NOTA JUSTIFICATIVA DE CUSTAS DE PARTE
EXECUÇÃO POR CUSTAS DE PARTE
NULIDADE POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA
Sumário

I - As questões relativas à tempestividade, regularidade e conteúdo da nota justificativa têm que ser suscitadas pelo devedor de custas de parte na ação declarativa em que foi proferida a decisão tributária e em que foi emitida a referida nota.
II - A sentença é nula, além do mais, sempre que o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
III - As questões a decidir reconduzem-se aos concretos problemas jurídicos que o tribunal tem que necessariamente solver em função da causa de pedir e do pedido formulado, das exceções e contra-exceções invocadas, enquanto os argumentos são as razões ou fundamentos aduzidos para sustentar uma certa resposta a uma questão jurídica.

Texto Integral

Processo nº 20425/23.2T8PRT-A.P1

Sumário do acórdão proferido no processo nº 20425/23.2T8PRT-A.P1 elaborado pelo relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil:

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Acordam os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:

1. Relatório

Em 16 de novembro de 2023, com referência ao processo nº 259/22.2T8STS-F, do Juízo de Comércio de Santo Tirso, Juiz 2, AA instaurou ação executiva sob forma sumária para pagamento de quantia certa contra BB, a fim de lhe ser pago o montante de € 1.122,00, acrescido de juros de mora contados à taxa de 4% ao ano, sobre aquele montante, no período compreendido entre 07 de janeiro de 2022 e 24 de outubro de 2023, alegando para o efeito o seguinte:

1.º A executada intentou contra a exequente a Ação n.º Processo: 5571/16.7T8MAI do Juízo Local Cível da Maia - Juiz 2., entretanto distribuída ao processo 259/22.2T8STS-F do Juízo de Comércio - J2 de Santo Tirso

2.º Por sentença de 22-11-2022, transitada em julgado em 15-11-2022, foi decidido (DOC.1):

- Absolver as R. AA, dos pedidos contra si dirigidos;

- Julgar-se improcedente o pedido formulado pela autora de condenação da AA como litigantes de má-fé, dele a absolvendo.

- Custas da acção pela autora e pela ré CC na proporção de 50% para cada uma, nos termos do artigo 527º do Cód. de Processo Civil.

3.º Nesta conformidade, por requerimento de 7-1-2022, com a refe.ª REFª: 40924377, a exequente remeteu a juízo a respetiva nota justificativa de custas de parte nos termo dos arts. 25.º e 26.º do RCP, no valor de 1.122,00€, da responsabilidade da executada. (DOC.2)

4.º E cujo pagamento deveria ser realizado no prazo de 10 dias.

5.º A referida nota justificativa foi notificada à mandatária da ali A. através de notificação eletrónica elaborada e 7-1-2022.

6.º E remetida à parte em 27-3-2023 através de carta registada. (DOC.3)

7.º A executada não reclamou da referida nota de custas de parte[[1]], não tendo contudo procedido ao pagamento das custas de parte em divida.

8.º Tal como se decidiu no AC. TRC, Proc.4749/20.3T8FNC-A.L1-2 de 7-7-2022, disponível em www.dgsi.pt I– O título executivo na execução por custas de parte é composto, em conjunto, pela sentença condenatória nas custas stricto sensu e pela nota discriminativa e justificativa das custas de parte devidamente consolidada, a qual deve ser elaborada e comunicada nos termos previstos no Regulamento das Custas Processuais.

II– A consolidação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte, em termos de relevar para o completamento do título executivo envolvente, depende de a parte devedora aceitar os seus termos, não reclamando, findo o prazo legalmente fixado para o efeito.

III– A apresentação da nota discriminativa e justificativa a que alude o artigo 25º, do RCP após a prolação da decisão, mas antes do seu trânsito, tem-se por tempestiva.

9.º E como se decidiu no AC. TRC, Proc 2083/14.0T8CBR.C3, de 8-3-2022, disponivel em www.dgsi.pt "A nota de custas de parte não tem que ser directamente notificada à parte que tenha constituído mandatário judicial, sendo suficiente a notificação deste.

Por força de despacho proferido em 27 de novembro de 2023, observou-se o disposto no nº 2 do artigo 85º do Código de Processo Civil, remetendo certidão para os Juízos de Execução do Porto.

Por despacho proferido em 29 de novembro de 2023, por alegado lapso no despacho anteriormente proferido na identificação do Juízo de Execução para onde devia ser remetida a certidão, ordenou-se a remessa do expediente para o Juízo de Execução da Maia, vindo os autos a ser aí distribuídos sob o nº 20425/23.2T8PRT.

Penhorado em 15 de dezembro de 2023 o saldo bancário em conta da executada no Banco 1..., S.A. no montante de € 1.950,00, foi esta citada[2] mediante expediente elaborado na mesma data nos seguintes termos:

FUNDAMENTO DA CITAÇÃO

Nos termos do disposto nos artigos 856º do Código Processo Civil (CPC), fica pela presente citado para os termos do presente processo executivo, tendo o prazo de 20 (vinte dias) para:

a. Pagar a quantia em dívida, juros e custas; ou querendo,

b. Deduzir oposição à execução através de embargos de executado; e/ou

c. Deduzir oposição à penhora;

Sem prejuízo do atrás referido e nos termos do nº 3 do artigo 753º do CPC fica também notificado que, no prazo da oposição e sob pena de ser condenado como litigante de má-fé, deve indicar os direitos, ónus e encargos não registáveis que recaiam sobre os bens penhorados, bem como os respetivos titulares ou beneficiários; e que pode requerer a substituição dos bens penhorados ou a substituição da penhora por caução, nas condições e nos termos do disposto na alínea a) do n.º 4 e no n.º 5 do artigo 751º do CPC.

