LOCATÁRIO
PRIVAÇÃO DE USO
MEIOS POSSESSÓRIOS
EXCEPÇÃO DE NÃO CUMPRIMENTO
CONHECIMENTO OFICIOSO
BOA-FÉ
Sumário

Sumário da Responsabilidade do Relator:
I- Estipula o art.º 1040/1 que se por motivo não atinente à sua pessoa ou à dos seus familiares, o locatário sofre uma privação ou diminuição do gozo da coisa locada, haverá lugar a uma redução da renda ou aluguer proporcional ao tempo da privação ou diminuição e à extensão desta sem prejuízo do disposto na secção anterior seja da possibilidade que assiste ao locatário de efectuar as reparações urgentes com direito ao reembolso (art.º 1036 do CCiv) de usar contra o locador os mesmos meios que assistem ao possuidor (art.º 1037 do CCiv), considerar o contrato não cumprido nos termos dos art.ºs 1032, 1033 e 1034, ou pedir a sua resolução. Nas situações do art.º 1032, não ficando o locador liberto da obrigação de assegurar o gozo da coisa, como resultado do art.º 1031, do CCiv, caso o locador não elimine o defeito, pode o locatário exigir uma indemnização pelo prejuízo que lhe advier, não em consequência do não cumprimento do contrato, mas em consequência da existência dos defeitos e da sua não eliminação, tudo isto sem prejuízo do art.º 1040 do CCiv. No caso concreto o locatário não efectuou as reparações no locado nem intentou ou usou quaisquer meios de defesa da posse contra o locador, não pediu a sua resolução, considerou o contrato não cumprido e deixou de pagar as rendas invocando justa causa para o incumprimento dessa obrigação.
II- O artigo 1040º do Código Civil equivale a uma manifestação especial da excepção do contrato não cumprido, prevista nos artigos 428º a 431º do Código Civil; tem-se admitido o funcionamento do instituto mesmo no caso de incumprimento parcial ou de cumprimento defeituoso, mas fazendo intervir então, sempre que as circunstâncias concretas o imponham, o princípio da boa fé e a “válvula de segurança” do abuso do direito (art.ºs 762º, nº 2, e 334º do CC), e isto porque seria contrário à boa fé que um dos contraentes recusasse a sua inteira prestação, só porque a do outro enferma de uma falta mínima ou sem suficiente relevo. Na mesma linha, surge a regra da adequação ou proporcionalidade entre a ofensa do direito do excipiente e o exercício da excepção. Uma prestação significativamente incompleta ou viciada justifica que o outro obrigado reduza a contraprestação a que se acha adstrito, mas, em tal caso, só é razoável que recuse quanto se torne necessário para garantir o seu direito. O recurso do arrendatário a este instituto, se existe cumprimento defeituoso ou parcial pelo senhorio, apenas o dispensa de pagar a renda correspondente à falta verificada. A quantificação pode tornar-se mais ou menos difícil. Quando as partes não chegarem a acordo subsiste o remédio da consignação em depósito, mas o arrendatário corre o risco de o seu cálculo pecar por defeito, depositando uma renda menor do que a devida.
III- A excepção de não cumprimento tem de ser invocada pela parte de forma expressa ou tácita, não podendo ser conhecida oficiosamente pelo juiz, o ónus da prova da exceptio incumbe ao arrendatário.
IV- Provando-se que o arrendatário deixou de cumprir a sua obrigação contratual em momento anterior ao comprovado condicionamento do gozo do locado, tal comportamento retira-lhe a legitimidade pata excepcionar o não cumprimento ao abrigo do disposto no art.º 428 do CCiv.
V- Admitindo-se que, depois da ocorrência que determinou a privação do gozo do locado em 22/10/2020, o arrendatário veio a comunicar essa situação, muito embora se desconheça a data em que o fez, ainda que essa comunicação tivesse tido lugar logo a seguir ao episódio, as obrigações contratuais do arrendatário não terminaram aí na medida em que ao senhorio assistia o direito de inspecionar o locado, avaliar o estado em que ficara e os estragos aí produzidos pelo sinistro, se o arrendatário, comprovadamente, não permitiu que tal ocorresse, se por essa razão o senhorio não só não conseguiu avaliar os estragos produzidos como esteve impossibilitado de proceder à reparação, nessa circunstância a manutenção da privação do gozo do locado (cuja extensão o senhorio desconhecia até finais de Abril de 2022), ficou a dever-se inteiramente ao próprio arrendatário, não lhe assistindo qualquer direito quanto à redução do valor da renda a pagar (ou sua isenção), mantendo-se também aí o decidido.

Texto Integral

Acordam os juízes na 2.ª secção deste Tribunal da Relação

I- RELATÓRIO
APELANTE/RÉ: A … e B …
APELADO/AUTORA: C …, Lda.,
Todos com os sinais dos autos
Valor da acção: € 22.444,65 (vinte e dois mil, quatrocentos e quarenta e quatro euros e sessenta e cinco cêntimos) fixado no despacho saneador
I.1. A Autora propôs contra os réus acção de processo comum pedindo que, pela procedência da acção, seja 1) declarado resolvido o contrato de arrendamento, para fins habitacionais, celebrado entre a Autora, na qualidade de senhoria, e a 1ª Ré, na qualidade de arrendatária, e o 2º Réu, na qualidade de fiador, com fundamento na falta de pagamento de rendas, 2) seja a 1ª Ré, condenada na entrega imediata à Autora, do locado, livre de pessoas e bens, e sejam ainda, 3) sejam ambos os Réus, solidariamente, condenados no pagamento à Autora, das quantias de a. € 7.700,00 (sete mil e setecentos euros), a título de rendas vencidas e não pagas, referentes aos meses de julho de 2020 a março de 2022, num total de 22 (vinte e duas) rendas, e b. o valor correspondente às rendas vincendas, e ou indemnização, após o trânsito em julgado da sentença a proferir, à razão mensal de € 350,00 (trezentos e cinquenta euros), c. e juros de mora.
I.2. Regularmente citados, os réus deduziram articulado de contestação, datado de 29.04.2022, impugnando parte da factualidade alegada pela autora, mais excepcionando com a figura do abuso de direito. Deduziram pedido reconvencional, nos art.ºs 42º e ss., peticionando a condenação da autora, no pagamento à 1ª Ré, da quantia de € 1.416,00 (mil, quatrocentos e dezasseis euros), a titulo de indemnização por danos patrimoniais, acrescida da quantia de € 2.000,00 (dois mil euros), a título de indemnização por danos morais. E ainda peticionam a condenação da autora, enquanto litigante de má fé, em multa e indemnização.
I.3. Por articulado de 14.06.2022 a Autora respondeu ao pedido reconvencional, acusando-o de inepto e aduziu a excepção de abuso de direito. Mais informou que a 1ª Ré entregou o locado, em 22 de abril de 2022, reduzindo o que peticionara em b), até 30.04.2022.
I.4. Por despacho de 28.09.2022, foi a autora convidada a aperfeiçoar a sua alegação factual, o que satisfez.
I.5. Foi proferido despacho (fls. 56), a julgar parcialmente extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, quanto à entrega do locado, e foi proferido despacho saneador, por escrito, dispensando-se a audiência prévia, o qual não foi objecto de reclamação
I.6. Procedeu-se ao julgamento com observância da forma legal.
