I - Vindo invocada pela Autora a nulidade do Acórdão prolatado por este Supremo Tribunal de Justiça no dia 19 de junho de 2024 e que se acha prevista na alínea d) do número 1 do artigo 615.º, aplicável a este Aresto por força dos artigos 666.º e 685.º, todos do NCPC, importa realçar que só para aqui importa a fundamentação de tal arguição de nulidade, na precisa medida da sua invocação e justificação, sendo irrelevantes todos os mais argumentos e questões suscitadas que extravasem essa finalidade.
II - A presente ação declarativa com processo comum laboral foi proposta pela empresa empregadora contra o seu trabalhador, ao abrigo do disposto na parte final do número 7, por referência ao estatuído no número 2 do artigo 57.º do Código de Trabalho de 2009, destinando-se a mesma a discutir apenas a efetiva verificação do concreto motivo justificativo suscitado pela Autora para recusar o pedido de horário flexível do Réu e que não foi aceite por este último e pela CITE, competindo à mesma o ónus de alegar e provar os factos respetivos.
III - Logo, o objeto legalmente previsto para esta ação não pode abranger todas e quaisquer questões que a empregadora entenda por suscitar mas apenas aquelas que têm a ver com a existência das aludidas e impeditivas exigências imperiosas do funcionamento da empresa ou da impossibilidade de substituir o trabalhador se este for indispensável.
IV - Por força do cariz formal do referido procedimento, a pretensão da empregadora e a causa de pedir que lhe está subjacente nesta ação acha-se ainda condicionada pelo teor da decisão que se mostra referida no número 3 do artigo 57.º do CT/2009.
V – Face ao quadro substantivo e adjetivo exposto e olhando ainda para a fundamentação do Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 19/6/2024, apreciaram-se aí as questões que lhe eram consentidas julgar, por força de tal regime e dos limites materiais traçados pela justificação apresentada pela Autora no seu email de 28/12/2020, nada mais havendo a apreciar e a decidir por este STJ, por lhe estar vedado fazê-lo.
VI - Não houve assim, por parte deste tribunal e no referido Aresto, a prática de uma qualquer omissão de pronúncia que tivesse originada a imputada nulidade de sentença arguida pela recorrida.
ACORDAM OS JUÍZES NA SECÇÃO SOCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
I. – RELATÓRIO
1. ÁGUAS DO NORTE, S.A., com os sinais indicados nos autos, veio intentar, no dia 14/7/2021, a presente ação declarativa de processo comum laboral contra AA, com os sinais indicados nos autos, pedindo que seja declarada a existência de motivo justificativo para a recusa do horário de trabalho em regime de horário flexível requerido pelo Réu.
«Face a tudo o exposto, decide-se julgar a presente ação totalmente improcedente e, consequentemente, considerar não existir motivo justificativo para a Autora recusar a atribuição de horário flexível solicitada pelo Réu, pelo que se absolve o mesmo do pedido.
Custas pela Autora.
Registe e notifique.»
«Nestes termos, acordam os juízes que integram a Secção Social deste Tribunal da Relação em julgar procedente a apelação e, revogando a decisão recorrida, declara-se a existência de motivo justificativo para a recusa pela Autora/recorrente do horário de trabalho requerido pelo Réu/recorrido.
Custas da apelação a cargo do recorrido. Notifique.”
«1. O presente recurso de revista vem interposto do acórdão de 1.2.2024 proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães que julgou procedente a Apelação e revogou a decisão da primeira instância declarando a existência de motivo justificativo para a recusa pela Autora/Recorrente do horário de trabalho requerido pelo Réu/recorrido, entenda-se na apelação.
2. Decisão com a qual não nos conformamos por considerar que efetuou uma errada interpretação e consequente aplicação de normas legais constantes do Código do Trabalho e da Constituição da República Portuguesa.
3. A argumentação e consequente decisão do acórdão em apreço foi no sentido único de considerar que o teor da comunicação efetuada pelo trabalhador Réu à Autora foi de imposição de um horário fixo, sem dar margem ao empregador para a fixação de horário flexível.
4. Discordamos, não só porque nada na comunicação do trabalhador redunda na conclusão que o acórdão proferido da mesma retirou, como também porque a tese do acórdão recorrido é contrariada pelo teor da resposta da Autora de 28.12.20 – teor esse dado como reproduzido no ponto 9 dos factos provados.
5. O que resulta dos autos foi que a Autora não elaborou qualquer horário como lhe competia, nos termos do disposto no n.º 3 do art.º 56.º do CT.
6. O Réu limitou-se a fazer a escolha de horário no pedido que enviou à Autora, conforme aliás está claramente previsto no n.º 2 do art.º 56.º, do CT. A letra da norma é muito clara, da qual só pode resultar a interpretação de que permite ao trabalhador escolher o horário, obviamente dentro de certos limites. Limites esses constantes do n.º 4 do art.º 56.º do CT.
7. O art.º 56.º do CT, deve ser interpretado no sentido que da letra do mesmo resulta com a devida clareza, ou seja, que ao trabalhador é permitido efetuar uma escolha de horário na comunicação que dirige ao empregador, e ao empregador é que compete a fixação do horário flexível.
8. Razão pela qual, se entende que houve errada interpretação e aplicação da norma do art.º 56.º, do CT, e por isso a decisão proferida deve ser revogada.
9. Nos presentes autos não foi demonstrado pela Autora qualquer um dos fundamentos previstos no art.º 57.º, n.º 2, para que pudesse proceder à recusa de horário flexível ao Réu.
10. Razão pela qual, se entende que a decisão constante do acórdão da Relação de Guimarães em apreço, viola a norma do n.º 2 do art.º 57.º, do CT, e por isso a decisão proferida deve ser revogada.
11. A decisão proferida pelo acórdão em apreço coloca em causa o direito do Réu a poder conciliar a sua vida profissional com a vida familiar, em particular a assistência que pretende prestar aos seus filhos menores de 12 anos.
12. A decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães foi no sentido contrário ao de assegurar a obrigação do Estado em proteger as famílias e no caso do Réu a de o proteger como Pai na sua realização insubstituível em relação aos filhos.
13. Razão pela qual, se entende que a decisão proferida viola de foram inaceitável as normas constitucionais previstas nos art.ºs 59.º, 67.º e 68.º da C.R.P. e por isso deve ser revogada.
Nestes termos e nos mais de direito que Vexas doutamente suprirão, pelos fundamentos expostos nas alegações e conclusões apresentadas, deve ser concedido total provimento ao presente recurso de revista, revogando-se o acórdão recorrido, substituindo por outro que reponha a decisão da primeira instância, com o que farão, inteira e sã JUSTIÇA.»