COMINAÇÕES

Não sendo feito o pagamento e não havendo causa que determine a suspensão da execução, serão vendidos ou adjudicados os bens penhorados, para pagamento da quantia peticionada e eventuais créditos que possam ser reclamados.

MEIOS DE OPOSIÇÃO / EMBARGOS

1. Nos termos do disposto no artigo 58º do CPC, para deduzir oposição/embargos, é obrigatória a constituição de Advogado quando o valor da execução seja superior à alçada do tribunal de primeira instância (5.000,00 euros).

2. A oposição/embargos é apresentada diretamente ao tribunal e implica o pagamento de taxa de justiça, salvo se tiver requerido apoio judiciário, sendo neste caso necessário juntar aos presentes autos, no prazo para se opor (através de embargos de executado), documento comprovativo da apresentação do referido documento, para que o prazo em curso se interrompa até notificação do apoio judiciário.

3. O recebimento dos embargos só suspende o prosseguimento da execução (artigo 733º do CPC) se:

a. O embargante prestar caução;

b. Tratando-se de execução fundada em documento particular, o embargante tiver impugnado a genuinidade da respetiva assinatura, apresentando documento que constitua princípio de prova, e o juiz entender, ouvido o embargado, que se justifica a suspensão sem prestação de caução;

c. Tiver sido impugnada, no âmbito da oposição deduzida, a exigibilidade ou a liquidação da obrigação exequenda e o juiz considerar, ouvido o embargado, que se justifica a suspensão sem prestação de caução.

CASO PRETENDA PAGAR

O valor em dívida (incluindo a quantia peticionada, juros e custas) é provisoriamente fixado em 1.950,00 Euros já aqui estando incluídos os honorários e despesas previsíveis com o agente de execução.

Poderá, a qualquer momento, saber qual o valor atualizado da dívida e o valor devido a título de honorários e despesas, solicitando-o diretamente ao agente de execução.

Para efetuar o pagamento do valor em dívida utilize as referências indicadas no quadro "pagamentos".

PRAZOS E DILAÇÕES

1 - A citação/notificação por via postal considera-se feita no dia em que se mostre assinado o aviso de receção (nº 1 do artigo 230º do CPC) ou entregue a nota de citação, e tem-se por efetuada na própria pessoa do citando mesmo quando entregue a terceira pessoa.

2 - A citação/notificação por contato pessoal considera-se feita na data da entrega da nota de citação (ou da sua afixação) tem-se por efetuada na própria pessoa do citando mesmo quando entregue a terceira pessoa.

3 - Quando a citação/notificação seja realizada nos termos do nº 5 do artigo 229º do CPC a citação considera-se efetuada na data certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado o aviso, no 8.º dia posterior a essa data, presumindo-se que o destinatário teve oportuno conhecimento dos elementos que lhe foram deixados.

4 - Nos termos do disposto no artigo 245º do CPC, ao prazo de defesa acresce uma dilação de 5 (cinco) dias quando tenha sido realizada em pessoa diversa do seu destinatário (alínea b) do nº 2 do artigo 228º do CPC) ou tenha sido realizada por afixação (nos termos do nº 4 do artigo 232º do CPC).

5 - Ao prazo poderá ainda acrescer uma das seguintes dilações: a) 5 dias - quando destinatário resida fora da área da comarca sede do tribunal onde pende a ação (nº 1 do artigo 245º do CPC); b) 15 dias - quando o destinatário resida no território das Regiões Autónomas, correndo a ação no continente ou em outra ilha, ou vice-versa (nº2 do artigo 245º do CPC); c) 30 dias - quando o destinatário resida no estrangeiro; tenha sido citado por via edital; ou tenha sido concretizada por carta em depósito (nº3 do artigo 245º do CPC); quando o destinatário seja pessoa coletiva obrigatoriamente constante do Registo Nacional de Pessoas Coletivas (artigo 246º do CPC).

6 - A citação/notificação pode ainda ser praticada nos 3 dias úteis subsequentes ao término do prazo mediante o pagamento de multa nos termos do artigo 139º nº5 do CPC.

7 - O prazo processual, estabelecido por lei ou fixado por despacho do juiz, é contínuo, suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais (que decorrem de 22 de Dezembro a 3 de Janeiro, do domingo de Ramos à segunda-feira de Páscoa e de 16 de Julho a 31 de Agosto) salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de atos a praticar em processos que a lei considere urgentes.

8 - Quando o prazo para a prática do ato processual terminar em dia em que os tribunais estiverem encerrados, transfere-se o seu termo para o primeiro dia útil seguinte.

9 - Os tribunais consideram-se encerrados quando for concedida tolerância de ponto (Conferir artigos 137º e 138º do CPC) o artigo 28º da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto.

Em 23 de janeiro de 2024, por apenso à ação executiva sob forma sumária nº 20425/23.2T8PRT, BB deduziu oposição à referida execução, alegando, em síntese, a inexistência de título executivo, nos termos do artigo 25º do Regulamento das Custas Processuais, a caducidade do direito, o caso julgado, abuso do direito na modalidade de venire contra factum proprium, e, assim não se entendendo, pugnando pelo cumprimento do disposto no nº 2 do artigo 32º da Portaria nº 419-A/2009 de 17 de abril, limitando-se em consequência a compensação a título de honorários ao mandatário da exequente ao montante de € 156,19, não sendo devido o valor peticionado a título de perícia, por ter sido liquidado pelo IGP, só sendo devidos juros volvidos dez dias sobre a interpelação para pagamento a realizar após o trânsito em julgado da decisão exequenda, ou, no mínimo, com a prolação da decisão final concluindo pela extinção da ação executiva.