I.7. Inconformado com a sentença de 8/5/2024, que julgando procedente, por provada, a presente acção e improcedente por não provada a acção reconvencional, e em consequência, declarou resolvido o contrato de arrendamento, para fins habitacionais, celebrado e aludido nos autos, com fundamento em falta de pagamento de rendas, condenou ambos os réus, solidariamente, no pagamento à autora, das quantias de € 7.350,00 (sete mil trezentos e cinquenta euros), a título de rendas vencidas e não pagas, referentes aos meses de agosto de 2020 (vencido em julho) a abril de 2022 (vencido em março), num total de 21 (vinte e uma) rendas, e nos juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa supletiva legal, desde o vencimento de cada renda e até efectivo e integral pagamento, absolvendo do mais a autora e ainda da condenação como litigante de má fé, dela apelaram os réus em cujas alegações concluem, em suma:
I- A autora omitiu, dolosamente, que já tinha procedido à resolução do contrato de arrendamento, em 1 de janeiro de 2021, conforme cópia da carta que se junta e cuja junção foi recusada pelo douto tribunal a quo, o douto tribunal a quo, deveria ter aceite a junção da carta, mediante a condenação de pagamento de multa por parte da ré, dado que tinha interesse para fazer prova do facto legado no artº 66º, da contestação e para prova de que a autora estava a litigar com abuso de direito e litigava de má-fé, o documento, carta enviada pela autora á primeira ré, salvo melhor opinião, ao abrigo do disposto, no artº 696º, alínea c), do C.P.C., pode ser fundamento para a revisão de sentença transitada em julgado, dado que por si só, é suficiente, para modificar a decisão, ora proferida, em sentido mais favorável à parte vencida, no caso os recorrentes, pelo que, em nossa modesta opinião, nada impede de ser aceite, mediante pagamento de multa e nada interfere na obtenção de uma decisão surpresa, para as partes. A não aceitação e rejeição da junção do documento, carta, por parte do douto tribunal a quo, aos autos, levou a uma condenação injusta, dos recorrentes, pelo que deve ser aceite, nos autos [Conclusões 1 a 4]
II- A recorrente, quando a autora intentou a ação, apenas tinha as rendas em atraso, respeitantes aos meses de Agosto, Setembro e Outubro de 2020 após o sinistro e dado que a autora/senhorio, não arranjou outro espaço para residir, a recorrente, primeira ré, ao abrigo do disposto nos arts. 1040 do C. Civil, dado que sofreu privação no uso e fruição da coisa arrendada, caso o contrato de arrendamento ainda estivesse em vigência, teria direito à redução da renda e de acordo com o disposto no artº 428º, do CCivil, tinha direito a recusar-se a pagar as rendas enquanto a outra parte não cumprisse com a sua obrigação, fazer obras e colocar o arrendado em condições ed ser habitado, o que a autora não fez, pelo que, mesmo caso o contrato de arrendamento estivesse ainda vigente, a recorrente, não estava obrigada a pagar a renda mensal, pelo que, mesmo aqui, andou mal o douto tribunal “ a quo”, ao ter condenado os recorrentes no pagamento das rendas entre novembro de 2020 até abril de 2022. a partir do dia 22/10/2020, devido á ocorrência, sinistro que se verificou, a recorrente deixou de poder habitar e residir no arrendado; a recorrente, juntou aos autos o dc. 17, onde consta a razão pela qual se verificou a inundação do seu apartamento, com águas pluviais, mau estado de conservação do telhado e algerozes entupidos, que não faziam o escoamento das águas pluviais a manutenção e obras de conservação do imóvel, são da responsabilidade da autora, assegurando assim o gozo e uso do arrendado, para os fins a que coisa se destina, no caso, arrendamento habitacional, pela recorrente, (artº 1031º, al. b) do C. Civil). [Conclusões 5 a 10]
III-A autora, não fez prova nos autos de que pediu as chaves, à inquilina aqui recorrente, nem o senhorio e que esta se negou a entrega-las, pelo que, a factualidade vertida no ponto 15 dos factos dados como provados, deve ser dada como não provada, a recorrente, fez prova, através do documento nº 21, junto com a sua contestação, de que a autora, estava na posse das chaves. A recorrente, comunicou, de imediato, a ocorrência que atingiu o seu apartamento, bem como os prejuízos que teve, através de um vídeo, à autora/senhorio, como melhor consta do doc. 18, junto com a contestação, tendo a recorrente provado, nos autos, através do doc. 18, que participou a ocorrência e estragos sofridos no seu património, por vídeo á autora/senhorio, através da D.ª D …, factualidade vertida nos arts. 22, 23, 24 e 25, que foi dada como não provada, deve ser dada como provada com a seguinte redação Ponto 22 - Do suprarreferido em 8 a 12 e principalmente que a ré estava impedida de se manter no interior do locado, foi imediatamente informado, o sr. AM___, na pessoa da sua legal representante em Portugal, com o envio de um vídeo por parte da recorrente, inquilina, 1ª ré; Ponto 23 - Nas referidas circunstâncias, quer a sala, quer o quarto, quer a cozinha, ficaram completamente inundados; Ponto 24 - A ré, enviou um vídeo demonstrativo do estado do locado e das mobílias e roupas da 1ª ré, à legal representando do senhorio, o sr. E …, o qual reencaminhou para ele;
Ponto 25 – Todavia a autora nem o senhorio, nada fizeram; a factualidade vertida no ponto 29, factos não provados, descritos na douta sentença, devem ser dados como provados, dado que a recorrente fez prova, nos autos, da destruição dos móveis e roupas, através dos documentos 23 a 26 – fotografias e tal situação foi confirmada pela testemunha da recorrente, Srº F …, como consta da fundamentação vertida na douta sentença tal factualidade, deve ser dada como provada, e não como não provada, como decidiu o douto tribunal a quo, devendo tal factualidade, passar nos seus precisos termos, em que se encontra descrita na douta sentença colocada em crise, para os factos como não provados [Conclusões 11 a 14, 16 e 18]
IV-A autora/senhorio, ao abrigo do disposto no artº 483º, do C.C., é responsável pelos prejuízos causados nas mobílias, roupas, devido à enxurrada de água, que entrou no locado, levando a que parte do tecto da sala e quarto tivesse caído, devido ao facto de não ter o telhado em condições nem ter limpo os algerozes, do imóvel, a recorrente, primeira ré, inquilina, fez prova dos prejuízos que teve a título patrimonial e moral, bem como fez prova do nexo de causalidade, pelo que, o pedido reconvencional, apresentado, deve ser julgado por procedente e a autora/senhorio, condenado, nos precisos termos em que foi peticionado na contestação.[Conclusões 15 e 18]
V-O pedido de condenação de litigância de má-fé, da autora/senhorio, deve ser julgado procedente por provado, dado que se encontra devidamente provado nos autos, que a autora, tinha conhecimento dos estado em que o arrendado ficou, com impossibilidade de continuar a ser habitado pela recorrente, 1ª ré e tinha procedido à resolução do contrato de arrendamento, através de carta enviada à inquilina e mesmo assim, veio com a acção de despejo, pedindo pagamento de rendas a que sabe não ter direito a excepção perentória invocada pelos recorrentes na sua contestação, a qual é de conhecimento oficio, deve ser julgada procedente por provada com as legais consequências, dado que, o douto tribunal a quo, salvo melhor opinião não se pronunciou sobre a mesma, nem no despacho saneador, nem agora na decisão final, o recorrente, 2º réu, fiador, nunca foi interpelado pela autora/senhorio, sobre a existência de rendas em atraso, pelo que deve ser absolvido a decisão recorrida, violou o disposto no arts. violou o disposto nos arts. 576º, nº 3 e artº 696º, al.c) do C.P.C. e arts. 334º, 428º, 483º, 496,1031º, al. b) , 1038º, al. h), 1040º, nº 1, todos do C. Civil.[Conclusões 19 a 22]
Termina pedindo a revogação da decisão recorrida, por outra, que julgue a exceção perentória, de abuso de direito, invocada pelos réus na contestação, procedente por provada e julgue procedente por provado o pedido reconvencional, apresentado pela          recorrente, A … e consequentemente condene, a autora/senhorio, nos valores peticionados pela recorrente 1ª ré, inquilina e julgado ainda procedente por provada a litigância de má-fé, por parte da autora/senhorio, em multa e indemnização fixar pelo douto tribunal e a final serem os recorrentes absolvidos do pagamento de rendas em atraso, para além do mês de novembro de 2020, até ao mês de abril de 2022, como foram condenados.
 I.8. Não houve contra-alegações.
