PROCEDIMENTO CAUTELAR
PENDÊNCIA DE ACÇÃO
CONTA DO PROCESSO
TAXA DE JUSTIÇA
PARTE REMANESCENTE
DISPENSA DE PAGAMENTO
PRAZO
Sumário

I. A conta nos procedimentos cautelares instaurados na pendência de ações declarativas deve ser elaborada apenas no final do processo principal, aí sendo computada a taxa devida com base na Tabela Anexa II como um dos procedimentos integrados na ação;
II. Não há lugar a cômputo de taxa de justiça remanescente nos processos referidos no art.º 7.º do Regulamento das Custas Processuais, entre os quais os procedimentos cautelares, sendo devido tal remanescente apenas na própria ação, com base na aplicação do art.º 6.º desse diploma e na Tabela Anexa I;
III. Elaborada conta no procedimento cautelar e nela sendo computado valor de taxa remanescente a pagar, deve a mesma ficar sem efeito, sendo de dez dias sobre a decisão final da ação o momento relevante para apresentação do pedido de dispensa de pagamento de taxa remanescente que eventualmente venha a ser liquidada.

Texto Integral

Acordam os juízes que integram esta 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa o seguinte:

I. Caracterização do recurso:
I.I. Elementos objetivos:
- Tipologia da apelação – Em separado (de autos de procedimento cautelar propostos na dependência de processo de inventário);
 - Tribunal recorrido - Juízo Local Cível de Lisboa - Juiz 24;
- Decisão recorrida – Indeferimento de requerimento para dispensa de pagamento de taxa de justiça remanescente.
I.II. Elementos subjetivos:
- Recorrente - AA –
I.III. Síntese relevante dos autos;
I.III.I. De procedimento cautelar:
- Por apenso a autos de inventário para partilha por óbito de BB e CC, propôs o aqui recorrente, na qualidade de interessado filho, em 21/7/2022, procedimento cautelar de arrolamento;
- Notificados os requeridos do procedimento, veio DD, na qualidade de interessada e cabeça-de-casal, deduzir oposição;
- Autonomamente a oposição anteriormente referida, vieram também as interessadas EE e FF opor-se ao procedimento;
- Por despacho de 14/12/2022 foram as partes notificadas, nos termos do art.º 3.º n.º 3 do CPC, para se pronunciarem sobre nulidades e exceções;
- Por despacho proferido a 23/1/2023 foi decidido (transcrição do dispositivo relevante):
- julgo improcedente o presente procedimento cautelar de arrolamento e, em consequência, absolvo o(s) Requerido(s) do(s) pedido(s) cautelar(es).
Condeno em custas o Requerente.
Valor do procedimento: o indicado no requerimento inicial, vide alínea f) do n.º 3 do artigo 304.º, n.º 4 do artigo 305.º e 306.º do Código de Processo Civil.
- Deste despacho interpôs o requerente recurso para esta Relação;
- Por acórdão de 11/5/2023 foi decidido negar provimento à apelação e manter a decisão recorrida;
- Baixados os autos, conforme termo de 15/1/2024, foram os autos de procedimento cautelar remetidos à conta;
- Elaborada esta em 30/1/2024, apurou um valor a pagar pelo aqui recorrente equivalente a €6.732 (seis mil setecentos e trinta e dois), computando as taxas anteriormente pagas no procedimento (no montante de €1.632) e fixando o valor da taxa devida no equivalente a €8.364 (oito mil trezentos e sessenta e quatro);
- Nesse mesmo dia (30/1/2024) foi emitida e enviada guia para pagamento ao aqui recorrente do valor apurado;
- Por requerimento de 19/2/2024 este requereu dispensa do pagamento da taxa remanescente em percentagem não inferior a 95%;
- Fundamentou tal requerimento, em síntese, dizendo que o procedimento não teve complexidade e que o valor de taxa já paga corresponde a uma contraprestação adequada ao serviço que lhe foi prestado pela administração da justiça;
- Aberta vista para o efeito, pronunciou-se o Ministério Público dizendo:
Pese embora se considere que o requerimento que antecede foi apresentado extemporaneamente, a verdade é que se entende que o valor já pago a título de taxa de justiça, atenta a especificidade dos presentes autos, mostra-se justo e proporcional.
