CONTRATO DE TRABALHO
DIUTURNIDADES
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
TRABALHO IGUAL SALÁRIO IGUAL
INTERPRETAÇÃO
INTERPRETAÇÃO DA DECLARAÇÃO NEGOCIAL
INTERPRETAÇÃO DA VONTADE
Sumário


I - À data da sua integração na recorrente (01.07.2006), os Autores tinham direito à terceira diuturnidade, correspondente ao escalão da sua antiguidade (nesse momento), e não às diuturnidades anteriores, sendo que, na sequência de mudança de escalão de diuturnidade após 01.07.2006 (em função do correspondente acréscimo da antiguidade), as novas diuturnidades são calculadas sobre a remuneração base, então em vigor, acrescidas das diuturnidades antes reconhecidas até esse momento.
II - Na aplicação do regime de diuturnidades revela-se uma diferenciação arbitrária entre trabalhadores, traduzida no favorecimento de músicos mais modernos relativamente a outros, como os Autores, que são mais antigos, situação que, não assentando em qualquer justificação de ordem objetiva, infringe o princípio da igualdade salarial ou da equidade retributiva (a trabalho igual salário igual).
III - Em face das implicações no caso concreto deste princípio, impõe-se colocar os Autores em situação idêntica à do trabalhador mais moderno que em maior medida tenha sido beneficiado quanto a esta parcela da remuneração, valor a determinar em incidente de liquidação, nos termos do artigo 609.º, n.º 2, do CPC.

Texto Integral


Processo n.º 3769/21.5T8MTS.P1.S1

Recurso de revista

Acordam os Juízes na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça

I.Relatório

1. – AA, BB, CC, DD, EE, intentaram acção com processo comum contra

Fundação Casa da Música, pedindo a condenação da Ré:

1) a reconhecer que a retribuição mensal base e as diuturnidades dos 1.º e 5.º AA., a partir de 1/01/2021, correspondem, respectivamente, a € 2.840,30 e a € 329,82;

2) a reconhecer que a retribuição mensal base e as diuturnidades dos 2.º, 3.º e 4.ª AA., a partir de 1/01/2021, correspondem, respectivamente, a € 2.169,16 e a € 251,89;

3) a proceder anualmente à actualização da retribuição dos AA., em função da taxa de inflação, correspondente à taxa de variação do índice de preços do consumidor positiva apurada pelo INE, verificada no ano anterior, nos termos do art. 19.º do Regulamento Interno;

4) a pagar ao 1.º A. as quantias de € 40.710,96 e de € 16.473,00, respectivamente, a título de retribuição mensal base e diuturnidades, acrescidas das diferenças salariais vincendas, a partir de 1/08/2021, e dos juros, vencidos e vincendos, calculados sobre a data de vencimento de cada uma das referidas quantias, computando-se os vencidos, na presente data, 27/08/2021, em € 12.480,43;

5) a pagar ao 2.º A. as quantias de € 31.036,71 e de € 23.434,32, respectivamente, a título de retribuição mensal base e diuturnidades, acrescidas das diferenças salariais vincendas, a partir de 1/08/2021, e dos juros, vencidos e vincendos, calculados sobre a data de vencimento de cada uma das referidas quantias, computando-se os vencidos, na presente data, 27/08/2021, em € 12.736,22;

6) a pagar ao 3.º A. as quantias de € 31.137,77 e de € 23.444,60, respectivamente, a título de retribuição mensal base e diuturnidades, acrescidas das diferenças salariais vincendas a partir de 1/08/2021, e dos juros, vencidos e vincendos, calculados sobre a data de vencimento de cada uma das referidas quantias, computando-se os vencidos, na presente data, 27/08/2021, em € 12.731,00;

7) a pagar à 4.ª A. as quantias de € 30.681,96 e de € 12.652,03, respectivamente, a título de retribuição mensal base e diuturnidades, acrescidas das diferenças salariais vincendas a partir de 1/08/2021, e dos juros, vencidos e vincendos, calculados sobre a data de vencimento de cada uma das referidas quantias, computando-se os vencidos, na presente data, 27/08/2021, em € 9.536,29;

8) a pagar ao 5.º A. as quantias de € 40.385,70 e de € 16.887,40, respectivamente, a título de retribuição mensal base e diuturnidades, acrescidas das diferenças salariais vincendas a partir de 1/08/2021, e dos juros, vencidos e vincendos, calculados sobre a data de vencimento de cada uma das referidas quantias, computando-se os vencidos, na presente data, 27/08/2021, em € 12.686,19.

2. - A Ré contestou, concluindo pela total improcedência da acção e absolvição do pedido.

3. - Foi proferida sentença, decidindo:

“(J)ulgo parcialmente procedente o pedido formulado nos autos, pelo que condeno a ré:

a) a reconhecer que a diuturnidade mensal de cada um dos autores AA e EE ascende a €286,96 a partir de 1/1/2021;

b) a pagar a cada um dos autores AA e EE a quantia a liquidar posteriormente, relativa à diferença entre as quantias pagas a título de diuturnidades entre 1/6/2006 e 31/12/2021 e as que deveria ter pago (estas num total de €35.066,66), acrescida dos juros de mora à taxa de 4% desde a data em que a ré passou a pagar efetivamente menos do que o devido a título de diuturnidades, descontado do valor pago em excesso nos primeiros anos;

c) a reconhecer que a diuturnidade mensal de cada um dos autores BB, CC e DD ascende a €219,79 a partir de 1/1/2021;

d) a pagar a cada um dos autores BB, CC e DD a quantia a liquidar posteriormente, relativa à diferença entre as quantias pagas a título de diuturnidades entre 1/6/2006 e 31/12/2021 e as que deveria ter pago (estas num total de €26.685,30), acrescida dos juros de mora à taxa de 4% desde a data em que a ré passou a pagar efetivamente menos do que o devido a título de diuturnidades, descontado do valor pago em excesso nos primeiros anos.

e) absolvo a ré do demais peticionado.”.

4. - Por acórdão de 26.06.2023, o Tribunal da Relação do Porto decidiu:

A. Julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelos AA. e, em consequência, revoga-se o decidido nas als. a), b), c), d) do seu ponto IV da sentença recorrida, que é substituída pelo presente acórdão, em que se decide condenar a Ré, Fundação Casa da Música a:

A.1. Reconhecer que a diuturnidade mensal do 1º A., AA é de €285,68 a partir de 01.01.2021;

A.2. A pagar ao 1º A. AA, a quantia global de €11.087,82 a título de diferenças de diuturnidades em dívida no período de 01.07.2006 a 31.07.2021, bem como as vencidas e vincendas desde 01.08.2021, tudo acrescido de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, calculados sobre a data em que cada uma das prestações em dívida deveriam ter sido pagas, até integral e efetivo pagamento;

A.3. Reconhecer que a diuturnidade mensal do 2º A., BB, é de €214,17 a partir de 01.01.2021;

A.4. A pagar ao 2º A. BB, a quantia global de €17.995,82 a título de diferenças de diuturnidades em dívida no período de 01.07.2006 a 31.07.2021, bem como as vencidas e vincendas desde 01.08.2021, tudo acrescido de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, calculados sobre a data em que cada uma das prestações em dívida deveriam ter sido pagas, até integral e efetivo pagamento;

A.5. Reconhecer que a diuturnidade mensal do 3º A., CC, é de €214,17 a partir de 01.01.2021;

A.6. A pagar ao 3º A. CC, a quantia global de €17.296,64 a título de diferenças de diuturnidades em dívida no período de 01.07.2006 a 31.07.2021, bem como as vencidas e vincendas desde 01.08.2021, tudo acrescido de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, calculados sobre a data em que, cada uma das prestações em dívida deveriam ter sido pagas, até integral e efetivo pagamento;

