NOTIFICAÇÃO POR VIA POSTAL
CONSTITUIÇÃO DE ASSISTENTE
REPRESENTAÇÃO EM JUÍZO
PESSOA COLECTIVA
Sumário

I - Não constitui notificação válida aquela feita por via postal registada, com prova de receção, que, por não ser encontrado o destinatário nem haver por este levantamento da mesma no estabelecimento postal, é devolvida à entidade remetente, porquanto as pessoas, não intervenientes no processo, não têm qualquer dever de ter ou manter morada atualizada no processo e/ou informar este de qualquer ausência prolongada dessa morada, ao contrário do que sucede com os arguidos - por força do TIR (artigo 196º, nº 3, al. b), do C. P. Penal) -, com os assistentes e com as partes civis, depois de disso serem advertidos (artigo 145º, nºs 5 e 6, do C. P. Penal).
II - Não contendo os autos documento que comprove que determinado cidadão tem poderes para apresentar queixa em representação de um ente coletivo (e também para constituir uma concreta Advogada como mandatária forense desse ente coletivo), tal não deve conduzir ao indeferimento liminar do requerimento de constituição como assistente do ente coletivo em causa.
III - Ao abrigo do disposto no artigo 28º, nº 1, do C. P. Civil, aplicável ex vi do artigo 4º do C. P. Penal, deve o Juiz de Instrução, não tendo tal sido feito antes pelo Ministério Público, ordenar ao referido cidadão para, em prazo que fixar, comprovar a sua qualidade de legal representante do ente coletivo denunciante.

Texto Integral


No Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Local Criminal de Loulé – Juiz 3, foi, em 14 de junho de 2024, proferido despacho com o seguinte teor (transcrição):

“Requerimento de fls. 30 e ss.:

A Absol - Associação de Beleza Solidária, com sede na Estrada Vale de Éguas, n.º 44, 1.º direito, Almancil, representada, nesse ato, pela (alegadamente) presidente do respetivo conselho executivo, veio exercer o seu direito de queixa contra D, alegando ter sido vítima, pelo mesmo, de um crime de difamação, p. e p. pelos artigos 180.º do Código Penal, com a agravação prevista no artigo 183.º, n.º 1 do mesmo diploma.

Por douto despacho exarado em 18.12.2023, a fls. 18, foi determinada a notificação da sobredita denunciante para, no prazo de 10 dias, vir aos autos requerer a sua constituição como assistente.

Em cumprimento deste douto despacho:

i) Conforme resulta de fls. 19, em 19.12.2023 foi expedida carta registada, com aviso de receção, dirigida à própria Associação denunciante e remetida para a morada da respetiva sede. Esta carta veio devolvida, com a menção “objeto não reclamado” (cf. fls. 23);

ii) Conforme resulta de fls. 22, em 09.01.2024, foi expedida carta registada, com aviso de receção, dirigida à (pretensa) legal representante da sobredita pessoa coletiva e remetida para a morada da respetiva sede (desconsiderando-se, em todo o caso, aquela expedida a fls. 20, já que a morada aí indicada difere daquela que corresponde(rá) à morada da sede da pessoa coletiva denunciante). Esta carta veio devolvida, com a menção “objeto não reclamado” (cf. fls. 24).

Por e-mail datado de 26.01.2024, de fls. 25, veio a pessoa coletiva denunciante, por intermédio da sua ilustre mandatária, informar o seguinte: “A minha constituinte Absol - Associação Beleza Solidária (envio procuração em anexo) não teve possibilidade de levantar em tempo a correspondência registada a que se refere o aviso cujas imagens envio. Gostaria de saber se é possível remeter-me o teor da respetiva notificação.”.

Foi, então, a ilustre mandatária da pessoa coletiva denunciante notificada do sobredito douto despacho exarado em 18.12.2023, a fls. 18, após o que, em 05.02.2024, veio requerer a constituição como assistente da sua constituinte (cf. fls. 29).

Sucede, porém, o seguinte:

- Desconhece-se se quem apresentou a suprarreferida queixa, em representação da pessoa coletiva aqui ofendida, tinha poderes para o fazer, inexistindo qualquer documento, válido, junto aos autos (v.g., certidão permanente, estatutos e/ou deliberação) que os corrobore, sendo idêntico raciocínio válido para o requerimento de constituição como assistente que antecede; mas, sobretudo,

- O requerimento de constituição como assistente que antecede é manifestamente extemporâneo.

Com efeito, conforme resulta do próprio teor da (última) notificação realizada nos moldes acima descritos em ii), a mesma considera-se efetuada no dia 12.01.2024, terminando o prazo perentório para a denunciante, querendo, se constituir assistente no dia 22.01.2024, sem prejuízo do disposto no artigo 107.º-A, que permitia, in casu, mediante o pagamento de uma multa processual, a prática do ato extemporâneo até ao dia 25.01.2024.

No caso sub judice, conforme resulta do supra exposto, tal não sucedeu, apenas requerendo a denunciante a sua constituição como assistente no sobredito dia 05.02.2024.

Conforme jurisprudência fixada pelo STJ, por Ac. n.º 1/2011, publicado em DR n.º 18/2011, Série I de 2011.01.26, “Em procedimento dependente de acusação particular, o direito à constituição como assistente fica precludido se não for apresentado requerimento para esse efeito no prazo fixado no n.º 2 do artigo 68.º do Código de Processo Penal.”.