I.9. Mantêm-se os pressupostos de validade e regularidade processual. São as seguintes as questões a resolver:
a) Saber se o Tribunal deveria ter aceite a junção da carta que consubstancia a resolução do contrato de arrendamento, em 1 de janeiro de 2021, mediante a condenação de pagamento de multa por parte da ré, dado que tinha interesse para fazer prova do facto legado no artº 66º, da contestação e para prova de que a autora estava a litigar com abuso de direito e litigava de má-fé,
b) Saber se ocorre, na decisão recorrida, erro na apreciação dos meios de prova e subsequente decisão relativa ao facto dados como provado sob 15 e aos factos dados como não provados constantes de 22 a 25 e 29 e forma ínvia de 31 dos factos não provados da decisão recorrida.
c) Saber se andou mal o tribunal a quo, ao ter condenado os recorrentes no pagamento das rendas entre novembro de 2020 até abril de 2022, na medida em que a partir do dia 22/10/2020, devido á ocorrência, sinistro que se verificou, a recorrente deixou de poder habitar e residir no arrendado, ocorrendo na decisão recorrida erro de interpretação do disposto nos art.ºs 428º e 334, 1031º, al. b) , 1038º, al. h), 1040º, nº 1  do CCiv.
d) Saber se, em face dos prejuízos sofridos ela Ré e comprovados em razão da alteração da decisão de facto, em conformidade com o disposto nos art.ºs 483º, 496, deve proceder o pedido reconvencional.
d) Saber se com a Autora litiga de má fé, ou abuso de direito.
e) Saber se o recorrente, 2º réu, fiador, nunca foi interpelado pela autora/senhorio, sobre a existência de rendas em atraso, consequentemente deve ser absolvido a decisão recorrida
II- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
I.1. Deu o Tribunal recorrido como provados os seguintes factos cujo sob 15 a apelante impugna:
1. A Autora dedica-se além do mais, à compra, venda e arrendamento de imobiliário, conforme certidão permanente de fls. 72 e ss.;
2. Por escrito, intitulado “contrato de arrendamento duração limitada para habitação”, datado de 21 de abril de 2016, a Autora, na qualidade de senhoria, declarou ceder o gozo e a fruição do 1º andar, do prédio urbano, em propriedade total com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, sito na Rua …, n.º …, … Alhandra, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Vila Franca de Xira, sob o n.º …/…, da freguesia de … e concelho de Vila Franca de Xira, e inscrito na matriz predial urbana, sob o artigo …, da união das freguesias de …, São … e …, destinado a habitação, e a 1ª Ré, na qualidade de arrendatária, declarou aceitar, tudo conforme doc. 1 junto com a PI, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
3. O 2º Réu prestou fiança, assumindo, solidariamente, com a 1ª Ré, o cumprimento das cláusulas do identificado escrito, tudo conforme cláusula 17ª, do doc. 1 junto com a PI, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
4. Mais acordaram, que o referido contrato teria a duração de 1 (um) ano, com início em 1 de maio de 2016 e termo em 30 de abril de 2017, podendo renovar-se por períodos sucessivos de um ano, tudo conforme cláusulas 1ª e 2ª, do doc. 1 junto com a PI, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
5. A contrapartida pecuniária acordada foi de € 350,00 (trezentos e cinquenta euros) mensais, a pagar no 1º dia útil do mês anterior àquele a que disser respeito, tudo conforme cláusula 8ª, do doc. 1 junto com a PI, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
6. Sucede que, a 1ª Ré não pagou as quantias referidas em 5), quando se venceram, nomeadamente a renda de agosto de 2020, que se venceu no dia 1 de julho de 2020, não foi paga, nem nenhuma das demais que venceram;
7. A título de exemplo, a renda de junho de 2020, vencida em 1 de maio de 2020, foi paga pela 1ª Ré, em 8 de outubro de 2020, conforme doc. 11 junto com a Contestação, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
8. No dia 22 de outubro de 2020, a 1º Ré deixou de poder fruir do locado, devido a infiltrações de água, provindas do telhado;
9. Pois tais infiltrações fizeram ruir parte dos tetos da sala e do quarto;
10. Quer a sala, quer o quarto, quer a cozinha, ficaram com água;
11. Foram chamadas ao local, as autoridades competentes, as quais comunicaram à 1ª Ré que estava impedida de habitar o locado,
12. E que transmitiram à 1ª Ré que o sucedido, se devia muito provavelmente à existência de telhas partidas no telhado e à falta de limpeza dos algerozes;
13. Já em maio de 2020, a 1ª Ré e o sr. E … já haviam trocado mensagens electrónicas sobre o (mau) estado do locado e a existência e ou agravamento de infiltrações;
14. A 1ª Ré acompanhou a D.ª D …, e um perito de seguros ao locado, em data não concretamente apurada;
15. Logo que tomou conhecimento do sucedido, em data não concretamente apurada, a Autora pediu as chaves do locado à 1ª Ré, quer para verificar o seu estado de conservação e dos danos causados ao local arrendado, quer para promover a reparação de tudo quanto tivesse de ser ali reparado;
16. Em resposta, a 1ª Ré recusou, tendo respondido à Autora que apenas entregava as chaves para esses efeitos, depois de previamente indemnizada pela Autora dos danos patrimoniais aqui reclamados;
17. A 1ª Ré manteve tal posição impedindo que a Autora verificasse e reparasse os danos causados no local arrendado, até finais de abril de 2022;
18. Pois só em 22 de abril de 2022, a 1ª Ré entregou à Autora, o locado e as respectivas chaves;
19. Face ao referido em 11), a 1ª Ré foi residir para um quarto de uma pessoa sua amiga, sito na Rua …, nº …, …, em Alhandra;
II.2. Deu o Tribunal recorrido como não provados os seguintes factos cujos sob 22 a 25 e 29 e 31 recorrente impugna:
20. O locado desde a contratação, nunca teve as condições necessárias de habitabilidade, devido a infiltrações de água da chuva;
21. Aquando da entrada em juízo da PI (9 de março de 2022), a Autora já havia comunicado aos Réus a intenção de resolver o contrato de arrendamento, com efeitos a 1 de fevereiro de 2021;
22. Do suprarreferido em 8) a 12) e principalmente de que a 1ª Ré estava impedida de se manter no interior do locado, foi imediatamente informado o Sr. E …, através da sua legal representante D. D …;
23. Nas referidas circunstâncias, quer a sala, quer o quarto, quer a cozinha, ficaram completamente inundados;
24. E foi enviado ao Sr. E …, um vídeo, demonstrativo do estado do locado e das mobílias e roupas da 1ª Ré;
25. Todavia, a Autora nada fez;
26. Foi por isso que a Ré decidiu deixar de pagar as rendas a partir de outubro de 2020 em diante, pois até aí as pagava;
27. O referido em 11) e 19), deveu-se ao facto de a Autora não arranjar um espaço para a Ré habitar;
28. E do referido em 11) e 19), deu a Ré imediato conhecimento à Autora;
29. Em virtude do sucedido e suprarreferido, várias roupas e mobílias pertença da 1ª Ré, ficaram danificadas, nomeadamente
- um sofá de três lugares, de marca IKEA, no valor de € 359,00; - duas estantes de marca IKEA, no valor de € 218,00;
- uma mesa de centro, de marca desconhecida, no valor de € 79,00;
- um roupeiro de marca IKEA, de quatro portas, no valor de € 620,00;
- um colchão elétrico insuflável, de marca desconhecida, no valor de € 80,00; - um édredon, de marca IKEA, no valor de € 60,00,
o que perfez um valor total de € 1.416,00 (mil, quatrocentos e dezasseis euros);
30. Do referido em 29), deu também a 1ª Ré imediato conhecimento à Autora, que nada fez, nem se prontificou a indemnizar;
31. Além do referido em 29), a 1ª Ré sofreu por ter de residir numa casa emprestada por um amigo, o que sucedeu em período pandémico, nomeadamente
- por ter perdido a sua privacidade;
- porque deixou de se deslocar livremente na casa, como fazia na sua residência; - deixou de andar descalça, de chinelos ou com qualquer tipo de roupa, vestida, - ficou limitada a novas regras e horários,
- ficou limitada no acesso a certas dependências da casa e do WC,
- ficou obrigada, a ter que refazer os seus horários, e a sua vida, para sair de manhã, para o trabalho e quando chegava à noite, para descansar;
32. O referido telhado, ruiu por falta de cuidado na sua manutenção pela Autora;
33. Apesar de diversas tentativas da Autora, e de funcionários desta, junto de ambos os Réus, estes não pagaram as rendas em dívida à Autora, então e até agora;
Nenhum outro facto, com relevância para a boa decisão da causa          
III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
III.1. Conforme resulta do disposto nos art.ºs 608, n.º 2, 5, 635, n.º 4, 649, n.º 3, do CPC[1] são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso. É esse também o entendimento uniforme do nosso mais alto Tribunal (cfr. por todos o Acórdão do S.T.J. de 07/01/1993 in BMJ n.º 423, pág. 539.
III.2. Não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objecto, tal como enunciadas em I.
