I. O regime do n.º 3 do art. 671.º do CPC reporta-se à conformidade entre a decisão final de cada uma das instâncias e não à conformidade entre a respectiva fundamentação; esta apenas releva no caso de existir diferença essencial entre a fundamentação de cada uma das decisões em causa.
II. Assim, nem o facto de o acórdão da Relação ter apreciado das invocadas nulidades da sentença, considerando-as não verificadas, nem o facto de o mesmo acórdão ter conhecido da invocada violação do princípio do inquisitório, considerando-a inexistente, implicam a existência de fundamentação essencialmente diferente entre as decisões das instâncias.
«1. AA, BB e CC intentaram a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra: 1.º) DD; 2.º) EE; e 3.º) FF.
Pediram que seja:
(a) “reconhecida a posse e propriedade exclusiva sobre 681/36098 avos indivisos do prédio identificado em 6º e 7º” da petição aperfeiçoada;
(b) reconhecido que 681/36098 avos indivisos do prédio identificado nos artigos 6º e 7º da petição aperfeiçoada correspondem aos lotes 12 e 13 do projecto de reconversão ur
banística da área de génese ilegal do ..., freguesia de ..., concelho de ...;
(c) reconhecido que esses lotes são propriedade exclusiva das autoras;
(d) reconhecido que, à data escritura de justificação e doação, outorgada pelos réus, estes já tinham cedido, às autoras, todos os direitos que detinham sobre aquelas parcelas ou prédio rústico;
(e) anulada ou declarada nula a escritura de justificação e doação, outorgada em 16/2/2008, e ordenado o cancelamento da inscrição registral, a favor do réu, efectuada pela apresentação nº..03, de 3/6/2009, sobre o prédio descrito sob o nº .69 da ...Conservatória do Registo Predial;
(h) condenados os réus no pagamento de indemnização em quantia não inferior a €49.000,00, a título ressarcimento dos danos, patrimoniais e não patrimoniais, sofridos pelas autoras em consequência da actuação daqueles.”.
Os réus contestaram.
Após múltiplas vicissitudes, teve lugar audiência de discussão e julgamento, vindo a ser proferida sentença decidindo:
“a) reconhecer o direito de propriedade das autoras AA, BB e CC, sobre 681/36.0... avos indivisos do prédio rústico descrito na ...Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº.02, freguesia de ..., e inscrito na matriz predial rústica da freguesia de ..., sob o artigo 103º, secção AA-2;
b) reconhecer que os 681/36.0... avos indivisos do prédio rústico descrito na...Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº.02, freguesia de ... – referidos na alínea anterior -, pertencentes exclusivamente às autoras correspondem fisicamente aos lotes designados por 12 (doze) e 13 (treze), no processo de reconversão da AUGI denominada Bairro ... a que respeita o alvará de loteamento n.º 02/2016 de 6 de Dezembro de 2016, rectificado por Declaração de 14 de Março de 2017;
c) reconhecer as autoras AA, BB e CC, como únicas titulares do direito de propriedade sobre os lotes 12 (doze) e 13 (treze), referidos no ponto anterior e identificados no alvará de loteamento n.º 02/2016 de 6 de Dezembro de 2016, rectificado por Declaração de 14 de Março de 2017;
d) declarar ineficaz a escritura de justificação e doação outorgada no dia 16 de Dezembro de 2008, no Cartório Notarial sito na ..., concelho de ..., exarada a folhas dezoito do livro vinte e quatro daquele Cartório Notarial, então a cargo da Senhora Notária GG, na qual foram outorgantes os réus DD e EE e declarar nula a doação de 1210,8/12108 avos indivisos do prédio rústico, sito em ..., freguesia de ..., concelho de ..., descrito na Segunda Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº .69 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 43, secção A2, efectuada pela ré DD ao réu EE, constante dessa escritura de justificação;
e) determinar o cancelamento da inscrição no registo predial efectuada pela apresentação nº..03, de 3/6/2009, sobre o prédio descrito sob o nº .69 da ... Conservatória do Registo Predial, em nome do réu EE;
f) condenar os réus DD, EE e FF, solidariamente, no pagamento da quantia de €11.000,00 (onze mil euros), a cada autora, a título de ressarcimento dos danos não patrimoniais, acrescida de juros legais, contabilizados à taxa de juros legal, actualmente, de 4% ao ano (Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril; artigos 559.º, n.º 1, 804.º, n.ºs 1 e 2, 805.º, n.ºs 2, al. b) e 3 e 806.º, n.ºs 1 e 2, todos do Código Civil), vencidos desde a data da presente decisão e vincendos até integral pagamento;
g) Absolver os réus DD, EE e FF, dos demais pedidos.”.
