PRESSUPOSTOS DA ADMISSIBILIDADE DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO "MANIFESTAMENTE NECESSÁRIO À MELHORIA DA APLICAÇÃO DO DIREITO"
Sumário

I - Para que a Relação conclua pela admissibilidade do recurso a título extraordinário na consideração de tal se afigurar “manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito”, não basta à recorrente invocar esse fundamento, antes se lhe impondo que nele alegue as razões concretas e precisas que evidenciem a existência desse fundamento, dado que a apreciação e decisão dessa pretensão constituem questão prévia relativamente à apreciação do recurso.
II - A aceitação do recurso por se afigurar manifestamente necessário à melhor aplicação do direito só tem justificação, quando na decisão impugnada se observe um erro jurídico grosseiro, incomum, uma errónea aplicação do direito bem visível, não se destinando a corrigir, eventuais, erros de julgamento.

(Da responsabilidade da Relatora)

Texto Integral

Proc.Nº 3873/23.5T8PNF.P1


Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este Juízo do Trabalho de ... - Juiz 3


Recorrente: A..., Ld.ª
Recorrida: Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT)








Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto


I – RELATÓRIO

A A..., Ld.ª, com sede na Rua ..., ... ..., impugnou judicialmente a decisão da subdiretora da Unidade Local de ... da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) - que a condenou na coima de 10 UC (€ 1.020,00), pela prática de uma contraordenação grave prevista pelo artº 16º, do DL nº 237/2007, de 19.06, por referência ao artº 8º, nº 2, do DL nº 237/2007, de 19.06, e punível pelo artº 554º, nºs 1, 3, alínea e), 5 e 9, do C.T.

