UNIÃO DE FACTO
DIREITO DE USO E HABITAÇÃO
CASA DE MORADA DE FAMÍLIA
NORMA IMPERATIVA
Sumário


A extensão temporal do direito de uso e habitação, posto que provada a união de facto, está estabelecida por lei, art.º 5.º da lei 7/2001 de 11 de Maio, não dispondo o julgador de qualquer margem de discricionariedade para a determinar.

Texto Integral

Recorrente: AA, ré

BB, ré

Recorrido: CC, autora


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I – Relatório

I.1 – relatório

AA e BB intentaram recurso de revista do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 10 de Julho de 2024 que, revogando parcialmente a sentença ali recorrida, proferida pelo Juízo de Família e Menores da ... - Juiz 1 do Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra, decidiu:

- condenar as RR. a reconhecer o direito real de habitação e (de uso do) recheio do rés do chão e 1º andar do imóvel inscrito na matriz sob o art. ..75º da freguesia de ..., sito na Rua ..., ..., ..., pelo igual período de duração da união de facto da A. com DD, durante 37 anos a partir da data de falecimento desde último (........2022);

- condenar as RR. a absterem-se de praticar quaisquer actos que firam o direito real de habitação e (uso do) recheio do mencionado rés do chão e 1º andar, pelo prazo de 37 anos, ou seja, até ao ano 2059 (24 de Dezembro).

As recorrentes apresentaram alegações que terminam com as seguintes conclusões:

1. A sentença proferida não atendeu as questões suscitadas pelas recorrentes

2. Alias foi alem do já decidido

3. Passou apenas do uso do rés do chão para o 1º Andar

4. Sendo que as Recorrentes não tem acesso ao que ó seu

5. E passou ainda o uso até 2059

6. Nessa altura as Recorrentes quiçá já não serão vivas

7. Mas pagas as despesas de IMI, ÁGUA E LUZ de alguém que não é da sua família

8. E que faz do PATRIMÓNIO que é seu o que bem entender

9. Usando gozando, fazendo cedências, acumulando lixos e afins e as recorrentes a ser autuadas por serem as proprietárias

10. Se já sentenciar o uso do rés do chão era susceptível da incredibilidade das recorrentes

11. Faze-lo na totalidade do imóvel ainda mais se estranha

12. Sendo o direito de aplicação a pessoas, não se crê que o legislador, quis, pensou que o VERDADEIRO proprietário não possa USAR 0 QUE É SEU

13. Pois o falecido DD era o pai das RECORRENTES disso não existe duvidas

14. Embora esta decisão nos leve a pensar o inverso e a recorrida é que era a MULHER do falecido

15. Mas não é

16. As recorrentes opõem se ao prazo até 2059 mencionado na sentença que se recorre, aumentando 2 anos sem qualquer justificação

17. As recorrentes não aceitam o referido prazo, pois não esta devidamente fundamento o deveria

18. Em 2059 qualquer das recorrentes terá mais de 80 a 90 anos é que vão tomar posse do que é seu?

19. Quando se altera a decisão que se recorre, no se tem em consideração regras básicas do direito de propriedade

20. Não se pode só porque sim decidir a favor de alguém

21. Olvidado este direito constitucional protegido

22. Pelo que o tribunal recorrido este mal na sua apreciação da decisão

23. E a mesma tem de ser alterada

24. Quer no que concerne ao USO como ao espaço temporal

Termos em que, e nos melhores de Direito, se requer a V. Exas. Senhores Juízes Conselheiros decidir no sentido de que deverá a douta sentença proferida ser revogada e ser aceite o recurso interposto e anular a decisão proferida.

Não foram apresentadas contra-alegações, mas a autora apresentou um requerimento onde considera que as alíneas c) e e) do art. 696º do CPC não são aplicáveis, e, bem assim, as alegações apresentadas são uma mera repetição do já alegado para esse Venerando Tribunal sem qualquer alteração doutrinal e jurisprudencial.


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I.2 – Questão prévia - admissibilidade do recurso

O recurso de revista é admissível ao abrigo do disposto no art.º 671.º, n. º1 do Código de Processo Civil.

