I - Face ao AUJ n.º 7/2022, de 20-09-2022, deve averiguar-se se há segmentos decisórios autónomos e cindíveis e, em relação a cada um desses segmentos decisórios autónomos e cindíveis, caso os haja, deve averiguar-se se o acórdão do tribunal da Relação confirma a decisão do tribunal de 1.ª instância e, caso confirme, se em relação a cada um desses segmentos decisórios autónomos e distintos em que o acórdão da Relação confirme a decisão do tribunal de 1.ª instância, se o faz sem fundamentação essencialmente diferente.
II - Apesar de o AUJ ter sido proferido no âmbito de uma ação de responsabilidade civil extracontratual fundada em facto ilícito, a doutrina nele fixada deve aplicar-se a outras ações em que também esteja em causa a interpretação do disposto no art. 671.º, n.º 3, do CPC.
III - Obsta ao recurso de revista normal, pressupõe que haja um acórdão da Relação que confirme a decisão (recorrida) da primeira instância e que essa confirmação ocorra sem qualquer voto de vencido e sem uma fundamentação essencialmente diferente.
IV - Existe dupla conforme entre as decisões das instâncias sempre que o recorrente obtém uma decisão mais favorável, quantitativa ou qualitativamente, ainda que não tenha obtido vencimento integral do recurso.
V - O excesso de pronúncia constitui uma nulidade da decisão judicial prevista no art. 615.º, n.º 1, al. d), do CPC, quando o juiz conheça de causas de pedir não invocadas, ou de exceções, não invocadas, que estejam na exclusiva disponibilidade das partes.
VI - O atual modelo de processo civil, assente no primado do direito substantivo sobre o direito adjetivo e no princípio da gestão processual, torna inevitável a flexibilização do princípio do pedido contido no art. 609.º, n.º 1 do CPC, no sentido da necessidade de se apreender realmente o âmbito objetivo do pedido que foi formulado na ação.
VII - A convolação do pedido há de respeitar um princípio de correspondência ou congruência entre o pedido deduzido e a pronúncia jurisdicional obtida pela parte, devendo o decidido pelo juiz adequar-se às pretensões formuladas, ser com elas harmónico ou congruente, sob pena de se verificar a nulidade da sentença por excesso de pronúncia.
VIII - A omissão de pronúncia constitui uma nulidade da decisão judicial, prevista no art. 615.º, n.º 1, al. d), 1.ª parte, do CPC, quando o tribunal deixe de se pronunciar sobre questões que deva apreciar.
IX - Diferente das questões a dirimir/decidir são os argumentos, as razões jurídicas alegadas pelas partes em defesa dos seus pontos de vista, que não constituem questões no sentido do art. 608.º, n.º 2, do CPC.
X - Para que a decisão careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito.
RECURSO DE REVISTA1,2,3,4,5 | 2242/20.3T8LRA.C1.S1 |
RECORRENTE6 | AGEAS PORTUGAL, COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. |
RECORRIDO7 | CASEMA – CASAS ESPECIAIS DE MADEIRA, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO, LDA. |
I – Face ao AUJ n.º 7/2022, de 20-09-2022, deve averiguar-se se há segmentos decisórios autónomos e cindíveis e, em relação a cada um desses segmentos decisórios autónomos e cindíveis, caso os haja, deve averiguar-se se o acórdão do Tribunal da Relação confirma a decisão do Tribunal de 1.ª instância e, caso confirme, se em relação a cada um desses segmentos decisórios autónomos e distintos em que o acórdão da Relação confirme a decisão do Tribunal de 1.º instância, se o faz sem fundamentação essencialmente diferente. II – Apesar de o AUJ ter sido proferido no âmbito de uma ação de responsabilidade civil extracontratual fundada em facto ilícito, a doutrina nele fixada deve aplicar-se a outras ações em que também esteja em causa a interpretação do disposto no art. 671º/3, do CPCivil. III – A figura da “dupla conforme” que se encontra plasmada no art. 671º/3, do CPC, que obsta ao recurso de revista normal, pressupõe que haja um acórdão da Relação que confirme a decisão (recorrida) da primeira instância e que essa confirmação ocorra sem qualquer voto de vencido e sem uma fundamentação essencialmente diferente. IV – Existe dupla conforme entre as decisões das instâncias sempre que o recorrente obtém uma decisão mais favorável, quantitativa ou qualitativamente, ainda que não tenha obtido vencimento integral do recurso. V – O excesso de pronúncia constitui uma nulidade da decisão judicial prevista no art. 615°/1/d, do CPCivil, quando o juiz conheça de causas de pedir não invocadas, ou de exceções, não invocadas, que estejam na exclusiva disponibilidade das partes. VI – O atual modelo de processo civil, assente no primado do direito substantivo sobre o direito adjetivo e no princípio da gestão processual, torna inevitável a flexibilização do princípio do pedido contido no art. 609º/1 do CPCivil, no sentido da necessidade de se apreender realmente o âmbito objetivo do pedido que foi formulado na ação. VII – A convolação do pedido há de respeitar um princípio de correspondência ou congruência entre o pedido deduzido e a pronúncia jurisdicional obtida pela parte, devendo o decidido pelo juiz adequar-se às pretensões formuladas, ser com elas harmónico ou congruente, sob pena de se verificar a nulidade da sentença por excesso de pronúncia VIII – A omissão de pronúncia constitui uma nulidade da decisão judicial, prevista no art. 615°/1/d/1ª parte, do CPCivil, quando o tribunal deixe de se pronunciar sobre questões que deva apreciar. IX – Diferente das questões a dirimir/decidir são os argumentos, as razões jurídicas alegadas pelas partes em defesa dos seus pontos de vista, que não constituem questões no sentido do art. 608.º/2, do CPCivil. X – Para que a decisão careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito. |
1. RELATÓRIO
CASEMA – CASAS ESPECIAIS DE MADEIRA, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO, LDA., intentou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra AGEAS PORTUGAL, COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., pedindo que:
- Seja declarada a perda total do veículo sinistrado;
- Seja a ré condenada a indemnizar a autora no montante seguro, ou seja, 136 710,00€ (cento e trinta e seis mil euros);
- Seja a ré condenada a indemnizar a autora pela privação do uso do veículo no montante 175€/dia a contar de 08/05/2019 até integral reconstituição da situação existente antes do acidente, tendo por base o valor do aluguer de viatura idêntica à sinistrada (que até à data se cifra em 74 025,00€ (setenta e quatro mil e vinte e cinco euros)), ou, caso assim não se entenda, deverá sempre a mesma ser condenada pelos valores das rendas do ALD vencidas e pagas pela A. desde o mês do sinistro até integral reconstituição da situação existente antes do acidente, valor que até à data perfaz 19.868,55€ (dezanove mil oitocentos e sessenta e oito euros e cinquenta e cinco cêntimos);
- Seja a ré condenada a reembolsar a autora do valor remanescente das despesas de transporte da viatura para a oficina, no valor de 150,00€ (cento e cinquenta euros);
- Seja a ré condenada a reembolsar a A. pela despesa do aluguer do veículo de substituição, no valor de 531,48€ (quinhentos e trinta e um euros e quarenta e oito cêntimos);
- Seja a ré condenada a pagar à F..., Lda. o valor respeitante ao parqueamento da viatura sinistrada no valor de 18,45€ diários a contar desde 13/05/2019 até integral reconstituição da situação existente antes do acidente (que até à data, perfaz o valor de 7675,20€ (sete mil seiscentos e setenta e cinco euros e vinte cêntimos));
- Tudo perfazendo um valor indemnizatório total mínimo, calculado até à data de propositura da presente ação, de 164 935,23€ (cento e sessenta e quatro mil novecentos e trinta e cinco euros e vinte e três cêntimos) ao qual acrescem juros de mora até efetivo e integral pagamento.
Foi proferida sentença em 1ª instância que condenou a ré a pagar à autora as seguintes quantias:
- 115 572,60€, (cento e quinze mil, quinhentos e setenta e dois euros e sessenta cêntimos);
- 37 012,50€ (trinta e sete mil, doze euros e cinquenta cêntimos);
- 18,45€ diários correspondentes ao parqueamento, a contar desde 13/05/2019 até integral reconstituição da situação existente antes do acidente, ou seja, pagamento da indemnização pela perda total acima já referida (que até à data da propositura da presente ação perfaz o valor de 7675,20€ (sete mil seiscentos e setenta e cinco euros e vinte cêntimos).
Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação de Coimbra proferido acórdão que julgou parcialmente procedente o recurso, condenando-a a pagar ao autor a quantia de 35 173,00€ (trinta e cinco mil cento e setenta e três).
Inconformada, veio a ré interpor recurso de revista deste acórdão, tendo extraído das alegações11,12 que apresentou as seguintes
CONCLUSÕES13:
a. O presente recurso de revista vem interposto do Acórdão proferido pelo tribunal a quo, na parte em que condenou a Recorrente no pagamento à Recorrida no pagamento da quantia de € 35.173 (trinta e cinco mil cento e setenta e três euros).
b. O Acórdão é recorrível por força da inexistência de uma situação de dupla conforme (cf. artigo 671.º, n.º 3 do CPC), em virtude de a Relação ter confirmado a decisão de 1.ª instância através de uma fundamentação essencialmente diferente.
c. Com efeito, na petição inicial, a Recorrida peticionou a condenação da Recorrente no pagamento de uma indemnização pela privação do uso do veículo sinistrado, invocando, assim, o dano da privação do uso.
d. Apreciando esse dano invocado pela Autora, o Tribunal de 1.ª instância julgou a ação foi julgada parcialmente procedente, condenando a Recorrente a pagar à Recorrida o montante de €37 012,50 pela privação do uso do veículo em causa, por considerar que a Recorrida ficou privada da utilização do veículo durante 423 dias.
e. A Recorrente interpôs recurso daquela decisão para a Relação, alegando que, tendo sido facultada à Recorrida uma viatura de substituição, entre a data do sinistro e o dia 7 de maio de 2019, e tendo sido entregue depois à Recorrida uma nova viatura, igual à sinistrada, a 29 de maio de 2019, a admitir-se a existência de um dano pela privação do uso, apenas se poderia considerar este período de 22 dias para o cálculo do valor indemnizatório.
f. O Tribunal da Relação de Coimbra manteve a condenação da Recorrente (embora reduzindo o valor para €35.173,00, absolvendo a Recorrente da restante parcela em que fora condenada), o que fez através de uma fundamentação essencialmente diferente.
g. Em suma, a Relação entendeu que, no período que decorreu entre o término do uso da viatura de substituição e a aquisição da nova viatura pela Recorrida, não há qualquer dano ressarcível, e que o facto de a Recorrida ter adquirido viatura para substituir a viatura acidentada constitui um dano autónomo – e já não um dano da privação do uso –, pois a despesa foi suportada por um período de tempo prolongado, sem recebimento do capital seguro, por facto imputável à seguradora. No entendimento da Relação, “a nova viatura substitui a anterior e elimina o dano (puro ou próprio) da privação de uso, pois as utilidades colhidas da viatura acidentada passaram a ser satisfeitas pela viatura de substituição”.
h. Assim, conclui-se pela diferença essencial de fundamentação entre as duas decisões, que sustenta a recorribilidade do Acórdão proferido: enquanto o Tribunal de 1.ª instância decidiu encontrar-se verificado o dano da privação do uso do veículo, invocado pela Recorrida na petição inicial, o Tribunal da Relação entendeu que não se produziu na esfera jurídica da Recorrida um dano da privação do uso, mas antes um outro dano (um “dano autónomo”) pelo facto de a despesa ter sido suportada por um período de tempo prolongado, sem recebimento do capital seguro, por facto imputável à Recorrente.
i. Trata-se de um outro dano (não invocado pela Recorrida), e de uma construção jurídica manifestamente distinta, relativamente à qual a Recorrente não se pôde pronunciar no recurso de apelação.
j. Esta divergência é importante e significativa quanto à própria configuração do dano e do enquadramento jurídico, aspeto essencial para o julgamento da causa, assim se concluindo que fundamentação entre as decisões é “essencialmente diferente”, determinando a recorribilidade do Acórdão.
k. Subsidiariamente, a entender-se que o recurso de revista ordinário é inadmissível (no que não se concede) a Recorrente interpõe do Acórdão recurso de revista excecional, cuja admissibilidade se funda n seguinte questão, cuja apreciação é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito: Limites impostos pela equidade quando inexiste dano ressarcível a título de privação do uso – conexamente, a proibição dos punitive damages.
