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CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
NÃO EXCLUSIVIDADE
DIREITO À REMUNERAÇÃO
NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE A ACTIVIDADE E O NEGÓCIO
QUEBRA DO NEXO
Sumário
I- O direito à remuneração do mediador imobiliário, por via de contrato de mediação imobiliária em regime de não exclusividade, depende da conclusão e perfeição do negócio visado no contrato de mediação. II-A venda de imóvel (negócio visado no contrato de mediação) por valor superior ao inicialmente previsto e fixado em contrato-promessa de compra de venda – cuja celebração decorre da atividade do mediador - não transmuta o negócio assim concretizado em negócio diferente do visado pelo contrato de mediação, não afastando por si o direito à remuneração, não devendo o preço considerar-se, para tal efeito, em regra e na falta de estipulação no contrato de mediação que imponha diferente interpretação, elemento essencial do negócio visado. III- Se o negócio visado pelo contrato de mediação e que veio a ser concretizado tem a sua génese na atividade da mediadora que aproximou as partes, que as pôs em contacto, que encontrou um destinatário que veio efetivamente a comprar o prédio e a quem o cliente da mediadora quis vender o prédio, mantém-se o nexo causal entre a atividade de mediação e o negócio ainda que haja alteração de preço. IV- A quebra do nexo causal não resulta do maior ou menor lapso de tempo decorrido entre a atividade de mediação e a conclusão do negócio, mas haverá de resultar de circunstâncias concretas que permitam afirmar que aquele negócio que veio a ser concluído anos depois já não tem ligação com a atividade de mediação, não resulta dela ou, noutra perspetiva, essa atividade já não contribuiu, já não se revela adequada nem idónea a ter determinado o negócio que veio a ser concluído anos depois.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
I-Relatório
1- W… - Mediação Imobiliária Lda., intentou contra H… Unipessoal, Lda., ação declarativa de condenação pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 184.500,00€, acrescida de juros de mora vencidos no valor de 8.852,04€ e vincendos até integral e efetivo pagamento, alegando, em síntese, que no âmbito de contrato de mediação imobiliária entre ambas celebrado, envidou esforços e logrou obter uma proposta de compra da totalidade das frações autónomas da Ré pelo valor de 3.240.000,00€, proposta que a ré aceitou, tendo sido celebrado o contrato promessa de compra e venda do qual consta que houve prestação de serviços de mediação imobiliária pela A.; em 19/02/2021 a Ré enviou à A. missiva na qual refere que esta não efetuou os esforços necessários para promover a conclusão da venda do imóvel solicitando a devolução dos valores adiantados por conta do negócio que não ocorreu; realizaram-se em ../0../2021 as escrituras de compra e venda, constando de todas elas que houve intermediação imobiliária da A.; a Ré nada pagou e tem vindo a evitar o contacto e a A. teve que proceder ao pagamento do Iva correspondente ao montante faturado que não recebeu.
2- A ré contestou alegando que efetuou o pagamento da comissão acordada, não à A., mas a outra empresa do grupo, pela entrega de dois cheques, um de 50.000,00€ e outro de 59.800,00€ os quais foram descontados em ../05/2017 e ../06/2017, tendo sido emitidas as faturas correspondentes pela V…, Lda., fazendo referência a serviço de consultoria imobiliária. A partir do momento em que recebeu a segunda tranche a A. remeteu-se ao silêncio, não tendo contribuído de qualquer forma para a concretização das escrituras que apenas ocorreram 3 anos depois, pugnando pela improcedência da acção.
3- A A. respondeu à exceção de pagamento parcial referindo que os pagamentos efetuados à V…, Lda. não têm qualquer relação com o contrato de mediação imobiliária em causa nestes autos, e o valor não corresponde ao acordado pelas partes.
4- Realizou-se audiência prévia no âmbito da qual foi fixado como objeto do Litígio: “O direito da A. a receber da Ré as quantias peticionadas a título de comissão devida pela mediação imobiliária.”, e os seguintes temas de prova: “1º -Do pagamento da comissão devida pela assinatura do contrato promessa de compra e venda pela A. através dos cheques juntos aos autos como doc. 2 da contestação. 2ª Da falta de contribuição da A. para a concretização da venda.”
5 -Após julgamento foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “IV. DECISÃO: Pelo exposto, decido julgar a presente totalmente procedente, por provada e, consequentemente condeno a Ré a pagar à A. a quantia de 150.000,00€ acrescida de Iva, num total de 184.500,00€, acrescido de juros à taxa legal desde 20.03.2021 até integral pagamento. Custas pela R.”
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6 -É desta sentença que vem interposto o presente recurso, pela ré, que termina com as seguintes conclusões (serão consideradas, naturalmente, as conclusões aperfeiçoadas na sequência do despacho proferido em 15.7.2024): 1) A sentença padece de nulidade, pois, durante a audiência prévia, o Tribunal a quo deu como assente, por acordo das partes, a validade da resolução do contrato de mediação imobiliária, na medida em que não foi posta em causa a resolução pela Autora (cfr. Gravação da audiência prévia – ficheiro ‘Diligencia_26410-21.1T8LSB_2023…_10-09-34’- a partir dos 00:50 segundos). 2) Por esse motivo, o Tribunal a quo não incluiu tal questão nos temas da prova da presente ação e tal questão não foi objeto de qualquer discussão. 3) No entanto e apesar disso, a final, a questão da validade da resolução foi tomada em consideração pelo Tribunal a quo na decisão ora recorrida tendo inclusivamente passado a ser a questão essencial para a tomada da decisão. 4) Assim, a decisão violou caso julgado e inquinou a decisão sobre todas as restantes questões, porquanto a decisão sobre estas resultou da decisão sobre a (in)validade da resolução do contrato de mediação imobiliária, além de que se baseou em matéria de facto verdadeiramente insuficiente para a sua decisão, atendendo a que a questão não foi objeto de qualquer discussão. 5) Assim, deve a sentença recorrida ser substituída por outra da qual seja omitida qualquer análise e decisão referente à legitimidade da resolução do CMI operada pela Ré. 6) Ademais e sem conceder, a sentença recorrida padece ainda de erro de julgamento relativamente à matéria de facto, por ter considerado provados os factos elencados sob os n.ºs 7 e 15 da matéria de facto provada, devendo o Tribunal ad quem corrigir a decisão sobre a matéria de facto em conformidade. 7) Em especial, o facto ínsito no n.º 7 da matéria de facto provada deve ser corrigido e/ou completado de modo a que passe a integrar a redação completa da cláusula 5ª do contrato de mediação imobiliária, devendo acrescentar-se o seu restante conteúdo, isto é: “nos termos e com as exceções previstas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro”, 8) pois tal conteúdo adicional implica que a Autora teria direito à remuneração, não apenas por encontrar um destinatário para o negócio (como se refere no facto provado n.º 7), mas também por praticar os atos necessários à promoção ativa da celebração efetiva do negócio pretendido pelas partes (ou seja, nos termos da lei, é necessária a “conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação”) – cfr. Contrato de Mediação Imobiliária junto sob o Doc. n.º 5 da Petição Inicial. 9) Já o facto ínsito no n.º 15 da matéria de facto provada deve ser modificado (por o valor mencionado corresponder a matéria de facto que não ficou provada, além de o valor indicado não poder estar correto, atendendo à prova documental produzida), passando a prever apenas que: “A outorga das escrituras de compra e venda veio, assim, a ocorrer no dia .. de fevereiro de 2021, no Cartório Notarial do dr…., em C.., tendo a R. ali recebido o valor remanescente do preço.” – cfr. Contrato-promessa de compra e venda e Escrituras Públicas juntas à Petição Inicial sob os Docs. n.º 6, 7, 9, 10 e 11. 10) A sentença recorrida também padece de erro de julgamento sobre a matéria de facto, ao considerar não provados os factos elencados nas als. a), b), d) e e) da matéria de facto não provada, pelo que deverá o Tribunal ad quem corrigir a matéria de facto, considerando também estes factos como provados – cfr. Docs. n.º 1 a 4 da Contestação; e depoimento de parte do representante legal da Autora (ficheiro ‘Diligencia_26410-21.1T8LSB_2023…_10-10-05’ a partir do minuto 11:44) e depoimento das testemunhas LL … (ficheiro ‘Diligencia_26410-21.1T8LSB_2023-11-07_11-05-00’ – a partir do minuto 04:01) e P.C… (ficheiro ‘Diligencia_26410-21.1T8LSB_2023-11-07_11-49-51’ a partir do minuto 03:34) 11) Atendendo a que os factos supra referidos deveriam ter sido dados como provados, deve também o Tribunal ad quem declarar que a sentença recorrida deveria ter concluído que a atividade da Autora não contribuiu de forma alguma para a celebração do negócio definitivo, tendo havido uma quebra do nexo causal e decidir que não é devida qualquer remuneração à Autora, até porque o contrato de mediação imobiliária tinha sido resolvido. 12) Ainda nessa sequência lógica, deve ainda o Tribunal ad quem concluir que a decisão recorrida errou de Direito ao não ter em conta as consequências lógicas da anterior cessação do contrato de mediação imobiliária, mormente como impedimento à emissão de uma fatura relativa a um contrato já extinto, alterando a decisão do tribunal a quo em conformidade. 13) Em qualquer caso, erra ainda o Tribunal a quo ao ter considerado que a comissão de mediação imobiliária era devida apenas porque a Autora “encontrou” um comprador (o proprietário das 3 sociedades) para os prédios objeto da mediação, pois o contrato definitivo não foi celebrado na data acordada por as partes terem entrado em desacordo relativamente ao preço de venda e apenas foi celebrado muito mais tarde, por um preço diferente (sendo claro, portanto, que o acordo sobre o preço foi essencial para a celebração do negócio definitivo). 14) Ora, não tendo a Autora demonstrado ter desenvolvido as atividades concretas que realizou para que as partes tivessem chegado a acordo quanto ao preço pelo qual os imóveis acabaram por ser transacionados, a decisão do Tribunal a quo não podia ser outra senão a de que a Autora não cumpriu o ónus de alegar e provar o cumprimento das obrigações a seu cargo, não sendo aceitável que o Tribunal a quo se tenha bastado com uma mera dedução (i.e. se os prédios foram vendidos ao proprietário identificado pela A., celebração desse negócio teria necessariamente decorrido do esforço desta, independentemente da A. ter ou não mantido a sua atividade ao longo de todo o processo pré-contratual, ou de aquele corresponder ou não ao negócio que foi visado pelas partes – em especial ao que era pretendido a R., em beneficio de quem a atividade de mediação devia ter sido exercida) para fundar a sua decisão. 15) Em suma – e mesmo que a decisão sobre a matéria de facto não seja modificada – os factos dados por provados pelo Tribunal a quo mostram-se insuficientes para fundar a decisão tomada a respeito do direito aplicável ao caso sub judice, por faltarem aqueles que possibilitariam aferir da validade da resolução do contrato de mediação, comunicada pela R., bem como os que poderiam permitir aferir da extensão do contributo da A. para a concretização do negócio visado pela mediação. 16) A este propósito, deve pelo menos ordenar-se a reabertura da discussão sobre a matéria de facto, de forma poder carrear para os Autos os factos necessários à fundamentação das decisões de direito a tomar. 17) Caso assim não se entenda, o que não se aceita, mas por mero dever de patrocínio se acautela, deve o Tribunal ad quem decidir que o Tribunal a quo devia ter considerado procedente a exceção do pagamento parcial, realizado ao abrigo do disposto no Art.770.º do Código Civil, no valor de 90.000,00 € (60%) – cfr. Docs. n.º 2 a 4 da Contestação; e depoimento da Testemunha P.C… (ficheiro ‘Diligencia_26410-21.1T8LSB_2023…_11-49-51’ a partir do minuto 03:34) -, apenas considerando serem devidos 60.000,00 €, ou seja, os restantes 40%, corrigindo a sentença recorrida em conformidade.