Em 30 de janeiro de 2024, no apenso de embargos de executado, foi proferida a seguinte decisão[3]:

Por apenso aos autos de execução de sentença para pagamento de quantia certa que a exequente AA intentou contra o executada BB veio esta deduzir os presentes embargos de executado, requerendo que os mesmos sejam julgados procedentes.

Como fundamento dos embargos o executado alegou que:

- inexiste o titulo uma vez que a exequente não juntou aos autos declarativos no prazo legal a nota discriminativa de custas de parte;

- a caducidade do direito uma vez que o direito não foi exercício no prazo legal;

- caso julgado;

- abuso de direito;

Cumpre, pois, apreciar se os presentes embargos e oposição à penhora têm fundamento e podem ser recebidos.

Dispõe o artigo 732º, nº1 do CPC: “Os embargos, que devem ser autuados por apenso, são liminarmente indeferidos quando:

a) Tiverem sido deduzidos fora do prazo;

b) O fundamento não se ajustar ao disposto nos artigos 729º a 731º;

c) Forem manifestamente improcedentes.”

Prevê o artigo 729º do CPC que a oposição só pode ter algum dos fundamentos seguintes:

a) Inexistência ou inexequibilidade do título;

b) Falsidade do processo ou do traslado ou infidelidade deste, quando uma ou outra influa nos termos da execução;

c) Falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da instância executiva, sem prejuízo do seu suprimento;

d) Falta ou nulidade da notificação para o procedimento de injunção quando o requerido não tenha intervindo no processo;

e) Incerteza, inexigibilidade ou iliquidez da obrigação exequenda, não supridas na fase introdutória da execução;

f) Caso julgado anterior ao requerimento de injunção que se executa;

g) Qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao prazo para oposição no procedimento de injunção e se prove por documento; a prescrição do direito ou da obrigação pode ser provada por qualquer meio;

h) Contracrédito sobre o exequente, com vista a obter a compensação de créditos.

i) Tratando-se de sentença homologatória de confissão ou transação, qualquer causa de nulidade ou anulabilidade desses atos.

No caso dos autos vem invocada a inexistência de título e de interpelação eficaz.

Nos termos do artigo 10º, nº5 do CPC toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva.

Por seu turno, prevê o artigo 703º, nº1, alínea a) do CPC que são títulos executivos as sentenças condenatórias. Há, ainda, a considerar que, de acordo com o artigo 26º, nº1 do RCP, as custas de parte integram-se no âmbito da condenação judicial por custas. E por força do artigo 533º, nº3 do CPC, as custas de parte são objecto de nota discriminativa.

Ora, da conjugação de tais disposições legais é forçoso concluir que o título executivo é constituído pela sentença na qual foi proferida a decisão e condenação dos executados em custas conjugada com a nota discriminativa de custas de parte apresentada pela embargada no processo declarativo, de onde consta o valor devido pela embargante.

Assim, o título executivo, no caso, é compósito, envolvendo a sentença definitiva condenatória no pagamento das custas stricto sensu e a nota discriminativa e justificativa das custas de parte depois de consolidada, sendo que esta consolidação se verifica com a sua remessa pela parte vencedora à parte vencida.

Tanto basta para que exista título executivo em relação a tal quantia.

As questões levantadas quanto à tempestividade da apresentação da nota discriminativa teriam que ser suscitadas pela embargante na acção declarativa, não cabendo nesta fase apreciar tais questões. Efectivamente, como se refere no Acórdão da Relação de Coimbra de 1.06.2021 disponível in www.dgsi.pt “Os embargos de executado não se destinam a reapreciar o procedimento e o conteúdo das notas discriminativas e justificativas das custas de parte, se não

apresentada atempadamente reclamação junto da parte contrária e/ou do tribunal. Questionando-se, inclusive, a falta de notificação regular da nota discriminativa e a quantia efectivamente despendida pela embaragada/exequente estas matérias deveriam ter sido alegadas no prazo concedido à parte vencida para reclamar da nota discriminativa e justificativa das custas de parte, não podendo os embargados fazer uso da oposição à execução mediante embargos de executado para que haja uma reapreciação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte quanto a tais matérias ou quaisquer outras não oportunamente suscitadas referentes à forma/procedimento e ao seu conteúdo.”

Nas descritas circunstâncias, promovida a execução, a executada estava inibida de opor à exequente aquilo que já opusera ou poderia ter oposto no processo declarativo que a precedeu.

Pelo exposto e nos termos do artigo 732º, nº1, alínea c) do CPC, indeferem-se liminarmente os embargos deduzidos.

Custas pela embargante.

Valor: € 1950,00.

Registe e notifique.

Em 20 de fevereiro de 2024, inconformada com a decisão que precede, BB interpôs recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

1. É o presente Recurso interposto do despacho que indeferiu liminarmente os embargos por manifestamente improcedentes.

2. No despacho recorrido consta que “Como fundamento dos embargos o executado alegou que: - inexiste o titulo uma vez que a exequente não juntou aos autos declarativos no prazo legal a nota discriminativa de custas de parte; - a caducidade do direito uma vez que o direito não foi exercício no prazo legal; - caso julgado; - abuso de direito;”

3. Considera ainda o tribunal a quo que “ Assim, o título executivo, no caso, é compósito, envolvendo a sentença definitiva condenatória no pagamento das custas stricto sensu e a nota discriminativa e justificativa das custas de parte depois de consolidada, sendo que esta consolidação se verifica com a sua remessa pela parte vencedora à parte vencida. Tanto basta para que exista título executivo em relação a tal quantia.”

4. E que “Nas descritas circunstâncias, promovida a execução, a executada estava inibida de opor à exequente aquilo que já opusera ou poderia ter oposto no processo declarativo que a precedeu. Pelo exposto e nos termos do artigo 732º, nº1, alínea c) do CPC, indefere-se liminarmente os embargos deduzidos.”

