INCUMPRIMENTO DE ÓNUS DE IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ILISÃO DA PRESUNÇÃO DE LABORABILIDADE
Sumário

I - Nos termos da al. a) do n.º 1 do art.º 640.º do CPC, é imprescindível ao recebimento e apreciação da impugnação da decisão da matéria de facto, a indicação nas alegações e respetivas conclusões dos concretos pontos de facto impugnados.
II - Não cumpre o disposto pelo art.º 640.º, n.º 1, al. b) e 2) do CPC a indicação dos depoimentos (mesmo que transcrevendo/indicando excertos deles) e apenas dizer que com base neles a decisão sobre certos pontos de facto devia ser diferente, impondo-se que em relação a cada ponto (ou grupo de pontos que a parte recorrente mostre que têm apoio nos mesmos concretos meios de prova, ou estejam relacionados entre si) seja feita a conexão com o meio de prova que suporta a decisão diferente da tomada pelo tribunal a quo.
III - Para ilidir a presunção a que se refere o art.º 12º, n.º 1 do CT não basta a contraprova destinada a tornar duvidoso o facto presumido. É necessário que se faça a prova de factos que levem à conclusão de que a relação contratual consubstancia um outro tipo contratual que não o contrato de trabalho, designadamente que consubstancia um contrato de prestação de serviços.

Texto Integral

Processo n.º 8234/24.6T8PRT.P1

Origem: Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto - Juiz 3

Relatório

O Ministério Público intentou a presente ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho contra A..., S.A., com sede na Rua ..., Porto peticionando que se declare que AA celebrou com a Ré um contrato de trabalho enquadrável no conceito definido no artigo 12º do Código do Trabalho (doravante CT), e por via disso, que seja a ré condenada a reconhecer a existência desse contrato de trabalho com início em 04 de junho de 2018.

Alega, em síntese, que à data da inspeção levada a cabo pela Autoridade para as Condições do Trabalho, o referido AA se encontrava a trabalhar por conta da ré, em condições análogas ao contrato de trabalho.

No exercício da sua atividade, AA trabalha a partir do seu domicílio, onde redige as peças a publicar, ou nos locais para onde tem de se deslocar a fim de efetuar a cobertura noticiosa solicitada pela ré e de acordo com a agenda previamente definida por esta; utiliza equipamentos e instrumentos disponibilizados pela ré e o software por esta usado para a escrita e edição de artigos, recebe apoio técnico quando ocorrem avarias informáticas; quando precisa de faltar, tem de, com antecedência, informar os editores de cada uma das publicações para as quais elabora peças, o que igualmente sucede quanto ao período de férias; são esses editores que lhe dão ordens e orientações para a execução do trabalho, quer quanto à forma de cobrir os acontecimentos a noticiar quer quanto à elaboração do conteúdo noticioso; são os seus editores que supervisionam o seu trabalho, que apenas é publicado mediante prévia aprovação deles; recebe uma quantia fixa mensal, paga 12 vezes por ano e uma quantia variável, esta no que toca aos artigos produzidos para a ...; está integrado na estrutura orgânica do ...; nas suas deslocações em trabalho beneficia dos protocolos que a ré possui com a CP e unidades hoteleiras; trabalha exclusivamente para a ré, embora não receba subsídios de férias nem de Natal e emita recibos como trabalhador independente.

A ré contestou, pugnando pela improcedência da ação, referindo, em síntese, que o AA é mero prestador de serviços; nega que o mesmo preste a sua atividade em locais determinados pela ré, já que apenas o faz onde "há notícias", como é inerente à profissão de jornalista; o uso de equipamentos disponibilizados pela ré não possui a relevância que o autor lhe atribui, uma vez que o mesmo sucede com os prestadores de serviços; também a comunicação dos dias de ausência, prende-se somente com uma questão de funcionamento e organização, sem qualquer imposição de terceiros; os prestadores de serviços também beneficiam dos protocolos com a CP e unidades hoteleiras e possuem email ..., por mera questão de facilidade; além disso, inexiste qualquer horário de trabalho que AA deva cumprir; também a existência de uma avença mensal não desvirtua o vínculo contratual existente entre as partes e, na ..., o pagamento é feito "à peça"; inexiste qualquer exclusividade. Por fim, na área de negócio a que a ré se dedica, pelas suas especificidades, é usual que o jornalista se reúna com os editores, para que seja acordado entre si o ângulo de abordagem de determinada peça, sem que tal configure uma ingerência ou instrução, e que, no final, a peça seja validada pelo editor.

Designada data para a realização de julgamento, foi o trabalhador notificado nos termos do disposto no artigo 186.°-L, n.º 4, do Código de Processo do Trabalho (doravante CPT), tendo apresentado articulado autónomo, reafirmando o alegado pelo Ministério Público.

Realizou-se audiência de discussão e julgamento, vindo a ser proferida sentença que culminou na decisão de julgar a ação totalmente procedente e, consequentemente, declarou o tribunal que AA celebrou com a ré contrato de trabalho, com início a 04 de junho de 2018, condenando a ré a reconhecê-lo.

Inconformada a ré interpôs o presente recurso, pretendendo a revogação da sentença por erro de julgamento acerca da matéria de facto e por incorreta interpretação e aplicação do direito e a sua substituição por acórdão que absolva integralmente a Recorrente do pedido.

Formulou as seguintes conclusões:

«A. O Tribunal " a quo" não devia ter considerado preenchido o a alínea b) do artigo 12° do Código do Trabalho

B. O uso de equipamentos disponibilizados pela Ré não possui a relevância que o Tribunal "a quo" lhe atribui, e muito menos permite considerar "preenchido" a alínea b) do artigo 12° do Código do Trabalho:

C. O (AA) "acede ao sistema Banco 1..., que lhe permite aceder ao jornal em tempo real, aceder ao arquivo de fotografias e agências noticiosas no entanto, que a peça pode ser escrita e enviada por email ao editor, não sendo obrigatório o uso daquele sistema para o efeito,

D. O AA declarou que usava o seu computador pessoal.

E. O Tribunal "a quo ", ainda que tenha dado como provado os factos 6 e 7, não poderia considerar que os mesmos serviriam para dar como preenchido o requisito da alínea b) do artigo 12° do Código do Trabalho.

F. O Tribunal "a quo" ter considerado que o uso do "sistema Banco 1..." é uma ferramenta facilitadora do trabalho a desenvolver e que a sua utilização depende da livre vontade de cada jornalista que presta serviços, seja a que título for, à Ré.

G. O Tribunal "a quo" não devia ter considerado preenchido o a alínea a) do artigo 12° do Código do Trabalho

H. O Tribunal "a quo", ainda que desse como provado nos seus exactos termos o facto n.º 5 não podia considerar o mesmo serviria para preencher a alínea a) do artigo 12.

I. Na medida em que a "agenda" não é pré definida pela Ré.

J. A agenda existe consoante os acontecimentos dignos de cobertura noticiosa e cabe à Ré organizar a cobertura dos mesmos pelos vários jornalistas.

K. Não havendo uma imposição ou determinação dos locais

L. Existe, apenas e só e por uma questão básica de organização, uma distribuição pelos jornalistas que lhe prestam actividade, seja a que título for.

M. Esta realidade é intrínseca da profissão de jornalista e não poderá ser usada para considerar preenchida a alínea a) do artigo 12° do código do trabalho.

N. O AA, nem nenhum outro jornalista, pode escapar a esta realidade.

O. O Tribunal "a quo" deveria ter valorado o facto do AA trabalhar em casa e, quanto às anteriores instalações, poder frequentá-las se quisesse.

P. Para tal, bastaria ao Tribunal "a quo" atentar ao facto não provado n.º 1 - não tem o AA dever assiduidade (à contrario), para assim o entender

Q. Bem como, atentar ao facto n.º 26 dado como provado:

R. 26) AA não está obrigado ao cumprimento de um horário de trabalho, com horas de entrada e de saída.

S. O Tribunal "a quo" considerou, erradamente, existir, subordinação jurídica,

T. O Tribunal " a quo" deu como provado os factos 21, 27 e 28.

U. Tais factos, dados como provados, não podem ser usados para fundamento de uma alegada "subordinação jurídica" que o Tribunal "a quo" pretende dar como existente na situação em apreço.

V. Porquanto, na área de negócio a que a Ré se dedica, pelas suas especificidades, é usual que o jornalista se reúna com os editores, para que seja acordado entre si o ângulo de abordagem de determinada peça, sem que tal configure uma ingerência ou instrução,

W. Sendo, igualmente, da praxis jornalística que a peça final seja validada pelo editor antes da publicação, sem que isso determine qualquer subordinação jurídica.

X. AA declara que (os jornalistas) não pode publicar notícias sem prévia validação dos editores, que podem ou não, caso introduzam alterações, dar-lhe conhecimento das mesmas.

Y. Tendo ainda aduzido que, essa possibilidade de revisão dos artigos conferida aos editores tem como desiderato o cumprimento do estatuto editorial de publicação.

Z. A testemunha BB declarou, que, para além de estar sujeito ao Código Deontológico, o jornalista, independentemente do vínculo, está sujeito, nas peças que escreve e na definição dos temas a escrever, ao crivo do editor.