«I. No entender da Recorrida, o Acórdão recorrido, que declarou a existência de motivo justificativo para a recusa pela Autora, ora recorrida, do horário de trabalho requerido pelo Réu, é profusamente fundamentada e não merece qualquer censura, antes constituiu um exemplo de administração correta e profícua da justiça.
II. A Recorrida louva e revê-se no douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, não tendo qualquer fundamento o lamento do Recorrente ínsito nas suas alegações, pelo que, bem andou o Tribunal a quo ao decidir como decidiu, tendo sido feita correta decisão da matéria de facto e correta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.
III. A Recorrida, face ao pedido de regime de horário de trabalho flexível pelo Recorrente, comunicou-lhe, fundamentadamente, a impossibilidade de aceder ao solicitado, informando que a atividade exercida pelo trabalhador no regime de turnos era indispensável para assegurar o normal abastecimento a que a Recorrida está obrigada face aos contratos de concessão estabelecidos com o Estado Português, através do Decreto-Lei n.º 93/2015, de 29 de maio; bem como que tal alteração de horário prejudicaria (como prejudicou)o funcionamento do subsistema a que está adstrito, onde existe a necessidade de operar de forma contínua, 7 dias por semana, pelo que, por via dos contratos de concessão aludidos, a Recorrida exerce um trabalho contínuo e ininterrupto.
IV. Prescreve o art.º 56.º, n.º 2 do CT que «Entende-se por horário flexível aquele emque o trabalhador pode escolher, dentro de certos limites, as horas de início e termo do período normal de trabalho diário.».
V. Porém, a Recorrida, por razões de força maior conexas com o seu próprio interesse enquanto entidade empregadora, e devidamente fundamentadas na lei, indeferiu o pedido do Recorrente, de um alegado horário flexível que de flexível nada tinha.
VI. Ainda assim, face à elaboração da proposta de horário pelo Recorrente (o que não lhe competia), a Recorrida procedeu à formulação de decisão de indeferimento de forma completa e justificada.
VII. Não percebeu o Recorrente que não lhe competia a elaboração do horário flexível.
VIII. Diga-se, ainda assim, que o horário solicitado pelo Recorrente não tinha nada de flexível, configurando-se, ao invés, como um horário em regime fixo. Vejamos:
IX. O Recorrente solicitou que os termos do seu horário se fixassem com início às 7:00 horas e termo às 16:00 horas, o qual integrava a pausa para almoço das 13:00 às 14:00 horas, sendo que a plataforma fixa compreendia os períodos das 10:00h às 12:00h e das 14:00h às 16:00h.
X. Assim, tendo em conta que o Recorrente teria sempre de cumprir com o trabalho normal diário de 8 horas, perfazendo o total de 40 horas semanais, o horário solicitado não permitia à Recorrida enquadrar o trabalhador noutro horário que não o requerido, o que, na prática, se traduz num verdadeiro horário fixo.
XI. À luz do art.º 56.º do CT, não pode o trabalhador, de forma unilateral e vinculativa, fixar o seu próprio horário de trabalho, como fez, pelo que, por tudo o sobredito, o Acórdão recorrido respeita todas as disposições legais e jurisprudenciais, não assistindo, portanto, razão ao Recorrente.
XII. Alega o Recorrente que a Recorrido não demonstrou os fundamentos para a recusa do horário flexível, o que é, manifestamente, falso.
XIII. Em cabal cumprimento do n.º 2 do art.º 57.º do CT, que determina que o empregador apenas pode recusar o pedido de horário flexível que lhe seja formulado por um trabalhador se estiver perante exigências imperiosas do funcionamento da empresa ou na impossibilidade de substituir o trabalhador se este for indispensável, a Recorrida, via E-mail de 28/12/2020, informou o Recorrente da sua decisão de indeferimento, justificada pela laboração em regime de turnos e que tal alteração de horário colocaria em causa o regular funcionamento do subsistema em causa, onde tem necessidade de operar de forma contínua e ininterrupta.
XIV. Acresce que, tal horário, que chegou a ser praticado pelo Recorrente, conjugado com o facto de outro elemento da equipa beneficiar de horário flexível (este sim, com motivos imperiosos e atendíveis), causou enorme prejuízo e transtorno à Recorrida, que não consegue dar resposta ao cumprimento dos contratos de concessão no abastecimento de águas residuais aos municípios.
XV. Tal horário culminou até com prejuízos para os restantes trabalhadores, que viram o seu descanso e tempo familiar prejudicado.
XVI. Enquanto a Recorrida, por seu lado, tem de lhes pagar horas suplementares e, por via do cansaço extra dos seus trabalhadores, está sujeita à ocorrência de erros laborais, com consequente prejuízo para os consumidores finais.
XVII. Assim, dúvidas não restam acerca do cumprimento, pela Recorrida, do preceituado no n.º 2 do art.º 57.º do CT.
XVIII. Não pode ter acolhimento a interpretação do Recorrente quando afirma que o Tribunal a quo, com a decisão em crise, colocou em causa os seus direitos constitucionalmente protegidos ínsitos nos artigos 59.º, 67.º e 68.º, todos da CRP.
XIX. O Recorrente descurou que também a entidade empregadora goza de direitos constitucionalmente tutelados, designadamente os direitos à iniciativa privada, cooperativa e autogestionária (art.º 61.º da CRP), à liberdade de iniciativa e de organização empresarial no âmbito de uma economia mista (art.º 80.º, al. c) da CRP) e direitos constitucionais concernentes às empresas privadas (artigos 82.º, n.º 3 e 86.º, n.º 1 da CRP).
XX. No entanto, no âmbito da relação jurídica entre trabalhador e empregador, este conjunto de direitos constitucionais não goza de natureza absoluta, sendo muitas vezes restringidos em prol da compatibilização dos interesses de ambas as partes.
XXI. Esta harmonização está patenteada nos artigos 56.º e 57.º do CT, que preveem que o horário flexível será fixado pelo empregador, que estabelece os limites temporais dento dos quais o horário flexível pode ser exercido, sendo que depois, dentro desse balizamento, o trabalhador poderá gerir o seu tempo por forma a poder cuidar dos seus filhos menores.
XXII. Esta conciliação de interesses terá de ser realizada atentando às necessidades e exigências de ambas as partes, no caso concreto.
XXIII. Como sabemos e resulta provado, a Recorrida encontra-se adstrita a imposições contratuais que a obrigam a adotar uma laboração em regime de turnos, de maneira a assegurar-se o normal abastecimento dos recursos hídricos, pelo que o regime flexível prejudica severamente o seu funcionamento.