5. Da fundamentação parece resultar que basta a remessa da nota à parte vencida, sem qualquer necessidade de comunicar ao tribunal, contudo se não for obrigatário comunicar ao tribunal, após o trânsito em julgado, não pode a parte contrária exercer o seu direito ao contraditório, exceto por via dos embargos de executado, assim sendo é evidente a contradição do despacho.

6. Sem prescindir do exposto, acresce ainda que a recorrente alegou, nos artigo 7 e 8 dos embargos, que a exequente não juntou ao processo qualquer comunicação efetuada no prazo de 10 após o dia 17.11.2022, Nem tão-pouco no prazo de 10 dias após a decisão final (28.10.2022).

7. Assim sendo a recorrente não podia reclamar de uma nota que o tribunal desconhecia….

8. Só pode ser atribuído valor à nota apresentada nos termos previstos do Regulamento das Custas processuais.

9. A jurisprudência considera que “O título executivo na execução por custas de parte é composto, em conjunto, pela sentença condenatória nas custas stricto sensu e pela nota discriminativa e justificativa das custas de parte devidamente consolidada, a qual deve ser elaborada e comunicada nos termos previstos no Regulamento das Custas Processuais.” O requerimento datado de janeiro de 2022, 10 meses anterior à prolação da decisão final não tem qualquer valor processual e a comunicação de final de Março de 2023, apenas a parte vencida, 4 meses após a trânsito em julgado não cumpre os requisitos do artigo 25 RCP.

10. Ora conforme tem sido considerado “nos termos do artº 732º, nº 1, alª c) do CPC os embargos só podem ser julgados manifestamente improcedentes se a situação objetivamente afasta de imediato a existência de mais que uma solução plausível de direito nomeadamente segundo as diversas conceções e sensibilidades jurisprudenciais ou doutrinárias.” – AC tribunal da Relação de Coimbra de 04 Junho 2020 e “os embargos de executado são manifestamente improcedentes quando a pretensão de executado/embargante, seja por razões de facto, seja por motivos de direito, está irremediável e indiscutivelmente condenada ao insucesso” o que claramente não sucede nos presentes autos.

11. Mesmo que único fundamento fosse a inexistência ou inexequibilidade de titulo executivo, o que não sucede nos presentes autos, e que fosse considerado que se está diante de uma execução de sentença, a jurisprudência não tem sido unanime relativamente a esta matéria.

12. Há quem defenda que “O título executivo na execução por custas de parte é composto, em conjunto, pela sentença condenatória nas custas stricto sensu e pela nota discriminativa e justificativa das custas de parte devidamente consolidada, a qual deve ser elaborada e comunicada nos termos previstos no Regulamento das Custas Processuais. …..Na verdade, a nota discriminativa e justificativa das custas de parte elaborada depois de esgotado o prazo previsto no art. 25º nº 1 do R.C.P. não tem qualquer valor, …..” Acórdão do Tribunal da relação de Lisboa de 14-09-2023.

13. O Acórdão do Tribunal da Relação de Évora por sua vez salienta que “as partes que tenham

direito a custas de parte devem enviar para o tribunal e para a parte vencida a respetiva nota discriminativa e justificativa, nos termos e prazos previstos no artigo 25º do RCP.” Concluído que “O vencimento da obrigação depende da interpelação para pagamento concretizada através da expedição para a parte vencida da nota discriminativa e justificativa, só assim se criando título executivo, o que de outra forma, não se verifica.”.

14. No mesmo sentido consta do Manual “Custas Processuais” Centro de Estudos Judiciários, de 2021, “Acresce que o reembolso das custas de parte supõe o trânsito em julgado da decisão, só podendo ser pedido após este”.

15. Para apreciação do título executivo o tribunal tem de se pronunciar se documentos juntos cumprem o RCP, caso não cumprem não podem ter validade processual, a aqui recorrente não tinha nem podia exercer o seu direito de defensa se o pedido de custas de partes não seguiu a tramitação processual imposta.

16. A comunicação à recorrente ocorreu 4 meses após o trânsito em julgado e nessa data a exequente nada informou/comunicou ao tribunal.

17. Não se pode aceitar que o nosso ordenamento jurídico permita que a exequente, ao arrepio das normas processuais impostas, prejudique, impossibilite o direito de defesa da aqui recorrente.

18. O tribunal a quo tinha de ter em conta as circunstâncias particulares alegadas pela recorrente nos embargos.

19. Acresce ainda que foram vários os fundamentos para os embargos, nomeadamente foi invocado o DESPACHO DE 24.11.2023 proferido no âmbito do apenso F do processo n.º Proc. n.º 259/22.2T8STS (processo declarativo objeto do alegado nota de custas de parte), transitado em julgado

20. Após o trânsito em julgado da decisão datado de 24.11.2023, ou seja, em janeiro no presente

ano de 2024, foi emitida a nota de restituição à executada no valor de € 1.829,64 Cfr documento n.º 12 junto aos embargos

21. Face aos factos alegados e ao estabelecido no artigo 29 da Portaria n.º 419-A/2009, de 17.4

“- Nos casos em que haja lugar à devolução de valores pagos, esta é efetuada apenas após o trânsito em julgado e depois de saldadas todas as dívidas da parte ao processo, nomeadamente; ….c) Custas de parte.”, considera a recorrente que o tribunal a quo nunca poderia ter indeferido liminarmente os embargos.

22. Sem prescindir do supra exposto e mesmo que se considere que exista título executivo, e que se está diante de uma execução de sentença, a alínea g) do artigo 729º permite alegar “qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento; …..”