Estando verificados os requisitos gerais de admissibilidade da revista por a causa ter valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada ser desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, em conformidade com o art.º 629.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, é objecto do presente recurso um acórdão da Relação, proferido sobre decisão da 1.ª instância, que conheceu do mérito da causa e veio por aquele a ser parcialmente revogada.


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I.3 – O objecto do recurso

Tendo em consideração o teor das conclusões das alegações de recurso e o conteúdo da decisão recorrida, cumpre apreciar a seguinte questão:

1. Omissão de pronúncia/excesso de pronúncia

2. Direito de uso e habitação da totalidade do imóvel

3. Extensão temporal do direito de uso e habitação.


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I.4 - Os factos

As instâncias consideraram provados os seguintes factos:

1. A A., no ano de 1985, conheceu um indivíduo do sexo masculino de nome DD.

2. Em 1985, DD, a A. e o filho menor desta, com 5 anos de idade de nome EE, passaram a viver juntos na casa de habitação do primeiro, sita na Rua ..., ..., ....

3. O referido prédio urbano, de acordo com a caderneta predial, é composto de r/c, com dois arrumos e cozinha rural e 1º andar com sala, 4 quartos, cozinha e banho exterior, não se encontra descrito na competente conservatória do registo predial da ... e encontra-se inscrito na matriz predial urbana sob o art. 1475º, em nome de cada uma da s requeridas, na proporção de 1/6 cada uma, e de DD, enquanto cabeça de casal de herança, na proporção de 2/3.

4. Desde a data acima referida e com a mudança da A. e do seu filho menor para a habitação daquele DD, sempre se trataram como marido e mulher.

5. A A. e DD dormiam na mesma cama e faziam carícias um ao outro mesmo em público.

6. A A. e DD passeavam juntos.

7. A A. e DD tomavam refeições juntos.

8. A A. e DD festejavam aniversários e faziam almoços em família.

9. A A. e DD iam juntos a eventos sociais tais como baptizados e casamentos.

10. Desde 2020 e até finais de 2022, DD ficou acamado no rés do chão do mencionado prédio, sendo alimentado e higienizado pela A..

11. Em 2020, a A. e o referido DD passaram a residir no rés do chão do referido prédio.

12. Pelo menos meses antes de Dezembro de 2022, o primeiro andar do referido prédio, que dispõe de acesso de escadas a partir do exterior, entrou em obras, por iniciativa das RR., porque não dispunha de condições de habitabilidade, fruto da sua degradação, com a finalidade de vir a ser arrendado.

13. Em ... de Novembro de 2022, o referido DD foi internado no Hospital Distrital ....

14. O referido DD faleceu em ... de Dezembro de 2022.

15. DD deixou como suas únicas e universais herdeiras, suas filhas, as aqui RR. AA e BB.

16. A A. não deixa as requeridas entrar no referido prédio para levar os bens do falecido pai.

17. O Ilustre Mandatário das requeridas remeteu à requerente uma carta, com data de 06.02.2023, fixando-lhe um prazo para abandonar a casa onde residiu com o falecido DD, sob pena de lhe cortar a luz e a água.

18. Encontra-se pendente inquérito criminal fundado em queixa apresentada pela aqui requerente contra as requeridas, sob o nº 58/23.4...

19. Em sede de esclarecimentos solicitados pelo tribunal, a E Redes escreveu:

Cumpre esclarecer que o local de consumo .....09, CPE PT..............98GB (Habitação), corresponde à instalação sita na RUA ..., ...

Para este local de consumo vigoram os seguintes contratos de fornecimento de energia elétrica:

• No período de 19.08.2017 a 06.02.2023, vigorou um contrato de fornecimento de energia elétrica, titulado por DD, com o NIF .......08, contrato esse celebrado com o Comercializador EDP Comercial;

• No período de 07.02.2023 a 08.03.2023, vigorou um contrato de fornecimento de energia elétrica, titulado por CC, com o NIF .......75, contrato esse celebrado com o Comercializador EDP Comercial;

• No período 09.03.2023 até ao presente, vigorou um contrato de fornecimento de energia elétrica, titulado por AA, com o NIF .......74, contrato esse celebrado com o Comercializador EDP Comercial.