III.3. Saber se o Tribunal deveria ter aceite a junção da carta que consubstancia a resolução do contrato de arrendamento, em 1 de janeiro de 2021, mediante a condenação de pagamento de multa por parte da ré, dado que tinha interesse para fazer prova do facto legado no artº 66º, da contestação e para prova de que a autora estava a litigar com abuso de direito e litigava de má-fé,
III.3.1. Sustentam os réus em suma e a propósito do pedido de condenação como litigante de má fé, no corpo das alegações:
· a autora, não podia desconhecer, o estado que o imóvel onde se encontrava o arrendado, além de que omitiu, que tinha enviado á recorrente, uma carta a resolver o contrato de arrendamento;
· a recorrente, na sua contestação, alegou tal factualidade, no artº 66º, onde referiu que: “... omitiu os factos que levaram a que a inquilina tivesse de abandonar o arrendado e mesmo sabendo, enviou-lhe uma carta a denunciar o contrato, com o fundamento de rendas em atraso, bem sabendo que não as podia pedir, por o arrendamento não ter condições de habitabilidade;
· a recorrente,1ª ré, à data, não juntou o documento com a contestação, nem posteriormente nos 20 dias antes á data agendada para a audiência de julgamento, apenas e só, porque não sabia se ainda tinha a referida carta e se a tinha onde se encontrava;
· realidade esta compreensível, dado que houve a inundação do arrendado, foi morar para a casa de um amigo, cerca de um ano, porque a autora/senhorio, não lhe arranjou uma nova habitação para residir e posteriormente mudou novamente de casa;
· tendo a recorrente, alegado o facto logo na sua contestação e requerido, a junção da carta, na primeira audiência de julgamento e havendo já agendada segunda data para continuação do julgamento, a junção tardia, não colocava em causa, o bom andamento dos autos nem levava a que fosse proferida uma decisão surpresa;
· a carta, pretendida juntar, provava não só, que a autora/senhorio, datada de 1 de fevereiro de 2021, enviada pela autora, era quem passava os recibos de renda, logo, agia em nome e representação do senhorio, bem como que a autora estava a litigar de má-fé e abuso do direito, pois estava a pedir o pagamento de rendas, quando já tinha resolvido o contrato de arrendamento;
· se é certo que a documentação, deve ser junta com os articulados ou então até 20 dias antes da audiência de julgamento, não deixa de ser mesmo, verdade, que de acordo com o disposto no artº 696, nº 1, al. c), do C.P.C., permite a revisão de sentença, de documento: “ ... se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não pudesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável á parte vencida ...”;
· a carta, documento em causa, que não foi aceite a sua junção por parte do douto tribunal “ a quo” e oposição por parte da autora, por si só, prova que há erro na forma do processo e que a autora, não podia intentar a ação de despejo, como intentou, mas sim ação de reivindicação de propriedade, pedindo o pagamento das rendas vencidas e não pagas, pela recorrente desde outubro de 2020, até ao dia 22 de abril de 2022;
· ao não ter sido aceite o documento, carta enviada pela autora á 1ª ré, inquilina, aqui recorrente, veio, sim a ser proferida uma sentença surpresa, para a recorrente, a qual é condena a pagar um valor a título de rendas (7.350,00 €), quando ficou sem habitação, por culpa da autora/senhorio em não fazer as obras de reparação e manutenção do telhado doo imóvel e algerozes que são da sua responsabilidade enão lhe arranjou uma casa durante o período de obras, de reparação, para depois voltar para o arrendado e o douto tribunal, “ a quo”, declara resolvido o contrato de arrendamento, quando a autora, já o rinha resolvido por carta datada de 1 de fevereiro de 2021;
· face ao exposto entende a recorrente, que o documento deveria ter sido aceite, pelo douto tribunal a quo, mediante pagamento de uma multa, por extemporâneo, pois tinha interesses e era fundamental, para a boa decisão da causa;
III.3.2. Lendo e relendo o requerimento motivado de interposição do recurso não se vislumbra o despacho de não admissão da junção do mencionado documento, ou seja, nem no introito do recurso os recorrentes manifestam intenção de interposição de recurso de um despacho de não admissão de junção de documentos, nem nas conclusões o fazem. A sentença sob recurso não elege como questão a decidir a junção do mencionado documento, mais, na decisão relativa à questão da litigância de má-fé não faz a mínima referência a tal. Assim sendo, por falta de objecto não se conhece dessa questão.
III.4. Saber se ocorre, na decisão recorrida, erro na apreciação dos meios de prova e subsequente decisão relativa aos factos dados como provado sob 15 e aos factos dados como não provados constantes de 22 a 25 e 29, também de uma forma ínvia o ponto 31 dos factos não provados da decisão recorrida.
III.4.1. Sustenta a recorrente no corpo das alegações que ocorre erro na apreciação dos meios de prova e decisão sobre essa factualidade porque:
· a factualidade dada como provada no ponto (artigo) 15º, no que diz respeito a terem sido pedidas as chaves, pela autora, não corresponde á verdade, como melhor consta e depreende dos documentos 18, 21 e 29, mensagens trocadas entre a recorrente, A …, 1ª ré  o senhorio proprietário da fração, onde residia, o sr. E …, dado que, em nenhuma mensagem, do senhorio, o mesmo pede a entrega das chaves;
· nem a representante do senhorio, D.ª D …, aquando da deslocação ao arrendado com a recorrente, A …, inquilina, lhe pediu as chaves, ou foi feita prova pela autora, nos autos, por escrito ou verbalmente, que alguma vez tenha pedido as chaves á inquilina, primeira ré, e esta tenha negado a sua entrega, se o senhorio ou alguém em sua representação, fez o levantamento e acrescentou que estava pronto para começar as obras no apartamento, é porque tinha chaves, do apartamento e tinha conhecimento dos danos causados pela enxurrada de água, causados no apartamento e que necessitava de obras para ser novamente habitado pelo que deve ser dada como não provada;
· analisando o doc.18, junto pela recorrente, 1ª ré, inquilina, não nos deixa quaisquer dúvidas de que, por um lado contactou a D.ª D … a representante do senhorio em Portugal, assim como não nos deixa quaisquer dúvidas, antes pelo contrário, prova de que enviou um vídeo, sobre a ocorrência e estragos que causou no interior do arrendado, móveis e roupas, basta olhar para a fotografia que consta do videio, a quantidade do tecto que caiu e que seta o reenviou ao sr. E …, factualidade esta, que se encontra, provada através da resposta dada pela D.ª D …, quando responde: “... vou mandar para o Srº AM___; já lhe ligo ..”; não há quaisquer dúvidas de que a recorrente enviou um vídeo ao senhorio a dar-lhe conhecimento do que tinha acontecido e o estado em que ficou o interior do arrendado, e, depois, mais tarde, em relação ao envio do vídeo, escreveu em mensagem o seguinte: “Boa tarde sr.ª A …, o sr. AM___ lamenta o que aconteceu, como lhe disse, quando falei consigo à pouco ninguém estava a prever que o teto/telhado, viesse a cair ...”; tendo a recorrente feito prova de que deu conhecimento da verificação do sinistro, danos causados, prejuízos causa donos seus bens, ao senhorio e autora na pessoa da D.ª D …, a factualidade dada como não provada nos arts. /pontos 22, 23, 24 e 25, devem ser dados como provados, passando a constar nos factos dados como provados.