Inconformados, os réus interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, o qual veio a proferir acórdão com a seguinte decisão:
“Pelo exposto, os Juízes da 6.ª Secção da Relação de Lisboa acordam em:
a) Rejeitar as nulidades da sentença arguidas pelos recorrentes;
b) Julgar totalmente improcedente a impugnação da matéria de facto efectuada pelos recorrentes;
c) Julgar parcialmente procedente a apelação apresentada e, consequentemente:
1- condenar os réus DD e EE, solidariamente, no pagamento da quantia de €5.000,00 (cinco mil euros), a cada autora, a título de ressarcimento dos danos não patrimoniais, acrescida de juros legais, contabilizados à taxa de juros legal, actualmente, de 4% ao ano (Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril; artigos 559.º, n.º 1, 804.º, n.ºs 1 e 2, 805.º, n.ºs 2, al. b) e 3 e 806.º, n.ºs 1 e 2, todos do Código Civil), vencidos desde a data da presente decisão e vincendos até integral pagamento;
2- absolver a ré FF do pagamento de qualquer quantia a cada autora, a título de ressarcimento dos danos não patrimoniais;
d) No mais, julga-se improcedente a apelação e mantendo-se a decisão recorrida.”.
2. Novamente inconformados os réus DD e EE vieram interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça pugnando pela revogação do acórdão recorrido.
3. Suscita-se a questão da admissibilidade do recurso, sobre a qual os réus recorrentes se pronunciaram nos termos seguintes:
“O recurso é de revista normal (artº 671º do CPC) e é admissível porquanto quanto às questões que infra se enunciam, não existe a restritiva dupla conforme prevista no nº 3 daquele artº 671º.
Efetivamente, as questões da nulidade da decisão de 1ª Instância do excesso de pronúncia e por condenação em objeto diverso do pedido (alíneas b) e c) das conclusões da apelação) foram conhecidas pela primeira vez no Acórdão de que ora se recorre.
Também a questão referente ao uso do poder inquisitório previsto, nomeadamente, nos artºs 411º e 526º nº 1 do CPC (alínea e) das conclusões da apelação), não suscitada em 1ª Instância, foi conhecida pela primeira vez no mesmo Acórdão.
A revista deve subir nos próprios autos (artºs 675º e 671º do CPC) e com efeito meramente devolutivo (a contrario do artº 676º do CPC), tendo por fundamento a violação ou errada aplicação da lei de processo (artº 674º nº 1 alínea b) do CPC), requerendo-se o respetivo recebimento.”.
Por sua vez, os autores recorridos responderam o seguinte:
“Relativamente à questão do alegado excesso de pronúncia, e à invocada condenação em objecto diverso do peticionado, existe dupla conforme, porquanto, a decisão lavrada na primeira Instância foi confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, sem voto de vencido e sem uma fundamentação essencialmente diferente.
Assim dispõe o artº. 671º nº 3 do C.P.C..
Por outro lado, a arguição pelos Recorrentes, de alegadas nulidades do acórdão também não desvirtua a dupla conforme, pois, nesse caso, será o Tribunal que proferiu a decisão a apreciá-las (art. 617º, nº6, do CPC).
O douto acórdão recorrido foi proferido pelo Tribunal à quo sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente da decisão proferida pela 1.ª Instância.