AA. A testemunha BB declarou que o jornalista não pode fazer-se substituir, na medida em que a relação entre o órgão de comunicação social e o jornalista pressupõe "uma relação de confiança e de trabalho".

BB. Ora, o Tribunal "a quo" não valorou estas declarações/depoimentos, como devia ter feito.

CC. E ainda foi mais além, desconsiderou ostensivamente a relevância e

importância da aferição do cumprimento do Estatuto Editorial - da competência do Editor.

DD. Que lhe confere legitimidade e a OBRIGAÇÃO para, em relação, a cada cobertura noticiosa, discutir com o jornalista o ângulo de abordagem.

EE. Esta especificidade da profissão de jornalista NÃO se traduz na existência de um vínculo laboral!

FF. Trata-se "tão só" do cumprimento de critérios legais que regulam a comunicação social, nomeadamente, no que às publicações concerne, bem como ao exercício da profissão de jornalista.

GG. O desempenho da função de jornalista tem um cariz intelectual vincado, como se tratasse de uma obrigação intuitu personae, o que inviabiliza a indicação por parte do prestador de alguém que o possa substituir.

HH. Nessa eventualidade, terá sempre de ser o OCS, entidade a quem o serviço é prestado, a designar terceiro que a possa fazer!

II. Assim, nunca poderia o Tribunal ter dado como provados os factos n.º 8, n.º 9 e parte final do n.º 10, pelo menos da forma "crua" como o fez,

JJ. E, por outro lado, não poderia ter dado como não provado o facto 31°

KK. O Tribunal " a quo" aos factos 8, 9 e parte final do 10, dados como provados, deveria ter acrescentado o teor do Facto 31 (facto não provado)

LL. Devendo ter tais factos o seguinte teor: Facto 8

Apenas por exigências decorrentes do cumprimento do estatuto editorial do respectivo órgão de comunicação social, AA recebe ordens, instruções e orientações para a execução do trabalho emanadas de CC (editor ...), DD (editor ...) e EE (editora ...),

Facto 9

sobre a forma de cobrir os acontecimentos a noticiar e de elaborar o conteúdo noticioso, com indicações específicas e instruções directas e precisas sobre como realizar o seu trabalho, designadamente o ângulo de abordagem de determinada peça, apenas por exigências decorrentes do cumprimento do estatuto editorial do respectivo órgão de comunicação social.

Facto 10

o AA encontra-se integrado na estrutura ... juntamente com o editor e outros jornalistas, trabalha para a rubrica fixa "...", com publicação semanal no ..., sendo os trabalhos propostos e marcados, maioritariamente, pelo editor do ..., por exigências decorrentes do cumprimento do estatuto editorial do respectivo órgão de comunicação social.

MM. o Tribunal " a quo" mal andou quando deu por provado o facto 19) da matéria provada, na medida em que o próprio AA, no seu depoimento, declara que goza 15-20 dias de férias e que combina as Férias com os editores

NN. E o Editor CC declara que o AA o informa das férias MAS não tem de aprovar as férias do AA

OO. O AA envia períodos de férias e estes têm de ser validados, mas apenas no sentido da "gestão do trabalho", porque, no limite, caso não exista entendimento entre todos, não podia recusar a proposta do AA, quanto aos dias de férias que indica.

PP. A ser assim, como é, o artigo 19° dos factos provados tinha de ser dado por não provado!

QQ. E, por seu turno, o facto dado por não provado n.º 30, devia estar na listagem dos Factos dados por Provados!

RR. Idêntico raciocínio, competia ao Tribunal a quo fazer relativamente ao tema "faltas" e nunca poderia ter dado como provado o artigo 20 da matéria dada por provada.

SS. Resulta evidente que o AA não tem superiores hierárquicos, porquanto é um prestador de serviços.

TT. O Tribunal "a quo" mal andou quando deu ênfase ao critério do "trabalho "em exclusivo" do AA para a Ré e fez uso de tal critério para decidir em prol da existência de um vínculo laboral.

UU. E mal andou o Tribunal "a quo" na medida em que, pelo supra exposto, não existe um vínculo laboral entre a Ré e o AA e, a ser assim como é, o uso do critério de forma isolada - presta a sua actividade em exclusivo para a Ré -não terá a virtualidade de transformar uma prestação de serviços num contrato de trabalho.

VV. Ainda será de aduzir, que não se entende a razão de ser deste argumento, na medida em que, qualquer um pode desenvolver a actividade de prestador de serviços e é livre de a prestar a 1,2 ou mais entidades!

WW. Termos em que, deve a sentença ora recorrida ser revogada, por incorrecta interpretação e aplicação do direito, sendo substituída por acórdão que não considere provado a existência de vínculo laboral entre AA e a Ré, ora Recorrente».

O Ministério Público contra-alegou, pugnando pela improcedência o recurso, formulando as seguintes conclusões:

«1.° - A prova produzida em audiência de julgamento foi corretamente apreciada e valorada pelo Tribunal, segundo as regras de experiência, não tendo ocorrido nenhum erro de avaliação, designadamente, dos depoimentos prestados pelas testemunhas e declarações prestadas pelo interveniente principal AA;

2. ° - Inexiste fundamento válido para que sejam alterados os pontos de facto dados como provados sob as alíneas 8), 9) e 10);

3.° - A demonstração e tal factualidade resultou dos depoimentos prestados pelas testemunhas FF - minutos 05:02 a 05:40 da gravação áudio -; CC - minutos 03:52 a 04:45, 07:10 a 07:25 e 07:50 a 08:41 da gravação áudio -; GG - minutos 05:10 a 05:45, 05:48 a 06:55, 21:20 a 22:22, 24:30 a 26:13 e 26:45 a 27:28 da gravação áudio -; e BB - minutos 07:05 a 08:56 da gravação áudio -; e nas declarações prestadas por AA - minutos 14:32 a 15:02, 15:06 a 15:18, 15:50 a 17:10, 17:26 a 17:38 e 18:05 a 19:44 da gravação áudio;

4.° - Também os factos provados 19) e 20) foram corretamente julgados, resultando os mesmos da conjugação do teor do documento n.º 6 junto à participação da ACT com s declarações prestadas por AA;

5.° - Tendo sido contrariados por factos dados como provados, os factos não provados 30) e 31) mostram-se corretamente valorados;

6.° - Quanto às conclusões de Direito, extraídas da matéria de facto, a sentença não merece nenhuma censura, tendo sido correta a subsunção jurídica dos factos ao disposto no artigo 12.° do Código do Trabalho;

7.° - Impendia sobre a Ré o ónus da ilisão da presunção de laboralidade;

8.° - Mas, o que ficou demonstrado em audiência de julgamento foi a efetiva existência de subordinação jurídica na relação entre o prestador de atividade AA e a Ré;

9.° - A Ré não conseguiu ilidir a presunção de laboralidade, pelo que foi correta a conclusão do tribunal de que a relação contratual que vigora entre o prestador de atividade e a Ré configura um contrato de trabalho.»

O recurso foi regularmente recebido e neste Tribunal o Ministério Público teve vista consignando não emitir parecer nos termos do art.º 87º, nº 3 do CPT, dado o Ministério Público ser o recorrido.


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Colhidos os vistos legais e realizada a conferência cumpre apreciar e decidir.

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Delimitação do objeto do recurso

Resulta do art.º 81.º, n.º 1 do CPT e das disposições conjugadas dos arts. 639.º, nº 1, 635.º e 608.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil (doravante CPC), aplicáveis por força do disposto pelo art.º 1.º, n.º 1 e 2, al. a) do CPT, que as conclusões delimitam objetivamente o âmbito do recurso, no sentido de que o tribunal deve pronunciar-se sobre todas as questões suscitadas pelas partes (delimitação positiva) e, com exceção das questões do conhecimento oficioso, apenas sobre essas questões (delimitação negativa).

Assim, são as seguintes as questões a decidir:

1 – alteração da decisão da matéria de facto;

2 – se o vínculo existente entre a recorrida e o recorrente não deve ser qualificado como contrato de trabalho.


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Fundamentação de facto

Foram os seguintes os factos dados como provados em 1.ª instância:

«1) A ré foi notificada para, no prazo de 10 dias, regularizar a situação do colaborador AA.

2) A ré não regularizou a situação, tendo sido elaborado o correspondente auto de notícia, ao abrigo do disposto no artigo 15.°-A, n.º 1, da Lei 107/2009, de 14/09, e remetido ao Ministério Público em 29/04/2024.

3) A Ré, "A..., S.A.", dedica-se, nomeadamente, à actividade de edição de jornais e outros meios de comunicação social.

4) Em 28 de Fevereiro de 2024, a Ré tinha ao seu serviço AA a prestar a actividade de jornalista, encontrando-se integrado nos serviços das publicações "...", "..." e "..." àquela pertencentes.

5) Tal actividade de jornalista ocorre, quer no domicílio do mesmo, onde redige as peças a publicar (sendo que, até à mudança de instalações da Ré para a Rua ..., o indicado trabalhador desenvolvia essa concreta actividade maioritariamente nas instalações da Ré, sitas na Rua ..., no Porto), ou nos locais para onde AA se desloca a fim de efectuar a cobertura noticiosa solicitada pela Ré e de acordo com a agenda previamente definida por esta.