De resto, como é bom de se ver, nem a “justificação” constante do sobredito e-mail datado de 26.01.2024, de fls. 25, configura uma qualquer situação de justo impedimento, nem, em todo o caso, o mesmo foi alegado, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 140.º do Código de Processo Civil.

Nem, bem assim, a supramencionada notificação de fls. 28, datada de 29.01.2024 - ou seja, expedida, inclusive, numa altura em que já decorrera, na íntegra, o prazo previsto no artigo 68.º, n.º 2 do Código de Processo Penal - tem a virtualidade de desencadear o decurso de um novo prazo processual que, nessa altura, já se encontrava exaurido.

A este propósito já decidiu o TRC, em Ac. de 05.12.2018, proc. n.º 542/17.9PBCLD-A.C1, disponível em www.dgsi.pt, nos seguintes termos: “(…) Face à inação que determinou a extinção do direito de se constituir assistente, a partir daí o recorrente podia e devia contar com tal desfecho preclusivo que, em última análise, conduziria ao arquivamento dos autos por ilegitimidade do Ministério Público para prosseguir o procedimento. Quando erradamente o Ministério Público mandou [repetir] o cumprimento do artigo 246.º, n.º 4 do CPP, não foi criada qualquer legítima expectativa no sentido de o recorrente vir a beneficiar de uma segunda possibilidade de se constituir assistente. Tal ato indevido, realizado num momento em que já se encontrava extinto o direito do recorrente, não era apto a gerar no recorrente uma confiança merecedora de tutela. A [segunda] notificação não tem a virtualidade de conferir novo prazo para a prática do ato precludido.” (sublinhado nosso).

Termos em que, não tendo o requerimento para constituição como assistente sido apresentado em tempo, sendo, portanto, extemporâneo - desconhecendo-se, de resto, se nesse ato, tal como aquando da apresentação da queixa-crime, a pessoa coletiva, aqui ofendida, estava representada por quem tinha poderes para o efeito, inclusive, para, em seu nome, outorgar a procuração de fls. 26/47 -, indefere-se a requerida constituição como assistente, nos termos ora formulados, por parte de Absol - Associação de Beleza Solidária.

Notifique e, oportunamente, devolva os autos aos serviços do Ministério Público. “

*

Inconformada com a decisão, a ofendida ABSOL – ASSOCIAÇÃO BELEZA SOLIDÁRIA interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões:

1. O despacho recorrido indeferiu o pedido de constituição de assistente formulado pela ofendida, considerando-o extemporâneo.

2. Sucede que a notificação por carta registada que se considera efetuada no dia 12.01.2024 foi remetida para a sede da denunciante, tendo a carta sido devolvida ao remetente com a menção “objeto não reclamado”.

3. Por e-mail datado de 26.01.2024, a mandatária informou que a ofendida não teve possibilidade de levantar a tempo a correspondência registada e requereu que lhe fosse remetida a notificação, o que veio a suceder pela notificação datada de 29.01.2024, tendo sido requerida a constituição como assistente em 05.02.2024.

3. A Recorrente não deve considerar-se notificada do teor da carta registada que se considera efetuada no dia 12.01.2024 e que foi remetida para a sua sede, porque não chegou a conhecer o seu conteúdo e desconhecia que estaria a decorrer qualquer prazo para requerer a sua constituição como assistente.

4. A presunção constante no artigo 113º, nº 2 do CPP apenas funciona se a carta não for devolvida porque se a mesma não é entregue não se pode presumir a notificação.

5. A ofendida estava a ser assistida por mandatário, cuja constituição sempre seria obrigatória para efeitos de constituição como assistente e a notificação tinha de ser feita a ambos, por força do disposto no art.° 113.°, n.° 10 do CPP, e neste caso, o prazo para a prática de ato processual conta-se a partir da data da notificação efetuada em último lugar.

6. Se a mandatária foi notificada em último lugar, esta, por força do disposto no citado n.° 2 do art.° 113.°, presume-se efetuada no terceiro dia útil posterior ao do envio, data a partir da qual começou a correr o prazo para a prática do ato processual, ou seja por via da notificação datada de 29.01.2024 que se presume efetuada em em 01.02.2024.

7. Assim, em 05.02.2024 foi requerida a constituição de assistente, pelo que sempre teria a mesma de ser admitida, nunca podendo proceder a sua rejeição por alegada extemporaneidade.

8. Não se trata de pretender um novo prazo, mas a nova notificação remetida para a mandatária já depois de decorrido o prazo que o despacho recorrido considera como único prazo válido, cria uma expectativa legítima de direitos que não pode ser escamoteada.

9. Após criada essa expectativa, a decisão de indeferimento da constituição de assistente constante no despacho recorrido constitui uma decisão surpresa que é proibida à luz das leis processuais vigentes.

10. Logo, à data de entrada do pedido de constituição de assistente (05.02.2024) não se tinha extinguido o direito de o formular.

DA ALEGADA ILEGITIMIDADE:

11. O despacho recorrido afirma desconhecer se no requerimento de constituição como assistente “tal como aquando da apresentação da queixa-crime, a pessoa coletiva, aqui ofendida, estava representada por quem tinha poderes para o efeito, inclusive, para, em seu nome, outorgar a procuração de fls. 26/47”.