Respondendo às questões:

No período da vigência do contrato (09.03.2023 até ao presente) titulado pela Sra. AA, e para este local de consumo, existem as seguintes visitas técnicas ao local, todas a pedido do comercializador EDP Comercial:

• No dia 13.03.2023, o Comercializador EDP Comercial, submeteu um pedido de desligação para o local de consumo em questão - CPE PT..............98GB;

• No dia 15.03.2023, em deslocação técnica ao local, os técnicos não efetuaram a desligação de energia elétrica, conforme solicitado pelo comercializador, pelo facto de não terem deixado efetuar a desligação, exibindo o contrato novo;

• Entretanto, no dia 15.03.2023, o comercializador EDP Comercial, submeteu um processo de anulação do pedido de desligação, anteriormente enviado, mantendo-se assim o contrato em vigor;

• Posteriormente, a 08.05.2023, consta um processo de interrupção de fornecimento de energia elétrica, submetido pelo comercializador EDP Comercial;

• No dia 23.05.2023 foi efetuada a interrupção de fornecimento de energia elétrica, conforme solicitação do comercializador EDP Comercial;

• A instalação encontra-se com o fornecimento de energia elétrica interrompido desde 23.05.2023. Não se verifica qualquer contacto ou solicitação, efetuada pela Sras. AA, BB ou FF, para com a E-REDES, por causa do imóvel sito na Rua ..., .... ....”

20. Encontra-se pendente no Juízo Cível da ..., desde 22.02.2023, sob o n.º 311/23.7..., acção de condenação intentada pelas RR. contra a A., tudo nos presentes autos, pedindo:

- sejam declaradas as AA. como donas e legítimas proprietárias do prédio urbano sito na Conservatória do Registo Predial da ... com o n.º .69 e inscrita na matriz predial sob o art. ..75;

- seja condenada a R. a reconhecer o direito de propriedade das AA. e restituir de imediato a estas o dito prédio livre de quaisquer encargos e devoluto de pessoas;

- seja a R. condenada a pagar às AA. a quantia mensal de €500,00 desde 01.02.2023 até ao trânsito em julgado da decisão, acrescida de juros à taxa legal, em virtude da ocupação ilícita do imóvel e impossibilidade de proceder à sua venda.

Factos não provados:

A. A requerente conheceu DD precisamente a ... de ... de 1985.

B. DD foi apresentado à requerente em casa de uma prima deste de nome GG, tendo de imediato ambos iniciado uma relação amorosa com a consequente mudança da requerente CC e do seu filho menor com 5 anos de idade de nome EE para a habitação, propriedade daquele DD, sita na acima referida Rua ..., ..., ....

C. Em 1985, DD era viúvo há cerca de 9 meses.

D. A requerente e DD apoiavam-se mutuamente em todos os actos conjugais.

E. Após tal data as requeridas tentaram proibir o contacto com a requerente com aquele DD, tendo inclusivamente insultado e ameaçado esta na casa de morada de família.

F. Logo após o óbito daquele DD e logo após também a requerente ter intentado acção principal a que este procedimento segue por apenso, as requeridas têm vindo a pressionar e ameaçar a requerente no sentido de abandonar de imediato a casa morada de família onde aquela residiu durante 37 anos e 11 meses com o falecido pai destas.

G. Pela requerente foi oportunamente transmitido às requeridas que tem o direito real de habitação conferido pelo art.5º nº2 da lei nº 7/2001 de 11 de Maio, ou seja, o direito a usufruir da casa morada de família e do respectivo recheio por tempo igual ao da duração da união – 37 anos e 11 meses.

H. As requeridas tudo têm feito para impedir a requerente de usufruir na sua plenitude de um direito que lhe assiste, vedando-lhe o acesso a várias divisões, deixando-lhe “recados” escritos e colados nas portas da habitação, partem-lhe vários vasos com flores, entram e saem quando querem.

I. No passado dia ... de ... de 2023, as requeridas com manifesta e requintada má-fé e bem sabendo que não o podiam fazer decidiram cortar a luz no imóvel, objecto dos presentes autos, onde a requerente reside.