A.7. Reconhecer que a diuturnidade mensal da 4ª A., DD, é de €215,40 a partir de 01.01.2021;

A.8. A pagar à 4ª A. DD, a quantia global de €7.732,71 a título de diferenças de diuturnidades em dívida no período de 01.07.2006 a 31.07.2021, bem como as vencidas e vincendas desde 01.08.2021, tudo acrescido de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, calculados sobre a data em que cada uma das prestações em dívida deveriam ter sido pagas, até integral e efetivo pagamento;

A.9. Reconhecer que a diuturnidade mensal do 5º A., EE, é de €281,20 a partir de 01.01.2021;

A.10. A pagar ao 4º A., EE, a quantia global de €10.527,68 a título de diferenças de diuturnidades em dívida no período de 01.07.2006 a 31.07.2021, bem como as vencidas e vincendas desde 01.08.2021, tudo acrescido de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, calculados sobre a data em que cada uma das prestações em dívida deveriam ter sido pagas, até integral e efetivo pagamento.

B. No mais impugnado no recurso interposto pelos AA., julgá-lo improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.

C. Julgar improcedente o recurso interposto pela Ré, Fundação Casa da Música, sendo a sentença recorrida revogada nos termos do decidido quanto ao recurso dos AA.”.

5. - A Ré interpôs recurso de revista, concluindo, em síntese:

I - Aquando da integração dos Músicos da Orquestra ... na Recorrente, ficou definido nos respetivos contratos de trabalho que, não obstante a data de assinatura dos contratos de trabalho (01/07/2006), para efeitos de antiguidade, seria considerado que os mesmos se iniciaram à data do início da relação laboral dos trabalhadores com a Orquestra ... não havendo, assim, lugar à renúncia da antiguidade destes trabalhadores/músicos.

II - Antes da celebração dos contratos de trabalho com a Fundação Casa da Música, os músicos/trabalhadores da Orquestra ... nunca beneficiaram de qualquer regime de diuturnidades.

IV - O artigo 22.º do Regulamento Interno, reconhecendo embora a antiguidade dos trabalhadores/músicos, reportada à data da admissão dos mesmos na Orquestra ..., ressalvou que tal não produziria qualquer efeito retroativo, com isso pretendendo e tendo sido aceite pelas partes que, aquando da integração dos músicos na Fundação Casa da Música, se iniciar o cálculo da diuturnidade correspondente, sendo atribuída a antiguidade que foi a cada um deles reconhecida, mas excluindo outras eventuais diuturnidades vencidas anteriormente por força dessa antiguidade.

V. Atento as especificidades do teor deste artigo, não poderá ser outro o entendimento, quando as partes estabelecem no referido Regulamento interno que o pagamento de diuturnidades irá ser realizado «sem qualquer retroatividade», que se quis afastar toda e qualquer retroatividade relativa às diuturnidades, quer a relativa a pagamentos, quer a referente ao vencimento das mesmas.

VI. Por outro lado, a cláusula 6.1, alínea c) dos contratos de trabalho de todos os músicos refere que à retribuição base mensal de cada um destes «acrescerá os montantes a seguir descritos (…) c) diuturnidades, de acordo com o regulamento interno, a calcular da forma seguinte: i) multiplica-se a percentagem correspondente à diuturnidade aplicável pela remuneração base mensal (…).»

VII. Assim, para além de a cláusula ora transcrita remeter para o que estipula em termos de diuturnidades o já referenciado Regulamento Interno da Fundação Casa da Música, determinou-se fixar na sua redação a alusão a um critério de singularidade: «(…) percentagem correspondente à diuturnidade aplicável pela remuneração base mensal (…)» e não no plural a “diuturnidades aplicáveis”.

VIII. A interpretação do conteúdo do Regulamento deve obedecer, necessariamente, aos princípios interpretativos previstos no artigo 236.º do Código Civil, designadamente, resultante das negociações e que os músicos/trabalhadores conhecem ou deveriam conhecer, é a de que tinham direito à diuturnidade correspondente à sua antiguidade e, bem assim, às subsequentes, correspondentes aos anos de antiguidade ao serviço da Recorrente, pois não poderia um declaratário normal, sagaz e diligente considerar que à Recorrente caberia o pagamento de diuturnidades anteriores à integração dos músicos/trabalhadores na mesma, diuturnidades essas que, em rigor, nunca se venceram, porque não existiam.

IX. É legalmente admissível afirmar que, nos termos do n.º 1 do artigo 236.º do Código Civil, não importa apenas a perceção de um qualquer normal declaratário, mas sim a perceção deste colocado na posição do real declaratário, isto é, tomando em conta as condições concretas em que se encontra e os elementos que conheceu efetivamente.

X. A não retroatividade da antiguidade prevista no artigo 22.º do referido Regulamento Interno pretendeu abranger não apenas o pagamento das diuturnidades vencidas até 01/07/2006, como também, após essa data, o pagamento das já anteriormente vencidas que antecedem a do escalão em que cada um dos trabalhadores/músicos, em 01/07/2006, foram integrados, correspondendo ao que foi a vontade real das partes.

XI. O artigo 22.º do Regulamento Interno, reconhecendo embora a antiguidade dos trabalhadores/músicos, reportada à data da admissão dos mesmos na Orquestra ..., ressalvou que tal não produziria qualquer efeito retroativo, com isso pretendendo e tendo sido aceite pelas partes que, aquando da integração dos músicos na Fundação Casa da Música, se iniciar o cálculo da diuturnidade correspondente, sendo atribuída a antiguidade que foi a cada um deles reconhecida, mas excluindo outras eventuais diuturnidades vencidas anteriormente por força dessa antiguidade.

XII. Considerando, (i) o contexto de negociação em que o Regulamento Interno da Fundação Casa da Música foi elaborado (elemento histórico), (ii) as práticas adotadas até agora pela Fundação Casa da Música no que concerne ao vencimento e pagamento de diuturnidades e à revisão anual da retribuição mensal dos trabalhadores (elemento teleológico) e (iii) o resultado da interpretação conjunta das cláusulas do Regulamento Interno da Fundação Casa da Música com os contratos de trabalho celebrados pelos trabalhadores/músicos (argumento sistemático), o acórdão recorrido deveria ter concluído pela forma de cálculo aplicada pela Recorrente, não sendo esta devedora de quaisquer valores, a título de diuturnidades, aos trabalhadores/músicos.

XIII. - O acórdão recorrido coloca em crise a violação do princípio da igualdade, contudo, não se verifica qualquer situação de desigualdade ou discriminação, já que os trabalhadores/músicos da Fundação Casa da Música não se encontram em igualdade de circunstâncias, existindo um critério objetivo que fundamenta a diferenciação na aplicação do regime de diuturnidades vigente na Fundação Casa da Música, não sendo, assim, essa diferença abusiva, arbitrária ou discriminatória.

XXX - A haver violação do princípio da igualdade, a mesma só ocorre no momento em que o primeiro músico com menor antiguidade passa a receber um valor superior, a título de diuturnidades, em relação ao trabalhador com maior antiguidade, pois até esse momento não há qualquer desigualdade.

XXXII. Ainda que a Recorrente mantenha a tese que tem vindo a defender desde o início, não pode deixar de manifestar que, a ter de se corrigir o cálculo das diuturnidades, o mesmo não deverá ser feito da forma decidida pelo acórdão do Tribunal a quo, por ser demasiado penalizador e não ter acolhimento na lei, pois que a alegada violação do princípio da igualdade não existe no momento da integração.