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Após apresentação do processo a juízo, prosseguiram os autos para julgamento e realizada que foi a audiência, foi proferida sentença que terminou com a seguinte decisão:
Nos termos e com os fundamentos supra referidos, julgo a impugnação judicial deduzida pela arguida improcedente e, em consequência, mantenho a decisão da subdiretora da Unidade Local de ... da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT).
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Custas pela arguida, fixando-se a taxa de justiça em 1 UC - cfr. artºs 60º, da Lei nº 107/2009, de 14.09; 92º, nºs 1 e 3, 93º, nºs 3 e 4, e 94º, nºs 2 e 3, todos do DL nº 433/82, de 27.10; e 513º, nºs 1 a 3, e 514º, nº 1, ambos do C.P.P.”.
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Inconformada interpôs a arguida o presente recurso, “nos termos do número 2 do artigo 49º e artigo 50º da Lei n.º 107/2009 de 14 de Setembro”, invocando, sob o título “Da admissibilidade do Recurso ao abrigo do disposto no n.º 2 do art.º 49.º da Lei n.º 107/2009, de 14/09”, o seguinte: “1.
No âmbito da decisão administrativa proferida pela ACT – Unidade Local de ... e que deu origem aos presentes autos, foi aplicada à ora Recorrente uma coima no montante de 1.020,00€, pela prática de uma contraordenação prevista pelo artigo 8º, n.º 2 do DL 237/2007 de 19.06.
2.
Verifica-se, nos presentes autos, um excesso de tempo de trabalho consecutivo permitido, equivalente a 17 minutos.
3.
Tanto em sede de impugnação judicial, como em sede de julgamento, a Recorrente alegou a exceção consagrada no artigo 12º do Regulamento 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15 de Março de 2006.
4.
Pese embora a situação sub judice se enquadre no normativo supra identificado e se tenha produzido prova capaz de impor uma decisão diferente, certo é que, a douta sentença proferida não só não se pronunciou quanto ao alegado, como fez uma aplicação da lei contrária aos fins do direito, como se pretende mostrar,
5.
Pese embora tenha sido oferecida prova documental que denota a aplicação do supramencionado artigo, a decisão proferida ignora tal realidade, desmerece a prova oferecida pela Recorrente, olvida as normas excecionais previstas no Regulamento, e faz uma aplicação errónea do direito.
6.
Não pretende a Recorrente corrigir erros de julgamento, mas tão-só, demonstrar ao douto Tribunal como é flagrante a necessidade de aplicação do artigo 12º do Regulamento supramencionado,
7.
A situação sub judice não pode ser resolvida sem que seja aplicado o artigo 12º do Regulamento, ou, pelo menos, se fundamente a sua não aplicação, o que não aconteceu.
8.
Não há qualquer declaração de inconstitucionalidade da norma supra referida e existe inúmera jurisprudência que retrata de forma objetiva as consequências da aplicação deste normativo, facto negligenciado na sentença aqui recorrida e que determina que se verifique uma errónea aplicação do direito, o que fundamenta o presente recurso.
9.
Face ao exposto e ao que se pretende evidenciar infra, impõe-se a apresentação do presente recurso, a título excecional, atenta a pertinência das razões aqui invocadas, de forma a permitir concluir justificar-se a sua apreciação por ocorrência de um erro grave, incomum e notório, para que a solução jurídica contida na decisão recorrida, não possa manter-se.”.
E, prossegue, sob a epígrafe “Do Recurso”, terminando as suas alegações com as seguintes Conclusões:
“A. O presente recurso é apresentado a título excecional ao abrigo do n.º 2 do artigo 49º e artigo 50º da Lei n.º 107/2009 de 14 de Setembro.
B. Em sede de impugnação judicial e em sede de julgamento, a Recorrente alegou a exceção consagrada no artigo 12º do Regulamento 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15 de Março de 2006.
C. A sentença proferida não só não se pronunciou quanto ao alegado, como fez uma aplicação da lei contrária aos fins do direito,
D. Desconsiderou a prova oferecida pela Recorrente, olvidou as normas excecionais previstas no Regulamento, e faz uma aplicação errónea do direito, ancorando-se em normas cuja aplicação é manifestamente injusta e abusiva.
E. A situação em causa não pode ser resolvida sem que seja aplicado o artigo 12º do Regulamento, ou, pelo menos, se fundamente a sua não aplicação, o que não aconteceu.
F. Existe inúmera jurisprudência que retrata de forma objetiva as consequências da aplicação deste normativo, facto negligenciado na sentença aqui recorrida.