7- Contra-alegou a A/recorrida, concluindo da seguinte forma: 1. O caso dos presentes autos não contempla nenhuma das excepções previstas no n.º 3, do art. 647.º, do CPC ou noutro diploma legal. 2. A sociedade recorrente não requereu de forma fundamentada que o recurso tivesse efeito suspensivo, nem prestou-se para pagar caução, nos termos e para os efeitos do art. 647.º do CPC. 3. Pelo que, deve, no entender da sociedade recorrida, ser fixado efeito meramente devolutivo do recurso, nos termos e para os efeitos do art. 647.º, do CPC. 4. A recorrente tenta alegar a violação da sentença nos termos do disposto na al. d), do n.º 1, do art. 615.º, do CPC. 5. Todavia, a recorrente aquando do proferimento do despacho saneador não recorreu do obecto do litígio, nem dos temas de prova. 6. Pelo que, a Mma. Juiz a quo para decidir dos mesmos teria necessariamente que aferir da legitimidade da resolução operada pela ali Ré. 7. A Mma. Juiz a quo ao dar como não provados os factos constantes das alíneas e) e f), a recorrente não logrou provar qualquer incumprimento por parte da ora recorrida e consequentemente não existe fundamento para a resolução operada pela ali Ré. 8. A resolução não produz os seus efeitos e, como tal o contrato mantém-se em vigor. 9. A recorrente requer a correcção do facto n.º 7, da matéria de facto provada, uma vez que nos termos em que é redigido – daria a entender que a única tarefa que a Autora necessitava de cumprir era encontrar um comprador para o imóvel, o que não corresponde à verdade, como é do conhecimento comum e conforme resulta também da nossa jurisprudência (…)”. 10.A recorrida não pode concordar com a “correção” porque parece-nos claro que os termos em que o facto n.º 7 se encontra formulado não remete exclusivamente para a procura do destinatário e tanto assim é que é necessário que esse mesmo destinatário concretize o negócio visado. 11.A sociedade recorrente não pretende “apenas” a correção do facto n.º 7 da matéria dada como provada, mas sim o aditamento de um novo facto escudando-se em razões de linguística e ignorando a condição a condição sine qua non que do facto n.º 7 que determina que a sociedade recorrida apenas tem direito a receber a sua remuneração quando esse comprador concretize não apenas o negócio, mas sim o negócio visado. 12.Acresce que, ao contrário do alegado pela sociedade recorrente, a sociedade recorrida além de ter encontrado o destinatário e o negócio visado pelo contrato ter sido concretizado ficou amplamente provado em sede de Audiência e Discussão de Julgamento, nomeadamente através do depoimento desse mesmo destinatário que destaca a postura activa, profissional e disponível da sociedade recorrida ao longo destes quase quatro anos. 13.Aquando da celebração das escrituras de compra e venda, em 25 de … de 2021, a sociedade recorrente declarou que naqueles negócios jurídicos houve intervenção da sociedade recorrida, conforme escrituras que foram juntas com a Petição de Direito. 14.A recorrente requer ainda a alteração do facto constante do n.º 15 da matéria de facto provada 15.A sociedade recorrente tenta fazer parecer que a sociedade recorrida alegou na Petição de Direito que a sociedade recorrente recebeu o valor global da venda apenas no momento da escritura de compra e venda e que tal estaria em contradição com o facto de as sociedades compradoras terem entregue o sinal e reforços de sinal em momentos anteriores. 16.Todavia, o que ali se diz é que com a celebração das escrituras no dia 25 de …de 2021 e com o pagamento do remanescente – o que implica que já teria sido pago parte do valor - a sociedade recorrente recebeu a totalidade do preço de venda. 17.Assim, entende a ora recorrida, que não deve o facto n.º 15 ser corrigido porque não resulta de qualquer meio de prova e consequentemente a sua correcção, conforme apela a sociedade recorrente, seria contrária à prova produzida. 18. A sociedade recorrente após a concretização do negócio escudou-se ao pagamento da remuneração alegando, entre outros, que teria pago parte da comissão à sociedade recorrida através de outra empresa a pedido desta e agora, em sede de recurso, vem requerer que o facto seja dado como provado, mas, no nosso entender, sem qualquer fundamento que o sustente. 19.A sociedade recorrida dedica-se à actividade de mediação imobiliária e tem como gerente o Sr. FF ….e a sociedade Gr…, Lda, dedica-se, no que aos presentes autos interessa, a actividades de consultoria para os negócios e gestão tendo como CAE principal o 70220 e tem também como gerente o Sr. FF….. 20.Ou seja, estamos perante duas sociedades distintas, com objectos sociais e actividades distintas, mas com o mesmo gerente – situação que a sociedade recorrente conhecia e sempre conheceu e tanto assim é, que, a sociedade recorrente contratou a sociedade Gr…, Lda, por mais de uma vez, em negócios distintos, para actividades de consultoria e gestão na venda de imóveis propriedade da mesma - e fê-lo, uma vez mais, no processo de venda deste imóvel tendo pago os serviços daquela empresa – como sempre o fez. 21.A recorrente não junta qualquer prova para sustentar o alegado e a verdade é que podia nomeadamente ter requerido o depoimento da legal representante da sociedade recorrente que teria conhecimento directo dos factos, mas optou, convenientemente, por não o fazer. 22.Acresce que, até à presente data, Março de 2024, não foi feito qualquer pedido de restituição daquele valor à sociedade Gr…., Lda. 23.No entanto, sempre se dirá o seguinte: o Tribunal a quo fundamentou – e bem - a sua decisão com base nos depoimentos das testemunhas P.C… e LL…, mas também no depoimento de parte do legal representante da Autora. 24.Resulta claro do depoimento do legal representante da sociedade recorrida que ambos os serviços foram contratados e devidamente prestados, mas também que não foi feito qualquer pagamento à sociedade recorrida pela actividade de mediação imobiliária e sim à sociedade Gr…, Lda pelos serviços de consultoria por aquela prestados. 25.Pelo que o facto não provado identificado sob a letra b) não poderia consequentemente ser considerado provado. 26.A sociedade recorrente tenta fazer parecer – e até o diz – que os contratos promessas de compra e venda teriam sido celebrados no dia … de Maio de 2017 e que nesse mesmo dia o cheque relativo à comissão teria sido entregue. 27.Sucede, porém, que os contratos promessa de compra e venda foram celebrados no dia .. de Maio de 2017, conforme doc. n.º 6 junto com a Petição de Direito e o único aditamento aos mesmos apenas foi celebrado no dia .. de Fevereiro de 2018, conforme doc. n.º 7 junto com a Petição de Direito. 28.Pelo que, resulta de forma clara que o alegado pela recorrente não pode corresponder à verdade. 29.Acresce que, a factura junta à Douta Contestação sob o doc. n.º 2 refere expressamente: “Serviço de Consultoria Imobiliária: Prédio Urbano sito na Rua …, 1-3, Lisboa” e conforme se pode comprovar a factura não se limita a referir serviço de consultoria imobiliária. 30.Face ao supra exposto, entende a recorrida que o Tribunal a quo bem andou ao dar como não provado os factos das alíneas a) e b) e que assim se deveriam manter. 31.A recorrente requer ainda em sede de apelação que o facto da al. d), da matéria de facto não provada seja considerado provado e para tanto alega que as promitentes compradoras se recusaram a celebrar a escritura não por não estarem cumpridas as condições acordadas no contrato promessa de compra e venda. 32.Ora, parece-nos claro que não se trata de uma recusa em celebrar o negócio, mas sim uma impossibilidade de o fazer, uma vez que o prédio não estava pronto, não tinha as licenças devidas e o pedido de propriedade horizontal ainda não tinha ficado registada. 33.Pelo que, mais uma vez bem andou o Tribunal a quo ao dar como não provado o facto constante da al. d). 34.Por último, a sociedade recorrente requer ainda que o facto constante da al. e) da matéria de facto não provada seja dado como provado. 35.Sucede, porém, que tal não poderia estar mais longe da verdade: O processo de venda deste imóvel arrastou-se por cerca de 4 anos e durante todo este período a sociedade recorrida e os seus funcionários prestaram o apoio necessário e devido durante todo o processo seja através dos inúmeros contactos e reuniões com o comprador, com a sociedade Ré e os seus funcionários, nomeadamente o Sr. Arquitecto JJ…., com os advogados de ambos os lados, as recorrentes idas à Câmara Municipal de Lisboa ou mesmo à obra. 36.Mais, ao contrário do alegado pela recorrente, o acompanhamento e apoio manteve-se após a celebração do contrato promessa tal como esclarecido pela testemunha PC. 37.A sociedade recorrida mediou tanto quanto pôde as negociações entre as partes, a celebração de acordos e aditamentos entre as partes, esteve presente nas reuniões entre as partes promovendo o diálogo, mesmo quando uma das partes se recusava a fazê-lo. 38.Em suma, após a celebração do contrato de mediação imobiliária, após a aceitação de todas as condições de venda, após cerca de quatro anos de trabalho, após a celebração das escrituras de compra e venda e após o recebimento do preço integral pela sociedade Ré, a mesma, através de artimanhas e manobras dilatórias, como já tem sido seu apanágio, escudase em argumentos falaciosos ao pagamento merecido e devido da remuneração à sociedade A./ora recorrida. 39.O princípio da livre apreciação da prova determina que esta apreciação deverá ser feita, com recurso às regras da experiência comum. No entanto, o princípio vertido naquele preceito legal, não pode, de forma alguma permitir uma apreciação imotivável, incontrolável e arbitrária da prova produzida em julgamento. 40.Pelo que, face à prova produzida na Audiência de Discussão e Julgamento, aos depoimentos das testemunhas e à prova documental a Mma. Juiz a quo fez uma análise responsável, lógica e de bom senso. 41.Aliás, tudo quanto foi alegado pela recorrente não passa de descrições e cenários hipotéticos sem qualquer prova ou ainda factos que o sustentem. 42.Começa por alegar que parte da comissão teria sido paga, por indicação do legal representante da recorrida, a outra empresa, mas, não junta qualquer prova para o efeito e ainda junta a factura – [sob o doc. n.º 4 da Douta Contestação] – que refere expressamente: “Serviço de Consultoria Imobiliária: Prédio Urbano sito na Rua…., 1-3, Lisboa” 43.Até à presente data não houve qualquer pedido de restituição daquele valor. 44.Mais, a recorrente não juntou qualquer elemento, não arrolou qualquer testemunha que tenha provado ou dito o contrário e não requereu o depoimento de parte da legal representante que teria conhecimento directo dos factos. 45.A contabilista – testemunhada arrolada pela Ré - apenas veio confirmar o que a recorrida alegou na sua Petição de Direito, isto é, a recorrente encontrava-se numa situação financeira frágil que levou a que a mesma tivesse de recorrer a financiamento bancário. 46.Ora, tal como alegado na Petição de Direito, atenta a relação de confiança entre as partes, as sucessivas promessas de pagamento a recorrida – erradamente, apercebe-se agora – aguardou, tal como solicitado pela recorrente, pela efectiva celebração do negócio para receber o pagamento. 47.A recorrente alega ainda que, segundo as regras de prática processual civil e a jurisprudência nacional o ónus da prova cabe a quem invoca os factos constitutivos do seu direito e que esse ónus da prova recairia sobre o nexo causal entre o trabalho da mediadora e a celebração do negócio definitivo. 48.Todavia, entende a recorrida que o nexo causal foi estabelecido e que cumpriu o ónus da prova que lhe cabia. 49.Mais, não basta que tenham passado três anos da celebração do contrato de mediação imobiliária para que o nexo causal possa ser afastado (Ac. da Relação de Guimarães, proferido em 2 de Novembro de 2023, no âmbito do proc. nº. 5183/21.3T8VNF.G1 e Relator Figueiredo de Almeida). 50.Tanto o legal representante como a testemunha LL ..demonstraram se incansáveis ao longo destes quatro anos: visitaram várias vezes o imóvel, estiveram presentes e contribuíram de forma activa na maioria das inúmeras reuniões entre o comprador e a recorrente, deslocaram-se à Câmara Municipal de forma a obterem informações sobre a licença ou mesmo pressionarem a emissão da mesma, mantiveram contactos com os arquitectos, engenheiros e representantes legais das partes, desempenharam um papel conciliador, prestável e disponível com o comprador em todas as etapas do processo, 51.Tanto assim é que o comprador – a tal testemunha considerada clara, isenta e desinteressada – confirmou o supra exposto. 52.Em suma, foi celebrado um contrato de mediação imobiliária, a mediadora diligenciou por encontrar um comprador para aquele negócio, esteve presente, disponível e prestável durante todas as negociações, contratempos e mesmo quando a recorrente se remeteu ao silêncio – não se acomodou e tentou sempre fazer e saber tudo quanto possível. 53.A sociedade recorrente que a remuneração também não seria devida porque a final se celebrou um negócio diferente daquele que era pretendido inicialmente, alegando que sociedade A. não contribuiu de forma activa para a celebração de um contrato promessa de compra e venda que fosse realista para ambas as partes. 54.Todavia, convenientemente ou por lapso, não menciona que os contratos promessa de compra e venda foram analisados pelos representantes legais de ambas as partes e que após o seu aval foram efectivamente celebrados. 55.Além disso, tanto as sociedades compradoras como a sociedade Ré dedicam-se, têm como principal actividade, a compra e venda de imóveis e revenda dos mesmos. 56.Mais, a sociedade Ré tem ainda como objecto social a mediação de obras de construção, remodelação, ampliação, demolição e reconstrução de imóveis, conforme certidão permanente junta com a Petição de Direito. 57.Por fim, a recorrente alega ainda que o negócio visado e o negócio afinal não são coincidentes por duas razões: Pela diferença de preço e pelos termos do negócio, 58.A recorrente tenta escudar-se ao pagamento à recorrida com base na diferença de preço… uma vez que recebeu mais 150 mil euros do que o acordado previamente…Será que este facto é suficiente para concluir que o negócio concluído não fora o visado? A resposta a esta questão tem de ser um categórico não. Caso contrário, se assim fosse iríamos permitir que a menor flutuação de preço – quer seja superior ou inferior ao acordado – permitisse/fosse via para que a actividade de mediação imobiliária fosse descartada a qualquer momento! E, note-se que quem acorda o preço são as partes! 59.Alega ainda a recorrente que os termos do negócio também são diferentes e que por isso o negócio visado não corresponde ao negócio celebrado. 60.Ainda que as fracções tenham de facto sido vendidas sem a correspondente licença de utilização a recorrente ficou solidariamente responsável pela obtenção da mesma. 61.Mais uma vez, entende a ora recorrida que face ao supra exposto este facto não implica que o negócio concluído não tenha sido o negócio visado, uma vez que se trata do mesmo prédio, o mesmo número de fracções e as mesmas partes! 62.Em conclusão, após a celebração do contrato de mediação imobiliária, após a aceitação de todas as condições de venda, após cerca de quatro anos de trabalho, após a celebração das escrituras de compra e venda e após o recebimento do preço integral pela sociedade Ré, a mesma, através de artimanhas e manobras dilatórias, como já tem sido seu apanágio, escudase ao pagamento merecido e devido da remuneração à sociedade A./ora recorrida. 63.Pelo que, muito bem andou o Tribunal a quo ao julgar a presente acção procedente por totalmente provada e condenar a recorrente ao pagamento da remuneração devida.