XXXV - A decisão é, assim, injusta, desproporcionada e violadora ela própria de princípios fundamentais, tais como princípio da boa-fé negocial e da liberdade contratual das partes.

XXXVI. - O Tribunal a quo valorizou o princípio da igualdade em detrimento destes dois princípios, concluindo por uma correção que é contraditória à própria fundamentação do acórdão, já que está a ordenar uma correção reportada a um momento em que não há violação do princípio da igualdade,

XXXVII. - pelo que deve o presente recurso proceder e o acórdão ser substituído por uma decisão que julgue improcedente o pedido dos Recorridos.

6. - Por despacho do Relator, confirmado pelo Acórdão Conferência de 08.05.2024, o recurso de revista interposto pela Ré apenas foi admitido em relação aos 2.º e 3.º Autores, BB e CC, respectivamente.

7. - O Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso de revista.

8. - Cumprido o disposto no artigo 657.º, n.º 2, ex vi do artigo 679.º, ambos do Código de Processo Civil (CPC), cumpre apreciar e decidir.

II. - Fundamentação de facto.

1. - O Tribunal da Relação proferiu a seguinte decisão sobre a matéria de facto, aqui reportada apenas aos 2.º e 3.º Autores, BB e CC:

“Estão provados os seguintes factos:

1. A Ré foi instituída pelo Estado Português e pelo município do ... após a conclusão do projeto da construção da Casa da Música, decidida em 1998 com a candidatura do ... a Capital Europeia da Cultura 2001.

2. Para integração da Orquestra ... na Fundação, o Estado assegurou transitoriamente uma contribuição financeira específica destinada à integração da Orquestra ..., em moldes a estabelecer em contrato-programa a celebrar entre o Ministério da Cultura e a Fundação Casa da Música.

3. O contrato programa estabelece, na cláusula 3.ª, sob a epigrafe, Disponibilização da comparticipação financeira, que:

1. A comparticipação financeira do Ministério da Cultura pelos encargos inerentes à integração prevista na clausula 1 será disponibilizada do seguinte modo:

a. € 2 500 000 em 2006;

b. € 2 000 000 em 2007;

c. € 1 500 000 em 2008;

d. € 1000 000 em 2009;

e. € 500 000 em 2010.

2. A comparticipação financeira prevista em cada uma das alíneas do número anterior será entregue anualmente em quatro parcelas trimestrais, sendo cada uma delas paga no final de cada trimestre.

3. Do montante indicado na alínea a) do número 1 da presente cláusula serão deduzidos os duodécimos correspondentes aos meses decorridos até à conclusão das contratações referidas no número 2 da cláusula 2.ª.” como resulta dos documentos que ora se juntam sob o n.º 1, aqui tidos por integrados no seu teor.

4. a 7. - O 1.º autor - Conforme resulta do ponto 2.1. do aludido contrato de trabalho, “Não obstante o presente contrato ser assinado nesta data, para efeitos de antiguidade será considerado que o mesmo se iniciou em 1 de Maio de 1996”, porquanto o mesmo era músico, desde essa data, da Orquestra ..., posteriormente designada por Orquestra ....

8. O 2.º autor (BB) foi admitido ao serviço da Ré mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado, celebrado em 01/07/2006, no âmbito da integração da Orquestra ....

9. Conforme resulta do ponto 2.1. do aludido contrato de trabalho, “Não obstante o presente contrato ser assinado nesta data, para efeitos de antiguidade será considerado que o mesmo se iniciou em 1 de abril de 1994”, porquanto o mesmo era músico, desde essa data, da Orquestra ..., posteriormente designada por Orquestra ....

10. O 2.º Autor. foi admitido ao serviço da Ré para “exercer as funções inerentes à categoria de “Tutti”, no naipe de 1ºs violinos, da sua Orquestra, ficando no desempenho destas tarefas sob autoridade e direcção da FUNDAÇÃO, nomeadamente do Maestro Titular da Orquestra e do Director Artístico e de Educação da FUNDAÇÃO”, incluindo-se nestas funções, “a prestação de trabalho em 6 causa em ensaios, espetáculos e gravações promovidos e organizados pela FUNDAÇÃO, designadamente concertos, óperas e bailados, nomeadamente em agrupamentos, incluindo bandas de palco, com um número igual ou superior a treze instrumentistas, no âmbito do quadro da Orquestra e se inseridos nos programas orquestrais.” (cláusulas 1.1 e 1.2 do contrato de trabalho)

11. O 2.º Autor passou a auferir a retribuição mensal de “€ 1.771,45, 14 vezes por ano, à qual acrescerá os montantes a seguir descritos:

d) Subsídio de transmissão - € 95,52, por mês, pago 12 vezes por ano;

e) Subsídio de traje - € 76,55, por mês, pago 12 vezes por ano; e

c) Diuturnidades, de acordo com o regulamento interno, a calcular da forma seguinte:

i) multiplica-se a percentagem correspondente à diuturnidade aplicável pela remuneração base mensal;

ii) o valor daí resultante é multiplicado por 12 e dividido por 14;

iii) esse valor é pago 14 vezes, juntamente com a remuneração base mensal;

iv) havendo mudança de escalão a nova diuturnidade será calculada sobre a remuneração base então em vigor, acrescida da(s) diuturnidade(s) anterior(es).” (cláusula 6.1 do contrato de trabalho)

12. O 3.º Autor (CC) foi admitido ao serviço da Ré mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado, celebrado em 01/07/2006, no âmbito da integração da Orquestra ....

13. Conforme resulta do ponto 2.1. do aludido contrato de trabalho, “Não obstante o presente contrato ser assinado nesta data, para efeitos de antiguidade será considerado que o mesmo se iniciou em 1 de Março de 1993”, porquanto o mesmo era músico, desde essa data, da Orquestra ..., posteriormente designada por Orquestra ....

14. O 3.º Autor foi admitido ao serviço da Ré para “exercer as funções inerentes à categoria de “Tutti”, no naipe de 2ºs violinos, da sua Orquestra, ficando no desempenho destas tarefas sob autoridade e direcção da FUNDAÇÃO, nomeadamente do Maestro Titular da Orquestra e do Director Artístico e de Educação da FUNDAÇÃO”, incluindo-se nestas funções, “a prestação de trabalho em causa em ensaios, espetáculos e gravações promovidos e organizados pela FUNDAÇÃO, designadamente concertos, óperas e bailados, nomeadamente em agrupamentos, incluindo bandas de palco, com um número igual ou superior a treze instrumentistas, no âmbito do quadro da Orquestra e se inseridos nos programas orquestrais.” (cláusulas 1.1 e 1.2 do contrato de trabalho).

15. O 3.º Autor passou a auferir a retribuição mensal de “€ 1.771,45, 14 vezes por ano, à qual acrescerá os montantes a seguir descritos:

d) Subsídio de transmissão - € 95,52, por mês, pago 12 vezes por ano;

e) Subsídio de traje - € 76,55, por mês, pago 12 vezes por ano; e

c) Diuturnidades, de acordo com o regulamento interno, a calcular da forma seguinte:

i) multiplica-se a percentagem correspondente à diuturnidade aplicável pela remuneração base mensal;

ii) o valor daí resultante é multiplicado por 12 e dividido por 14;

iii) esse valor é pago 14 vezes, juntamente com a remuneração base mensal;

iv) havendo mudança de escalão a nova diuturnidade será calculada sobre a remuneração base então em vigor, acrescida da(s) diuturnidade(s) anterior(es).” (cláusula 6.1 do contrato de trabalho).