- Na sequência de tal promoção foi proferido o despacho recorrido;
- Interposto o recurso em apreço, por despacho proferido a 10/7/2024 foi o mesmo admitido;
- O Ministério Público não alegou.
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I.III.II. Do inventário:
- Os autos de inventário estão a correr, não tendo ainda sido decidido incidente de reclamação à relação de bens.
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I.III.III. O despacho recorrido (transcrito na íntegra):
Ref.ª Citius 38515827 de 19-02-2024 (Requerente) e promoção de ref.ª Citius 433319794 de 01-03-2024:
O Requerente veio requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça [n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais].
Cotejando a data do trânsito em julgado do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa [ref.ª Citius 19975086 de 11-05-2023] com a data do requerimento em apreciação é forçoso considerar extemporânea o efeito prático normativo visado por parte do Requerente.
Leia-se o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 1/2022, de 10 de Novembro de 2021, publicado no Diário da República n.º 1/2022, Série I de 2022-01-03, páginas 31 – 71: «A preclusão do direito a requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, a que se reporta o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, tem lugar com o trânsito em julgado da decisão final do processo» e correlativos critérios e fundamentos normativos mobilizados.
Ergo, sem necessidade de maiores considerandos, indefere-se o requerido.
Notifique.
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II. Objeto do recurso (como delimitado pelas alegações do recorrente sintetizadas nas respetivas conclusões):
II.I. Alegações do recorrente:
Conclui pedindo a revogação do despacho recorrido e que seja ordenada a sua substituição por outro que determine que se aguarde pela decisão final do processo (de que o procedimento cautelar é dependência) para, aquando da elaboração da conta de custas, aprecie e decida sobre o pedido do remanescente da taxa de justiça relativa ao procedimento cautelar de arrolamento.
Sustenta-se apresentando as seguintes conclusões:
1. O pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, que o requerente formulou ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 7, do RCP, deve ser considerado tempestivo.
2. O artigo 30.º desse diploma legal estatui que deve ser elaborada uma única conta, a qual deve abranger obrigatoriamente todas as custas, quer do processo principal quer dos seus apensos.
3. A apresentação da conta de custas do procedimento cautelar tem de aguardar pela decisão final da ação de que é dependência.
4. O despacho recorrido violou o disposto no artigo 30.º do RCP e artigo 539.º, n.º 2, do CPC, e o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 1/2022.
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II.II. Questão a apreciar:
A questão a apreciar, diretamente suscitada pela recorrente, refere-se a saber se o procedimento cautelar deveria ter sido objeto de contagem autónoma, i.e., antes do fim do processo de que é dependente - o inventário judicial para partilha de herança.
Relacionada diretamente com tal questão está a existência, ou a preclusão, do direito do requerente de solicitar ainda a dispensa de remanescente noutro momento processual. --
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Não foram apresentadas contra-alegações.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. –
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III. Apreciação do recurso interposto:
Pretende o recorrente sustentar a sua pretensão recursória invocando, em síntese, que não deveria ter sido elaborada conta no procedimento cautelar, sendo que esta teria lugar apenas a final, i.e., uma vez findo o processo de inventário.
Quer isto dizer, portanto, que, pelo presente recurso, o recorrente não repete a pretensão de dispensa de pagamento de taxa remanescente com fundamento na complexidade dos autos e no valor das taxas já pagas, ou, dizendo de modo simples, não solicita, direta ou subsidiariamente, uma avaliação substantiva da questão, pretendendo apenas uma reavaliação do despacho que declarou a intempestividade do requerimento apresentado (sem se pronunciar sobre os respetivos fundamentos materiais).
