baterias”.
15.ª — Como bem se afirma no despacho recorrido, a Recorrente não invocou na acção qualquer cláusula contratual que pudesse ser sindicada quanto à sua validade à luz do estabelecido no regime do Decreto-Lei n.º 84/2021, de 18 de Outubro, ou no regime de controlo das cláusulas contratuais gerais constante do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro.
16.ª — A Recorrente limitou-se a invocar, como fundamento da acção, a informação parcialmente transcrita na petição inicial e no Documento n.º 3 da petição inicial, mas esta não constitui uma cláusula inserida num contrato nem sequer contém uma cláusula contratual geral que o Tribunal pudesse apreciar.
17.ª — Não tem fundamento algum o pedido de reenvio prejudicial para o TJUE deduzido pela Recorrente na sua alegação, dado que a situação sub judice nada tem a ver com a aplicação de regras de Direito da União Europeia, tratando-se antes de uma situação puramente interna que mobiliza unicamente a aplicação das regras nacionais.
18.ª — Improcedem, por isso, todas as conclusões do recurso.
Termos em que deverá julgar-se improcedente o recurso e, consequentemente, confirmar-se o douto despacho recorrido”.
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Colhidos os vistos, cumpre analisar e decidir.
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II - Objecto do recurso
O objecto do recurso é definido pelas conclusões das alegações, mas esta limitação não abarca as questões de conhecimento oficioso, nem a qualificação jurídica dos factos (arts. 635º nº 4, 639º nº 1, 5º nº 3 do Código de Processo Civil).
Este tribunal também não pode decidir questões novas, excepto se estas se tornaram relevantes em função da solução jurídica encontrada no recurso ou sejam de conhecimento oficioso e os autos contenham os elementos necessários para o efeito – art. 665º nº 2 do mesmo diploma.
Face teor das alegações e conclusões, as questões a decidir são as seguintes:
- se o tribunal, para proferir a decisão sob recurso, deveria ter fixado factos provados e não provados; se, não obstante, o tribunal deu como provado que a Política de Garantia de Equipamentos Recondicionados da da Ré não reduz o prazo de garantia legal para as baterias e se esse facto deve ser alterado;
- se o documento nº 3 junto com a petição inicial é uma informação/declaração que vincula o declarante/Ré, representando uma compressão dos direitos dos consumidores à garantia legal, reduzindo-a de três anos para um ano;
- se, nesse caso, existe homogeneidade da classe aqui representada;
- se a declaração em causa, constante do documento nº 3 junto com a petição inicial, é ou não uma cláusula contratual geral que, por contraria à lei, deve ser declarada nula;
- saber se a petição inicial devia ter sido admitida no âmbito da acção popular, à luz das alegações dos Autores.
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III - Fundamentação de Facto
Foram já elencados supra os factos processuais que podem ter relevância para a decisão desta questão.
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IV - Fundamentação de Direito
A Lei nº 83/95, de 31/08, que regula o Direito de Participação Procedimental e Acção Popular (LPA), define os casos e termos em que são conferidos e podem ser exercidos o direito de participação popular em procedimentos administrativos e o direito de acção popular para a prevenção, a cessação ou a perseguição judicial das infracções previstas no nº 3 do artigo 52º da Constituição, conforme dispõe o art. 1º, nºs e 1 daquela Lei.
São designadamente interesses protegidos pela referida Lei, a saúde pública, o ambiente, a qualidade de vida, a protecção do consumo de bens e serviços, o património cultural e o domínio público (nº 2 do mesmo artigo).
Nos termos do artigo 2º, nº 1 daquela Lei, são titulares do direito procedimental de participação popular e do direito de acção popular quaisquer cidadãos no gozo dos seus direitos civis e políticos e as associações e fundações defensoras dos interesses previstos no artigo anterior, independentemente de terem ou não interesse directo na demanda.
De acordo com o art. 13º da Lei 83/95, “A petição deve ser indeferida quando o julgador entenda que é manifestamente improvável a procedência do pedido, ouvido o Ministério Público e feitas preliminarmente as averiguações que o julgador tenha por justificadas ou que o autor ou o Ministério Público requeiram”.