6) No desenvolvimento da sua actividade profissional, AA utiliza equipamentos e instrumentos disponibilizados pela Ré e a esta pertencentes, nomeadamente, a VPN da Ré para aceder, via remota ao computador da Ré, mediante passwords individuais, fornecidas pela Ré.

7) Utiliza ainda o software Banco 1..., programa interno utilizado para escrever e editar artigos, a ele acedendo também mediante passwords individuais fornecidos pela Ré, e cuja licença é propriedade desta.

8) AA recebe ordens, instruções e orientações para a execução do trabalho emanadas de CC (editor ...), DD (editor ...) e EE (editora ...), (eliminado nos termos da decisão infra)

9) sobre a forma de cobrir os acontecimentos a noticiar e de elaborar o conteúdo noticioso, com indicações específicas e instruções directas e precisas sobre como realizar o seu trabalho, designadamente o ângulo de abordagem de determinada peça. (alterado nos termos da decisão infra)

10) AA encontra-se integrado na estrutura ... juntamente com o editor e outros jornalistas, trabalha para a rubrica fixa "...", com publicação semanal no ..., sendo os trabalhos propostos e marcados, maioritariamente, pelo editor do ....

11) AA encontra-se integrado na estrutura ..., juntamente com o director da revista e outros jornalistas, e tem como função, para além da redacção de artigos para a revista em papel, escrever uma notícia por dia, incluindo fins-de -semana, para o site ....

12) Os trabalhos por si produzidos são publicados com o seu nome, AA.

13) Como contrapartida do trabalho prestado, o AA recebe da Ré, com periodicidade mensal, a importância monetária de €1.400,00 ilíquidos, sendo €700,00 ... e €700,00 do ..., também paga durante o período de férias e outros períodos de ausência, designadamente por motivo de doença. (alterado nos termos da decisão infra)

14) Como contrapartida do trabalho prestado, o trabalhador AA recebe também da Ré, com periodicidade mensal, uma quantia variável, em média de €300,00, em função dos artigos produzidos, da .... (alterado nos termos da decisão infra)

15) O trabalhador emite, mensalmente, recibo electrónico, como "trabalhador independente".

16) Quando a Ré determina a AA deslocações e/ou estadia em Lisboa, no âmbito da publicação ..., o trabalhador não suporta qualquer custo, usufruindo dos acordos pré-estabelecidos pela Ré com a CP e com determinadas unidades hoteleiras. (alterado nos termos da decisão infra)

17) A AA foi atribuído um endereço de correio electrónico com o domínio da Ré (..........@.....).

18) AA tem acesso, tal como os restantes trabalhadores da Ré, a apoio técnico a avarias informáticas.

19) Goza 22 dias de férias em cada ano, tendo de comunicar, com a antecedência de pelo menos um mês, aos seus superiores hierárquicos a indicação do período em que pretende fazê-lo, o qual carece de ser validado. (alterado nos termos da decisão infra)

20) AA quando precisa faltar tem de, com antecedência, comunicar previamente aos editores de cada uma das publicações atrás indicadas, enquanto seus superiores hierárquicos.

21) E não pode fazer-se substituir por terceiros na execução das peças jornalísticas.

22) A Ré não paga a AA qualquer quantia a título de subsídios férias ou de Natal.

23) AA trabalha exclusivamente para a Ré pelo que se encontra em situação de dependência económica para a sua subsistência. (alterado nos termos da decisão infra)

24) AA iniciou funções de Jornalista para a Ré a 04 de Junho de 2018, na sequência de um contrato verbal.

25) Está inscrito na Autoridade Tributária e na Segurança Social como trabalhador independente.

26) AA não está obrigado ao cumprimento de um horário de trabalho, com horas de entrada e de saída.

27) As peças jornalísticas são lidas pelos editores antes de irem para a gráfica ou serem publicadas online.

28) As peças elaboradas por AA são validadas e aprovadas pelos editores, a quem compete zelar pelo cumprimento do estatuto editorial do respectivo órgão de comunicação social.»

E foi considerado como não provado o seguinte:

« 29) AA está obrigado ao dever de assiduidade. (Eliminado nos termos da decisão infra)

30) AA comunica os dias em que se ausenta, fazendo-o sempre em liberdade e sem qualquer imposição de terceiros.

31) O referido em 8) e 9) apenas ocorra por exigências decorrentes do cumprimento do estatuto editorial do respectivo órgão de comunicação social.

32) O ângulo de abordagem de determinada peça é acordado entre o jornalista e o editor.

33) Os protocolos da ... com a CP e com unidades hoteleiras não impedem que os mesmos sejam usufruídos por pessoas que lhe prestam serviços.

34) Todos os prestadores de serviços têm um email da ..., referindo que são externos pela utilização da sigla "ext" na sua composição.»


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Apreciação

Seguindo a ordem imposta pela precedência lógica (cfr. art.º 608.º, n.º 1 do CPC), importa começar a apreciação do recurso pelas questões atinentes à matéria de facto.

Antes, contudo, de proceder à análise da pretensão da recorrente, importa proceder à alteração oficiosa da decisão de facto.

Com efeito, o Tribunal da Relação deve, mesmo oficiosamente, alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto se tal se impuser (art.º 662º, nº 1 do CPC), como é o caso de existir matéria de direito e/ou conclusiva a invadir a matéria de factos.

Na verdade, o comando normativo do art.º 607.º relativo à discriminação dos factos aplica-se, também, ao Tribunal da Relação, atento o disposto pelo art.º 663.º, n.º 2 do CPC, não podendo o acórdão que aprecie o recurso interposto fundar-se em afirmações meramente conclusivas ou que constituam descrições jurídicas.

Como se escreve no Ac. RP de 08/02/2021[1], “sendo a matéria daqueles itens de natureza conclusiva e também de direito, a mesma é contrária à matéria estritamente factual que deve ser seleccionada para a fundamentação de facto da sentença, como explicitamente decorre do nº4 do art. 607º do CPC [note-se que a inclusão nos fundamentos de facto da sentença de matéria conclusiva (desde que não se reconduza a juízos periciais de facto) e/ou de direito enquadra-se na alínea c), do nº 2, do artigo 662º, do CPC, considerando-se uma deficiência na decisão da matéria de facto]”. E como se lê no Ac. RP de 23-11-2017[2], com o qual concordamos, “a selecção da matéria de facto só pode integrar acontecimentos ou factos concretos, que não conceitos, proposições normativas ou juízos jurídico-conclusivos. Caso contrário, as asserções que revistam tal natureza devem ser excluídas do acervo factual relevante- artº 607º, nº 4, NPCP”.

No caso concreto, constitui, ostensivamente, matéria conclusiva e de direito a constante do pontos 8) “ AA recebe emanadas de CC”; do ponto 9) “sobre a forma de realizar o trabalho”; dos pontos 13) e 14) “como contrapartida do trabalho prestado”; do ponto 16) “O trabalhador não suporta”; do ponto 19) “aos seus superiores hierárquicos”; do ponto 23) dos factos provados “(…) trabalha exclusivamente para a ré pelo que se encontra em situação de dependência económica para a sua subsistência” e do ponto 29 dos factos não provados “AA está obrigado ao dever de assiduidade”.

Nessa medida, decide-se:

- eliminar o ponto 8);

- alterar a redação do ponto 9) que passará a ser a seguinte: “AA recebe de CC (editor ...), DD (editor ...) e EE (editora ...) indicações específicas, diretas e precisas sobre a forma de cobrir os acontecimentos a noticiar, de elaborar o conteúdo noticioso e sobre o ângulo de abordagem de determinada peça.”;

- alterar a redação dos pontos 13) que passará a ser a seguinte: “Como contrapartida da atividade desempenhada, o AA recebe da Ré, com periodicidade mensal, a importância monetária de €1.400,00 ilíquidos, sendo €700,00 ... e €700,00 do ..., também paga durante o período de férias e outros períodos de ausência, designadamente por motivo de doença.”;

- alterar a redação do ponto 14) passando a ser a seguinte: “Como contrapartida da atividade desempenhada, o trabalhador AA recebe também da Ré, com periodicidade mensal, uma quantia variável, em média de €300,00, em função dos artigos produzidos, da ....”;

- alterar a redação do ponto 16) que passará a ser a seguinte: “Quando a Ré determina a AA deslocações e/ou estadia em Lisboa, no âmbito da publicação ..., este não suporta qualquer custo, usufruindo dos acordos pré-estabelecidos pela Ré com a CP e com determinadas unidades hoteleiras.”;

- alterar a redação do ponto 19) que passará a ser a seguinte “Goza 22 dias de férias em cada ano, tendo de comunicar, com a antecedência de pelo menos um mês, à ré a indicação do período em que pretende fazê-lo, o qual carece de ser validado.

- alterar a redação do ponto 23) que passa a ser a seguinte: “AA presta atividade exclusivamente para a Ré.”;

- eliminar o ponto 29).


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Vejamos agora a impugnação da matéria de facto deduzida pela recorrente.

Nos termos do já mencionado art.º 662.º, n.º 1 CPC «A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.»

A Relação tem efetivamente poderes de reapreciação da decisão da matéria de facto decidida pela 1ª instância, impondo-se-lhe no que respeita à prova sujeita à livre apreciação do julgado, a (re)análise dos meios de prova produzidos em 1ª instância, desde que o recorrente cumpra os ónus definidos pelo art.º 640.º do CPC.