Assinale-se, por outro lado, que o recorrente não reclamou da conta e, portanto, os argumentos com que pretende sustentar a revogação do despacho foram trazidos ex novo em sede de recurso e não apreciados em 1.ª instância, o que convoca também uma questão adicional – saber se pode o recorrente pôr em causa a conta elaborada sem que da mesma tenha previamente reclamado, i.e., sem se estar em contexto de reapreciação ad quem de reclamação deduzida a quo.
A falta de reclamação determina preclusão do direito de pôr em causa o ato processual de contagem ou tal direito mantém-se intacto, permitindo questionar a validade da conta (no caso, quanto ao momento da sua elaboração) em sede de recurso? – esta é a questão que previamente se deve colocar.
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Nos termos do art.º 31.º n.º 1 do Regulamento das Custas Processuais (RCP) o responsável pelo pagamento tem o prazo de dez dias para reclamar da conta ou pagar o seu valor, o que, no caso, o recorrente não fez.
Sabe-se que houve controvérsia jurisprudencial quanto ao momento de dedução  do pedido de dispensa de pagamento de taxa de justiça remanescente, querela que está ultrapassada com a doutrina estabelecida pelo acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 1/2022, mas, apreciando-o, o pedido formulado pelo recorrente na sequência de notificação da conta não pode ser interpretado de outra forma senão como uma pretensão estritamente dirigida a tal dispensa de pagamento de taxa remanescente.
 Por outro lado, ainda que não tenha havido decisão sobre a questão, na medida em que o recorrente não reclamou da conta, e, portanto, não existe pronúncia judicial que diretamente permita afirmar a formação de caso julgado formal sobre a respetiva validade, a falta de reação do visado terá que traduzir uma preclusão do seu direito a reclamar, por falta do respetivo acionamento, no momento próprio e pela via adequada.
A questão, assim apresentada, transfere-se para a de saber se decorre de tal preclusão a impossibilidade de avaliar judicialmente, por qualquer razão, a validade da conta elaborada.
Entende-se que não.
Quer isto dizer, avançando, que uma coisa é afirmar a preclusão do responsável pelo pagamento de reclamar da conta, outra o impedir definitivamente qualquer avaliação judicial da mesma, feita por via oficiosa, se e quando for entendido que enferma de vício que a afete e que possa ser conhecido.
Traduzindo esta asserção para a situação em apreço, na medida em que o recurso traduza, materialmente, uma reclamação do ato de contagem (quanto ao momento da sua elaboração), não poderá ser admitida (por preclusão do respetivo direito); mas, na medida em que o presente recurso possa ser entendido como uma invocação de vício patente na conta (e que poderia ser oficiosamente conhecido), entende-se que o mesmo pode ser objeto de apreciação.
A questão fica, neste momento, apenas assinalada e não decidida, uma vez que a respetiva decisão se prende diretamente com a questão essencial em discussão neste recurso – devia, ou não, o procedimento cautelar ter sido contado enquanto continua a correr a ação de que é dependência?
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Avançando diretamente para a questão em apreço, o argumento histórico de interpretação dá sustento à tese do recorrente (de que o procedimento cautelar não deveria ter sido objeto de contagem autónoma, devendo ser contado juntamente com o processo de inventário, a final).
Assim, dispunha o art.º 30.º do Regulamento das Custas Processuais (RCP), na sua versão originária, a constante do Decreto-Lei n.º 34/2008 de 26/2 que a conta definitiva abrange todas as custas da acção principal, incidentes, recursos e procedimentos anómalos, ao passo que este mesmo art.º 30.º n.º 1 do RCP, na redação em vigor e que incorpora as alterações introduzidas pela Lei n.º 7/2012 passou a dispor que a conta é elaborada de harmonia com o julgado em última instância, abrangendo as custas da acção, dos incidentes, dos procedimentos e dos recursos.
Quer isto dizer que a regra que estabelece a elaboração de conta única passou a referir-se, indistintamente, a procedimentos e não apenas os procedimentos anómalos.