A manifesta improcedência do pedido que legitima o indeferimento liminar, analisada caso a caso, implica o juízo de inviabilidade da acção, contendendo com o seu mérito (questão de fundo) e não com requisitos de forma (por ex., falta de pressupostos processuais). Para que assim seja, a alegação dos factos e razões de direito expostas na petição são sujeitas a uma averiguação sumária que culminará com uma pronúncia antecipatória quanto ao mérito da acção, se esta se mostra viável ou não atentas as possíveis soluções de direito.
O despacho sobre recurso é um despacho de indeferimento liminar da petição inicial, proferido ao abrigo do referido art. 13º da LAP.
No relatório já fizemos referência à fundamentação do tribunal recorrido para indeferir liminarmente a petição inicial.
Nas suas alegações de recurso (pontos 7 a 9), os Recorrentes sustentam que o Tribunal a quo não enunciou factos provados nem factos não provados; mas no entanto, dá como provado que a Política de Garantia de Equipamentos Recondicionados da Da Ré não reduz o prazo de garantia legal para as baterias, com base na análise integral do documento relevante, pelo que, por dever de patrocínio, impugnam tal facto.
Ora, estando nós na presença de um despacho de indeferimento liminar da petição inicial, necessariamente produzido numa fase anterior à citação e produção de prova (cfr. arts. 15º a 17º da LAP), os factos provados e não provados não foram fixados, nem tinham de o ser. No fundo, na apreciação antecipatória sobre a viabilidade do mérito da acção, o juiz basta-se com os factos alegados pelo autor. E se, nessa apreciação, o juiz conclui que mesmo que provados, tais factos não conduzem à procedência do pedido, como aconteceu no caso, não há que fixar a factualidade provada e não prova.
Não obstante esta alegação, os Recorrentes impugnam aquilo a que chamam de “facto provado”, ou seja, no seu entendimento o tribunal deu como provado que “Política de Garantia de Equipamentos Recondicionados da Ré não reduz o prazo de garantia legal para as baterias”. Contudo, sem qualquer fundamento. Na verdade, tal resulta da interpretação feita pelo tribunal a quo do documento nº 3 junto com a petição inicial que serve de base à acção. Não se trata de um facto provado, como pretendem os Recorrentes.
Como é fácil de perceber pela leitura da decisão recorrida, os únicos “factos” levados em consideração, foram os factos alegados pelos Autores na petição inicial.
Desde modo, improcedem as conclusões dos Autores no que respeita a esta primeira questão.
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A segunda questão a decidir prende-se, precisamente, com a interpretação a dar ao referido documento nº 3, já transcrito no relatório, defendendo os Autores/Recorrentes que o referido documento, que menciona a política de garantias da ré “é claro quando declara que a garantia dos produtos recondicionados comercializados pela ré é de 3 anos após a compra, exceto para baterias recondicionadas que têm apenas 1 ano de garantia”,  sendo que apesar das definições finais estarem alinhadas com o DL 84/2001, “não alteram a interpretação de que as baterias estão excluídas da garantia após um ano sobre a sua compra, pois era essa a interpretação que um consumidor médio, baseado na declaração ali constante, entenderia”. Ou seja, é entendimento dos Recorrentes que a declaração da Ré leva os consumidores a não exercerem seus direitos à garantia, especialmente no que diz respeito às baterias após um ano da compra, violando não só os art. 3º, a), e) e f), 4º e 9º da Lei 24/96, do referido DL 84/2021, como as Directivas (UE) 2019/771 e (UE) 2011/83/EU, tendo em conta que as “informações sobre garantias fornecidas aos consumidores devem ser consideradas parte dos termos do contrato de venda” (pontos 9 a 16 das conclusões).
Na decisão em crise, depois de discorrer sobre os fundamentos da acção popular, a Srª. Juiz a quo  refere, com acerto, que “sendo uma acção que acarreta elevados custos para o Estado – pelo universo de citações e pela dimensão e complexidade de julgamento que abstractamente pode ter –, reclama um crivo criterioso que evite que, sob a capa da defesa de todo um universo de lesados ou potenciais lesados, se prossigam interesses pessoais concretos, efeito para o qual a lei dispõe de meios processuais próprios”. Procedendo à análise do documento nº 3 junto com a petição inicial, com base no qual os Autores fundamentam a acção, refere que na parte final do documento, “surge uma referência expressa ao Decreto-Lei n.º 84/2021, de 18 de Outubro (regula os direitos do consumidor na compra e venda de bens, conteúdos e serviços digitais, transpondo as Diretivas (UE) 2019/771 e (UE) 2019/770)”. Acrescentando, “Na parte final desse documento que consta da página da internet - e que não é mencionado pela Autora na sua petição inicial - consta também expressamente as “DEFINIÇÕES” de Equipamento Novo, Equipamento Seminovo ou Usado e Equipamento Recondicionado, com a indicação expressa, nesse último caso dos 3 anos de garantia limitada de acordo DL n.º 84/2021, de 21 de Outubro(sublinhado nosso).