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Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir
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Objecto do recurso/questões a decidir:
Sendo o objeto do recurso balizado pelas conclusões apresentadas, nos termos conjugados dos arts.635.º n.º4 e 639.º n.º1 do CPC, sem prejuízo das questões de que o tribunal possa conhecer oficiosamente (art.608.º, n.º 2, in fine, em conjugação com o art. 663.º, n.º 2, parte final, ambos do CPC), prefiguram-se no presente caso as seguintes questões a decidir:
-nulidade da sentença;
- impugnação/alteração/correção da matéria de facto.
-erro de julgamento quanto à verificação dos pressupostos de que depende o pagamento da remuneração à A.
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II- Fundamentação
2.1- Fundamentação de facto:
2.1.1- Na sentença objeto de recurso constam como provados os seguintes factos: 1. A sociedade A. exerce a actividade de mediação imobiliária, detendo a licença AMI n.º 1…, conforme certidão permanente da sociedade e licença emitida pelo Instituto dos Mercados Públicos do Imobiliário e da Construção (IMPIC).(docs. nos 1 e 2). 2. A Ré, que já usou a designação "H…, Lda" e, actualmente, denominada "H…, unipessoal, Lda." é uma sociedade unipessoal que exerce a actividade de compra e venda de imóveis, revenda dos imóveis adquiridos para esse fim, mediação de obras de construção, remodelação, ampliação, demolição e reconstrução de imoveis, (doc. n.º 3) 3. No âmbito da sua actividade, a Ré pretendia vender as futuras fracções autónomas do prédio urbano de que era proprietária sito nos …, na Rua…., n.ºs 1, 1A, 1B, 1C e 3, freguesia de…., concelho de Lisboa, registado na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o n.º … e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de …sob o artigo …. 4. No dia 13 de Abril de 2017, a. e a R. celebraram um contrato de mediação imobiliária entre si, conforme doc. n.º 4 cujo teor se dá por integralmente reproduzido. 5. Cerca de um mês após a data da celebração do contrato de mediação imobiliária a R. transmitiu ao sócio-gerente da sociedade A. - FF….- que a sua intenção seria a de vender as futuras fracções autónomas de forma integral e não de forma autonomizada. 6. Assim, no dia … de Maio de 2017, a. e a R. celebraram novo contrato de mediação imobiliária desta feita para a venda do prédio urbano na totalidade, pelo preço global de 3.300.000,00 € (três milhões e trezentos mil euros), em regime de não exclusividade, por um prazo de 6 meses, renovável automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não fosse denunciado com a antecedência mínima de dez dias em relação ao seu termo. 7. A. e a R. estabeleceram ainda na Cláusula 5ª do referido contrato que seria devida a quantia global de 150.000,00€ (cento e cinquenta mil euros), acrescida de IVA à taxa legal de 23%, a título de remuneração, se a. conseguisse encontrar um destinatário que concretizasse o negócio visado pelo contrato. 8. Mais, acordaram que aquele pagamento seria feito nas seguintes condições: i. 60 % após a celebração do contrato promessa de compra e venda e o remanescente de 40% com a conclusão do negócio. ii. Igualmente convencionaram que os "sessenta por cento serão divididos em duas tranches de 30% cada, a primeira a ser paga no CPCV e a segunda a 15 de Julho” (doc.5) 9. A. desenvolveu esforços e logrou obter por parte do Sr. P.C… uma proposta global de compra da totalidade das futuras fracções autónomas da R, pelo valor de 3.240.000,00 (três milhões e duzentos e quarenta mil euros). 10. A referida proposta de compra foi aceite pela R. 11. No dia .. de Maio de 2017 foi celebrado o contrato promessa de compra e venda entre a R. e três sociedades comerciais - "He…, Lda"; "P… C… Lda." e "Co…, Lda" - todas elas representadas por P.C…, na qualidade de sócio gerente e na qualidade de gerente, conforme contratos promessas que se encontram juntos como doc. 6 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido. 12. Prescreve a cláusula décima-segunda do referido contrato que: “Ambos os contraentes, declaram que a presente promessa de compra e venda foi objecto de prestação de serviços de mediação imobiliária pela empresa de mediação imobiliária denominada W… - Mediação Imobiliária, Lda., NIPC …., com a licença AMI n.º ….." 13. Em … de Fevereiro de 2018, foi efectuado um aditamento ao contrato promessa de compra e venda, nos termos do qual, as partes contratantes mantiveram a cláusula décima segunda nos seus exactos termos, conforme doc. n.º 7. 14. No dia … de Fevereiro de 2021 foi enviada pela R. uma missiva à sociedade A, que se encontra junta como doc. 8 e aqui se dá por reproduzida, através da qual a Ré comunica que “a decisão desta empresa em resolver o contrato de mediação imobiliária celebrado no dia 02 de Maio de 2017 relativo ao imóvel situado na Rua…, n.º 3, em Lisboa, o que fazemos com efeitos imediatos e motivado no incumprimento grave e reiterado das obrigações assumidas por V.exas nesse contrato. (…) V.Exas não envidaram quaisquer esforços para promover a conclusão do negócio visado (a venda do imóvel), ao contrário do que era obrigação e, nos termos legais, condição para a remuneração dos V. serviços. (…). O silêncio a que nos votaram desde essa altura, recusando todas as tentativas de contacto que efectuamos, não nos deixa, pois, outra alternativa senão a de exigir a restituição dos valores adiantados por conta do negócio que não ocorreu.” 15. A outorga das escrituras de compra e venda veio, assim, a ocorrer no dia … de Fevereiro de 2021, no Cartório Notarial do Dr. …em …, tendo a R. ali recebido o valor remanescente do preço, num total de 3.080, 16 € (três milhões, oitenta euros e dezasseis cêntimos), assim discriminado: i. Fracção autónoma designada pela letra H, pelo valor global de 371.400,00 €; ii. Fracção autónoma designada pela letra l, pelo valor global de 319.560,00€; iii. Fracção autónoma designada pela letra D, pelo valor global de 329.280,00 €; iv. Fracção autónoma designada pela letra J, pelo valor global de 468.600,00 €; v. Fracção autónoma designada pela letra B, pelo valor global de 316.320,00 €; vi. Fracção autónoma designada pela letra F, pelo valor global de 342.240,00€. vii. Fracção autónoma designada pela letra A, pelo valor global de 303.360,00€. viii. Fracção autónoma designada pela letra C, pelo valor global de 309.840,00 €; ix. Fracção autónoma designada pela letra G, pelo valor global de 319.560,00 €; 16. Todas as escrituras de compra e venda celebradas entre a R e as sociedades compradoras contêm a expressa menção que nestes negócios jurídicos houve intervenção da sociedade A. enquanto mediadora imobiliária conforme docs. nºs. 9 10 e 11 que se dão por integralmente reproduzidos. 17. A. enviou a factura número W2021/.., emitida em ...03.2021 para a R. proceder ao pagamento da remuneração acordada pela mediação da venda das dez fracções do prédio urbano sito na Rua…., nos termos do contrato de mediação celebrado entre as partes, conforme doc. no 12 que ora se junta. 18. Porém, no dia 12 de Abril de 2021, através de carta registada, a R. enviou nova missiva à A. alegando, que se encontra junta como doc. 13 e aqui se dá por reproduzida e na qual a Ré referiu que “Queiram encontrar em anexo a V. factura n.º W2021/.., datada de 28/03/2021, que recusamos por não ser devida, não só por ter sido emitida ao arrepio de qualquer contrato em vigor, como por não corresponder a serviços praticados por V.Exas. Aproveitamos para solicitar a devolução dos 109.800,00€ que em 2017 adiantamos por conta dos serviços que V.Exas acabaram por não prestar, na fala do que não deixaremos de recorrer aos meios judiciais competentes, com vista à respectiva recuperação.” 19. FF…, socio gerente da A. era o angariador indicado no contrato de mediação imobiliária e, também, sócio e gerente da sociedade com o NIPC …que então girava com o nome V…., L.da (actualmente Gr…., L.da). 20. A Ré entregou ao Sr. FF….., dois cheques: um datado de 19/05/2017, no valor de 50.000,00€ e outro datado de 20/07/2017 no valor de 59.800,00€, ambos à ordem de V…., Lda. (doc. 2 da cont.) 21. Tais cheques foram descontados da conta da Ré, respectivamente nos dias 21/05/2017 e 23/07/2017 (doc. 3 e 4 da cont.) 22. FF…entregou à Ré duas facturas emitidas pela V…, L.da, uma datada de 19 de Maio de 2017 e outra de 10 de Julho de 2017, com valores correspondentes aos cheques recebidos da Ré. (doc. 2) 23. As referidas facturas, fazem menção a “serviço de consultoria imobiliária: prédio urbano sito na Rua…., 1-3, Lisboa” e “Serviço de consultoria imobiliária: Prédio urbano com 10 fracções sito na Rua….., 1-3, Lisboa” (doc. 2) 24. As escrituras foram realizadas em …/02/2021 sem que tivessem sido emitidas às fracções transaccionadas as licenças de utilização.
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2.1.2- Na sentença objeto de recurso foram considerados não provados os seguintes factos: a) Que o sócio gerente da A.- FF..– solicitou à Ré que fizesse o pagamento da comissão acordada, não à A. mas a outra empresa do “grupo”. b) Que o pagamento da comissão devida pela assinatura do contrato promessa (60% indicados no contrato subscrito em Maio de 2017) foi efectuado mediante a entrega ao Sr. FF, dos cheques referidos no facto assente n.º 22. c) O aditamento contratual efectuado em Fevereiro de 2018 originou um conflito entre a Ré e as promitentes compradoras. d) As promitentes compradoras recusaram celebrar o contrato prometido na data acordada – Fevereiro de 2018. e) A A. não deu qualquer contribuição para que a venda se concretizasse. f) A partir de Julho de 2017 a A. remeteu-se ao silêncio furtando-se às tentativas de contacto empreendidas pela Ré.
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2.2-Fundamentação de direito:
2.2.1- Nulidade da sentença
Invoca a recorrente que a sentença padece de nulidade porque “durante a audiência prévia, o Tribunal a quo deu como assente, por acordo das partes, a validade da resolução do contrato de mediação imobiliária, na medida em que não foi posta em causa a resolução pela Autora” e essa matéria não foi incluída nos temas da prova; contudo, diz, apesar disso, essa questão foi tomada em consideração pelo tribunal, pelo que, a decisão violou o caso julgado e inquinou a apreciação de todas as demais questões. Acrescenta, ainda, neste particular, que o tribunal se baseou em matéria de facto insuficiente, atendendo a que essa questão não foi objeto de discussão. Pretende, por isso, que a sentença “seja substituída por outra da qual seja omitida qualquer análise e decisão referente à legitimidade da resolução”. (conclusões 1.ª a 5.ª).
A recorrente, nas alegações de recurso enquadra a nulidade no art.615.º n.º 1 al. d) do CPC, por ter a sentença conhecido de questão que não podia tomar conhecimento, referindo-se, agora nas conclusões do recurso, à validade da resolução, à legitimidade da resolução e ainda à violação do caso julgado.
Vejamos:
O art.615.º do CPC no seu n.º1 diz que é nula a sentença quando: a) não contenha a assinatura do juiz;
b) não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade que torne a decisão ininteligível;
d) o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
Por seu turno, o n.º4 desse artigo diz-nos que as nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.