12. O Tribunal a quo refere a inexistência de “qualquer documento, válido, junto aos autos (v.g., certidão permanente, estatutos e/ou deliberação) que os corrobore (…)”.

13. Ora, a procuração junta aos autos identifica os representantes legais da ofendida.

14. Existindo dúvidas por parte do Tribunal sobre a validade de tal representação, deveria a ofendida ter sido notificada para juntar o respetivo comprovativo, ao invés de ser automaticamente indeferida a constituição como assistente com base nesse fundamento.

15. Nesse caso, teria a ofendida procedido à junção dos documentos que ora anexa, que é a Ata da última eleição (Doc. 1) e os respetivos estatutos (Doc. 2).

16. Seria de presumir que o Tribunal não tinha dúvidas sobre a legitimidade dos representantes da ofendida e ora Recorrente, porquanto o mesmo Tribunal, no âmbito do Inquérito 361/23.3T9LLE, admitiu, em 24.11.2023, a constituição como assistente da mesma ofendida, sem qualquer dúvida relativa a legitimidade, cf. Doc. 3 que junta.

17. Foi inclusive requerida a apensação dos presentes autos àqueles, tendo sido proferido em 18.03.2024 o despacho que se junta como Doc. 4, tendo sido prestado o esclarecimento solicitado, sem que a ofendida tenha tomado conhecimento de qualquer decisão nesse sentido.

Pelo exposto e pelo mais que for doutamente suprido por V. Exas. deve conceder-se provimento ao presente recurso, revogando-se o despacho proferido, substituindo-o, em conformidade, admitindo-se a constituição de assistente requerida, por tempestiva e por não se verificar qualquer ilegitimidade e/ou irregularidade

*

O recurso foi admitido e fixado o respetivo regime de subida e efeito.

*

O Ministério Público respondeu ao recurso interposto pugnando pelo não provimento do mesmo.

*

No Tribunal da Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu Parecer nos seguintes termos:

“ (…)

IV. A magistrada do Ministério Público titular do inquérito apresentou resposta em que se limita a declarar que entende que não assiste razão à recorrente e que o despacho recorrido deve ser mantido nos precisos termos, uma vez que nenhum reparo lhe merece.

V. Diferentemente, o Ministério Público junto deste Tribunal da Relação de Évora considera que o recurso da denunciante merece provimento parcial. Vejamos porquê.

a. Quanto à tempestividade do requerimento, a questão está em saber se vale ou não como notificação aquela feita por via postal registada com prova de recepção nos casos em que, não sendo encontrado o destinatário nem pessoa que com ele habite ou pessoa indicada pelo destinatário que com ele trabalhe, os serviços postais deixem aviso indicando a natureza da correspondência e a identificação do tribunal ou do serviço remetente, vindo o objecto postal a ser devolvido à entidade remetente por não reclamado – cf. artigo 113.º, n.º 1, alínea b), n.º 2 e n.º 7, alínea d), do CPP.

Os factos respeitantes a este ponto que se extraem dos autos são os seguintes:

• por despacho de 18.12.2023, a fls. 18, foi determinada a notificação da denunciante para, no prazo de 10 dias, vir aos autos requerer a sua constituição como assistente;

• em 19.12.2023, foi expedida carta registada, com prova de recepção, dirigida à própria associação denunciante e remetida para a morada da respectiva sede, indicada na denúncia – fls. 19. Esta carta veio devolvida, com a menção “objeto não reclamado” (cf. fls. 23);

• na mesma data, foi igualmente expedida carta registada, com prova de recepção, mas dirigida a A – que na denúncia se apresentava como representante legal da denunciante –, remetida para morada não constante dos autos – fls. 20. Esta carta veio devolvida, com a menção “desconhecido” (cf. fls. 21);

• em 09.01.2024, ainda antes da devolução da carta enviada para a denunciante, foi oficiosamente expedida nova carta registada, com prova de recepção, dirigida a A, mas agora para a morada da sede da ABSOL, constante da denúncia – fls. 22 Esta carta veio devolvida, com a menção “objecto não reclamado” (cf. fls. 24);

• Por e-mail datado de 26.01.2024, de fls. 25, veio a pessoa colectiva denunciante, por intermédio da sua ilustre mandatária, informar o seguinte:

«A minha constituinte Absol – Associação Beleza Solidária (envio procuração em anexo) não teve possibilidade de levantar em tempo a correspondência registada a que se refere o aviso cujas imagens envio. Gostaria de saber se é possível remeter-me o teor da respetiva notificação».

• Foi, então, a ilustre mandatária da pessoa colectiva denunciante notificada do referido despacho exarado em 18.12.2023, a fls. 18, após o que, em 05.02.2024, veio requerer a constituição como assistente da sua constituinte (cf. fls. 29).

A decisão recorrida, como já descrito, considerou válida a notificação feita com o ofício de fls. 22, que veio devolvida com a menção “objecto não reclamado” – fls. 24). Porém, tendo essa notificação sido dirigida a A e não à ABSOL, não havendo sequer qualquer menção no ofício e no envelope que assim era na qualidade de representante legal da denunciante ABSOL, nunca poderia tal notificação ser considerada válida: essa notificação não foi dirigida à denunciante, não podendo notificação dirigida a título pessoal a qualquer outra pessoa, ainda que legal representante da pessoa colectiva, produzir efeitos na esfera jurídica desta.