16. a 19. - A 4.ª Autora - Conforme resulta do ponto 2.1. do aludido contrato de trabalho, “Não obstante o presente contrato ser assinado nesta data, para efeitos de antiguidade será considerado que o mesmo se iniciou em 1 de Abril de 1995”, porquanto a mesma era música, desde essa data, da Orquestra ..., posteriormente, designada por Orquestra ....

20. a 23. - O 5.º Autor - Conforme resulta do ponto 2.1. do aludido contrato de trabalho, “Não obstante o presente contrato ser assinado nesta data, para efeitos de antiguidade será considerado que o mesmo se iniciou em 1 de Abril de 1995”, porquanto o mesmo era músico, desde essa data, da Orquestra ..., posteriormente designada por Orquestra ....

24. Aquando da admissão dos Autores ao serviço da Ré, os mesmos aderiram ao Regulamento Interno da mesma, nos termos da cláusula 1.3. dos respetivos contratos de trabalho.

25. O art. 18.º do aludido Regulamento Interno, sob a epígrafe “Níveis retributivos”, quer na versão junta com os documentos docs. n.ºs 2, 3, 5 e 6, quer na versão mais recente junta sob o n.º 7, determina que:

1. Os músicos são distribuídos pelos seguintes níveis de retribuição:

Nível I – 1.º Concertino (concertino principal)

Nível II – 2.º Concertino

Nível III – Assistente de Concertino e Chefes de Naipe

Nível IV – Solistas A

Nível V – Solistas B

Nível VI – Tutti 13

2. Em cada nível de retribuição poderão existir salários diferentes, nomeadamente por força da aplicação do disposto no art.º 22.º.”

26. O artigo 19.º do aludido Regulamento Interno estabelece que “A Fundação, aquando da revisão salarial anual, terá em conta a inflação verificada no ano anterior”.

27. O artigo 22.º do aludido Regulamento, sob a epígrafe “Diuturnidades”, determina o seguinte:

1 Os músicos terão direito, pela antiguidade que lhes for reconhecida no contrato de trabalho, sem qualquer retroactividade, às seguintes diuturnidades, calculadas sobre a remuneração base actual, de acordo com os seguintes escalões:

a) 4 anos de antiguidade – primeira diuturnidade correspondente a 2,5 %;

b) 8 anos de antiguidade – segunda diuturnidade correspondente a 3 %;

c) 12 anos de antiguidade – terceira diuturnidade correspondente a 3,5 %;

d) 16 anos de antiguidade – quarta diuturnidade correspondente a 4 %.

2. Havendo mudança de escalão a nova diuturnidade será calculada sobre a remuneração base então em vigor, acrescida da diuturnidade anterior”.

28. A evolução da retribuição e das diuturnidades auferidas pelo 1.º Autor (…).

29. Por sua vez, a evolução da retribuição e das diuturnidades auferidas pelo 2.º Autor ao serviço da Ré, 14 meses por ano, até à presente data, foi a seguinte:

- De 01/07/2006 até 31/12/2006 - € 1.771,45 + € 53,14 (3.ª diuturnidade) (€1.771,45 x 3,5% x 12 : 14 = € 53,14)

- De 01/01/2007 (pagos em março, mas com retroativos de janeiro e fevereiro) até 31/12/2007 - € 1.815,74 + € 54,47 (€ 1.815,74 x 3,5% x 12 : 14 = € 54,47)

- De 01/01/2008 (pagos a partir de abril, mas com retroativos de janeiro, fevereiro e março) até 31/12/2008 - € 1.853,87 + € 54,47 18

- De 01/01/2009 até 31/01/2009 (pagos em maio, retroativamente) - € 1.881,67 + € 54,47

- De 01/02/2009 (pagos em Maio, retroativamente) até 31/03/2010 - € 1.881,67 + € 56,45 (€ 1.881,67 x 3,5% x 12 : 14 = € 56,45)

- De 01/04/2010 até 31/12/2018 - € 1.881,67 + € 123,22 (4.ª diuturnidade)

- De 01/01/2019 até 31/07/2021 - € 1.919,31 + € 125,68

30. A evolução da retribuição e das diuturnidades auferidas pelo 3.º Autor ao serviço da Ré, 14 meses por ano, foi a seguinte:

- De 01/07/2006 até 31/12/2006 - € 1.771,45 + € 53,14 (3.ª diuturnidade) (€ 1.771,45 x 3,5% x 12 : 14 = € 53,14)

- De 01/01/2007 (pagos em março, mas com retroativos de janeiro e fevereiro) até 31/12/2007 - € 1.815,74 + € 54,47 (€ 1.815,74 x 3,5% x 12 : 14 = € 54,47)

- De 01/01/2008 (pagos a partir de abril, mas com retroativos de janeiro, fevereiro e março) até 31/12/2008 - € 1.853,87 + € 54,47

- De 01/01/2009 até 31/01/2009 (pagos em maio, retroativamente) - € 1.881,67 + € 54,47

- De 01/02/2009 até 28/02/2009 (pagos em Maio, retroativamente) - €1.881,67 + € 56,45 (€ 1.881,67 x 3,5% x 12 : 14 = € 56,45)

- De 01/03/2009 (pagos a partir de maio, mas com retroativos de fevereiro, março e abril) até 31/12/2018 - € 1.881,67 + € 123,22 (4.ª diuturnidade)

- De 01/01/2019 até 31/07/2021 - € 1.919,31 + € 125,68 20

31. A evolução da retribuição e das diuturnidades auferidas pela 4.ª autora (…).

32. A evolução da retribuição e das diuturnidades auferidas pelo 5.º autor (…).

33. A Ré apenas procedeu à atualização da retribuição base dos Autores, à razão de:

- 2,5% em 2007

- 2,1% em 2008

- 1,5% em 2009, e

- 2,00% em 2019.

34. O músico FF foi admitido ao serviço da Ré em 01/07/2006, com antiguidade reportada a .../09/2002 (…).

35. O músico GG foi admitido ao serviço da Ré em 01/07/2006, com antiguidade reportada a .../02/2001, (…).

36. A música HH foi admitida ao serviço da Ré em 01/07/2006, com antiguidade reportada a .../09/2000, (…).

37. O músico II foi admitido ao serviço da Ré em 01/07/2006, com antiguidade reportada a .../09/2002, (…).

38. O músico JJ foi admitido ao serviço da Ré em 01/07/2006, com antiguidade reportada a .../09/2000, (…).

39. O músico KK foi admitido ao serviço da Ré em 01/07/2006, com antiguidade reportada a .../09/2000, (…).

40. O músico LL foi admitido ao serviço da Ré em 01/07/2006, com antiguidade reportada a .../09/2002, (…).

41. Quer os autores, quer os acima identificados músicos, se encontram subordinados à Ré, sujeitos às mesmas ordens e instruções, ao regulamento interno, que faz parte integrante do contrato de trabalho de todos os músicos da orquestra, à orientação do “... da Orquestra e do ... da FUNDAÇÃO”, estando todos obrigados a prestar o trabalho em causa em ensaios, espetáculos e gravações promovidos e organizados pela FUNDAÇÃO, designadamente concertos, óperas e bailados, nomeadamente em agrupamentos, incluindo bandas de palco, com um número igual ou superior a treze instrumentistas, no âmbito do quadro da Orquestra e se inseridos nos programas orquestrais.