23. Ora o despacho em causa é de 24.11.2023. sendo posterior à discussão do processo.

24. A jurisprudência tem considerado que “Toda a decisão é a conclusão de certos pressupostos (de facto e de direito) de modo que o respectivo caso julgado se encontra referenciado a certos fundamentos: o caso julgado incide sobre a decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge esses fundamentos enquanto pressupostos daquela decisão.”

25. Assim sendo a decisão, transitada em julgado, que deferiu o pedido de restituição de valores à executada à ordem do processo n.º 259/22.2T8STS-F (processo objeto da alegada nora de custas de parte, face à sua remessa para outro tribunal) teve como pressuposto o facto de não haver valores por saldar nesse processo no âmbito de custas de partes.

26. A alínea g) do artigo 729º CCP encontra-se ainda preenchido com o fundamento de abuso de direito e à data de início da contagem dos juros.

27. Relativamente à contagem dos juros a recorrente alegou que “Os juros só pode começar a contar no prazo de 10 dias apos a interpelação para pagamento e essa interpelação tem de ocorrer após o trânsito, ou mínimo com a prolação da decisão final e nunca em data anterior, conforme é solicitado do requerimento executivo.”

28. Face ao exposto os embargos não podiam ter sido liminarmente indeferidos, não só porque foram deduzidos com diversos fundamentos, fundamentos esses que se enquadram no âmbito processual dessa peça processual, como a situação objetivamente relatada nos embargos não afasta de imediato a existência de mais que uma solução plausível de direito nomeadamente segundo as diversas conceções e sensibilidades jurisprudenciais ou doutrinárias.

29. Por tudo o exposto é evidente que os embargos não podem ser liminarmente indeferidos, face ao disposto o despacho viola os artigos 732º, 731º, 729º e n.º 2 do artigo 728º todos do CPC e o artigo 29 da Portaria n.º 419-A/2009, de 17.4”.

O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, ordenando-se a notificação da exequente para os efeitos dos artigos 641º, nº 1 e 569, nº 1, 2ª parte, ambos do Código de Processo Civil.

Não foram oferecidas contra-alegações.

Atenta a natureza estritamente jurídica do objeto do recurso, com o acordo dos restantes membros do coletivo dispensaram-se os vistos, cumprindo agora apreciar e decidir.

2. Questões a decidir tendo em conta o objeto do recurso delimitado pela recorrente nas conclusões das suas alegações (artigos 635º, nºs 3 e 4 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil), por ordem lógica e sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil

2.1 Da existência de outras soluções plausíveis para a questão da consequência jurídica da omissão de dedução de reclamação contra a nota justificativa;

2.2 Da omissão de pronúncia quanto à invocada violação do caso julgado, ao abuso do direito e ao termo inicial da contagem dos juros de mora[4].

3. Fundamentos de facto

Os factos necessários e suficientes para conhecimento do objeto do recurso constam do relatório desta decisão, resultam dos próprios autos que, nesta vertente estritamente adjetiva, têm força probatória plena.

4. Fundamentos de direito

4.1 Da existência de outras soluções plausíveis para a questão da consequência jurídica da omissão de dedução de reclamação contra a nota justificativa

A recorrente pugna pela revogação da decisão recorrida porque, na sua perspetiva, a solução nela adotada quanto à consequência jurídica da omissão de dedução de reclamação contra a nota justificativa é apenas uma das soluções plausíveis, exemplificando em abono da sua posição com o que se decidiu no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 14 de setembro de 2023, proferido no processo nº 20774/22.7T8LSB.L1-8, acessível na base de dados do IGFEJ.

Cumpre apreciar e decidir.

Nos termos do disposto no nº 1 do artigo 732º do Código de Processo Civil, “[o]s embargos, que devem ser autuados por apenso, são liminarmente indeferidos quando:
a) Tiverem sido deduzidos fora de prazo;
b) O fundamento não se ajusta ao disposto nos artigos 729º a 731º;
c) Forem manifestamente improcedentes.”

No caso dos autos, a decisão recorrida indeferiu liminarmente os embargos de executado porque entendeu que as questões relativas à tempestividade, regularidade e conteúdo da nota justificativa teriam que ser suscitadas pela ora recorrente na ação declarativa em que foi emitida a referida nota.

Existe jurisprudência consolidada no sentido da decisão recorrida[5] e na pesquisa jurisprudencial a que procedemos não se encontrou qualquer decisão contrária a essa orientação.

Esta orientação jurisprudencial é a única que se coaduna com a economia e a racionalidade na utilização dos meios processuais e com o princípio da preclusão, obstando à prática de atos inúteis no processo. De facto, se a lei adjetiva prevê a sujeição da nota justificativa a contraditório (artigo 33º, nº 1, da Portaria nº 419-A/2019 de 17 de abril) e se a parte visada por essa nota voluntariamente não impugnou essa nota, não pode por meio de embargos de executado “ressuscitar” todas as questões que podia e devia ter suscitado quando a nota justificativa lhe foi notificada.

A recorrente, como se destacou na primeira nota de rodapé deste acórdão, voluntariamente não se pronunciou sobre a nota de custas de parte que lhe foi remetida pela recorrida, diferindo a sua pronúncia para o trânsito em julgado da decisão referente à recorrida e, operado esse trânsito, nenhuma pronúncia emitiu relativamente à aludida nota justificativa.

Assim, a recorrente, só tem de queixar-se de si própria por não ter impugnado a nota justificativa, questionando a sua tempestividade, a irregularidade da notificação da mesma e alguns dos montantes nela insertos, como pretende fazer agora nestes embargos de executado.

Pelo exposto, à luz da única solução plausível para a questão da consequência jurídica da omissão de dedução de reclamação contra a nota justificativa, bem andou o tribunal recorrido em indeferir liminarmente os embargos de executado no que respeita este fundamento.