No caso concreto a nulidade arguida convoca a al. d) do n.º1 do art.615.º do CPC, da qual decorre que se verifica nulidade da sentença se o juiz conhecer de questão de que não podia tomar conhecimento.
A recorrente suporta a nulidade no facto do tribunal, segundo alega, ter dado como assente em sede de audiência prévia a validade da resolução, pelo que, não podia voltar a apreciar essa questão na sentença concluindo, aí, pela invalidade da mesma. Ora, vista a acta da referida audiência prévia dela não consta nenhuma decisão sobre qualquer factualidade que tenha sido considerada assente, nem dela consta que tenha sido apreciada qualquer questão prévia ou exceção ou conhecido, ainda que parcialmente, o mérito da causa. O que resulta dessa acta é que o tribunal proferiu despacho saneador em que afirmou a competência do tribunal, a personalidade e capacidade judiciárias das partes e sua legitimidade, e exarou que Inexistem nulidades, outras excepções ou questões prévias de que cumpra conhecer desde já e que obstem ao conhecimento do mérito da causa”, donde nenhuma outra nulidade, questão prévia ou, exceção, foi em concreto conhecida; e, na mesma audiência, após debate, foi proferido despacho fixando o objeto do litígio e temas da prova, pelo que, os autos prosseguiram para julgamento. Também não resulta da dita acta que as partes tenham apresentado qualquer reclamação àquele despacho que fixou o objeto do litígio e temas da prova. Por conseguinte, linearmente, se tem que concluir que não foi apreciada – nem tinha que o ser, nem faria sentido que o fosse – qualquer questão atinente à validade/legitimidade da resolução contratual. Assim, não tem qualquer fundamento a invocação feita pela recorrente de que o tribunal violou o caso julgado, violação que só poderia conceber-se - em tese e para facilidade de exposição - caso o tribunal tivesse proferido alguma decisão (v.g. conhecimento de alguma exceção ou de parte do mérito da causa) em que houvesse de apreciar a “validade/legitimidade” da resolução contratual, tendo-a afirmado. Acresce que, tendo a recorrente invocado decisão tomada em audiência prévia, indicando até a passagem da referida gravação de onde tal decorreria, o certo é que, ouvida a gravação, impõe-se afirmar que o tribunal nada decidiu sobre a “validade da resolução”, limitando-se a auscultar as partes, em face da existência da carta a comunicar a resolução e ao conteúdo, algo omisso, dos articulados a esse respeito, sobre se ocorreu a resolução, sem nunca tecer qualquer consideração quanto à validade da mesma, vocábulo que não consta sequer ter sido proferido, nem qualquer outro que possa associar-se-lhe.
Acrescenta a recorrente, ainda, que o tribunal deu como assente a validade da resolução e, por isso, tal matéria não foi levada aos temas da prova e não foi objeto de discussão. Afigura-se-nos que a recorrente confunde duas realidades distintas, uma delas reportada ao envio do escrito/carta que remeteu à autora/recorrida a comunicar que resolvia o contrato. O envio dessa carta e seu conteúdo consta do facto provado n.º14, e, como alega a recorrente e se admite, o documento respetivo, junto pela autora, com o requerimento de 11.11.2021, não foi impugnado pela ré (sua autora, aliás), pelo que, à data da audiência prévia estava já provado o envio da carta e o conteúdo dela, razão pela qual, se compreende que não conste dos temas da prova qualquer ponto a esse respeito. Mas o envio dessa comunicação e conteúdo dela, é coisa distinta da apreciação a efetuar – em face do conjunto dos factos que resultem provados e/ou não provados – sobre se quem resolveu o contrato, no caso a ré/recorrente, tinha fundamento contratual ou legal para resolver o contrato, apreciação essa que, vulgarmente, se associa à validade/legitimidade da resolução. Assim, a “validade/legitimidade” da resolução não é um facto em si mesmo, é uma conclusão, no sentido de que corresponde ao resultado da apreciação a fazer pelo tribunal - em face dos factos que sejam pertinentes - sobre a existência ou inexistência de fundamento legal para que a parte resolvesse o contrato. Em consequência, não havia que levar aos temas da prova, ao contrário do propugnado pela recorrente, a “validade/legitimidade” da resolução, porquanto, não se trata de matéria de facto, mas de conclusão a extrair – ou a infirmar - dos factos que tenham sido alegados e se provem, designadamente, sobre o (in)cumprimento contratual. A resolução contratual, que opera pela comunicação feita por uma parte à outra, não se confunde, pois, com a efetiva existência de fundamento para operar, por tal via, a extinção do vínculo contratual, donde a afirmação de que o contrato foi resolvido não encerra qualquer juízo sobre a dita “validade/legitimidade” da resolução. Inexiste, por isso, qualquer decisão em sede audiência prévia sobre a validade/invalidade da resolução contratual, pelo que, não tem qualquer sustentação a nulidade imputada à sentença. De facto, haveria de ser na sentença final, tal como ocorreu, que o tribunal havia de apreciar, se relevante para a decisão, se a resolução do contrato a que a ré procedeu era fundada ou infundada, com as inerentes consequências.
Nesta parte improcede o recurso.
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2.2.2- Impugnação da matéria de facto/erro na apreciação da prova:
Sob a epígrafe “Dos erros de julgamento sobre a matéria de facto” constante das alegações, e face ao que consta das conclusões 6.ª a 10.ª, pretende a recorrente a alteração da matéria de facto.
Vejamos:
Nos termos do art.639.º n.º1 do CPC o recorrente deve apresentar a sua alegação na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
Por seu turno, nos termos do art.640.º do CPC que estabelece o “Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”: 1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. 3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.
Resulta evidente do artigo transcrito que pretendendo a parte recorrer na parte atinente à decisão de facto, impugnando-a, tem que cumprir diversos ónus, sob pena do recurso quanto à matéria de facto ser rejeitado e, por isso, não chegar a ser apreciado pelo Tribunal da Relação. Por conseguinte, numa primeira linha de exigências (n.º1 do art.640.º), deve obrigatoriamente especificar a) os concretos pontos de facto incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa; c) a decisão (diversa) que deve ser proferida. E numa segunda linha de exigência, se os meios indicados como fundamento do erro na apreciação das provas tiverem sido gravados, sob pena de imediata rejeição do recurso, tem o recorrente que indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda.
A jurisprudência é pacífica quando à necessidade de cumprimento de tais ónus. Assim, v.g. Acórdão do STJ Uniformizador de Jurisprudência, de 17.10.2023 onde se diz “Com efeito, no art.º 640, sob a epígrafe “Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”, consta do n.º1, Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgado; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da recorrida; e quanto ao ora em análise, c) A decisão que no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. Apontados como ónus primários, pois têm como função delimitar o objeto do recurso, fundando os termos da impugnação, daí a sua falta traduzir-se na imediata rejeição do recurso, em contraposição aos ónus secundários, previstos no n.º2 do art.º640 relativos à alínea b) do n.º1, enquanto instrumentais do disposto no art.º 662, que regula a modificabilidade da decisão sobre a matéria de facto pelos Tribunais da Relação, permitindo assim, um efetivo segundo grau de jurisdição no conhecimento das questões de facto, na procura da sua melhor realização, em termos relevantes, isto é, na busca da verdade material com a decorrente justa composição dos litígios.”; ou nos dizeres do sumário do Ac. TRG de 12.10.2023 (relatora Maria João Matos), “I. O ónus de impugnação da matéria de facto julgada exige que, cumulativamente, o recorrente indique os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, os meios probatórios e as exactas passagens dos depoimentos que os integrem que determinariam decisão diversa da tomada em primeira instância - para cada um dos factos que pretende impugnar -, e a decisão que deverá ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (art.º 640.º, n.º 1 e n.º 2, do CPC).”, ou ainda no Ac. TRP de 12.7.2023 (Paula Leal de Carvalho) “A impugnação da decisão da matéria de facto deve ser rejeitada quando o Recorrente: não deu cumprimento, nas conclusões, aos requisitos previstos nas als. a) e c) do nº 1 do art. 640º, do CPC pois que não indicou os concretos pontos da decisão da matéria de facto de que discorda e as respostas que, em seu entender, deveriam ter sido dadas, sendo que são estas que delimitam o objeto do recurso; não deu igualmente cumprimento a tais requisitos no corpo das alegações, pois que, aí, limita-se a transcrever os factos provados e não provados e a dizer que o juiz “não poderia ter dado todos os factos acima identificados como não provados” sem concreta indicação das respostas que, em seu entender, deveriam ter sido dadas; não cumpriu o disposto na al. b) do nº 1 do citado art. 640º, mais não fazendo do que uma impugnação em bloco, não conexionando cada facto individualizadamente (ou, pelo menos, grupos de factos que estejam em intimamente relacionados) com os concretos meios de prova que aduz; e não cumpriu o disposto no art. 640º, nº 2, al. a), não localizando, na gravação, o momento temporal (minutos) correspondente aos depoimentos que transcreve.”, ou Ac. TRL de 11.7.2024 (Paulo Fernandes da Silva) “II.–Sob pena de rejeição do recurso da decisão de facto, na impugnação desta o Recorrente tem um triplo ónus: (i) concretizar os factos que impugna, (ii) indicar os concretos meios de prova que justificam a impugnação e impõem uma decisão diversa, sendo que caso tenha havido gravação daqueles deve o Recorrente indicar as passagens da gravação em que funda a sua discordância, e (iii) especificar a decisão que entende dever ser proferida quanto à factualidade que impugna.”, todos acessíveis em www.dgsi.pt.
Haverá ainda de ter em conta que, relativamente à forma/modo de cumprimento do ónus previsto na al. c) do n.º1 do art.640.º, questão que vinha gerando controvérsia, o já mencionado Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º12/2023, de 17.10.2023, com a retificação operada pela declaração de retificação n.º25/23 (DR de 28.11.2023) uniformizou a jurisprudência da forma seguinte: «Nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa pretendida, desde que a mesma resulte, de forma inequívoca, das alegações».
Já quanto ao cumprimento do ónus previsto na al. a) do n.º1 do art.640.º do CPC, como ressalta também desse mesmo acórdão uniformizador, a indicação dos concretos ponto de facto terá, sob pena de rejeição, que constar das conclusões do recurso.
Quanto à indicação dos concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (al. b) do n.º1 do art.640.º), vem sendo entendido que tal ónus se cumpre se for possível extrair com segurança das alegações de recurso a indicação dos concretos meios probatórios em que o recorrente se funda para defender que se impõe decisão diferente sobre cada um dos pontos de facto concretamente impugnados.
Por outro lado, ainda, não há lugar a convite ao aperfeiçoamento, tendo em vista o cabal cumprimento dos ónus impostos ao recorrente quando impugna a decisão sobre a matéria de facto (Ac. STJ de 25.11.2020 (Paula Sá Fernandes) “II. Omitindo a Recorrente o cumprimento dos ónus processuais a que se refere o artigo 640.º do CPC, impõe-se a imediata rejeição da impugnação da matéria de facto, não sendo aplicável o convite ao aperfeiçoamento das conclusões a que se refere o n.º1, b) do artigo 652.º do CPC.”; Ac. STJ de 14.2.2023 (Jorge Dias), “III - No recurso sobre a matéria de facto se as conclusões forem deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não contemple o estatuído no art. 640.º, o relator não tem o dever de convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, na parte afetada. IV - Ou seja, quando o recurso da matéria de facto se apresenta deficiente, sem dar cumprimento ao disposto no art. 640.º do CPC, não há lugar a despacho de convite ao aperfeiçoamento.”, - acessíveis em www.dgsi.pt.
