PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CIVIL
PROCESSO PENAL
PRINCÍPIO DA ADESÃO
RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
Sumário

(Da responsabilidade do relator - art.º 663º nº 7 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26-06, e adiante designado pela sigla “CPC”)
1- O pedido de indemnização que pode ser apreciado no âmbito de um processo penal e que se encontra adstrito ao princípio da adesão plasmado na norma do art.º 71º do Código de Processo Penal é o que se funda, exclusivamente, em responsabilidade extracontratual por facto ilícito e, já não, a que, designadamente, decorrer de responsabilidade contratual.
2 - Face ao princípio da adesão, pretendendo o autor deduzir em separado pedido de indemnização cível por factos que constituem ilícito criminal, nos termos do artigo 342º do Código Civil, cabe-lhe o ónus de alegar e provar a existência de alguma das exceções do artigo 72º nº 1 do Código de Processo Penal.

Texto Integral

Acordam na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

Relatório
LM, a 24.06.2022, intentou ação declarativa de condenação contra DT e Company Sucursal, formulando os seguintes pedidos:
a) Serem as Rés condenadas a pagar à Autora a quantia global de €149.804,34 (cento e quarenta e nove mil oitocentos e oitenta e quatro euros e trinta e quatro cêntimos), sendo a quantia de €139.804,34 (cento e trinta e nove mil oitocentos e oitenta e quatro euros e trinta e quatro cêntimos) a título de danos patrimoniais e a quantia de € 10.000,00 (dez mil euros) a título de danos não patrimoniais;
b) Serem as Rés condenadas a pagar à Autora os juros de mora vincendos sobre o valor do pedido, desde a data da citação até integral e efetivo pagamento, bem como todas as custas processuais, incluindo as de parte. pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de 13.222,50 €, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral e efetivo pagamento.
Em fundamento, alega, em suma, que:
 - entre os anos de 2016 e 2021, a Autora pagou à Primeira Ré a quantia de € 139.804,34 (cento e trinta e nove mil oitocentos e quatro euros e trinta e quatro cêntimos), relativamente a serviços que esta não prestou e a encargos inventados, bem como para diligências que não existem no ordenamento jurídico português;
 - sofreu abalo moral com o comportamento da primeira Ré;
- entre a Ordem dos Advogados e a Segunda Ré foi celebrado um contrato de seguro de responsabilidade civil profissional, titulado pela Apólice n.º ES00013960EO22A, garantindo a indemnização de prejuízos causados a terceiros, que resultem de dolo, erro, omissão ou negligência profissional dos advogados com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados que exerçam atividade em prática individual ou societária.

Regularmente citada, a Ré seguradora apresentou contestação, a 24.10.2022, invocando a exceção dilatória de incompetência do tribunal em razão da matéria, porque a A. já apresentou a competente queixa-crime contra a Primeira Ré, junto do DIAP de, a qual corre termos sob o n.º. Assim sendo, o pedido cível deve ser apresentado por adesão ao processo criminal, por força da norma do art.º 71º do Código de Processo Penal (CPP).
Sem conceder, mais  pugnou por que fosse julgada parte ilegítima, porque o comportamento imputado à 1ª Ré não se prendeu com o exercício da advocacia.
A Autora respondeu a 30.11.2023, em suma e no que tange à exceção de incompetência territorial, nos seguintes termos:
1) O pedido de indemnização civil deduzido pela Autora não se funda na prática de um crime – ainda que a atuação da Primeira Ré constitua igualmente um ilícito penal – mas sim no incumprimento do contrato de mandato forense e na violação dos deveres deontológicos a que a Primeira Ré estava adstrita, porquanto a Primeira Ré, na qualidade de advogada, e dentro do espírito de confiança que transmitia à Autora, induziu-a em erro/engano relativamente a situações que eram do seu conhecimento e à forma de as solucionar, determinando-a à entrega de avultadas quantias que a Autora estava convicta destinarem-se a honorários de serviços prestados e ao pagamento de despesas e encargos inerentes aos vários serviços prestados pela 1ª Ré;
2) Concretamente, com a sua conduta, a 1ª Ré violou o princípio da confiança e da lealdade, consagrado no artigo 97º do Estatuto da Ordem dos Advogados, bem assim o dever de agir de forma a defender os interesses legítimos da Autora, enquanto sua Cliente, e bem assim incumpriu o dever específico prescrito no art.º   101º, nº1 do EOA de dar a aplicação devida aos valores que lhe foram entregues pela Autora.
Foi prolatada Sentença a 12.01.2024 que concluiu com a seguinte Decisão:
“Julga-se este Tribunal incompetente, em razão da matéria, para conhecer da presente ação e, em consequência, absolvem-se os réus da instância.
Fixa-se à ação o valor indicado na p.i..
Custas pela autora.”
Em fundamento do assim decidido, foi aí consignado que “o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime – com o é o caso dos presentes autos - é deduzido no processo penal respetivo [processo-crime que corre termos sob o n.º, só o podendo ser em separado, perante o Tribunal civil, nos casos previstos na lei, como dispõe o artigo 71.º do Código de Processo Penal”.
A Sentença foi notificada à recorrente por carta expedida a 19.01.2024.
É desta decisão que vem interposto recurso por parte da Autora, a qual apresentou as suas Alegações, tudo datado de 09.02.2024, terminando a Recorrente pelo seguinte pedido:
“Nestes Termos, e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser julgado totalmente procedente, por provado, o presente recurso e em consequência, ser declarada a competência material do Tribunal, [prosseguindo] o processo os termos subsequentes.”
São estas as Conclusões:
“1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida a fls. dos autos, que decidiu julgar “este Tribunal incompetente, em razão da matéria, para conhecer da presente acção e, em consequência, absolvem-se os réus da instância.”
2. A Recorrente não se conforma com a decisão proferida, porquanto o Tribunal a quo fez uma errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 71º do Código de Processo Penal, ao entender que a Autora tinha, obrigatoriamente, que deduzir o pedido de indemnização civil no processo-crime, concluindo, por isso, que o Tribunal era incompetente, em razão da matéria.
3. O Tribunal a quo desconsiderou os fundamentos alegados pela Recorrente, em sede de contraditório, dos quais decorre inequivocamente a competência material do Tribunal.
4. Como decorre da factualidade descrita na alínea a), o pedido de indemnização deduzido pela Autora funda-se no incumprimento do contrato de mandato forense e na violação dos deveres deontológicos a que a Primeira Ré estava adstrita.
5. Foi no âmbito dessa relação contratual existente que a Primeira Ré, na qualidade de advogada, e dentro do espírito de confiança que transmitia à Autora, induziu-a em erro/engano relativamente a situações que eram do seu conhecimento e à forma de as solucionar, determinando-a à entrega de avultadas quantias que a Recorrente estava convicta destinarem-se a honorários de serviços prestados e ao pagamento de despesas e encargos inerentes aos vários serviços prestados.
6. Resulta inequívoco que a Primeira Ré violou, além dos referidos princípios gerais que regem a profissão de advogado, o princípio da confiança e lealdade, consagrado no artigo 97º do Estatuto da Ordem dos Advogados, violando de forma indiscutível o dever de agir de forma a defender os interesses legítimos da Autora, enquanto sua Cliente, e bem assim incumpriu o dever específico prescrito no art.º   101º, nº1 do EOA de dar a aplicação devida aos valores que lhe foram entregues pela Autora.
7. Deste modo, a causa de pedir da ação em apreço é a violação, por parte a Primeira Ré, dos seus deveres profissionais e deontológicos, decorrente do contrato de mandato celebrado com a Autora, pelo que estamos no campo da responsabilidade civil contratual.
8. Trata-se de um contrato de mandato atípico sujeito ao regime especial do Estatuto da Ordem dos Advogados, sendo-lhe ainda aplicável, a título subsidiário, o regime do contrato de mandato constante dos arts. 1157º a 1184º, do C. Civil, sendo que o regime geral de responsabilidade civil dos advogados apresenta características específicas, impostas, desde logo, pelo interesse público da profissão e do papel do advogado como elemento indispensável na administração da justiça, pelo que os deveres deontológicos deverão integrar a relação contratual.
9. Em consequência, a violação destas normas estabelecidas no Estatuto da Ordem dos Advogados gera a responsabilidade civil do advogado para com o seu cliente, na medida em que a violação de normas deontológicas representa um facto ilícito, pelo que, desde que verificados os demais requisitos da responsabilidade civil, o advogado constitui-se na obrigação de indemnizar os particulares por ele patrocinados.
10. A responsabilidade civil do advogado pela violação das normas deontológicas impostas pelo Estatuto da Ordem dos Advogados, no âmbito da relação advogado- cliente, tem natureza contratual na medida em que tais normas consubstanciam uma série de deveres acessórios que conformam e integram-se na prestação principal emergente do contrato de mandato forense. (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/05/2019, Proc. 14647/14.4T8LSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt.)
11. Por essa razão, não tem aplicação o disposto no artigo 71º do Código de Processo Penal, o qual resulta que o pedido de indemnização civil deduzido em processo penal apenas pode ter como fonte a responsabilidade civil extracontratual fundada no facto ilícito criminal, estando, assim, excluída a responsabilidade civil contratual (Assento do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/99, publicado no Diário da República n.º 179/99, SÉRIE I-A, de 1999-08-03).