Na verdade, quando estão em causa meios de prova sujeitos à livre apreciação do julgador, decorre da conjugação dos art.º 635.º, nº 4, 639.º, nº 1 e 640.º, nº 1 e 2, todos do CPC, que quem impugna a decisão da matéria de facto deve, nas conclusões do recurso, especificar quais os pontos concretos da decisão em causa que considera errados e, ao menos no corpo das alegações, deve, sob pena de rejeição, identificar com precisão quais os elementos de prova que fundamentam essa pretensão, sendo que, se esses elementos de prova forem pessoais, deverá ser feita a indicação com exatidão das passagens da gravação em que se funda o recurso (reforçando a lei a cominação para a omissão de tal ónus, pois que repete que tal tem de ser feito sob pena de imediata rejeição na parte respetiva) e qual a concreta decisão que deve ser tomada quanto aos pontos de facto em questão.

Importa, pois, antes de mais, verificar se foram ou não cumpridos pela recorrente os ónus legais exigíveis à parte que pretende impugnar a decisão sobre a matéria de facto, a que se refere o art.º 640.º do CPC.

Como refere António Santos Abrantes Geraldes[3], quanto às funções atribuídas à Relação em sede de intervenção na decisão da matéria de facto, «foram recusadas soluções maximalistas que pudessem reconduzir-nos a uma repetição dos julgamentos, tal como foi rejeitada a admissibilidade de recursos genéricos contra a decisão da matéria de facto, tendo o legislador optado por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas e relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente.»

A modificação da matéria de facto constitui um dever da Relação a ser exercido sempre que a reapreciação dos meios de prova (sujeitos à livre apreciação do tribunal) determine um resultado diverso daquele que for declarado pela 1.ª instância. Porém, como também sublinha António Santos Abrantes Geraldes[4]«(...) a reapreciação da matéria de facto pela Relação no âmbito dos poderes conferidos pelo art. 662.° não pode confundir-se com um novo julgamento, pressupondo que o recorrente fundamente, de forma concludente, as razões por que discorda da decisão recorrida, aponte com precisão os elementos ou meios de prova que impliquem decisão diversa da produzida e indique a resposta alternativa que pretende obter».

Nos termos do n.º 1 do art.º 640.º do CPC, impõe-se ao recorrente, na impugnação da matéria de facto, a obrigação de especificar, sob pena de rejeição:

“a) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”

E nos termos do n.º 2 da mesma disposição legal, no caso da alínea b) deve ser observado o seguinte:

“a) quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.”

Apesar de apenas ter sido fixada jurisprudência a respeito da alínea c) do n.º 1 do art.º 640.º do CPC, o certo é que a fundamentação do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 12/2023[5] contém um conjunto de considerações com importância determinante quanto à interpretação dos ónus a que se referem as demais alíneas, que, pela sua relevância, a seguir se transcrevem:

«(...) Da articulação dos vários elementos interpretativos, com cabimento na letra da lei, resulta que em termos de ónus a cumprir pelo recorrente quando pretende impugnar a decisão sobre a matéria de facto, sempre terá de ser alegada e levada para as conclusões, a indicação dos concretos pontos facto que considera incorretamente julgados, na definição do objeto do recurso.

Quando aos dois outros itens, caso da decisão alternativa proposta, não podendo deixar de ser vertida no corpo das alegações, se o for de forma inequívoca, isto é, de maneira a que não haja dúvidas quanto ao seu sentido, para não ser só exercido cabalmente o contraditório, mas também apreendidos em termos claros pelo julgador(58), chamando à colação os princípios da proporcionalidade e razoabilidade instrumentais em relação a cada situação concreta, a sua não inclusão nas conclusões não determina a rejeição do recurso(59), conforme o n.º 1, alínea c) (60) do artigo 640, apresentando algumas divergências ou em sentido não totalmente coincidente, vejam- se os Autores, Henrique Antunes(61), Rui Pinto(62), Abílio Neto(63).

5 - Em síntese, decorre do artigo 640, n.º 1, que sobre o impugnante impende o dever de especificar, obrigatoriamente, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera julgados de modo incorreto, os concretos meios de probatórios constantes do processo, de registo ou de gravação nele realizado, que imponham decisão diversa da recorrida, bem como aludir a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

Tais exigências, traduzidas num ónus tripartido sobre o recorrente, estribam-se nos princípios da cooperação, adequação, ónus de alegação e boa-fé processuais, garantindo a seriedade do recurso, num efetivo segundo grau de jurisdição quanto à matéria de facto, necessariamente avaliado de modo rigoroso, mas sem deixar de ter em vista a adequada proporcionalidade e razoabilidade, de modo a que não seja sacrificado um direito das partes em função de um rigorismo formal, desconsiderando aspetos substanciais das alegações, numa prevalência da formalidade sobre a substância que se pretende arredada.(...).»

Assim, e como se mostra sintetizado no Acórdão desta Secção Social de 20/05/2024[6], «[d]o que nos afigura também resultar da citada fundamentação, entendemos como adequado, em face do que resulta da lei, o entendimento de que, para cumprir os ónus legais aqui analisados, o recorrente sempre terá de alegar e levar para as conclusões, sob pena de rejeição do recurso, a indicação dos concretos pontos facto que considera incorretamente julgados, como estabelecido na alínea a) do n.º 1 do preceito citado, enquanto definição do objeto do recurso, sendo que, noutros termos, já quando ao cumprimento do disposto nas alíneas b) e c) do mesmo número, desde que vertido no corpo das alegações, a respetiva não inclusão nas conclusões não determina tal rejeição do recurso». (sublinhados nossos)

Neste mesmo sentido, se pronuncia António Santos Abrantes Geraldes[7], quando elenca as situações de rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto.

Assim, nos termos da al. a) do n.º 1 do art.º 640.º do CPC, é imprescindível ao recebimento e apreciação da impugnação da decisão da matéria de facto, a indicação nas alegações e respetivas conclusões dos concretos pontos impugnados.

Quanto ao ónus previsto na alínea b) do n.º 1 do art.º 640.° do CPC, e como se afirma no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5-09-2018[8], essa alínea, «ao exigir que o recorrente especifique os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo de gravação nele realizada, que impunham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnados, exige que esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respetivos meios de prova, documental e/ou testemunhal e das passagens da gravação de cada um dos depoimentos», sendo que «não cumpre aquele ónus o apelante que, nas alegações e nas conclusões, divide a matéria de facto em três "blocos distintos de factos" e indica os meios de prova relativamente a cada um desses blocos, mas omitindo-os relativamente a cada um dos concretos factos cuja decisão impugna».

No recente Acórdão desta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto de 28/06/2024[9], assinala-se o seguinte:

«Decorre do exposto que a parte recorrente deverá também (a par da indicação dos concretos pontos de facto e concretos meios probatórios), relacionar ou conectar cada facto, individualizadamente, com o concreto meio de prova que, em seu entender, sustentaria diferente decisão, designadamente, caso a discordância se fundamente em depoimentos que hajam sido gravados, identificando as testemunhas por referência a cada um dos factos que impugna.

Em conformidade, diz-se no acórdão desta Secção Social do TRP de 23/11/2020[10], que na indicação dos meios probatórios [sejam eles documentais ou pessoais] que sustentariam diferente decisão [art.º 640°, n° 1, al. b) do Código de Processo Civil], deverão eles ser identificados e indicados por referência aos concretos pontos da factualidade impugnada de modo a que se entenda a que concretos pontos dessa factualidade se reportam os meios probatórios com base nos quais a impugnação é sustentada, mormente nos casos em que se pretende a alteração de diversa matéria de facto.

Na verdade, só assim será possível ao tribunal ad quem perceber e saber quais são os concretos meios de prova que, segundo o recorrente, levariam a que determinado facto devesse ter resposta diferente da que foi dada. (…)

Quer isto dizer que não obedece ao estipulado pelo legislador indicar depoimentos (mesmo que transcrevendo/indicando excertos deles) e apenas dizer que com base neles a decisão sobre certos pontos de facto devia ser diferente, impondo-se que em relação a cada ponto (ou grupo de pontos que a parte recorrente mostre que têm apoio nos mesmos concretos meios de prova, ou estejam relacionados entre si) seja feita a conexão com o meio de prova que suporta a decisão diferente da tomada pelo tribunal a quo.

É que, de outra forma cairíamos na realização de um segundo julgamento (ainda que parcial), isto é, traduzir-se-ia em pedir simplesmente ao tribunal ad quem que faça uma reapreciação dos meios de prova, o que não corresponde claramente ao consagrado pelo legislador.».

Quanto ao cumprimento do ónus previstos pelo art.º 640.º, n.º 1, al. c) do CPC, importa ter presente o Acórdão do STJ n.º 12/2023, supra identificado, que uniformizou a jurisprudência nos seguintes moldes:

«Nos termos da alínea c), do n.º 1 do artigo 640.° do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa pretendida, desde que a mesma resulte, de forma inequívoca, das alegações.».

No mesmo sentido, se pronunciaram ainda, ente outros, os Acórdãos desta Secção Social 29-01-2024[11], e de 10-07-2024[12].