· pela recorrente, 1ª ré, nem as declarações da testemunha, F …, o qual, como consta da fundamentação, vertida na sentença ora posta em crise, disse, que estava no interior do arrendado, quando parte do teto da sala rui; referiu que infiltrações só nas paredes da sala e não em outras divisões da casa, mas naquele dia a água chegou ás outras divisões; Foi confrontado na segunda audiência de julgamento com docs. 14 e 18, o qual confirmou o estado em que ficou o arrendado; a recorrente participou, a ocorrência e prejuízos ás autoridades competentes, no caso PSP, (doc. 27, junto com a contestação) e ao qual o tribunal a quo, não deu qualquer valor, como consta da douta sentença “ ... limitou-se a alegar o que decorria da participação policial, que não é um documento autêntico ...”, para prova da destruição dos seus móveis o estado em que ficaram, bem como a roupa, a recorrente, 1ª ré, juntou prova documental, a qual consta da contestação, docs. 23 a 26, os quais demonstram a quantia e dimensão dos pedaços de tecto, que caíram sobre os móveis e roupas e a causa pela qual os móveis e roupas, ficaram destruídas e danificadas, a recorrente, através dos documentos 12 a 16, 23 a 26, que juntou com a sua contestação, provou os danos que sofreu, devido às infiltrações que o seu arrendado sofreu; no contrato de arrendamento junto aos autos, não consta que o andar foi arrendado com qualquer tipo de mobília, pelo que, não restam quaisquer dúvidas de que o mobiliário existente no mesmo e que ficou danificado/destruído com as infiltrações e queda dos tetos, era da recorrente nem a autora/senhorio, posteriormente, veio fazer prova de que foi ele que adquiriu, os móveis existentes no arrendado, deve assim ser julgado provada a factualidade do ponto 29 dos factos dados como não provados;
III.4.2. O Tribunal recorrido motivou do seguinte modo a decisão: “Para a formação da convicção do Tribunal, concorreram desde logo o acordo das partes plasmado nos referidos articulados, a par dos documentos carreados para os autos e a saber, um contrato de arrendamento, uma certidão de registo comercial, escritos intitulados “recibos de renda”, onze fotografias, registo de ocorrência da Proteção Civil, mensagens eletrónicas, participação da PSP e aditamento, a par do depoimento prestado pela única testemunha ouvida, e a saber, F …, a qual revelou isenção e demonstrou credibilidade. A referida testemunha, amigo da 1ª Ré, revelou grande desconhecimento dos factos controvertidos, referindo que conheceu o locado em 2019, princípios de 2020, frequentava a casa da Ré e conhecia-a; do evento recorda-se porque estava na sala, sozinho na casa, quando parte do tecto ruiu, sabe porque ia viajar no dia seguinte; referiu que infiltrações só nas paredes da sala, e não em outras divisões da casa, mas naquele dia a água chegou às outras divisões; confrontado com as fotos juntas com a Contestação, disse que foi assim que ficou o locado, docs. 14 e 18; mais disse que telefonou à Ré, que estava a trabalhar e veio ver o que se passava, ligou para os Bombeiros, e Policia; referiu de relevante que se lembra que a Proteção Civil demorou mais tempo a chegar porque haviam outras ocorrências noutras casas em Alhandra, foi fenómeno que afectou várias residências.
Corroborou que as autoridades disseram à Ré que não podia permanecer ali, e que se deslocaram ao telhado, que visionaram e disseram “que não estava e, condições”.
Disse desconhecer a atuação do senhorio da Ré, mas que disponibilizou a chave da sua casa, porque ia viajar e a Ré passou a lá ficar; disse ainda que já lá estava um casal seu amigo. Disse que a Ré ali permaneceu cerca de um ano, enquanto a testemunha regressava de 3 em 3 meses, por uma semana. Disse “não saber nada do que foi falado em termos de realojamento”. Relevaram ainda as declarações de parte da Ré, que referiu que desde que arrendou tinha problemas de infiltrações, mas lhe foi dito que era da estrutura do Prédio, e que era responsabilidade do Prédio; tinha humidade em casa, mas conseguia viver.
 Corroborou que D. D … era representante do Sr. E …, e que falou com esta e este por telefone varias vezes.
Quanto ao evento, referiu que foram “chuvas de granizo intensas”, fenómeno adverso, e que tecto da sala não aguentou:
Referiu que era Prédio sem condomínio sem administradores e que os inquilinos é que chamavam as autoridades.
Disse que telefonou ao Sr. E … no dia do evento, mas ele não apareceu nem no dia, nem no dia seguinte.
Quanto às rendas admitiu que pagava “quando conseguia e podia”, não era acordado ser assim, mas era assim porque não podia. Admitiu deixei de pagar os últimos três meses, agosto, setembro e outubro de 2020, para fazer pressão para o senhorio me arranjar uma casa, não houve qualquer conversação.
Corroborou que no dia, estava no trabalho e em sua casa, estava o F …, seu melhor amigo tendo tudo acontecido em espaço de minutos, que descreveu. Corroborou que foi casa do F …, e que lá permaneceu, quase um ano, porque ele ia para Espanha trabalhar. Disse ainda que foi retirando as suas roupas e outros bens, manteve o mobiliário.
Disse que em novembro de 2020, foi ao locado, com D. D … e uma pessoa, que foi apresentado como perito, mas não soube de mais nada. Sabe que tirou fotografias mas não fez perguntas nenhumas.
Admitiu que Sr. E … lhe disse que accionaram o seguro, e que esperavam resposta, mas o tempo foi passando e nada fizeram, só três meses depois do evento o senhorio iniciou as obras, mas não lhe disse em concreto que trabalhos ia fazer (!).
Mais disse, que então, quando tinha tempo, retirou todo o seu mobiliário para uma garagem onde trabalhava, coube lá tudo, descreveu o que retirou. Quanto aos danos disse que deu estimativa aos agentes da PSP, pois não guardou papéis, mas “tudo o que era madeira” empenou e salvou os eletrodomésticos.
Disse que começou a procurar nova casa e arrendou, mudou-se e nela reside agora. Os factos não provados foram assim considerados, ora em face da total ausência de produção de prova, pela parte a quem incumbiam, seja a Ré quanto aos danos causados, sua quantificação e nexo de causalidade, seja quanto à ocorrência de evento que impediu de fruir da habitação, enquanto cumpria escrupulosamente o contrato, o que se parece inferir da sua defesa, só deixou de pagar porque senhorio nada fez, mas depois admite que foi accionado um seguro, houve peritagem, e foram iniciados trabalhos (?), seja quanto ao pagamento de rendas, que não comprovou (só junta recibos, nada de comprovativos de pagamento e com grande distancia temporal da data de vencimento).
III.4.3. Comecemos pelo ponto 29 dado como não provado: “Em virtude do sucedido e suprarreferido, várias roupas e mobílias pertença da 1ª Ré, ficaram danificadas, nomeadamente - um sofá de três lugares, de marca IKEA, no valor de € 359,00; - duas estantes de marca IKEA, no valor de € 218,00;
- uma mesa de centro, de marca desconhecida, no valor de € 79,00; - um roupeiro de marca IKEA, de quatro portas, no valor de € 620,00; - um colchão elétrico insuflável, de marca desconhecida, no valor de € 80,00; - um édredon, de marca IKEA, no valor de € 60,00, o que perfez um valor total de € 1.416,00 (mil, quatrocentos e dezasseis euros)”. Corresponde à alegação dos art.ºs 46 e seguintes da contestação, ou seja, que a Ré comunicou à Autora o estado em que ficaram as suas mobílias (docs 23 a 26) sendo que a matéria de facto do ponto 29 corresponde à participação que a Ré fez à polícia (documento 27). Relativamente a essa alegação e documentos 12 a 29 tal foi impugnado pela Autora na Réplica (art.º 14), alegando que nenhum dos objectos pertence à Ré (15) que os objectos identificados nas fotografias dos autos pertence à Ré nunca estiveram no interior do local arrendado (16) os danos alegadamente causados aos objectos fotografados nos autos não foram provocados por qualquer conduta da Autora (17) a Ré nunca permitiu que a Autora examinasse os bens móveis alegadamente danificados, pelo que, nunca poderá imputar-lhe qualquer responsabilidade. A participação às autoridades policiais de uma certa ocorrência e o documento policial que consubstancia essa participação apenas fazem prova plena de que houve essa participação com esse conteúdo e nada mais. Tendo havido impugnação dos documentos por parte da Autora cabia à Ré a prova dos factos alegados enquanto integradores do seu direito à reparação (art.ºs 483 do CCiv), não tendo sido efectuada essa prova a falta dela resolve-se contra a Ré (art.º 414), o facto 29 dos factos dados como não provados, não pode ser dado como provado. Do mesmo passo a factualidade do ponto 31 dos factos dados como não provados não vem impugnada nos termos da lei de processo porquanto a impugnante não transcreve nem identifica os pontos exactos do depoimento da testemunha F … que permitam a alteração da decisão de facto.
III.4.4. Relativamente aos factos dados como não provados sob 22 a 25:“ 22Do suprarreferido em 8) a 12) e principalmente de que a 1ª Ré estava impedida de se manter no interior do locado, foi imediatamente informado o Sr. E …, através da sua legal representante D. D …; 23. Nas referidas circunstâncias, quer a sala, quer o quarto, quer a cozinha, ficaram completamente inundados; 24. E foi enviado ao Sr. E …, um vídeo, demonstrativo do estado do locado e das mobílias e roupas da 1ª Ré; 25. Todavia, a Autora nada fez.