l. A primeira razão que justifica o acesso ao terceiro grau de jurisdição prende-se com o facto de a decisão a quo, ao considerar não existir um dano da privação ressarcível, mas ainda assim condenando a Recorrente no pagamento de uma indemnização que a Recorrida assentara na existência de um dano da privação de uso, não ser equitativa, gerando soluções injustas e desiguais que o Direito não tolera.
m. Estão em causa os princípio da igualdade, da proporcionalidade, da equidade e da razoabilidade, já que o racional que parece presidir à decisão trata por igual situações distintas: uma pessoa que se encontre efetivamente privada da utilização do seu veículo, perdendo as utilidades que o mesmo lhe proporcionava, terá direito à mesma indemnização que será atribuída à Recorrida, que nunca esteve privada de uma viatura e que viu as utilidades colhidas da viatura acidentada passarem a ser satisfeitas pela viatura de substituição.
n. Acresce que a Relação, sem alegação e prova que o sustente, alterou em absoluto a configuração do dano invocado pela parte, a esta se substituindo, condenando a Recorrente com base numa suposta verificação de um dano que o próprio Tribunal presumiu.
o. Ora, a deslocação da indemnização da prova concreta do dano gera um efeito punitivo que a lei não permite, traduzindo-se numa condenação à margem de qualquer dano invocado/ provado, à imagem da figura dos punitive damages, figura intolerável no ordenamento jurídico português, razão adicional pela qual a apreciação da questão objeto do recurso é juridicamente relevante.
p. Os fundamentos do presente recurso são comuns à revista e à revista excecional: o erro de interpretação e aplicação do Direito (cf. artigo 674.º, n.º 1, alínea a) do CPC) e a nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC (cf. artigo 674.º, n.º 1, alínea c) do CPC).
q. Com efeito, conforme supramencionado, a Recorrida invocou, na petição inicial, o dano decorrente da privação do uso do veículo, que alicerçou num conjunto de factos que alegou e que foram julgados provados em 1.ª instância, determinando a condenação da Recorrente no pagamento de uma indemnização pelo invocado dano da privação do uso.
r. Na sequência do recurso interposto daquela decisão pela Recorrente, o Tribunal da Relação de Coimbra concluiu pela inexistência de um dano da privação do uso durante a totalidade do período relativamente ao qual a Recorrida alegara ter-se visto privada da utilização do veículo sinistrado, o que deveria ter determinado a procedência da apelação e a consequente absolvição da Recorrente do pedido.
s. Contudo, a Relação, não se contendo dentro dos limites da pretensão deduzida (como impõe o princípio do dispositivo), decidiu ainda assim condenar a Recorrente no pagamento de uma indemnização, que suportou no facto de, no seu entender, a Recorrida ter efetuado, com a aquisição de nova viatura, uma despesa adicional, suportada por período de tempo prolongado, sem recebimento do capital seguro, por facto imputável à seguradora, o que, no seu entender, constituiria um “dano autónomo”
t. Sucede que este “dano autónomo” que o Tribunal considerou ter-se constituído não foi invocado e assenta em factos não alegados e sobre os quais não foi feita prova, pelo que a decisão viola os princípios do dispositivo e do contraditório (artigos 5.º, n.º 1 e 3.º, n.º 3 do CPC), bem como o princípio da estabilidade da instância (artigo 260.º do CPC).
u. Trata-se de um dano meramente teórico e presumido, que não foi alegado e cujo ressarcimento não foi pedido, concluindo-se que não poderia ter sido conhecido, por extravasar manifestamente o objeto do processo. O Acórdão enferma, nestes termos, da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC.
v. Ademais, ao alterar em absoluto, sem alegação e prova que o sustente, a configuração do dano invocado pela parte, condenando a Recorrente com base numa suposta verificação de um dano que o próprio Tribunal presumiu, a decisão afasta a da prova concreta do dano, traduzindo-se num efeito punitivo que a lei não permite – a figura dos punitive damages – , enfermando, também por este motivo, de erro na aplicação do Direito.
w. Acresce que improcede a tese vertida no Acórdão a quo segundo a qual, ao considerar que a Recorrente não discutiu no recurso a opção da decisão de 1.ª instância quanto ao apelo à equidade na liquidação do dano, nem a forma como se operou a sua quantificação, tais questões se situam em princípio fora do âmbito do recurso.
x. Isto porque é evidente que a Recorrente, ao impugnar a existência de um dano, está também a discutir a sua quantificação, e ainda porque o conhecimento da equidade e a aplicação de critérios de equidade configura uma questão de direito.
Neste sentido, e não tendo conhecido da quantificação do dano, designadamente através do apelo à equidade, o Tribunal incorreu em erro na aplicação do Direito e não se pronunciou sobre questão que devia apreciar, o que configura a nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), primeira parte do CPC.
y. Nestes termos, impõe-se revogar o Acórdão recorrido, na parte em que condenou a aqui Recorrente no pagamento da quantia de € 35 173,00 (trinta e cinco mil cento e setenta e três euros) 14.
A recorrida não contra-alegou.
Colhidos os vistos15, cumpre decidir.
Emerge das conclusões de recurso apresentadas por AGEAS PORTUGAL, COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., ora recorrente, que o seu objeto está circunscrito às seguintes questões:
1.) Saber se é admissível recorrer de revista do acórdão proferido pelo tribunal a quo, o qual, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, confirmou a decisão proferida em 1ª instância.
2.) Saber se o acórdão proferido pelo tribunal a quo é nulo por excesso de pronúncia (art. 615º/1/d, do CPCivil), por ter a Relação ultrapassado os limites da pretensão deduzida, ao condenar a recorrente no pagamento de uma indemnização por um “dano autónomo” meramente teórico e presumido, que não foi alegado e cujo ressarcimento não foi pedido, com base em factos não alegados e sobre os quais não foi feita prova, violando os princípios do dispositivo e do contraditório (arts. 5º/1 e 3º/3 do CPCivil), bem como o princípio da estabilidade da instância (art. 260º do CPCivil).
3.) Saber se o acórdão proferido pelo tribunal a quo é nulo por omissão de pronúncia (art. 615º/1/d, do CPCivil), na parte em que não conheceu da quantificação do dano, designadamente através do apelo à equidade, considerando que a recorrente não discutiu no recurso de apelação a opção da decisão de 1ª instância quanto ao apelo à equidade na liquidação do dano, nem a forma como se operou a sua quantificação, concluindo que tais questões se situam fora do âmbito do recurso.
4.) Saber se há erro de direito do acórdão recorrido ao condenar a recorrente à margem de qualquer dano invocado/ provado, numa suposta verificação de um dano que o próprio tribunal presumiu, afastando-se da prova concreta do dano, traduzindo-se a condenação num efeito punitivo que a lei não permite – a figura dos punitive damages.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. FACTOS PROVADOS NA 1ª E 2ª INSTÂNCIA
1. Em 19 de dezembro de 2018 a Casema, Lda, empresa ora Autora, celebrou com o Banco BPI o Contrato de Aluguer e Promessa de Compra e Venda n.º ...00.
2. O supra referido contrato tem com objeto o aluguer de longa duração do veículo Tesla Model X 100D, com o chassis nº ...43, ao qual foi atribuída a matrícula ..-VU-...
3. Em 06 de abril de 2019, o Sr. AA, ... da Autora, condutor habitual do veículo em causa, por força da existência de gelo acumulado na estrada, perdeu o controlo do carro e este despistou-se.
4. Aquando do despiste a viatura embateu com a frente e com a traseira nas bermas da estrada e num muro de pedra.
5. Do despiste resultaram danos na viatura.
6. Foi feita a participação do sinistro à seguradora nos termos do documento 16.
7. Em Portugal, à data do evento, apenas existiam duas oficinas autorizadas para a reparação de viaturas da marca TESLA, uma no ... e outra em ....
8. A A., por ter boas referências da oficina, solicitou que o veículo fosse levado para a oficina do ..., a F..., Lda. (doravante F..., Lda.).
9. A R. não aceitou pagar o transporte para a oficina selecionada, alegando que só assumia o pagamento do transporte para a oficina mais próxima, no caso, ..., tendo apenas comparticipado com 150€, sendo que foi a A. quem procedeu ao pagamento do valor remanescente (cfr. Fatura que se junta, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos, DOC. 17).
10. Da informação transmitida à A., o perito designado pela Ré foi pela primeira vez à oficina em 10 de abril de 2019, conforme email recebido que se junta, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos, DOC. 18.
11. A partir daí, e por informação prestada pelo responsável da oficina, foram agendadas diversas diligências de peritagem com o perito da seguradora, justificadas pela extensão dos danos e pela especificidade do veículo pelo facto de ser um elétrico de alta cilindrada.
12. Durante as semanas seguintes ao sinistro o responsável da A. por diversas vezes foi ligando para o call center da R. para saber do ponto de situação do processo, sendo que nunca lhe era dada qualquer informação.
13. Com o passar do tempo a A., considerando já ser altura de ter uma resposta sobre o estado do processo, passou a telefonar também diretamente para a oficina,
14. Sendo a partir daí que conseguiu ter uma ideia do andamento do processo.
15. Nomeadamente, era o responsável da oficina que lhe ia informando que a peritagem ainda não estava concluída e que o perito lá voltaria noutra data.
16. Da informação que a A. foi conseguindo obter, por vezes o perito agendava datas para continuação da peritagem e não comparecia na oficina.
17. Por outras vezes a A. recebia uma mensagem automática a informar que havia novas informações sobre o processo na oficina, mas ao telefonar para a F..., Lda. percebia que se tratava de informação errada.
18. No início do mês de Maio de 2019, o ... da A. voltou a telefonar para o apoio ao cliente da R. e o operador com quem falou informou-o de que no processo estava o relatório do perito e que o mesmo apontava para a perda total do veículo, sendo que apenas estava em falta a determinação do valor do salvado que demoraria dois ou três dias.
19. Passos os três dias voltou a telefonar e foi-lhe comunicado que já tinham o valor do salvado e que o gestor do processo iria enviar email a comunicar toda essa informação.
20. Perante tal informação, e tendo em conta que o prazo da viatura de substituição estava a terminar, a A. procedeu à encomenda de uma nova viatura para substituir a viatura sinistrada.
21. A nova viatura, igual à sinistrada, foi entregue à A. em 29 de maio de 2019, conforme faturas que se juntam, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos, DOCS. 19 e 20.
22. Duas semanas depois, uma vez que não tinha recebido por escrito comunicação da decisão de perda total nem do valor do salvado, o responsável da A. voltou a contactar o apoio ao cliente da R.
23. Qual não é o seu espanto quando neste telefonema o operador lhe dá informação totalmente contraditória com a do telefonema anterior.
24. Desta vez o operador que atendeu a chamada informou que possivelmente não se trataria de uma perda total, fundamentando a sua afirmação nas fotos do acidente que, segundo ele, não demonstravam danos suficientes para se tratar de perda total.
25. Ora, nunca a A. aceitou a possibilidade da reparação do veículo, por considerar que os danos foram tão extensos que nenhuma reparação colocará a viatura em estado igual ao da data do sinistro, ou seja, novo, pois naquela data o veículo tinha apenas 3 meses.
26. Nesta altura, para que se pudesse apurar em concreto os danos da viatura a A. acabou por dar ordem de desmontagem do veículo, não tendo contudo, apesar da pressão nesse sentido, dado ordem de reparação.
27. O responsável da A. deslocou-se então à F..., Lda. para ele próprio verificar os danos da viatura, tendo constatado a debilidade estrutural da mesma.
28. A A. foi contactando a oficina que informava não haver ainda relatório final de peritagem e que o perito ainda se deslocaria mais algumas vezes à oficina para contabilização dos valores da peças necessárias à eventual reparação.
29. A partir daqui iniciou-se um longo período em que a A. procurava, junto do apoio ao cliente da R., saber informações sobre o processo, as peritagens e nada lhe era dito, não havia informações a dar, afinal não havia relatório final de peritagem.
30. O responsável da A., por perceber que os operadores do call center não tinham acesso a toda a informação, pois apenas conseguiam ver o que lhes estava disponível dos ficheiros informáticos do processo, pediu por diversas vezes para falar com o gestor de processo o que lhe foi sempre negado.
31. Chegou mesmo a solicitar uma reunião com alguém da estrutura diretiva da R., pedido que também recebeu resposta negativa.
32. Entretanto, o responsável da oficina informou que ele próprio elaborou uma listagem das peças necessárias, com os respetivos valores, bem como valores dos trabalhos a efetuar na viatura e remeteu o relatório diretamente para a R.
33. Em meados de julho de 2019, num contacto telefónico para o apoio ao cliente, foi a mandatária da A. informada que existia no processo o relatório final do perito e que o mesmo apontava para uma reparação no valor de 61.300€ (sessenta e um mil e trezentos euros).