Por isso, o referido acórdão constitui dupla conforme para o Recorrente e, nessa medida, é para o mesmo irrecorrível – artigos 671.º n.º 1 e 3 do CPC.
Por conseguinte, o presente recurso não deverá ser admitido, e antes devendo ser rejeitado com todas as suas legais consequências.”.
4. O Juiz relator do Tribunal da Relação exarou o seguinte despacho:
“Para sustentar o recurso de revista normal (artº 671º do CPC), entendem quanto às questões que infra se enunciam, não existir a dupla conforme prevista no nº 3 daquele artº 671º, constituem tais questões:
1º as questões da nulidade da decisão de 1ª Instância do excesso de pronúncia e por condenação em objeto diverso do pedido (alíneas b) e c) das conclusões da apelação) foram conhecidas pela primeira vez no Acórdão de que ora se recorre;
2º também a questão referente ao uso do poder inquisitório previsto, nomeadamente, nos artºs 411º e 526º nº 1 do CPC (alínea e) das conclusões da apelação), não suscitada em 1ª Instância, foi conhecida pela primeira vez no mesmo Acórdão.
Tendo em conta jurisprudência recente do Supremo Tribunal de Justiça e quanto à 1ª questão, quando uma nulidade da sentença da 1ª instância é apreciada e julgada improcedente em recurso de apelação perante a Relação tal equivale para todos os efeitos a uma reapreciação sucessiva da mesma questão, estando assim formada uma dupla conformidade decisória que seria impeditiva do recurso de revista (cfr. Ac. do STJ de 01-10-2019, proferido no proc. 620/14.6T8LSB.L1-A.S1, versão integral em www.dgsi.pt).
Já quanto à 2ª questão, entendemos que não se verifica a dupla conforme, pelo que o recurso de revista é admissível.
Em face do exposto, admito o recurso de revista interposto, o qual subirá nos próprios autos e com efeito devolutivo (art. 671º nº 1 e 675º nº 1, ambos do CPC).”.
Vejamos.
5. Diversamente daquele que parece ser o entendimento dos recorrentes, assim como, até certo do ponto, o entendimento do Juiz relator do tribunal a quo, a dupla conforme forma-se em função da decisão final de cada uma das instâncias, apenas relevando a respectiva fundamentação no caso de existir diferença essencial (cfr. art. 671.º, n.º 3, do CPC).
A dupla conforme apenas poderá ser parcial no caso de estarem em causa segmentos processuais materialmente autónomos e cindíveis (cfr. decisão uniformizadora do Pleno das Secções Cíveis – AUJ n.º 7/2022).
5.1. No caso dos autos, verifica-se que os segmentos decisórios relativos à definição do direito de propriedade (cfr. alíneas a) a e) da decisão da sentença) são autónomos e cindíveis em relação ao segmento decisório relativo ao valor indemnizatório (cfr. alínea f) da sentença), embora este último não o seja em relação aos primeiros.
Assim, tendo o acórdão da Relação confirmado, sem voto de vencido nem fundamentação essencialmente diferente, a decisão da 1.ª instância correspondente às referidas alíneas a) a e) da decisão da sentença, ocorre nesta parte o obstáculo da dupla conforme à admissibilidade do recurso (cfr. art. 671.º, n.º 3, do CPC).
Mais se esclarece que, diversamente do alegado pelos recorrentes: (i) nem o facto de o acórdão da Relação ter apreciado das invocadas nulidades da sentença, considerando-as não verificadas; (ii) nem o facto de o mesmo acórdão ter conhecido da invocada violação do princípio do inquisitório na apreciação da impugnação da matéria de facto, considerando-a inexistente; (iii) são de molde a gerar fundamentação essencialmente diferente entre as decisões das instâncias.
Com efeito, encontra-se consolidado na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça que o conhecimento pelo Tribunal da Relação de questão suscitada inovatoriamente no recurso de apelação e julgada não procedente, não permite descaracterizar a dupla conforme decisória. Se assim não fosse, estava encontrada a via para impedir que, em todo e qualquer caso, se formasse o obstáculo da dupla conforme.