12. Deste modo, assentando o pedido de indemnização civil contra as Rés na existência de um contrato de mandato e na violação dos respetivos deveres deontológicos, não tem aplicação o princípio de adesão consagrado no artigo 71º do Código de Processo Civil, não se verificando qualquer incompetência do tribunal em razão da matéria.
13. O Tribunal a quo, ao decidir, fez uma errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 71º do CPP e, em consequência, dos artigos 96º, alínea a), 278º, n.º 1, alínea a), 576º, n.º 1 e 2 e 577º, alínea a), todos do Código de Processo Civil.”
A seguradora apresentou Contra-Alegações a 11.03.2024, nas quais apresenta as seguintes Conclusões:
1. O recurso de apelação vem interposto da douta sentença proferida a fls.___, da ação de processo comum n.º, que correu termos junto do douto Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte, Juízo Central Cível de Loures, a qual veio a julgar procedente a exceção dilatória de incompetência do Tribunal, em razão da matéria, deduzida pela Ré, para conhecer dos pedidos da Autora, absolvendo a ora Ré da instância.
2. Em suma, entendeu o Tribunal a quo que “Alegando e imputando à ré DT factualidade de natureza criminal, relativamente à qual, aliás, apresentou a competente queixa-crime, por um lado e, por outro, incumprindo o ónus que lhe incumbia, de alegar a aplicabilidade de uma das situações previstas no artigo 72.º do Código de Processo Penal, tem de se concluir que a autora tem a obrigatoriedade de deduzir o presente pedido cível no processo-crime que corre termos sob o n.º, não sendo este Tribunal competente, em razão da matéria, para apreciar o mesmo”.
3. É este o segmento decisório com que a Autora/Recorrente não se conforma, pretendendo que a sentença proferida seja revogada e substituída por outra que reconheça a competência do Tribunal em razão da matéria objeto de discussão nos presentes autos. Pretensão que, atendendo aos factos carreados para os autos e a própria configuração da causa de pedir, conjugados com as coordenadas legais, só poderá vir a naufragar em toda a sua linha.
4. Ora, desde logo refira-se que a apresentação das doutas contra-alegações de recurso se afigura tempestiva, por se encontrar enquadrada no prazo de 30 dias concedido pelos artigos 638.º e 644.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil – neste sentido, cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21.02.2019 e o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12.01.2023, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
5. Veio a A. nos presentes autos sustentar, em síntese, que mandatou a Ré advogada para apurar concretamente qual a situação do património da herança sua avó, já falecida em 1980, promovendo as diligências necessárias para atualizar as respetivas cadernetas e registos prediais.
6. Para tanto, alega que, entre os anos de 2016 e 2021, pagou à Ré Advogada a quantia de € 139.804,34 (cento e trinta e nove mil oitocentos e quatro euros e trinta e quatro cêntimos), relativamente a alegados serviços que a R. não prestou e a encargos “inventados”, bem como a diligências que, no entender da Autora, não existem no ordenamento jurídico português.
7. Em face do exposto, conclui a A. que a R. Advogada “(…) atuou de forma dolosa, induzindo a autora, conscientemente, em erro/engano, determinando-a à entrega das referidas quantias, que integrou ilegitimamente no seu património, tudo mediante expedientes fraudulentos, configurando as suas condutas ilícitos penais, designadamente, o crime de burla qualificada, na forma continuada, previsto e punível no artigo 217.º, n.º 1, 218.º, n.º 1 e n.º 2, alínea a), por referência ao artigo 202.º, alínea b), todos do Código Penal (artigos 466.º a 478.º da p.i.);”.
8. Em face do exposto, a Autora/Recorrente entende que o Tribunal a quo fez uma errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 71.º do Código de Processo Penal, na medida em que entendeu que a Autora tinha, obrigatoriamente, de ter deduzido o pedido de indemnização civil no processo-crime.
9. Contrariamente ao alegado pela Recorrente nas suas doutas alegações de recurso, a pretensão indemnizatória prosseguida com a entrada da presente ação encontra o seu fundamento numa conduta alegadamente ilícita e culposa praticada pela 1.ª Ré, DT, consubstanciada na (pretensa) apropriação ilícita e/ou ilegítima de diversas quantias monetárias que descreve nos autos – e que totalizam o montante de € 149.804,34 – peticionadas pela A. a título de (presumíveis) danos/prejuízos patrimoniais e não patrimoniais sofridos.
10. As condutas imputadas à R. Advogada e descritas pela Recorrente relativamente às quais a Recorrente terá apresentado, inclusivamente, queixa-crime (a qual corre termos sob o n.º, configuram, em si, ilícitos criminais previstos e punidos nos artigos 217.º, n.º 1, 218.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), por referência ao artigo 202.º, alínea b), todos do Código Penal.
11. Ora, conforme decorre do artigo 71.º do Código de Processo Penal, que se refere ao princípio de adesão, o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime deverá, regra geral, ser deduzido no processo penal respectivo.
12. No entanto, prevê o artigo 72.º que, caso a extensão dos danos, à data da acusação, não sejam totalmente conhecidos, o pedido de indemnização civil poderá ser deduzido em separado, junto dos Tribunais comuns.
13. Atenta a natureza criminal da factualidade alegada nos autos (causa de pedir) e imputada à R. Advogada pela Autora, conforme estipula o artigo 71.º do Código de Processo Penal, é obrigatória a dedução do pedido de indemnização cível decorrente dos comportamentos alegados no competente processo-crime – o qual corre termos sob o n.º.
14. Dado que a competência em razão da matéria do Tribunal se afere através dos termos em que a ação se apresenta configurada pela Autora, haverá que concluir que o Tribunal Criminal é competente em razão da matéria para apreciar o pedido de indemnização civil, enxertado no processo penal, nos termos conjugados dos artigos 71.º e 72.º do Código de Processo Penal.
15. Veja-se que na presente situação, a Autora pretende fazer-se valer de um direito a uma indemnização por danos ocasionados pela prática de um crime. Ou seja, no fundo, e contrariamente ao alegado pela Autora, a mesma arroga-se titular do direito a ser ressarcida pelos danos sofridos decorrentes da prática de um crime, ao abrigo da responsabilidade civil por factos ilícitos. Deste modo, e sempre que a indemnização peticionada emerge de danos ocasionados pela prática de um crime, sendo esta a configuração original da causa de pedir e pedido, o Tribunal Criminal, por força do princípio da adesão previsto no art.º   71.º do Código de Processo Penal, tem uma competência, por conexão, para conhecer deste pedido de indemnização civil.
16. De acordo com tudo quanto supra se expôs, não se encontrando preenchidos, por nem terem sido sequer demonstrados ou alegados, os pressupostos inerentes à possibilidade de dedução em separado do pedido de indemnização civil perante o tribunal civil, não resta senão concluir que a douta sentença recorrida não merece qualquer censura, por ter feito correta aplicação do direito aplicável ao caso concreto, devendo proceder a invocada exceção dilatória de incompetência absoluta (em razão da matéria) do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte – Juízo Central Cível de Loures, o que obsta ao conhecimento do mérito e determina a absolvição da instância da ora Ré.
17. Por mera cautela de patrocínio, cabe ainda referir que, os contratos de seguro celebrados pela Ordem dos Advogados apenas garantem os danos decorrentes do exercício da advocacia, que sejam passíveis de ser indemnizados à luz das normas legais previstas para a responsabilização civil.
18. A situação jurídica em apreço nos presentes autos, tal como se encontra delineada pela A., designadamente no que diz respeito à restituição do montante de €139.804,34, assenta precisamente num (pretenso) enriquecimento sem causa do património da 1.ª Ré, e bem assim num consequente (e presumível) empobrecimento do património da Autora.
19. De modo que, a admitir-se a verificação de qualquer actuação ilícita por parte da 1.ª Ré advogada, Dra. DT, nos termos descritos nos autos pela A., esta extrapola (manifestamente) o mandato forense, o seu âmbito, as suas atribuições e poderes, e o exercício da advocacia.
20. Não podendo a ora contestante Seguradora ser responsabilizada, por via do contrato de seguro celebrado com a Ordem dos Advogados, por uma atuação da 1.ª Ré que extrapola em larga medida até o exercício da advocacia, por falta de enquadramento nos riscos cobertos pelos contratos de seguro celebrados entre si a Ordem dos Advogados.
21. Acresce que, não obstante a sua natureza ou caráter “claims made”, a presente apólice só garante os sinistros cuja primeira reclamação seja efetuada durante a vigência da apólice, desde que os factos ou circunstâncias passíveis de gerar a responsabilização civil do segurado, não sejam pelo mesmo conhecidas (pré-conhecidas) em data anterior à data de início do período seguro (alínea a) do artigo 3.º das Condições Especiais da apólice.
22. Ora, à data de início do contrato de seguro celebrado entre a Ordem dos Advogados e a ora contestante (01.01.2018), a Ré Advogada, Dra. DT, tinha já conhecimento dos factos que, potencialmente, poderiam vir a gerar a sua responsabilização, posta em crise nos autos pela Autora.
23. Pelo que, ainda assim, a R sempre terá, em todo e qualquer caso, de ser absolvida de todos os pedidos contra si formulados, também por esta via, ao abrigo do disposto no artigo 576.º, n.º 3 do Código de Processo Civil.