34. Nesse mesmo contacto informaram ainda que o processo estava para decisão superior que seria comunicada à A. na semana seguinte.
35. Como não houve na dita semana qualquer comunicação da R., a A. voltou a contactar o apoio ao cliente em 29 de julho de 2019.
36. Nesse contacto foi a A. informada da existência de um relatório final e da decisão que era de perda total.
37. De imediato a mandatária da A. remeteu email a solicitar esclarecimentos.
38. Ao que a R. respondeu em 30 de julho de 2019, por email também, informando “...ter recebido relatório estimativa de orçamento, pelo quem estamos perante uma perca parcial (reparação), não se repercutindo em perca total.”, conforme email que se junta, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, para os devidos e legais efeitos, DOC. 21.
39. A partir desta data a R. passou a pressionar a A. no sentido de dar ordem de reparação do veículo.
40. Contudo, a A. nunca aceitou dar ordem de reparação do veículo porque, por um lado, no meio de tantas contradições e atendendo que por duas vezes lhe haviam dito tratar se de perda total, não estava confiante na informação que lhe era transmitida e pretendia que lhe fosse fornecido o relatório pericial e devidamente esclarecido o seu teor.
41. Por outro lado, por considerar que a reparação não será tecnicamente viável e apta a deixar o veículo nas condições em que se encontrava antes do acidente, isto tudo atendendo que a viatura era nova (apenas tinha 3 meses) à data do sinistro.
42. Isto porque, em virtude do despiste o veículo torceu o chassis, o que se pode constatar de forma evidente pela excessiva torção das longarinas frontais, e ainda pelo encarquilhar do chassi sob a porta traseira do lado esquerdo, conforme fotografias que se juntam, DOCS. 22 a 29.
43. Importante referir que o chassis da viatura é integralmente em alumínio, o que não permite as correções que um chassis normal em aço possibilita, rasgando ou partindo facilmente, comprometendo assim a segurança da própria viatura e, consequentemente, dos seus ocupantes.
44. Estes foram certamente os fundamentos da peritagem para apontar inicialmente para perda total.
45. Ninguém até agora garantiu que a viatura após reparação venha a ficar como estava antes do sinistro, aliás, nem a oficina reparadora assume essa garantia.
46. Importa por isso ressalvar que, perante estes factos o valor da reparação acaba por ter pouca relevância, pois por questões técnicas a viatura terá, necessariamente, que ser considerada perda total.
47. A A. adquiriu veículo novo, com as mesmas características da viatura sinistrada, pelo montante de 100 980,00€ (cem mil novecentos e oitenta euros), ao passo que a viatura sinistrada foi adquirida pelo valor de 136 710,00€ (cento e trinta e seis mil setecentos e dez euros) DOC.3.
48. A R. não assume a perda total.
49. Em 7 de outubro de 2019 a A. recebeu uma missiva da R. na qual esta informava que a peritagem do veículo estava concluída e que o valor aprovado para a reparação do mesmo era de 149 187,78€, contudo ressalvam “sem qualquer compromisso de responsabilidade”, conforme fotocópia que se junta, cujo teor aqui se dá por reproduzido para os devidos e legais efeitos, DOC. 30.
50. Ora, face a todas as contradições já relatadas, a mandatária da A. logo no dia seguinte enviou email acusando a receção da carta e, uma vez o valor de reparação comunicado era superior ao valor da viatura e ao valor segurado, solicitando rápida decisão final no sentido da perca total do veículo.
51. No dia 9 de outubro de 2019, responde a R., por email, que a missiva datada de 7 de outubro continha afinal um lapso no valor indicado para a reparação dos danos e que onde se lê 149 187,78€ dever-se-ia ler 60 133,70€.
52. Nesse email a R. informa ainda que a A. será contactada pelo seu perito liquidatário para agendamento da tão solicitada reunião.
53. Ora, de facto o contacto prometido aconteceu e foi agendada reunião para o dia 4 de novembro de 2019, nas instalações da A.
54. Nessa reunião estiveram presentes o sócio-gerente da A., a sua mandatária e a perita liquidatária da R., a Dra. BB.
55. As negociações decorreram a partir daí com diversos contactos telefónicos e de email até ao mês de janeiro de 2020.
56. Neste período o perito da R. voltou a deslocar-se à oficina onde se encontra o veículo e realizou diversas novas diligências de peritagem.
57. Em 8 de janeiro de 2020, a senhora perita da R. informou que a resposta decorrente das negociações seria dada por escrito pela R.
58. Assim foi, no dia 17 de janeiro de 2020 chegou ao escritório da mandatária da A. comunicação datada de 15 de janeiro onde a R., fazendo tábua rasa de tudo o que foi discutido em sede de negociações, informa que se encontra disponível para proceder ao pagamento da reparação do veículo, no valor de 60 133,70€, mediante a apresentação de fatura-recibo emitida pelo reparador.
59. Acrescenta apenas o valor de 28 920,38€ (vinte e oito mil novecentos e vinte euros e trinta e oito cêntimos) respeitante à bateria do veículo que se encontra danificada.
60. Ao valor da reparação terá que ser deduzido o valor da franquia: 5480,00€ (cinco mil quatrocentos e oitenta euros), pelo que a R., na sua proposta, assume o pagamento da reparação no valor total de 83 574,08€ (oitenta e três mil quinhentos e setenta e quatro euros e oito cêntimos), conforme comunicação que se junta, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, para os devidos e legais efeitos, DOC. 31.
61. A A. não aceitou a proposta da R. para reparação do veículo por diversos motivos.
62. Primeiro que tudo a A. tem sérias dúvidas da viabilidade técnica da reparação proposta pela R., pelos valores mencionados, e bem assim da possibilidade de a viatura ficar nas condições de segurança exigíveis e existentes à data do sinistro, sobretudo porque ninguém lhe garante isso.
63. A reforçar as dúvidas da A. está a convicção dos responsáveis da oficina reparadora que asseguram que o valor final encontrado será necessária e inevitavelmente objeto de aditamentos à medida que for sendo feita a reparação, o que demonstra que a reparação proposta pela R. não é apta a restituir a situação existente antes do sinistro.
64. Ora, tendo uma reparação que a R. assume no valor de 89 054,70€ (oitenta e nove mil e cinquenta e quatro euros e setenta cêntimos) que os técnicos asseguram terá aditamentos, atendendo ao valor de mão de obra tabelado pela marca TESLA no valor de cerca de 120€/hora (ao qual acresce o IVA), e bem assim o elevado custo das peças para o veículo em causa.
65. Facilmente se prevê que os aditamentos que venham a acontecer atinjam um valor aproximado dos 100 000,00€ (cem mil euros) que na verdade é um valor igual ao preço pelo qual se poderá adquirir uma viatura exatamente igual nova.
66. Não faz qualquer sentido reparar uma viatura com danos tão extensos, que ninguém se responsabiliza sobre a segurança da mesma depois de reparada, sobretudo, quando se pode adquirir uma viatura nova por valor equivalente.
67. Por outro lado, a reparação a fazer é tão extensa que importará uma desvalorização anormal e drástica do veículo, inviabilizando qualquer hipótese de venda por parte da A. por exemplo.
68. Por fim, entendeu a A. não aceitar a proposta da R. porque nela não estão sequer contemplados outros valores dos quais considera ter que ser indemnizada.
69. Ora, tendo em conta que apenas em janeiro de 2020 a R. comunicou a sua decisão final.
70. Tendo em conta a forma como a R. conduziu todo este processo com contradições e demoras anormais e inaceitáveis.
71. E tendo ainda em conta que a viatura continua, nesta data, na oficina, desmontada e, por isso, imobilizada (importa também referir que ainda que fosse reparada, o tempo previsto para a reparação é de cerca de 6 meses).
72. Tendo por referência o valor diário de aluguer de uma viatura com as mesmas características da sinistrada, ou seja, 175€/dia, conforme orçamento que se junta, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, DOC. 32.
73. Atendendo que o sinistro ocorreu em 6 de abril de 2019 e apenas foi facultada viatura de substituição no período de 8 de abril a 7 de maio, 30 dias portanto, sem que contudo fosse disponibilizado um veículo igual ou equivalente, antes um veículo de cilindrada bem inferior e de motor a combustão.
74. Desde o final dos aludidos 30 dias até à data de entrada da presente ação decorreram 423 dias em que a Autora ficou privada da utilização do veículo em causa.
75. Conforme no início, a viatura sinistrada é objeto de um contrato de aluguer, v.g. ALD, pelo qual a A. paga ao Banco BPI o valor mensal de 1324,57€, cfr. DOC. 1.
76. Nunca a A. deixou de proceder a esse pagamento, mesmo neste longo período em que tem estado privada de usar a viatura, conforme comprovativos que se juntam, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, para os devidos e legais efeitos, DOCS. 33 a 47.
77. O aluguer da viatura de substituição foi pago pela A., não tendo a R. procedido ao respetivo reembolso DOC. 48.
78. Por outro lado, a F..., Lda. comunicou à A. que está a debitar o valor de 15,00€ (quinze euros), ao qual acresce o IVA, ou seja, 18,45€ por cada dia de parqueamento da viatura nas suas instalações, desde a data de desmontagem do veículo – 13.05.2019.
79. Até à presente data, (416 dias depois), é devido à F..., Lda. o montante de 7675,20 € (sete mil seiscentos e setenta e cinco euros e vinte cêntimos) de parqueamento da viatura.
80. O valor do salvado corresponde a €15 669,00, com o IVA incluído.
81. Em 21.12.2018 a Autora contratou o seguro de Danos Próprios com a Ré (Seguro Direto) ao qual corresponde a apólice n.º 0045.20.784278, conforme condições particulares e condições gerais juntas18.
82. A A. celebrou com o Banco BPI Contrato de Aluguer e Promessa de Compra e Venda n.º ...00, tendo por objeto o aluguer de longa duração do veículo Tesla Model X 100D, matrícula ..-VU-..19.
2.3. O DIREITO
Importa conhecer o objeto do recurso, circunscrito pelas respetivas conclusões, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e as que sejam de conhecimento oficioso20 (não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objeto).
1.) SABER SE É ADMISSÍVEL RECORRER DE REVISTA DO ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRIBUNAL A QUO, O QUAL, SEM VOTO DE VENCIDO E SEM FUNDAMENTAÇÃO ESSENCIALMENTE DIFERENTE, CONFIRMOU A DECISÃO PROFERIDA EM 1ª INSTÂNCIA.
Cabe revista para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação, proferido sobre decisão da 1.ª instância, que conheça do mérito da causa ou que ponha termo ao processo, absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos – art. 671º/1, do CPCivil.
Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte – art. 671º/3, do CPCivil.
Consagra este inciso normativo a figura chamada de «dupla conforme», traduzida numa pronúncia com o mesmo sentido decisório proferido pelas (duas) instâncias hierarquicamente inferiores21.
Tal “desconformidade” terá, pois, sempre de reporta-se a matérias integradas na competência decisória (ou seja, nos poderes de cognição) do Supremo Tribunal de Justiça22.
Como requisitos para a existência dessa figura processual (inibitória do recurso de revista), três requisitos, os dois primeiros de natureza positiva e o terceiro de natureza negativa, a saber: a) confirmação pela relação, do sentido decisório (condenatório ou absolutório do pedido ou da instância) adotado pela 1ª instância; b) decisão confirmativa da Relação tirada sem qualquer voto de vencido; c) a fundamentação (jurídica) da decisão essencialmente diferente da decisão de 1ª instância23.
Se a fundamentação de ambas as decisões forem essencialmente idênticas, há dupla conforme e, portanto, é inadmissível a revista; se forem essencialmente (substancialmente) diferentes, inexiste “dupla conforme”, sendo admissível a revista24.
Assim, não é admissível revista do acórdão que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível (art. 671º/3, do CPCivil).
A interpretação desta disposição legal suscitou controvérsia na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, tendo sido proferido o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência (AUJ) n.º 7/202225, o qual uniformizou a jurisprudência nos seguintes termos: “Em ação de responsabilidade civil extracontratual fundada em facto ilícito, a conformidade decisória que caracteriza a dupla conforme impeditiva da admissibilidade da revista, nos termos do artigo 671º, nº. 3, do CPC, avaliada em função do benefício que o apelante retirou do Acórdão da Relação, é apreciada, separadamente, para cada segmento decisório autónomo e cindível em que a pretensão indemnizatória global se encontra decomposta”.
No caso dos autos, a ação é fundada na responsabilidade contratual da ré seguradora no âmbito do contrato de seguro celebrado entre as partes.
Apesar de o referido AUJ ter sido proferido no âmbito de uma ação de responsabilidade civil extracontratual fundada em facto ilícito, a doutrina nele fixada deve aplicar-se a outras ações em que também esteja em causa a interpretação do disposto no art. 671º/3, do CPCivil26.