Conclui, assim, a decisão, que o dito documento constitui apenas uma “informação” que faz alusão ao DL 84/2021 e não reduz qualquer prazo de garantia, “apenas podendo induzir em erro os consumidores, quando reduz esse prazo no caso das baterias de iPhones, MacBooks, iPads e Apple ou elimina a garantia no caso de se tratarem de baterias ou carregadores que não sejam de iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch recondicionados por si. Para além disso, sem prejuízo de quaisquer questões que, em concreto, se possam verificar em relação a cada específica situação do consumidor colocado na posição de cidadão que exerce o seu direito de garantia, não podemos ter por verificada a invocada lesão geral e abstracta aos consumidores, no sentido de “a Ré não aceita reparar as baterias de iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch recondicionados por si” e “as baterias ou carregadores que não sejam de iPhones, MacBooks, iPads e Apple Watch recondicionados por si, ao abrigo do direito de garantia” ou que, em caso de verificação dos pressupostos de activação da garantia, se negue a efectuar a reparação ou substituição no prazo de três anos”.
Adiantamos, desde já, que não podemos deixar de concordar com os fundamentos e conclusões a que chega a decisão recorrida.
Antes de mais, atentemos às normais legais que regulam a questão que se nos apresenta.
Tendo em conta os factos alegados na petição inicial, podemos afirmar que na situação em apreço os Autores pretendem a tutela dos direitos seus direitos enquanto consumidores.
O consumidor é, nos termos do art. 2º, nº 1 da nº 24/96, de 31 de Julho, que transpôs para a ordem interna a Directiva nº 2011/83/EU de 25/10/2011 (Lei de Defesa do Consumidor, na actual redacção), “todo aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma atividade económica que vise a obtenção de benefícios”.
E, de acordo com o com o artigo 3º, als. a), e) e f) da mesma Lei, o consumidor tem, entre outros, o direito “à qualidade dos bens e serviços; à proteção dos interesses  económicos e à prevenção e à reparação dos danos patrimoniais ou não patrimoniais que resultem da ofensa de interesses ou direitos individuais homogéneos, coletivos ou difusos”.
A Directiva (UE) 2019/771, de 20/5/2019, tendo em vista a protecção dos direitos dos consumidores, estabeleceu regras sobre certos aspectos dos contratos de compra e venda de bens, incluindo disposições sobre garantias.
O art. 2º, nº 12 desta Directiva refere que se entende por “«Garantia comercial»: um compromisso assumido pelo vendedor ou pelo produtor («garante») perante o consumidor, para além das obrigações legais do vendedor relativas à garantia de conformidade, de reembolsar o preço pago, substituir, reparar ou ocupar-se de qualquer modo de um bem, no caso de este não ser conforme com as especificações ou qualquer outro elemento não relacionado com a conformidade estabelecidos na declaração de garantia ou na respetiva publicidade divulgada na celebração do contrato ou antes desta”.
E o art. 17º, sob a epígrafe “Garantias Comerciais”, dispõe:
“1. Qualquer garantia comercial deve ser vinculativa para o garante nos termos das condições previstas na declaração de garantia comercial e publicidade conexa, disponibilizadas aquando ou antes da celebração do contrato. Nas condições previstas no presente artigo e sem prejuízo de quaisquer outras disposições aplicáveis do direito da União ou do direito nacional, caso um produtor dê ao consumidor uma garantia comercial de durabilidade para determinados bens durante um determinado período tempo, o produtor é diretamente responsável perante o consumidor, durante todo o período da garantia comercial de durabilidade pela reparação ou substituição dos bens nos termos do artigo 14º . O produtor pode oferecer ao consumidor condições mais favoráveis na declaração de garantia comercial de durabilidade.