Verdadeiramente, pois, a questão da validade da notificação da denunciante coloca-se antes apenas para a carta registada com prova de recepção expedida em 19.12.2023, dirigida à própria associação denunciante e remetida para a morada da respectiva sede, indicada na denúncia, que veio devolvida com a menção “objecto não reclamado” – fls. 19 e fls. 23.

Quanto a esta, note-se, antes de mais, que, contrariamente ao alegado no recurso, a notificação não tinha de tinha de ser dupla, isto é, feita quer à denunciante, quer à mandatária, pois:

• essa obrigação apenas existe relativamente a arguido, assistente e partes civis, e a ABSOL não tinha então qualquer dessas qualidades processuais – artigo 113.º, n.º 10, do CPP;

• essa obrigação apenas existe relativamente a notificações que respeitam à acusação, à decisão instrutória, à contestação, à designação de dia para julgamento, à sentença, à aplicação de medidas de coacção e de garantia patrimonial e à dedução do pedido de indemnização civil (artigo 113.º, n.º 10, do CPP), o que não era o caso;

• finalmente, porque a denúncia foi apresentada por quem se arrogava ser legal representante da denunciante, não havendo, na data da notificação, qualquer mandatário constituído.

Tendo a carta registada com prova de recepção sido devolvida por não ter sido reclamada, não se pode considerar realizada a notificação. Vejamos porquê.

O n.º 2 do artigo 113.º («Quando efetuadas por via postal registada, as notificações presumem-se feitas no terceiro dia posterior ao do seu envio, quando seja útil, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja, devendo a cominação aplicável constar do ato de notificação») pressupõe que exista acto de notificação. Isso o que resulta claro da parte final do preceito: tem de haver acto de notificação, pois só assim o destinatário pode tomar conhecimento da cominação. A presunção que desse preceito consta respeita apenas à data em que se considera feita a notificação, não à realização da notificação.

Dispõe a alínea d) do n.º 7 do artigo 113.º que, se não for possível, pela ausência de pessoa ou por outro qualquer motivo [não ser encontrada, nem pessoa que com ele habite ou pessoa por ele indicada que com ele trabalhe], proceder nos termos das alíneas anteriores, os serviços postais cumprem o disposto nos respectivos regulamentos, mas sempre que deixem aviso indicarão expressamente a natureza da correspondência e a identificação do tribunal ou do serviço remetente.

Esse regulamento é o Regulamento do Serviço Público de Correios, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 176/88. No seu artigo 23.º, prevê que a entrega de correspondências nos estabelecimentos postais da localidade de destino seja feita, mediante identificação do destinário ou seu representante (n.º 3), quando sujeitas a tratamento especial que preveja essa modalidade [n.º 2, alínea c)]; tal regime especial é o previsto no seu artigo 28.º, aplicável às correspondências registadas (como sucede com a via postal registada prevista no artigo 113.º, n.º 1, alínea b), do CPP) que determina que «[a] entrega das correspondências registadas é sempre comprovada por recibo e tem lugar: a) Na morada do destinatário, desde que esteja implantada a distribuição domiciliária; b) Nos estabelecimentos postais da localidade de destino, nos casos em que: […] 2.º Não tenha sido possível a entrega na morada do destinário; […]». No artigo 30.º dispõe que «[o] remetente de qualquer correspondência registada pode, no acto de registo, requisitar que lhe seja enviado aviso de recepção».

O modelo de cartas para realização deste tipo de notificação foi aprovado pela Portaria 953/2003, alterada Portaria 275/2013 (2) (mas não no que respeita a esses modelos), onde, entre os motivos para devolução ao remetente, se inclui o de “não reclamado” – tal modelo é o utilizado a fls. 23. Esta Portaria refere expressamente a existência de aviso de recepção.

Da conjugação destes normativos, resulta que, tratando-se de notificação por via postal registada, não sendo possível a entrega por não ter sido encontrado o destinatário nem pessoa que com ele habite ou pessoa por ele indicada que com ele trabalhe, deve o agente dos serviços postais deixar aviso indicando expressamente a natureza da correspondência e a identificação do tribunal ou do serviço remetente, ficando a carta ou aviso no estabelecimento postal que servir tal área, aguardando que o destinatário ou seu representante aí a reclame; não ocorrendo tal reclamação no prazo fixado, é a carta/aviso devolvida ao remetente com essa informação.

A norma que consta do preceito da alínea d) do n.º 7 do artigo 113.º do CPP é, pois, apenas uma norma de procedimento para os serviços postais, não contendo, contrariamente ao que sucede com as alíneas a) e b) do mesmo número, qualquer norma sobre a validade da notificação.