O AUJ seguiu assim o entendimento maioritário da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça de que existe dupla conforme entre as decisões das instâncias sempre que o recorrente obtém uma decisão mais favorável, quantitativa ou qualitativamente, ainda que não tenha obtido vencimento integral do recurso27,28,29,30,31,32,33,34,35.
Com efeito, no segmento uniformizador desse AUJ consta que “a conformidade decisória que caracteriza a dupla conforme impeditiva da admissibilidade da revista, nos termos do artigo 671º, nº. 3, do CPC” é “avaliada em função do benefício que o apelante retirou do Acórdão da Relação”.
Trata-se “de um critério de conformidade assente na ideia de coincidência racional, que se afasta da coincidência formal de julgados (por esta se revelar mecânica e redutora dos propósitos subjacentes à própria figura da dupla conforme face à imponderação do elemento teleológico na interpretação da norma), que inicialmente equacionado relativamente às decisões de condenação numa prestação pecuniária (ações com objetos processuais economicamente divisíveis, ainda que não se esgote nesse âmbito), parte da ideia e encontra justificação no facto de carecer de sentido admitir o recurso de revista nas situações em que o recorrente tenha obtido uma decisão mais favorável que aquela que teria com a confirmação irrestrita da decisão de 1.ª instância, inviabilizadora da revista. Por conseguinte e segundo o posicionamento onde nos situamos, levando em conta o elemento racional ou teleológico de interpretação, a sobreposição caracterizadora da conformidade decisória, não obstante partir de uma coincidência de julgados (sobreposição parcial), é aferida em função da decisão mais favorável – quantitativa ou qualitativamente -, ou seja, quando o acórdão da Relação se revela mais benéfico ao recorrente do que a proferida em 1.ª instância. (…) Na verdade, na escolha do caminho de racionalização do acesso ao STJ, pouco sentido faria inibir a parte de interpor recurso no caso de a Relação manter a mesma condenação da 1ª instância, mas admiti-lo na situação de a parte obter uma reformatio in melius. Nestas duas situações ocorre uma identidade de razão que impõe, em termos de raciocínio lógico, o mesmo efeito impeditivo do recurso para ambas”.
No caso dos autos, o acórdão recorrido na sua globalidade, é claramente mais favorável à ré do que a sentença de 1.ª instância porquanto o valor indemnizatório liquidado pela Relação é inferior ao que foi fixado pela 1.ª instância.
Porém, analisada a fundamentação das decisões das instâncias, cremos que as mesmas são “essencialmente diferentes”.
Estando o recurso de revista circunscrito ao dano pela privação de uso do veículo sinistrado, a 1.ª instância considerou que “no caso concreto em apreciação ficou provado que no apuramento do sinistro e no apuramento da responsabilidade da seguradora e no pagamento da indemnização, a seguradora atuou efetivamente com clara violação de deveres acessórios de conduta, designadamente dos deveres de boa-fé, diligência, probidade e lealdade conduzindo a uma intolerável demora na resolução do litígio, o que implica a sua responsabilidade no ressarcimento dos danos moratórios, como sucede com a privação do uso do veículo em causa, porque retardou intoleravelmente o ressarcimento dos danos da sua responsabilidade”.
Quanto ao cálculo da indemnização devida, considerando os factos provados relativos ao valor diário de aluguer de uma viatura com as mesmas características da sinistrada, ou seja, 175€/dia, e considerando um período de 423 dias em que a recorrida ficou privada da utilização do veículo, alcançou um valor total de 74 025,00€, concluindo, no entanto, que o mesmo “deve ser temperado pela equidade (cfr. art. 566.º, n.º 3, do Código Civil) e deve ser reduzido para metade, considerando que a certa altura foi adquirido outro veículo pela Autora, isto é, deve ser reduzido para a quantia global de €37.012,50 (trinta e sete mil, doze euros e cinquenta cêntimos) pela privação do uso do veículo em causa, causado
pelo comportamento da seguradora”.
No acórdão recorrido, considerou-se, ao invés, dando razão à recorrente, “que a nova viatura substitui a anterior e elimina o dano (puro ou próprio) da privação de uso, pois as utilidades colhidas da viatura acidentada passaram a ser satisfeitas pela viatura de substituição”.
No entanto, considerou o Tribunal da Relação “que essa substituição foi suportada pela A. e implica encargos que podem ser enquadrados no âmbito das despesas (ou danos) indemnizáveis. Aqui, a privação desaparece mas dá lugar a outras consequências, analisadas, em sentido amplo, no desvalor patrimonial subsequente ao facto lesivo mas nele radicado”.
Defendeu o tribunal recorrido que “a autora efetua uma despesa adicional, no sentido de que afeta capital à aquisição (o que tem custos inerentes), sem dispor ainda do valor segurado (cabível no caso da perda total), sendo entendível a «racionalidade da despesa» (na expressão de B. Proença), dada a sua exposta necessidade e a expectativa do próximo recebimento do valor devido. Sucede que a conduta subsequente da R. (a qual corporiza o ilícito contratual diagnosticado e aqui não discutido), revertendo a sua posição e levando a um prolongado e complexo processo de avaliação, que culmina nesta ação, converte aquela despesa num encargo acrescido por se prolongar no tempo sem o recebimento do capital seguro (ou seja, um encargo derivado da antecipação dessa despesa sem ser colmatado pelo devido recebimento do valor do seguro), só justificado pela atuação da R. e assim uma despesa (ou dano, se se quiser) ressarcível”.
Analisando as duas decisões proferidas pelas instâncias, podemos concluir, como se escreveu no acórdão recorrido, que nesta última decisão, “o dano associado à falta da viatura (ou do pagamento do seu valor) não desaparece, apenas mudando de fisionomia: deixa de haver perda de utilidades (porque satisfeitas por outra via), mas essa eliminação é obtida à custa dos encargos adicionais com a substituição da viatura (que existem sempre, mormente por despesas adicionais emergentes, por imobilização de capital, pelo preço adicional do capital, etc.), e assim com diminuição do património do lesado/credor. Assim, em vez da perda de uso, é a despesa tida com a obtenção que surge como dano/despesa emergente próprio”.
Ou seja, enquanto a 1.ª instância condenou a ré no pagamento de uma indemnização pela perda das utilidades da viatura sinistrada, a Relação condenou-a no pagamento de uma indemnização pelos encargos adicionais com a obtenção de uma nova viatura em substituição da anterior, surgindo essa diminuição do património como um dano emergente próprio, o que é substancialmente diverso da decisão de 1.ª instância que determinou essa indemnização atendendo à privação do uso da viatura sinistrada, ou seja, apenas às utilidades desse veículo que deixaram de ser usufruídas pela autora, sem ter em conta as despesas decorrentes da referida obtenção de nova viatura.
O enquadramento jurídico do dano é, assim distinto, o que nos permite concluir que a fundamentação das duas decisões é essencialmente diferente, não se verificando o obstáculo da dupla conforme, sendo por isso admissível a revista.
2.) SABER SE O ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRIBUNAL A QUO É NULO POR EXCESSO DE PRONÚNCIA (ART. 615º/1/D, DO CPCIVIL), POR TER A RELAÇÃO ULTRAPASSADO OS LIMITES DA PRETENSÃO DEDUZIDA, AO CONDENAR A RECORRENTE NO PAGAMENTO DE UMA INDEMNIZAÇÃO POR UM “DANO AUTÓNOMO” MERAMENTE TEÓRICO E PRESUMIDO, QUE NÃO FOI ALEGADO E CUJO RESSARCIMENTO NÃO FOI PEDIDO, COM BASE EM FACTOS NÃO ALEGADOS E SOBRE OS QUAIS NÃO FOI FEITA PROVA, VIOLANDO OS PRINCÍPIOS DO DISPOSITIVO E DO CONTRADITÓRIO (ARTS. 5º/1 E 3º/3 DO CPCIVIL), BEM COMO O PRINCÍPIO DA ESTABILIDADE DA INSTÂNCIA (ART. 260º DO CPCIVIL).
Quanto a este vicio da decisão recorrida, a recorrente apresentou as seguintes conclusões:
“q. Com efeito, conforme supramencionado, a Recorrida invocou, na petição inicial, o dano decorrente da privação do uso do veículo, que alicerçou num conjunto de factos que alegou e que foram julgados provados em 1.ª instância, determinando a condenação da Recorrente no pagamento de uma indemnização pelo invocado dano da privação do uso.
r. Na sequência do recurso interposto daquela decisão pela Recorrente, o Tribunal da Relação de Coimbra concluiu pela inexistência de um dano da privação do uso durante a totalidade do período relativamente ao qual a Recorrida alegara ter-se visto privada da utilização do veículo sinistrado, o que deveria ter determinado a procedência da apelação e a consequente absolvição da Recorrente do pedido.
s. Contudo, a Relação, não se contendo dentro dos limites da pretensão deduzida (como impõe o princípio do dispositivo), decidiu ainda assim condenar a Recorrente no pagamento de uma indemnização, que suportou no facto de, no seu entender, a Recorrida ter efetuado, com a aquisição de nova viatura, uma despesa adicional, suportada por período de tempo prolongado, sem recebimento do capital seguro, por facto imputável à seguradora, o que, no seu entender, constituiria um “dano autónomo”
t. Sucede que este “dano autónomo” que o Tribunal considerou ter-se constituído, não foi invocado e assenta em factos não alegados e sobre os quais não foi feita prova, pelo que a decisão viola os princípios do dispositivo e do contraditório (artigos 5.º, n.º 1 e 3.º, n.º 3 do CPC), bem como o princípio da estabilidade da instância (artigo 260.º do CPC).
u. Trata-se de um dano meramente teórico e presumido, que não foi alegado e cujo ressarcimento não foi pedido, concluindo-se que não poderia ter sido conhecido, por extravasar manifestamente o objeto do processo”.
Assim, concluiu que “O Acórdão enferma, nestes termos, da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC”.
O tribunal a quo pronunciou-se sobre a arguida nulidade, indeferindo a sua verificação, argumentando que “a decisão proferida se baseia nos factos alegados e demonstrados, e atende também a um dano alegado, assente nos efeitos patrimoniais negativos decorrentes da privação da viatura. E continua em causa o dano derivado da privação, variando apenas a sua configuração. Donde se considerar não ocorrer o vício invocado.”
Vejamos a questão.
É nula a sentença quando o juiz conheça de questões de que não podia tomar conhecimento – art. 615º/1/d, do CPCivil.
Não podendo o juiz conhecer de causas de pedir não invocadas, nem de exceções, não invocadas, que estejam na exclusiva disponibilidade das partes (art. 608º-2), é nula a sentença em que o faça36.
Encontra-se vedado ao juiz conhecer de causas de pedir não invocadas ou de exceções que não sejam do seu conhecimento oficioso (art. 608º/2, 2º segmento)37.
Quando a lei se refere a questões está a querer dizer que o conhecimento do juiz deve abarcar todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir invocadas e todas as exceções suscitadas, o que significa que o juiz só cometerá a nulidade de excesso de pronúncia se conhecer de causa de pedir não invocada38.
Trata-se de nulidade relacionada com a 2ª parte do nº 2 do art. 608º, onde se proíbe ao juiz de ocupar-se de questões que as partes não tenham suscitado, a menos que a lei lho permita ou lhe imponha o conhecimento oficioso.
Porém, nos termos do disposto no art. 5º/3, do CPCivil “o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito” (“jura novit curia”).
No âmbito deste princípio, a jurisprudência constante do Supremo Tribunal de Justiça tem admitido a convolação da configuração jurídico-normativa atribuída pelo autor ao pedido ou à causa de pedir. Ou seja, e no que respeita ao pedido formulado, a errada qualificação jurídica do mesmo não impede o juiz de, observado o princípio do dispositivo, declarar pedido diferente, conforme a referida norma prevista no art. 5º/3 do CPCivil.
Como exemplos desta jurisprudência, salienta-se, desde logo, o Assento do STJ n.º 4/95 de 28/3/9539, no qual se uniformizou a jurisprudência no seguinte sentido: “Quando o Tribunal conhecer oficiosamente da nulidade de negócio jurídico invocado no pressuposto da sua validade, e se na ação tiverem sido fixados os necessários factos materiais, deve a parte ser condenada na restituição do recebido, com fundamento no n.º 1 do artigo 289.º do Código Civil”40.