24. Assim, por tudo quanto se encontra exposto, e ressalvando o devido respeito por melhor e douta opinião de V. Exas., deverão improceder todas as conclusões da Recorrente, não merecendo a douta Sentença recorrida qualquer censura.
A Autora respondeu à ampliação do recurso a 28.03.2024, pugnando por que sejam julgadas extemporâneas as contra-alegações e o pedido de ampliação do recurso, em conformidade com o disposto no artigo art.º  638º nº 1 e n.º 5, 644º, nº 2, alínea b) e 636º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil.
Caso assim não se entenda,
Não deve ser admitida a ampliação do recurso, por não estarem preenchidos os pressupostos consagrados no artigo 636º, n.º 1 do CPC.
Mesmo que assim não se entenda,
Sempre deverá, a ampliação pretendida pela Recorrida, ser julgada totalmente improcedente.
As conclusões foram as seguintes:
I. As contra-alegações e o respetivo pedido de ampliação do recurso, inserto naquelas, são manifestamente extemporâneos, não sendo procedente a argumentação expedida pela Requerida em sede de questão prévia (da tempestividade das contra-alegações de recurso).
II. Em face do objeto do recurso e da questão a apreciar no mesmo, não existem quaisquer dúvidas de que o que está em causa é saber se se verifica a exceção dilatória de incompetência material do Tribunal a quo que declarou ser absolutamente incompetente, em razão da matéria, para tramitação e conhecimento dos pedidos deduzidos nos autos.
III. Decorre expressamente do artigo 638º, n.º 1 conjugado com o artigo 644º, n.º 2, alínea b) ambos do CPC que o prazo para a interposição de recurso é de 15 dias.
IV. Se bem atentarmos na redação do nº 2 do citado art.º  644º do Código de Processo Civil aí não se faz qualquer referência a decisões que ponham ou não termo ao processo, ao invés do que consta do nº 1 als. a) e b) do mesmo preceito legal, pelo que interpretação distinta viola gravemente a função orientadora das normas jurídicas e a concomitante segurança jurídica.
V. Tal entendimento compagina-se, nomeadamente, com a posição exarada nos Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 30/05/2018 (Processo nº 19903/16.4T8PRT-A.P1), de 17/02/2014 (Processo n.º 367/12.8TVPRT-A.P1) e de 04/04/2022 (Proc. 20371/19.4T8PRT-A.P1).
VI. Nos termos do artigo 638º, n.º 5 do CPC, as contra-alegações devem ser apresentadas no mesmo prazo, de 15 dias, e o requerimento de ampliação do pedido, em conformidade com o previsto no artigo 636º, é efetuado na respetiva alegação, logo, no mesmo prazo, a contar da data de notificação das Alegações apresentadas pela Recorrente (05/02/2024), o qual terminou no dia 23/02/2024.
VII. Tendo a Recorrida apresentado as suas alegações em 11/03/2024, são as mesmas extemporâneas, pelo que é igualmente extemporâneo o requerimento de ampliação do recurso, que não pode, por essa razão, ser conhecido.
VIII. Não estão verificados os requisitos que permitam a ampliação do recurso, nos termos peticionados pela Recorrida, pois para além do despacho julgando procedente a exceção dilatória de incompetência do Tribunal, nada mais foi conhecido pelo Tribunal de 1ª Instância, não se tendo pronunciado sobre nenhum outro fundamento da ação ou da defesa.
IX. Não foi feita qualquer instrução no processo, nem foi discutida qualquer factualidade invocada pelas partes, pelo que não se encontram por isso provados quaisquer factos.
X. Não pode o Tribunal da Relação conhecer de questões que, em rigor, nunca foram submetidas ao crivo decisório da instância, pois os recursos são meros meios de consequente alteração e/ou revogação.
XI. A procedência do recurso da Recorrente, como se espera, determinará o normal prosseguimento dos autos na Primeira Instância, para instrução do processo e subsequente julgamento.
XII. Os pedidos deduzidos pela Recorrida têm necessariamente de improceder, na medida em que não se encontra assente a factualidade essencial para aplicação das soluções jurídicas preconizadas pela Recorrida.
XIII. Ao contrário do que pretende fazer crer a Recorrida estão em causa atos próprios de advogados e todos os pagamentos efetuados pela Recorrente, como resulta da factualidade alegada nos autos, foram-no na firme convicção de que se destinavam, efetivamente, à prática de tais atos próprios de advogados, expressamente identificados e esclarecidos pela Recorrente.
XIV. Todas as quantias entregues se destinavam, na convicção da Recorrente, à realização de atos próprios de advogados, ou destinando-se a pagamento de honorários ou com vista a fazer face a despesas necessárias, pelo que naturalmente a sua receção por parte da 1ª Ré, constitui um ato próprio de advogado.
XV. É destituída de qualquer fundamento a referência ao instituto do enriquecimento sem causa, porquanto, como é sobejamente sabido, este tem uma aplicação meramente subsidiária a que se lança mão apenas quando a lei não faculta ao empobrecido outros meios de reação, o que não se verifica, pois estando em causa o incumprimento do mandato forense, com a violação das respetivas obrigações deontológicas, situamo-nos, inequivocamente, no campo da responsabilidade civil contratual.
XVI. Não se encontra assente a factualidade que permita uma qualquer decisão sobre a aplicação da cláusula 3ª das condições especiais da apólice de seguro em causa, na medida em que não se encontra provada a data da celebração do contrato de Recorrente.
XVII. Acresce que, em todo o caso, sempre terá de soçobrar a pretensão almejada pela Recorrida, uma vez que a exclusão da cobertura invocada não é oponível à Recorrente.
XVIII. Estamos perante um contrato de seguro de grupo obrigatório, previsto no artigo 104º, n.º 3 do Estatuto da Ordem dos Advogados, de que beneficiam todos os advogados inscritos e representados pela Ordem dos Advogados, que não só protege o advogado dos riscos em que pode incorrer no exercício da sua atividade, como garante a proteção do cliente contra a falta de zelo do seu advogado no cumprimento do mandato forense, conforme resulta do artigo 2º das condições especiais da apólice de seguro.
XIX. Trata-se de uma apólice de reclamação (“claims made”), que condiciona o pagamento da indemnização à apresentação da queixa de terceiros durante o prazo de validade (vigência) do contrato e que possibilita a extensão da cobertura por um determinado período anterior ao início do contrato, pelo que o evento relevante para o acionamento do contrato durante a sua vigência, é a reclamação e não o facto gerador do dano que está na sua base. (Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 09/11/2017 - Proc. 9108/16.0T8PRT-A.P1)
XX. O disposto no artigo 3º, al. a) das Condições Particulares, relativo à exclusão da cobertura, tem de ser conjugado com o disposto no artigo 101º, n.º 4 da Lei do Contrato de Seguro, do qual resulta que as cláusulas de redução ou de exclusão fundadas no incumprimento pelo segurado dos deveres de participação do sinistro à seguradora, não são oponíveis aos lesados – norma imperativa que visa a salvaguarda do interesse público de conferir uma especial proteção aos lesados no âmbito dos seguros obrigatórios de responsabilidade civil.
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Questões a Decidir
São as Conclusões da Recorrente que, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, delimitam objetivamente a esfera de atuação do tribunal ad quem (exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial, como refere, Abrantes Geraldes[1]), sendo certo que, tal limitação, já não abarca o que concerne às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (artigo 5.º, n.º 3, do Código de Processo Civil), aqui se incluindo qualificação jurídica e/ou a apreciação de questões de conhecimento oficioso.
In casu, e na decorrência das Conclusões da Recorrente, destaca-se:
1) A decisão de incompetência do tribunal em razão da matéria e, por conseguinte, de absolvição do réu da instância, pondo termo à ação em 1ª instância, subsume-se à alínea a) do n.º 1 ou à alínea b) do n.º 2 ambos do art.º 644º do CPC?
2) O princípio da adesão previsto na norma do art.º 71º do Código de Processo Penal (CPP) e a causa de pedir subjacente – responsabilidade extracontratual e contratual ou apenas a primeira delas?
3) As exceções ao princípio da adesão previstas no art.º 72º do CPP.
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Corridos que se mostram os Vistos, cumpre decidir.
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1) A decisão de incompetência do tribunal em razão da matéria e, por conseguinte, de absolvição do réu da instância, pondo termo à ação em 1ª instância, subsume-se à alínea a) do n.º 1 ou à alínea b) do n.º 2 ambos do art.º 644º do CPC?
Em sede de contra-alegações, a Ré seguradora suscitou a tempestividade das suas contra-alegações de recurso, pugnando por que assim o tribunal o considere, por entender que a sentença de 12 de janeiro de 2024 , para efeitos de recurso, se subsume à norma do art.º   644º n.º 1 a) do CPC, por contraposição à da alínea b) do n.º 2.
Em síntese, argumenta a este respeito:
 - Trata-se de uma decisão que põe termo à causa, pelo que goza do prazo de 30 dias tal como configurado no artigo 638.º, n.º 1, do referido diploma legal;
- As decisões subjacentes ao n.º 2 do art.º 644º são interlocutórias.
De acordo com a norma do art.º   277º do CPC, configura uma decisão de extinção da instância, além do mais, a que declara a absolvição da instância[2].