Diga-se que este conceito de procedimento anómalo não é de apreensão evidente, não tendo qualquer correspondência noutros lugares paralelos, havendo uma tradicional referência a incidentes anómalos. Não parece, todavia, que tal exegese se imponha nos autos, podendo dar-se por adquirido que um procedimento cautelar não constitui qualquer anomalia na tramitação e, portanto, o que fica apenas do argumento histórico de interpretação é a alteração da referência).
Em termos racionais e sistemáticos, ligando a regra do atual n.º 1 com a norma estabelecida no n.º 2  - deve elaborar-se uma só conta por cada sujeito processual responsável pelas custas, multas, e outras penalidades, que abranja o processo principal e os apensos, pode dizer-se que fica clara a ratio e a teleologia do preceito – evitar a multiplicação de atos de contagem, centrando-os num ato único, no final do processo principal.
Quer isto dizer, portanto, que não apenas o elemento histórico de interpretação, como o racional e o teleológico dão suporte à posição do recorrente, que também se estriba adequadamente na letra do preceito convocado (art.º 30.º n.º 1 do RCP).
Contra-argumentando poderia dizer-se que não se compaginam com tal entendimento todas as situações de procedimentos cautelares instaurados e decididos previamente à ação de que dependem e, por maioria de razão, aqueles em que tal ação não exista mesmo, por ter sido determinada a inversão do contencioso.
São objeções relevantes, mas não definitivas, na medida em que pode a regra em causa ser interpretada incluindo os procedimentos cautelares, sempre que tenha sido instaurada ação definitiva de que dependa ou, dizendo de outro modo, que a conta será elaborada no procedimento quando este se mostre findo sem haver notícia de propositura de ação definitiva (ou quando se saiba mesmo que esta não será instaurada).
Nestes casos a ratio e a teleologia do preceito mantêm-se, uma vez que a decisão final do procedimento corresponde ao encerramento definitivo do pleito. Nos casos em que corra ação, a contagem do procedimento aguardaria a decisão desta, sendo feita a final.
Diga-se que a questão, assim colocada, já foi objeto de apreciação pelos tribunais superiores, em situação equivalente, sendo decidido que o cômputo da taxa do procedimento cautelar deverá ser efetuado na conta final da ação - assim, acórdão da Relação de Lisboa de 2/7/2019, Isabel Fonseca, dgsi.pt.
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Antes de desenvolver as afirmações anteriores, impõe-se referir uma questão conexa com esta e não suscitada diretamente pela parte nas conclusões do seu recurso, mas que se pode considerar abrangida pelo seu objeto, na medida em que traduzirá uma avaliação da obrigação de pagamento de tal obrigação – ser ou não devido remanescente de taxa de justiça nos procedimentos cautelares.
Esta é uma outra questão que já foi objeto de apreciação jurisprudencial, vindo a ganhar consistência o entendimento no sentido de que nos procedimentos cautelares, em primeira instância, mas igualmente em sede de recurso, não há lugar ao pagamento do remanescente da taxa de justiça previsto no n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais – (veja-se, neste sentido, acórdão da Relação do Porto 4/3/24, José Eusébio de Almeida, ecli.pt e jurisprudência aí referida, ac. Relação de Guimarães de 24/1/2019, Helena Melo, dgsi.pt).
A avaliação judicial a fazer prende-se com o disposto no art.º 7.º, n.º 4 do RCP (que estabelece que o cômputo da taxa de justiça nos procedimentos cautelares se faz com recurso à Tabela Anexa II e não prevê o pagamento do remanescente da taxa de justiça) enquanto, no concerne a ação e recursos, dispõe o art.º 6.º que a taxa de justiça é fixada com recurso à Tabela I, só aí estando previsto o pagamento de taxa remanescente.
Seguindo esta doutrina jurisprudencial, entende-se que é muito mais conforme com o sentido da lei reconduzir o cômputo da taxa devida em procedimentos cautelares por forma a abranger toda a tramitação do procedimento, i.e., abrangendo eventuais recursos, tramitação que será computada na conta única, incluindo a taxa devida pelos recursos apenas relativamente ao processo principal (e aí considerando as taxas pagas e os remanescentes devidos pela tramitação em cada instância).