Ou seja, a presunção (ilidível) que conta do n.º 2 do artigo 113.º respeita apenas à data da notificação e é aplicável apenas:

• aos casos de notificação nomeados no n.º 1 como de “por via postal registada”, pois aos de “via postal simples” aplica-se a presunção prevista no n.º 3;

• dentro destes, aos seguintes:

o quando a carta ou aviso sejam entregues ao destinatário:

▪ directamente pelo agente dos serviços postais; ou,

▪ não sendo o destinatário encontrado, nem pessoa que com ele habite ou pessoa por ele indicada que com ele trabalhe, o agente dos serviços postais deixe aviso indicando expressamente a natureza da correspondência e a identificação do tribunal ou do serviço remetente, vindo a carta a ser entregue ao destinatário estabelecimento postal – artigo 113.º, n.º 7, alínea d), do CPP, parágrafo 1.º, n.º 3, da Portaria 953/2003, com a redacção dada pela Portaria 275/2013, e artigo 28.º, n.º 4, alínea b), § 2.º, do Regulamento do Serviço Público de Correios, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 176/88.

o quando o destinatário se recusar a assinar, e o agente dos serviços postais entregue a carta ou o aviso e lavre nota do incidente – artigo 113.º, n.º 7, alínea a), do CPP;

o quando o destinatário se recusar a receber a carta ou o aviso, e o agente dos serviços postais lavre nota do incidente – artigo 113.º, n.º 7, alínea b), do CPP;

o quando o destinatário não for encontrado, e a carta ou o aviso sejam entregues a pessoa que com ele habite ou a pessoa por ele indicada que com ele trabalhe, fazendo os serviços postais menção do facto com identificação da pessoa que recebeu a carta ou o aviso – artigo 113.º, n.º 7, alínea c), do CPP.

Não é, pois, notificação válida aquela feita por via postal registada que, por não ser encontrado o destinatário nem haver por este levantamento da mesma no estabelecimento postal, é devolvida à entidade remetente. Não há, nem poderia haver lei que o afirmasse. Note-se que esta notificação pode ser usada com qualquer pessoa, mesmo não sujeito ou participante processual, que não tem qualquer dever de manter actualizada morada no processo e informar este de qualquer ausência prolongada dessa morada, como sucede com os arguidos, por força do TIR [artigo 196.º, n.º 3, alínea b)], os assistentes e as partes civis, depois de disso serem advertidos (artigo 145.º, n.º s 5 e 6, do CPP).

No caso dos autos, e por força do exposto, há que concluir que não ocorreu qualquer notificação com os ofícios e cartas que constam de fls. 19 a 24, tendo a primeira notificação válida ocorrido apenas a 29.01.2024, na pessoa da mandatária forense entretanto constituída (fls. 28), pelo que é tempestiva a apresentação do requerimento de constituição como assistente em 05.02.2024.

b. Quanto à legitimidade:

Assiste razão à M.ma Juíza de Instrução a quo quando afirma que, à data do despacho, não continham os autos documento que comprovasse que A tinha poderes para apresentar queixa em representação da ABSOL e para constituir como mandatária forense a advogada Cristina Rodrigues (fls. 33 e 47).

Não obstante, tal não deveria conduzir ao indeferimento do requerimento de constituição como assistente. Ao abrigo do disposto no artigo 28.º, n.º 1, do CPC, ex vi do artigo 4.º do CPP, deveria a M.ma Juíza de Instrução, não tendo tal sido feito antes pelo Ministério Público, ordenar a A para, em prazo que fixasse, comprovasse a sua qualidade de legal representante da denunciante.

No entanto, não pode agora o Tribunal da Relação de Évora substituir-se à primeira instância e, inovatoriamente, proceder à apreciação da legitimidade da requerente (à luz dos factos denunciados e dos documentos entretanto juntos pela denunciante) e demais requisitos da constituição como assistente (pagamento da taxa de justiça e representação por advogado).

VI. Pelo que fica exposto, somos de parecer que:

i. O recurso deve ser julgado em conferência por respeitar a decisão que não conhece a final do objecto do processo, não ter sido requerida a audiência e não ser necessário proceder à renovação da prova – artigo 419.º, n.º 3, do CPP.

ii. O recurso deve ser julgado parcialmente procedente, revogando-se a decisão recorrida e ordenando-se que seja proferida outra que, considerando tempestivo o requerimento de constituição como assistente apresentado a fls. 29 e 30, determine a sua apreciação quanto aos demais requisitos da constituição como assistente.

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Cumprido o disposto no artigo 417º, nº2, do Código de Processo Penal não foi apresentada resposta.

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Realizado o exame preliminar determinou-se que fossem os autos aos vistos e à conferência.

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Fundamentação

Delimitação do objeto do recurso

O âmbito do recurso é delimitado em função do teor das conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, só sendo lícito ao Tribunal “ad quem” apreciar as questões desse modo sintetizadas, sem prejuízo das que importe conhecer oficiosamente, como são os vícios da sentença previstos no artigo 410º, nº2, do CPP, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (cfr. Ac. do Plenário das Secções Criminais do STJ de 19/10/1995, DR I-A Série, de 28/12/1995 e artigos 403º, nº1 e 412º, nºs 1 e 2, ambos do CPP).

São, pois, as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas conclusões da respetiva motivação que o Tribunal ad quem tem de apreciar.

No presente recurso suscita-se a questão de saber se deve ser revogado “o despacho proferido, substituindo-o, em conformidade, admitindo-se a constituição de assistente requerida, por tempestiva e por não se verificar qualquer ilegitimidade e/ou irregularidade quanto à representação da ofendida”.