5.2. Temos, assim, que, no caso sub judice, apenas se poderá equacionar a não formação de dupla conforme em relação ao segmento decisório relativo ao valor indemnizatório (cfr. alínea f) da sentença), que a 1.ª instância fixou em € 11.000,00, a pagar solidariamente pelos 1.º, 2º, e 3.º réus a cada uma das autoras; e que o Tribunal da Relação reduziu para € 5.000,00, a pagar solidariamente pelos 1.º e 2.º réus a cada uma das autoras.
Simplesmente, aqui chegados, vindo impugnado o acórdão da Relação que, reduzindo o quantitativo indemnizatório, se revelou mais favorável aos 1.º e 2.º réus, ora recorrentes, deparamo-nos com a orientação consolidada da jurisprudência deste Supremo Tribunal no sentido da inclusão de tal situação no conceito de dupla conforme. O que encontra manifestação no AUJ n.º 7/2022, no qual se dispôs o seguinte:
“Em acção de responsabilidade civil extracontratual fundada em facto ilícito, a conformidade decisória que caracteriza a dupla conforme impeditiva da admissibilidade da revista, nos termos do artigo 671.º, n.º 3, do CPC, avaliada em função do benefício que o apelante retirou do acórdão da Relação, é apreciada, separadamente, para cada segmento decisório autónomo e cindível em que a pretensão indemnizatória global se encontra decomposta.”.
E em cuja fundamentação se pode ler o seguinte:
“Trata-se, como já referido, de um critério de conformidade assente na ideia de coincidência racional, que se afasta da coincidência formal de julgados (por esta se revelar mecânica e redutora dos propósitos subjacentes à própria figura da dupla conforme face à imponderação do elemento teleológico na interpretação da norma), que inicialmente equacionado relativamente às decisões de condenação numa prestação pecuniária (acções com objectos processuais economicamente divisíveis, ainda que não se esgote nesse âmbito), parte da ideia e encontra justificação no facto de carecer de sentido admitir o recurso de revista nas situações em que o recorrente tenha obtido uma decisão mais favorável que aquela que teria com a confirmação irrestrita da decisão de 1.ª instância, inviabilizadora da revista.
Por conseguinte e segundo o posicionamento onde nos situamos, levando em conta o elemento racional ou teleológico de interpretação, a sobreposição caracterizadora da conformidade decisória, não obstante partir de uma coincidência de julgados (sobreposição parcial), é aferida em função da decisão mais favorável - quantitativa ou qualitativamente -, ou seja, quando o acórdão da Relação se revela mais benéfico ao recorrente do que a proferida em 1.ª instância.
Trata-se de um critério "pragmático e funcional do conceito de dupla conforme, tendo a vantagem prática de criar alguma segurança jurídica acerca dos contornos da figura, não deverá, todavia, fazer perder de vista que ela se passa a mover, não tanto no plano da coincidência decisória, mas envolve a formulação de uma espécie de regra especial de sucumbência, adicional à que sempre resultou do n.º 1 do art. 629.º, e implica, por outro lado, a criação de uma espécie de dupla conforme subjetiva, inibidora da revista normal quanto apenas a uma das partes.”. [negrito nosso]
De acordo com esta orientação do Pleno das Secções Cíveis, também o segmento decisório relativo à fixação do valor indemnizatório se encontra abrangido pela dupla conformidade, uma vez que, neste particular, o recurso de apelação foi julgado parcialmente procedente, decidindo o tribunal a quo em sentido mais favorável aos 1.º e 2.ºs réus.
Conclui-se, deste modo, pela verificação de dupla conforme entre as decisões das instâncias, impeditiva da admissibilidade do recurso na sua integralidade (cfr. art. 671.º, n.º 3, do CPC).
6. Pelo exposto, e atendendo a que tanto os recorrentes como os recorridos se pronunciaram já sobre a questão da admissibilidade do recurso, designadamente sobre a existência ou não de dupla conforme, não se admite o recurso.».