42. Os autores e os acima identificados músicos desenvolvem o respetivo trabalho nas mesmas condições, ensaiando da mesma forma e atuando nos mesmos concertos, desempenhando as mesmas funções inerentes às respetivas categorias recebendo o mesmo apoio para manutenção dos instrumentos, previsto no art. 23.º, n.º 2 do Regulamento Interno, sendo certo que, o mesmo pode variar de acordo com o instrumento que tocam.

43. Os autores participam, como os restantes membros da orquestra, na votação do Maestro Titular, recebendo, igualmente, os boletins informativos, através dos quais recebem informações relativas à atividade da Orquestra, bem como indicações sobre a prestação de trabalho, nomeadamente na utilização da plataforma informática "maestrina" e procedimentos a observar na distribuição de serviço, bem como sobre outras matérias.

44. Os autores integram, tal como os outros músicos da Orquestra, os júris de concurso para seleção de novos instrumentistas para a orquestra, sendo ainda responsáveis pela seleção da lista de obras impostas a concurso para a admissão de novos instrumentistas dos respetivos naipes, bem como pela organização da pré-seleção dos candidatos.

45. a 47. - O 1.º Autor (…).

48. - O 1.º e 5.º Autores (…).

49. - O 1.º Autor (…).

50. - (…), o 2.º Autor é detentor do grau de ... obtido na E..., (…).

51. No dia 17 de novembro de 2020 em reunião ocorrida na sede da ré e com a participação de MM, na qualidade de ... da ré, NN, na qualidade de ... da ré, OO, na qualidade de ... da Orquestra Sinfónica ..., e PP, QQ, RR e SS, estes na qualidade de membros do Comité de Orquestra, foi por aquele Diretor Geral da ré referido “que, em maio de 2018, depois de ter sido detetado, pelo coordenador da orquestra que haveria colegas da mesma categoria com menos antiguidade a auferir um maior valor salarial, o próprio tinha apresentado a toda a orquestra sinfónica, na sala ..., uma proposta de alteração do regime de diuturnidades aplicável. A proposta seria atualizar o valor das diuturnidades, de acordo com o mapa que então apresentou, respeitando a antiguidade de cada um e a sua categoria profissional, e calculando o referido valor de forma a existir uniformidade e equidade. Mais propôs, à data de maio de 2018, que a atualização do valor das diuturnidades fosse paga a partir de setembro de 2018. Contudo, a atualização e pagamento imediato do valor das diuturnidades apenas seria efetuado com na condição dos músicos da orquestra aprovarem uma alteração ao texto do artigo 22º do regulamento interno referente às diuturnidades, conforme documento que então entregou ao Comité de Orquestra. Referiu ainda que a mesma viria a ser recusada pelo então Comité de Orquestra.

52. - O 5.º Autor (…).

53. - A 4.ª Autora (…).

54. O Regulamento Interno da Ré resultou de um processo de negociação no qual os músicos foram representados por uma Comissão, designada pelo coletivo dos músicos, a qual foi assessorada por um Advogado.

55. Antes da celebração dos contratos de trabalho com a ré, os autores, enquanto trabalhadores da Orquestra ..., nunca beneficiaram de qualquer regime de diuturnidades.

56. Em virtude de pressões governamentais no sentido de serem criadas diuturnidades, aliadas à vontade de os músicos passarem a integrar a Ré e o interesse desta em os receber, as partes as partes acordaram que, aquando da integração dos músicos na Ré, se iniciar o cálculo da diuturnidade correspondente, nessa altura, à antiguidade a cada um deles reconhecida, excluindo quaisquer outras eventuais diuturnidades vencidas anteriormente por força dessa antiguidade.

57. Durante a execução do contrato os Autores estiveram ausentes os seguintes períodos:

[2.º autor: de 02.09.2010 a 21.01.2018, baixas médicas e faltas justificadas, um total de 25 dias].

[3.º autor: de 01.09.2006 a 19.12.2016, baixas médicas e faltas justificadas, um total de 150 dias].

58. Quando a Ré se comprometeu, no momento da celebração do contrato-programa, a integrar os músicos da Orquestra, o valor da comparticipação estabelecido pelo Estado apenas tinha em conta o valor das remunerações auferidas à data pelos músicos, sem diuturnidades.

59. O regulamento a que os autores aderiram aquando da celebração dos contratos de trabalho, deu origem, mais tarde, a dois regulamentos:

- regulamento de procedimento de contratação de músicos para o quadro de efetivos da Orquestra ..., que define as regras dos concursos/recrutamento, seleção e contratação;

- regulamento funcional da Orquestra ... para as restantes regras.

60. Uma das versões iniciais (em abril de 2006) do regulamento interno que estava a ser negociado entre a ré e os representantes dos músicos da Orquestra ..., a cláusula correspondente à atualização correspondia à 24ª e tinha o seguinte texto: “A Fundação obriga-se a proceder anualmente, em Janeiro, à actualização da retribuição dos músicos, que não deverá ser inferior à inflação verificada no ano anterior”.


*


Não há factos não provados.”.

III. - Fundamentação de direito.

1. - O objecto do recurso de revista:

- Cálculo das diuturnidades: vontade das partes e interpretação das cláusulas contratuais - Cláusula 6.ª.1, iv) dos contratos de trabalho - e disposições do Regulamento Interno - artigo 22.º, n.º 1.

- Implicações do princípio da igualdade salarial no caso sub judice.

2. - O Tribunal da 1.ª Instância considerou que aos 2.º (BB) e 3.º (CC) Autores deveria ter sido paga a 1ª diuturnidade em 1/06/2006, a 2ª em 1/06/2010, a 3ª em 1/06/2014 e a 4ª em 1/06/2018.

3. - O Tribunal da Relação entendeu que “sendo a antiguidade do 2.º Autor reportada a 01.04.1994, tem direito aos seguintes escalões de diuturnidades: 3ª D, em 01.07.2006; 4ª D, em 01.04.2010.”.

E “sendo a antiguidade do 3.º Autor reportada a 01.03.1993, tem direito aos seguintes escalões de diuturnidades: 3ª D, em 01.07.2006; 4ª D, em 01.03.2013.”.

“(…).

No que toca à interpretação da vontade negocial, afigura-se-nos, salvo melhor opinião, que com a não retroatividade da antiguidade prevista do art. 22º do Contrato Programa se,pretendeu abranger não apenas o pagamento das diuturnidades vencidas até 01.07.2006, como também, após esta data, o pagamento das já anteriormente vencidas que antecedem a do escalão em que cada um dos AA., em 01.07.2006, foram integrados (assim, em relação: (…) ao 2º A., as 1ª e 2ª diuturnidades; ao 3 ºA., as 1ª e 2ª diuturnidades; (…), correspondendo ao que foi a vontade real das partes, sendo que a interpretação, nos termos do art. 236º, nº1, do Cód. Civil, de acordo com a teoria da impressão do destinatário, apenas valerá quando essa vontade real não seja apurada.

(…).

O art. 22º do Regulamento Interno, reconhecendo embora a antiguidade dos AA. reportada à data da admissão dos mesmos na anterior O..., ressalvou que tal não produziria qualquer efeito retroativo, com isso pretendendo e tendo sido aceite pelas partes que, aquando da integração dos músicos na Ré, se iniciar o cálculo da diuturnidade correspondente, sendo atribuída a antiguidade que foi a cada um deles reconhecida, mas excluindo outras eventuais diuturnidades vencidas anteriormente por força dessa antiguidade (nº 56), ou seja, (…), quanto aos 2º e 3º AA, a 1ª diuturnidade, sendo que esta se venceu em data anterior a 01.07.2006.