Acresce, que o conhecimento da impugnação da matéria de facto, pelo Tribunal da Relação, haverá de se revelar necessário e relevante para a apreciação das questões objeto do recurso, donde, evidenciando-se que a alteração dos factos pretendida não tem a virtualidade de se repercutir, alterando ou modificando os termos da questão a apreciar no recurso, o tribunal superior não tem que conhecer do recurso sobre a impugnação da matéria de facto, ou conhecê-lo na sua totalidade, podendo a apreciação cingir-se aqueles concretos pontos de factos relevantes e cuja alteração, supressão ou aditamento, tenham a virtualidade de se puderem repercutir na decisão final do recurso, em face das demais questões objecto do mesmo. Neste sentido, entre outros, Ac. STJ de 3.11.2023 (Mário Belo Morgado), em cujo sumário se exarou: “I- O julgamento da matéria de facto está limitado aos factos articulados pelas partes, nos termos do art. 5º, nº 2, do CPC [sem prejuízo das circunstâncias particulares contempladas nas alíneas a) a c) deste mesmo nº 2]. II- Se determinados pontos não foram alegados pelas partes, nem constam do elenco dos factos provados e não provados constantes da sentença da primeira instância, eles são insuscetíveis de constituir o objeto de impugnação da decisão de facto dirigida a aditá-los à factualidade provada. III- Nos recursos apenas se impõe tomar posição sobre as questões que sejam processualmente pertinentes/relevantes (suscetíveis de influir na decisão da causa), nomeadamente no âmbito da matéria de facto. IV- De acordo com os princípios da utilidade e pertinência a que estão sujeitos todos os atos processuais, o exercício dos poderes de controlo sobre a decisão da matéria de facto só é admissível se recair sobre factos com interesse para a decisão da causa, segundo as diferentes soluções plausíveis de direito que a mesma comporte. V- Deste modo, o dever de reapreciação da prova por parte da Relação apenas existe no caso de o recorrente respeitar os ónus previstos no art. 640.º, n.º 1 do CPC, e, para além disso, a matéria em causa se afigurar relevante para a decisão final do litígio. VI- Na parte em que na revista se visa (em última análise) que a Relação adite à matéria de facto determinados pontos que são insuscetíveis de influir na decisão da causa (à luz das diversas soluções plausíveis da questão de direito), o recurso é inútil, o que obsta ao conhecimento do respetivo objeto.”; Ac. TRL de 26.9.2019 (Carlos Castelo Branco) – “I)– Não se deverá proceder à reapreciação da matéria de facto quando os factos objecto de impugnação não forem susceptíveis, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação, de ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe ser inútil, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processuais (arts. 2º, nº 1, 137º e 138º, todos do C.P.C.).”; Ac. TRC de 25.10.2022 (João Moreira do Carmo) - “I - Não há lugar à reapreciação da matéria de facto quando o facto concreto objecto da impugnação for insusceptível de, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação, ter relevância, importância ou suficiência jurídica para a solução de direito e mérito do recurso, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente; Ac. TRG de 22.10.2020 (Maria João Matos) -” V. Por força dos princípios da utilidade, da economia e da celeridade processual, o Tribunal ad quem não deve reapreciar a matéria de facto quando o(s) facto(s) concreto(s) objecto da impugnação for(em) insusceptível(eis) de, face às circunstância próprias do caso em apreciação e às diversas soluções plausíveis de direito, ter(em) relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe ser inútil.” (acessíveis em www.dgsi.pt)
Em face do que fica dito, vejamos o caso dos autos.
Pretende a recorrente a alteração dos factos provados vertidos sob os pontos 7 e 15 dos factos provados.
Diz a recorrente na 7.ª conclusão do recurso que “o facto ínsito no n.º 7 da matéria de facto provada deve ser corrigido e/ou completado de modo a que passe a integrar a redação completa da cláusula 5ª do contrato de mediação imobiliária, devendo acrescentar-se o seu restante conteúdo, isto é: “nos termos e com as exceções previstas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro”. E, justifica a necessidade da alteração na conclusão 8.ª, dizendo “pois tal conteúdo adicional implica que a Autora teria direito à remuneração, não apenas por encontrar um destinatário para o negócio (como se refere no facto provado n.º 7), mas também por praticar os atos necessários à promoção ativa da celebração efetiva do negócio pretendido pelas partes (ou seja, nos termos da lei, é necessária a “conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação”) – cfr. Contrato de Mediação Imobiliária junto sob o Doc. n.º 5 da Petição Inicial.”.
O ponto 7 da matéria de facto provada constante sentença tem o seguinte teor: “7. A A. e a R. estabeleceram ainda na Cláusula 5ª do referido contrato que seria devida a quantia global de 150.000,00€ (cento e cinquenta mil euros), acrescida de IVA à taxa legal de 23%, a título de remuneração, se a A. conseguisse encontrar um destinatário que concretizasse o negócio visado pelo contrato.”. Este ponto 7) da matéria de facto é sequencial, também em termos cronológicos, relativamente aos pontos anteriores, designadamente, aos pontos 4 e seguintes. Ora, está provado no ponto 4 – “No dia 13 de Abril de 2017, a A. e a R. celebraram um contrato de mediação imobiliária entre si, conforme doc. n.º 4 cujo teor se dá por integralmente reproduzido.”, pelo que, em face desse ponto 4) está adquirido na matéria de facto provada esse contrato e todo o seu clausulado - constante do documento 4, que se considerou reproduzido. Está provado no ponto 5) – “Cerca de um mês após a data da celebração do contrato de mediação imobiliária a R. transmitiu ao sócio-gerente da sociedade A. – FF..- que a sua intenção seria a de vender as futuras fracções autónomas de forma integral e não de forma autonomizada.” E em decorrência prova-se no ponto 6 – “Assim, no dia 2 de Maio de 2017, a A. e a R. celebraram novo contrato de mediação imobiliária desta feita para a venda do prédio urbano na totalidade, pelo preço global de 3.300.000,00 € (três milhões e trezentos mil euros), em regime de não exclusividade, por um prazo de 6 meses, renovável automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não fosse denunciado com a antecedência mínima de dez dias em relação ao seu termo.”. Ou seja, o tribunal destaca nos pontos 6 e 7 as alterações significativas relativamente ao contrato anterior, que são, aliás, as pertinentes. Por outro lado, o que a recorrente pretende aditar ao ponto 7), é a expressão constante do n.º1 da clausula 5.ª: “nos termos e com as exceções previstas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro”, e não a totalidade dessa cláusula, como parecia anunciar. Mas aquela expressão é uma remissão do contrato para o regime legal e esse aditamento nada acrescentaria de útil à factualidade vertida no ponto 7), tratando-se apenas de uma remissão para o regime legal. Ora o tribunal haverá sempre de ter em consideração o regime legal aplicável, não estando sujeito às alegações das partes no que respeita à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art.5º n.º3 do CPC). E que tal acrescento é inócuo retira-se do teor completo do n.º1 da cláusula 5.ª “A remuneração é devida se a mediadora conseguir destinatário que celebre com o segundo contraente o negócio visado pelo presente contrato, nos termos e com as excepções previstas nos n.º1 e 2 do art.19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro.”, ou seja, trata-se de uma previsão contratual que corresponde praticamente ao regime legal constante do art.19.º da Lei aí invocada. Ademais, não colhe a justificação da recorrente contida na 8.ª conclusão porque, contrariamente ao que parece ser a sua interpretação do ponto 7) ora em crise, o certo é que deste já consta que seria devida a quantia global de 150.000,00€ (cento e cinquenta mil euros), acrescida de IVA à taxa legal de 23%, a título de remuneração, se a A. conseguisse encontrar um destinatário que concretizasse o negócio visado pelo contrato, pelo que, a conclusão do negócio determinante do pagamento da remuneração já está contida nesse ponto 7) e sempre resultaria do regime legal, independentemente da remissão do n.º1 da cláusula 5.ª.
Assim, porque irrelevante, não há que proceder a qualquer correção com vista a aditar a referida expressão constante do n.º1 da cláusula 5.ª.
No que respeita ao ponto 15) dos factos provados entende a recorrente que “deve ser modificado (por o valor mencionado corresponder a matéria de facto que não ficou provada, além de o valor indicado não poder estar correto, atendendo à prova documental produzida), passando a prever apenas que: “A outorga das escrituras de compra e venda veio, assim, a ocorrer no dia … de fevereiro de 2021, no Cartório Notarial do dr….., em…., tendo a R. ali recebido o valor remanescente do preço.” – cfr. Contrato-promessa de compra e venda e Escrituras Públicas juntas à Petição Inicial sob os Docs. n.º 6, 7, 9, 10 e 11.
O teor do ponto 15), recorde-se, é “A outorga das escrituras de compra e venda veio, assim, a ocorrer no dia … de Fevereiro de 2021, no Cartório Notarial do Dr. ..em…, tendo a R. ali recebido o valor remanescente do preço, num total de 3.080,16 € (três milhões, oitenta euros e dezasseis cêntimos), assim discriminado: i. Fracção autónoma designada pela letra H, pelo valor global de 371.400,00€; ii. Fracção autónoma designada pela letra l, pelo valor global de 319.560,00€; iii. Fracção autónoma designada pela letra D, pelo valor global de 329.280,00 €; iv. Fracção autónoma designada pela letra J, pelo valor global de 468.600,00€; v. Fracção autónoma designada pela letra B, pelo valor global de 316.320,00€; vi. Fracção autónoma designada pela letra F, pelo valor global de 342.240,00€. vii. Fracção autónoma designada pela letra A, pelo valor global de 303.360,00€. viii. Fracção autónoma designada pela letra C, pelo valor global de 309.840,00€; ix. Fracção autónoma designada pela letra G, pelo valor global de 319.560,00€;
Evidencia-se que tal ponto da matéria de facto contém um lapso de escrita ou de cálculo no que concerne ao valor global, posto que o valor correto, resultante do somatório das parcelas identificadas no mesmo ponto de facto, é €3.080.160,00 (três milhões, oitenta mil e cento e sessenta euros) e não o que foi feito constar. Este ponto 15) corresponde ao que foi alegado no art.20.º da petição inicial e que já continha aquele erro de cálculo, como dá nota a recorrente. Da sentença consta que esse facto assenta nos documentos juntos aos autos, retirando-se, aliás, do ponto 16) que são as escrituras de compra e venda. Contudo, a ora recorrente insurge-se - como melhor se compreende das respetivas alegações - contra o que consta desse ponto 15, porquanto, na interpretação que dele faz extrai que o pagamento do preço foi feito no acto da escritura, contrapondo que se extrai da prova documental que antes tinham havido pagamentos. A recorrida, ao invés, faz leitura diferente no sentido de que do ponto 15) não resulta que a totalidade do preço foi paga no acto da escritura. E quanto a nós, não se extrai da redação dada a esse ponto 15) que todo o preço foi pago no acto da escritura, ao invés, o que se diz é que no acto da escritura foi recebido o remanescente do preço, afirmação que encerra, por isso, a existência de pagamentos anteriores (em conformidade com o que consta dos contratos promessa dos quais também decorre que havia remanescente a pagar no acto da escritura), donde, em sintonia, no que respeita aos valores mencionados nesse ponto 15, os mesmos são os valores das vendas e não os valores pagos no acto da escritura. Desta feita, nesse enfoque, a incorreção que a recorrente imputa a esse ponto de facto resulta da sua incorreta leitura/interpretação, pelo que, se mais não houvesse, ter-se-ia que concluir que nenhuma correção se impõe fazer, sem prejuízo da correção do erro de escrita/cálculo já acima mencionado. Contudo, o valor global da venda que consta desse ponto 15), vista a matéria de facto provada na sua totalidade e conjugadamente, seria, então, inferior ao valor da proposta que consta como tendo sido aceite nos pontos 9) e 10) dos factos provados, realidade que, efetivamente, como diz a recorrente (que invoca que o valor não pode estar correto, atendendo à prova documental produza), é desmentida pelos documentos – escrituras- em que o tribunal a quo diz ter firmado a sua convicção. Tal ocorre porque, na senda da alegação desse facto na petição, que o tribunal a quo, acriticamente, seguiu, não foi considerado o valor de uma fração, a fração E, posto que no ponto 15) são indicados os valores de 9 frações quando o prédio tem 10 frações, o que resulta à saciedade dos documentos, quer das escrituras de compra e venda, quer dos contratos promessa mencionados no ponto 11) dos factos provados. Ademais, resulta do ponto 9) dos mesmos factos que a proposta englobava a totalidade das futuras frações autónomas da ré. No contexto global da matéria de facto assente e tendo em conta as questões a apreciar, não é irrelevante que a matéria de facto ateste se o valor global da venda é superior ou inferior ao valor da proposta obtida pela A., (tanto mais que a recorrente, também, vem esgrimir no recurso – conclusão 13 – que o contrato definitivo foi celebrado por um preço diferente), pelo que, é a própria matéria de facto assente que impõe que deva ser corrigido esse ponto 15), em conformidade com as escrituras de compra e venda, por forma a dele constar também o valor da fração E – vendida pela escritura a que corresponde o documento 11 junto com o requerimento da A. datado de 11.11.2021. E o valor da venda da dita fração é de €309.840,00, o que somado ao valor correto do conjunto das demais frações, atinge o total de €3.390.000,00.