A mesma orientação foi seguida no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 3/200141, no qual se uniformizou a jurisprudência no sentido de que: “Tendo o autor, em ação de impugnação pauliana, pedido a declaração de nulidade ou a anulação do ato jurídico impugnado, tratando-se de erro na qualificação jurídica do efeito pretendido, que é a ineficácia do ato em relação ao autor (nº1 do art. 616º do CC), o juiz deve corrigir oficiosamente tal erro e declarar a ineficácia, como permitido pelo art. 664º do CPC.”.
O que identifica a pretensão material do autor, o efeito jurídico que ele visa alcançar, enquanto elemento individualizador da ação, é o efeito prático-jurídico por ele pretendido e não a exata caracterização jurídico-normativa da pretensão material, a sua qualificação ou subsunção no âmbito de certa figura ou instituto jurídico, sendo lícito ao tribunal, alterando ou corrigindo tal coloração jurídica, convolar para o decretamento do efeito jurídico adequado à situação litigiosa, sem que tal represente o julgamento de objeto diverso do peticionado. É lícito ao tribunal, através de uma requalificação ou reconfiguração normativa do pedido, atribuir ao autor, por uma via jurídica não coincidente com a que estava subjacente à pretensão material deduzida, o bem jurídico que ele pretendia obter; mas já não será processualmente admissível atribuir-lhe, sob a capa de tal reconfiguração da materialidade do pedido, bens ou direitos substancialmente diversos do que o autor procurava obter através da pretensão que efetivamente, na sua estratégia processual, curou de formular.
A convolação do pedido há de respeitar um princípio de correspondência ou congruência entre o pedido deduzido e a pronúncia jurisdicional obtida pela parte, devendo o decidido pelo juiz adequar-se às pretensões formuladas, ser com elas harmónico ou congruente, sob pena de se verificar a nulidade da sentença por excesso de pronúncia42,43,44,45.
O nosso atual modelo de processo civil, assente no primado do direito substantivo sobre o direito adjetivo e no princípio da gestão processual, toma inevitável a flexibilização do princípio do pedido contido no art. 609º/1, do CPCivil, no sentido da necessidade de se apreender realmente o âmbito objetivo do pedido que foi formulado na ação46,47.
Reportando-nos ao caso dos autos, tudo se resumirá em saber se a convolação oficiosa do pedido de indemnização formulado pela autora respeita o princípio de correspondência ou congruência entre o pedido deduzido e a pronúncia jurisdicional obtida pela parte.
Na presente ação, a autora pede o ressarcimento dos danos decorrentes do incumprimento da ré do contrato de seguro de danos próprios celebrado pelas partes, no que respeita à demora no pagamento do capital seguro decorrente da perda total do veículo sinistrado.
Como foi salientado no acórdão do tribunal a quo que se pronunciou sobre as nulidades arguidas, a pretensão da autora assenta nos efeitos patrimoniais negativos decorrentes da privação da viatura sinistrada.
O que identifica a pretensão material do autor, o efeito jurídico que ele visa alcançar, enquanto elemento individualizador da ação, é o efeito prático-jurídico por ele pretendido e não a exata caracterização jurídico-normativa da pretensão material, a sua qualificação ou subsunção no âmbito de certa figura ou instituto jurídico.
Ora, o efeito prático-jurídico pretendido pela autora na presente ação é a reconstituição da situação que existiria se a ré tivesse cumprido atempadamente as obrigações decorrentes do contrato de seguro de danos próprios.
Com efeito, a autora configurou o seu pedido de indemnização com referência à perda das utilidades decorrentes da viatura sinistrada, calculando a indemnização peticionada tendo por referência o valor diário de aluguer de uma viatura com as mesmas características, ou caso assim não se entendesse, “pelos valores das rendas do ALD vencidas e pagas desde o mês do sinistro até integral reconstituição da situação existente antes do acidente”.
No entanto, a autora não omitiu na sua petição inicial que, perante a informação prestada pelo apoio ao cliente da ré, no início do mês de maio de 2019, de que no processo estava o relatório do perito e que o mesmo apontava para a perda total do veículo, além de que já tinham o valor do salvado, tendo em conta que o prazo da viatura de substituição estava a terminar, procedeu à encomenda de uma nova viatura para substituir a viatura sinistrada.
Alegou igualmente que a nova viatura, igual à sinistrada, lhe foi entregue em 29-05-2019, e que teve um custo de 100 980,00€.
Porém, posteriormente a essa obtenção de nova viatura, alegou que se verificaram uma série de recuos e demoras abusivas e injustificadas da ré no pagamento do valor devido pela perda total da viatura que culminou com a decisão da mesma em a reparar, o que por si não foi aceite.
Assim, como já referido, a pretensão da autora assenta na “reconstituição da situação existente antes do acidente”.
Assim sendo, e seguindo a citada jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, será lícito ao tribunal, alterando ou corrigindo a qualificação atribuída pela parte, ou seja, a configuração do concreto dano cuja reparação é peticionada, calcular tal dano com base nos encargos suportados com a obtenção do novo veículo com as mesmas características do anterior - despesas adicionais emergentes, por imobilização de capital, pelo preço adicional do capital, etc.
Quer a configuração do dano constante da petição inicial, quer a configuração realizada no acórdão recorrido, têm a mesma base, ou seja, a diminuição do património do lesado/credor provocada pelo sinistro e pela impossibilidade de usufruir das utilidades da viatura sinistrada.
Em vez da perda de uso, a Relação considerou a despesa tida com a obtenção de novo veículo com as mesmas características, como dano/despesa emergente próprio.
Por outro lado, ao contrário do que é alegado pela recorrente, o tribunal a quo baseou a sua decisão unicamente nos factos que resultaram provados e não em qualquer outra factualidade.
Sobre a indemnização em causa é referido pelo tribunal a quo que “a discussão que poderia subsistir prende-se com a suficiência dos factos apurados para revelar este dano. Mas assente a aquisição da nova viatura por um valor considerável, deve aceitar-se que esta transação envolve efeitos negativos seguros no património da A. nos termos referidos (no mínimo, os custos de capital imobilizado), e assim danos ressarcíveis (questão diferente é a que se prende com a sua quantificação)”.
Com efeito, consta dos factos provados que a autora adquiriu uma nova viatura, a data em que o fez e o respetivo valor de aquisição.
Cremos, assim, que a Relação se limitou a convolar o pedido de indemnização formulado pela autora para o decretamento do efeito jurídico adequado à situação litigiosa, sem que tal represente o julgamento de objeto diverso do peticionado.
O bem jurídico pretendido pela autora é exatamente o mesmo e assenta na diminuição do seu património devido à impossibilidade de utilizar a sua viatura, o que pode corresponder, quer à perda das utilidades desse bem, quer aos encargos suportados com a obtenção de viatura de substituição que forneça as mesmas utilidades.
Não está em causa na decisão recorrida a reconfiguração normativa do pedido para bens ou direitos substancialmente diversos do que a autora procurava obter através da pretensão que efetivamente, na sua estratégia processual, curou de formular.
Concluindo, não vislumbramos qualquer excesso de pronúncia no acórdão recorrido, não se verificando a nulidade arguida.
Donde que o recurso improcede, quanto à imputação à decisão sob recurso da nulidade prevista no art. 615º/1/d, 2ª parte, do CPCivil (excesso de pronúncia/pronúncia indevida).
Destarte, não se verificando a nulidade arguida pela recorrente, improcede a conclusão T), do recurso de revista.
3.) SABER SE O ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRIBUNAL A QUO É NULO POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA (ART. 615º/1/D, DO CPCIVIL), NA PARTE EM QUE NÃO CONHECEU DA QUANTIFICAÇÃO DO DANO, DESIGNADAMENTE ATRAVÉS DO APELO À EQUIDADE, CONSIDERANDO QUE A RECORRENTE NÃO DISCUTIU NO RECURSO DE APELAÇÃO A OPÇÃO DA DECISÃO DE 1ª INSTÂNCIA QUANTO AO APELO À EQUIDADE NA LIQUIDAÇÃO DO DANO, NEM A FORMA COMO SE OPEROU A SUA QUANTIFICAÇÃO, CONCLUINDO QUE TAIS QUESTÕES SE SITUAM FORA DO ÂMBITO DO RECURSO.
Quanto a este vicio da decisão recorrida, a recorrente apresentou as seguintes conclusões:
“w. Acresce que improcede a tese vertida no Acórdão a quo segundo a qual, ao considerar que a Recorrente não discutiu no recurso a opção da decisão de 1.ª instância quanto ao apelo à equidade na liquidação do dano, nem a forma como se operou a sua quantificação, tais questões se situam em princípio fora do âmbito do recurso.
x. Isto porque é evidente que a Recorrente, ao impugnar a existência de um dano, está também a discutir a sua quantificação, e ainda porque o conhecimento da equidade e a aplicação de critérios de equidade configura uma questão de direito”.
Assim, concluiu que “não tendo conhecido da quantificação do dano, designadamente através do apelo à equidade, o Tribunal incorreu em erro na aplicação do Direito e não se pronunciou sobre questão que devia apreciar, o que configura a nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), primeira parte do CPC”.
O tribunal a quo, na sua fundamentação, no que respeita à quantificação do dano, referiu que:
“12. A R. não discutiu no recurso a opção da decisão recorrida quanto ao apelo à equidade na liquidação do dano, nem discutiu a forma como se operou a quantificação do dano (com base naquela equidade) e assim o valor alcançado (não discutiu o modelo, assente na equidade, e os fatores utilizados, ou o valor encontrado), tendo apenas questionado a existência do dano. Significa isto que tais questões se situam em princípio fora do âmbito do recurso. Mas porque se alterou o prazo relevante, e assim se eliminou parcialmente o dano, o valor arbitrado tem que ser alterado em função, e apenas em função (porque no mais é questão não trazida ao recurso), daquela modificação. Como o critério de quantificação usado não foi discutido, deverá fazer-se repercutir o prazo excluído (21 dias) no prazo global (423 dias) e da mesma forma, proporcionalmente, no valor arbitrado, fixando-se este valor em 35.173 euros”.
O tribunal a quo pronunciou-se sobre a arguida nulidade, indeferindo a sua verificação, argumentando que “a decisão em causa considerou justamente que a questão não foi colocada no recurso, não havendo assim que dela conhecer. A avaliação pode estar incorreta, mas não pode é afirmar-se que existe omissão de pronúncia”.
Vejamos a questão.
As decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas – art. 154º/1, do CPCivil.
Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência – art. 607º/4, do CPCivil.
É nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão – artigo 615º/1/b, do CPCivil ex vi do art. 666º/1, ambos do CPCivil.
É nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento – art. 615º/1/d ex vi do art. 666º/1, ambos do CPCivil.
A omissão de pronúncia constitui uma nulidade da decisão judicial prevista no art. 615°/1/d, do CPCivil, quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que deva apreciar (incumprimento do dever prescrito no art. 608°/2, do CPCivil)48,49,50,51,52.
A omissão de pronúncia está relacionada com o comando contido no art. 608º/2, do CPCivil, exigindo ao juiz que resolva todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, “excetuadas aquelas cujas decisões estejam prejudicadas pela solução dada a outras”53,54, 55,56,57,58.
São coisas diferentes deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte59,60,61,62.
No entanto, importa não confundir questões colocadas pelas partes, com os argumentos ou razões, que estas esgrimem em ordem à decisão dessas questões neste ou naquele sentido. As questões submetidas à apreciação do tribunal identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as exceções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio63.
Diferente das questões a dirimir/decidir são os argumentos, as razões jurídicas alegadas pelas partes em defesa dos seus pontos de vista, que não constituem questões no sentido do art. 608.º/2, do CPCivil64.
Constitui, pois, jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça, que a nulidade da decisão por omissão de pronúncia “apenas se verificará nos casos em que ocorra omissão absoluta de conhecimentos relativamente a cada questão e já não quando seja meramente deficiente ou quando se tenham descurado as razões e argumentos invocados pelas partes”65,66,67,68.
Nos autos, a questão que, segundo os recorrentes, foi submetida à apreciação do tribunal recorrido e, não foi por este apreciada, traduziu-se na quantificação do efetivo dano sofrido pela autora e consequente medida da indemnização a seu cargo.
Ora, atento o teor da fundamentação do acórdão recorrido, podemos constatar que o tribunal se pronunciou sobre tal matéria no sentido de a mesma não integrar o objeto do recurso de apelação, defendendo que a recorrente não questionou o critério da quantificação do dano seguido pela 1.ª instância.
No entanto, porque foi alterado o prazo relevante para a quantificação desse dano, alterou o valor arbitrado em função dessa modificação temporal, fazendo repercutir o prazo excluído (21 dias), proporcionalmente, na redução do valor arbitrado, fixando-o em 35 173€.
Afigura-se-nos que a conclusão alcançada pelo tribunal recorrido seria correta se tivesse mantido a mesma configuração do dano constante da petição inicial e que mereceu provimento pela 1.ª instância o que, não sucedeu.