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Apreciando

De acordo com o preceituado no art.º 68º, n.º 1, al. a), do CPP, podem constituir-se assistentes no processo penal, além das pessoas e entidades a quem leis especiais conferirem esse direito, os ofendidos, considerando-se como tais os titulares dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação, desde que maiores de dezasseis anos.

A constituição como assistente configura no nosso sistema processual um incidente cuja decisão cabe ao Juiz, que, como decorre do disposto no nº. 4 do artigo 68º do CPP, decide após o exercício do contraditório.

Como referido por Paulo Dá Mesquita, in “Prova e Sistema Judiciário”, Coimbra Editora-,pág. 183, “(…) Apresentando-se a constituição de assistente como um direito conexo com específicos crimes sobre que incide o processo, exige-se um concreto juízo cognitivo da autoridade judiciária relativo a esse(s) tipo(s) penal(is) que se deve articular com os requisitos da notícia do crime não envolvendo pressupostos equivalentes ao juízo de indícios suficientes, cuja concretização no processo constitui precisamente um dos eixos centrais da intervenção processual do assistente (eventualmente no quadro de discussão dialética com as autoridades judiciárias de primeira instância, em especial através da abertura da fase de instrução e interposição de recurso das decisões judiciais). (…) Satisfeitas as condições do pedido, constituição de advogado e pagamento da taxa de justiça, o Juiz pronuncia-se, com observância do princípio do contraditório, numa apreciação substantiva dos elementos fácticos disponíveis relativos aos respectivos pressupostos legais que se aferem ainda pelo crime em investigação (..)”.

Assistente é, assim, é a pessoa (s) (singular ou coletiva) que, por serem ofendidas ou porque a lei lhes confere legitimidade para se constituírem como tal (art. 68º, nº1, do CPP), requerem ao juiz a sua intervenção no processo penal para ai fazerem valer os seus interesses (de natureza penal e conjuntamente de natureza cível), quer em colaboração com o Ministério Público (crimes públicos e semi-públicos), quer autonomamente nos casos previstos na lei (crimes particulares), e que por despacho judicial forem admitidas como tal. É um sujeito processual.

São requisitos da constituição de assistente:

É necessário que tenha legitimidade, e para isso tem de ser o ofendido ou alguma das pessoas a que se refere o art. 68º do CPP;

Tem que fazer um requerimento ao juiz (juiz de instrução criminal, ou juiz de julgamento, dependendo da fase em que requerer) – art. 68º, nº2 do CPP;

Tem que fazer esse requerimento em tempo (art. 68º, nº2 do CPP);

Ora, nos termos do artigo 246.º, nº4, do CPP o denunciante pode declarar, na denúncia, que deseja constituir-se assistente. Tratando-se de crime cujo procedimento depende de acusação particular, a declaração é obrigatória, devendo, neste caso, a autoridade judiciária ou o órgão de polícia criminal a quem a denúncia for feita verbalmente advertir o denunciante da obrigatoriedade de constituição de assistente e dos procedimentos a observar.

Nos termos do art.50º, nº1 do CPP, quando o procedimento criminal depender de acusação particular, do ofendido ou de outras pessoas, é necessário que essas pessoas se queixem, se constituam assistentes e deduzam acusação particular.

E nos termos do nº 2 do art.68º do CPP, tratando-se de procedimento dependente de acusação particular, o requerimento tem lugar no prazo de 10 dias a contar da advertência referida no n.º 4 do artigo 246.º.

Vejamos

Com relevo para a decisão resulta dos autos que:

- por despacho de 18.12.2023 foi determinada a notificação da denunciante para, no prazo de 10 dias, vir aos autos requerer a sua constituição como assistente (cfr. fls.18);

- em 19.12.2023 foi expedida carta registada, com aviso de receção, dirigida à própria Associação denunciante e remetida para a morada da respetiva sede, indicada na denúncia (cfr.fls.19);

- tal carta veio devolvida, com a menção “objeto não reclamado” (cf. fls. 23);

- em 19.12-2023 foi igualmente expedida carta registada, com prova de receção, dirigida a A – que na denúncia se apresentava como representante legal da denunciante –, remetida para Rua (……) Lisboa, morada não constante dos autos – cfr.fls. 20;

- esta carta veio devolvida, com a menção “desconhecido” (cf. fls. 21);

-em 09.01.2024, ainda antes da devolução da carta enviada para a denunciante, foi oficiosamente expedida nova carta registada, com prova de receção, dirigida a A, mas agora para a morada da sede da ABSOL, constante da denúncia – cfr.fls. 22;

- esta carta veio devolvida, com a menção “objecto não reclamado” (cf. fls. 24);

- por e-mail datado de 26.01.2024, veio a pessoa coletiva denunciante, por intermédio da sua ilustre mandatária, informar o seguinte: “A minha constituinte Absol - Associação Beleza Solidária (envio procuração em anexo) não teve possibilidade de levantar em tempo a correspondência registada a que se refere o aviso cujas imagens envio. Gostaria de saber se é possível remeter-me o teor da respetiva notificação.” (cfr.fls.25);

- foi, então, em 29.01.2024, a ilustre mandatária da pessoa coletiva denunciante notificada do despacho exarado em 18.12.2023, a fls. 18, (cfr. fls.28), após o que, em 05.02.2024, veio requerer a constituição como assistente da sua constituinte (cf. fls. 29).