Nos termos do art.662.º nº1 do CPC “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”
Assim, ainda que não colha em toda a sua extensão, a correção com o conteúdo proposto pela recorrente, como acima visto, impõe-se a alteração do ponto 15) da matéria de facto, por forma a harmonizá-lo com os demais factos assentes e considerando o teor das escrituras, pelo que, tal ponto de facto, passa a ter a seguinte redação: “A outorga das escrituras de compra e venda veio, assim, a ocorrer no dia .. de Fevereiro de 2021, no Cartório Notarial do Dr. …em…, tendo a R. ali recebido o valor remanescente do preço, num total de €3.390.000,00, assim discriminado: i. Fracção autónoma designada pela letra H, pelo valor global de 371.400,00€; ii. Fracção autónoma designada pela letra l, pelo valor global de 319.560,00€; iii. Fracção autónoma designada pela letra D, pelo valor global de 329.280,00 €; iv. Fracção autónoma designada pela letra J, pelo valor global de 468.600,00€; v. Fracção autónoma designada pela letra B, pelo valor global de 316.320,00€; vi. Fracção autónoma designada pela letra F, pelo valor global de 342.240,00€. vii. Fracção autónoma designada pela letra A, pelo valor global de 303.360,00€. viii. Fracção autónoma designada pela letra C, pelo valor global de 309.840,00€; ix. Fracção autónoma designada pela letra G, pelo valor global de 319.560,00€; x. Fracção autónoma designada pela letra E, pelo valor global de 309.840,00€;
Pretende, ainda, a recorrente que sejam considerados provados os factos constantes das seguintes alíneas dos factos não provados: a) Que o sócio gerente da A.- FF..– solicitou à Ré que fizesse o pagamento da comissão acordada, não à A. mas a outra empresa do “grupo”. b) Que o pagamento da comissão devida pela assinatura do contrato promessa (60% indicados no contrato subscrito em Maio de 2017) foi efectuado mediante a entrega ao Sr. FF, dos cheques referidos no facto assente n.º 22. d) As promitentes compradoras recusaram celebrar o contrato prometido na data acordada – Fevereiro de 2018. e) A A. não deu qualquer contribuição para que a venda se concretizasse.
Para tanto, invoca:
- os documentos 1 a 4 juntos com a contestação,
-depoimento de parte do representante legal da autora, …;
- depoimento da testemunha LL;
-depoimento da testemunha P.C;
Estando identificados os concretos pontos de facto, sendo indicados também os concretos meios de prova que a impugnante entende determinarem decisão diferente, estando invocado com clareza o sentido desta decisão diferente e constando quer das conclusões quer das alegações de recurso as passagens das declarações e depoimentos gravados que são relevantes (sendo de admitir, face à argumentação da recorrente, uma maior extensão de tais depoimentos), mostram-se cumpridos os ónus de impugnação acima identificados, ao que tudo acresce que, na economia do recurso, a matéria impugnada mostra-se relevante face à pretensão final da recorrente, qual seja a revogação da sentença por improcedência do pedido deduzido pela recorrida.
A sentença objeto de recurso quanto a esta matéria não provada exarou na motivação: “No que respeita aos factos não provados a convicção do Tribunal no que respeita à matéria referida nas alíneas a) e b) resultou da conjugação dos depoimentos de LL…. e do legal representante da A. que esclareceram que os trabalhos realizados pela V… nada têm a ver com os trabalhos realizados pela A., sendo que nenhuma outra prova foi apresentada e que, tratando-se de matéria de excepção, a prova destes factos caberia à Ré. Efectivamente, apesar de se encontrar provado que foram feitos pagamentos pela Ré à V…, empresa que tinha como sócio gerente o legal representante da A., o certo é que nem os valores nem a data dos pagamentos efectuados permite concluir que aqueles pagamentos foram por conta dos serviços de mediação imobiliária em causa nos autos. Efectivamente, a Ré invoca que aquele valor global 109.800,00€ corresponde ao valor de 60% da remuneração acordada (90.000€ acrescida de IVA à taxa de 21% aplicável na Região autónoma da Madeira). Ora, nem o IVA na Região Autónoma da Madeira era de 21% (é, em regra 1% abaixo do IVA no continente, ou seja 22%) nem, mesmo que assim fosse, o valor seria o referido 109.800,00€. Refira-se que a testemunha P.C… referiu que no dia do contrato promessa assistiu à entrega de um cheque, por parte da legal representante da R., ao legal representante da Autora. Porém, afirmou desconhecer o montante ou mesmo se era relacionado com o negócio em causa ou com qualquer outro. Ora, o contrato promessa foi outorgado no dia 5/05/2017 os cheques emitidos à ordem de V…. são datados de 19 de Maio e de 20 de Julho o que deixa dúvidas que o cheque entregue naquela data ao legal representante da A. fosse algum dos cheques aqui invocados. Mas, ainda que fosse, mantém-se a dúvida de que visasse pagar a comissão pela mediação imobiliária.No que respeita aos factos referidos em c) e d), consideraram-se não provados face ao depoimento do comprador P.C…. Esta testemunha prestou um depoimento que se considerou claro, isento e desinteressado, afirmando que o conflito com a Ré nada teve a ver com a A. prendendo-se com o facto de a Ré, apos a celebração dos CPCV ter destinado os imóveis objectos daqueles contratos a alojamento local, o que motivou que tivesse que intentar acção contra a vendedora, ora Ré, peticionando condenação desta a cumprir o contrato. Mais esclareceu que o contrato prometido não havia sido celebrado na data inicialmente agendada uma vez que a obra não se encontrava concluída. Este depoimento foi ainda determinante para que se considerassem não provados os factos referidos em e) e f). Esclareceu esta testemunha que o legal representante da A. sempre acompanhou quando foi necessário e esteve sempre disponível não podendo fazer mais já que havia um litigio judicial.”
A recorrente, quanto aos concretos meios de prova que impõem decisão diferente invoca os mesmos depoimentos e declarações em que o tribunal a quo se sustentou para concluir que os mesmos não são suficientes para superarem a dúvida relativamente a tal matéria, que resultou, por isso, não provada. Tal como é dito na sentença, trata-se de factualidade impeditiva do direito da A. à remuneração, pelo que, cabe à ré o ónus da prova, e, na dúvida, a mesma resolve-se contra ela ré, a quem os factos aproveitariam (art.342.º n.º2 do CC e art.414.º do CPC).
Vejamos em detalhe:
Lida a argumentação que a recorrente desenvolve para sustentar a sua pretensão, constata-se que a mesma reconhece, salvo, concede-se, no que respeita ao depoimento da testemunha P.C., que quer as declarações do legal representante da autora quer o depoimento da testemunha LL.., não dão cobertura à decisão diversa por si propugnada, ou seja, à prova dos factos; sucede que vem aqui defender que “tais declarações eram claramente falsas e destinavam-se a encobrir um esquema montado por ambos para obtenção de benefícios fiscais”, falsidade que pretende retirar do documento n.º1 junto com a sua contestação - matrícula da sociedade V./Gr.. - por ter sido “constituída em 2011 precisamente pelo Sr. FF… e pela Sra. LL…,” e porque “à data da celebração do contrato de mediação imobiliária com a Ré e do contrato-promessa de compra e venda entre a Ré e a compradora dos imóveis (em abril/maio de 2017), eram sócios-gerentes da empresa (cada um com 50% e obrigando-se a sociedade com a assinatura de ambos) o Sr. FF ….e, pasme-se, o filho menor da Sra. LL…!”, e “à data da celebração do contrato de mediação imobiliária com a Ré e do contrato-promessa de compra e venda entre a Ré e a compradora dos imóveis (em abril/maio de 2017), eram sócios-gerentes da empresa o Sr. FF… e, pasme-se, o filho menor da Sra. LL …!” e “apesar de a Sra. LL … ter cedido a sua quota de 35,00 € poucos meses após a constituição da empresa (por sinal, a um familiar do Sr. FF…, o Sr. AA….), a mesma não deixou de estar ligada à empresa, (…) tendo-se mantido no cargo até 2016 ou seja, até ao momento em que o Sr. AA …cedeu a referida quota ao filho menor da Sra. LL. (…) em 2019, o filho da Sra. LL …. chegou mesmo a ser designado gerente com poderes de vinculação da sociedade em conjunto com o Sr. FF…, apesar da sua tenra idade e dos serviços (alegadamente) altamente especializados de consultoria imobiliária que a testemunha e o representante legal da W…afirmaram que esta empresa prestava.(…) o filho da Sra. LL também é sócio da W. Consulting Lda. (empresa que é detentora da totalidade das quotas da W…, segundo resulta do Doc. n.º 1 junto à Petição Inicial (…). estes negócios obviamente tiveram de ser celebrados pela Sra. LL …enquanto única titular das responsabilidades parentais do seu filho durante a sua menoridade, o que a mesma confirmou.”, concluindo que é falso que a testemunha LL seja prestadora de serviços para a A., e avançando de igual forma que o legal representante da A. respondeu com falsidade à questão do pagamento da comissão de mediação imobiliária à V…/Gr....
No que concerne ao referido documento 1 junto com a contestação, que a recorrente convoca nesta sede, relativo à matricula da sociedade à qual, alegadamente, fora paga a remuneração devida pela mediação imobiliária, apesar das relações societárias que dela resultam e das relações familiares da testemunha LL ..e um dos sócios, em tempo, da dita sociedade, seu filho menor, (que a dita testemunha confirma no seu depoimento), esse documento e os factos que o mesmo atesta, não permitem, manifestamente, fazer as extrapolações que a recorrente faz para concluir pela existência de um conluio, que, por sua vez, determinaria e justificaria a falsidade desses depoimentos e, em segunda decorrência, deveria determinar a prova dos factos em causa apesar de resultarem infirmados pelas declarações dessas pessoas. E a argumentação da recorrente é tão insubsistente neste particular – posto que não objetivada em qualquer outro meio de prova-, que dispensa muito maiores considerações. Admitindo a recorrente que os depoimentos do legal representante da A. e da referida testemunha, não atestam os factos em causa, factos que também não resultam, por si, da análise dos cheques nem das faturas que a eles são associadas (faturas que referem serviços de consultoria), nada acrescentando a este respeito os extratos bancários relativos ao desconto dos cheques – tudo sendo os documentos 1 a 4 invocados em suporte pela recorrente – a alteração do sentido da decisão de “factos não provados” para “factos provados”, só poderia ter alguma virtualidade se, no mínimo, ocorressem de forma evidente circunstâncias, atestadas por meios probatórios inconsiderados pela 1.ª instância ou fosse patente de tais depoimentos, a falsidade do declarado, falta de credibilidade dos declarantes/depoentes, manifesta inverosimilhança das declarações, incoerência suscetível de abalar a credibilidade; e tudo em termos de afastar a dúvida sobre a verificação de tais factos, convencendo da sua efetiva ocorrência. Tal não se verifica. No que concerne às declarações do legal representante da autora, FF, ouvidas as mesmas, (de notar que a recorrida contrapõe outras passagens de tais declarações, que haverão também de ser consideradas) o que se constata é que negou o facto que veio a constar da alínea a) ora em causa, negou que os cheques se destinassem ao pagamento da remuneração relativa à intermediação imobiliária (alínea b), tendo explicado, de forma escorreita, sem hesitação, as razões da existência desses cheques, o negócio a cujo pagamento se destinavam, negando inclusive, que os valores e datas se harmonizassem com os pagamentos da remuneração, face ao estipulado no contrato de mediação; refutou de forma circunstanciada a factualidade que veio a constar da alínea e); tais declarações não corroboram minimamente o facto não provado constante da alínea d) na medida em que o declarante imputa a não realização da escritura à vendedora e não às compradoras. Em síntese, tais declarações são insuscetíveis de determinar convicção positiva da verificação dessa factualidade. Relativamente ao depoimento da testemunha LL, ouvido o mesmo, sendo transversal ao desenrolar dele, as questões relativas à factualidade cuja impugnação está agora em causa, tal como já se verifica relativamente às declarações do legal representante da autora, o depoimento dessa testemunha não corrobora nem sustenta a referida factualidade, como a recorrente reconhece. No que respeita ao testemunho de P.C., tal como consta da transcrição feita pela recorrente e se atesta da audição do depoimento o mesmo declarou na “Sim, no dia da assinatura do contrato, eu assisti a… pronto, o Sr. FF a pedir um…pronto, um cheque que devia ser para pagamento da comissão, deduzo eu.”, ou seja, a testemunha afirma ter deduzido que o cheque que viu ser pedido era para pagamento da comissão, pelo que, tal como considerou o tribunal a quo, o declarado é insuficiente para suportar convicção positiva sobre os factos constantes das alíneas a) e b) ora em análise. Tal depoimento também não corrobora o facto constante da alínea e), declarando a testemunha, ao invés, que houve acompanhamento do negócio pela A., “acompanharam nos momentos mais difíceis”, explicando ainda que, passando a haver um litigio em tribunal por si relacionando com o incumprimento do contrato-promessa, a situação estava condicionada pelo mesmo.
Face ao que se acaba de expor, do conjunto desses meios de prova invocados pela recorrente, ainda que, como pretende a mesma recorrente, conjugados com os ditos documentos, nada havendo que corrobore objetivamente (face à já acima analisada insuficiência dos documentos invocados, para esse efeito) a falsidade do declarado, há que considerar que o tribunal recorrido fez correta apreciação da prova nesse particular, evidenciando na motivação as razões que determinaram que tais factos fossem considerados não provados, razões que se acompanham, por não ter a prova produzida afastado a dúvida sobre a sua verificação.
Por conseguinte, improcede, nesta parte, a impugnação da matéria de facto, mantendo-se a decisão do tribunal recorrido que considerou não provados os factos constantes das alíneas a), b), d) e e).