G. Razões pelas quais se justifica a apresentação do presente articulado, atenta a pertinência das razões aqui invocadas, de forma a permitir concluir justificar-se a sua apreciação por ocorrência de um erro grave, incomum e notório, para que a solução jurídica contida na decisão recorrida não possa manter-se.
H. Resulta do auto de contraordenação o motivo pelo qual o motorista excedeu o tempo de trabalho permitido em 17 minutos.
I. Resulta, também, do talão de registo diário de tacógrafo, impresso no dia da infração e junto aos autos em sede de julgamento.
J. O artigo 12º do Regulamento supra referido contém disposições que permitem ao condutor desrespeitar as exigências mínimas de repouso e os tempos máximos de condução, verificados alguns requisitos e com o objetivo de garantir a segurança das pessoas, do veículo ou da carga.
K. O motorista referiu que tal incumprimento se deveu a um evento fortuito que não se relaciona com a organização do trabalho operada pela Recorrente – neste caso, o facto do parque de estacionamento estar sobrelotado, justificação que foi devidamente referida no verso da impressão dos dados do aparelho de controlo, após parquear.
L. A ação do motorista não prejudicou a segurança rodoviária, bem pelo contrário, destinou-se a garanti-la.
M. Apesar de alegada a exceção, a sentença não emite qualquer juízo sobre a mesma.
N. E mantém a decisão administrativa que é manifestamente injusta e abusiva.
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas., Venerandos Desembargadores, doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogada a decisão que julgou improcedente a impugnação judicial da ora Recorrente e substituída por outra que absolva a Recorrente, com o que, uma vez mais, se fará a já costumada Justiça!”.
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A seguir a Mª Juíza “a quo”, após determinar a notificação do Mº Pº, ordenou a, oportuna, remessa dos autos, a este Tribunal, face ao disposto pelo art. 49º, nº 2 e 50º, nºs 2 e 3, ambos da Lei 107/2009 de 14/09.
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O Ministério Público respondeu, terminando com as seguintes, CONCLUSÕES:
“1. Da decisão que aplicar coima inferior a 25 UC ou valor equivalente, como ocorreu in casu, não há recurso, nos termos do artigo 49.º, nº 1, al. a) da Lei n.º 107/2009 de 14.09.
2. Acresce que, invocando a arguida nas suas alegações a necessidade de uniformização de jurisprudência, tal invocação não se mostrou acompanhado de requerimento como se impunha, nos termos do n.º 2 do art.º 50 da Lei 107/2009 de 14.09.
3. Nessa medida, o recurso deve ser rejeitado, não podendo a Relação conhecer do mesmo.
4. Face à matéria de facto apurada, não padece a sentença em crise de aplicação errónea do direito muito menos pela não aplicação do art.º 12 do Regulamento 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15 de Março de 2006 e nem pela invocada aplicação da lei contrária aos fins do direito.
5. Os factos em questão no recurso, foram criteriosamente fixados, tendo em consideração os elementos probatórios que os sustentaram.
6. Concorda-se, assim, com a sentença produzida nos autos.
Pelo exposto, entendemos que a douta decisão recorrida deve ser mantida, nos termos enunciados, e assim se fazendo inteira justiça.”.
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Nesta Relação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de o recurso não obter provimento, face “ao já explanado nas contra-alegações apresentadas pela ilustre colega junto da 1ª. Instância.”.
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A recorrente não respondeu a este parecer.
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Foi cumprido o disposto no art. 418º do CPP, remetendo-se o processo aos vistos e o projecto de acórdão por via electrónica.
Cumpre decidir.
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Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso (art.s 403º, nº 1, e 412º, nº 1, do CPP), as questões colocadas para apreciação são as seguintes:
- Previamente: - saber se o recurso é admissível ao abrigo do disposto no art. 49º nº2, da Lei 107/2009, de 14 de Setembro;
- E se sim: - saber se deve ser revogada a decisão recorrida e absolvida a recorrente, como ela defende.
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II - FUNDAMENTAÇÃO
Os factos a considerar são, os que decorrem do relatório que antecede e, ainda, os a seguir transcritos que o Tribunal “a quo” considerou, resultaram provados, com relevo para a decisão:
“1º- A arguida é uma sociedade comercial que se dedica à atividade de transporte rodoviário de mercadorias - CAE 49410.