XXIV. Por outro lado, nunca foram pelo Recorrente concretizadas as necessidades que alega enfrentar relativamente à prestação de assistência aos seus filhos menores.
XXV. O Recorrente não revela a situação profissional da progenitora, os motivos pelos quais o horário pretendido seria mais benéfico para o exercício da sua parentalidade, ou sequer a idade dos menores, elementos fácticos estes que seriam absolutamente essenciais para aferir das necessidades do Recorrente.
XXVI. Assim, por tudo o supra exposto, e dadas as imperiosas exigências da Recorrida e à falta de justificação do Recorrente, podemos concluir que está justificada a recusa do regime de horário flexível.
XXVII. E, assim, por todas as razões apontadas, o recurso interposto pelo Recorrente deverá improceder na sua totalidade.
Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso de revista ser julgado não provado e totalmente improcedente, e, em consequência, manter-se o Acórdão recorrida, assim se fazendo a costumada e boa…JUSTIÇA.»
«Somos, assim, de parecer que o recurso interposto pelo recorrente deverá ser considerado procedente, revogando-se o douto acórdão recorrido.»
«Atento o exposto, acordam os Juízes que compõem a Secção Social julgar procedente o recurso de revista interposto pelo Réu AA, com a inerente revogação do recorrido Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães e a repristinação da sentença da 1.ª instância.
Custas a cargo da Autora, quer no que toca à ação, como no que respeita ao recurso, nos termos do número 1 do artigo 527.º do CPC/2013.
Notifique e registe.»
«1.º - Por Acórdão datado de 04.07.2024, sob a Ref.ª ...26, foi o Recorrente notificado da decisão que julgou procedente o recurso de Revista interposto pelo Réu AA e, em consequência, revogou o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, com a respetiva repristinação da Sentença de 1.ª Instância.
2.º - Para tanto, encontra-se fundamentado que as dificuldades de serviço da ora Recorrente que ressaltam dos factos dos autos não podem ser configuradas juridicamente como impeditivas, de uma forma estrutural, grave, incontornável e socialmente inexigível, da normal e regular atividade da empresa, de forma que seja legítimo à Autora/Recorrente qualificá-las como necessidades imperiosas da mesma e, nessa medida, obstar à modificação do horário requerido pelo Réu/Requerido.
3.º - Ora, considera o Recorrente que o douto Tribunal incorreu em erro na qualificação jurídica dos factos e que constam dos autos prova suficiente que, só por si, implicam necessariamente decisão diversa da que antecede, deverá a presente Reclamação ser aceite, nos termos e para os efeitos dos artigos. 616.º, n.º 2, alíneas a) e b) e 666.º do CPC, ex vi art.º 685.º do mesmo diploma legal. Assim como incorreu em omissão de pronúncia, o que configura uma nulidade do acórdão nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. d) ex vi do artigo 666.º, n.º 1 e 2 do CPC.
4.º - Serviu de base à prolação do presente Acórdão, a questão suscitada pelo Recorrente/trabalhador, no seu ponto D) do recurso, sob o título “Da violação dos artigos 59.º, 67.º e 68.º da CRP”. Nesse ponto, o trabalhador alegou que a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães colocou em causa o direito do Réu a poder conciliar a sua vida profissional com a vida familiar, em particular a assistência que pretende prestar aos seus filhos menores de 12 anos.
5.º - Entendeu o trabalhador, e assim o alegou nas suas alegações de recurso que, a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães foi no sentido contrário ao de assegurar a obrigação do Estado em proteger as famílias e no caso do Réu a de o proteger como Pai na sua realização insubstituível em relação aos filhos.
6.º - Ora, não se compreende por que razão, tendo tal questão sido suscitada pelo Recorrente e respondida pela Recorrida em sede de contra-alegações, qual o motivo para que o douto Tribunal tivesse considerado que tal questão já estava definitivamente ultrapassada.
7.º - Tal questão foi colocada pelo próprio trabalhador no seu recurso de revista. E foi devidamente respondida pela Recorrida nas suas contra-alegações.
8.º - Além disso, era, como é, uma questão de particular importância, porquanto o pedido de horário flexível feito pelo trabalhador não obedeceu aos requisitos do artigo 57.º, n.º 1 do CT.
9.º - Atento o exposto, deveria o douto STJ ter-se debruçado sobre esta questão, que aliás não foi apenas levantada pela recorrida nas suas contra-alegações como parece o douto Tribunal entender, mas foi abordada pelo Recorrente/trabalhador nas suas alegações de revista e por isso objeto de contraditório pela Recorrida em sede de contra-alegações.
10.º - Nestes termos, entendemos que o douto Tribunal omitiu o dever de ser pronunciar sobre questão que merecia a sua apreciação, o que é causa de nulidade do acórdão nos termos do disposto na alínea d), do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, ex vi do artigo 666.º, n.º 1 e 2 do CPC e ainda 77.º, e 1.º, n.º 2, al. a) do CPT.
11.º - Conforme consta dos autos, e de toda a prova produzida nesse sentido em sede de julgamento, a razão pela qual foi o pedido de horário flexível apresentado recusado foram as exigências imperiosas da Recorrente.
12.º - Isto porque, sendo a Recorrente uma empresa do sector empresarial do Estado, não dispõe de recursos para contratar mão de obra que permitisse e assegurasse o normal funcionamento do Núcleo Operacional da ..., concedido o horário flexível.
13.º - O Núcleo Operacional da ... é uma infraestrutura de abastecimento de água para consumo humano, onde é necessário trabalhar sete dias por semana e 24 horas por dia.
14.º - Foi necessário proceder à alteração dos horários de trabalho, à qual o Recorrido deu a sua concordância, no Núcleo Operacional da ..., uma vez que se verificou um aumento muito significativo dos volumes de abastecimento ao município de ... ou ....
15.º - O que resultou no alargamento do período de acompanhamento físico do Núcleo da ... e motivo ainda pelo qual era (e é) absolutamente necessário contar com uma equipa de 5 elementos, por só assim ser a Recorrente capaz de cumprir com as suas obrigações.
16.º - Portanto, os horários praticados e a equipa formada nos moldes em que estava (na ...) decorriam de uma necessidade premente da empresa, necessária face ao modo de funcionamento dessa instalação, tendo sido a alteração de horários uma mudança fulcral.
17.º - Caso em que, se não tivesse ocorrido, colocaria em risco o normal e bom funcionamento da empresa, bem como a qualidade do serviço prestado – água para consumo humano.