4.2 Da omissão de pronúncia quanto à invocada violação do caso julgado, ao abuso do direito e ao termo inicial da contagem dos juros de mora

A recorrente insurge-se contra a decisão recorrida por não se ter debruçado sobre as questões de caso julgado e de abuso do direito por si suscitadas na petição de embargos.

Para tanto, no que respeita ao caso julgado refere, em síntese, que na sequência do despacho de 24 de novembro de 2023[6], sem oposição da exequente, foi restituída à recorrente a importância de € 1 829,64[7], pelo que aceitou, concordou, confessou que nada lhe era devido a título de custas de parte[8].

Quanto ao abuso do direito, a recorrente alega na petição de embargos que a exequente não pode declarar uma coisa no processo nº 259/22.2T8STS-F e volvidos poucos dias dar entrada de uma ação executiva relativa à mesma matéria, com declaração diversa, que o valor depositado era mais do que suficiente para assegurar a denominada nota discriminativa e que a presente ação executiva só serviu para obrigar a executada a despender uma quantia do seu parco rendimento para o exercício da sua defesa.

Relativamente aos juros de mora, a recorrente alega que os juros só podem contar-se volvidos 10 dias após a interpelação para pagamento e que essa interpelação tem de ocorrer após o trânsito em julgado da decisão tributária, ou, no mínimo, com a prolação da decisão final.

Cumpre apreciar e decidir.

Nos termos do disposto no artigo 615º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil, a sentença é nula sempre que o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.

Estabelece-se nesta previsão legal a consequência jurídica pela infração do disposto no artigo 608º, primeira parte do nº 2, do Código de Processo Civil. No entanto, como ressalva a segunda parte do número que se acaba de citar, o dever de o juiz apenas conhecer das questões suscitadas pelas partes cede quando a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.

As questões a decidir são algo de diverso dos argumentos aduzidos pelas partes para sustentar as posições que vão assumindo ao longo do desenvolvimento da lide[9]. As questões a decidir reconduzem-se aos concretos problemas jurídicos que o tribunal tem que necessariamente solver em função da causa de pedir e do pedido formulado, das exceções e contra-exceções invocadas, enquanto os argumentos são as razões ou fundamentos aduzidos para sustentar uma certa resposta a uma questão jurídica.

Importa salientar que a vinculação do tribunal às concretas questões ou problemas suscitados pelas partes é compatível com a sua liberdade de qualificação jurídica (artigo 5º, nº 3, do Código de Processo Civil). Por isso, o tribunal pode, sem violação da sua vinculação à problemática invocada pelas partes, qualificar juridicamente de forma diferente essas questões.

A invocada violação de caso julgado e bem assim de abuso do direito, tal como a recorrente as delineou na petição de embargos nada têm a ver com o efeito preclusivo que deriva da não dedução de reclamação contra a nota justificativa, pois respeitam a um lapso temporal posterior à produção desse efeito preclusivo.

Por outro lado, a questão do termo inicial da contagem dos juros de mora respeita ao alcance do título exequendo e extravasa do teor da nota justificativa, pelo que também se trata de questão distinta da preclusão derivada da não reclamação contra a nota justificativa.

O tribunal recorrido fundamentou a sua decisão de indeferimento dos embargos exclusivamente sobre esse efeito preclusivo e nada disse sobre os invocados caso julgado, abuso do direito e termo inicial da contagem dos juros de mora.

Nesta medida, tratando-se de fundamentos autónomos da defesa deduzida pela ora recorrente na sua petição de embargos, afigura-se-nos que o tribunal a quo deveria ter conhecido de tais questões fundamentando especificamente a sua pronúncia relativamente a cada uma delas.

Por isso, conclui-se que ao proceder do modo descrito, a decisão recorrida enferma de nulidade por omissão de pronúncia, devendo esta instância substituir-se ao tribunal recorrido (artigo 665º, nº 1, do Código de Processo Civil), na medida em que o puder fazer atenta a fase processual em que os autos se encontram, sem que tenha sido ainda facultado o contraditório à parte contrária relativamente aos fundamentos dos embargos.

A recorrente assenta a invocação da violação de caso julgado no despacho de 24 de novembro de 2023 e na consequente restituição à recorrente do montante de € 1 829,62, sem qualquer oposição da exequente[10].

Ora, o aludido despacho não apreciou qualquer pretensão que dissesse respeito à recorrida e a restituição da quantia de € 1 829,62 é o remanescente do depósito que a recorrente teve de efetuar nos termos previstos no nº 2 do artigo 33º da Portaria nº 419-A/2019 de 17 de abril e decorre da parcial procedência da reclamação deduzida pela recorrente contra as notas justificativas oferecidas pela A..., S.A. e pelo Banco 2..., S.A.

A recorrida é de todo alheia à decisão proferida sobre a reclamação deduzida pela recorrente contra as notas justificativas daquelas sociedades comerciais.

Neste contexto, não foi proferida qualquer decisão judicial que tenha incidido sobre as custas de parte a que a recorrida tem direito e que pretende realizar coercivamente na ação executiva de que estes autos são um apenso, pelo que é manifesto inexistir qualquer caso julgado, como é invocado pela recorrente.

Deste modo, também quanto a este fundamento dos embargos, dada a sua ostensiva improcedência, devem rejeitar-se os embargos dada a sua manifesta improcedência.

Vejamos agora o abuso de direito invocado pela recorrente e que consistiria num venire contra factum proprium.

Na perspetiva da recorrente, tal resultaria de a exequente ter declarado uma coisa no processo nº 259/22.2T8STS-F e volvidos poucos dias dar entrada de uma ação executiva relativa à mesma matéria, com declaração diversa, de o valor depositado ser mais do que suficiente para assegurar a denominada nota discriminativa e ainda de a ação executiva só ter servido para obrigar a executada a despender uma quantia do seu parco rendimento para o exercício da sua defesa.