*
E, em face do decidido supra, os factos provados a considerar, tendo em conta a alteração do ponto 15), são os seguintes: 1. A sociedade A. exerce a actividade de mediação imobiliária, detendo a licença AMI n.º …, conforme certidão permanente da sociedade e licença emitida pelo Instituto dos Mercados Públicos do Imobiliário e da Construção (IMPIC).(docs. nos 1 e 2). 2. A Ré, que já usou a designação "H.., Lda" e, actualmente, denominada "H.., unipessoal, Lda." é uma sociedade unipessoal que exerce a actividade de compra e venda de imóveis, revenda dos imóveis adquiridos para esse fim, mediação de obras de construção, remodelação, ampliação, demolição e reconstrução de imoveis, (doc. n.º 3) 3. No âmbito da sua actividade, a Ré pretendia vender as futuras fracções autónomas do prédio urbano de que era proprietária sito…, na Rua, n.ºs 1, 1A, 1B, 1C e 3, freguesia de…, concelho de Lisboa, registado na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o n.º… e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de … sob o artigo …. 4. No dia 13 de Abril de 2017, a A. e a R. celebraram um contrato de mediação imobiliária entre si, conforme doc. n.º 4 cujo teor se dá por integralmente reproduzido. 5. Cerca de um mês após a data da celebração do contrato de mediação imobiliária a R. transmitiu ao sócio-gerente da sociedade A. - FF - que a sua intenção seria a de vender as futuras fracções autónomas de forma integral e não de forma autonomizada. 6. Assim, no dia 2 de Maio de 2017, a A. e a R. celebraram novo contrato de mediação imobiliária desta feita para a venda do prédio urbano na totalidade, pelo preço global de 3.300.000,00 € (três milhões e trezentos mil euros), em regime de não exclusividade, por um prazo de 6 meses, renovável automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não fosse denunciado com a antecedência mínima de dez dias em relação ao seu termo. 7. A A. e a R. estabeleceram ainda na Cláusula 5ª do referido contrato que seria devida a quantia global de 150.000,00€ (cento e cinquenta mil euros), acrescida de IVA à taxa legal de 23%, a título de remuneração, se a A. conseguisse encontrar um destinatário que concretizasse o negócio visado pelo contrato. 8. Mais, acordaram que aquele pagamento seria feito nas seguintes condições: i. 60 % após a celebração do contrato promessa de compra e venda e o remanescente de 40% com a conclusão do negócio. ii. Igualmente convencionaram que os "sessenta por cento serão divididos em duas tranches de 30% cada, a primeira a ser paga no CPCV e a segunda a 15 de Julho” (doc.5) 9. A A. desenvolveu esforços e logrou obter por parte do Sr. P.C… uma proposta global de compra da totalidade das futuras fracções autónomas da R, pelo valor de 3.240.000,00 (três milhões e duzentos e quarenta mil euros). 10. A referida proposta de compra foi aceite pela R. 11. No dia 5 de Maio de 2017 foi celebrado o contrato promessa de compra e venda entre a R. e três sociedades comerciais - "He…, Lda"; "P. C.. Lda." e "Co…, Lda" - todas elas representadas por P.C…, na qualidade de sócio gerente e na qualidade de gerente, conforme contratos promessas que se encontram juntos como doc. 6 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido. 12. Prescreve a cláusula décima-segunda do referido contrato que: “Ambos os contraentes, declaram que a presente promessa de compra e venda foi objecto de prestação de serviços de mediação imobiliária pela empresa de mediação imobiliária denominada W.. - Mediação Imobiliária, Lda., NIPC …., com a licença AMI n.º ….." 13. Em 27 de Fevereiro de 2018, foi efectuado um aditamento ao contrato promessa de compra e venda, nos termos do qual, as partes contratantes mantiveram a cláusula décima segunda nos seus exactos termos, conforme doc. n.º 7. 14. No dia 19 de Fevereiro de 2021 foi enviada pela R. uma missiva à sociedade A, que se encontra junta como doc. 8 e aqui se dá por reproduzida, através da qual a Ré comunica que “a decisão desta empresa em resolver o contrato de mediação imobiliária celebrado no dia 02 de Maio de 2017 relativo ao imóvel situado na Rua…, n.º 3, em Lisboa, o que fazemos com efeitos imediatos e motivado no incumprimento grave e reiterado das obrigações assumidas por V.exas nesse contrato. (…) V.Exas não envidaram quaisquer esforços para promover a conclusão do negócio visado (a venda do imóvel), ao contrário do que era obrigação e, nos termos legais, condição para a remuneração dos V. serviços. (…). O silêncio a que nos votaram desde essa altura, recusando todas as tentativas de contacto que efectuamos, não nos deixa, pois, outra alternativa senão a de exigir a restituição dos valores adiantados por conta do negócio que não ocorreu.” 15.A outorga das escrituras de compra e venda veio, assim, a ocorrer no dia .. de Fevereiro de 2021, no Cartório Notarial do Dr. …em…, tendo a R. ali recebido o valor remanescente do preço, num total de €3.390.000,00, assim discriminado: i. Fracção autónoma designada pela letra H, pelo valor global de 371.400,00€; ii. Fracção autónoma designada pela letra l, pelo valor global de 319.560,00€; iii. Fracção autónoma designada pela letra D, pelo valor global de 329.280,00 €; iv. Fracção autónoma designada pela letra J, pelo valor global de 468.600,00€; v. Fracção autónoma designada pela letra B, pelo valor global de 316.320,00€; vi. Fracção autónoma designada pela letra F, pelo valor global de 342.240,00€. vii. Fracção autónoma designada pela letra A, pelo valor global de 303.360,00€. viii. Fracção autónoma designada pela letra C, pelo valor global de 309.840,00€; ix. Fracção autónoma designada pela letra G, pelo valor global de 319.560,00€; x. Fracção autónoma designada pela letra E, pelo valor global de 309.840,00€; 16. Todas as escrituras de compra e venda celebradas entre a R e as sociedades compradoras contêm a expressa menção que nestes negócios jurídicos houve intervenção da sociedade A. enquanto mediadora imobiliária conforme docs. nºs. 9 10 e 11 que se dão por integralmente reproduzidos. 17. A A. enviou a factura número W2021/.., emitida em 20.03.2021 para a R. proceder ao pagamento da remuneração acordada pela mediação da venda das dez fracções do prédio urbano sito na Rua…., nos termos do contrato de mediação celebrado entre as partes, conforme doc. no 12 que ora se junta. 18. Porém, no dia 12 de Abril de 2021, através de carta registada, a R. enviou nova missiva à A. alegando, que se encontra junta como doc. 13 e aqui se dá por reproduzida e na qual a Ré referiu que “Queiram encontrar em anexo a V. factura n.º W2021/.., datada de 28/03/2021, que recusamos por não ser devida, não só por ter sido emitida ao arrepio de qualquer contrato em vigor, como por não corresponder a serviços praticados por V.Exas. Aproveitamos para solicitar a devolução dos 109.800,00€ que em 2017 adiantamos por conta dos serviços que V.Exas acabaram por não prestar, na fala do que não deixaremos de recorrer aos meios judiciais competentes, com vista à respectiva recuperação.” 19. FF, socio gerente da A. era o angariador indicado no contrato de mediação imobiliária e, também, sócio e gerente da sociedade com o NIPC …. que então girava com o nome V…., L.da (actualmente Gr…, L.da). 20. A Ré entregou ao Sr. FF…, dois cheques: um datado de 19/05/2017, no valor de 50.000,00€ e outro datado de 20/07/2017 no valor de 59.800,00€, ambos à ordem de V…, Lda. (doc. 2 da cont.) 21. Tais cheques foram descontados da conta da Ré, respectivamente nos dias 21/05/2017 e 23/07/2017 (doc. 3 e 4 da cont.) 22. FF… entregou à Ré duas facturas emitidas pela V…, L.da, uma datada de 19 de Maio de 2017 e outra de 10 de Julho de 2017, com valores correspondentes aos cheques recebidos da Ré. (doc. 2) 23. As referidas facturas, fazem menção a “serviço de consultoria imobiliária: prédio urbano sito na Rua…, 1-3, Lisboa” e “Serviço de consultoria imobiliária: Prédio urbano com 10 fracções sito na Rua…, 1-3, Lisboa” (doc. 2) 24. As escrituras foram realizadas em 25/02/2021 sem que tivessem sido emitidas às fracções transaccionadas as licenças de utilização.
2.2.3- Mérito da decisão/pressupostos (ou falta deles) do pagamento da remuneração
Tendo em conta os factos definitivamente fixados, cumpre decidir se deve ser mantida a sentença recorrida que condenou a recorrente a pagar à recorrida o valor da remuneração de 150 mil euros acrescida de iva, fixada no contrato.
E neste ponto, uma vez que improcedeu a impugnação da matéria dirigida aos factos não provados nos termos acima vistos, encontra-se prejudicada a apreciação do recurso na parte em que fazia decorrer a alteração da sentença da prova desses factos e, desde logo, a exceção de pagamento parcial invocada na 17.ª conclusão do recurso, posto que a factualidade provada não demonstra qualquer pagamento relativo à remuneração.
Mas a recorrente insurge-se contra o decidido mesmo em face da factualidade que vinha provada, numa primeira linha dizendo que na sentença recorrida não foi tido em conta “as consequências lógicas da anterior cessação do contrato de mediação imobiliária, mormente como impedimento à emissão de uma fatura relativa a um contrato já extinto” e, numa segunda linha, errou o tribunal a quo “por ter considerado que a comissão era devida apenas porque a autora encontrou um comprador (…) pois o contrato definitivo não foi celebrado na data acordada por as partes terem entrado em desacordo quanto ao preço e apenas foi celebrado muito mais tarde por um preço diferente” e, ainda, “os factos provados são insuficientes para fundar a decisão tomada a respeito do direito aplicável por faltarem os que poderiam permitir aferir da validade da resolução bem como os que poderiam permitir aferir da extensão do contributo da A. para a concretização do negócio visado”.
Vejamos:
As partes não discutem que entre elas foi celebrado um contrato que deve ser qualificado como de mediação imobiliária, qualificação já adotada em 1.ª instância e que não vem posta em causa. E em face dos factos provados estamos em presença de um acordo que se subsume a um contrato de mediação imobiliária, cuja regulação legal consta da Lei n.º15/2013 de 08 de Fevereiro.
A atividade de mediação imobiliária é definida no art.2.º n.º1 dessa lei como “1 - A atividade de mediação imobiliária consiste na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis.”, exigindo o art.16.º da mesma lei que o contrato seja reduzido a escrito, e dele constem, obrigatoriamente: a) A identificação das características do bem imóvel que constitui objeto material do contrato, com especificação de todos os ónus e encargos que sobre ele recaiam; b) A identificação do negócio visado pelo exercício de mediação; c) As condições de remuneração da empresa, em termos fixos ou percentuais, bem como a forma de pagamento, com indicação da taxa de IVA aplicável; d) A identificação do seguro de responsabilidade civil ou da garantia financeira ou instrumento equivalente previsto no artigo 7.º, com indicação da apólice e entidade seguradora ou, quando aplicável, do capital garantido; e) A identificação do angariador imobiliário que, eventualmente, tenha colaborado na preparação do contrato; f) A identificação discriminada de eventuais serviços acessórios a prestar pela empresa; g) A referência ao regime de exclusividade, quando acordado, com especificação dos efeitos que do mesmo decorrem, quer para a empresa quer para o cliente.
Por outro lado, o art.19.º do citado regime legal, no que respeita à remuneração da empresa, estabelece: 1 - A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra. 2 - É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel. 3 - Quando o cliente for um potencial comprador ou arrendatário, a empresa, desde que tal resulte expressamente do respetivo contrato de mediação imobiliária, pode cobrar quantias a título de adiantamento por conta da remuneração acordada, devendo as mesmas ser devolvidas ao cliente caso o negócio não se concretize. 4 - O direito da empresa à remuneração cujo pagamento caiba ao cliente proprietário de imóvel objeto de contrato de mediação não é afastado pelo exercício de direito legal de preferência sobre o dito imóvel. 5 - O disposto nos números anteriores aplica-se apenas a contratos sujeitos à lei portuguesa.
Estamos, pois, em presença de um contrato sujeito à forma escrita e objeto de regulamentação legal.
No que respeita à remuneração resulta do n.º1 do artigo acima transcrito que a mesma é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação, mas se tiver sido celebrado contrato promessa e as partes, no contrato de mediação, tiverem previsto o pagamento de remuneração nessa fase é a mesma devida com a celebração do contrato-promessa. Uma vez que o contrato dos autos foi celebrado em regime de “não exclusividade”, não tem interesse a previsão do n.º2 do art.19.º (ponto 6 dos factos provados).