18.º - E por só assim conseguir a Recorrente satisfazer os compromissos no âmbito dos contratos de concessão que assumiu, porquanto, tendo em consideração que a grande maioria das tarefas diárias só podem ser executadas presencialmente, a alteração do horário do Recorrido, conforme por ele indicado, põe em causa o funcionamento da empresa.
19.º - Ainda para mais quando na equipa já existia um colega, BB, a quem tinha sido concedido horário flexível e, claro está tendo um novo elemento, da mesma equipa, a solicitar horário flexível, nos moldes em que solicitou, era totalmente incompatível com os horários que estavam a ser praticados.
20.º - Com efeito, a atribuição desse horário flexível, nos moldes em que foi solicitado pelo Recorrido, causou enorme prejuízo para a Recorrente que não conseguiu dar resposta às obrigações que assumiu por força dos contratos de concessão, conforme confirmado pelos seus trabalhadores.
21.º - Dito isto, salvo o devido respeito, entende a Recorrente que efetivamente existiu fundamento para recusa do horário flexível, fundado em exigências imperiosas da empresa e na impossibilidade da substituição do Recorrido.
22.º - Tendo ficado devidamente comprovado nos autos que a alteração do horário de trabalho do Recorrido colocou em causa o cabal funcionamento da atividade da Recorrente, mais concretamente no que ao Núcleo da ... diz respeito, atendo à dimensão deste e ao volume de trabalho, bem como à forma de operar.
23.º - E se tais dificuldades de funcionamento não podem ser configuradas juridicamente como impeditivas, de uma forma estrutural, grave, incontornável e socialmente inexigível, da normal e regular atividade da empresa, de forma que seja legítimo à Recorrente qualificá-las como necessidades imperiosas da mesma e, nessa medida, obstar à modificação do horário requerido pelo Requerido, então não sabemos que motivos existem de facto para uma empresa recusar tal pedido de um trabalhador…
24.º - Pelo exposto, considera o Recorrente que o douto Tribunal incorreu em erro na qualificação jurídica dos factos e que constam dos autos prova suficiente para concluir que a recusa por parte da Recorrente do pedido de horário flexível foi devidamente justificada, face às exigências imperiosas do funcionamento da empresa, nos moldes supra aludidos.
25.º - Porquanto, não pode o Recorrente concordar com a supra referida decisão, por entender que existe uma incorreta interpretação do direito ao caso em apreço, nomeadamente por violação do n.º 2 do art.º 57.º do Código do Trabalho.
26.º - O Recorrido foi contratado, a 04/06/2010, pela Recorrente e prestaria o seu trabalho de segunda a sexta-feira, num período normal de trabalho de oito horas diárias e quarenta horas semanais, com uma hora para o almoço, tendo sido estipulada a possível alteração,e respetivo consentimento,na organização do horário de trabalho, em virtude do funcionamento dos serviços da Recorrente.
27.º - Ora, sucede que, a 11/12/2020, o Recorrido solicitou à Recorrente que lhe fosse atribuído um regime de horário flexível, de segunda a sexta-feira, para prestar assistência aos filhos menores de 12 anos, solicitando que o seu horário de trabalho passasse a ser das 07h00 às 13h00 da parte da manhã e das 14h00 às 16h00 da parte de tarde, constituído por uma componente fixa de quatro horas, das 10h00 às 12h00 e das 14h00 às 16h00 horas, com período para intervalo de descanso diário das 13h00 às 14h00.
28.º - Horário esse a manter-se até que a sua filha mais nova perfizesse 12 anos de idade, desconhecendo a Recorrente, à data em que foi feito o pedido, a idade da filha mais nova do Recorrido.
29.º - A 28/12/2020 foi comunicado ao Recorrido a decisão de recusa do pedido de horário flexível, devidamente fundamentada e justificada, com o reparo de que havia sido acordado, em Janeiro de 2021, a alteração dos horários em regime de turnos.
30.º - Tudo porque, tendo em conta a dinâmica e organização da empresa Recorrente, designadamente do Núcleo Operacional da ..., onde o Recorrido desempenha funções,nunca seria possível à Recorrente aceitar o pedido de horário flexível, nos moldes melhor supra expostos.
31.º - Mas, após o Recorrido ter solicitado o horário flexível, e em virtude do parecer desfavorável da CITE, a partir de 08/02/2021, o Recorrido passou ao horário flexível das 07h00 às 13h00 e das 14h00 às 16h00, constituído por uma componente fixa de quatro horas, das 10h00 às 12h00 e das 14h00 às 16h00.
32.º - Bem vistas as coisas, o Recorrido deixou de trabalhar aos fins de semana, assim como deixou de trabalhar até às 22h00 no turno parcialmente noturno, trabalhando apenas até às 16h00, de segunda a sexta-feira, em regime de horário fixo.
33.º - Com o horário flexível a ser praticado pelo Recorrido, e por existir na equipa outro colaborador a quem foi concedido horário flexível (BB) pelo prazo de um ano, a equipa ficou apenas com três elementos a fazer trabalho em regime de turnos e a trabalhar aos fins de semana.
34.º - Colocando a Recorrente numa situação de enorme prejuízo e transtorno, já que deixou de conseguir dar resposta, no cumprimento dos contratos de concessão, no abastecimento de água para consumo humano e saneamento de águas residuais aos municípios, designadamente o de ....
35.º - Note-se bem, o Recorrido no seu pedido de horário flexível indica apenas o horário pretendido por si, não restando grandes alternativas à Recorrente do que o de o enquadrar num horário que não seja fixo, indicado por si.
36.º - Isto, na prática, acaba por se traduzir num horário fixo e não num horário flexível.
37.º - O que o Recorrido pretende não constituiu um pedido de atribuição de horário flexível, previsto no art.º 56.º do CT, pois que o que ele pretende é ser ele próprio, unilateralmente, e sem qualquer maleabilidade a estabelecer os limites dentro dos quais pretende exercer o seu direito, donde não ser o horário pretendido subsumível à previsão legal do art.º 56.º do CT.
38.º - O horário indicado pelo Recorrido é fixo e rígido em todos os seus parâmetros, não respeitando a expressão “horário flexível” a sua semântica pois que o termo “flexível” não tem no horário proposto pelo Recorrido qualquer aderência à realidade.
39.º - Este horário indicado pelo Recorrido, não parece, de todo, constituir um pedido de atribuição de horário flexível, pois que o mesmo não é subsumível na previsão legal do art.º 56.º do CT e no regime de horário flexível aí previsto e regulado.
40.º - Nos termos do n.º 3 do artigo 56º do CT, é à entidade empregadora que compete elaborar o horário de trabalho, não se mostrando previsto que o trabalhador possa indicar os limites quer para o início do período inicial, quer para o termo do trabalho.