Se as condições previstas na declaração de garantia comercial forem menos vantajosas para o consumidor do que as previstas na publicidade conexa, a garantia comercial deve ser vinculativa nas condições previstas na publicidade relativa à garantia comercial, a menos que, antes da celebração do contrato, a publicidade conexa tenha sido corrigida de uma forma idêntica ou comparável àquela em que foi feita (…)”.
Também a Directiva 2011/83/EU, no seu art. 2º, nº 14 dispõe que se entende por “«Garantia comercial»: qualquer compromisso assumido pelo profissional ou pelo produtor (o «garante») perante o consumidor, para além das suas obrigações legais no tocante à garantia de conformidade, de reembolsar o preço pago, substituir, reparar ou ocupar-se de qualquer modo de um bem, no caso de este não ser conforme com as especificações ou qualquer outro elemento não relacionado com a conformidade estabelecidos na declaração de garantia ou na respectiva publicidade divulgada aquando ou antes da celebração do contrato”.
O DL 84/2021 de 18/10, que regula os Direitos do Consumidor na compra e venda de bens, conteúdos e serviços digitais, transpôs para a ordem interna a Directiva (EU) 2019/770 de 20/5/2019.
Dispõe este DL no nº 1 do art. 12º (cuja epígrafe é a Responsabilidade do profissional em caso de falta de conformidade) que “o profissional é responsável por qualquer falta de conformidade que se manifeste no prazo de três anos a contar da entrega do bem”. E no seu nº 3 que “Nos contratos de compra e venda de bens móveis usados e por acordo entre as partes, o prazo de três anos previsto no n.º 1 pode ser reduzido a 18 meses, salvo se o bem for anunciado como um bem recondicionado, sendo obrigatória a menção dessa qualidade na respetiva fatura, caso em que é aplicável o prazo previsto nos números anteriores”.
Por seu turno, o art. 51º do DL dispõe que:
1 - Sem prejuízo do regime das cláusulas contratuais gerais, é nulo o acordo ou cláusula contratual pelo qual se excluam ou limitem os direitos do consumidor previstos no presente decreto-lei.
2 - É aplicável à nulidade prevista no número anterior o disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 16.º da Lei n.º 24/96, de 31 de julho, na sua redação actual.
3 - O disposto no presente decreto-lei não impede o profissional de propor ao consumidor disposições contratuais que lhe concedam maior nível de protecção”.  
Finalmente, e porque relacionado com a questão em apreço, o DL 330/90 de 23/10 (Código da Publicidade) define como publicidade qualquer forma de comunicação feita por entidades de natureza pública ou privada, no âmbito de uma actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal, com o objectivo directo ou indirecto de promover, com vista à sua comercialização ou alienação, quaisquer bens ou serviços ou de promover ideias, princípios, iniciativas ou instituições.
Nos termos do art. 12º deste DL, “É proibida a publicidade que atente contra os direitos do consumidor”.
Ora, o documento que serve de fundamento à acção é, como se diz na decisão em crise, uma “informação”, retirada de uma página da internet que se refere a garantias, trocas e devoluções da Ré.
Foi entendimento da Srª juiz a quo que estando mencionada, na parte final do documento nº 3, depois das definições de Equipamento Novo, equipamento Seminovo ou Usado e equipamento Recondicionado, a indicação expressa, neste último caso aos três anos de garantia limitada de acordo com o DL nº 84/2021, o referido documento ou “informação” não reduz qualquer prazo de garantia.
Analisando os factos alegados pelos Autores e considerados na decisão de indeferimento liminar, não consta que tenha sido celebrado qualquer contrato de compra e venda dos produtos comercializados pela Ré com a imposição aos Autores, ou a qualquer consumidor em concreto, de um contrato de “adesão” respeitante a condições previamente elaboradas pela Ré sobre garantias, trocas e devoluções, designadamente as constantes do documento nº 3, junto com a p.i.