Enquanto a 1.ª instância condenou a ré no pagamento de uma indemnização pela perda das utilidades da viatura sinistrada, o Tribunal da Relação condenou-a no pagamento de uma indemnização pelos encargos adicionais com a obtenção de uma nova viatura em substituição da anterior, surgindo essa diminuição do património como um dano emergente próprio, o que é substancialmente diverso da decisão da 1.ª instância que determinou essa indemnização atendendo à privação do uso da viatura sinistrada, ou seja, apenas às utilidades desse veículo que deixaram de ser usufruídas pela autora, sem ter em conta as despesas decorrentes da obtenção de nova viatura.
No recurso de apelação, a apelante coloca em causa a existência do dano da privação do uso do veículo precisamente por defender que “não basta a mera prova da privação do uso, sendo ainda necessário que o lesado alegue e demonstre, para além da impossibilidade de utilização do bem, que aquela privação gerou perda de utilidades que tal bem lhe proporcionava”.
Sendo que, no caso dos autos, “tendo sido facultada à recorrida uma viatura de substituição, e tendo-lhe sido posteriormente entregue uma viatura igual à sinistrada, não se verifica qualquer perda das utilidades que lhe eram proporcionadas pela viatura sinistrada, porquanto tais utilidades lhe continuaram a ser proporcionadas pelas referidas viaturas”.
Essa argumentação da recorrente tornou desnecessária a impugnação dos critérios seguidos na quantificação do dano apurado, atendendo à negação da existência de um efetivo dano.
O Tribunal da Relação deu parcial razão à apelante, concluindo que a obtenção de uma nova viatura pela autora recorrida substitui a anterior e elimina o dano (puro ou próprio) da privação de uso, pois as utilidades colhidas da viatura acidentada passaram a ser satisfeitas pela viatura de substituição.
No entanto, considerou o Tribunal da Relação “que essa substituição foi suportada pela A. e implica encargos que podem ser enquadrados no âmbito das despesas (ou danos) indemnizáveis. Aqui, a privação desaparece mas dá lugar a outras consequências, analisadas, em sentido amplo, no desvalor patrimonial subsequente ao facto lesivo mas nele radicado”.
Como já referido, o Tribunal da Relação alterou oficiosamente a configuração do dano, condenando a ré no pagamento de uma indemnização pelos encargos adicionais com a obtenção da nova viatura, em substituição da anterior, surgindo essa diminuição do património como um dano emergente próprio e autónomo.
Apesar de o dano continuar a ter na sua génese a privação do uso da viatura sinistrada e consequente necessidade de aquisição de um novo veículo que proporcionasse as mesmas utilidades, a configuração desse dano deixou de assentar na simples perda das referidas utilidades do veículo sinistrado, passando a reportar-se aos encargos financeiros decorrentes da aquisição da nova viatura, nomeadamente e, desde logo, as despesas adicionais emergentes, por imobilização de capital, pelo preço adicional do capital despendido com essa aquisição.
Os critérios de quantificação do dano concretamente sofrido pela recorrida não podem ser totalmente similares aos que foram utilizados pela 1.ª instância, pois, ainda que se recorra à equidade, passaram a considerar-se diferentes fatores, não relevados anteriormente, como o preço de aquisição da nova viatura e o período entre a data dessa aquisição e o momento em que for atribuída à autora a indemnização pela perda total da viatura sinistrada.
Nada consta dos autos que nos permita concluir que a recorrente, antes de interpor o recurso de apelação, pudesse contar com a nova configuração do dano que viria a ser realizada pelo Tribunal da Relação, motivo pelo qual não lhe era exigível que impugnasse na apelação a forma de quantificação do dano decorrente da aquisição da nova viatura.
Se a recorrente impugnou a própria existência do dano, por não ter existido perda das utilidades da coisa, algo com o qual o Tribunal da Relação concordou, configurando, no entanto, o dano de forma diversa, necessariamente que o tribunal recorrido tem a obrigação legal de quantificar esse dano, definindo os respetivos critérios.
Estes, ainda que passem pelo recurso à equidade, necessariamente serão diversos da mera consideração do valor médio diário de aluguer de uma viatura com as mesmas características, tendo de contar com os elementos acima descritos relacionados com a aquisição do novo veículo (nomeadamente preço de aquisição e período de tempo decorrido).
Ou seja, a apelante quando não impugnou a forma de cálculo do dano com a configuração realizada pela 1.ª instância, não podia contar com a nova configuração do acórdão recorrido.
Em suma, estamos na presença de uma questão – a quantificação do dano – que foi submetida à apreciação do Tribunal da Relação.
No entanto, cremos que o vício da decisão recorrida não assenta na omissão de pronúncia porque, efetivamente, o Tribunal da Relação pronunciou-se expressamente sobre tal matéria, no sentido de a mesma não integrar o objeto da apelação, motivo pelo qual se devia manter a quantificação do dano operada pela 1.ª instância com a redução proporcional relativa à diminuição do período relevante.
A própria fixação de um valor líquido de indemnização demonstra que existiu pronúncia sobre a matéria em causa.
O que ressalta do teor do acórdão recorrido é que, devido ao entendimento de que tal questão não integrava o objeto da apelação, o que constitui um erro de julgamento do tribunal recorrido, este acabou por não fundamentar a sua decisão no que respeita à quantificação do valor concreto da indemnização devida à autora.
Na verdade, inexistem por completo quaisquer elementos na fundamentação do acórdão recorrido que nos permitam saber quais os concretos critérios seguidos nessa quantificação, não bastando a mera referência à equidade sem qualquer explicação da forma como se alcançou o valor de 35 173,00€.
Ou seja, o vício de que padece o acórdão recorrido não se reconduz a uma omissão de pronúncia, mas antes a uma falta de fundamentação dessa decisão.
A sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (art. 615º/1/b, do CPCivil).
A imposição de fundamentação está consagrada no art. 205º da Constituição da República, e encontra regulamentação processual especifica no caso da decisão da matéria de facto (art. 653-2) e no da sentença (art. 659º/2/3, atual art. 607º/3/4)69.
Hoje, o preceito constitucional impõe o entendimento de que só o despacho de mero expediente não carece, por natureza, de ser fundamentado, outro sendo o caso de toda a decisão que, direta ou indiretamente, interfira no conflito de interesses entre as partes70.
Só é operante a nulidade da decisão, por falta de fundamentação jurídica da decisão, quando haja total omissão dos fundamentos de facto ou de direito em que assenta a decisão71.
Constitui, pois, jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça, que o vício de falta de fundamentação só se verifica quando falte em absoluto a indicação dos fundamentos da decisão e já não quando a fundamentação seja meramente deficiente, incompleta, aligeirada ou não exaustiva72,73,74,75,76.
Nos autos, o Tribunal da Relação pronunciou-se sobre a questão da quantificação do dano, fixando um valor líquido devido pela ré, mas a fundamentação é completamente omissa sobre os critérios que foram seguidos para apurar esse valor.
É dito que a indemnização deve ser reduzida em razão da exclusão do período de 21 dias, reduzindo-se proporcionalmente o valor fixado pela 1.ª instância - 37 012,50€ – mas nada é dito sobre a forma como se alcançou este último valor.
Existe uma total ausência de fundamentação dessa parte da decisão, não se enunciando qualquer argumento, por mínimo que seja, que sustente aquele valor concreto.
Apesar da recorrente não ter arguido expressamente o vício da falta de fundamentação, cremos tratar-se meramente de um caso de alteração da qualificação jurídica da pretensão deduzida, pois foi alegada a génese do vício consistente na falta de explicação na decisão recorrida sobre a forma como se alcançou o valor concreto da indemnização fixada, o que consubstancia o vício de falta de fundamentação e não o de omissão de pronúncia77.
Concluindo, apesar de o tribunal a quo se ter pronunciado sobre a questão da quantificação do dano, fixando um valor líquido devido pela ré, porém, a fundamentação é completamente omissa sobre os critérios que foram seguidos para apurar esse valor.
Em face do exposto, consideramos que deve ser declarada a nulidade do acórdão recorrido por manifesta falta de fundamentação, com a consequente baixa dos autos à Relação para efeitos tidos por convenientes.
Nestes termos, é manifesto que a decisão recorrida padece da nulidade prevista no art. 615°/1/b ex vi do art.666º/1, ambos do CPCivil (manifesta falta de fundamentação), pois não foram enunciados os critérios seguidos para apurar o valor concreto que fixou.
Destarte, não tendo o tribunal a quo fundamentado os critérios que foram seguidos para apurar o valor fixado a título de indemnização, o que consubstancia a nulidade de falta de fundamentação, a decisão recorrida deve ser anulada com esse fundamento, na parte em que não enunciou os critérios seguidos para apurar esse valor concreto que fixou.
Não estando tal vício previsto no art. 684º/1, do CPCivil, nos termos do n.º 2 do mesmo preceito, deve o processo baixar ao tribunal a quo para reforma da decisão anulada, fundamentando-se quais os critérios seguidos para apurar o valor concreto que fixou, se possível, pelos mesmos juízes.
O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras – art. 608º/2, ex vi, do art. 663º/2, ambos do CPCivil.
Do princípio de que a sentença deve resolver todas as questões suscitadas pelas partes excetuam-se «aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras».
Se o tribunal, v.g., se declara incompetente para conhecer do pedido, em razão da matéria ou da hierarquia, não faria sentido que na sentença se pronunciasse ainda sobre as questões levantadas pelas partes quanto ao mérito da causa78.
Assim, com a anulação do acórdão do tribunal a quo e, determinando-se que aprecie as questões omitidas, o conhecimento da questão (erro de direito do acórdão recorrido ao condenar a recorrente à margem de qualquer dano invocado/provado), mostra-se prejudicada79,80,81,82,83,84,85,86.
3. DISPOSITIVO
3.1. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desta secção cível (1ª) do Supremo Tribunal de Justiça em julgar procedente a revista e, consequentemente, por verificada a nulidade por falta de fundamentação, em anular-se o acórdão recorrido, na parte em que se absteve de enunciar os critérios seguidos para apurar o valor indemnizatório concreto que fixou, devendo os autos baixar ao tribunal a quo para reforma da decisão anulada, fundamentando-se a forma como se operou a quantificação do dano sofrido pela recorrida, se possível, pelos mesmos juízes.
3.2. REGIME DE CUSTAS
Custas pela recorrida (na vertente de custas de parte, por outras não haver87), porquanto a elas deu causa por ter ficado vencida (no recurso de revista, tenha ou não acompanhado o recurso, é o vencido responsável pelo pagamento das custas88)89.