Que o direito à remuneração apenas é devido com a conclusão do negócio visado pela mediação, já resultava dos regimes legais anteriores à lei que atualmente regula a atividade, posto que já assim estava previsto no art.19.º do DL 77/99 de 16 de março, do qual constava “1 - A remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação. 2 - Exceptuam-se do disposto no número anterior: a) Os casos em que o negócio visado, no âmbito de um contrato de mediação celebrado em regime de exclusividade, não se concretiza por causa imputável ao cliente da empresa mediadora, tendo esta direito a remuneração; b) Caso seja celebrado contrato-promessa relativo ao negócio visado pelo contrato de mediação, as partes podem prever o pagamento da remuneração após a sua celebração.”, pelo que, há muito que está sedimentado que o mediador imobiliário adquire o direito à remuneração com a conclusão do negócio visado. Assim, o direito à remuneração – no contrato de mediação em regime de não exclusividade - está referenciado ao resultado atingido pela atividade de mediação, ou seja, à conclusão do negócio visado pelo contrato de mediação (v.g. compra, permuta, arrendamento, ou qualquer outro negócio que vise a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis), mas daí não resulta, necessariamente, que tal contrato encerre uma obrigação de resultado para a empresa mediadora. Como escreve, Olga Marçal, “O Contrato de Mediação Imobiliária – Da (In) Admissibilidade da Revogação Unilateral Pelo Cliente”, acessível em https://estudogeral.uc.pt/ - citando Higina Castelo, Regime Jurídico da Atividade de Mediação Imobiliária Anotado, 2015 - “No regime atualmente em vigor (Lei 15/2013), como refere Higina Orvalho Castelo, - “O RJAMI dá abertura a que um contrato de mediação imobiliária se considere legalmente típico independentemente de a empresa de mediação ter assumido ou não uma obrigação e, no primeiro caso, independentemente do conteúdo da mesma obrigação (diligenciar por encontrar destinatário – meios – ou, encontra-lo – resultado)”. Tal significa que, por via de regra a obrigação assumida pelo mediador, no contrato de mediação imobiliária simples, será uma obrigação de meios (diligenciar por encontrar um destinatário). No contrato de mediação imobiliária com regime de exclusividade, poderá haver uma maior ou menor vinculação, conforme o acordado pelas partes e aqui pode encontra-se uma obrigação de meios ou de resultado. Esta posição encontra, desde logo, apoio na orientação assumida por Ricardo Lucas Ribeiro, o qual tendo por base o princípio da liberdade das partes na conformação do conteúdo dos contratos, acaba por concluir que “em princípio as partes podem converter validamente obrigações de resultado em obrigações de meios e obrigações de meios em obrigações de resultado”72, sem transcenderem os limites impostos pela lei.”.
Em conformidade a primeira conclusão a reter é que a autora, enquanto mediadora, apenas terá direito à remuneração, cujo montante foi fixado no contrato, se se concluir, em face dos factos, que o negócio visado pelo contrato de mediação foi concluído, o que impõe saber qual o negócio visado pela mediação. Extrai-se dos factos que tal negócio correspondia à venda pela ré do prédio identificado no contrato de mediação (cfr. ponto 6 dos factos provados); porém, havia ainda sido estabelecido que a referida venda havia de ser feita pelo valor de €3.300.000,00. Resulta provado que a A. logrou obter uma proposta de compra da totalidade das frações do prédio, por um valor inferior, de €3.240.000,00, mas a ré, ora recorrente, aceitou esse valor, ou seja, aceitou que a venda visada pela mediação fosse feita por valor inferior, donde, essa alteração de valor não altera o negócio visado pela mediação, e permite afirmar que o valor inicial de €3.300.000,00, não era condição essencial do negócio, contrariamente ao propugnado pela recorrente na conclusão 13.ª. Mais resulta provado que, na sequência, foi celebrado contrato promessa de compra e venda da totalidade das frações, entre as empresas representadas pela pessoa que apresentou a proposta, PC, e a ré. O contrato promessa foi depois objeto de aditamento em 27.2.2018. Quer no contrato promessa quer no seu aditamento, as partes declararam que a promessa de compra e venda foi objeto de mediação imobiliária pela recorrida (pontos 12 e 13 dos factos). Sucede que o contrato definitivo de compra e venda da totalidade das frações, ou seja, as escrituras de compra e venda, só foram celebradas em 2021, tendo-o sido, aliás, por valor superior ao da proposta que a recorrente havia aceite (cfr. ponto 15 dos factos provados), e que constava do contrato promessa. Também esta alteração do valor da venda, agora para mais, não transmuta o negócio concretizado em negócio diferente do visado pelo contrato de mediação, não afastando por si o direito da recorrida à remuneração estabelecida no contrato. É que, se, como já se disse, o valor inicial da venda mencionado no contrato de mediação (€3.300.000,00), não deve considerar-se elemento essencial do negócio, posto que foi aceite proposta inferior, não se pode agora afirmar o contrário por ter sido a venda, afinal, efetuada por valor superior ao inicialmente projetado. O facto das partes terem concretizado a venda por valor superior ao previsto no contrato promessa (que não fora, note-se, nesse particular alterado), este causal da atividade da recorrida – o que não é posto em causa -, não significa que se não tenha atingido o resultado útil (do qual depende a remuneração) pretendido com a mediação, justamente, a venda, ainda que tal resultado, em termos de valor, haja sido mais vantajoso para o vendedor. A venda por valor superior, decorre da realização de uma proposta pelo comprador e aceitação dela pelo vendedor, da subsequente vinculação dessas partes no contrato-promessa, do que terá decorrido subsequentes negociações que desembocaram no aumento de valor, mas o negócio das partes tem a sua génese na atividade da mediadora que as aproximou, que as pôs em contacto, que encontrou um destinatário para a realização da venda, destinatário que veio efetivamente a comprar o prédio e a quem a ré/recorrente quis vender o prédio. Mantem-se o nexo causal entre a atividade de mediação e o contrato. Sobre a questão da alteração do preço, mas no sentido da sua diminuição, situação que seria mais discutível, também discorre, Olga Marçal, ob. cit., “A questão que aqui se coloca é a de saber se, sofrendo alterações o preço do contrato desejado, no decurso das negociações, se a remuneração acordada é ou não devida. Debruçando-se sobre tal questão, Manuel Salvador199 refere que “nós pensamos que, se o preço fixado pelo mandante não foi considerado condição sine qua non da atribuição da percentagem ou remuneração ao mediador, é seguro que a conclusão do negócio por preço inferior não faz perder àquele o seu direito, pela razão de ser opinião comum que não é necessária perfeita coincidência entre o contrato desejado e o efetivamente realizado; o mediador conseguira já a adesão do terceiro à celebração do negócio, daí a sua participação no nexo causal”. Também Higina Orvalho Castelo200 refere que “conseguido um interessado, se o cliente vem a celebrar com ele contrato por valor diferente do perspetivado no contrato de mediação, em princípio, não poderá usar essa diferença para se escusar ao pagamento da remuneração do mediador. A decisão poderá ser outra se claramente resultar do contrato de mediação que o direito à remuneração está absolutamente dependente da obtenção de um interessado naquele preço, e não noutro, e se o contrato não tiver sido celebrado por diferente preço com o fito de frustrar a remuneração do mediador”.
Não sendo o direito da recorrida à remuneração afastado pelo aumento do preço, vejamos se o será por ter o negócio final- compra e venda- sido apenas concluído em 2021. Na sentença em recurso foi dito, a respeito, “É certo que os contratos definitivos apenas foram outorgados cerca de 3 anos depois do contrato promessa de compra e venda. Porém, tal não basta para afastar o nexo causal entre o trabalho desenvolvido pela A. e a celebração das escrituras, sendo certo que daquelas consta que naqueles negócios houve intervenção da sociedade Autora.”. Concordamos com a conclusão tirada, pois que a quebra do nexo causal não resulta do maior ou menor lapso de tempo decorrido entre a atividade de mediação e a conclusão do negócio, mas haverá de resultar de circunstâncias concretas que permitam afirmar que aquele negócio que veio a ser concluído anos depois já não tem ligação com a atividade de mediação, já não resulta daquela atividade, ou, noutra perspetiva, essa atividade não contribuiu, já não se revela adequada a ter determinado o negócio que veio a ser concluído anos depois. Não é o caso dos autos. Como já se disse, a venda veio a ser feita anos depois mas é consequente da celebração do contrato promessa, não revogado pela partes que se mantiveram a ele vinculadas, é feita nos termos projetados – venda da totalidade das frações - é feita entre as mesmas partes, e não há notícia da interposição de qualquer fator que anule os antes mencionados. Ademais, foi a própria recorrente, vendedora, que declarou, juntamente com as compradoras, nas escrituras, que houve intervenção da mediadora, ora recorrida. Não se verifica por isso, também por esta razão, quebra do nexo causal, improcedendo as conclusões do recurso a este respeito.
Resta apreciar a questão relativa à resolução do contrato.
Quanto à mesma consta da sentença o seguinte: “(…) importa avaliar a validade dessa resolução e a eventual relevância da mesma para efeitos do direito da A. à comissão contratualmente estabelecida. Nos termos do nº 1 do art.º 432º do Código Civil “É admitida a resolução do contrato fundada na lei ou em convenção.” Como ensinam P.Lima e A. Varela, in Código Civil anotado, vol. I, pg. 384, ao lado da resolução legal, como por ex. nos casos de não cumprimento da obrigação, impossibilidade do cumprimento ou alteração das circunstâncias que fundaram a decisão de contratar (cfr. art.º 801ºn.º2, 802º, 808º e 437º), em que o direito é conferido por lei a uma das partes, admite este artigo que, por convenção, se atribua a uma das partes ou a ambas o direito de resolver o contrato. No caso em apreço nenhuma cláusula resolutiva foi convencionada entre as partes, nem tão pouco decorre de forma imperativa das disposições legais do Decreto-Lei n.º 211/2004, de 20/8, regulador do contrato de mediação imobiliária em causa. A resolução do contrato fundada na lei pressupõe que uma das partes falte culposamente ao seu cumprimento e a outra o tenha cumprido ou diligenciado para o efeito. Verificado o incumprimento definitivo do contrato por parte do devedor, ou tornando-se impossível a prestação por causa imputável ao devedor, assiste ao credor a faculdade da sua resolução (artigos 432º, n.º 1, 762º, n.º 1, 804º, n.º 2 e 801º, n.º 1, do Código Civil). Ora no caso em apreço, atentos os factos não provados constantes das al. e) e f) não logrou a ré provar qualquer incumprimento por parte da A., pelo que tem considerar-se ilegítima a resolução operada pela Ré através da carta de 19/02/2021. Sendo ilegítima a resolução por falta de convenção e de normativo legal que confira tal direito à ré e mostrando-se ter sido a actividade da A. causal relativamente à conclusão do negócio, conclui-se que a A. cumpriu a actividade de mediação imobiliária a que se propôs por via do contrato estabelecido com a Ré, mostrando-se cumprida a obrigação contratual da A., pelo que, consequentemente, deve a Ré cumprir a sua contraprestação, i.e., o pagamento da comissão contratualmente fixada.”.
Entende a recorrente que, por ter enviado à recorrida carta a resolver o contrato, não é devida a remuneração porque o mesmo se extinguiu, não podendo a recorrida emitir fatura relativamente a um contrato extinto. Vista a questão desse ponto de vista, que é o da recorrente, às partes que não quisessem cumprir as obrigações a que estavam adstritas bastava comunicar à contra parte que resolviam o contrato para ficarem desoneradas, independentemente da lei ou o contrato lhe conferirem fundamento para unilateralmente lhe porem fim. Neste caso o contrato foi resolvido poucos dias antes da celebração das escrituras e na missiva enviada não consta que tenha sido paga a remuneração, pagamento que veio a ser invocado na ação, o que é impressivo (cfr. ponto 14) dos factos). É certo que a recorrente invoca para resolver o contrato o incumprimento da recorrida, mas não logrou provar os factos respetivos como lhe competia. Como se escreve no sumário do Ac. TRL de 24.2.2022 (Inês Moura) “1. A resolução do contrato por uma das partes não é livre, antes tem de ser fundamentada, exigindo uma situação de incumprimento da parte contrária que seja de tal modo grave que determina uma rutura contratual. A mesma tem de ter na sua origem factos que se integrem na convenção das partes que contemple a possibilidade de resolução do contrato, ou na lei, designadamente que caibam na previsão do art.º 801.º e 802.º do C.Civil, factos que, pela sua importância ou gravidade, justificam que, unilateralmente, uma das partes ponha fim ao contrato.”.
Assim, há que concluir que a sentença recorrida, ao afirmar que, não estando provado o incumprimento invocado pela resolvente, a resolução não afasta o direito da recorrida ao pagamento da remuneração, não merece censura, improcedendo também quanto a esta questão o recurso.
III- Decisão:
Pelo exposto, acordam os juízes da 8.ª Secção Cível, em julgar improcedente o recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 7.11.2024
Fátima Viegas
Cristina da Conceição Pires Lourenço
Ana Paula Nunes Duarte Olivença