Sendo a constituição de assistente um ato individual, pois que em relação a cada requerente deve ser apreciada a respetiva legitimidade substantiva (artº 68º do CPP), também a verificação dos demais requisitos legais de admissão, nomeadamente a tempestividade do requerimento terá que ser apreciada.

Se faltar algum dos requisitos enunciados, então o juiz deverá proferir um despacho de indeferimento.

Ora, no caso sub judice, como bem referido no elaborado Parecer proferido neste Tribunal da Relação, que transcrevemos, “ (…) A decisão recorrida, como já descrito, considerou válida a notificação feita com o ofício de fls. 22, que veio devolvida com a menção “objecto não reclamado” – fls. 24). Porém, tendo essa notificação sido dirigida a A e não à ABSOL, não havendo sequer qualquer menção no ofício e no envelope que assim era na qualidade de representante legal da denunciante ABSOL, nunca poderia tal notificação ser considerada válida: essa notificação não foi dirigida à denunciante, não podendo notificação dirigida a título pessoal a qualquer outra pessoa, ainda que legal representante da pessoa colectiva, produzir efeitos na esfera jurídica desta.

Verdadeiramente, pois, a questão da validade da notificação da denunciante coloca-se antes apenas para a carta registada com prova de recepção expedida em 19.12.2023, dirigida à própria associação denunciante e remetida para a morada da respectiva sede, indicada na denúncia, que veio devolvida com a menção “objecto não reclamado” – fls. 19 e fls. 23.

Quanto a esta, note-se, antes de mais, que, contrariamente ao alegado no recurso, a notificação não tinha de tinha de ser dupla, isto é, feita quer à denunciante, quer à mandatária, pois:

• essa obrigação apenas existe relativamente a arguido, assistente e partes civis, e a ABSOL não tinha então qualquer dessas qualidades processuais – artigo 113.º, n.º 10, do CPP;

• essa obrigação apenas existe relativamente a notificações que respeitam à acusação, à decisão instrutória, à contestação, à designação de dia para julgamento, à sentença, à aplicação de medidas de coacção e de garantia patrimonial e à dedução do pedido de indemnização civil (artigo 113.º, n.º 10, do CPP), o que não era o caso;

• finalmente, porque a denúncia foi apresentada por quem se arrogava ser legal representante da denunciante, não havendo, na data da notificação, qualquer mandatário constituído.

Tendo a carta registada com prova de recepção sido devolvida por não ter sido reclamada, não se pode considerar realizada a notificação. Vejamos porquê.

O n.º 2 do artigo 113.º («Quando efetuadas por via postal registada, as notificações presumem-se feitas no terceiro dia posterior ao do seu envio, quando seja útil, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja, devendo a cominação aplicável constar do ato de notificação») pressupõe que exista acto de notificação. Isso o que resulta claro da parte final do preceito: tem de haver acto de notificação, pois só assim o destinatário pode tomar conhecimento da cominação. A presunção que desse preceito consta respeita apenas à data em que se considera feita a notificação, não à realização da notificação.

Dispõe a alínea d) do n.º 7 do artigo 113.º que, se não for possível, pela ausência de pessoa ou por outro qualquer motivo [não ser encontrada, nem pessoa que com ele habite ou pessoa por ele indicada que com ele trabalhe], proceder nos termos das alíneas anteriores, os serviços postais cumprem o disposto nos respectivos regulamentos, mas sempre que deixem aviso indicarão expressamente a natureza da correspondência e a identificação do tribunal ou do serviço remetente.

Esse regulamento é o Regulamento do Serviço Público de Correios, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 176/88. No seu artigo 23.º, prevê que a entrega de correspondências nos estabelecimentos postais da localidade de destino seja feita, mediante identificação do destinário ou seu representante (n.º 3), quando sujeitas a tratamento especial que preveja essa modalidade [n.º 2, alínea c)]; tal regime especial é o previsto no seu artigo 28.º, aplicável às correspondências registadas (como sucede com a via postal registada prevista no artigo 113.º, n.º 1, alínea b), do CPP) que determina que «[a] entrega das correspondências registadas é sempre comprovada por recibo e tem lugar: a) Na morada do destinatário, desde que esteja implantada a distribuição domiciliária; b) Nos estabelecimentos postais da localidade de destino, nos casos em que: […] 2.º Não tenha sido possível a entrega na morada do destinário; […]». No artigo 30.º dispõe que «[o] remetente de qualquer correspondência registada pode, no acto de registo, requisitar que lhe seja enviado aviso de recepção».

O modelo de cartas para realização deste tipo de notificação foi aprovado pela Portaria 953/2003, alterada Portaria 275/2013 (2) (mas não no que respeita a esses modelos), onde, entre os motivos para devolução ao remetente, se inclui o de “não reclamado” – tal modelo é o utilizado a fls. 23. Esta Portaria refere expressamente a existência de aviso de recepção.