2º- No dia 25.10.2022, pelas 09:30 horas, EN - Rotunda ..., a arguida mantinha em circulação o veículo pesado de mercadorias, com a matrícula ..-UV-.., afeto ao motorista AA.
3º- Nessa data, o referido condutor foi objeto de fiscalização, fazendo-se acompanhar do cartão de condutor.
4º- Da impressão de registo respeitante ao dia 03.10.2022 resulta que, no período compreendido entre as 06:32 horas e as 12:49 horas, entre condução e outros trabalhos, perfez 06:17 horas de trabalho consecutivo.
5º- O condutor não apresentou à agente autuante ou em sede de instrução qualquer talão imprimido por aquele na data de 03.10.2022 com a inscrição no verso do motivo que o levou a exceder o tempo de trabalho consecutivo permitido.
6º- A arguida concedeu formação sobre regulamentação social e manuseamento de tacógrafo ao condutor em 23.12.2022.
7º- No ano de 2021, o volume de negócios da arguida foi de €12.125.308,00.
8º- O condutor celebrou com a arguida contrato de trabalho em data anterior a 03.10.2022.
9º- A arguida juntou à resposta escrita que apresentou o documento de fls. 19, que, aqui, se dá por integralmente reproduzido.
10º- O condutor informou a agente autuante do motivo pelo qual, segundo ele, excedeu o seu tempo de trabalho.
Factos não provados
Com relevo para a decisão, resultaram não provados os seguintes factos:
1º- A 26 de setembro de 2022.
2º- A arguida ministrou formação ao condutor em matéria de regulamentação social e manuseamento de tacógrafo logo após ser admitido.
3º- O documento referido no ponto 9º, dos factos provados, é demonstrativo da organização de trabalho, o qual permite o cumprimento dos tempos de condução e repouso.
4º- A violação daquilo que estava organizado e planeado, apenas, aconteceu face a eventos não previsíveis e que fogem ao controlo da arguida.
5º- A arguida organizou o trabalho do seu motorista.
6º- Tendo exibido o talão com a respetiva justificação.
7º- O motorista não comprometeu a segurança rodoviária.”.
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Apreciando.
Como referimos, a primeira questão e prévia a apreciar, consiste em saber, se o recurso interposto da decisão recorrida que, julgou improcedente a impugnação judicial deduzida e manteve a sanção aplicada à arguida, uma coima no valor de 1.020,00€, é admissível a título excepcional, nos termos previstos no nº2, do art. 49º da Lei 107/2009, de 14.09 por, como defende a recorrente e diz entender, no requerimento de interposição daquele, “impõe-se a apresentação do presente recurso, a título excecional, atenta a pertinência das razões aqui invocadas, de forma a permitir concluir justificar-se a sua apreciação por ocorrência de um erro grave, incomum e notório, para que a solução jurídica contida na decisão recorrida, não possa manter-se.”.
Que dizer?
Desde já, que a recorrente não tem razão.
Senão, vejamos.
É aplicável, ao caso, a invocada Lei nº 107/2009, de 14.09, que aprovou o regime jurídico das contra-ordenações laborais e da segurança social (cfr. art. 65º, nº 1), que entrou em vigor em 01.10.2009.
E, por determinação do art.º 60.º, subsidiariamente, desde que o contrário não resulte daquela lei, “(..), com as devidas adaptações, os preceitos reguladores do processo de contra-ordenação previstos no regime geral das contra –ordenações”, ou seja, no Decreto-Lei nº 433/82, de 27.10, com as alterações introduzidas pelos Decretos-lei nº 356/89, de 17.10 e nº 244/95, de 14.09 e pela Lei nº 109/2001, de 24.12.
O art. 49º daquela Lei nº 107/2009, dispõe sob a epígrafe “Decisões judiciais que admitem recurso” que:
“1 – Admite-se recurso para o Tribunal da Relação da sentença ou do despacho judicial proferidos nos termos do artigo 38º, quando:
a) For aplicada ao arguido uma coima superior a 25 UC ou valor equivalente;
(...)
2 – Para além dos casos enunciados no número anterior, pode o Tribunal da Relação, a requerimento do arguido ou do Ministério Público, aceitar o recurso da decisão quando tal se afigure manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência.
(...).”.
Nas situações previstas neste nº 2, cabe à recorrente justificar a admissibilidade do recurso, em requerimento autónomo, constituindo questão prévia a apreciação e decisão do mesmo, conforme art. 50º nºs 2 e 3, daquela mesma Lei nº 107/2009), os quais dispõem, o seguinte:
“2 - Nos casos previstos no n.º 2 do artigo anterior, o requerimento segue junto ao recurso, antecedendo-o.
3 - Nestes casos, a decisão sobre o requerimento constitui questão prévia, que é resolvida por despacho fundamentado do tribunal, equivalendo o seu indeferimento à retirada do recurso.”.