Existe previsão legal específica para o caso da “decisão que aprecie a competência absoluta do tribunal” (art.º   644º n.º 2 b) do CPC).
Como a própria Autora adianta, há diferentes entendimentos doutrinais e jurisprudenciais quanto à interpretação da norma do art.º 644º nº 2 al. b) do CPC) - uns defendem que o prazo de 15 dias se reporta à generalidade das decisões que apreciem a competência absoluta do tribunal[3] e outros defendem que se restringe às decisões que não põem fim ao processo -, prevalecendo o prazo geral de 30 dias nas decisões que ponham termo ao processo.
Desde já se adianta que propendemos para este último sentido, porquanto, na dúvida, mais facilitador da interposição recursal.
Acresce que, “para a admissibilidade da apelação é indiferente que a decisão seja no sentido da afirmação da competência absoluta do tribunal ou da sua negação”.[4]
“Quanto ao prazo de interposição do recurso, (…) nos casos em que a decisão ponha termo ao processo, isto é, quando seja julgada procedente a exceção de incompetência absoluta, com (…) absolvição total da instância, deve prevalecer o prazo normal de 30 dias, nos termos dos arts. 638º, n.º 1 e 644º, n.º 1, al. a)”.[5]
Logo, o prazo aplicável para as alegações e contra-alegações de recurso, tal como o tribunal a quo enunciou, é de 30 dias.
Conclui-se, pois, pela tempestividade respetiva no caso dos autos.
Fundamentação de Facto (de acordo com a configuração vertida na petição inicial)[6]
A)
Nos finais do ano de 2015, a Autora contatou a Primeira Ré, para que, na qualidade de advogada, pudesse apurar concretamente qual a situação do património da herança da sua avó Ana da Piedade Nunes, já falecida em 1980, promovendo todas as diligências necessárias para atualizar as respetivas cadernetas e registos dos prédios (artigo 3.º da p. i.).
B)
A Primeira Ré era, há vários anos, advogada da mãe e das tias da Autora, tendo tratado de inúmeros assuntos relativos aos prédios das mesmas, pelo que havia uma relação de confiança já estabelecida com a mesma (artigo 6.º da p. i.).
C)
A Autora, totalmente ignorante sobre o panorama jurídico e fiscal português, confiava plenamente na Primeira Ré, e, ao longo dos anos, criaram-se laços de grande proximidade e amizade entre ambas (artigo 9.º da p. i.).
D)
Por essa razão, a Autora transferia de imediato para a Primeira Ré todas as quantias que esta solicitava e indicava como necessárias com vista a promover as diligências imprescindíveis para regularizar a situação de todos os imóveis (artigo 10.º).
E)
No início de 2021, estranhando o facto de já ter transferido para Primeira Ré cerca de €140.000,00 (cento e quarenta mil euros), sem que lhe tenha sido entregue qualquer documentação, a Autora começou a insistir com Primeira Ré para lhe enviar toda a documentação relativamente a todos os assuntos tratados (artigo 11.º da p. i.).
F)
Apesar de a Primeira Ré responder sempre que o faria, o certo é que ia dando desculpas para não o fazer e, em Junho de 2021, encontrando-se a Autora em Portugal, nunca foi possível o encontro com a Primeira Ré, a qual se desculpava com a pandemia e com a doença dos pais (artigo 12.º da p. i.).
G)
A Autora começou, então, a desconfiar que algo se passava, pelo que contactou outro advogado com vista a apurar qual a situação concreta dos seus prédios, bem como dos prédios que pertenciam às supra referidas heranças (artigo 13.º da p. i.).
H)
Relatando ao seu novo mandatário os diversos serviços que lhe haviam sido cobrados pela Primeira Ré, a Autora veio, então, a tomar conhecimento que lhe haviam sido solicitados pagamentos para a prestação de diligências que não existiam, nem existem, no ordenamento jurídico português, bem como veio a tomar conhecimento que nenhum dos serviços havia sido efetivamente prestado pela Primeira Ré (artigo 14.º da p. i.).
I)
A Autora tomou, então, conhecimento que a Primeira Ré, aproveitando-se da relação de confiança, e até de amizade, que estabeleceu com aquela, fez-se pagar por encargos processuais que a própria inventou e cobrou honorários relativamente a serviços que fingiu prestar (artigo 15.º da p. i.).
J)
Entre os anos de 2016 e 2021, a Autora pagou à Primeira Ré a quantia de €139.804,34 (cento e trinta e nove mil oitocentos e quatro euros e trinta e quatro cêntimos), relativamente a serviços que esta não prestou e a encargos inventados, bem como para diligências que não existem no ordenamento jurídico português[7] (artigo 16.º da p. i.).
K)
Uma vez que os valores entregues pela autora à ré DT não se destinaram ao pagamento de qualquer tipo de encargos ou despesas, a Denunciada integrou os valores entregues pela Autora no seu património (artigo 463.º da p. i.).
L)
A ré DT atuou de forma dolosa, induzindo a autora, conscientemente, em erro/engano, determinando-a à entrega das referidas quantias, que integrou ilegitimamente no seu património, tudo mediante expedientes fraudulentos, configurando as suas condutas ilícitos penais, designadamente, o crime de burla qualificada, na forma continuada, previsto e punível no artigo 217.º, n.º 1, 218.º, n.º 1 e n.º 2, alínea a), por referência ao artigo 202.º, alínea b), todos do Código Penal (artigos 466.º a 478.º da p. i.).
M)
A Primeira Ré atuado no âmbito das suas funções profissionais de advogada, a Autora apresentou a respetiva denuncia junto do Conselho de Deontologia de Lisboa da Ordem dos Advogados (artigo 464.º da p. i.).
N)
Apresentou a competente queixa-crime contra a Primeira Ré, junto do DIAP de Alenquer, a qual corre termos sob o n.º 178/22.2T9ALQ (artigo 465.º da p. i.).
O)
A Primeira Ré praticou diversos crimes, designadamente o de burla qualificada, na forma continuada, previsto e punível no artigo 217º, n.º 1, 218º, n.º 1 e n.º 2, alínea a), por referência ao artigo 202º, alínea b), todos do Código Penal
*
Fundamentação de Direito
2) O princípio da adesão previsto na norma do art.º 71º do Código de Processo Penal (CPP) e a causa de pedir subjacente – responsabilidade extracontratual e contratual ou apenas a primeira delas?
A Autora, notificada para exercer o princípio do contraditório relativamente à exceção de incompetência em razão da matéria, sempre respondeu que o pedido de indemnização civil por si deduzido «não se funda na prática de um crime – ainda que a atuação da Primeira Ré constitua igualmente um ilícito penal – mas sim no incumprimento do contrato de mandato forense e na violação dos deveres deontológicos a que a Primeira Ré estava adstrita», uma vez que «na qualidade de advogada, e dentro do espírito de confiança que transmitia à Autora, induziu-a em erro/engano relativamente a situações que eram do seu conhecimento e à forma de as solucionar, determinando-a à entrega de avultadas quantias que a Autora estava convicta destinarem-se a honorários de serviços prestados e ao pagamento de despesas e encargos inerentes aos vários serviços prestados pela 1ª Ré», assim violando, «além dos referidos princípios gerais que regem a profissão de advogado, o princípio da confiança e lealdade, consagrado no artigo 97º do Estatuto da Ordem dos Advogados, violando de forma indiscutível o dever de agir de forma a defender os interesses legítimos da Autora, enquanto sua Cliente, e bem assim incumpriu o dever específico prescrito no art.º 101º, nº1 do EOA de dar a aplicação devida aos valores que lhe foram entregues pela Autora».
Vejamos.
Nos termos do art.º 71º do Código de Processo Penal (CPP), “o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei.”
Ou seja, “no pedido de indemnização civil deduzido ao abrigo da previsão normativa do artigo 71.º do CPP, a causa de pedir é constituída pelos factos constitutivos da prática de um crime [pois que] os factos geradores da responsabilidade civil e os que justificam a responsabilidade criminal são necessariamente coincidentes.”[8]
Assim se sumariou no acórdão do STJ de 12-06-1997[9]:
“I - A competência em razão da matéria do tribunal cível é residual, na medida em que lhe compete preparar e julgar as acções de natureza cível que não estejam atribuídas a outros tribunais - art.ºs: 56 da Lei 38/87, de 29-12, e 66 e 67 do CPC.
II - Face ao disposto no art.º 71 do CPP, consagrando o princípio da adesão, o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei.
III - Ora, não tendo o processo penal instaurado conduzido à acusação dentro de oito meses, a contar da notícia do crime, e não dependendo o procedimento criminal de queixa, é competente em razão da matéria, para conhecer da acção, a que corresponde processo sumaríssimo, o tribunal de pequena instância cível - art.ºs: 72, n.º 1, a) e c), do CPP, 462, n.º 1, do CPC e 77 da Lei 38/87, de 29-12.”