J. A requerente deslocou-se à EDP por forma a repor o contrato que se encontrava em seu nome, mas por esta instituição foi dito que nada podem decidir até existir sentença judicial transitada em julgado que determine que a mesma tem legitimidade para habitar naquele imóvel.

K. A requerente não tem quaisquer imóveis, sua propriedade, nem tem capacidade para providenciar outra habitação, não aufere qualquer tipo de reforma em virtude de ter dedicado a sua vida ao falecido DD, estando assim preenchida a sua situação de necessidade como membro sobrevivo da união de facto.

L. As requeridas com esta atitude as requeridas estão a causar lesão grave e dificilmente reparável ao direito real de habitação e recheio do referido imóvel da casa morada de família da requerente.

M. Não é a requerente que paga a luz e a água do referido prédio.

N. As requeridas foram alertadas pela polícia de que poderia haver problemas com a electricidade, porque os fios estavam em pré-contacto com a água.

O. Por isso, as requeridas levaram técnico da EDP ao local.

P. A requerente não deixou entrar o técnico da EDP.

Q. As requeridas participaram a situação às autoridades.

R. A A. não tem quaisquer imóveis, sua propriedade, nem tem capacidade para providenciar outra habitação, não aufere qualquer tipo de reforma em virtude de ter dedicado a sua vida ao falecido DD.


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II – Fundamentação

1. Omissão de pronúncia/excesso de pronúncia

As recorrentes nas 1.º e 2.º conclusões indicam que a sentença proferida não atendeu as questões suscitadas pelas recorrentes, alias foi além do já decidido.

Na motivação, sobre estas questões indica que:

«A douta decisão proferida, na ânsia de chegar a um determinado resultado que intuitivamente se lhe deve ter afigurado como criterioso, incorreu em vícios e incongruências de todo o tipo que terão razoavelmente que justificar ou a respectiva nulidade (por ter conhecido de factos que não foram articulados e não eram do conhecimento oficioso) ou - caso assim se não entenda - a revogação por decisão superior, tamanhas são as incongruências lógico-discursivas em que se enredou e que, manifestamente, consubstanciam uma errónea aplicação do Direito aos factos que foram considerados como provados.».

Em seguida, explicam que irão do fim para o princípio e indicam que o Tribunal não apreciou bem a prova porque, ao que se consegue perceber, do discurso nem sempre coerente ou, pelo menos completo e claro das alegações, a A. trataria o pai das recorrentes por senhor e, por isso, não viveria com ele em união de facto.

Mas, em momento algum das alegações faz uma concreta referência a quais as questões, referidas pelas recorrentes, que o Tribunal recorrido deixou de pronunciar, nem em que se materializa o invocado excesso de pronúncia.

Sendo impossível analisar as ditas questões, por ignorância completa de qual elas sejam, apenas podemos concluir pela improcedência do recurso, com este fundamento.

2. Direito de uso e habitação da totalidade do imóvel

Percebe-se claramente que as recorrentes aceitam, ainda que descontentes, que a autora possa continuar a viver no rés-do-chão do imóvel, mas referem que o acórdão recorrido, sem fundamento estendeu esse direito ao 1.º andar do imóvel.

A este propósito, o acórdão recorrido argumentou que:

«4. No caso, verifica-se que a casa de habitação abrangia os dois andares do prédio. Apenas em 2020 (e até finais de 2022), tendo DD ficado acamado no rés do chão do prédio, a A. e o referido DD passaram a residir no rés do chão do prédio. É notória a ligação entre os factos: acamado DD, passaram a A. e este a residir no rés do chão. No entanto, não fica claro um corte com o primeiro andar, não só por tal não estar demonstrado (inexistem factos que revelem que deixaram de usar o 1º andar), como por, de um lado, se denotar que a modificação se deu em virtude da situação de DD e, de outro lado, se verificar que essa ocupação do rés do chão teve que envolver limitações (e previsivelmente continuar a promover o uso do 1º andar) pois aquele rés do chão era composto, face aos factos provados, apenas por dois arrumos e uma cozinha rústica (enquanto o 1º andar dispunha de sala, quatro quartos, cozinha e banho exterior).