A este respeito, lê-se no (Acórdão desta secção, de 11.04.2019, relator Desembargador Jerónimo Freitas) o seguinte: “Da conjugação destes preceitos retira-se que o requerimento a apresentar pelo requerente é autónomo, dado anteceder o recurso, bem assim que deverá conter a alegação dos argumentos suficientes para justificar a pretendida admissão excepcional do recurso, na medida em que “a decisão sobre o requerimento constitui questão prévia”.
Dito por outras palavras, a admissibilidade do recurso a título extraordinário “quando tal se afigure manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência” é aferida, a montante, atendendo às razões, devidamente sustentadas, que devem logo ser explanadas no requerimento apresentado, e não a jusante, face aos argumentos que sustentam as alegações de recurso.
Concede-se que também se possa atender às alegações de recurso, mas como elemento complementar, dada a necessária conexão entre as razões que sejam invocadas para justificar o recurso e as questões que neste se pretendam colocar à apreciação do tribunal de recurso. Mas já não é de aceitar os casos em que o recorrente procure justificar a admissibilidade do recurso remetendo exclusivamente para a argumentação das alegações de recurso.”.
Transpondo o que antecede, para o caso, importa desde logo, atentar se deve ser rejeitado o recurso, por como alega e conclui o Mº Pº, na resposta apresentada àquele, “invocando a arguida nas suas alegações a necessidade de uniformização de jurisprudência, tal invocação não se mostrou acompanhado de requerimento como se impunha, nos termos do n.º 2 do art.º 50 da Lei 107/2009 de 14.09.”.
E, analisando o requerimento apresentado pela recorrente, em 04.04.2024, verifica-se que a mesma, como questão prévia, alude ao disposto no nº 2 daquele art. 49º e, embora não conste como devia de requerimento integralmente autonomizado, suscita a problemática respeitante à admissibilidade do recurso, antes, das alegações que identifica, como “Do Recurso”.
Razão porque, ainda que se concorde que a forma como aquele é apresentado não é a mais característica e usual, para não se perfilhar uma visão demasiado formalista sobre o assunto, entende-se que aquela forma de apresentação não obsta à sua apreciação.
Assim, analisando se o recurso deve ser admitido, transpondo o que decorre do referido art. 49º para o caso, é manifesta, como já dissemos, a falta de razão da recorrente ao pugnar pela admissibilidade do presente recurso, alegadamente, por entender, verificarem-se no caso em apreço, os requisitos que possibilitam este Tribunal aceitar o recurso, por se afigurar manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito, ou seja, nos termos daquele nº 2 que invoca.
Pois, no caso, não se encontram reunidos os pressupostos previstos naquele art. 49º, para que se possa admitir o recurso, nem nos termos do nº 1, do mesmo, nem pela via do nº 2.
Nos termos do nº 1, porque o valor da coima aplicada na sentença recorrida é inferior ao valor a que alude a al. a), o montante de 1020,00€, não atinge o valor de 25 UC, ali referidos.
Nos termos do nº 2, porque, no requerimento que apresentou, nos termos do nº 2 do art. 50º da referida Lei nº 107/2009 escreveu a recorrente que, “Tanto em sede de impugnação judicial, como em sede de julgamento, a Recorrente alegou a exceção consagrada no artigo 12º do Regulamento 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15 de Março de 2006.
Pese embora a situação sub judice se enquadre no normativo supra identificado e se tenha produzido prova capaz de impor uma decisão diferente, certo é que, a douta sentença proferida não só não se pronunciou quanto ao alegado, como fez uma aplicação da lei contrária aos fins do direito, como se pretende mostrar,
Pese embora tenha sido oferecida prova documental que denota a aplicação do supramencionado artigo, a decisão proferida ignora tal realidade, desmerece a prova oferecida pela Recorrente, olvida as normas excecionais previstas no Regulamento, e faz uma aplicação errónea do direito.
(…).
Face ao exposto e ao que se pretende evidenciar infra, impõe-se a apresentação do presente recurso, a título excecional, atenta a pertinência das razões aqui invocadas, de forma a permitir concluir justificar-se a sua apreciação por ocorrência de um erro grave, incomum e notório, para que a solução jurídica contida na decisão recorrida, não possa manter-se.”.