Ou seja, “o artigo 71.º do CPP impõe que o pedido de indemnização cível fundado na prática de um crime seja deduzido no processo penal e o artigo 72.º do mesmo código prevê exceções a este princípio, respeitantes a situações em que por razões não imputáveis ao lesado a responsabilidade civil do arguido não foi apreciada (alíneas b) e e)), ou a tramitação processual civil é mais adequada do que a processual penal (alíneas g) e h)), ou a demora do processo penal põe em crise o interesse do lesado num rápido ressarcimento (alínea a)), ou há superveniência de danos (alínea d)), ou o litígio respeita igualmente a terceiros que não o arguido e o lesado/ofendido (alínea f)), ou o lesado não foi devidamente informado da possibilidade/ónus de deduzir o pedido civil no processo penal ou notificado para o fazer (alínea i)).”[10]
A Autora/recorrente não alegou o preenchimento de qualquer das hipóteses enunciadas no n.º 1 do art.º 72º do CPP, pelo que, para efeitos da presente decisão, até se poderia concluir que nada releva, in casu. [11]
Com efeito, “face ao princípio da adesão, pretendendo o autor deduzir em separado pedido de indemnização cível por factos que constituem ilícito criminal, nos termos do artigo 342º do CC, cabe-lhe o ónus de alegar e provar a existência de alguma das excepções do artigo 72º nº1.”[12]
Nessa decorrência, têm-se repetido os arestos onde se ajuíza que “o princípio da adesão previsto no art.º 71.º CPP comporta uma regra de fixação de competência material em matéria de pedido de indemnização fundado em crime. A violação deste preceito não é sancionada com a caducidade do direito do lesado que vem a recorrer à ação cível, mas com a exceção de incompetência material do tribunal cível.[13]

Ora, a prática de um crime, para além de ofender bens jurídico-criminais, pode lesar direitos civis, patrimoniais e não patrimoniais, merecedores de tutela jurídica.
No nosso sistema jurídico, a responsabilidade civil é tutelada numa base de interdependência processual civil e processual penal.[14]
Na origem de tal interdependência, estão razões práticas de economia processual, atenta a natureza complexa do facto material que dá origem a ambas as ações. Tanto assim é que o tribunal criminal deverá decidir sobre os danos originados pelo mesmo facto, ainda que sobrevenha decisão absolutória os pressupostos penais.[15]
Nesta senda, há quem entenda que “a inclusão da reparação dos danos no âmbito do processo penal traz consigo um conjunto de vantagens: em geral, facilita a obtenção da reparação dos danos sofridos pela vítima: a possibilidade de diminuição da pena em consequência da reparação do dano confere incentivos ao autor do facto para realizá-la; sobretudo propicia ao delinquente a via mais ajustada para a sua reintegração através da reparação do “mal” cometido, aproximando-o do Direito, atingindo os fins da pena; e, finalmente, facilita a aproximação de uma maior eficiência na administração da justiça. Se o agente do delito, com a reparação dos danos que provocou, percorre parte importante do caminho desejado pela pena, a cominação desta, implicaria uma dosimetria menor e mais adequada.”[16]
Porém – o que releva diretamente no caso vertente – “o pedido de indemnização que pode ser apreciado no âmbito de um processo penal é o que se funda, exclusivamente, em responsabilidade extracontratual por facto ilícito e, já não, a que, designadamente, decorrer de responsabilidade contratual.”[17]
Aliás, de acordo com jurisprudência fixada em acórdão de fixação de jurisprudência, “se em processo penal for deduzido pedido cível, tendo o mesmo por fundamento um facto ilícito criminal, verificando-se o caso previsto no artigo 377º, nº 1, do Código de Processo Penal, ou seja, a absolvição do arguido, este só poderá ser condenado em indemnização civil, se o pedido se fundar em responsabilidade extracontratual ou aquiliana, com exclusão da responsabilidade civil contratual.”[18]
É só responsabilidade extracontratual (responsabilidade fundada na prática de um crime), ou seja, fundada estritamente na norma do art.º   483º e ss. do Código Civil (CC), ficando, de fora, institutos conexos, como sejam a responsabilidade civil contratual(responsabilidade fundada em incumprimento contratual) ou o enriquecimento sem causa.[19]
Regressemos aos autos.
A Autora respondeu a 30.11.2023, em suma e no que tange à exceção de incompetência material, nos seguintes termos:
1) o pedido de indemnização civil deduzido pela Autora não se funda na prática de um crime – ainda que a atuação da Primeira Ré constitua igualmente um ilícito penal – mas sim no incumprimento do contrato de mandato forense e na violação dos deveres deontológicos a que a Primeira Ré estava adstrita, porquanto a Primeira Ré, na qualidade de advogada, e dentro do espírito de confiança que transmitia à Autora, induziu-a em erro/engano relativamente a situações que eram do seu conhecimento e à forma de as solucionar, determinando-a à entrega de avultadas quantias que a Autora estava convicta destinarem-se a honorários de serviços prestados e ao pagamento de despesas e encargos inerentes aos vários serviços prestados pela 1ª Ré;
2) concretamente, com a sua conduta, a 1ª Ré violou o princípio da confiança e da lealdade, consagrado no artigo 97º do Estatuto da Ordem dos Advogados, bem assim o dever de agir de forma a defender os interesses legítimos da Autora, enquanto sua Cliente, e bem assim incumpriu o dever específico prescrito no art.º 101º, nº 1 do EOA de dar a aplicação devida aos valores que lhe foram entregues pela Autora.

Contrapôs a Ré seguradora que “a receção de montantes por conta de outrem não constitui um ato próprio de advogado, conforme resulta do artigo 1.º da própria Lei dos Actos Próprios dos Advogados (Lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto):
5 - Sem prejuízo do disposto nas leis de processo, são actos próprios dos advogados e dos solicitadores:
a) O exercício do mandato forense;
b) A consulta jurídica.
6 - São ainda atos próprios dos advogados e dos solicitadores os seguintes:
a) A elaboração de contratos e a prática dos atos preparatórios tendentes à constituição, alteração ou extinção de negócios jurídicos, designadamente os praticados junto de conservatórias e cartórios notariais;
b) A negociação tendente à cobrança de créditos;
c) O exercício do mandato no âmbito de reclamação ou impugnação de atos administrativos ou tributários. (…).”
Diverso é o entendimento da Autora e, de acordo com a configuração de facto em sede de petição inicial, não se compreende como não possa ser considerado «ato próprio de advogado» o que, alegadamente, a 1ª Ré - a mando daquela – lhe transmitia que estava a fazer, a saber, “a prática dos atos preparatórios tendentes à constituição, alteração ou extinção de negócios jurídicos, designadamente os praticados junto de conservatórias e cartórios notariais”.
Ora, sendo alegado e aceite que a 1ª Ré é advogada de profissão – confirmado pela própria Ordem dos Advogados - e tendo a mesma sido mandatada para regularizar a situação matricial e registral de prédios, de acordo com configuração da petição inicial, estava a atuar como mandatária da Autora.
Logo, a responsabilidade por danos patrimoniais e não patrimoniais acionada funda-se no incumprimento do contrato de prestação de serviços jurídicos, especificamente denominado contrato de mandato (art.º   1157º e ss.).
Voltemo-nos, agora, para a Ré seguradora.
A sua demanda é consequentemente também fundada na responsabilidade contratual da 1ª Ré, qual “ocorrência concreta do risco coberto”[20], ao abrigo de contrato de Seguro. Trata-se, pois, de “um contrato bilateral ou sinalagmático e aleatório, sendo-o na medida em que a prestação da seguradora fica dependente de um evento futuro e incerto – um sinistro -, a concretizar o risco coberto.”[21]

Releva, desde logo, a norma do art.º 104º do Estatuto da Ordem dos Advogados:
“1. O advogado com inscrição em vigor deve celebrar e manter um seguro de responsabilidade civil profissional tendo em conta a natureza e âmbito dos riscos inerentes à sua actividade, por um capital de montante não inferior ao que seja fixado pelo conselho geral e que tem como limite mínimo (euro) 250 000, sem prejuízo do regime especialmente aplicável às sociedades de advogados.
2.(…).
3. O disposto no número anterior não se aplica sempre que o advogado não cumpra o estabelecido no n.º 1 ou declare não pretender qualquer limite para a sua responsabilidade civil profissional, caso em que beneficia sempre do seguro de responsabilidade profissional mínima de grupo de (euro) 50.000, de que são titulares todos os advogados portugueses não suspensos.”
Nesse pressuposto, “o seguro de responsabilidade civil a que alude o art.º 104.º do Estatuto da Ordem dos Advogados tem a natureza de seguro obrigatório, sendo do interesse público que a actividade do exercício da advocacia seja acompanhada de um seguro susceptível de proteger essencialmente as pessoas que a ela recorrem, visando em primeiro lugar a protecção destas pessoas enquanto lesados, mas também dos advogados que a praticam. “[22] (sublinhado nosso)
Ou seja, o pressuposto quanto à obrigatoriedade de seguro é, sempre, o estatuto de advogado e a atuação do mesmo nessa qualidade perante o mandante.
Eis porque, de igual modo, “I - O contrato de seguro celebrado entre a Ordem dos Advogados e a seguradora tendo por objecto o risco decorrente de acção ou omissão praticada pelos advogados com inscrição em vigor na Ordem, no exercício da sua profissão, configura um “contrato de seguro de grupo”, em que a Ordem é o tomador de seguro e os advogados são os segurados.
II. A este contrato de seguro é aplicável o Regime Jurídico do Contrato de Seguro (aprovado pelo DL nº 72/2008, de 16.04, alterado pela Lei n.º 147/2015, de 9.09), nomeadamente o artigo 101.º, n.º 4, dispondo que, nos seguros obrigatórios de responsabilidade civil, as cláusulas de redução ou de exclusão fundadas no incumprimento pelo segurado de deveres de participação do sinistro à seguradora são inoponíveis ao lesado.