Ao contrário do que parece ser o entendimento dos Autores, não há no caso em apreço qualquer compromisso assumido pelo profissional/garante (neste caso a Ré) perante um consumidor no que respeite à garantia de “conformidade, de reembolsar o preço pago, substituir, reparar ou ocupar-se de qualquer modo de um bem, no caso de este não ser conforme com as especificações ou qualquer outro elemento não relacionado com a conformidade estabelecidos na declaração de garantia ou na respectiva publicidade divulgada aquando ou antes da celebração do contrato (sublinhado nosso), tal como se prevê na Directiva 2011/83/UE (art. 2º, nº 14) e também na Directiva (UE) 2019/771 (arts. 2º, nº 1 e 17º, nº 1). Veja-se a este respeito, a definição de garantia comercial em cada uma das Directivas não prescinde da existência de um compromisso, ou seja, um contrato.
Os Autores, no corpo das alegações (pág. 15), referem que “se um fornecedor de serviços ou bens, como é a ré, declara, mesmo que a título informativo ou em mera publicidade, que um produto tem uma determinada garantia, essa declaração deve ser considerada parte do contrato de venda” e que “no direito interno, a declaração em crise é uma declaração negocial expressa nos termos do artigo 217 (1), do CC, sem se revestir de nenhuma forma especial que decorra de lei, portanto é válida (cf. artigo 219, do CC), pelo que a mesma vincula o declarante e torna-se eficaz nos termos do artigo 224 (1), do CC”.
Todavia, o documento em apreço, tratando-se de uma mera “informação” ou publicidade dos serviços da Ré, não chega a “vincular” a Ré na medida em que não existe qualquer declaração negocial, qualquer contrato ou compromisso do qual resulte a imposição de uma política quanto a garantias, trocas e devoluções dos produtos por si comercializados.
Mesmo que estivesse em causa uma publicidade ilícita (nos termos do art. 12º do DL 330/90), sempre teriam de estar alegados os eventuais danos decorrentes da mesma, passíveis de indemnização (ao abrigo do art. 30º do mesmo DL), o que não acontece nos autos.
Ponto assente é que, tal como defendido na decisão da primeira instância, a “informação” constante no documento nº 3, não reduz a garantia legal de três anos para um ano no caso das baterias recondicionadas, nem impede os consumidores de exercerem os seus direitos à garantia no caso das baterias com mais de um ano e menos de três, “seja os consumidores que tentam exercer a garantia junto da ré e são confrontados com essa política, seja os que se confrontam com essa declaração na página da internet da ré e nem tentam exercer o seu direito à garantia, conformando-se com a má sorte de terem comprado a bateria na ré” (tal como alegado pelos Apelantes a pág. 16 das alegações).
Qualquer cliente, exposto à referida informação ou publicidade pode livremente, caso não concorde com tal política de garantia oferecida pela Ré, optar, simplesmente, por não contratar com a Ré.
Note-se que nos Acórdãos mencionados nas alegações de recurso as situações apresentada às instâncias não são análogas à dos autos. No caso do Ac. da RL de 25/5/2023 (proc. 5555/22, relator Carlos Castelo Branco), o ali autor adquiriu um disco rígido à ré, constando dos factos então alegados na acção que esta impôs ao autor um contrato de adesão designado “Condições Gerais Reparações e Serviços”, ao qual o autor aderiu, e que a ré não cumpriu com o dever de reparação e indemnização; no Ac. do STJ de 8/9/2016, (proc. 7617/15, sendo relator Oliveira Vasconcelos) estava em causa um contrato de mútuo bancário e o pagamento das respectivas prestações.
Por outro lado, e na decorrência do que se vem de escrever, não faz sentido o apelo ao art. 51º do DL 84/2001 que refere, claramente “o acordo ou cláusula contratual pelo qual se excluam ou limitem os direitos do consumidor” previstos no decreto lei, nem tão pouco ao Regime das Cláusulas Contratuais Gerais (DL 446/85 de 25 de Outubro). Aquele regime comina com a nulidade o “acordo ou cláusula contratual” pelo qual se excluam ou limitem os direitos dos consumidores (art. 51º do DL 84/2001); o DL 446/85 comina com nulidade as cláusulas contratuais gerais proibidas por disposição do referido diploma (art. 12º), sendo que, de acordo com o nº 1 do art. 1º, cláusulas contratuais gerais são aquelas que são "elaboradas sem prévia negociação individual", ou seja, são prévia e unilateralmente definidas por um dos contraentes, tendo em vista uma generalidade e pluralidade de pessoas que não as vão negociar e influenciar, no âmbito de um padrão negocial uniformizado. “As cláusulas contratuais gerais inseridas em propostas de contratos singulares incluem-se nos mesmos, para todos os efeitos, pela aceitação, com observância do disposto neste capítulo” (art. 4º) e “As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las” (art. 5º, nº 1 do mesmo DL).