41.º - Acresce ao supra exposto que o Recorrido, no seu pedido, não disse expressamente durante quanto tempo requeria o horário flexível, apenas referindo que pretendia até a sua filha menor de idade perfazer 12 anos.
42.º - Acontece ainda que o Recorrido não fundamentou o seu pedido de horário flexível com impossibilidade ou incompatibilidade do horário da mãe dos seus filhos.
43.º - Não sabia a Recorrente se a mãe dos filhos do Recorrido tem ou não capacidade para prestar o apoio familiar que permita ao Recorrido continuar a ter o seu horário normal.
44.º - Pelo que deveria o Recorrido ter invocado essa circunstância por forma a fundamentar o seu pedido.
45.º - Apenas quando a Recorrente enviou ao Recorrido a comunicação da intenção de recusa do pedido, é que este último, na sua apreciação, abordou o facto de ter dois filhos menores de 12 anos, que dependem dos seus cuidados, advertindo a Recorrente que até à emissão de parecer da CITE, iria cumprir com o seu horário de trabalho.
46.º - Sabe-se que o n.º 1 do art.º 56.º do CT consagra o direito do trabalhador ao horário flexível, estando o conceito de tal direito definido no n.º 2 do mesmo preceito, nos termos do qual se entende por horário flexível aquele em que o trabalhador pode escolher, dentro de certos limites, as horas de início e termo do período normal de trabalho.
47.º - Certo sendo que os limites dentro dos quais o trabalhador poderá escolher o horário serão os que decorrem do n.º 3 e, deste, resulta que é o empregador quem deve elaborar o horário em conformidade com o que nele se estipula.
48.º - Pelo exposto, considera o Recorrente, salvo o devido respeito, que o douto Tribunal incorreu em erro na qualificação jurídica dos factos, na medida em que o pedido apresentado pelo Recorrente nunca podia ser subsumível à previsão legal do art.º 56.º do CT, pelo que assiste à entidade empregadora o poder de o recusar por não respeitar o previsto na alínea b) do n.º 3 do artigo 56.º do CT.
49.º - Põe ainda em causa este Tribunal a boa-fé da alteração de horários pela entidade empregadora, mas com o devido respeito essa questão já foi decidida e resultou provado que:
“8. Por comunicação electrónica (email), datada de 11 de Dezembro de 2020, dirigida ao coordenador dos Recursos Humanos da A., o Réu solicitou que lhe seja atribuído um regime de horário flexível nos seguintes termos: “Eu, AA, ... AA a exercer função de operador na ETA de ..., nos termos do disposto no art. 56.º e 57.º do código do trabalho, e demais normas legais e regulamentares aplicáveis, venho por este meio solicitar que me seja atribuído um regime de horário flexível de segunda a sexta-feira para prestar assistência aos filhos menores de 12 anos, em vigor a partir do dia 12 de Janeiro de 2021 até a minha filha menor atingir 12 anos de idade.
Horário das 07:00 horas às 13:00 horas da parte da manhã, das 14:00 horas as 16:00 horas da parte da tarde, constituído por uma componente fixa de 4 horas (plataformas fixas), das 10:00 horas às 12:00 horas da manhã e das 14:00 as 16:00 da tarde, período de intervalo de descanso diário das 13:00 as 14:00 horas.(…)” – cfr. documento junto com a p.i., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.”
50.º - Ou seja, mais uma vez, não se entende qual o alcance da conclusão do STJ quando diz: “As questões relativas ao pedido de horário flexível têm de ser equacionadas por referência ao horário de trabalho que era praticado pelo Réu na data da sua dedução e não em função da alteração posterior que foi introduzido pela Autora, sendo certo que essa modificação temporal, assim como a subsequente transferência de local de trabalho, que não se mostram justificadas nos autos, suscitam dúvidas quanto à sua motivação, boa-fé e legalidade.”
51.º - Veja-se o que resultou provado do ponto 8 da matéria de facto dada como provada, e da fundamentação do Tribunal da Relação de Guimarães, na sua fundamentação sobre esse ponto, e que supra se transcreveu.
52.º - Ou seja, não se vislumbra de onde é que os Exmos. Senhores Drs. Conselheiros retiraram essa conclusão, pondo em causa a boa-fé, a motivação e a legalidade da alteração do horário de trabalho do Recorrido.
53.º - Resulta da prova produzida em julgamento e da matéria de facto julgada provada, e que não foi alterada, que a questão da alteração dos horários já havia sido comunicada aos trabalhadores antes de este ter apresentado o pedido de horário flexível.
54.º - Todavia, não tinha, o Douto Tribunal matéria probatória que lhe permitisse retirart al conclusão, pelo que ao assim decidir, violou o Supremo Tribunal de Justiça o disposto no artigo 616.º, n.º 2, al. b) ex vi artigo 666.º ambos do CPC.
55.º - O Tribunal a quo também decidiu que: “Dir-se-á, finalmente, que não cabem no objeto desta ação algumas das questões levantadas pela recorrida e que se prendem com as necessidades do Réu no que toca ao seu pedido de horário flexível e com as circunstâncias e condições pessoais e familiares em que o mesmo foi formulado, dado tal problemática já se encontrar, nesta fase do litígio, definitivamente ultrapassada.”
56.º - Mas esquecesse o douto Tribunal que essas questões foram devidamente apreciadas em sede de recurso de Apelação, tendo o Tribunal da Relação de Guimarães se pronunciado sobre elas, em sentido favorável à Recorrente.
57.º - Ou seja, deveria o douto Tribunal a quo ter-se pronunciado sobre tal questão, uma vez que a mesma foi levantada pela Recorrida nas suas contra-alegações ao recurso de revista interposto pelo trabalhador.
58.º - Mais uma vez, ao decidir da forma como decidiu, violou o Tribunal a quo o disposto nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 616.º do CPC.
Nestes termos, e nos melhores de direito que V. Exa. doutamente suprirá, requer-se V. Ex.ª se digne admitir a presente Reclamação, com ida à Conferência, para apreciação das questões supra suscitadas e nos termos expostos, conforme o disposto nos artigos 615º, n.º 1, al. d), 616.º, n.º 2, alíneas a) e b) e artigo 666.º do Código de Processo Civil, ex vi artigo 685.º do mesmo diploma legal, só assim que alcançando a sã e costumada…JUSTIÇA!»
13. - Os Tribunais da 1.ª e da 2.ª Instância consideraram PROVADOS e NÃO PROVADOS os seguintes factos:
“Os factos que o Tribunal recorrido considerou provados são os seguintes:
1. Por carta registada enviada a 8 de Janeiro de 2021, a Autora remeteu à Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), cópia do pedido de autorização de trabalho em regime de horário flexível, apresentado pelo Réu, para efeitos da emissão de parecer.