III. Uma das funções “naturais” do seguro – e, por maioria de razão, do seguro obrigatório imposto a certos profissionais, que, como a do advogado, exercem atividades com risco elevado de produção de danos – é a de assegurar que o lesado não deixará de ser ressarcido, pelo que só em casos muito contados é legítimo a seguradora escusar-se a responder ou limitar a sua responsabilidade perante o lesado.” [23]
Dir-se-ia, pois, que, no caso vertente, de acordo com a versão de facto trazida aos autos pela Autora/recorrente, podendo estar em causa a responsabilidade contratual da 1ª Ré, se justifica o prosseguimento dos presentes autos em primeira instância, sendo revogada a decisão de absolvição das Rés da instância.
Com efeito, “se a Relação expressar um entendimento oposto quanto [à decisão de absolvição das Rés da Instância] deve determinar a baixa do processo para que se conheça do mérito se acaso houver factos controvertidos que devam ser objeto de prova”.[24]
Paralelamente, se for o caso, prossegue o inquérito/processo criminal pelo crime de burla qualificada, na forma continuada, previsto e punível no artigo 217.º, n.º 1, 218.º, n.º 1 e n.º 2, alínea a), por referência ao artigo 202.º, alínea b), todos do Código Penal, ou outra qualificação jurídica.
O busílis da questão, no caso concreto, porém, reside em que se desconhece qual o enquadramento jurídico-criminal dos factos alegadamente denunciados em inquérito.
Aliás, nos autos, nem sequer consta certificada a denúncia criminal, sendo que, em junho de 2022 (apresentação em juízo da petição inicial), já a Autora noticiava a apresentação de queixa criminal.
E isto, não obstante a 12.01.2024 (data da decisão recorrida) terem decorrido mais de 18 meses sobre a denúncia criminal, considerando que a Autora já na petição inicial identificou o inquérito.
Sucede que o dito enquadramento é importante, no caso concreto, pelo facto de o enquadramento jurídico-penal poder vir a ser o de abuso de confiança, previsto e punido no art.º   205º n.ºs 1 e 4 b) do Código Penal, onde está subjacente a qualidade profissional, designadamente, de advogado (1ª Ré).
A assim (poder) ser, redundaria artificial a distinção entre responsabilidade contratual e extracontratual, porquanto o processo criminal teria de conhecer a qualidade profissional do agente apropriativo e sua relevância no caso concreto.
Acresce que a eficácia cível das decisões penais, condenatória (art.º   623º[25] do CPC) e absolutória (art.º   624º[26] do CPC) contribui para a economia processual e harmonia de julgados, pelo que não é sistematicamente despicienda.

3) As exceções ao princípio da adesão previstas no art.º 72º do CPP.
Do que antecede decorre, inevitavelmente, que não poderemos restar indiferentes perante o desconhecimento concreto das exceções ao princípio da adesão previstas na norma do art.º 72º do CPP:
1 - O pedido de indemnização civil pode ser deduzido em separado, perante o tribunal civil, quando:
a) O processo penal não tiver conduzido à acusação dentro de oito meses a contar da notícia do crime, ou estiver sem andamento durante esse lapso de tempo;
b) O processo penal tiver sido arquivado ou suspenso provisoriamente, ou o procedimento se tiver extinguido antes do julgamento;
c) O procedimento depender de queixa ou de acusação particular;
d) Não houver ainda danos ao tempo da acusação, estes não forem conhecidos ou não forem conhecidos em toda a sua extensão;

e) A sentença penal não se tiver pronunciado sobre o pedido de indemnização civil, nos termos do n.º 3 do artigo 82.º;
f) For deduzido contra o arguido e outras pessoas com responsabilidade meramente civil, ou somente contra estas haja sido provocada, nessa acção, a intervenção principal do arguido;
g) O valor do pedido permitir a intervenção civil do tribunal colectivo, devendo o processo penal correr perante tribunal singular;
h) O processo penal correr sob a forma sumária ou sumaríssima;
i) O lesado não tiver sido informado da possibilidade de deduzir o pedido civil no processo penal ou notificado para o fazer, nos termos do n.º 1 do artigo 75.º e do n.º 2 do artigo 77.º

2 - No caso de o procedimento depender de queixa ou de acusação particular, a prévia dedução do pedido perante o tribunal civil pelas pessoas com direito de queixa ou de acusação vale como renúncia a este direito.”
Quanto às alíneas a), b), c), e), f) e i), deverão as mesmas ser certificadas pelo inquérito/processo criminal, sem prejuízo de se estender às demais, se forem, in casu, pertinentes, sendo certo que, inclusive se desconhece qual o enquadramento jurídico-penal enveredado.
 Acresce que “está de há muito consagrado na doutrina e na jurisprudência que os tipos penais de burla contidos no artigo 218º do Código Penal são tipos penais autónomos e qualificados relativamente ao tipo base previsto no artigo 217º. Não se trata, pois, de mera “agravação da pena” como afirma o recorrente - Vide, Almeida e Costa, in “comentário Conimbricense ao Código Penal, Vol. II, em anotação aos artigos 218 e 204º do Código Penal.
Logo, a sua natureza é a de um crime público[27].
Assim, não podemos presumir que a qualificação jurídico-penal corresponde a um crime dependente de queixa, para efeitos da alínea c) do n.º 1 do art.º   72º citado.
Conclui-se, portanto, pela necessidade de, em primeira instância, ser aferida a verificação das diferentes alíneas do n.º 1 do citado art.º 72º do CPP e, em função disso, determinar o prosseguimento dos autos como for de direito.
Anula-se, pois, a decisão de 12.01.2024, nos termos do art.º  662º n.º 2 c) do CPC, sem possibilidade de substituição do tribunal recorrido.
Na verdade, um dos princípios basilares do atual sistema recursório civil é o da garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto.[28]
Na análise de Rui Pinto, ao direito de ação universal, contrapõe-se um direito ao recurso mínimo que cumpra a função de válvula de segurança residual. Concretizando esse direito ao recurso mínimo, afirma que «o direito à verdade material imporá um recurso por erro de facto, não para todas, mas para as situações mais graves e manifestas».[29]
O dever de substituição previsto no art.º   665º nº1, visa, desde logo, conduzir a uma resolução célere do litígio, no pressuposto de que o Tribunal da Relação disponha dos elementos necessários para tal.[30]
 Todavia, a esse valor da celeridade há que contrapor o da garantia do duplo grau de jurisdição em matéria de facto, afigurando-se que este valor é mais garantístico e proeminente para a realização de um processo equitativo, na vertente de um processo que permita, num prazo razoável, a descoberta da verdade material e a prolação de uma decisão ponderada.[31]
Havendo que se sacrificar um dos valores, cremos que deverá ser o da celeridade, tanto mais que a situação em apreço nem contém contornos que demandem particular urgência na sua definição final.
Assim sendo, justifica-se uma interpretação restritiva do art.º 665º nº 1 do CPC, nos termos da qual, em situações como a presente, sem factos aptos à subsunção jurídica, ocorre a anulação da decisão impugnada, ordenando-se ao tribunal a quo que – sendo o caso - a fundamente, garantindo-se efetivamente o duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto.[32]
Note-se que se desconhece o que venha a resultar da certificação do estado do inquérito/processo criminal, bem assim, especificamente, das diferentes alíneas do art.º 72º n.º 1 do CPP, pelo que a primeira instância dever-se-á pronunciar, sendo garantido, assim, o duplo grau de jurisdição em matéria de facto.
Fica prejudicado o conhecimento das demais questões (art.º 608º nº2 do CPC).
Da ampliação do objeto do recurso nos termos do n.º 2 do art.º 636º e 640º, n.º 3 do CPC
A Recorrida seguradora veio requerer, a título subsidiário, a ampliação do âmbito do recurso, ao abrigo do disposto no artigo 636º do C.P.C., o qual, no seu n.º 1, dispõe:
“No caso de pluralidade de fundamentos da ação ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respetiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação.”
Escreve a recorrida que “pode não ser de todo indiferente para si, tendo em vista a manutenção do resultado expresso através da decisão recorrida, o modo como o tribunal a quo fundamentou a decisão, se acaso vierem a ser acolhidos pelo tribunal ad quem questões suscitadas pelo A.. Nesta eventualidade, se porventura fosse vedada ao recorrido a possibilidade de promover a ampliação do objeto do recurso, poderia ver-se definitivamente prejudicado pela resposta que o tribunal ad quem viesse a dar às questões suscitadas pelo A., num momento em que já não teria capacidade para reagir (…)”[33].
Concorda-se, contudo, com a Autora quando argumenta que, na situação sub judice, não estão verificados os requisitos que permitam a ampliação do recurso, nos termos peticionados pela Recorrida.
Ora vejamos.
O Tribunal a quo veio a proferir despacho, julgando procedente a exceção dilatória de incompetência do Tribunal, em razão da matéria, absolvendo a Ré seguradora da instância.
Ou seja, o tribunal a quo não se pronunciou sobre nenhum outro fundamento da ação ou da defesa, para além da competência do tribunal, nem teve ainda lugar a instrução do processo.