Importa também referir que, no que toca ao recurso da decisão da matéria de facto, como vem sendo entendimento do STJ[13], que se perfilha, não é possível despacho de aperfeiçoamento[14].

Por último, há que atender a que nos termos do suprarreferido art.º 662.º, n.º 1 do CPC a alteração da matéria de facto, em 2.ª instância tem de ser imposta. Como se afirma no citado Acórdão desta Secção de 28-06-2024, “não basta que os meios de prova admitam, permitam ou consintam uma decisão diversa da recorrida”.

No caso em apreço, salvo o devido respeito, as alegações e conclusões da recorrente no que respeita à matéria de facto são pouco claras, misturando-se a questão de facto, com a interpretação juridicamente relevante dos factos provados e não provados. É disso exemplo o teor da conclusão H onde a recorrente refere que «H. O Tribunal " a quo", ainda que desse como provado nos seus exactos termos o facto n.º 5 não podia considerar o mesmo serviria para preencher a alínea a) do artigo 12», sem que resulte quer do corpo das alegações, quer das conclusões a vontade da recorrente de pôr em causa a decisão do tribunal quanto a tal ponto da matéria de facto.

Por outro lado, verifica-se que a recorrente, sem pôr em causa aquilo que foi considerado provado, sustenta que o tribunal não podia ter considerado que estavam verificados os pressupostos de aplicação da presunção prevista pelo art.º 12.º, n.º 1, al. a) e b) do CT, fundamentando a sua divergência nos depoimentos prestados em audiência de julgamento, transcrevendo-os parcialmente, confundindo meios de prova, com factos provados.

Consequentemente, mesmo que fosse intenção da recorrente impugnar os pontos 6), 7), 21), 27) e 28) da matéria de facto provada, como, apesar de mencionar os mesmos nas conclusões das alegações (conclusões E e T), nenhuma menção faz à sua efetiva impugnação, não se mostra cumprido o ónus previsto pelo art.º 640.º, n.º 1, al. a) do CPC., o que determinaria a rejeição da impugnação.

Ainda assim, é possível perceber, porque o expressa nas conclusões II, JJ, MM e QQ que a recorrente pretende, pelo menos, impugnar a decisão de facto quanto aos pontos 8), 9), 10) parte final, 19), 20), 30) e 31).

No que respeita à impugnação da decisão relativa aos pontos 8), 9), 10) parte final e 31), é, porém, manifesto que a recorrente não cumpriu o ónus a que se refere a al. b) do n.º 1 do citado art.º 640.º.

Na verdade, a recorrente transcreve e refere-se a depoimentos das testemunhas GG, BB, CC e declarações de AA, para concluir que o tribunal não podia considerar os factos provados 6) e 7) para dar como preenchidos os requisitos das als. a) e b) do art.º 12º, n.º 1 do CT, e, de seguida, sem indicar os meios de prova que relativamente a cada um dos factos que impugna imporiam decisão diversa, sem estabelecer em relação a cada ponto a conexão com o meio de prova que suporta a decisão diferente da tomada pelo tribunal a quo, afirma de forma conclusiva que o tribunal não podia, da forma que o fez, dar como provada matéria dos pontos 8), 9), 10) parte final, devendo acrescentar-lhes, como provada, a matéria do ponto 31).

Assim, não se mostrando cumprido, nesta parte o disposto pelo art.º 640.º, n.º 1, al. b) e n.º 2 do CPC, decide-se rejeitar a impugnação.

Relativamente aos pontos 19) e 30) a recorrente não cumpre também o mencionado ónus, na medida em que se limita a indicar (transcrevendo excertos) as declarações de AA e os depoimentos das testemunhas CC e BB conjugado com os emails juntos ao processo que nem sequer identifica, e como já referimos acima “não obedece ao estipulado pelo legislador indicar depoimentos (mesmo que transcrevendo/indicando excertos deles) e apenas dizer que com base neles a decisão sobre certos pontos de facto devia ser diferente”.

Por isso, também quanto aos pontos 19) e 30), rejeita-se a impugnação nos termos do art.º 640.º, n.º 1 do CPC.

A mesma decisão de rejeição se impõe quanto ao ponto 20).

Com efeito a recorrente, a este respeito, diz apenas que o tribunal devia fazer o mesmo raciocínio quanto ao ponto 20), na medida em que o AA não tem superiores hierárquico porque é um prestador de serviço.

Nenhum meio de prova vem indicado, nenhuma relação vem estabelecida entre qualquer meio de prova e a decisão e a recorrente limita-se a justificar a sua pretensão quanto a este ponto da matéria de facto, com um raciocínio que deturpa, até, toda a lógica da decisão, partindo da conclusão jurídica e prematura sobre a natureza do contrato para dela inferir que o facto não podia ser dado como provado.

Em consonância, rejeita-se, na íntegra, a impugnação da matéria de facto.


*

O acervo factual a considerar é, em consequência das alterações oficiosamente determinadas, o seguinte:

1) A ré foi notificada para, no prazo de 10 dias, regularizar a situação do colaborador AA.

2) A ré não regularizou a situação, tendo sido elaborado o correspondente auto de notícia, ao abrigo do disposto no artigo 15.°-A, n.º 1, da Lei 107/2009, de 14/09, e remetido ao Ministério Público em 29/04/2024.

3) A Ré, "A..., S.A.", dedica-se, nomeadamente, à atividade de edição de jornais e outros meios de comunicação social.

4) Em 28 de Fevereiro de 2024, a Ré tinha ao seu serviço AA a prestar a atividade de jornalista, encontrando-se integrado nos serviços das publicações "...", "..." e "..." àquela pertencentes.

5) Tal atividade de jornalista ocorre, quer no domicílio do mesmo, onde redige as peças a publicar (sendo que, até à mudança de instalações da Ré para a Rua ..., o indicado trabalhador desenvolvia essa concreta atividade maioritariamente nas instalações da Ré, sitas na Rua ..., no Porto), ou nos locais para onde AA se desloca a fim de efetuar a cobertura noticiosa solicitada pela Ré e de acordo com a agenda previamente definida por esta.

6) No desenvolvimento da sua atividade profissional, AA utiliza equipamentos e instrumentos disponibilizados pela Ré e a esta pertencentes, nomeadamente, a VPN da Ré para aceder, via remota ao computador da Ré, mediante passwords individuais, fornecidas pela Ré.

7) Utiliza ainda o software Banco 1..., programa interno utilizado para escrever e editar artigos, a ele acedendo também mediante passwords individuais fornecidos pela Ré, e cuja licença é propriedade desta.

8) Eliminado.

9) AA recebe de CC (editor ...), DD (editor ...) e EE (editora ...) indicações específicas, diretas e precisas sobre a forma de cobrir os acontecimentos a noticiar, de elaborar o conteúdo noticioso e sobre o ângulo de abordagem de determinada peça.

10) AA encontra-se integrado na estrutura ... juntamente com o editor e outros jornalistas, trabalha para a rubrica fixa "...", com publicação semanal no ..., sendo os trabalhos propostos e marcados, maioritariamente, pelo editor do ....

11) AA encontra-se integrado na estrutura ..., juntamente com o diretor da revista e outros jornalistas, e tem como função, para além da redação de artigos para a revista em papel, escrever uma notícia por dia, incluindo fins-de -semana, para o site ....

12) Os trabalhos por si produzidos são publicados com o seu nome, AA.

13) Como contrapartida da atividade desempenhada, o AA recebe da Ré, com periodicidade mensal, a importância monetária de €1.400,00 ilíquidos, sendo €700,00 ... e €700,00 do ..., também paga durante o período de férias e outros períodos de ausência, designadamente por motivo de doença.

14) Como contrapartida da atividade desempenhada, o trabalhador AA recebe também da Ré, com periodicidade mensal, uma quantia variável, em média de €300,00, em função dos artigos produzidos, da .... (alterado nos termos da decisão infra)

15) O trabalhador emite, mensalmente, recibo eletrónico, como "trabalhador independente".

16) Quando a Ré determina a AA deslocações e/ou estadia em Lisboa, no âmbito da publicação ..., este não suporta qualquer custo, usufruindo dos acordos pré-estabelecidos pela Ré com a CP e com determinadas unidades hoteleiras. (alterado nos termos da decisão infra)

17) A AA foi atribuído um endereço de correio eletrónico com o domínio da Ré (..........@.....).

18) AA tem acesso, tal como os restantes trabalhadores da Ré, a apoio técnico a avarias informáticas.

19) Goza 22 dias de férias em cada ano, tendo de comunicar, com a antecedência de pelo menos um mês, à ré a indicação do período em que pretende fazê-lo, o qual carece de ser validado. (alterado nos termos da decisão infra)

20) AA quando precisa faltar tem de, com antecedência, comunicar previamente aos editores de cada uma das publicações atrás indicadas, enquanto seus superiores hierárquicos.

21) E não pode fazer-se substituir por terceiros na execução das peças jornalísticas.

22) A Ré não paga a AA qualquer quantia a título de subsídios férias ou de Natal.

23) AA trabalha exclusivamente para a Ré.

24) AA iniciou funções de Jornalista para a Ré a 04 de Junho de 2018, na sequência de um contrato verbal.

25) Está inscrito na Autoridade Tributária e na Segurança Social como trabalhador independente.