Mas, ainda que assim se não entendesse, afigura-se-nos, salvo melhor opinião, que essa seria a interpretação ao abrigo do disposto no art. 236º, nº 1. Tal é o que resulta da clª 22ª, que não se limita a dizer que o reconhecimento da antiguidade não produz efeitos retroativos, mas sim que não produz “qualquer” efeito retroativo, sendo que o pagamento, ainda que após 01.07.2006, das diuturnidades que se teriam vencido em data anterior a essa consubstancia um efeito retroativo do reconhecimento dessa antiguidade. Por outro lado, a clª 6ª, nº 1, al. c), i), do contrato de trabalho ao reportar-se “à diuturnidade” (no singular) e não já no plural, aponta nesse sentido.

(…).

Acresce, mas sem prejuízo do que mais adiante se dirá, que a mencionada interpretação está em consonância com a função da diuturnidade, que é premiar o tempo de serviço no empregador (e/ou em categorias sem progressão), sendo que o pagamento de diuturnidades vencidas anteriormente a 01.07.2006 reportam-se a período de trabalho que foi totalmente prestado ao serviço de outrem que não a Ré.

Importa salientar que os AA. não auferiam, ao serviço da O..., diuturnidades, pelo que não se pode falar de “transmissão” do direito às mesmas, que não existiam, nem, à data em que o acordo foi celebrado, de diminuição de retribuição tendo o acordo no seu pagamento, mesmo nos termos em que foi celebrado (“sem qualquer retroatividade”), representado um acréscimo remuneratório.

E, aquando dessa celebração e durante algum tempo, esse acordo e sua execução, não determinaram, na sua execução prática, violação do princípio da igualdade por discriminação salarial negativa dos trabalhadores com maior antiguidade, em relação aos mais novos.

(…).

A questão coloca-se, sim, porque, por virtude do acordado, os trabalhadores mais novos podiam progredir pelos 4 escalões das diuturnidades (assim vendo refletido no valor da diuturnidade, quando atingissem o 4º escalão, as 1ª, 2ª, 3ª e 4ª diuturnidades), enquanto que os mais antigos não: os enquadrados, ab initio, no 2º escalão, apenas poderiam vir a aceder ao 3º e 4º escalões (apenas vendo refletido o valor das diuturnidades do 2º, 3º e 4º escalões); os enquadrados no 3º escalão, apenas poderiam vir a aceder ao 4ª escalão (apenas vendo refletido o valor das do 3º e 4º escalões); os enquadrados no 4º escalão, apenas poderiam vir a receber 1 diuturnidade (a do 4º escalão). E, na prática, tal efeito veio a verificar-se posteriormente, por efeito dessa progressão quanto aos músicos com menor antiguidade e à medida em que ela se ia verificando.

(…).

Coloca-se, pois, a questão de saber se tal viola o princípio da igualdade.

Constituem princípios estruturantes da ordem jurídica o princípio da igualdade, consagrado no art. 13º, nº 1, da CRP, nos termos d qual “Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei”, bem como o da proibição da discriminação, consagrado no art. 26º, nº 1, da mesma, nos termos do qual “1. A todos são reconhecidos os direitos (…) e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação”. E, como emanação do princípio da igualdade, é ainda consagrado constitucionalmente, conforme art. 59, nº 1, al. a), da CRP o principio “de que para trabalho igual salário igual”.

Tem sido entendimento pacífico do Supremo Tribunal de Justiça o de que as exigências do princípio da igualdade se reconduzem, no fundo, à proibição do arbítrio, mas não impedindo, em absoluto, toda e qualquer diferenciação de tratamento, mas apenas proibindo as diferenciações materialmente infundadas, sem qualquer fundamento razoável ou justificação objectiva e racional. - cfr., designadamente, o Acórdão do STJ de 20.11.2013, Proc. 14/11.5TTCVL.C1.S1, in www.dgsi.pt, no qual se refere, para além do mais que: “Da densificação daquele primeiro, importará reter ora o segmento da proibição do arbítrio - a tornar defesa quer a diferenciação de tratamento sem justificação razoável, quer a identidade de tratamento para situações manifestamente desiguais -, ora o segmento da proibição de discriminação, a tornar ilegítimas diferenciações de tratamento baseadas em categorias meramente subjetivas ou em razão dessas categorias.

Da proibição do arbítrio, qual princípio negativo de controlo, decorre que nem aquilo que é fundamentalmente igual deve ser tratado arbitrariamente como desigual, nem aquilo que é essencialmente desigual deve ser arbitrariamente tratado como igual.

De sua vez, não pode a proibição de discriminação significar uma exigência de igualdade absoluta, nem, de modo igualmente absoluto, proibir diferenciações de tratamento. Exige-se, sim, que a diferenciação seja materialmente fundada, nomeadamente sob o ponto de vista da proporcionalidade, da justiça e da solidariedade. Neste conspecto, a diferenciação de tratamento sairá legitimada quando se baseie numa distinção objetiva de situações ou se revele necessária, adequada e proporcionada à satisfação do seu objetivo.

Em formulação de síntese, dir-se-á: um tratamento desigual obriga a uma justificação material da desigualdade.”.

(…).

E tem-se também entendido que, inexistindo fator discriminatório (cfr. arts. 23º, nºs 1 e 3, do CT/2003 e arts. 25º, nºs 1 e 5, 24º, nº 1 e 25º, nº 6, do CT/2009), em que que se verificaria a inversão do ónus da aprova [cabendo ao empregador a prova da justificação da diferenciação do tratamento], caberá ao trabalhador o ónus da prova da igualdade do trabalho, em natureza, quantidade e qualidade [sendo que no caso não se verifica, nem foi alegado, a existência de fator discriminatório].

Contudo, tais considerações não se colocam, nem relevam, no caso em apreço, em que o que está em causa são as diuturnidades, cujo direito assenta apenas no fator antiguidade, isto é, no tempo ao serviço do empregador, e não em qualquer juízo relativamente à igualdade do trabalho em natureza, quantidade e qualidade.

(…).

Não obstante, e salvo melhor opinião, afigura-se-nos que não se pode olvidar o efeito pernicioso ou “perverso” e, como diremos, inaceitável, dos efeitos do acordo relativamente à não retroatividade dos efeitos da antiguidade quanto às diuturnidades anteriores àquelas em que os AA. foram, aos 01.07.2006, enquadrados (mas devidas, evidentemente, apenas após 01.07.2006).

É que, bem ou mal, a Ré aceitou integrar os músicos da O..., concretamente os AA., nos seus quadros e reconhecer-lhes a antiguidade reportada à data de admissão dos mesmos na anterior O..., dificilmente se compreendendo que, tendo todos eles provindo da mesma entidade e com a anterior antiguidade reconhecida pela Ré, sejam, afinal, os com maior antiguidade prejudicados por virtude dessa antiguidade quando, as diuturnidades, visam precisamente premiá-la.

Acresce que a situação da passagem da O... para a Ré se poderá até enquadrar numa situação de transmissão de estabelecimento (art. 318º do CT/2003, em vigor à data), ou pelo menos em situação muito similar, que determina a transmissão dos contratos de trabalho, sendo que consta da Clª 1ª, nºs 1 e 3, do Contrato-Programa celebrado entre a Ré e o Ministério da Cultura que constitui objeto do mesmo “ a integração dos músicos da O..., na Fundação Casa da Música” e que “O Ministério da Cultura diligenciará no sentido de o equipamento e os instrumentos musicais pertencentes à Orquestra ..., e identificados no Anexo III, serem atribuídos à Fundação aquando da extinção daquela”, bem como do seu Anexo I, nº 1, que “O contrato de trabalho a celebrar entre a Fundação e os músicos da Orquestra ... respeitará a antiguidade adquirida pelos próprios no âmbito desta última”.