III.4.5. Corresponde ao alegado na contestação art.ºs 9, 11; na réplica a Autora impugna esses factos, no art.º 14 e por impugnação motivada sustenta que “logo que tomou conhecimento da alegada intempérie, pediu as chaves do local arrendado à Ré, quer para verificar do estado de conservação e dos danos alegadamente causados ao local arrendado, quer para promover a reparação de tudo quanto tivesse de ser ali reparado, em resposta, a ré recusou, tendo respondido à Autora que apenas entregava as chaves para esses efeitos, depois de previamente indemnizada pela Autora, o que impediu que a Autora verificasse e reparasse os danos causados no local arrendado, até Maio de 2022, levando em conta que a Ré apenas restituiu as chaves em Abril de 2022 (isto depois de citada nesta acção) Impedida que se encontrou (pela Ré) de aceder ao local arrendado até Abril de 2022, só a partir desta data é que a Autora logrou proceder às reparações necessárias à re-colocação do local arrendado, no mercado de arrendamento (art.ºs 11ª 13).”A Autora não refere quando é que tomou conhecimento da situação, a 1.ª Ré refere que foi imediato e traz como suporte o documento 18, documento esse que é documento particular e que não foi emitido ou assinado pela Autora que o impugnou na réplica cabendo à autora a prova da sua veracidade (art.º 374/2 do CCiv), o que não ocorreu, por isso a dúvida resolve-se contra a Ré, inexistindo qualquer erro no julgamento desses factos.
III.4.6. Por último o facto dado como provado sob 15: “Logo que tomou conhecimento do sucedido, em data não concretamente apurada, a Autora pediu as chaves do locado à 1ª Ré, quer para verificar o seu estado de conservação e dos danos causados ao local arrendado, quer para promover a reparação de tudo quanto tivesse de ser ali reparado”. Corresponde a alegação da Autora na réplica assim o facto dado como provado sob 16. Curiosamente os réus não impugnam os factos dados como provados sob 16 e 17Em resposta, a 1ª Ré recusou, tendo respondido à Autora que apenas entregava as chaves para esses efeitos, depois de previamente indemnizada pela Autora dos danos patrimoniais aqui reclamados; A 1ª Ré manteve tal posição impedindo que a Autora verificasse e reparasse os danos causados no local arrendado, até finais de abril de 2022;” Ora, estando provado que, em resposta, a 1.ª Ré recusou a entrega das chaves, com aquele fundamento, é porque a Autora lhe pediu as chaves do locado para verificação do estado de conservação e dos danos causados ao local arrendado e o motivo era o de que só o faria se previamente a Autora a indemnizasse dos danos que reclamava. Diga-se, em abono da verdade, que a Autora nunca poderia, em consciência, pagar qualquer valor pelos reclamados prejuízos enquanto não verificasse in loco o que estava danificado, verificação essa que apenas lhe foi facultada em finais de Abril de 2022, 18 meses depois. Improcede, pois, a impugnação.
III.5. Saber se andou mal o tribunal a quo, ao ter condenado os recorrentes no pagamento das rendas entre novembro de 2020 até abril de 2022, na medida em que a partir do dia 22/10/2020, devido á ocorrência, sinistro que se verificou, a recorrente deixou de poder habitar e residir no arrendado, ocorrendo na decisão recorrida erro de interpretação do disposto nos art.ºs 428º e 334, 1031º, al. b) , 1038º, al. h), 1040º, nº 1  do CCiv.
III.5.1. Sustenta a recorrente, em suma, que:
· a situação da casa, e o que aconteceu, deve-se e deveu-se ao facto do senhorio, não ter levado em conta a chamada de atenção por parte de recorrente, inquilina, 1ª ré, já no ano de 2020, antes da ocorrência do sinistro, a qual por mensagem, datada de 18/05/2020, contactou o senhorio a informar do estado do arrendado e que chovia lá dentro, tendo inclusive dito, que tal situação, já vinha do ano passado (dizemos nós) 2019, como consta do documento nº 20, junto com a contestação, para o qual se remete para os devidos efeitos legais;
· foram estas circunstância relatadas pela recorrente, inquilina e o facto do mesmo, não fazer quaisquer obras de reparação e conservação no imóvel, nomeadamente no telhado, que permitia haver infiltrações de água, no seu arrendado, que a inquilina como forma de pressão, deixou de pagar as rendas dos meses de Agosto, Setembro e Outubro e depois no dia 22/10/2020, ocorreu a inundação do arrendado, ficando impossível da habitar e com falta de segurança, por parte dos elementos da proteção civil, os quais elaboraram um documento da ocorrência, onde consta a razão e motivo do sinistro, inundação do arrendado, 1º andar, onde residia a recorrente;
· para prova de tal factualidade a recorrente juntou o documento passado pela protecção civil, doc. 17, para o qual se remete para os devidos efeitos legais e onde consta que as infiltrações no imóvel e consequentemente para o interior do arrendado e destruição que causou, se devia ao mau estado da cobertura e falta;
· de limpeza dos algerozes, pois os operacionais tiveram de os limpar para haver escoamento das águas pluviais;
· dispõe a al. b) do artº 1031, do C. Civil que é obrigação do locador assegurar ao inquilino, o gozo do arrendado para os fins a que a coisa se destina;
· face à inundação que o arrendado foi vítima, por culpa do senhorio e autora, a recorrente, inquilina, 1ª ré, deixou de poder usar e fruir o arrendado;
· a recorrente, deu cumprimento ao disposto no artº 1038º, al. h), pois comunicou de imediato, o sinistro ao senhorio e autora, tanto assim é que a legal representante do senhorio em Portugal, se deslocou ao local e confirmou o sinistro e os danos, provocados, como causa e consequência direta das infiltrações.
III.5.2. Entendeu-se na decisão recorrida em suma que:
· da factualidade apurada, e do clausulado, temos o incumprimento pela arrendatária de obrigação que sobre si impendia, no caso o pagamento da renda, e em tempo;
· temos também que durante a execução do contrato, o locado passa a padecer de patologias que se não impedem a sua fruição, diminuem-na, e que tal deve ser tido em conta, para redução da renda ou justificação do seu não pagamento;
· a versão contraditória dos Réus de quando deixou a 1ª Ré de pagar as rendas e porquê cfr. art.ºs 6º, 12º e 36º, coincide com a versão contraditória do estado de conservação inicial do locado, e do seu agravamento, art.ºs 9º, 19º e 20º, todos da Contestação;
· dispõe o art.º 1040º, n.º 1 do CC, que se por motivo não atinente à sua pessoa ou dos seus familiares, o locatário sofrer privação ou diminuição do gozo da coisa locada, haverá lugar a uma redução da renda ou aluguer proporcional ao tempo da privação ou diminuição e à extensão desta. Mas no n.º 2 exclui-se tal privação ou diminuição não ser imputável ao locador, aplicando-se a secção II, ie art.ºs 1032º, 1033º e ss;
· por sua vez, dispõe o art.º 426º, do CC, que, nos contratos bilaterais, se não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação, enquanto o outro não efetuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo;
· o contrato de arrendamento, como alegam os Réus, é um contrato bilateral oneroso e sinalagmático, e não tendo o senhorio diligenciado pela reparação do locado, poderia ver obstaculizado o seu direito à resolução do contrato;
· não logrou a Ré, fazer prova do que alegara, ou seja, que após dar conhecimento ao senhorio do sinistro, sinistro que deixou inabitável o arrendado, porque antes já não o era, a Autora/senhorio não diligenciou no sentido de arranjar uma habitação para a inquilina residir e realizou obras de reparação;
· e só assim a inquilina, teria toda a legitimidade para recusar o pagamento da renda mensal, até porque os referidos três meses de renda, são as rendas de agosto, setembro e outubro de 2020 (passe o lapso de escrita repetido nos autos, alusivo ao ano de 2019;
· assim e quanto ao pedido de pagamento de quantia certa, quanto às rendas vencidas e não pagas, nos meses supra elencados, e nas rendas que se venceram, até à efectiva entrega do locado, no caso 22 de abril de 2022, procede o peticionado;