Da conjugação destes normativos, resulta que, tratando-se de notificação por via postal registada, não sendo possível a entrega por não ter sido encontrado o destinatário nem pessoa que com ele habite ou pessoa por ele indicada que com ele trabalhe, deve o agente dos serviços postais deixar aviso indicando expressamente a natureza da correspondência e a identificação do tribunal ou do serviço remetente, ficando a carta ou aviso no estabelecimento postal que servir tal área, aguardando que o destinatário ou seu representante aí a reclame; não ocorrendo tal reclamação no prazo fixado, é a carta/aviso devolvida ao remetente com essa informação.

A norma que consta do preceito da alínea d) do n.º 7 do artigo 113.º do CPP é, pois, apenas uma norma de procedimento para os serviços postais, não contendo, contrariamente ao que sucede com as alíneas a) e b) do mesmo número, qualquer norma sobre a validade da notificação.

Ou seja, a presunção (ilidível) que conta do n.º 2 do artigo 113.º respeita apenas à data da notificação e é aplicável apenas:

• aos casos de notificação nomeados no n.º 1 como de “por via postal registada”, pois aos de “via postal simples” aplica-se a presunção prevista no n.º 3;

• dentro destes, aos seguintes:

o quando a carta ou aviso sejam entregues ao destinatário:

▪ directamente pelo agente dos serviços postais; ou,

▪ não sendo o destinatário encontrado, nem pessoa que com ele habite ou pessoa por ele indicada que com ele trabalhe, o agente dos serviços postais deixe aviso indicando expressamente a natureza da correspondência e a identificação do tribunal ou do serviço remetente, vindo a carta a ser entregue ao destinatário estabelecimento postal – artigo 113.º, n.º 7, alínea d), do CPP, parágrafo 1.º, n.º 3, da Portaria 953/2003, com a redacção dada pela Portaria 275/2013, e artigo 28.º, n.º 4, alínea b), § 2.º, do Regulamento do Serviço Público de Correios, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 176/88.

o quando o destinatário se recusar a assinar, e o agente dos serviços postais entregue a carta ou o aviso e lavre nota do incidente – artigo 113.º, n.º 7, alínea a), do CPP;

o quando o destinatário se recusar a receber a carta ou o aviso, e o agente dos serviços postais lavre nota do incidente – artigo 113.º, n.º 7, alínea b), do CPP;

o quando o destinatário não for encontrado, e a carta ou o aviso sejam entregues a pessoa que com ele habite ou a pessoa por ele indicada que com ele trabalhe, fazendo os serviços postais menção do facto com identificação da pessoa que recebeu a carta ou o aviso – artigo 113.º, n.º 7, alínea c), do CPP.

Não é, pois, notificação válida aquela feita por via postal registada que, por não ser encontrado o destinatário nem haver por este levantamento da mesma no estabelecimento postal, é devolvida à entidade remetente. Não há, nem poderia haver lei que o afirmasse. Note-se que esta notificação pode ser usada com qualquer pessoa, mesmo não sujeito ou participante processual, que não tem qualquer dever de manter actualizada morada no processo e informar este de qualquer ausência prolongada dessa morada, como sucede com os arguidos, por força do TIR [artigo 196.º, n.º 3, alínea b)], os assistentes e as partes civis, depois de disso serem advertidos (artigo 145.º, n.º s 5 e 6, do CPP).

No caso dos autos, e por força do exposto, há que concluir que não ocorreu qualquer notificação com os ofícios e cartas que constam de fls. 19 a 24, tendo a primeira notificação válida ocorrido apenas a 29.01.2024, na pessoa da mandatária forense entretanto constituída (fls. 28), pelo que é tempestiva a apresentação do requerimento de constituição como assistente em 05.02.2024.

b. Quanto à legitimidade:

Assiste razão à M.ma Juíza de Instrução a quo quando afirma que, à data do despacho, não continham os autos documento que comprovasse que A tinha poderes para apresentar queixa em representação da ABSOL e para constituir como mandatária forense a advogada Cristina Rodrigues (fls. 33 e 47).

Não obstante, tal não deveria conduzir ao indeferimento do requerimento de constituição como assistente. Ao abrigo do disposto no artigo 28.º, n.º 1, do CPC, ex vi do artigo 4.º do CPP, deveria a M.ma Juíza de Instrução, não tendo tal sido feito antes pelo Ministério Público, ordenar a A para, em prazo que fixasse, comprovasse a sua qualidade de legal representante da denunciante.

No entanto, não pode agora o Tribunal da Relação de Évora substituir-se à primeira instância e, inovatoriamente, proceder à apreciação da legitimidade da requerente (à luz dos factos denunciados e dos documentos entretanto juntos pela denunciante) e demais requisitos da constituição como assistente (pagamento da taxa de justiça e representação por advogado).

(…)”

Ora, porque sufragamos na íntegra tal entendimento, e sem necessidade de outras considerações, o recurso procede parcialmente.

*

Decisão

Face a tudo o exposto, acordam os juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em:

- Julgar parcialmente procedente o recurso, revogando-se a decisão recorrida e ordenando-se que seja proferida outra que, considerando tempestivo o requerimento de constituição como assistente apresentado a fls. 29 e 30, proceda à apreciação dos demais requisitos da constituição como assistente.

- Sem custas.

*

Elaborado e revisto pela primeira signatária

Évora, 22 de outubro de 2024

Laura Goulart Maurício

Manuel Ramos Soares

Edgar Valente