O art.º 1.º n.º 2 do RCP estabelece um princípio de autonomia processual na base de taxação ao definir que a tributação processual incide sobre cada processo autónomo tributável, considerando-se, para tal efeito, cada acção, execução, incidente, procedimento cautelar ou recurso, corram ou não por apenso.
Quer isto dizer que, de forma muito clara, todos os processos e incidentes são contabilizados autonomamente. Coisa diferente será saber como e quando e são.
O como encontra-se nas tabelas anexas ao RCP e o quando, no que concerne a procedimentos cautelares, precisamente na regra em apreço – o art.º 30.º n.º 1 e 2 do RCP.
Para avançar, veja-se o que dispõe, como regras gerais, o art.º 6.º do RCP:
Em primeiro lugar, o princípio de que a taxação concreta é estabelecida com referência a um duplo critério: - o valor da causa e a sua complexidade (n.º 1).
Estes critérios não funcionam ao mesmo nível nem da mesma forma, podendo dizer-se que um deles é de aplicação primeira e universal – o valor da causa; e o outro é de aplicação facultativa e dependente – a complexidade.
Por isto, diz-nos o mesmo art.º 6.º n.º 1 do RCP que se aplicam, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela I-A, acrescentando o n.º 2 que, nos recursos, a taxa de justiça é sempre fixada nos termos da tabela I-B.
Quer isto dizer que, para ações (em geral) e recursos (especificamente), as taxas a pagar estão tabeladas de forma global, sendo que a modulação concreta do valor a pagar será feito na conta final, sendo que, nas causas de valor superior a (euro) 275.000, pode qualquer valor remanescente ser dispensado ao obrigado se a especificidade da situação o justificar, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento (cf. Art.º 6.º n.º 7).
Quer isto dizer, por outro lado, que também para os procedimentos cautelares o valor das taxas está tabelado, mas, neste caso, a lei (art.º 7.º n.º 4 do RCP) estabelece expressamente que se trata de uma regra especial, nada dispondo de equivalente ao supra referido n.º 7 do art.º 6.º quanto à existência de uma taxa remanescente a pagar.
Harmonizando estes preceitos no espírito do sistema (que é, claramente, o de concentrar os atos de contagem, postergando a sua repetição, seja por razões de economia processual, seja por razões de avaliação unitária dos fundamentos de determinação casuística da taxa aplicável), matizando-os de com referência aos princípios da proporcionalidade (que impõe uma adequação entre valores de taxas a pagar e tramitação processual) e de economia-gestão processual (que reforça a lógica de concentração dos atos de contagem – cf. art.º 6.º n.º 1 do CPC), as conclusões que se prefiguravam devem considerar-se confirmadas no sentido de que,  correndo ação definitiva, a contagem do procedimento cautelar deverá ser feita na ação, a final, sem cômputo específico de taxa de justiça remanescente e, portanto, sendo o próprio procedimento cautelar considerado como um dos elementos de avaliação da complexidade da ação.
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Chegando a este ponto, perante uma contagem efetivamente feita e não objeto de reclamação, pode avançar-se na avaliação da situação em apreço e várias considerações se impõem.
A primeira refere-se à validade da conta elaborada e não objeto de reclamação, no que concerne apenas ao momento de contagem.
Correndo ação, não devia o procedimento ter sido contado, mas, além do momento em que o foi, nada existe nos autos que permita sustentar que a contagem foi erradamente feita (algo que o próprio recorrente não questiona).
Não se poderá, assim, dizer que se trata de uma invalidade intrínseca da conta, mas uma simples prática de um ato em momento indevido.
Não se pode sequer dizer que seja absolutamente inútil a contagem feita, na medida em que tal ato poderia (em tese) ser aproveitada no momento de elaboração da conta final do inventário e, nessa medida, serviria como documento de encerramento de contabilidade do procedimento cautelar, mas com essa estrita função e não, portanto, como base para fundamentar uma exigência concreta de pagamento.