É certo que os AA (assim como os demais músicos) não beneficiavam, aquando da sua integração, de diuturnidades (pelo que não havia diuturnidades a transmitir) e que a Ré poderia vir atribuir tal direito apenas para o futuro. Um empregador que não pague diuturnidades, parece-nos, pode vir a conferir, para o futuro, tal direito aos seus trabalhadores, sem que se lhe imponha que o faça com efeitos retroativos quer no que toca ao pagamento, quer no que toca à contagem da antiguidade para efeitos do pagamento das diuturnidades.

Porém, o que se nos afigura é que a Ré já não poderá estabelecer um regime de não retroatividade que venha a ter no futuro, como veio a ter, como consequência um tratamento desigual quanto à possibilidade de acesso a número igual de diuturnidades, penalizando os de maior antiguidade.

(…).

Ou a Ré, em 01.07.2006, não teria, em relação a todos os músicos oriundos da O..., reconhecido a antiguidade nela adquirida (sendo que o que então se poderia discutir seria a obrigação, ou não, de a Ré reconhecer a antiguidade, designadamente por via da eventual existência transmissão de estabelecimento) ou, reconhecendo-a, não pode então vir a instituir um regime que, na prática, se traduza num tratamento diferente que penaliza os trabalhadores com maior antiguidade.

(…).

Afigura-se-nos, pois, que a interpretação do art. 22º do Regulamento Interno defendida pela Ré, ainda que, aquando da celebração dos contratos de trabalho tivesse sido aceite pelos AA., não pode ser acolhida, assim se revendo, a ora relatora e o 1ª Adjunto, a posição tomada, como, respetivamente 1º e 2º adjuntos, no Acórdão desta Relação de 20.09.2021, Proc. 25418/18.1T8PRT.P2.

Ou seja, assiste razão aos AA/Recorrentes quanto à questão das diuturnidades, e não à Ré/Recorrida, devendo o recurso desta ser julgado improcedente.

(…).

Os AA. liquidaram as quantias em dívida com base retribuição base que, segundo eles, deveria ter sido atualizada, pelo que, improcedendo o recurso nesta parte, improcede também a liquidação das diuturnidades formulada pelos AA, pelos valores em que o fizeram, adiante se procedendo ao seu cálculo.

(…).

Ter-se-ão em conta, na liquidação a fazer, as fórmulas de cálculo das diuturnidades utilizadas pelos AA. na p.i., que aliás não foram postas em causa pela Ré.

(…).

5.2. Ao 2º A. BB:

Sendo a sua antiguidade reportada a ....04.1994, tem direito aos seguintes escalões de diuturnidades: 3ª D, em 01.07.2006; 4ª D, em 01.04.2010.

(…).

5.3. Ao 3º A. CC

Sendo a sua antiguidade reportada a ....03.1993, tem direito aos seguintes escalões de diuturnidades: 3ª D, em 01.07.2006; 4ª D, em 01.03.2013.

(…).”.

4. - Num caso similar ao dos autos (a mesma Ré), o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05 de junho de 2024, proc. n.º 13440/21.2T8PRT.P1.S1., relator Conselheiro Mário Belo Morgado, consignou:

b) – Cálculo das diuturnidades: vontade das partes e interpretação das pertinentes cláusulas contratuais e disposições do Regulamento Interno.

9. Para decidir a questão em apreço, há que ter em conta, antes do mais, o contexto em que se formou o vínculo contratual existente entre as partes, que radica num contrato-programa celebrado, em 2006, entre a Ré e o Ministério da Cultura.

A ré comprometeu-se a integrar os músicos da Orquestra ..., celebrando com eles novos contratos de trabalho, embora respeitando a antiguidade e a remuneração destes à data da integração, sendo que a comparticipação financeira do Ministério da Cultura correspondente aos encargos com a integração foi fixada – e balizada – até 2010 (pontos B e C da matéria de facto) e a R. elaborou um Regulamento Interno com vista a definir os princípios a respeitar na contratação dos músicos, do qual consta, na parte que ora releva (ponto J da matéria de facto):

“Artigo 18º

1. Os músicos são distribuídos pelos seguintes níveis de retribuição:

Nível I – 1º Concertino (concertino principal)

Nível II – 2º Concertino

Nível III – Assistente de Concertino e Chefes de Naipe

Nível IV – Solistas A

Nível V – Solistas B

Nível VI – Tutti

2. Em cada nível de retribuição poderão existir salários diferentes, nomeadamente por força da aplicação do disposto no art. 22º”

(…)

Artigo 22º

1 – Os músicos terão direito, pela antiguidade que lhes for reconhecida no contrato de trabalho, sem qualquer retroatividade, às seguintes diuturnidades, calculadas sobre a remuneração base atual, de acordo com os seguintes escalões:

a) 4 anos de antiguidade – primeira diuturnidade correspondente a 2,5 %;

b) 8 anos de antiguidade – segunda diuturnidade correspondente a 3 %;

c) 12 anos de antiguidade – terceira diuturnidade correspondente a 3,5 %;

d) 16 anos de antiguidade – quarta diuturnidade correspondente a 4 %.

2. Havendo mudança de escalão a nova diuturnidade será calculada sobre a remuneração base então em vigor, acrescida da diuturnidade anterior”.

10. Consonantemente, na alínea c) do ponto 6.1. dos contratos de trabalho dos autores, estabeleceu-se que as diuturnidades, “de acordo com o Regulamento Interno”, seriam calculadas da forma seguinte (ponto k da matéria de facto):

“i) multiplica-se a percentagem correspondente à diuturnidade aplicável pela remuneração base mensal;

ii) o valor daí resultante é multiplicado por 12 e dividido por 14;

iii) esse valor é pago 14 vezes, juntamente com a remuneração base mensal;

iv) Havendo mudança de escalão a nova diuturnidade será calculada sobre a remuneração base então em vigor, acrescida da(s) diuturnidade(s) anterior(es)”.

11. Tendo ainda presente o conceito legal de diuturnidade, entendida como prestação de natureza retributiva a que o trabalhador tem direito com fundamento na sua antiguidade [art. 250º, nº 2, b), do CT/2003, que, pacificamente, é o aplicável ao caso dos autos], qual o alcance do assim regulado?

Como se sabe, a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele (art. 236º, nº 1, do Código Civil) – teoria da impressão do declaratário”). Porém, sempre que aquele conheça a vontade real deste, é de acordo com ela que vale a declaração emitida (nº 2 do mesmo artigo). Especificamente quanto aos negócios formais, não pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respetivo documento, ainda que imperfeitamente expresso, sentido que só poderá valer se corresponder à vontade real das partes e as razões determinantes da forma do negócio se não opuserem a essa validade (cfr. art. 238º, do mesmo diploma).

Todavia, se o sentido das proposições contratuais – e, em geral o de qualquer ato jurídico (cfr. art. 295º, do Código Civil) – é determinado através da respetiva interpretação do contrato, a verdade é que deverá “transcender-se a mera fixação do sentido linguístico e maximizar-se o efeito útil e a coerência entre as estipulações” (Ac. do STJ de 28.01.2021, Proc. n.º 3443/18.0T8CBR.C1.S1).

Também “os factos posteriores ao comportamento interpretando (designadamente, o modo como o negócio foi executado) relevam, por exemplo, para concluir acerca do entendimento das partes quanto ao sentido do negócio (especialmente relevante no caso dos contratos duradouros, em que é normal que, durante o período de vigência, as partes ajustem o negócio à alteração das circunstâncias envolventes)”.