Na acção não está alegada a celebração de qualquer contrato, pelo que a referida “informação” veiculada pela Ré na sua página da internet, não configura uma cláusula contratual geral referente à garantia de qualquer um dos produtos comercializados pela Ré, não podendo proceder o pedido de “nulidade da cláusula em crise”.
Desta forma, improcedem a 2ª e 4ª questões.
Assim, bem andou a primeira instância ao considerar ser manifesta a improbabilidade de procedência dos pedidos dos autores, pelo que a petição inicial teria de ser julgada manifestamente improcedente, conforme foi.
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Alegam os autores que no caso concreto “estamos perante um interesse particular homogéneo, na medida em que a diminuição do direito à garantia no caso das baterias recondicionais aplica-se a todos os consumidores que tenham adquirido essas baterias há mais de um ano e à menos de três, sem que exista uma situação individual particularizada, embora tais baterias possam ser diferentes de consumidor para consumidor ou adquiridas online ou presencialmente nas lojas(…) Tem natureza difusa, sendo suscetível de tutela popular, o interesse de diversos consumidores, num universo indeterminado, mas determinável (conjunto de consumidores que adquiriram baterias recondicionadas da ré), de que o fornecedor repare ou substituta o bem, em caso de falta de conformidade, uma vez que tal direito decorre das normas legais e convencionais gerais a todos aplicáveis” (sublinhado nosso).
Ora, perante as conclusões a que chegamos, pela manifesta falta de base factual que suporte a pretensão jurídica deduzida, resulta prejudicada esta particular questão de saber se existe homogeneidade da classe representada pelos Autores.
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Finalmente, os Apelantes requerem o reenvio para interpretação prejudicial pelo TJUE para interpretação as Directivas (UE) 2019/771 e (UE) 2011/83/UE à luz da factualidade apresentada, entendendo que a pronúncia do TJUE, no caso sub judice, será indispensável para a decisão da controvérsia jurídica que constitui objecto da presente acção. Por esse motivo, requerem a suspensão da instância até que o TJUE se pronuncie, a título prejudicial, expressa e especificamente, sobre tais questões (pontos 20 e 21 das conclusões).
Está em causa, nomeadamente, a interpretação dos arts. 2º, 10º, nº 1, 11º, 13º, nº 1 e 2 e 14º, nº 1 e 2 e 17º da Directiva (UE) 2019/771 e arts. 2º, 14 da Directiva 2011/83/UE, como melhor se explicita nas pág. 34 e ss do corpo das alegações.
Nos termos do art. 19º, 3, b) do Tratado da União Europeia e do artigo 267º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, o Tribunal de Justiça da União Europeia é competente para decidir, a título prejudicial, sobre a interpretação do direito da União e sobre a validade dos actos adoptados pelas instituições, órgãos ou organismos da União.
Deste modo,  o processo de reenvio de uma ou mais questões a título prejudicial, para interpretação de uma ou mais normas jurídicas de direito comunitário, originário ou derivado, pressupõe a existência dúvidas sobre a interpretação do texto em causa. Se, pelo contrário, o texto é perfeitamente claro, não se trata de interpretar, mas sim de o aplicar, o que é da competência do Tribunal incumbido da competência de julgar o caso concreto aplicando a lei, a nacional e/ou a comunitária se for esse o caso.
Este entendimento é conhecido e defendido pela doutrina e pela jurisprudência como a “teoria do acto claro”.
Já nos referimos supra a cada uma destas Directivas e aos artigos mencionados pelos Apelantes, particularmente aos arts. 2º, nº 14 da Directiva 2011/83/UE e arts. 2º, nº 1 e 17º da Directiva (UE) 2019/771, cujo conteúdo foi devidamente apreciado no caso em apreço, sem que se tenham suscitado quaisquer questões de interpretação.
Na solução dada ao caso concreto, este Tribunal não teve, nem tem qualquer dúvida acerca da interpretação das normas citadas.