26) AA não está obrigado ao cumprimento de um horário de trabalho, com horas de entrada e de saída.

27) As peças jornalísticas são lidas pelos editores antes de irem para a gráfica ou serem publicadas online.

28) As peças elaboradas por AA são validadas e aprovadas pelos editores, a quem compete zelar pelo cumprimento do estatuto editorial do respetivo órgão de comunicação social.


*

Aqui chegados importa decidir, se, ao contrário do decidido pela 1.ª instância, o vínculo existente entre a recorrida e AA não deve ser qualificado como contrato de trabalho.

O objetivo da ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, introduzida pela Lei 63/2013 de 27/08 é o combate à utilização indevida do contrato de prestação de serviços em relações de trabalho subordinado (cfr. art.º 1º daquela Lei).

Ora, na data a que o Ministério Público reporta o início do contrato (04 de junho de 2018) vigorava o CT aprovado pela Lei 7/2009 de 12/02, à luz do qual importa, pois, analisar a enunciada questão.

Nos termos do art.º 11º do dito Código, “Contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a autoridade destas”.

Por sua vez o art.º 1152º do Código Civil define o contrato de trabalho como aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade intelectual ou manual a outra ou outras pessoas, sob a autoridade e direção destas.

A relação jurídica laboral caracteriza-se, pois, essencialmente, pela existência de subordinação jurídica, a qual se reconduz à possibilidade de determinação da atividade do trabalhador, mediante ordens, diretivas e instruções e ao dever de obediência deste no que concerne à execução e disciplina da prestação de trabalho fixadas pelo empregador, titular do poder diretivo e disciplinador dessa prestação.

Tal posição de sujeição que se assume como individualizadora da relação jurídico-laboral, mostra-se ausente no contrato de prestação de serviços, a que alude o art.º 1154º do Código Civil, como “aquele pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição”.

O que distingue verdadeiramente o contrato de trabalho é, pois, como acertadamente se refere na sentença recorrida, o estado de sujeição do trabalhador relativamente ao empregador, consubstanciado na possibilidade de aquele, a cada momento, poder ver ser concretizada por este a sua prestação em determinado sentido[15].

Trata-se da possibilidade de o credor do trabalho determinar o modo, o tempo e o lugar da prestação de trabalho que é, portanto, heterodeterminada (pelo empregador), contrapondo-se ao trabalho autodeterminado em que, em princípio, cabe apenas ao próprio prestador da atividade a definição do modo, tempo e lugar da prestação.

Mas, mesmo no trabalho heterodeterminado o grau de dependência do prestador do trabalho da autoridade e direção do empregador pode ser maior ou menor, sobretudo no que se refere ao modo da prestação, diminuindo, sensivelmente à medida que aumenta a especificidade técnica exigida para o desempenho da atividade. Por isso, o contrato de trabalho não é incompatível com a salvaguarda da autonomia técnica do trabalhador, sendo possível o desempenho de funções de elevada craveira técnica e intelectual em regime de subordinação jurídica.

Releva ainda como elemento caracterizador do contrato de trabalho a subordinação económica do trabalhador à entidade empregadora. A obrigação de pagar a remuneração enquanto correspetivo da prestação de trabalho, é de resto, a principal obrigação que resulta para o empregador da celebração do contrato de trabalho, e a cujo cumprimento está vinculada independentemente do aproveitamento que faça da disponibilidade do trabalhador, na qual se esgota a prestação a que este se obriga em virtude o contrato de trabalho (obrigação de meios). O valor retributivo será regular e periódico (art.º 278.º do CT).

Reconhecendo-se a dificuldade de, em concreto, traçar uma fronteira completamente definida entre o contrato de trabalho e algumas das figuras que lhe são afins, tem-se optado pelo recurso à verificação, em cada caso, de um conjunto de indícios da existência ou inexistência de subordinação jurídica, particularmente, nas situações, de interpretação divergente do sentido das declarações de vontade na celebração do contrato.

Os indícios normalmente apontados no sentido da existência de subordinação são o de o lugar do trabalho pertencer ao empregador ou ser por ele determinado, o horário de trabalho ser o definido pelo empregador, a existência de poder disciplinar, a organização do trabalho depender estritamente da vontade o empregador, serem os instrumentos de trabalho pertencentes ao empregador, a existência de outros trabalhadores subordinados no exercício da mesma atividade, a opção pela modalidade de retribuição certa, o aumento periódico da retribuição, o pagamento de subsídios de férias e de Natal, a exclusividade da atividade laboral por conta do empregador, a sindicalização e a observância do regime fiscal e de segurança social próprios do trabalho por conta de outrem.

Assim, a distinção deverá, afinal, ser feita em função do modo concreto de execução da prestação.

As dificuldades que se colocam na prova dos indícios relevantes e o uso abusivo da figura do contrato de prestação de serviços para evitar os encargos que para o empregador resultam da celebração dos contratos de trabalho (omitindo certos empregadores unilateral e deliberadamente o cumprimento de obrigações fiscais e de segurança social, de seguros de acidentes de trabalho, de pagamento de subsídios de férias e de Natal, por exemplo), levaram o legislador a consagrar, presunções de contrato de trabalho que oneram a entidade empregadora com o esforço da prova da inexistência de contrato de trabalho.

Assim, de acordo com o art.º 12.º n.º 1 do CT “Presume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre a pessoa que presta uma actividade e outra ou outras que dela beneficiam, se verifiquem algumas das seguintes características:

a) A actividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado;

b) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da actividade;

c) O prestador da actividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo beneficiário da mesma;

d) Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de actividade, como contrapartida da mesma;

e) O prestador de actividade desempenhe funções de direcção ou de chefia na estrutura orgânica da empresa”.

Com a estatuição desta presunção, trata-se afinal, como refere João Leal Amado[16], de “(…) uma simplificação do método indiciário tradicional, visto que, como ponto de partida, ela dispensa o intérprete de proceder a uma valoração global de todas as características pertinentes para a formulação de um juízo conclusivo sobre a subordinação”.

Interessa também referir que, para que aquela presunção de laboralidade atue, basta a verificação de, pelo menos, dois dos pressupostos previstos nas diversas alienas desse preceito[17].

Por outro lado, existindo tal presunção legal de contrato de trabalho, face ao disposto pelos arts. 344.º, nº 1 e 350.º, do Código Civil, ao autor compete o ónus da prova das condições baseada presunção e não já o ónus da prova dos factos constitutivos do direito invocado, impendendo sobre o empregador o ónus de provar os factos demonstrativos da inexistência do contrato de trabalho, com vista a ilidir da presunção. Importa, porém, salientar que, para o efeito, não basta a contraprova destinada a tornar duvidoso o facto presumido. É necessário que se faça a prova de factos que levem à conclusão de que a relação contratual consubstancia um outro tipo contratual que não o contrato de trabalho, designadamente que consubstancia um contrato de prestação de serviços[18].

Quer isto dizer que «presumida a natureza laboral do contrato e apresentados ao tribunal, pela parte interessada, elementos de facto apontando em sentido oposto, mas não suficientes, porém, para convencer firmemente o tribunal de que o contrato em causa não é de trabalho -, então a decisão deverá ser favorável a quem beneficia da presunção, o prestador da atividade, e desfavorável a quem tinha o ónus de a ilidir. A presunção vincula o julgador – vale por dizer: verificados dois ou mais elementos dos elencados no art. 12.º, n.º 1, ele terá de considerar demonstrada a natureza laboral do contrato -, que apenas deverá afastar-se do resultado presuntivo se o interessado em ilidir a presunção lograr fazê-lo, dissipando não apenas a convicção de que o contrato em análise é um contrato de trabalho como a dúvida sobre se o será.»[19]

É de realçar, finalmente, que ainda que num determinado caso concreto não seja possível concluir pela verificação dos pressupostos de tal presunção, tal não exclui a possibilidade de qualificar um determinado vínculo como de trabalho subordinado, desde que estejam reunidos todos os seus requisitos à luz da mencionada noção legal de contrato de trabalho[20], cuja prova compete ao autor, neste caso ao Ministério Público, nos termos do art.º 342.º, n.º 1 do Código Civil.

Revertendo estas considerações para a situação dos autos verifica-se que, no que respeita ao local onde o referido AA exercia a atividade contratada, ficou provado que o mesmo iniciou funções de jornalista para a ré a 04 de junho de 2018, na sequência de um contrato verbal, atividade que prestava integrado nos serviços das publicações pertencentes à ré, “...”, “...” e ...” e que tal atividade de jornalista era desempenhada, maioritariamente, nas instalações da ré, no Porto ou nos locais para onde o mesmo se desloca a fim de efetuar a cobertura noticiosa solicitada pela ré.

A atividade era, pois, realizada em local pertencente à ré (as suas instalações) ou por esta determinado (locais onde tinha de se deslocar para fazer a cobertura noticiosa solicitada pela ré), situação que, se se tivesse mantido imutável, se subsumira à al. a) do n.º 1 do art.º 12.º do CT.