Ou seja o que se verifica, é que os motivos para justificar a admissibilidade do recurso, “com vista à melhoria da aplicação do direito”, (já que ao contrário do que refere o Ministério Público na sua resposta, a arguida nas suas alegações não invoca a necessidade de ver o recurso admitido extraordinariamente por necessidade de uniformização de jurisprudência, - não permitindo considerar que assim seja, o que alega no ponto 8, “…e existe inúmera jurisprudência…”-) são apenas manifestação de discordância com o entendimento seguido na decisão recorrida e a conclusão que formula.
Nada alegou, nem fundamenta de modo algum aquilo que alega “permitir concluir justificar-se a sua apreciação por ocorrência de um erro grave, incomum e notório,”, apenas, se verificando que a mesma o que pretende é a reapreciação da decisão quanto à invocada exceção consagrada no artigo 12º do Regulamento 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15 de Março de 2006, mas, sem que antes de entrar propriamente nas questões decididas na sentença, tenha alegado “razões para justificar a manifesta necessidade da aceitação do recurso por tal ser necessário à melhor aplicação do direito.”, como bem se refere, no (Ac. desta Relação de 10.12.2019, relatado pelo Desembargador Jerónimo Freitas, in www.dgsi.pt).
Ou seja, a recorrente alega, quer na 1ª parte do requerimento quer na 2ª parte do mesmo que, apelida “do recurso” sempre, apenas, a questão da necessidade de aplicação do artigo 12º do Regulamento supramencionado, alegando que a decisão recorrida não só não se pronunciou quanto ao alegado, como fez uma aplicação da lei contrária aos fins do direito e concluindo que a situação em causa não pode ser resolvida sem que seja aplicado o artigo 12º do Regulamento, ou, pelo menos, se fundamente a sua não aplicação, o que não aconteceu, sendo os motivos que invoca para justificar a admissibilidade do recurso os mesmos, o que não é fundamento bastante para justificar aquela, nesta sede.
Sendo, esta razão, bastante para se concluir pela inadmissibilidade do recurso.
Pois, o que se verifica é que a arguida para além de um divergente entendimento não fundamentado com a aplicação dos dispositivos considerados na decisão recorrida, não indica fundamentadamente nenhum erro grosseiro, notório ou incomum, ou uma errónea aplicação do direito bem visível, que torne manifestamente necessário para a melhoria da aplicação do direito a admissibilidade do recurso.
Necessário como se refere naquele Acórdão citado e se lê, no sumário do (Ac. do STJ de 19.01.2012, revista excecional n.º 837/09.5TBMAI.P1.S1, disponível in www.stj.pt), no sentido de que questão com relevância jurídica necessária para uma melhor aplicação do direito “é a que seja manifestamente complexa, de difícil resolução, na doutrina e na jurisprudência, e cuja subsunção jurídica imponha um importante e detalhado exercício de exegese, com o objetivo de se vir a obter um consenso quanto à provável interpretação das normas à mesma aplicáveis”.
Em idêntico sentido, tem sido o entendimento desta secção, como o demonstra aquele acórdão já citado e os demais referidos nos autos e ainda, a este propósito, o (Ac. desta Relação de 24.01.2018, relator Desembargador Rui Penha, aqui, 2º Adjunto (ao que supomos inédito)), no qual se lê: «consignou-se no recente acórdão desta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto de 4 de Dezembro de 2017, proferido no âmbito do processo nº 82/17.6T8OAZ.P1, relatado pelo aqui adjunto e que se subscreve integralmente: “Conforme é entendimento pacífico e unânime da jurisprudência dos Tribunais das Relações, a aceitação do recurso por se afigurar manifestamente necessário à melhor aplicação do direito só tem justificação quando da decisão impugnada se observe um erro jurídico grosseiro, incomum, uma errónea aplicação do direito bem visível, não se destinando, pois, a corrigir eventuais erros de julgamento [cfr. Ac. Rel. Évora, de 27-05-2008, proc.º 883/08-1, Desembargador Ribeiro Cardoso; Ac. Rel. Coimbra, de 9-12-2010, Proc.º 51/10.7TTTMR.C1, Desembargador Azevedo Mendes; Ac. Rel. Porto de 24-09-2012, proc.º 426/11.4TTBGC.P1, Desembargador Eduardo Petersen Silva; Ac. Rel. Coimbra, de 13-10-2016, proc.º 2368/15.5T8CBR.C1, Desembargadora Paula Paço; (todos disponíveis em www.dgsi.pt)].
“Nesta linha de entendimento, no recente Acórdão desta Relação, de 5 de Janeiro de 2017 [proferido no Recurso n.º 5426/15.2T8OAZ.P1, Desembargador Nelson Fernandes], escreve-se o seguinte:
“- «não esclarecendo a lei o que deve entender-se por “manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência”, importa desde já assinalar, por manifesto, e em primeira abordagem, que o objectivo perseguido da melhoria da aplicação do direito não poderá traduzir-se na possibilidade de ser sindicada toda e qualquer decisão de que discorde o arguido ou o Ministério Público. Por outro lado, ainda, estando de facto em causa a melhoria na aplicação do direito, o recurso fica no entanto limitado às situações em que tal se apresente “manifestamente necessário”.