Dizendo de forma mais simples, não pode considerar-se vedado por lei, ou sequer ato processual absolutamente inútil, proceder a contagem de procedimento cautelar antes do termo da ação de que dependa, desde que não se siga ao mesmo qualquer ato processual de notificação às partes para reclamação ou pagamento.
Em termos simples, o ato pode ser válido e eficaz se for visto meramente como de contabilidade do processo, ficando ao critério do funcionário responsável pela contagem e ao juiz do processo a avaliação da necessidade/utilidade de o praticar, nesse momento.
Não foi, portanto, a conta em si mesmo considerada o que foi antecipado no procedimento, foi a notificação feita ao obrigado para que pagasse o valor apurado ou reclamasse da mesma.
A segunda consideração refere-se já ao conteúdo da contagem e é relativa ao cômputo de uma taxa de justiça remanescente.
A este nível, o vício é do próprio ato e refere-se ao conteúdo da obrigação de pagamento de taxa de justiça, que, nos termos acima referidos, radica no erro de impor o pagamento de um remanescente que não é devido.
Compaginando estas duas considerações com o objeto do recurso apresentado, delimitado pelas conclusões do recorrente, e cruzando-as com os elementos recolhidos nos autos, emergem as seguintes conclusões intercalares:
a) Foi exigido ao recorrente um pagamento que não era devido materialmente (por não ser devida taxa remanescente em procedimentos cautelares);
b) Foi exigido ao recorrente pagamento de taxa em momento indevido (por apenas o dever ser quando finda a ação declarativa);
c) Foi o mesmo notificado para a prática de ato processual (de pagamento ou reclamação) que não era, por isso, também devido;
d) O recorrente, face a tal comunicação, reagiu de modo extemporâneo (extemporaneidade corretamente declarada na decisão recorrida qualificando a pretensão como incidente de dispensa de pagamento de taxa remanescente, à luz do art.º 6.º n.º 7 do RCP, mas que seria também verificada e declarada se se tratasse de incidente de reclamação da conta).
A avaliação conjunta destas conclusões intercalares mesmas só pode impor uma conclusão sintética em sede decisória – a declaração de inexistência de obrigação de pagamento de taxa remanescente, por ser a única solução conforme às regras supra assinaladas.
A preclusão da possibilidade de reclamar da conta não ganha, assim eficácia no processo, face à constatação de ser indevida a notificação para pagamento feita no momento processual em que o foi.
O facto de o recorrente não ter invocado expressamente nos autos, no requerimento que deu origem ao despacho recorrido, os fundamentos que veio apresentar em sede de recurso, levará necessariamente à conclusão que inexiste qualquer omissão de pronúncia (que o recorrente não invocou), mas isso não invalida que não se deva considerar que o despacho recorrido, ao apreciar pretensão relacionada com taxa a pagar sem questionar a validade da conta (seja quanto ao momento da sua elaboração, seja quanto à obrigação de pagamento de remanescente), sustentou a validade da mesma, como pressuposto necessário da decisão que proferiu (ou, dizendo de outro modo, sustentou a validade da conta implícita ou indiretamente)
Em termos simples, o tribunal a quo validou a conta ao afirmar a extemporaneidade do pedido de dispensa de taxa de remanescente computada na mesma.
E se é este o caso, sendo a posição do recorrente fundada materialmente (porque a conta foi elaborada em momento indevido), deve tal ser declarado, procedendo o recurso, o que se decide. –
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IV. Dispositivo:
Face ao exposto, declara-se procedente a apelação e determina-se a revogação do despacho recorrido e que a contagem do procedimento cautelar será feita no final da ação de inventário, em conjunto com todos os atos, incidentes e procedimentos da mesma.
Custas pelo recorrente.
Notifique-se e registe-se. –

TRL, 07-11-2024
João Paulo Vasconcelos Raposo
Vaz Gomes
António Moreira