Assim, entende-se que não há fundamento para pedir o reenvio prejudicial ao TJUE.
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Quanto a custas:
Nos termos do art. 20º da Lei 83/95, de 31/08:
“1 - Pelo exercício do direito de acção popular não são exigíveis preparos.
2 - O autor fica isento do pagamento de custas em caso de procedência parcial do pedido.
3 - Em caso de decaimento total, o autor interveniente será condenado em montante a fixar pelo julgador entre um décimo e metade das custas que normalmente seriam devidas, tendo em conta a sua situação económica e a razão formal ou substantiva da improcedência.
4 - A litigância de má-fé rege-se pela lei geral.
5 - A responsabilidade por custas dos autores intervenientes é solidária, nos termos gerais”.
No entanto, conforme refere o Ac. da RL de 11/7/2024, proc. 6308/22, relator Adeodato Brotas, que aqui se segue de perto, “… salvo o devido respeito, impõe-se esclarecer que aquele artº 20º da Lei 83/95, se encontra revogado.
Na verdade, aquele normativo é anterior ao DL 34/2008, de 26/02, que introduziu o Regulamento das Custas Processuais (RCP), revogando o então Código de Custas Judiciais. E, no preâmbulo desse DL 34/2008, refere-se expressamente “No âmbito dos objectivos de uniformização e simplificação do sistema de custas processuais, a presente reforma procurou concentrar todas as regras quantitativas e de procedimento sobre custas devidas em qualquer processo, independentemente da natureza judicial, administrativa ou fiscal num só diploma - o novo Regulamento das Custas Processuais - mantendo algumas regras fundamentais, de carácter substantivo, nas leis de processo.” E, pelo artº 25º desse DL 34/2008, foi introduzida uma norma geral revogatória, justamente com epígrafe “Norma revogatória”, que determinou:
“1 - São revogadas as isenções de custas previstas em qualquer lei, regulamento ou portaria e conferidas a quaisquer entidades públicas ou privadas, que não estejam previstas no presente decreto-lei.”
Aliás, neste sentido, veja-se João Alves (“Ação popular: manifesta improcedência do pedido – parecer do Ministério Público, Revista do Ministério Público 148, Dezembro de 2016, pág. 143) que expressamente defende: “No que respeita a custas, de acordo com o art.º 25º, nº 1 (norma revogatória) do DL 34/2008, de 26/2 (Regulamento de Custas Processuais-RCP) «São revogadas as isenções de custas previstas em qualquer lei, regulamento ou portaria e conferidas a quaisquer entidades públicas ou privadas, que não estejam previstas no presente decreto-lei», pelo que, encontra-se revogado o art.º 20º, nº 1 da Lei 83/95, de 31/8.”
Note-se, de resto, que aquele artº 20º da Lei 83/95 usa expressões arredadas do CPC e do RCP, como sucede com o termo “preparos”.
Portanto, em face da revogação daquele artº 20º da Lei 83/95, de 31/08, é em sede do RCP que deve buscar-se o regime de custas processuais relativo às Acções Populares.
Pois bem, determina o artº 4º nº 1, al. b) do RCP que estão isentos de custas:
“b) Qualquer pessoa, fundação ou associação quando exerça o direito de acção popular nos termos do n.º 3 do artigo 52.º da Constituição da República Portuguesa e de legislação ordinária que preveja ou regulamente o exercício da acção popular;”
Além desta alínea b), do nº 1 do artº 4º, estabelece o nº 5 do mesmo artigo que:
“5 - Nos casos previstos nas alíneas b), f) e x) do n.º 1 e na alínea b) do n.º 2, a parte isenta é responsável pelo pagamento das custas, nos termos gerais, quando se conclua pela manifesta improcedência do pedido”.
Daqui resulta que, tendo sido confirmada a decisão de indeferimento popular pela manifesta improcedência do pedido, as custas da apelação são pelos Autores nos termos gerais.
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V - Decisão:
Por todo o exposto, julga-se a apelação improcedente e, em consequência, mantém-se o despacho recorrido.
Custas da apelação pelos Autores (arts. 4º, nº 1, al. b) e nº 5 do RCP).

Lisboa, 7/11/2024
Carla Figueiredo
Teresa Sandiães
Cristina Lourenço