“Como refere Paulo Pinto de Albuquerque (Comentário do Regime Geral das Contraordenações à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem”, Universidade Católica, Lisboa, 2011, pág. 303), a questão, jurídica da “melhoria da aplicação do direito”, tendencialmente preencherá três requisitos: (i) ser relevante para a decisão da causa, (ii) ser uma questão que necessita de esclarecimento e (iii) ser passível de abstração no sentido de que permita o isolamento de uma ou mais regras gerais aplicáveis a casos similares.
“Tratando-se de um recurso de natureza extraordinária, já que apenas tem lugar quando não for admissível a interposição de recurso ordinário, visa essencialmente preservar a correcção do direito e a uniformidade da sua aplicação, sendo que após o RGCOC passou a estar também consagrado primeiro no Código do Processo dos Tribunais Administrativos, através do artigo 150.º, e depois no Código de Processo Civil, mediante o artigo 721.º-A (aditado pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto) – actualmente artigo 672.º, n.º 1, al. a), com a ressalva neste último, que não assume aqui relevo, de que se utiliza o advérbio claramente em vez de manifestamente, sendo que, então, ao abrigo dessa norma, a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que questão com relevância jurídica necessária para uma melhor aplicação do direito “é a que seja manifestamente complexa, de difícil resolução, na doutrina e na jurisprudência, e cuja subsunção jurídica imponha um importante e detalhado exercício de exegese, com o objetivo de se vir a obter um consenso quanto à provável interpretação das normas à mesma aplicáveis” (cf. sumário do acórdão de 19-01-2012, revista excecional n.º 837/09.5TBMAI.P1.S1, disponível em www.stj.pt, sumários de acórdãos de apreciação liminar-revista excecional). Aliás, dentro do citado objectivo se podem enquadrar, afinal, no domínio criminal, os acórdãos de fixação de jurisprudência (artigo 437.º e seguintes do Código de Processo Penal)».””».
Ora aplicando o que se vem de expor ao caso, como já dissemos, por esta via, o presente recurso não é admissível.
Pois, não se vislumbra, nem indica a recorrente outros fundamentos que não seja a sua divergência, quanto ao decidido na sentença recorrida, por a seu ver o entendimento, ali seguido não ser o correcto, não tendo o por si alegado a virtualidade de justificar o recurso extraordinário pretendido, nem se vislumbram argumentos que possam sustentar um eventual erro grosseiro, notório ou incomum que torne, manifestamente necessário, para a melhoria da aplicação do direito, a admissibilidade do recurso.
Neste sentido, decidiu-se, também, nos (Acórdãos desta Relação de 14.02.2022, Proc. nº 1573/21.0T8AGD.P1 e de 13.07.2022, Proc. nº 5703/21.3T8MTS.P1 in www.dgsi.pt) em cujos sumários se lê, “A aceitação do recurso por se afigurar manifestamente necessário à melhor aplicação do direito só tem justificação, quando na decisão impugnada se observe um erro jurídico grosseiro, incomum, uma errónea aplicação do direito bem visível, não se destinando a corrigir, eventuais, erros de julgamento.
Sendo deste modo, a arguida não pode pretender, apenas, que este Tribunal aprecie o, eventual, erro de julgamento do Tribunal “a quo” na aplicação do direito, porque, como já supra exposto, o recurso, também, não é admissível nos termos do nº 1, do referido art. 49º do RPCOLSS.
Conclui-se, pois, que na verdade, o que a arguida pretende é sujeitar à apreciação deste Tribunal “ad quem” o, eventual, erro de julgamento do Tribunal “a quo” na aplicação do direito.
Acontece, porém, que a sua discordância com o decidido não é o suficiente para justificar a admissibilidade do recurso a título extraordinário.
Restando concluir, pela inadmissibilidade do recurso.
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III – DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta secção em não admitir o recurso interposto.
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Custas a cargo da recorrente, fixando-se a taxa de justiça em duas UC’s.

Após trânsito em julgado deste Acórdão, comunique à ACT, com cópia certificada do mesmo.






Porto, 14 de Outubro de 2024

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O presente acórdão é assinado electronicamente pelas respectivas,

Relatora: (Rita Romeira)
1º Adjunto: (António Gomes)
2º Adjunto: (Rui Penha)