Contudo, a partir da mudança de instalações da ré para a Rua ... (que não se sabe quando ocorreu, porque não resulta dos factos provados), a atividade, na parte relativa à redação das peças a publicar, passou a ser executada no domicílio do prestador, não resultando da matéria de facto provada quais as circunstâncias em que tal modificação ocorreu, nomeadamente se tal resultou de determinação da ré, pelo que, apenas parte da atividade era realizada em local determinado pela ré, isto é nos locais onde o AA se deslocava para fazer a cobertura noticiosa. Isto é, apesar de parte da atividade ter passado a ser desempenhada em local que não pertencia à ré, esta conservou, ainda assim, a possibilidade de determinar o local em que era exercida, pelo menos, a outra parte, pelo que, ainda que o tribunal “a quo” não o tenha afirmado, afigura-se-nos ser de considerar verificada a previsão da al. a) do art.º 12.º, n.º 1 do CT.

Resulta também da matéria de facto provada que no desenvolvimento da sua atividade o referido AA utiliza equipamentos e instrumentos disponibilizados pela ré e a esta pertencentes, nomeadamente a VPN da ré para aceder via remota ao computador da ré, mediante passwords individuais, por esta fornecidas e software Banco 1..., cuja licença é propriedade da ré e que é um programa interno utilizado para escrever e editar artigos, ao qual o AA acede, também, mediante passwords individuais fornecidas pela ré. Releva também, o facto de ter sido atribuído um endereço de correio eletrónico com o domínio da ré.

Tanto basta para se concluir, como na sentença recorrida, pelo preenchimento da previsão da al. b) do art.º 12.º, n.º 1 do CT., sendo na nossa perspetiva irrelevante, até porque não ficou provado, que o software Banco 1... seja uma ferramenta facilitadora do trabalho a desenvolver e que a sua utilização dependa da livre vontade de cada jornalista que presta serviços, seja a que título for, à ré, como esta alegava, pois, o que importa é a disponibilização pelo beneficiário da atividade de equipamentos e instrumentos e a sua utilização pelo prestador.

Os factos provados e a recorrente não o contesta, permitem ainda considerar verificada a situação prevista na al. d) do at.º 12.º, n.º 1 do CT, pois apurou-se que, como contrapartida da atividade desempenhada, o AA recebe da ré, com periodicidade mensal, a quantia de € 1 400,00, que é paga também durante o período de férias e noutros períodos ausências, designadamente, por motivo de doença. O facto de receber também uma quantia variável relativa à atividade desenvolvida para a “...”, em nada belisca a conclusão anterior, pois, de acordo com o art.º 261.º do CT, nada obsta a que à retribuição certa, acresça uma retribuição variável.

Assim sendo, não merece qualquer censura a sentença recorrida quando conclui estarem verificados os pressupostos da presunção de laboralidade previstos pelo art.º 12.º, n.º 1 do CT.

Mostra-se, pois, demonstrada a base da presunção da qualificação do contrato como contrato de trabalho, pelo que, o que importa agora é perceber se a ré logrou ilidir tal presunção nos termos acima referidos, isto é, demonstrando factos dos quais se infira com a necessária segurança que o vínculo existente era afinal um contrato de prestação de serviços.

Adiantamos, desde já que não.

A relação contratual em causa, foi estabelecida de forma verbal, pelo que não tendo a vontade das partes[21] sido documentalmente exteriorizada, e na falta de quaisquer factos provados relativos às condições da contratação que a demonstrem, não poderá aquela desempenhar qualquer papel relevante com vista à qualificação do contrato em qualquer dos sentidos.

Da matéria de facto provada resulta que os trabalhos produzidos pelo AA são publicados com o seu nome. Ainda que de acordo com a Lei de Imprensa (cfr. arts. 13.º e 15.º da lei 2/99 de 13/01) apenas seja obrigatória a menção do nome do autor nas publicações não periódicas, da opção de fazer constar o nome do autor de cada peça ou trabalho em publicações periódicas, nada se colhe de útil quanto à natureza do vínculo estabelecido entre aquele autor e a empresa.

Acresce que não resulta da matéria de facto que a atividade do AA se limitaria à redação de notícias do dia ou ao relato de simples informações, já que o se provou foi que exercia a atividade de jornalista [ponto 4) da matéria de facto], elaborava conteúdos noticiosos [ponto 9) da matéria de facto], trabalhava para a rubrica fixa “...” publicada semanalmente no ... [ponto 10) da matéria de facto], redigindo também artigos para a revista “...” [ponto 11) da matéria de facto] e produzia artigos para a “... [ponto 14) da matéria de facto].

E de acordo com o art.º 7.º-A, n.ºs 1 e 2 do Estatuto do Jornalista (Lei n.º 1/99, de 01 de Janeiro), os jornalistas têm o direito de assinar, ou de fazer identificar com o respetivo nome profissional, as obras (os artigos, entrevistas ou reportagens que não se limitem à divulgação de notícias do dia ou ao relato de acontecimentos diversos com o carácter de simples informações e que traduzam a sua capacidade individual de composição e expressão) da sua autoria ou em que tenham tido participação, tratando-se, pois, de um direito estatutário independente da natureza do vínculo que mantenham com o titular da empresa como resulta do art.º 7.º-B daquele mesmo diploma.

Provou-se também que o AA emite, mensalmente, recibo eletrónico como “trabalhador independente”, que está inscrito na Autoridade Tributária e na Segurança Social como trabalhador independente e que a ré nunca lhe pagou qualquer quantia a título de subsídios de férias ou de Natal, provando-se, no entanto que aquele gozava em cada ano 22 dias de férias, que a ré remunerava, o que acontecia também com as outras ausências.

Ora, como se afirma no Ac. RP de 06/06/2016[22] «(…) é irrelevante para afastar a subordinação jurídica, o facto de a A. emitir facturas e os denominados “recibos verdes” para dar quitação das importâncias pagas pela R. (…). É o próprio legislador a determinar que se declare no verso daqueles recibos, que “a utilização de recibos do presente modelo não implica a qualificação do trabalho prestado, como independente, para efeitos de Direito do Trabalho”[23], o que atesta o valor indiciário quase nulo desta circunstância.

O mesmo deve dizer-se da subsistência de outros aspectos formais não consentâneos com a execução de um contrato de trabalho, como o não pagamento de subsídios de férias e de Natal e o não pagamento de contribuições à Segurança Social [factos l) e n)], aspectos que não têm a virtualidade de determinar uma conclusão diferente daquela a que se chegou pelo análise do concreto condicionalismo de subordinação jurídica em que se processava a actividade profissional da A.. E é de notar que o valor contrário destes aspectos se mostra mitigado, por um lado, pela circunstância de se ter provado o gozo de férias e o pagamento da retribuição em doze meses por ano (…) o que implica, necessariamente, que a A. auferia retribuição num determinado período de cada ano sem prestar actividade, realidade que de modo algum se coaduna com um contrato de prestação de serviço, em que a retribuição constitui contrapartida de um concreto resultado da actividade intelectual ou manual do prestador.»

No mesmo sentido afirma-se no Ac. RE de 12/07/2018[24], oportunamente citado na sentença recorrida que «A circunstância dos trabalhadores estarem inscritos na Administração Fiscal como trabalhadores independentes, é também habitual neste tipo de situações e apenas reforçam o propósito do empregador não querer assumir a existência da relação laboral, munindo-se de aspetos formais que não correspondem aos termos reais em que a relação contratual se desenvolve.

O não pagamento ao longo da relação contratual dos subsídios de férias e de natal também não releva por se tratar de uma realidade igualmente comum em situações em que o empregador não quer assumir a existência de um contrato de trabalho.»

Quanto à vinculação ou não do AA a um determinado horário ficou provado que este não estava obrigado ao cumprimento de qualquer horário com horas de entrada e saída, apontando no sentido e uma certa autonomia no que respeita à organização do tempo de trabalho. Mas também resulta da matéria de facto, em sentido contrário ao pretendido pela recorrente, que a atividade daquele era exercida de acordo com a agenda previamente definida por esta, implicando deslocações para efetuar a cobertura noticiosa que era solicitada pela ré [ponto 5) da matéria de facto], ou seja, não era o AA que decidia quais as tarefas as cumprir, quais as notícias que tinha que cobrir, nem os locais ou momentos onde tinha que se deslocar para o efeito.

Diz a recorrente a este propósito que «os acontecimentos noticiosos têm, a maioria das vezes, definição “prévia” de dia, local e hora e, por isso, obviamente, há um “agendamento e uma pré determinação do jornalista” que irá “fazer o serviço”.

O AA, nem nenhum outro jornalista, pode escapar a esta realidade.

Esta realidade é intrínseca da profissão de jornalista».

Até pode ser, mas o que releva é que, como a ré também afirma “Cabe à Ré organizar a cobertura dos mesmos pelos vários jornalistas” e “Existe, apenas e só e por uma questão básica de organização, uma distribuição pelos jornalistas que lhe prestam actividade, seja a que título for.”, o que não pode deixar de significar que é a ré quem decide qual jornalista cobre que notícia, qual o local onde o mesmo se desloca e quando é que se desloca, na certeza de que é a ré que escolhe, não a ocorrência dos acontecimentos, mas quais os acontecimentos a cobrir (não estando obrigada a cobrir todos), escolhendo o jornalista que cobre cada acontecimento, organizando quer a sua atividade, quer a atividade dos jornalistas.