Na construção dogmática do venire contra factum proprium levada a cabo pelo Professor Baptista Machado[11] os pressupostos que desencadeiam o efeito jurídico próprio do instituto jurídico em apreço são:

a) uma situação objetiva de confiança, isto é, a confiança digna de tutela tem que assentar em algo de objetivo, numa conduta de alguém que de facto possa ser entendida como uma tomada de posição vinculante em relação a dada situação futura;

b) um investimento de confiança e a irreversibilidade desse investimento;

c) a boa-fé da contraparte que confiou, pelo que a confiança do terceiro ou da contraparte só merecerá proteção jurídica quando esteja de boa-fé (por desconhecer a divergência entre a aparência criada e a situação ou intenção reais) e tenha agido com cuidado e precauções usuais no tráfico jurídico.

Ora, no caso dos autos, aquilo que a recorrente denomina de “declaração” da recorrida é uma mera inércia face a notificações que lhe foram endereçadas e que não lhe diziam respeito pois respeitavam a um procedimento de reclamação contra as notas justificativas oferecidas por A..., S.A. e pelo Banco 2..., S.A..

Inexiste uma qualquer declaração da recorrida no sentido de não pretender haver custas de parte a cargo da recorrente e, pelo contrário, ofereceu nota justificativa que não foi objeto de qualquer reclamação por parte da recorrente.

A prerrogativa de a parte vencedora requerer que as custas de parte a que tenha direito sejam liquidadas através do remanescente a devolver à parte vencida (artigo 29º, nº 2, da Portaria nº 419-A/2009 de 17 de abril) é uma mera faculdade e não um ónus ou um dever jurídico que incida sobre a parte credora e do não exercício dessa faculdade não se pode extrair uma qualquer renúncia do credor de custas de parte a este crédito.

Não existe assim qualquer situação objetiva de confiança que possa ser entendida como uma tomada de posição vinculante em relação a dada situação futura, falecendo deste modo logo o primeiro pressuposto do abuso do direito na modalidade de venire contra factum proprium, e, consequentemente, fica necessariamente prejudicado o preenchimento dos restantes pressupostos desta modalidade de abuso do direito.

Conclui-se assim que também quanto ao alegado abuso do direito é manifesta a improcedência dos embargos, razão pela qual também no que respeita esta questão devem os embargos ser rejeitados liminarmente.

Vejamos agora a questão dos juros de mora.

Alega a recorrente na sua petição de embargos que os juros só podem ser contados 10 dias após a interpelação para pagamento, que essa interpelação tem de ocorrer após o trânsito, ou no mínimo, com a prolação da decisão final e nunca em data anterior, conforme é pedido no requerimento executivo.

No requerimento executivo a recorrida pede juros de mora contados sobre o montante de € 1 122,00, desde a data da nota justificativa, isto é, desde 07 de janeiro de 2022 até 24 de outubro de 2023, à taxa supletiva legal de 4% ao ano, juros que liquida no montante de € 84,66.

Cumpre apreciar e decidir.

A decisão judicial que deu origem à nota discriminativa e justificativa emitida pela recorrida transitou em julgado em data posterior ao da referida nota, já que esta foi alegadamente emitida em 07 de janeiro de 2022 e a decisão tributária só veio a transitar em julgado depois de 27 de outubro de 2023.

Parece evidente neste contexto que o termo inicial da contagem dos juros de mora não pode ser a data de emissão da nota discriminativa e justificativa pois que esta antecedeu em muito o trânsito em julgado da decisão tributária, tanto mais que em regra a apresentação da nota deve processar-se nos cinco dias subsequentes ao trânsito em julgado da decisão tributária (veja-se a primeira parte do nº 1 do artigo 25º do Regulamento das Custas Processuais)[12].

Está em causa matéria que o Juiz de Execução “pode”[13] conhecer ao abrigo do disposto no artigo 734º do Código de Processo Civil.

Este Tribunal da Relação tem os seus poderes de cognição restritos ao objeto do recurso, não tendo os poderes do Juiz da Execução.

Neste circunstancialismo adjetivo, embora esteja em causa uma questão simples de natureza estritamente jurídica que poderia ser expeditamente conhecida, o Tribunal da Relação apenas deve apreciar se relativamente a esta matéria estão reunidos os pressupostos do indeferimento liminar dos embargos de executado.

Ora, pelo que já antes se referiu, a questão do termo inicial da contagem dos juros de mora não pode considerar-se manifestamente improcedente, bem pelo contrário. Daí que relativamente a esta problemática, os embargos devem ser recebidos, a fim desta questão ser conhecida após o necessário contraditório.

Pelo exposto, o recurso procede parcialmente, confirmando-se o indeferimento liminar no que tange a questão da consequência jurídica da omissão de dedução de reclamação contra a nota justificativa, declarando-se a decisão sob censura nula por omissão de pronúncia sobre as questões de caso julgado, abuso do direito e termo inicial da contagem dos juros de mora e em substituição nos termos do disposto no nº 1 do artigo 665º do Código de Processo Civil, indeferem-se liminar e parcialmente os embargos de executado também no que respeita às questões de caso julgado e abuso do direito, prosseguindo os embargos apenas para conhecimento da questão do termo inicial da contagem dos juros de mora.

As custas do recurso são da exclusiva responsabilidade da recorrente pois não houve contra-alegações e é a recorrente que tira proveito do recurso (artigo 527º, nº 1 do Código de Processo Civil).