2. Neste seguimento, a 05/02/2021, a Autora recebeu parecer desfavorável à intenção de recusa relativamente ao pedido de trabalho em regime de horário flexível apresentado pelo Réu.
3. Deste parecer a Autora interpôs Reclamação Graciosa, que decidiu mantê-lo integralmente.
4. O Réu mediante contrato individual de trabalho, obrigou-se a prestar, sob autoridade e direção da aqui Autora, tarefas e atividades na dependência da Gestão de Operação, correspondente à categoria profissional de Técnico Operativo A.
5. Enquanto Técnico Operativo de Exploração, à data do pedido referido em 1., o Réu exercia as suas funções de operador do Núcleo Operacional da ..., mais concretamente na ETA da ....
6. O referido contrato teve o seu início a 4 de Junho de 2010, tendo sido acordado entre o Réu e a Autora que para efeitos do cômputo de antiguidade (e período experimental, se aplicável) deverá ser considerada a data de 27 de Dezembro de 2007, data em que o Réu iniciou a sua atividade na A..., S.A., entretanto extinta por fusão – cfr. cláusula nona do contrato junto com a P.I., cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
7. Ficou ainda acordado que o trabalho seria prestado, de segunda a sexta-feira, num período normal de oito horas diárias e quarenta horas semanais, com uma hora para almoço, sendo que, foi dado conhecimento expresso ao Réu para qualquer alteração que viesse a ser necessária na organização do horário de trabalho, em virtude do funcionamento dos serviços da empresa – cfr. cláusula quinta do contrato de trabalho junto com a P.I..
8. Por comunicação eletrónica (email), datada de 11 de Dezembro de 2020, dirigida ao coordenador dos Recursos Humanos da Autora, o Réu solicitou que lhe seja atribuído um regime de horário flexível no seguintes termos: “Eu, AA, ... AA a exercer função de operador na ETA de ..., nos termos do disposto no art.ºs 56.º e 57.º do código do trabalho, e demais normas legais e regulamentares aplicáveis, venho por este meio solicitar que me seja atribuído um regime de horário flexível de segunda a sexta-feira para prestar assistência aos filhos menores de 12 anos, em vigor a partir do dia 12 de Janeiro de 2021 até a minha filha menor atingir 12 anos de idade.
Horário das 07:00 horas as 13:00 horas da parte da manhã, das 14:00 horas às 16:00 horas da parte da tarde, constituído por uma componente fixa de 4 horas (plataformas fixas) das 10:00 horas às 12:00 horas da manhã e das 14:00 as 16:00 da tarde, período de intervalo de descanso diário das 13:00 as 14:00 horas.(…)” – cfr. documento junto com a P.I., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
9. A 28 de Dezembro de 2020, a Autora, na pessoa do ... de Recursos Humanos – Processamento Salarial e Administrativo, via Email, comunicou ao Réu a decisão de recusa do pedido de autorização de trabalho em regime de horário flexível, nos termos que constam do documento junto com a P.I., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
10. Na mesma data, via Email, o Réu respondeu nos termos que constam do documento junto com a P.I. cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
11. Em Janeiro de 2021, a Autora procedeu à alteração de horários de trabalho, que seriam alargados para duas escalas, e parcialmente noturno, compreendido das 09:00 às 17:00 horas e das 14:00 às 22:00 horas.
12. O Núcleo Operacional da ..., que o Réu integrava à data do pedido supra referido em 1., labora em contínuo 7 dias por semana, 24 horas por dia.
13. Fazem parte deste Núcleo os seguintes colaboradores: o Réu, BB, CC, DD e EE.
14. Antes de o Réu ter requerido à Autora o horário flexível estavam a ser praticados, pelo próprio Réu e pelos colaboradores BB, DD e EE, o horário das 9:00 horas às 18:00 horas.
15. Depois de o Réu ter requerido o horário flexível, que apesar de lhe ter sido recusado pela Autora, uma vez que o parecer do CITE foi desfavorável ao sentido de recusa da Autora, a partir de 8 de Fevereiro de 2021, o Réu passou a horário flexível, compreendendo o seguinte horário, de segunda a sexta: das 7:00 horas às 13:00 horas e das 14:00 horas às 16:00 horas, constituído por uma componente fixa de quatro horas (plataformas fixas), correspondentes ao período das 10:00 horas às 12:00 horas e das 14:00 horas às 16:00 horas.
16. A partir de 15 de Fevereiro de 2021, os horários dos colaboradores da ETA da... passaram a ser os seguintes: das 9:00 horas às 17:00 horas e das 14:00 horas às 22:00 horas.
17. Com o horário referido em 15. e por existir na equipa outro colaborador, o Sr. BB, a quem foi concedido horário flexível, pelo prazo de um ano, com início em 1 de Dezembro de 2020 e termo em 30 de Novembro de 2021, por ter um filho menor com deficiência profunda que precisa do seu apoio, a equipa ficou apenas com três elementos a fazer trabalho em regime de turnos e a trabalhar aos fins de semana, sendo um dos períodos parcialmente noturno (até às 22:00).
18. Em 28/05/2021, com confirmação escrita, via Email a 09/06/2021, o Réu recebeu ordem de alteração do seu local de trabalho que passou a ser a ETAR de ... em ... – cfr. Doc. junto com a contestação, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.”
FACTOS NÃO PROVADOS
E considerou não provados os seguintes factos:
“a) A alteração de horário do Réu coloca em causa o normal funcionamento do subsistema a que está adstrito.
b) O alegado em 12., acontece também nos restantes Núcleos de Exploração.
[c) O horário referido em 14., era sem descanso semanal fixo.] (alterado pelo Tribunal da Relação de Guimarães para provado)
d) A situação referida em 16., ocorreu por causa do horário flexível do Réu.
e) A situação mencionada em 17., causa um enorme prejuízo e transtorno à Autora que não consegue dar resposta no cumprimento dos contratos de concessão no abastecimento de água e saneamento de águas residuais aos municípios, designadamente o de ....
f) Tendo a equipa cinco elementos, sendo esse o número de pessoas necessário à satisfação das necessidades da Autora para que esta consiga um cabal e normal funcionamento da ETA e para que seja possível o abastecimento de água à população, e não tendo a Autora dotação orçamental para contratar mais pessoas, incluindo para a substituição do réu, é impossível à Autora conseguir satisfazer os seus compromissos no âmbito dos contratos de concessão, com o horário que o Réu pretende fazer.
g) Essa impossibilidade traduz-se no enorme esforço que está a ser feito pelos restantes elementos da equipa (CC, DD e EE) que neste momento, de forma temporária, estão a assegurar o horário que anteriormente era feito pelo Réu, com prejuízo para o seu descanso, com prejuízo para as suas famílias, com prejuízo para a Autora que tem de lhes pagar horas de trabalho suplementar, com prejuízo para a Autora que devido aos cansaço destes colaboradores está mais exposta à ocorrência de erros e falhas nos procedimentos de trabalho, com o consequente prejuízo para os consumidores finais.
h) O horário solicitado pelo Réu é incompatível com os horários existentes na Autora e absolutamente necessários à sua laboração e resposta aos contratos de concessão que assumiu.
i) O Réu tem uma atividade profissional paralela com aquela que desempenha na Autora sendo esse o verdadeiro motivo para requerer o horário flexível.”»
III. - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
14. NULIDADE DO ACORDÃO [OMISSÃO DE PRONÚNCIA]
Tendo já transcrito as longas conclusões da reclamação da Autora quanto à arguição desta nulidade do Acórdão prolatado por este Supremo Tribunal de Justiça no dia 19 de junho de 2024 e que se acha prevista na alínea d) do número 1 do artigo 615.º, aplicável a este Aresto por força dos artigos 666.º e 685.º, todos do NCPC, importará, desde logo e em primeiro lugar, realçar que só para aqui releva a fundamentação de tal arguição de nulidade, na precisa medida da sua invocação e justificação, sendo irrelevantes todos os mais argumentos e questões suscitadas que extravasem essa finalidade, pois a Autora Requerente não apenas é Recorrida e não Recorrente, no quadro deste Recurso Ordinário de Revista, como já teve oportunidade para sustentar a sua posição e oposição à fundamentação jurídica apresentada pelo Réu, nas suas contra-alegações, que são o local próprio e exclusivo para expressar as mesmas.
Traduzindo-se a aludida nulidade de sentença por omissão de pronúncia, nos termos conjugados dos artigos 615.º, número 1, primeira parte da alínea d), 666.º, número 1 e 685.º do NCPC, num cenário adejetivo em que «O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar…», importará aqui averiguar se, de facto, este Supremo Tribunal de Justiça se absteve de apreciar e julgar questões suscitadas no recurso de revista em presença, quer ao nível das alegações, como das correspondente contra-alegações, que devesse ter analisado e decidido.
FERNANDO AMÂNCIO FERREIRA [1] afirma o seguinte, acerca desta irregularidade formal da sentença:
“À omissão de pronúncia alude a 1.ª parte da alínea d) do número 1 do artigo 668.º e traduz-se na circunstância de o juiz se não pronunciar sobre questões que devesse apreciar, ante o estatuído na 1.ª parte do número 2 do artigo 660.º.
Trata-se da nulidade mais invocada nos tribunais, originada na confusão que se estabelece com frequência entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos no decurso da demanda. (…)”
ABÍLIO NETO [2], por referência à posição sustentada pelo Prof. ALBERTO DOS REIS, em obra citada, páginas 93 e 453, sustenta que “Pelo que respeita ao direito, o juiz move-se livremente. (…) Pode ir buscar regras diferentes daquelas que as partes invocaram (indagação); pode atribuir às regras invocadas pelas partes sentido diferente do que estas lhe deram (interpretação); pode fazer derivar das regras de que as partes se serviram efeitos e consequências diversas das que estas tiraram (aplicação) (…)”, defendendo, por seu turno, JOÃO DE CASTRO MENDES [3] que «Estabelece-se que o Juiz não está sujeito à vontade das partes quanto às soluções de direito (art.º 664.º). Isto porque, em princípio, se pretende que a solução dada à hipótese presente ao Tribunal seja a realmente verdadeira (princípio da verdade material) e não apenas aquela que se justifica em face da maneira como decorreu o processo (princípio da verdade formal). Neste campo o Juiz só é limitado pela lei, não pela vontade das partes».
JOSÉ LEBRE DE FREITAS [4], , sustenta que deve o julgador “(…) conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e de todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer, …, não podendo o juiz conhecer de causas de pedir não invocadas, nem de exceções na exclusiva disponibilidade das partes…”, ao passo que o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11.01.2000, publicado no BMJ n.º 493.º, páginas 385 e seguintes afirma que “…Questões para este efeito são, desde logo, as que se prendem com o pedido e a causa de pedir. São, em primeiro lugar, todas as pretensões formuladas pelas partes, que requerem decisão do juiz, qualquer que seja a forma como são deduzidas (pedidos, exceções, reconvenção) …”. [5]
Interessará frisar nesta sede que a presente ação declarativa com processo comum laboral foi proposta pela empresa empregadora contra o seu trabalhador, ao abrigo do disposto na parte final do número 7, por referência ao estatuído no número 2 do artigo 57.º do Código de Trabalho de 2009, destinando-se esta ação a discutir apenas a efetiva verificação do concreto motivo justificativo suscitado pela Autora para recusar o pedido de horário flexível do Réu e que não foi aceite por este último e pela CITE, competindo à mesma o ónus de alegar e provar os factois respetivos. [6]
Esta ação, segundo o regime adjetivo constante do artigo 57.º do CT/2009, surge como último ato de um procedimento formal que aí se mostra descrito e regulado e que se inicia pelo pedido [escrito] de atribuição de um horário flexível por trabalhadores com responsabilidade parentais - como foi o caso do Réu -, correspondente resposta [escrita] de aceitação ou rejeição de tal pretensão por parte da empregadora, contraresposta [escrita] do requerente e obrigatoriedade por parte da entidade patronal de pedido [[escrito] de parecer [escrito] à CITE que se for desfavorável à posição da mesma [quer originalmente, quer após a decisão negativa da impugnação administrativa daquele], implica que esta se veja legalmente obrigada a instaurar uma ação judicial com vista a obter o reconhecimento pelo tribunal do trabalho de que o motivo justificativo para a negação do pedido de horário flexível é real, relevante e reconduzível a exigências imperiosas do funcionamento da empresa, ou na impossibilidade de substituir o trabalhador se este for indispensável.
Logo, o objeto legalmente previsto para esta ação não pode abranger todas e quaisquer questões que a empregadora entenda por suscitar – designadamente, quanto às condições familiares do requerente do horário flexível, natureza fixa deste último, falta de fundamentação do correspondente pedido, comunicação de alteração do horário de trabalho do Réu prévia a tal pedido [facto, aliás, não constante dos factos provados ou não provados] – mas apenas aquelas que têm a ver a existência das aludidas e impeditivas exigências imperiosas do funcionamento da empresa ou da impossibilidade de substituir o trabalhador se este for indispensável.