Também se provou a obrigação de escrever uma notícia por dia, incluindo aos fins-de-semana, para o site da revista “...” [facto 11) da matéria de facto].

E provou-se ainda a obrigação de comunicar com antecedência o período em que pretendia gozar férias, que carecia de validação da ré (ponto 19) da matéria de facto), bem como a obrigação de comunicar quando precisava de faltar.

Tudo conjugado, resulta que o AA não tinha, afinal, na sua inteira disponibilidade a gestão do seu próprio tempo de trabalho.

A restante matéria que se provou quanto à forma de execução da atividade, não só não é própria de um exercício autónomo, como demonstra exatamente contrário.

De facto, o AA está sujeito às indicações específicas da ré quanto à forma de cobrir os acontecimentos a noticiar, de elaborar o conteúdo noticioso e quanto ao ângulo de abordagem de determinada peça, os trabalhos a realizar para a rubrica fixa “...” são maioritariamente propostos e marcados pelo editor do .... As peças jornalísticas elaboradas são validadas e aprovadas pelos editores, aos quais compete, é certo, zelar pelo cumprimento do estatuto editorial de cada órgão de comunicação social, estando os jornalistas de cada órgão de comunicação social vinculados à orientação editorial definida, e à orientação e determinação pelo diretor do conteúdo da publicação (arts. 17.º e 20.º da lei de Imprensa).

O facto do cumprimento do estatuto editorial constituir uma obrigação legal dos órgãos de comunicação social, não significa, contudo, que a sujeição dos jornalistas às orientações editoriais seja indiferente, pois, ao aceitar trabalhar para um determinado órgão de comunicação social, um jornalista aceita também, necessariamente, a orientação editorial definida, perdendo a possibilidade de dela divergir na execução do seu trabalho, seja na elaboração de notícias, seja de artigos ou outros, o que limita, necessariamente o conteúdo do seu trabalho, ao contrário do que acontece, por exemplo, com os jornalistas “free lancers” que, tendo a liberdade de escolher os projetos nos quais pretendem trabalhar, conservam a possibilidade de não aceitar trabalhos, incluindo quando não concordam com as orientações editoriais de quem contrata os seus serviços.

Por outro lado, quando a ré determinava deslocações ou estadias, o AA não suportava qualquer custo com transporte e estadias, o AA tinha acesso, tal como os trabalhadores da ré, a apoio técnico a avarias informáticas e não pode fazer-se substituir por terceiros na execução das peças jornalísticas, circunstâncias, por via de regra ausentes numa mera prestação de serviços.

No que se refere à questão da exclusividade não podemos deixar relembrar a alteração feita ao ponto 23) da matéria de facto, na parte respeitante à dependência económica para a subsistência do AA.

Ainda assim, subsistiu como provado que aquele trabalha em exclusivo para a ré. Ora, como se deixou acima dito, a exclusividade da prestação é um dos indícios a ter em conta no âmbito do método indiciário para a qualificação do contrato como contrato de trabalho.

É, por isso, totalmente desajustado o argumento da ré de que “mal andou o Tribunal “a quo” na medida em que, pelo supra exposto, não existe um vínculo laboral entre a Ré e o AA e, a ser assim como é, o uso do critério de forma isolada - presta a sua actividade em exclusivo para a Ré - não terá a virtualidade de transformar uma prestação de serviços num contrato de trabalho”

De facto, nem este critério foi valorado isoladamente, nem colhe a tentativa da ré de afirmar de forma conclusiva que não existe um vínculo laboral para desvalorizar a exclusividade, com o argumento de que “qualquer um pode desenvolver a actividade de prestador de serviços e é livre de a prestar a 1,2 ou mais entidades”.

É exatamente o contrário. A exclusividade da prestação da atividade à ré, em conjugação com tudo o mais que se provou, é que permite concluir, não só que a ré não logrou ilidir, como lhe competia, a presunção de laboralidade do vínculo, como que o vínculo existente, atenta a forma pela qual vem sendo executado é um verdadeiro contrato de trabalho.

Não se vislumbra, assim, qualquer motivo para divergir da sentença recorrida, sendo a mesma de confirmar, apenas com as alterações à matéria de facto acima determinadas.


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Decisão

Por todo o exposto, acorda-se:

a) alterar oficiosamente a redação do ponto 23) e eliminar o ponto 29) da matéria de facto;

b) julgar o recurso improcedente, mantendo-se, a sentença recorrida.

c) condenar a recorrente nas custas, nos termos do art.º 527.º, n.ºs1 e2 do CPC.


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Nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do CPC, anexa-se o sumário do presente acórdão.

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Notifique.

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Porto, 05/11/2024
Maria Luzia Carvalho
Sílvia Saraiva
Rui Penha

(assinaturas eletrónicas nos termos dos arts. 132º, n.º 2, 153.º, n.º 1, ambos do CPC e do art.º 19º da Portaria n.º 280/2013 de 26/08)
___________________
[1] Processo, n.º 701/19.0T8PFR.P1, acessível em www.dgsi.pt.
[2] Processo n.º 811/13.3TBPRD.P1, acessível em www.dgsi.pt.
[3] In "Recursos em Processo Civil - Recursos nos Processos Especiais, Recursos no Processo do Trabalho", Almedina, 7a edição atualizada, 2022, pág. 195.
[4] Ob. cit., pág. 350.
[5] Publicado no DR, Série I, n.º 220/2023, de 14-11-2023 - cujo sumário foi retificado pela Declaração de Retificação n.º 35/2023, de 28 de novembro, publicado no DR, Série I, de 28-11-2023.
[6] Processo n.º 14580/21.3T8PRT.P1, ao que se julga não publicado, mas disponível no registo de acórdãos.
[7] Ob. cit., págs. 200 e 201.
[8] Processo n.º 15787/15.T8PRT.P1.S2, acessível em wwww.dgsi.pt.
[9] Processo n.º 1472/23.0.T8AVR.P1, ao que se julga não publicado, mas disponível no registo de acórdãos.
[10] Nota de rodapé do Acórdão (7) com o seguinte teor: Consultável em www.dgsi.pt, processo n° 607/18.0T8MTS.P1.
[11] Processo n.º 16293/ 23.2T8PRT.P1, acessível em www.dgsi.pt.
[12] Processo n.º 4199/23.0T8VLG.P1, acessível em www.dgsi.pt.
[13] Entre outros, veja-se o Ac. do STJ de 06/02/2024, Processo n.º 18321/21.7T8PRT.P1.S1, acessível em www.dgsi.pt.
[14] António Santos Abrantes Geraldes, obra citada, pág. 199.
[15] A. Menezes Cordeiro, Manual de Direito do Trabalho, pág. 535.
[16] Contrato de Trabalho, à Luz do novo Código do Trabalho, 2009, pág. 76 e 77.
[17] Vd. entre outros, Ac. RP de 30/01/2017, processo n.º 5/14.4T8OAZ.P1, Ac. RP de 14/12/201, proc. n.º 1694/16.0T8VLG.P1 e Ac. STJ de 12/10/2017, proc. n.º 1333/14.4TTLSB.L2.S2, todos acessíveis em www.dgsi.pt e Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 14.ª ed., página 153.
[18] Neste sentido, Ac. RP de 30/01/2017 e Ac. RP de 14/12/2017, identificados na nota anterior.
[19] Milena Silva Rouxinol, m Direito do Trabalho, Relação Individual, 2.ª ed. Revista e atualizada, pág. 99.
[20] Albino Mendes Baptista, Estudos sobre o Código do Trabalho, Coimbra Editora, pág. 71 e Maria do Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, 9ª ed. Revista e actualizada à Lei n.º 13/2023, de 3 de abril, , pág. 53 e na jurisprudência, entre outros, o Ac. RL de 12/09/2007 reportando-se, embora, à presunção prevista pelo Código do Trabalho de 2003.
[21] A propósito da vontade das partes na qualificação do vínculo contratual, veja-se Bernardo da Gama Lobo Xavier, Manual de Direito do Trabalho, 2.ª ed. Revista e atualizada, págs. 351 a 359.
[22] Proc. n.º 424/13.3TTVFR.P1, acessível em www.dgsi.pt.
[23] Nota 19 do Acórdão com o seguinte teor: “Vide a Portaria n.º 1035/2001, in D.R. n.º 195, Série I-B de 2001-08-23, que aprova o recibo modelo n.º 6 para o IRS. Declarando a irrelevância qualificativa deste específico aspecto formal em situações em que se mostre caracterizada a subordinação jurídica, vide, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2005.10.03, Recurso n.º 3953/04 - 4.ª Secção, sumariado in www.stj.pt.”.
A Portaria mencionada no Acórdão de 06/06/2026 em referência foi revogada tendo-se, contudo, mantido ao longo do tempo (Portaria n.º 879-A/2010 de 29/11, Portaria n.º 426-B/2012 de 28/12, Portaria n.º 338/2015 de 08/10 e Portaria n.º 243/22 de 23/09) o mesmo tipo de declaração que constava daquela, mantendo-se nas instruções de preenchimento dos recibos, agora eletrónicos, a seguinte menção “A utilização dos documentos aprovados pela presente portaria não determina a qualificação do serviço prestado como trabalho independente.”
[24] Proc. n.º 1149/17.6T8PTG.E1, acessível em www.dgsi.pt.