(Nelson Borges Carneiro) – Relator
(Maria Clara Sottomayor) – 1º adjunto
(Jorge Arcanjo) – 2º adjunto
_____________________________________________
1. As decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos – art. 627º/1, do CPCivil.↩︎
2. Recursos, «em sentido técnico-jurídico, são os meios específicos de impugnação das decisões judiciais, através dos quais se obtém o reexame da matéria apreciada pela decisão recorrida» – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 463.↩︎
3. No nosso sistema processual (no que à apelação e à revista) predomina o «esquema do recurso de reponderação»: o objeto do recurso é a decisão impugnada, encontrando-se à partida, vedada a produção defeitos jurídicos ex-novo. Através do recurso, o que se visa é a impugnação de uma decisão já ex-ante proferida que não o julgamento de uma qualquer questão nova. Uma relevante exceção ao modelo de reponderação é a que se traduz nas questões de conhecimento oficioso: o tribunal superior pode sempre apreciar qualquer dessas questões ainda que não suscitadas perante o tribunal a quo – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 468.↩︎
4. Os recursos são ordinários ou extraordinários, sendo ordinários os recursos de apelação e de revista e extraordinários o recurso para uniformização de jurisprudência e a revisão – art. 627º/2, do CPCivil.↩︎
5. A lei estabelece uma divisão entre recursos ordinários e recursos extraordinários a partir de um critério formal ligado ao trânsito em julgado da decisão. Enquanto os recursos ordinários pressupõem que ainda não ocorreu o trânsito em julgado, devolvendo-se ao tribunal de recurso a possibilidade de anular, revogar ou modificar a decisão, os recursos extraordinários são interpostos depois daquele trânsito – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 777.↩︎
6. Aquele que interpõe o recurso – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 477.↩︎
7. Aquele contra quem se interpõe o recurso – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 477.↩︎
8. O juiz que lavrar o acórdão deve sumariá-lo – art. 663º/7, do CPCivil.↩︎
9. O sumário não faz parte da decisão, consistindo tão só numa síntese daquilo que fundamentalmente foi apreciado com mero valor de divulgação jurisprudencial. Por tais motivos, o sumário deve ser destacado do próprio acórdão, sendo da exclusiva responsabilidade do relator – ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, p. 301.↩︎
10. O acórdão principia pelo relatório, em que se enunciam sucintamente as questões a decidir no recurso, expõe de seguida os fundamentos e conclui pela decisão, observando-se, na parte aplicável, o preceituado nos artigos 607.º a 612.º – art. 663º/2, do CPCivil.↩︎
11. Para além do dever de apresentar a sua alegação, impende sobre o recorrente o ónus de nela concluir, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão – ónus de formular conclusões (art. 639º/1) – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 503.↩︎
12. As conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objeto do recurso, como clara e inequivocamente resulta do art. 639º/3. Conforme ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que o recorrente pretende obter do tribunal superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal a quo – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 795.↩︎
13. O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar, as normas jurídicas violadas; o sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, e invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada – art. 639º/1/2 ex vi do art. 679º, ambos do CPCivil.↩︎
14. Depois de formular conclusões, o recorrente termina deduzindo um pedido de revogação, total ou parcial, de uma decisão judicial – RUI PINTO, Manual do Recurso Civil, Volume I, AAFDL Editora, Lisboa, 2020, p. 293.↩︎
15. Na sessão anterior ao julgamento do recurso, o processo, acompanhado com o projeto de acórdão, vai com vista simultânea, por meios eletrónicos, aos dois juízes-adjuntos, pelo prazo de cinco dias, ou, quando tal não for tecnicamente possível, o relator ordena a extração de cópias do projeto de acórdão e das peças processuais relevantes para a apreciação do objeto da apelação – art. 657º/2 ex vi do art. 679º, ambos do CPCivil.↩︎
16. Todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas, não podendo de elas conhecer o tribunal de recurso.↩︎
17. Vem sendo entendido que o vocábulo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir.↩︎
18. Aditado pelo Tribunal da Relação.↩︎
19. Aditado pelo Tribunal da Relação.↩︎
20. Relativamente a questões de conhecimento oficioso e que, por isso mesmo, não foram suscitadas anteriormente, deve ser assegurado o contraditório, nos termos do art. 3º/3, do CPCivil.↩︎
21. FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 572.↩︎
22. FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 574.↩︎
23. FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 574.↩︎
24. FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 574.↩︎
25. Diário da República n.º 201/2022, Série I de 2022-10-18.↩︎
26. O critério fixado no acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 7/2022, de 20 de Setembro de 2022, deve aplicar-se, a pari, à responsabilidade fundada no risco. Face ao acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 7/2022, de 20 de Setembro de 2022: deve averiguar-se se há segmentos decisórios autónomos e cindíveis; em caso afirmativo, e em relação a cada um dos segmentos decisórios autónomos e cindíveis, deve averiguar-se se o acórdão do Tribunal da Relação confirma a decisão do Tribunal de 1.ª instância; em caso afirmativo, e em relação a cada um dos segmentos decisórios autónomos e distintos em que o acórdão da Relação confirme a decisão do Tribunal de 1.º instância, deve averiguar-se o confirma sem fundamentação essencialmente diferente – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2022-12-15, Relator: NUNO PINTO OLIVEIRA, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
27. No caso dos autos, na parte em que a decisão da Relação difere da decisão da 1.ª instância, tal decisão é mais favorável ao recorrente pelo que, de acordo com a orientação consolidada da jurisprudência do STJ, ocorre quanto a ela o obstáculo da dupla conforme previsto no n.º 3 do art. 671.º do CPC. – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-09-12, Relatora: MARIA DA GRAÇA TRIGO, https://www. dgsi.pt/jstj.↩︎
28. Não é admissível recurso de revista nos casos em que o acórdão da Relação confirme sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diversa, a decisão produzida pelo primeiro grau, cfr. art. 671.º, n.º 3, do CPC. Embora a matéria de facto tenha sido alterada, assim como a taxa de juros, a qual passou de 4% para 2%, mantem-se a conformidade das decisões – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2022-03-15, Relatora: ANA PAULA BOULAROT, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
29. A condenação nos juros de mora sobre o montante indemnizatório, na responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, de acordo com a redação do art.º 805.º n.º 3 CCiv, tem a ver apenas com a depreciação do valor do pedido, face à data da sentença; não sendo esse o caso de ponderação do dano no processo, os juros devem contar-se a partir da data da sentença ou a partir da data do acórdão em 2.ª instância, consoante os casos, por aplicação da doutrina do AUJ n.º 4/2002, de 9/5/2002 – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2022-02-10, Relator: VIEIRA E CUNHA, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
30. Sempre que a Relação pronuncie uma decisão que é mais favorável ao apelante – tanto no aspeto quantitativo, como no aspeto qualitativo – do que a decisão proferida pela 1.ª instância, está-se perante duas decisões conformes – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2022-01-12, Relator: VIEIRA E CUNHA, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
31. Na hipótese em que o acórdão recorrido se traduz, por cotejo com a sentença da 1.ª instância, numa situação qualitativa ou quantitativamente mais favorável ao recorrente (o que implica uma redução da sucumbência), é de considerar, por coerência na interpretação do conceito de dupla conforme, que o acórdão da Relação não admite recurso de revista. É que, se as decisões fossem integralmente sobreponíveis, não admitiria igualmente recurso – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2022-12-14, Relatora: MARIA CLARA SOTTOMAYOR, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
32. Verificando-se que o autor obteve decisão (acórdão) que lhe é mais favorável do que se fosse confirmação integral da sentença, conforme entendimento quer a doutrina, quer a jurisprudência, em situações como a que se verifica nos autos há dupla conforme, para efeitos do previsto no art. 671º, nº 3 do CPC – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-10-07, Relator: JORGE DIAS, https://www. dgsi .pt/jstj.↩︎
33. Existe dupla conformidade entre as decisões das instâncias sempre que o Apelante obtém uma decisão que lhe é mais favorável, quantitativa ou qualitativamente, posto que não faria sentido que o mesmo ficasse impedido de lançar mão da revista normal caso o TR houvesse confirmado integralmente o decidido pela 1.ª instância e que já o pudesse fazer numa situação em que obteve melhor resultado – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-10-19, Relatora: MARIA JOÃO VAZ TOMÉ, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
34. É de equiparar à dupla conforme os casos em que o acórdão recorrido, não sendo inteiramente coincidente com a decisão da 1.ª instância, divirja dela em sentido mais favorável ao recorrente – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2020-11-17, Relator: FERNANDO SAMÕES, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
35. Há dupla conforme impeditiva de recurso de revista se o apelante obteve na Relação uma decisão que lhe é mais favorável, tanto no aspeto quantitativo, como no aspeto qualitativo, do que a decisão proferida pela 1ª instância – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2018-05-24, Relatora: ROSA RIBEIRO COELHO, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
36. LEBRE DE FREITAS, A Ação Declarativa Comum, À Luz do Código de Processo Civil de 2013, 4ª ed., p. 383.↩︎
37. FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 437.↩︎
38. Ac. Tribunal da Relação de Coimbra de 2018-01-09, Relator: MOREIRA DO CARMO, http://www.dgsi.pt/jtrc.↩︎
39. Diário da República, I Série-A, de 17-05-1995.↩︎
40. O que estava em causa na controvérsia jurisprudencial dirimida pelo citado assento era a questão da admissibilidade de convolação pelo tribunal da configuração jurídico - normativa que o A. dava à causa de pedir em que fundava a respetivas pretensão, passando a sustentá-la, não no cumprimento de certa relação contratual, mas antes nas consequências legais da declaração oficiosa da nulidade do negócio jurídico invocado como base da pretensão do demandante – envolvendo ainda tal reconfiguração jurídica da «causa petendi» uma alteração na configuração jurídica do próprio pedido, da pretensão material deduzida, que deixava de assentar na obtenção de uma prestação por via do contrato, para passar a incidir sobre a obtenção de determinado bem ou quantia pecuniária como mera decorrência da declaração oficiosa de nulidade dessa relação contratual. Subjacente ao assento está, pois, não apenas o reconhecimento de que é lícito ao Tribunal convolar para uma qualificação jurídica da causa de pedir diferente da formulada pelo A. – no caso, como decorrência da inquestionável possibilidade de conhecimento oficioso das nulidades da ato jurídico - mas também a admissibilidade de uma inovatória qualificação da pretensão material deduzida, cuja identificação não se faz apenas em função das normas e do instituto jurídico invocado pelo A., mas essencialmente através do efeito prático-jurídico que este pretende alcançar (só assim se explicando que o tribunal possa atribuir o bem, valor ou montante pecuniário pedido, não em consequência ou a título de cumprimento do contrato em que se consubstanciava a causa de pedir, mas através da figura do dever de restituir tudo aquilo que se obteve em consequência de um negócio oficiosamente tido por nulo) – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2016-04-07, Relator: LOPES DO REGO, Revista 842/10.9 TBPNF.P2.S1, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
41. Diário da República, I Série-A, de 2001-02-09.↩︎
42. LOPES DO REGO, O princípio dispositivo e os poderes de convolação do juiz no momento da sentença, in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor José Lebre de Freitas, Coimbra Editora, Coimbra, 2013, p. 789.↩︎
43. A restante doutrina nacional tem também seguido a mesma orientação: VAZ SERRA, Anotação ao acórdão do STJ de 15/10/1971, in RLJ, ano 105, págs. 217 e ss.; MIGUEL MESQUITA, A flexibilização do princípio do pedido à luz do moderno CPC – anotação ao Ac. Rel. Porto de 08-07-2010, in RLJ, ano 143, págs. 129 e segs.; MANUEL TOMÉ GOMES, Da Sentença Cível, texto da intervenção nas “Jornadas de Processo Civil” organizadas pelo CEJ que decorreram em Lisboa, em Janeiro de 2014, destacando-se as páginas 44 a 46; TEIXEIRA DE SOUSA, Comentário ao Acórdão do STJ de 4/10/2016 (processo 762/04.6TYLSB.L1.S1), publicado em 25-01-2017 no Blog do Instituto Português do Processo Civil; JOSÉ LEBRE DE FREITAS - ISABEL ALEXANDRE, Código de Processo Civil Anotado, 4ª ed. Reimpressão, Coimbra, Almedina, 2021, anotação ao artigo 609.º; ABRANTES GERALDES - PAULO PIMENTA - PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, 3ª ed, Coimbra, Almedina, 2022, anotação ao artigo 609.º.↩︎
44. A título exemplificativo, na jurisprudência do STJ, vem admitindo a possibilidade de convolação oficiosa do pedido, respeitados que sejam os limites enunciados, os seguintes acórdãos: de 17-06-1992 (Processo 82428, BMJ/418, Julho/1992, pp. 710 e ss.), de 23-09-1999 (Revista 510/99 - 7.ª Secção), de 18-11-2004 (Agravo 2640/04 - 2.ª Secção), de 14-05-2009 (Revista 162/09.1YFLSB - 1.ª Secção), de 05-11-2009 (Revista 308/1999.C1.S1 - 7.ª Secção), de 02-03-2011 (Revista 823/06.7TBLLE.E1.S1 - 7.ª Secção), de 18-01-2018 (Revista 1005/12.4TBPVZ.P1.S1 - 2.ª Secção), de 08-02-2018 (Revista 633/15.1T8VCT.G1.S1 - 2.ª Secção), de 04-10-2018 (Revista 588/12.3TBPVL.G2.S1 - 2.ª Secção), e mais recentemente os acórdãos do STJ de 08-03-2022 (Revista 21074/18.2T8PRT.P1.S1 - 7.ª Secção), de 02-03-2023 (Revista 21025/19.7T8PRT.P1.S1 - 2.ª Secção) e de 09-01-2024 (Revista 95/16.5T8ARC.P1.S1 - 1.ª Secção), todos publicados em www.dgsi.pt.↩︎
45. O Tribunal Constitucional também decidiu não julgar inconstitucionais as normas dos arts. 610º/b, e 616.º, ambos do CCivil, e do art. 661º/1, do CPCivil antigo (correspondente ao atual art. 609º/1, do CPC), quando interpretadas no sentido de permitirem que uma decisão jurisdicional condene em algo qualitativamente diverso do pedido formulado – Ac. do Tribunal Constitucional nº 33/2000 , de 2000-01-12, Relator: VÍTOR NUNES DE ALMEIDA, https://www.tribunalconstitucional.pt/.↩︎
46. Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2018-10-04, Relatora: ROSA TCHING, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
47. A diferente qualificação jurídica feita pelo tribunal arbitral, sem qualquer subversão do pedido ou da causa de pedir, da indemnização peticionada pela demandante pela via do interesse contratual negativo (dano da confiança) e não pela invocada via do art. 289º do CC, não consubstancia condenação em objeto diverso do pedido, nem decisão surpresa por violação do princípio do contraditório, não se verificando, portanto, os fundamentos de anulação da sentença arbitral previstos no art. 46º/3/a, pontos ii) e v), por referência ao art. 30º/b/c/, da LAV – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2017-02-22, Revista n.º 598/15.9YRLSB.S1 - 2.ª Secção, não publicado.↩︎