12. Quanto à vontade real das partes, provou-se que estas “chegaram ao acordo vertido no Regulamento Interno, no sentido de, aquando da integração dos músicos na ré, se iniciar o cálculo da diuturnidade correspondente, nessa altura, à antiguidade a cada um deles reconhecida, excluindo quaisquer outras eventuais diuturnidades vencidas anteriormente por força dessa antiguidade (ponto DD da matéria de facto), sendo certo que não se vislumbra qualquer disparidade entre a vontade assim apurada e o texto das disposições regulamentares e contratuais elencadas em supra nº 9 e 10.

13. Em conformidade com o assim acordado, em 01.07.2006, data da integração dos Autores na Ré, esta passou a pagar-lhes a 3ª diuturnidade (3,5%), correspondente aos 13 anos de antiguidade que ambos detinham nesse momento; e, a partir de fevereiro e março de 2009, data em que, respetivamente, perfizeram 16 anos de antiguidade, a R. passou a pagar-lhes a 4ª diuturnidade, sendo que o correspondente acréscimo de 4% incidiu sobre o somatório da sua remuneração base com a quantia referente à diuturnidade anterior (pontos E, H, L, e M da matéria de facto), conforme dispõe o art. 22º, nº 2, do Regulamento Interno.

14. Vale por dizer que a Ré calculou e pagou as diuturnidades aos Autores de acordo com o Regulamento Interno e com o clausulado nos contatos de trabalho, bem como em conformidade com a vontade real das partes, tendo sido assim que o corpo normativo dali decorrente foi reiteradamente executado ao longo de vários anos, durante os quais “os músicos nada reclamaram quanto à falta de pagamento de diuturnidades” [ponto FF da matéria de facto], isto até ao momento em que se constatou que, a partir de certa altura, diversos músicos, com categorias profissionais iguais às dos autores, passaram a auferir valores superiores a título de diuturnidades (pontos Q, R e S da matéria de facto).

Em suma:

a. A expressão “sem qualquer retroatividade”, prevista no art. 22.º nº 1, do Regulamento Interno, significa que as diuturnidades só se venceriam após a celebração do contrato de trabalho, embora com a antiguidade dos Autores reportada a 01.02.1993; por outras palavras, à data do contrato de trabalho celebrado entre as partes (01.07.2006), aos autores era reconhecida uma única diuturnidade, calculada em função da sua antiguidade, reportada a 01.02.1993;

b. Havendo mudança de escalão de diuturnidade após 01.07.2006 (em função do correspondente acréscimo da antiguidade), a nova diuturnidade seria calculada sobre a remuneração base então em vigor, acrescida da(s) diuturnidade(s) anterior(es) reconhecida(s) até esse momento.

15. Basicamente, foi também esta a primeira conclusão a que chegou o acórdão recorrido (cfr. supra 8.4.1. e 8.4.2.), embora, depois de problematizar as implicações do princípio da igualdade salarial no caso sub judice (cfr. supra 8.4.3.), tenha acabado por aderir, na prática, à posição oposta, ou seja, ao entendimento dos Autores.

Refira-se que no âmbito de um litígio entre a Ré e um trabalhador situado em circunstâncias idênticas às dos Autores, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 20.09.2021 (Proc. n.º 25408/18.1T8PRT.P2), concluiu: “sem prejuízo do direito do autor à sua antiguidade laboral, desde ....03.1993, nomeadamente, para efeitos de reforma, a ré apenas estava obrigada ao pagamento da retribuição base e diuturnidades correspondentes ao trabalho prestado pelo autor ao seu serviço, ou seja, desde 01.07.2006 até à cessação do contrato de trabalho” (emerge do texto do acórdão que na apelação não terá sido invocada a violação do princípio da igualdade salarial, pelo que o TRP não conheceu dessa matéria).

c) – Implicações do princípio da igualdade salarial no caso sub judice.

16. Acompanha-se o acórdão recorrido, na parte que afirma que “a Ré (…) não poderá estabelecer um regime de não retroatividade que venha a ter no futuro, como veio a ter, como consequência um tratamento desigual quanto à possibilidade de acesso a número igual de diuturnidades, penalizando os [trabalhadores] de maior antiguidade”.

Com efeito, é patente que na aplicação do regime de diuturnidades se revela uma diferenciação arbitrária entre trabalhadores, traduzida no favorecimento de músicos mais modernos relativamente a outros, como os Autores, que são mais antigos, situação que, não assentando em qualquer justificação de ordem objetiva, infringe o princípio da igualdade salarial – ou da equidade retributiva, segundo o qual a trabalho igual salário igual –, consagrado no art. 59º, nº 1, a), da CRP, no art. 28º do CT/2003, e no art. 31º, nºs 1 e 2, do CT/2009.

No entanto, como refere a recorrente, “a violação do princípio da igualdade só ocorre no momento em que o primeiro músico com menor antiguidade passa a receber um valor superior, a título de diuturnidades, em relação ao trabalhador com maior antiguidade, pois até esse momento não há qualquer desigualdade”.

Não se subscreve, pois, o passo seguinte do raciocínio desenvolvido pelo Tribunal a quo, que se traduz, no fundo, na reabertura/reexame da questão tratada em primeiro lugar e na negação das conclusões previamente atingidas e validadas nesse plano (logicamente anterior e distinto).

Com efeito, fixada que está a vontade das partes quanto ao modelo normativo da integração dos Autores na Ré, aliás coincidente com o sentido supra atribuído às pertinentes cláusulas contratuais e disposições regulamentares atinentes ao cômputo das diuturnidades, a solução passa, antes, por determinar os termos em que isso (e a prática da Ré nesta matéria) deve ceder em face das implicações no caso concreto do princípio da igualdade salarial, tendo em vista colocar os Autores em situação idêntica à do trabalhador mais moderno que em maior medida tenha sido beneficiado quanto a esta parcela remuneratória, valor a determinar em incidente de liquidação (cfr. art. 609º, nº 2, do CPC).” (os negritos e sublinhados integram o texto original).

5. - Acompanhamos, na íntegra, a elucidada fundamentação, supratranscrita, do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05 de junho de 2024, pelo que o presente recurso de revista procede parcialmente.

IV. - Decisão

Atento o exposto, acordam os Juízes que compõem a Secção Social julgar parcialmente procedente o recurso de revista e:

1. - Declarar que, à data da sua integração na Ré, os Autores tinham direito à terceira diuturnidade, correspondente ao escalão da sua antiguidade (nesse momento), e não às diuturnidades anteriores, sendo que, na sequência de mudança de escalão de diuturnidade após 01.07.2006 (em função do correspondente acréscimo da antiguidade), as novas diuturnidades são calculadas sobre a remuneração base então em vigor, acrescidas das diuturnidades antes reconhecidas até esse momento.

2. - Condenar a Ré a pagar aos Autores, em acréscimo aos montantes remuneratórios assim calculados, as quantias correspondentes à diferença entre o valor auferido por estes a título de diuturnidades e o recebido (a tal título) pelo trabalhador mais moderno (com referência à data da integração na Ré) que em maior medida se mostre beneficiado em relação àqueles, quantitativo a determinar em incidente de liquidação, nos termos do artigo 609.º, n.º 2, do Código Processo Civil.

3. - No mais, em confirmar o acórdão recorrido.

Custas da revista, bem como nas Instâncias, a fixar a final, na proporção do decaimento das partes, proporção que, provisoriamente, se fixa em metade para os Autores e para a Ré.

Lisboa, 16 de outubro de 2024

Domingos José de Morais (Relator)

Mário Belo Morgado

Júlio Manuel Vieira Gomes