II. Desta decisão vieram os recorrentes impugnar para a conferência, alegando essencialmente o seguinte:
«Na alegação da revista sustentou-se que as questões nelas suscitadas relativas à nulidade da decisão da 1ª Instância sobre o excesso de pronúncia e por condenação em objeto diverso do pedido (alíneas b) e c) das conclusões da apelação) foram pela primeira vez conhecidas no Acórdão da Relação, e também sucedendo o mesmo no que toca à questão referente ao uso do poder inquisitório previsto, nomeadamente nos artºs 411º e 526º nº 1 do CPC (alínea e) das conclusões da apelação), não suscitada em 1ª Instância.
O Sr. Juiz Desembargador Relator que proferiu o despacho de 22-05-2024 de recebimento da revista discordou que não se verificasse dupla conforme quanto às questões da nulidade, mas entendeu que tal não sucedia no que tocava à relativa ao uso do poder inquisitório questionado na alínea e) das conclusões da apelação.
Os ora requerentes, louvando a decisão parcialmente favorável daquele Sr. Juiz Desembargador Relator, entendem, no entanto, que também quanto à questão das nulidades não se verifica a dupla conforme.
Espera-se que a conferência não mantenha o decidido pelo Sr. Juiz Conselheiro Relator, - cujos argumentos não convencem, salvo o devido respeito, - pronunciando-se pela inexistência de dupla conforme e que, consequentemente, tome conhecimento deste recurso.
E não existindo tal limitação ao conhecimento do recurso, o mesmo, pelos fundamentos suscitados na respetiva alegação, deve ser provido.».
Os recorridos pugnaram pela não admissibilidade do recurso.
Vejamos.
III. No seu requerimento de impugnação para a conferência, os recorrentes não se pronunciam sobre os fundamentos da decisão impugnada, limitando-se a afirmar que os «argumentos [da decisão] não convencem, salvo o devido respeito» e reiterando que entre as decisões das instâncias não se verifica dupla conforme, atendendo a que o acórdão da Relação conheceu de duas questões suscitadas em sede de apelação e não apreciadas na decisão da 1.ª instância: (i) as alegadas nulidades da sentença; (ii) a alegada violação do princípio inquisitório.
Insistem os requerentes no equívoco assinalado na decisão ora impugnada de entenderem que a dupla conformidade entre as decisões das instâncias se forma em função da fundamentação das decisões das instâncias.
Na verdade, o regime do n.º 3 do art. 671.º do CPC - «não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância» - reporta-se à conformidade entre a decisão final de cada uma das instâncias e não à conformidade entre a respectiva fundamentação. Esta apenas releva no caso de existir diferença essencial entre a fundamentação de cada uma das decisões em causa.
Reitera-se, assim, o que foi afirmado na decisão impugnada, isto é, que, diversamente do alegado pelos recorrentes, nem o facto de o acórdão da Relação ter apreciado das invocadas nulidades da sentença, considerando-as não verificadas, nem o facto de o mesmo acórdão ter conhecido da invocada violação do princípio do inquisitório, considerando-a inexistente, implicam a existência de fundamentação essencialmente diferente entre as decisões das instâncias.
De acordo com a jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal, o conhecimento pelo Tribunal da Relação de questão (ou questões) suscitada(s) inovatoriamente no recurso de apelação e julgada(s) não procedente(s) não constitui diferença essencial na fundamentação do acórdão da Relação em relação à fundamentação da decisão da 1.ª instância. Se assim não fosse, bastaria aos apelantes invocarem inovatoriamente uma qualquer questão não apreciada na sentença para, ainda que julgada improcedente, obter a descaracterização da dupla conforme.
Deste modo, encontra-se verificado o obstáculo da dupla conformidade à admissibilidade do recurso de revista (art. 671.º, n.º 3, do CPC).
IV. Pelo exposto, indefere-se o requerido, mantendo-se a decisão de não admissão do recurso.
Custas pelos recorrentes requerentes.
Lisboa, 17 de Outubro de 2024
Maria da Graça Trigo (relatora)
Isabel Salgado
Catarina Serra