Assim, não pode o Tribunal ad quem conhecer de questões que não tenham sido objeto de apreciação na decisão recorrida, ou que sobre os mesmos não tenha incidido instrução em primeira instância, salvo se se poderem considerar provadas.
Tal constitui ilação da natureza dos recursos, enquanto reapreciação de decisões[34].
Escreve a Ré seguradora que “os contratos de seguro celebrados pela Ordem dos Advogados garantem os danos decorrentes do exercício da advocacia, que sejam passíveis de ser indemnizados à luz das normas legais previstas para a responsabilização civil, A atividade segura, ao abrigo do presente contrato de seguro abrange, somente, “(…) o exercício da advocacia, conforme regulado no Estatuto da Ordem dos Advogados.” – cfr. Ponto 5 das Condições Particulares do Seguro de Responsabilidade Civil dos contratos de seguro.
Mas, como a própria Ré seguradora reconhece, a “receção de tais montantes exigiria, in casu, a concessão de poderes especiais para o efeito. Nessa medida, cumpre referir que a Ré desconhece se a A. conferiu à R. Advogada, DT, poderes especiais para o efeito supra aludido.”
Logo, estamos perante matéria controvertida, a apurar, necessariamente, no prosseguimento dos autos em primeira instância.
Nesta medida, é prematura a conclusão da autoria da Ré seguradora, no sentido de que “qualquer actuação ilícita por parte da 1.ª Ré advogada, Dra. DT, nos termos descritos nos autos pela A., esta extrapola (manifestamente) o mandato forense, o seu âmbito, as suas atribuições e poderes, e o exercício da advocacia.”
Como controvertida neste momento é a conclusão acerca da natureza contratual ou extracontratual fundada em responsabilidade civil ou no enriquecimento sem causa da responsabilidade em que a 1ª Ré terá incorrido perante a Autora.
Decorrentemente, mesmo a aferição da legitimidade processual da Ré seguradora está dependente da prova - cujo ónus recai sobre a Autora, como facto constitutivo do direito indemnizatório e restitutório de que se arroga (art.º   342º n.º 1 do Código Civil – CC) – da relação contratual de mandato invocada na petição inicial e mantida ao longo dos autos, até ao momento.
Em suma, apesar do tempo consumido nos autos até ao momento, a verdade é que tudo é controvertido, apenas podendo ser aferido pela primeira instância.
Ora, da prova da existência do referido contrato de mandato decorre a relevância das normas do Estatuto da Ordem dos Advogados relativas ao seguro de responsabilidade civil profissional, assim estando legitimada a intervenção da Ré seguradora.
Acresce a necessidade de os autos retornarem à primeira instância para ser aferida a verificação das diferentes alíneas do n.º 1 do citado art.º 72º do CPP.
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Responsabilidade pelas custas
O recurso foi originado por uma decisão do Tribunal a quo que ora se anula.
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Nos termos do art.º 1.º do Regulamento das Custas Processuais (RCP), “todos os processos estão sujeitos a custas, nos termos fixados pelo presente Regulamento”, salvo nos casos de isenção objetiva, de acordo com o art.º   4.º nº 2 do RCP).
Por seu lado, decorre do art.º 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC que as decisões que julguem a ação, o incidente ou o recurso devem condenar no pagamento de custas a parte que lhes houver dado causa (considerada vencida e na respetiva proporção), sendo que, não havendo vencimento, quem do processo tirou proveito.
Portanto, a equação tributário-processual baliza-se entre os princípios da causalidade e, subsidiariamente, o do proveito.
Neste jaez, reina a lição do Conselheiro Salvador da Costa:
Na base da referida responsabilidade pelo pagamento das custas relativas às ações, aos incidentes e aos recursos está um de dois princípios, ou seja, o da causalidade e o do proveito, este a título meramente subsidiário, no caso de o primeiro se não conformar com a natureza das coisas (a responsabilidade pelo pagamento das custas com base no princípio do proveito ocorre, por exemplo, nos processos especiais de inventário de partilha ou de divisão de coisa comum).
Grosso modo, a causalidade consubstancia-se na relação entre um acontecimento (causa) e um posterior acontecimento (efeito), em termos de este ser uma consequência daquele.
Considerando o disposto na primeira parte do n.º 1 deste artigo, o primeiro evento é determinado comportamento processual da parte e o último a sua responsabilização pelo pagamento das custas.
Nesta perspetiva, do referido princípio da causalidade emerge a solução legal de dever pagar as custas relativas às ações, aos incidentes e aos recursos a parte a cujo comportamento lato sensu o ajuizamento do litígio seja objetivamente imputável.
A dúvida revelada pela doutrina e pela jurisprudência ao longo do tempo sobre quem devia ser responsabilizado pelo pagamento das custas processuais com base no princípio da causalidade levou o legislador a intervir por via da inserção do normativo que atualmente consta do n.º 2 do artigo, em termos de presunção iuris et de iure, ou seja, de que se entende sempre dar causa às custas do processo a parte vencida na proporção em que o for.
Consequentemente, o referido nexo de causalidade tem como primeiro evento o decaimento nas ações, nos incidentes e nos recursos, e o último na responsabilização pelo pagamento das custas de quem decaiu, conforme o respetivo grau.
Assim, a parte vencida nas ações, nos incidentes e nos recursos é responsável pelo pagamento das custas, ainda que em relação a eles não tenha exercido o direito de contraditório, o que se conforme com o velho princípio que envolve esta matéria, ou seja, o da justiça gratuita para o vencedor.
Em suma, o recorrido que não acompanhou o recurso procedente interposto pela parte contrária é responsável pelo pagamento das custas nas suas vertentes de encargos, se os houver, e das custas de parte”[35].
E assim conclui:
1.ª – É responsável pelo pagamento das custas nos recursos a parte que lhes tenha dado causa;
2.ª – Dá causa às custas dos recursos a parte que neles ficar vencida na respetiva proporção;
3.ª – A circunstância de o recorrido não ter contra-alegado no recurso interposto pela parte contrária, que foi julgado procedente, não exclui a sua responsabilidade pelo pagamento das custas respetivas”.
Num texto posterior, datado de 22 de Outubro de 2020[36], o mesmo Autor reafirma o seu entendimento, quando refere que a parte recorrida não contra-alegou no recurso, “mas podia nele ter contra-alegado, opondo-se à pretensão do recorrente”, pelo que no “âmbito da relação jurídica processual relativa ao recurso”, se configura “como parte vencida, porque a decisão da Relação de procedência lhe é potencialmente desfavorável.”
Com relevo para o caso vertente, destaque, também, para o Acórdão da Relação de Lisboa de 11-02-2021[37], onde se decidiu que, tendo havido “um vencedor e não se encontrando uma parte vencida, não funciona o critério da causalidade, atuando o princípio do proveito”.
Igualmente o princípio do proveito fundamentou a decisão no Acórdão da Relação de Lisboa de 22 de Janeiro de 2019 (Processo n.º 45824/18.8YIPRT-A.L1[38]- Micaela Sousa), quando “não haja uma parte vencida, se também não existir uma outra vencedora, será responsável pelas custas aquele (ou aqueles) cuja esfera se mostrar favorecida, e também na sua exacta medida, em face do teor da decisão.”[39]
E, encaixando-se na situação sob recurso, a decisão de 10.11.2021, Processo n.º 1641/04.2TBOER-D.L1 – Edgar Taborda Lopes[40]:
“Assim, e inexistindo norma que dispense tributação (em conformidade com o princípio geral de tributação ínsito no artigo 1.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais e com o artigo 527.º do Código de Processo Civil), embora com o presente recurso se tenha desenvolvido actividade jurisdicional relevante para efeitos de custas e a Executada não deu origem à decisão recorrida, nem apresentou contra-alegações, não pode ser objecto de condenação em custas. (…)
Deste modo, fazendo funcionar o critério do proveito[41], ele coloca a Exequente-Recorrente como a parte que fez movimentar a “máquina judiciária” e disso beneficiou, pelo que terá de ser a si que as custas caberão (admite-se que o resultado final acabe por corresponder a uma situação de “Sem Custas”, mas formalmente – e não só substancialmente – é o mais correcto).
Em conclusão e em face de tudo o exposto, no que à responsabilidade tributária respeita, as custas do Recurso ficarão a cargo da Recorrente.”[42]
No seguimento do assim discorrido, tendo sido a apelante a tirar proveito da atividade judiciária (pretendia a revogação da decisão do tribunal a quo e obteve a anulação dessa mesma decisão), imputam-se-lhe as custas do recurso.
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DECISÃO
Com o poder fundado no artigo 202.º, n.ºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa, e nos termos do artigo 663.º do Código de Processo Civil, acorda-se, nesta 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, face à argumentação expendida e tendo em conta as disposições legais citadas, em anular a decisão de 12.01.2024, determinando-se:
- que o tribunal a quo instrua os autos com certidão do inquérito/processo criminal referente aos factos objeto dos presentes autos, com especificação, em concreto, da verificação (ou não) das diversas alíneas do art.º 72º n.º 1 do CPP;
- que o tribunal a quo, em função da análise da dita certidão, dê prosseguimento aos autos conforme for de direito.
Custas do recurso a cargo da recorrente.
Notifique e, oportunamente, remeta à 1.ª Instância (artigo 669.º do CPC).