Afigura-se-nos ainda que, por força do cariz formal do referido procedimento, a pretensão da empregadora e a causa de pedir que lhe está subjacente se acha condicionada pelo teor da decisão que se mostra referida no número 3 do artigo 57.º do CT/2009 e que, no caso dos autos, foi a seguinte:
«…informamos que não vai ser possível atender o seu pedido uma vez que o AA trabalha no Núcleo Operacional da ... que labora em regime de turno para assegurar o normal abastecimento a que a Águas do Norte está obrigada derivado do contrato de concessão estabelecido com o Estado português…A alteração de horário coloca em causa o normal funcionamento do subsistema a que está adstrito onde tem necessidade de operar em contínuo 7 dias por semana.» [cf. Ponto 9 da Factualidade dada como Provada].
Ora, no quadro substantivo e adjetivo que deixámos exposto e olhando ainda para a fundamentação do Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 19/6/2024, apreciaram-se aí as questões que lhe eram consentidas julgar, por força de tal regime e dos limites materiais traçados pela justificação apresentada pela Autora no seu email de 28/12/2020, nada mais havendo a apreciar e a decidir por este STJ, por lhe estar vedado fazê-lo.
Assim se justifica o parágrafo que de tal argumentação consta e que parece rter indignado a recorrente: «Dir-se-á, finalmente, que não cabe[m] no objeto desta ação algumas das questões levantadas pela recorrida e que se prendem com as necessidades do Réu no que toca ao seu pedido de horário flexível e com as circunstâncias e condições pessoais e familiares em que o mesmo foi formulado.»
Os demais aspetos que são visados na presente Reclamação prendem-se com o julgamento de mérito e com a discordância por parte da Autora relativamente a algumas das afirmações que integram a argumentação jurídica aí desenvolvida e não com a invocada nulidade de sentença.
Não houve assim, por parte deste tribunal e no referido Aresto, a prática de uma qualquer omissão de pronúncia que tivesse originada a imputada nulidade de sentença arguida pela recorrida.
IV. - DECISÃO
Atento o exposto, acordam os Juízes que compõem a Secção Social em indeferir a arguição de nulidade de sentença por omissão de pronúncia invocada pela Recorrida e Reclamante ÁGUAS DO NORTE, S.A.
Custas a cargo da Ré, nos termos do número 1 do artigo 527.º do CPC/2013.
Notifique e registe.
Lisboa, 16 de outubro de 2024
José Eduardo Sapateiro (Juiz-Conselheiro relator)
Domingos José de Morais (Juiz-Conselheiro adjunto)
Mário Belo Morgado (Juiz-Conselheiro adjunto)
****************
SUMÁRIO
Descritores:
Nulidade de sentença
Omissão de pronúncia
Objeto da ação
Decisão da Autora
I - Vindo invocada pela Autora a nulidade do Acórdão prolatado por este Supremo Tribunal de Justiça no dia 19 de junho de 2024 e que se acha prevista na alínea d) do número 1 do artigo 615.º, aplicável a este Aresto por força dos artigos 666.º e 685.º, todos do NCPC, importa realçar que só para aqui importa a fundamentação de tal arguição de nulidade, na precisa medida da sua invocação e justificação, sendo irrelevantes todos os mais argumentos e questões suscitadas que extravasem essa finalidade.
II - A presente ação declarativa com processo comum laboral foi proposta pela empresa empregadora contra o seu trabalhador, ao abrigo do disposto na parte final do número 7, por referência ao estatuído no número 2 do artigo 57.º do Código de Trabalho de 2009, destinando-se a mesma a discutir apenas a efetiva verificação do concreto motivo justificativo suscitado pela Autora para recusar o pedido de horário flexível do Réu e que não foi aceite por este último e pela CITE, competindo à mesma o ónus de alegar e provar os factos respetivos.
III - Logo, o objeto legalmente previsto para esta ação não pode abranger todas e quaisquer questões que a empregadora entenda por suscitar mas apenas aquelas que têm a ver com a existência das aludidas e impeditivas exigências imperiosas do funcionamento da empresa ou da impossibilidade de substituir o trabalhador se este for indispensável.
IV - Por força do cariz formal do referido procedimento, a pretensão da empregadora e a causa de pedir que lhe está subjacente nesta ação acha-se ainda condicionada pelo teor da decisão que se mostra referida no número 3 do artigo 57.º do CT/2009.
V – Face ao quadro substantivo e adjetivo exposto e olhando ainda para a fundamentação do Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 19/6/2024, apreciaram-se aí as questões que lhe eram consentidas julgar, por força de tal regime e dos limites materiais traçados pela justificação apresentada pela Autora no seu email de 28/12/2020, nada mais havendo a apreciar e a decidir por este STJ, por lhe estar vedado fazê-lo.
VI - Não houve assim, por parte deste tribunal e no referido Aresto, a prática de uma qualquer omissão de pronúncia que tivesse originada a imputada nulidade de sentença arguida pela recorrida.
Lisboa, 16 de outubro de 2024
José Eduardo Sapateiro (Juiz-Conselheiro relator)
Domingos José de Morais
Mário Belo Morgado
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1. Em “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 9.ª Edição, Dezembro de 2009, Almedina, páginas 57 e 58.↩︎
2. Em «Código de Processo Civil Anotado», 19.ª Edição atualizada, Setembro de 2007, EDIFORUM, Lisboa, página 857, Nota 4 ao artigo 664.º do CPC/1961.↩︎
3. Em “Direito Processual Civil”, Volume I, Edição da AAFDL, 1980, págs. 218 e seguintes.↩︎
4. Em “Código de Processo Civil Anotado”, Volume 2.º, Coimbra Editora, pág. 670.↩︎
5. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23/1/2019, Processo n.º 4568/13.3TTLSB.L2.S1, relator: Júlio Gomes, publicado em www.dgsi.pt, com o seguinte Sumário parcial:
IV. Para determinar se existe omissão de pronúncia há que interpretar a sentença na sua totalidade, articulando fundamentação e decisão.↩︎
6. O pedido da Autora, no final da sua Petição Inicial, é o seguinte:
«Nestes termos, e nos melhores de direito que V. Edxa. Doutamente suprirá, deve ser julgada procedente, por provada, a presnete ação e, em consequência:
a) Ser declarada a existência de motivo justificativo para a recusa, pela Autora, do horário de trabalho em regime de horário flexível, requerido pelo Réu;
b) Ser o Réu condenado a reconhecer o pedido formulado em a);
c) Sero Réu condenado nas custas do processo».↩︎