5. Dispositivo

Pelo exposto, os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto acordam em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto em 20 de fevereiro de 2024 por BB e, em consequência, confirma-se a decisão recorrida proferida em 30 de janeiro de 2024 no que tange a questão da consequência jurídica da omissão de dedução de reclamação contra a nota justificativa, declarando-se a decisão sob censura nula por omissão de pronúncia sobre as questões de caso julgado, abuso do direito e termo inicial da contagem dos juros de mora e, em substituição, nos termos do disposto no nº 1 do artigo 665º do Código de Processo Civil, indeferem-se liminar e parcialmente os embargos de executado no que respeita às questões de caso julgado e abuso do direito e recebem-se os embargos quanto à questão do termo inicial da contagem dos juros de mora, prosseguindo os embargos apenas para conhecimento desta questão, iniciando-se o prazo para a contestação dos embargos por parte da exequente com a notificação desta decisão em primeira instância (2ª parte do nº 1 do artigo 569º do Código de Processo Civil, por identidade de razão).

Custas a cargo da recorrente, sendo aplicável a secção B, da tabela I, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, à taxa de justiça do recurso.


***

O presente acórdão compõe-se de dezassete páginas e foi elaborado em processador de texto pelo primeiro signatário.


Porto, 21 de outubro de 2024
Carlos Gil
Ana Paula Amorim
Miguel Baldaia de Morais
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[1] O último documento que a ora recorrente ofereceu com a petição inicial de embargos tem a seguinte introdução: “BB, autora no processo em epígrafe referenciado, tendo sido notificada da nota de custas de parte pelas Rés A..., SA e Banco 2..., SA vem reclamar das notas apresentadas pela Ré A..., SA e Réu Banco 2..., SA, dado que a sentença relativa a Ré AA não transitou em julgado, com os seguintes fundamentos”.
[2] O aviso de receção para citação da executada foi assinado por terceira pessoa em 27 de dezembro de 2023, tendo sido observado o disposto no artigo 233º do Código de Processo Civil em 11 de janeiro de 2024.
[3] Notificada por expediente eletrónico elaborado em 31 de janeiro de 2024.
[4] Nas conclusões das alegações de recurso a recorrente suscita a falta de conhecimento destas questões sem aludir à consequência jurídica aplicável, ou seja, a nulidade da sentença, patologia que não é de conhecimento oficioso como se extrai, a contrario sensu do disposto no nº 2 do artigo 615º do Código de Processo Civil. Porém, não obstante este défice de qualificação jurídica, atendendo ao disposto no nº 3 do artigo 5º do Código de Processo Civil, a falta de conhecimento das aludidas questões enquadra-se no instituto da nulidade da sentença por omissão de pronúncia e assim será conhecida.
[5] Vejam-se os seguintes acórdãos, acessíveis na base de dados do IGFEJ: acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 04 de maio de 2017, proferido no processo nº 1327/14.0T8GMR-A.G1; acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 14 de março de 2019, proferido no processo nº 1550/06.0TBSTR-C.E1; acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 01 de junho de 2021, proferido no processo nº 1182/19.3T8ANS-A.C1; acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 07 de julho de 2022, proferido no processo nº 4749/20.3T8FNC-A.L1-2.
[6] Este despacho tem o seguinte teor: “Req. De 30-06-2023 e segs.: Subsiste o inconformismo da autora BB relativamente aos fundamentos expostos pelo Sr. Contador nas várias informações produzidas nos autos quanto aos montantes a pagar e a devolver, no âmbito dos cálculos das custas de parte. Neste sentido, considera-se que a decisão proferida em 10-05-2023, apesar de indeferir de forma expressa a reclamação apresentada pela autora em 24-01-2022, quanto à ponto I) do respetivo requerimento, nem por isso deixa de atingir os pontos subsequentes da referida reclamação daquele dependentes, devendo assentar-se, na resolução da presente situação, do que consta da informação cotada de 27-03-2023, datada de 24-03-2023, da qual decorre que, por aplicação do art. 26º, nº 3, alíneas a) e c) do Regulamento das Custas Processuais, em conjugação com o disposto no artigo 32º, nº 2, da Portaria 419-A/2009, de 17 de abril, as quantias a satisfazer são as indicadas na sobredita informação datada de 24-03-2023, e sumariadas na informação de 25-10-2023, o que se determina. Notifique.”
[7] Na realidade, apenas foi restituída à ora recorrente a quantia de € 1 829,62.
[8] Sublinhe-se que em 28 de junho de 2023 foi proferido o seguinte despacho: “Notifique as partes do parecer do Sr. Contador, constante da abertura de vista de 23-06-2023, o qual obteve a concordância do Ministério Público, conforme promoção que antecede, a fim de, no prazo de 10 dias, dizerem ou requererem o que tiverem por conveniente, com a cominação de, nada dizendo no referido prazo, considerar-se que não se opõem ao referido parecer.” Ora, este parecer respeita apenas à A..., S.A. e ao Banco 2..., S.A.
[9] A propósito veja-se, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2º, 3ª edição, Coimbra Editora 2017, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, páginas 712 a 714 e 737. Não obstante os argumentos não sejam questões, do ponto de vista retórico e da força persuasiva da decisão, há interesse na sua análise e refutação.
[10] Sublinhe-se que o alegado no artigo 35º da petição de embargos não corresponde à realidade dos factos, como resulta inequívoco da transcrição do cabeçalho da reclamação contra a nota justificativa da recorrente constante da primeira nota de rodapé deste acórdão.
[11] Veja-se, Tutela da Confiança e “Venire contra Factum Proprium” in João Baptista Machado, Obra Dispersa, Volume I, Scientia Iuridica, Braga 1991, páginas 415 a 419.
[12] Esta observação não contende com a admissibilidade da nota discriminativa e justificativa remetida antes do referido trânsito em julgado, mas apenas com a determinação do termo inicial da contagem dos juros de mora.
[13] Usam-se aspas porque se entende que se trata de um poder-dever do tribunal que deve ser usado sempre que se detete uma situação que deveria ter determinado um indeferimento total ou parcial do requerimento executivo.