III.5.3. Vem provado entre o mais que “Já em maio de 2020, a 1ª Ré e o sr. E … já haviam trocado mensagens electrónicas sobre o (mau) estado do locado e a existência e ou agravamento de infiltrações, a 1ª Ré acompanhou a Dª. D …, e um perito de seguros ao locado, em data não concretamente apurada”. Também vem provado, com relevância que “8. No dia 22 de outubro de 2020, a 1º Ré deixou de poder fruir do locado, devido a infiltrações de água, provindas do telhado; 9. Pois tais infiltrações fizeram ruir parte dos tetos da sala e do quarto; 10. Quer a sala, quer o quarto, quer a cozinha, ficaram com água; 11. Foram chamadas ao local, as autoridades competentes, as quais comunicaram à 1ª Ré que estava impedida de habitar o locado, 12. E que transmitiram à 1ª Ré que o sucedido, se devia muito provavelmente à existência de telhas partidas no telhado e à falta de limpeza dos algerozes”. Ou seja, o locado padecia, antes do episódio do dia 22/10/2020, de problemas de infiltrações, mais precisamente em Maio de 2020 já padecia desses problemas de que a 1.ª Ré chamou a atenção ao senhor E …, na sequência do que, em data não concretamente apurada, se deslocou um perito de segurador ao locado para avaliação. Não vem provado que limitações é que essas infiltrações trouxeram ao gozo do locado, mas seguramente que algumas foram que, não obstante, não impossibilitaram o gozo do locado que se vinha fazendo desde o início do arrendamento datado de 2016, evidenciando-se que o locador tomou a providência de fazer deslocar um perito de segurador ao locado embora se desconheça a data em que tal ocorreu e o resultado. Apenas a partir de 22/10/2020 é que o locatário ficou impedido de fruir o locado sendo certo que acabou por o entregar em Abril de 2022. Os réus não lograram fazer a prova de que comunicaram, imediatamente, seja acto contínuo, o mencionado acontecimento de 20/10/2020, que impediu, comprovadamente, o gozo do locado. Sabe-se que o senhorio pediu as chaves do locado ao arrendatário para poder inspeccionar o locado, avaliar os danos e ordenar a sua reparação e que tal não aconteceu porque a arrendatária pretendia, previamente, ser indemnizada dos valores que reclamava dos prejuízos que dizia ter sofrido, o que manifesta não só a sua falta de colaboração e até má fé contratual, como o incumprimento da obrigação acessória que sobre o arrendatário recai e vem contemplada não só na alínea h) como na alínea e) do art.º 1038, do CCiv, ou seja, o réu em não tolerou a reparação porque condicionou essa reparação (e a prévia avaliação do imóvel) à reparação dos prejuízos por si sofridos. Nos termos do Artigo 1038º, alínea h), do Código Civil, constitui obrigação do locatário avisar imediatamente o locador sempre que tenha conhecimento de vícios da coisa. Não vem demonstrado que o Autor se tenha negado a fazer obras, caso assim fosse a declaração expressa do autor no sentido de que não faria as obras, integraria uma recusa do cumprimento da obrigação legal de efectuar obras de conservação decorrente dos Artigos 2º do Decreto-lei nº 157/2006, de 8.8., 1074º, nº1 e 1111º do Código Civil. Uma recusa de cumprimento do contrato tem como consequência o incumprimento definitivo do contrato pelo devedor, dispensando-se qualquer interpelação admonitória por parte do credor – cf. Artigo 798º e 801º do Código Civil. Havendo um protelamento na decisão de realização de obras, por via desse protelamento ocorre o incumprimento dessa obrigação por parte do senhorio, por outro lado. Relativamente ao locador é sua obrigação a de assegurar ao locatário o gozo da coisa para os fins a que a coisa se destina (art.º 1032/b do CCiv). Mais estipula o art.º 1040/1 que se por motivo não atinente à sua pessoa ou à dos seus familiares, o locatário sofre uma privação ou diminuição do gozo da coisa locada, haverá lugar a uma redução da renda ou aluguer proporcional ao tempo da privação ou diminuição e à extensão desta sem prejuízo do disposto na secção anterior seja da possibilidade que assiste ao locatário de efectuar as reparações urgentes com direito ao reembolso (art.º 1036 do CCiv) de usar contra o locador os mesmos meios que assistem ao possuidor (art.º 1037 do CCiv), considerar o contrato não cumprido nos termos dos art.ºs 1032, 1033 e 1034, ou pedir a sua resolução. Nas situações do art.º 1032, não ficando o locador liberto da obrigação de assegurar o gozo da coisa, como resultado do art.º 1031 do CCiv, caso o locador não elimine o defeito pode o locatário exigir uma indemnização pelo prejuízo que lhe advier, não em consequência do não cumprimento do contrato mas em consequência da existência dos defeitos e da sua não eliminação, tudo isto sem prejuízo do art.º 1040 do CCiv. O Réu não efectuou as reparações no locado nem intentou usou com quaisquer meios de defesa da posse contra o locador, não pediu a sua resolução, considerou o contrato não cumprido e deixou de pagar as rendas invocando justa causa para o incumprimento dessa obrigação. O artigo 1040, do CCiv equivale a uma manifestação especial da excepção do contrato não cumprido, prevista nos artigos 428º a 431º do Código Civil – cf. Menezes Cordeiro (Coord.), Leis do Arrendamento Urbano Anotadas, Almedina, 2014, p. 72. Conforme se refere pertinentemente no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9.12.2008, Nuno Cameira, 08A3302, «É entendimento comum, desde logo, que em matéria de locação a excepção do não cumprimento do contrato tem um limitado campo de aplicação, talvez porque, como salienta Aragão Seia (Arrendamento Urbano, 7ª edição, pág. 412), “uma vez entregue ao locatário a coisa locada, o sinalagma em grande medida se desfaz. Certo, o locador continua obrigado a proporcionar o gozo da coisa ao locatário; mas esta é uma obrigação sem prazo ou dia certo para o eu cumprimento, ao passo que é a termo a do pagamento da renda”. De qualquer modo, tem-se admitido o funcionamento do instituto mesmo no caso de incumprimento parcial ou de cumprimento defeituoso, mas fazendo intervir então, sempre que as circunstâncias concretas o imponham, o princípio da boa fé e a “válvula de segurança” do abuso do direito (artºs 762º, nº 2, e 334º do CCiv). E isto porque, como justamente observa o Prof. Almeida Costa na RLJ 119º, pág. 144, “seria contrário à boa fé que um dos contraentes recusasse a sua inteira prestação, só porque a do outro enferma de uma falta mínima ou sem suficiente relevo. Na mesma linha, surge a regra da adequação ou proporcionalidade entre a ofensa do direito do excipiente e o exercício da excepção. Uma prestação significativamente incompleta ou viciada justifica que o outro obrigado reduza a contraprestação a que se acha adstrito. Mas, em tal caso, só é razoável que recuse quanto se torne necessário para garantir o seu direito”. Em particular no âmbito da locação, este mesmo Autor (loc. cit., pág. 145/146), depois de chamar a atenção para o facto de a ideia de proporcionalidade ou equilíbrio das prestações aflorar a propósito da redução da renda ou aluguer se o locatário sofrer privação ou diminuição do gozo da coisa, conclui o seguinte: “O recurso do arrendatário a este instituto, se existe cumprimento defeituoso ou parcial pelo senhorio, apenas o dispensa de pagar a renda correspondente à falta verificada. A quantificação pode tornar-se mais ou menos difícil. Quando as partes não chegarem a acordo subsiste o remédio da consignação em depósito, mas o arrendatário corre o risco de o seu cálculo pecar por defeito, depositando uma renda menor do que a devida”. Ora, a excepção de não cumprimento tem de ser invocada pela parte de forma expressa ou tácita, não podendo ser conhecida oficiosamente pelo juiz – cf. CALVÃO DA SILVA, Cumprimento e sanção pecuniária compulsória, 4ª Ed., 2002, p. 334; Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 27.9.2007, Graça Araújo, de 26.6.2008, Granja da Fonseca, acessíveis em www.dgsi.pt/jtrl. A invocação tácita tem de resultar de factos alegados pelo excipiente que inequivocamente a exprimam – cf. Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 8.6.93, Francisco Lourenço, CJ 1993- III, pp. 55 – 57, da Relação de Guimarães de 9.4.2003, Arnaldo Silva, CJ 2003 – II, pp. 281 a 284. O ónus da prova da exceptio incumbe ao arrendatário – cf. Acórdão da Relação do Porto de 12.5.2015, Fernando Samões, 1012/12 e da Relação de Guimarães de 3.3.2016, Jorge Seabra, 328/14.  Houve privação ou diminuição do gozo do locado? Se sim o incumprimento do pagamento das rendas deu-se a partir desse preciso momento? Estava o arrendatário, independentemente da avaliação relativa à privação ou diminuição do uso do locado legitimado a recusar desde logo o pagamento das rendas?