48. A omissão de pronúncia implica, caso se verifique, de harmonia com o disposto no art. 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, a nulidade do acórdão – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-01-12, Relatora: ANA PAULA BOULAROT, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
49. Se o acórdão recorrido conheceu das questões suscitadas na apelação – embora remetendo para a motivação da sentença e sem explicitar, formalmente, a improcedência dessa apelação –, não incorre em nulidade, por omissão de pronúncia – art. 615.º, n.º 1, al. d), do CPC – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2016-05-17, Relator: PINTO DE ALMEIDA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
50. A nulidade do Acórdão pressupõe a verificação de alguma das hipóteses no artigo 615.º, n.º 1, do CPC. A nulidade por omissão de pronúncia advém da falta de resposta a questões que o Tribunal tenha o dever de responder – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-03-16, Relatora: CATARINA SERRA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
51. O direito adjetivo civil enuncia, imperativamente, no n.º 1, do art.º 615º, aplicável ex vi artºs. 666º, 679º e 685º, todos do Código de Processo Civil, as causas de nulidade do acórdão. Os vícios da nulidade do acórdão correspondem aos casos de irregularidades que põem em causa, nomeadamente, a ininteligibilidade do discurso decisório, em razão do uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de não tratar de questões de que deveria conhecer (omissão de pronúncia) – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-03-07, Relator: OLIVEIRA ABREU, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
52. O tribunal só tem que se pronunciar sobre questões (artigo 660, nº2 do CPC), entendendo-se como tal as concretas controvérsias centrais a dirimir e não os simples argumentos, opiniões, motivos, razões, pareceres, ou doutrinas expendidas pelas partes – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2004-05-13, Relator: FERREIRA GIRÃO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
53. A nulidade por omissão de pronúncia apenas se verifica quando o tribunal deixe de conhecer questões temáticas centrais suscitadas pelos litigantes (ou de que se deva conhecer oficiosamente), cuja resolução não esteja prejudicada pela solução dada a outras, não se considerando como tal os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocados, até porque o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-03-08, Relator: MÁRIO BELO MORGADO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
54. A nulidade das decisões judiciais por omissão de pronúncia, prevista no artigo 668.º, n.º 1, alínea d), primeira parte, do Código de Processo Civil "quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar" - aplicável aos acórdãos das Relações por força do artigo 716.º, n.º 1, e aos acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça por força do artigo 732.º, ambos do mesmo Código - constitui cominação ao incumprimento do disposto na primeira parte do n.º 2 do artigo 660.º do citado Código, segundo o qual "o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras" – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2002-10-16, Relator: MÁRIO TORRES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
55. Verifica-se o vício da omissão de pronúncia, previsto no art. 615.º n.º 1 d), do C.P.C., gerador da nulidade da decisão, quando o tribunal deixe de conhecer qualquer questão colocada pelas partes ou que seja do conhecimento oficioso – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2022-06-01, Relator: PEDRO BRANQUINHO DIAS, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
56. Somente se poderá concluir pela verificação de uma omissão de pronúncia suscetível de integrar a nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do art. 615º do atual CPC, quando uma determinada questão (que não seja mero argumento, consideração ou razão de fundamento) que haja sido suscitada pelas partes, não tenha sido objeto de qualquer apreciação e/ou decisão por parte do juiz – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2020-10-28, Relator: JOSÉ FEITEIRA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
57. Não integra omissão de pronúncia o facto de não se ter conhecido de questão cuja apreciação ficara prejudicada pela decisão dada a outra questão – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2002-04-17, Relator: MÁRIO TORRES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
58. A nulidade do acórdão da Relação por omissão de pronúncia não deriva de omissão de análise de motivação ou argumentação fáctico-jurídica desenvolvida pelas partes, mas de omissão de apreciação de questões propriamente ditas, ou seja, de pontos essenciais de facto ou de direito em que aquelas centralizaram o litígio, incluindo as exceções – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2004-07-01, Relator: SALVADOR DA COSTA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
59. É jurisprudência consensual dos tribunais portugueses que importa não confundir questões (cuja omissão de pronúncia desencadeia nulidade da decisão nos termos da alínea d) do nº 1 do artº 615º do atual CPC) com argumentos, razões ou motivos que são aduzidos pelas partes em defesa ou reforço das suas posições – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2014-11-20, Relator: ÁLVARO RODRIGUES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
60. São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. O que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão – ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil, anotado, vol. 5º, p. 143.↩︎
61. Só existe o dever de o juiz conhecer e decidir questões; não existe tal dever quanto aos argumentos invocados pelas partes para fazer valer as suas pretensões – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-07-14, Relatora: CATARINA SERRA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
62. A Nulidade de sentença/acórdão, por omissão de pronúncia, só ocorre quando o julgador deixe de resolver questões que tenham sido submetidas à sua apreciação pelas partes, a não ser que esse conhecimento fique prejudicado pela solução a outras questões antes apreciadas. O conceito de “questão”, deve ser aferido em função direta do pedido e da causa de pedir aduzidos pelas partes ou da matéria de exceção capaz de conduzir à inconcludência/improcedência da pretensão para a qual se visa obter tutela judicial, dele sendo excluídos os argumentos ou motivos de fundamentação jurídica esgrimidos/aduzidos pelas partes – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2022-10-11, Relator: ISAÍAS PÁDUA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
63. Só há omissão de pronúncia, geradora da nulidade da alínea d) do nº1 do artigo 668º, se a decisão não aborda todas as questões que as partes submeteram à apreciação do tribunal, salvo as prejudicadas por solução dada a outras – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2006-10-31, Relator: SEBASTIÃO PÓVOAS, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
64. A omissão de pronúncia só é causa de nulidade da sentença quando o juiz não conhece questão que devia conhecer, e não quando apenas não tem em conta alguns dos argumentos aduzidos pela parte – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-02-01, Relator: JÚLIO GOMES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
65. O vício de falta de fundamentação só se verifica quando falte em absoluto a indicação dos fundamentos da decisão e já não quando a fundamentação seja meramente deficiente, incompleta, aligeirada ou não exaustiva – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-11-16, Relator: PEDRO LIMA GONÇALVES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
66. Nas conclusões da revista o recorrente confunde falta de fundamentação com eventual fundamentação insuficiente; ora, só a falta de fundamentação constitui causa de nulidade da decisão e, in casu, não se identifica que ocorra uma falta de fundamentação. Há fundamentação, quer por remissão para a sentença, na parte em que o tribunal adere à mesma fundamentação que constava na sentença – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-02-09, Relatora: FÁTIMA GOMES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
67. a nulidade por omissão de pronúncia apenas se verificará nos casos em que a omissão de conhecimento, relativamente a cada questão, é absoluta, e já não quando seja meramente deficiente, e mais ainda quando apenas se tenham descurado algumas razões ou argumentos invocados, assim como quando a apreciação das questões fundamentais à justa decisão da lide tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-01-12, Relator: PAULO FERREIRA DA CUNHA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
68. A omissão de pronúncia prevista no art. 615 nº1 al. d) do CPC como causa de nulidade da sentença ocorre quando o tribunal não conhece da questão que lhe é colocada e não quando não alude nem aprecie todas as razões e fundamentos que o recorrente enuncie e em que se apoie para fazer valer a sua pretensão – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2020-10-12, Relator: MANUEL CAPELO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
69. LEBRE DE FREITAS – JOÃO REDINHA – RUI PINTO, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 302.↩︎
70. LEBRE DE FREITAS – JOÃO REDINHA – RUI PINTO, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 302.↩︎
71. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1992-01-08, BMJ, 413/360.↩︎
72. Só a total falta de fundamentação constitui a nulidade prevista no art. 615.º, n.º 1, al. b), do CPC – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-05-21, Relator: HENRIQUE ARAÚJO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
73. A nulidade das decisões judiciais por falta de fundamentação só ocorre no caso de ausência absoluta, e não quando for sucinta, deficiente, incompleta ou insuficiente, sendo que não abrange eventuais erros de julgamento – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-09-21, Relator: FERNANDO SAMÕES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
74. A nulidade por falta de fundamentação pressupõe uma total ausência de fundamentação de facto e/ou de direito – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-06-08, Relatora: MARIA JOÃO VAZ TOMÉ, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
75. Só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de direito, gera a nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do art.º 615º do Código de Processo Civil – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-12-09, Relator: OLIVEIRA ABREU, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
76. É nulo, por falta de fundamentação, o acórdão da Relação que confirma a decisão recorrida com uma total ausência de referência às razões que suportam tal decisão, tornando inalcançável o caminho que guiou o tribunal da Relação a manter a decisão da 1.ª instância – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-09-14 Relator: RIJO FERREIRA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
77. Analisada a decisão em crise, há que concluir que o tribunal da Relação manteve na íntegra, naquela parte, a decisão da 1.ª instância, fazendo isso mesmo constar do dispositivo do acórdão. Sucede que, nem com um intenso esforço interpretativo se alcança os fundamentos que conduziram a tal decisão, sendo manifesta a total ausência de fundamentos, o que não pode deixar de ser reconduzido a uma situação de nulidade por falta de fundamentação – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-09-14 Relator: RIJO FERREIRA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
78. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, vol. 5º, p. 58.↩︎
79. O juiz deve conhecer de todas as questões suscitadas pelas partes, exceto aquelas cujo conhecimento está prejudicado pela solução dada a outras – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2003-11-13, Relator: LUÍS FONSECA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
80. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, vol. 5º, p. 58.↩︎
81. Nos recursos devem ser conhecidas todas as questões que as partes tenham submetido à apreciação do Tribunal, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, o que se afere caso a caso – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2020-10-13, Relator: PEDRO DE LIMA GONÇALVES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
82. Não constitui omissão de pronúncia, produtora de nulidade, o não conhecimento de questão que se considerou prejudicada face à solução dada a questão anterior – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2009-12-10, Relator: MÁRIO CRUZ, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
83. A nulidade por omissão de pronúncia pressupõe que o tribunal deixe de apreciar alguma questão submetida pelas partes à sua apreciação e que não tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras, pelo que não padece daquele vício o acórdão confirmatório da decisão de declaração de incompetência em razão da matéria, ficando prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2020-12-02, Relator: FERNANDO SAMÕES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
84. Tendo o acórdão reclamado conhecido das questões que lhe competia apreciar, não incorre em nulidade por omissão de pronúncia por não ter respondido, um a um, a todos os argumentos da recorrida ou por não ter apreciado questões com conhecimento prejudicado pela solução dada à anterior questão – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2002-10-16, Relator: MÁRIO TORRES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
85. Estando certa questão prejudicada por solução já dada pelo tribunal, deixa de ser obrigatória a pronúncia sobre tal questão – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2019-05-09, Relator: OLINDO GERALDES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
86. A nulidade por omissão de pronúncia apenas se verifica quando o tribunal deixe de conhecer questões temáticas centrais suscitadas pelos litigantes (ou de que se deva conhecer oficiosamente), cuja resolução não esteja prejudicada pela solução dada a outras – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-03-08, Relator: MÁRIO BELO MORGADO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎
87. Como o conceito de custas stricto sensu é polissémico, porque é suscetível de envolver, nos termos do artigo 529º/1, além da taxa de justiça, que, em regra, não é objeto de condenação – os encargos e as custas de parte, importa que o juiz, ou o coletivo de juízes, nos segmentos condenatórios das partes no pagamento de custas, expressem as vertentes a que a condenação se reporta – SALVADOR DA COSTA, As Custas Processuais, Análise e Comentário, 7ª ed., p. 8.↩︎
88. O princípio da causalidade também funciona em sede de recurso, devendo a parte vencida nele ser condenada no pagamento das custas, ainda que não tenha contra-alegado – SALVADOR DA COSTA, As Custas Processuais, Análise e Comentário, 7ª ed., p. 8.↩︎
89. A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito – art. 527º/1, do CPCivil.↩︎
90. A assinatura eletrónica substitui e dispensa para todos os efeitos a assinatura autógrafa em suporte de papel dos atos processuais – art. 19º/2, da Portaria n.º 280/2013, de 26/08, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 267/2018, de 20/09.↩︎
91. Acórdão assinado digitalmente – certificados apostos no canto superior esquerdo da primeira página.↩︎