Acresce que o corte com o 1º andar ocorre, de acordo com os factos provados, não por acto da A. ou de DD, mas das RR., que iniciaram naquele 1º andar obras – e momento que tende a aproximar-se ao momento do internamento de DD (factos 12 e 13).

Neste quadro, deve aceitar-se que a descrita ocupação do rés do chão se deve a evento acidental (a situação de DD) e teria carácter não esgotante e não restritivo do âmbito da casa de família, tal como antes existia. A exclusão do 1º andar da casa de morada de família dá-se com facto de terceiro, que é aparentemente imposto à A., e contra o qual esta reage com esta acção.

Quanto à circunstância de se dar como provado que o 1º andar não dispunha de condições de habitabilidade, traduz uma valoração de facto que não se mostra impeditiva pois, de um lado, não estão concretizadas as condições de habitabilidade em falta (o que retira valor operativo à afirmação) e, de outro lado, o juízo sobre a operacionalidade (habitabilidade e utilizabilidade) do primeiro andar cabe antes de mais. à A., sem prejudicar a sua afectação à casa de morada de família (não deixa de fazer parte desta por estar em más condições).

A invocação do regime do art. 5º n.º5 da Lei 7/2001 não releva pois respeita à caducidade do direito, por não uso, não regulando eventual restrição do uso por parte do titular do direito (o uso parcial), a que a lei não atribui efeitos extintivos (sendo que cabe ao titular do direito definir a forma como usa a coisa). A extrapolação legal é, ao que se julga, injustificada.

Justifica-se, pois, reconhecer o direito de habitação sobre todo o prédio (rés do chão e primeiro andar), valendo o mesmo para o direito de uso (que deverá abranger o conteúdo, a existir, do primeiro andar).».

A decisão recorrida procede a uma correcta aplicação da lei aos factos provados, sendo certo que as recorrentes não indicam nem qual o facto provado que permitiria a adopção de decisão diversa, nem qual o meio de prova eventualmente preterido na fixação do probatório que pudesse ter tido a mesma consequência. Não basta a indicação de que sendo filhas do falecido companheiro da autora e sua herdeiras legitimárias têm o direito de suceder nos bens do falecido, porque não está em discussão nestes autos o direito de propriedade sobre o imóvel, que pertence às rés, mas o direito real de uso e habitação constituído a favor da autora, que o condicionam nos termos da legislação relativa às medidas de protecção das uniões de facto.

Improcede, pois, a revista, com este fundamento.

3. Extensão temporal do direito de uso e habitação

Insurgem-se, ainda as recorrentes contra a extensão temporal do direito de uso e habitação reconhecido pelo Tribunal recorrido, porque as recorrentes terão de esperar todo esse tempo para poderem ingressar na propriedade plena do imóvel, momento em que serão já muito idosas, se vivas forem.

A extensão temporal deste direito, posto que provada a união de facto, como aqui ocorre, está estabelecida por lei, art.º 5.º da lei 7/2001 de 11 de Maio, não dispondo o julgador de qualquer margem de discricionariedade para a determinar.

De acordo com o probatório, a união de facto começou em 1985 – ponto 2 - e terminou com o falecimento do DD ocorrido no dia .../.../2022 - ponto 14 -, a significar que teve a duração de 37 anos. Como a união de facto terminou em 2022, o direito de uso e habitação prolongar-se-á por 37 anos, isto é até 2059, por aplicação do n.º 2 daquele art.º 5.º, não podendo o julgador fazer qualquer ponderação tendente a limitar este direito, seja com que fundamento for, e, também, a idade que então terão as proprietárias.

Quem paga as despesas de água e electricidade, como já mencionado no acórdão recorrido não pode ser objecto do recurso porque não foi alvo de decisão pelo tribunal de 1.ª instância, apresentando-se, pois, como questão nova nos autos para conhecimento da qual não é vocacionado o recurso.

Improcede a revista, também com este fundamento.


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III – Deliberação

Pelo exposto, acorda-se em negar a revista e confirmar o acórdão recorrido.

Custas pelas recorrentes.


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Lisboa, 17 de Outubro de 2024

Ana Paula Lobo (relatora)

Orlando dos Santos Nascimento

Maria da Graça Trigo