III.5.4. O locatário deixou de cumprir a sua obrigação contratual de pagamento das rendas em momento anterior à comprovada privação do gozo do locado, o que lhe retira a legitimidade pata excepcionar o não cumprimento doa brigo do disposto no art.º 428 do CCiv. A excepção de não cumprimento consiste na recusa de efectuar a prestação por parte de um dos contraentes quando o outro a reclama, sem que este, por sua vez, efectue a respectiva contraprestação, para que a exceptio funcione exige-se, além do mais, que as prestações sejam correspectivas ou correlativas, isto é, interdependentes, sendo uma o motivo determinante da outra. O excipiens apenas recusa a sua prestação até que a outra parte realize a prestação a que está adstrito A exceptio visa assegurar o equilíbrio, mediante o cumprimento simultâneo, em que assenta o esquema do contrato bilateral, como afirmam Pires de Lima e Antunes Varela (anotação ao art.º 428 do CCiv, Coimbra editora, 4.ªe dição, 2011, vol I) opera não só no caso de falta integral de cumprimento, como no caso de incumprimento parcial ou cumprimento defeituoso. Como refere Antunes Varela (0bra citada), “a exceptio não vigora como uma sanção ...por isso ela vigora não só quando a outra parte não efectua a sua prestação porque não quer mas também quando ela não a realiza ou não oferece porque não pode...vale tanto para a falta integral do cumprimento como para o de cumprimento parcial ou defeituoso desde que a sua invocação não contrarie o princípio geral da boa fé consagrado nos art.ºs 227 e 762/2...”. Quando haja uma interdependência entre as prestações seria, além de ilegal, a todos os títulos injusto permitir que o contraente faltoso pudesse exigir a contraprestação, como se nenhuma falta houvesse da sua parte, premiando quem prevaricou, ainda segundo Antunes Varela. O início do incumprimento do pagamento das rendas ocorreu antes do episódio de 20/10/2020 que originou, comprovadamente, a impossibilidade do gozo do locado pelo arrendatário. Depois da ocorrência que determinou a privação do gozo do locado, o arrendatário veio a comunicar essa situação, muito embora se desconheça a data em que o fez; ainda que essa comunicação tivesse tido lugar logo a seguir ao episódio as obrigações contratuais do arrendatário não terminaram aí na medida em que ao senhorio assistia o direito de inspecionar o locado, avaliar o estado em que ficara e os estragos aí produzidos pelo sinistro e o arrendatário não permitiu que tal ocorresse, por isso o senhorio não só não conseguiu avaliar os estragos produzidos como estava impossibilitado de proceder à reparação, nessa circunstância a manutenção da privação do gozo do locado (cuja extensão o senhorio desconhecia até finais de Abril de 2022), ficou a dever-se inteiramente ao próprio arrendatário, não lhe assistindo qualquer direito quanto à redução do valor da renda a pagar (ou sua isenção), mantendo-se também aí o decidido.
III.6. Saber se em face dos prejuízos sofridos pela Ré e comprovados em razão da alteração da decisão de facto em conformidade com o disposto nos art.ºs 483º, 496, deve proceder o pedido reconvencional.
III.6.1. Sustenta a recorrente em suma que:
· a recorrente, como supra já se referiu, através do vídeo que fez e enviou à legal representante do senhorio e esta por sua vez lho o reenviou (doc. 18 junto com a contestação, comunicou ao senhorio, os prejuízos que teve;
· assim como, participou, a ocorrência e prejuízos às autoridades competentes, no caso PSP, (doc. 27, junto com a contestação) e ao qual o tribunal a quo, não deu qualquer valor, como consta da douta sentença “ ... limitou-se a alegar o que decorria da participação policial, que não é um documento autêntico;
· para prova da destruição dos seus móveis o estado em que ficaram, bem como a roupa, a recorrente, 1ª ré, juntou prova documental, a qual consta ad contestação, docs. 23 a 26, os quais demonstram a quantia e dimensão dos pedaços de teto, que caíram sobre os móveis e roupas e a causa pela qual os móveis e roupas, ficaram destruídas e danificadas;
· assim como não deu como provados os danos não patrimoniais, que a recorrente teve, pelo facto de não ter o arrendado em condições de ser habitado e ter de ir viver, para a casa de uma migo, onde já estava a residir um casal de nacionalidade brasileira;
III.6.1. Como acima se disse, a participação às autoridades policiais de uma certa ocorrência e o documento policial que consubstancia essa participação apenas fazem prova plena de que houve essa participação com esse conteúdo e nada mais. Tendo havido impugnação dos documentos por parte da Autora cabia à Ré a prova dos factos alegados enquanto integradores do seu direito à reparação (art.ºs 483 do CCiv), não tendo sido efectuada essa prova a falta dela resolve-se contra a Ré (art.º 414), o facto 29 dos factos dados como não provados, não pode ser dado como provado. Do mesmo passo a factualidade do ponto 31 dos factos dados como não provados pela simples razão de que a apelante não cumpre o sue ónus de impugnação da decisão de facto. Improcede nesse ponto o recurso.
III.7. Saber se com a Autora litiga de má fé ou abuso de direito.
III.7.1. Sustenta recorrente em suma que:
· a autora, não podia desconhecer, o estado que o imóvel onde se encontrava o arrendado;
· além de que omitiu, que tinha enviado à recorrente, uma carta a resolver o contrato de arrendamento;
· a recorrente,1ªré, à data, não juntou o documento com a contestação, nem posteriormente nos 20 dias antes á data agendada para a audiência de julgamento, apenas e só, porque não sabia se ainda tinha a referida carta e se a tinha onde se encontrava;
· realidade esta compreensível, dado que houve a inundação do arrendado, foi morar para a casa de um amigo, cerca de um ano, porque a autora/senhorio, não lhe arranjou uma nova habitação para residir e posteriormente mudou novamente de casa:
· tendo a recorrente, alegado o facto logo na sua contestação e requerido, a junção da carta, na primeira audiência de julgamento e havendo já agendada segunda data para continuação do julgamento, a junção tardia, não colocava em causa, o bom andamento dos autos nem levava a que fosse proferida uma decisão surpresa;
· aliás, a carta, pretendida juntar, provava não só, que a autora/senhorio, datada de 1 de fevereiro de 2021,enviada pela autora, era quem passava os recibos de renda, logo, agia em nome e representação do senhorio, bem como que a autora estava a litigar de má-fé e abuso do direito, pois estava a pedir o pagamento de rendas, quando já tinha resolvido o contrato de arrendamento;
III.7.2. Sobre o despacho que não admitiu o documento que não vem impugnado neste recurso já dissemos o que havia para ser dito, ou seja, não tem este Tribunal da Relação que se pronunciar sobre a matéria. Face à factualidade provada e não provada, tal como se decidiu na 1.ª instância não contêm os autos elementos que permitam condenar a Autora como litigante de má fé. De igual modo o exercício do direito de resolver o contrato de arrendamento nos comprovados moldes não evidencia qualquer ilicitude, por isso ilegitimidade nos termos do art.º 334 do CCiv. Improcede nessa parte o recurso.
III.8. Saber se o recorrente, 2º réu, fiador, nunca foi interpelado pela autora/senhorio, sobre a existência de rendas em atraso, consequentemente deve ser absolvido a decisão recorrida.
III.8.1. Na sua contestação os réus não alegam tal; no saneador tal não integra o objecto do litígio. Por essa razão não consta da sentença como questão a decidir, sendo certo que se não trata de questão de conhecimento oficioso (art.º 608/2); deveriam os réus ter suscitado a questão aquando da contestação em homenagem ao princípio da concentração da defesa, não o tendo feito, não sendo questão e conhecimento oficioso, precludiu o direito dos réus de suscitarem tal questão que sendo questão nova não pode ser conhecida por este Tribunal de recurso. Improcede por fim, também, nessa parte o recurso.

DECISÃO
Tudo visto acordam os juízes em julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença recorrida.
Regime da responsabilidade das custas: as custas deste recurso ficam a cargo dos Réus que decaem e porque decaem (art.º 527/1 e 2).

Lxa. 24-10-2024,
Vaz Gomes
Ana Cristina Clemente
Susana Gonçalves

[1] Na redacção que foi dada ao Código do Processo Civil pela Lei 41/2013 de 26/7, atento o disposto nos art.º 5/1, 8, e 7/1 (a contrario sensu) e 8 da mesma Lei; ao Código referido, na redacção dada pela Lei 41/2013, pertencerão as disposições legais que vierem a ser mencionadas sem indicação de origem.