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22/10/2024
AUGUSTA FERREIRA PALMA
JOÃO PERAL NOVAIS
CARLOS OLIVEIRA
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[1] António Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 6.ª edição Atualizada, Almedina, 2020, página 183.
[2] No mesmo sentido, GERALDES, António Santos Abrantes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª edição, Almedina, 2018, p. 201.
[3] Cfr. os acórdãos – também citados pela Autora- do Tribunal da Relação do Porto de 30/05/2018 (Processo nº 19903/16.4T8PRT-A.P1), de 17/02/2014 (Processo n.º 367/12.8TVPRT-A.P1) e de 04/04/2022 (Processo 20371/19.4T8PRT-A.P1), todos in www.dgsi.pt.
[4] GERALDES, António Santos Abrantes, Recursos (…), cit., p. 208.
[5] GERALDES, António Santos Abrantes, Recursos (…), cit., p. 209. No mesmo sentido, os acórdãos da Relação de Lisboa, de 12.01.2023, processo n.º 27196/17.0T8LSB.L1-6, e do Supremo Tribunal de Justiça, de 21.02.2019, processo n.º 27417/16.6T8LSB-A.L1.S2, ambos in www.dgsi.pt.
[6] Atenta a fase em que a instância se extinguiu – antes da sentença de mérito -, e por toda a matéria alegada nos autos se encontrar controvertida, face à posição assumida pela Ré seguradora em sede de contestação, tal como o tribunal a quo, o tribunal ad quem apenas se poderá ater à configuração fática em sede de articulados, em especial, da petição inicial. Cfr., a este ensejo, ANTUNES VARELA/J. MIGUEL BEZERRA/SAMPAIO E NORA, Manual de Processo Civil, 2ª edição revista e atualizada, Coimbra Editora, Lda., pp. 104-107.
[7] Nos artigos 17.º a 461.º a autora descreveu as circunstâncias em que foram efetuados tais pagamentos e o fim a que se destinavam.
[8] Cfr. o acórdão da Relação de Coimbra de 18.10.2017, in www.dgsi.pt.
[9] Processo n.º 351/97 - 2.ª Secção, in www.dgsi.pt
[10] Cfr, o acórdão da Relação de Lisboa de 19.12.2018, processo 9918/15.5T8LRS.L1-2, Jorge Leal, in www.dgsi.pt.
[11] Cfr. o acórdão da Relação de Coimbra de 2.03.2010, referente ao processo n.º 143/08.2TBOBR.C1, in www.dgsi.pt.
[12] Cfr. o acórdão da Relação de Lisboa de 21.02.2013(processo 193/11.1TBPST.L1), in www.dgsi.pt.
[13] Cfr., nesse sentido, os acórdãos da Relação de Coimbra de 24/04/2007 (processo 6135/05) e de 3/02/2010 (processo 143/2008), e da Relação do Porto de 05.11.2018 (processo n.º 2261/17.7T8PNF-A.P1) ambos in www.dgsi.pt.
[14] SILVA, Germano Marques da, Germano Marques da, Curso de Processo Penal I, p. 79.
[15] GASPAR, Henriques, Código de Processo Penal Comentado, p. 255.
[16] SALPICO, Nuno Alexandre Pires, Indemnização “Própria” e “Imprópria” em Processo Penal”, p. 22.
[17] Assim se repetiu no acórdão do STJ de 23.05.2024, processo 1989/19.1T9VLG.P1.S1, in www.dgsi.pt.
[18] Ac. do STJ de 17 de junho de 1999 – Proc. 98P993 in D. R. I Série-A de 3 de agosto de 1999, pág. 5016.
[19] Acórdão do STJ de 12 de novembro de 2009 – proc. 448/06.7TCLSB.S1 IN www.dgsi.pt.
[20] Na expressão do acórdão da Relação do Porto, de 21.10.2019, no processo 308/19.1YRPRT, in www.dgsi.pt.
[21] Cfr. o acórdão da Relação do Porto, de 21.10.2019, citado.
[22] Cfr. o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 09/11/2017 (Proc. 9108/16.0T8PRT-A.P1), in www.dgsi.pt.
[23] Cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17/10/2019 (Proc. 5992/13.7TBMAI.P2.S2), in www.dgsi.pt.
[24] GERALDES, António Santos Abrantes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª edição, Almedina, p. 336.
[25] “A condenação definitiva proferida no processo penal constitui, em relação a terceiros, presunção ilidível no que se refere à existência dos factos que integram os pressupostos da punição e os elementos do tipo legal, bem como dos que respeitam às formas do crime, em quaisquer ações civis em que se discutam relações jurídicas dependentes da prática da infração.”
[26] 1 - A decisão penal, transitada em julgado, que haja absolvido o arguido com fundamento em não ter praticado os factos que lhe eram imputados, constitui, em quaisquer ações de natureza civil, simples presunção legal da inexistência desses factos, ilidível mediante prova em contrário.
2 - A presunção referida no número anterior prevalece sobre quaisquer presunções de culpa estabelecidas na lei civil.
[27] Cfr. o acórdão do STJ de 17.10.2007, processo 07P3489, Pires da Graça, in www.dgsi.pt.
[28] Cfr. os arts. 640º e 662º do Código de Processo Civil; Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 16.12.2021, Vieira e Cunha, 513/19, de 26.5.2021, Luís Espírito Santo, 3277/12 e 31.6.2016, GarciaCalejo, 1572/12; Rui Pinto, O Recurso Civil. Uma Teoria Geral, AAFDL, 2017, p. 228.
[29] Manual do Recurso Civil, vol. I, AAFDL, 2020, pp. 120-122.
[30] Cfr. Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 6ª ed., p. 381.
[31] Cfr. o art.º   20º nº4, da Constituição; cf. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2ª ed., p. 441).
[32] Confluindo neste sentido e com citação de jurisprudência, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 11.2.2021, Elisabete Valente, 1433/20, in www.dgsi.pt.
[33] ABRANTES GERALDES, António Santos, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª edição, pág. 101, citado pela recorrida.
[34] Cfr. o – também citado pela Autora - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 23/09/2021 (Proc. 5334/17.2T8FNC.L1-2), in www.dgsi.pt.
[35] Salvador da Costa, Responsabilidade pelas custas no recurso julgado procedente sem contra-alegação do recorrido, publicado no Blog do IPPC a 18 de Junho de 2020 e disponível em https://drive.google.com/file/d/1dCu40RNwIovXdGgHYFpHcSaL13rwlCf6/view [consultado a 03/07/2022].
No mesmo sentido, cfr., v.g., os Acórdãos da Relação de Lisboa de 22/03/2022, 08/03/2022 (Processos n.ºs 10591/20.4T8SNT-B.L1-7 e 2214/04.5TBOER-D.L1-7 - Luís Filipe Pires de Sousa) e 07/10/2021 (Processo n.º 5214/19.7T8FNC.L1-6 - António Santos) e da Relação de Évora de 25/06/2020 (Processo n.º 769/12.0TBTVR-A.E1 - Albertina Pedroso).
[36] Também publicado no Blog do IPPC (a 31/10/2020) - Custas da apelação na proporção do decaimento a apurar a final-Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 23/4/2020 (Jurisprudência 2020 (77)) - e disponível em https://drive.google.com/file/d/1oc0UvAL2z8mzLXR-Vv2EtMAR7H7CfCiM/view [consultado a 03/07/2022].
[37] Processo n.º 1194/14.3TVLSB.L2-2-Carlos Castelo Branco. Trata-se de acórdão que foi também publicado por Miguel Teixeira de Sousa no Blog do IPPC a 28/07/2021 (disponível em https://blogippc.blogspot.com/2021/07/jurisprudencia-2021-22.html [consultado a 03/03/3022]) e que segue de perto o Acórdão da mesma Relação e com o mesmo Relator, de 06/02/2020 (Processo n.º 2775/19.4T8FNC-A.L1-2-Carlos Castelo Branco).
[38] Disponível em https://www.pgdlisboa.pt/jurel/jur_mostra_doc.php?nid=5566&codarea=58 [consultado a 03/03/2022].
[39] In www.dgsi.pt.
[40] In www.dgsi.pt.
[41] À pergunta “dever-se-á lançar mão do critério da vantagem ou proveito processual?” responderam os já citados Acórdãos da Relação de Lisboa de 11/02/2021 e 06/02/2020, que não podendo, em face do que dispõem os artigos 527.º e 607.º, n.º 4, do CPC, decidir-se por uma ausência de responsabilidade (“sem custas”) - que seria ilegal por corresponder a “uma isenção tributária não prevista na lei” (sendo preliminar assumir-se que o recurso “está sujeito a tributação”) – “deve ser apurada a responsabilidade tributária decorrente da instância gerada e do facto de ter desenvolvido actividade jurisdicional relevante para efeitos de custas, dos eventuais encargos assumidos e das custas de parte que poderá ter determinado.
Reiterando a necessidade de consideração dos critérios tributários da causalidade e do proveito – em detrimento de uma solução que isente de tributação o recurso (que, no caso, não se compreenderia) – verifica-se, como se disse supra, que o critério do vencimento não é prestável.
Funciona, pois, o critério do proveito (…)”.
[42] Cfr., também, o Acórdão da Relação de Coimbra de 17/10/2018 (Processo n.º 128/15.2T9CDN.C2-Heitor Vasques Osório), in www.dgsi.pt.