I - O art. 3.º, al. a), do Regulamento (CE) n.º 469/2009, de 06-05-2009, relativo ao certificado complementar de protecção (CCP) para os medicamentos, deve interpretar-se no sentido de que um produto composto por um princípio activo é “protegido por uma patente de base em vigor” quando esse princípio activo esteja expressamente mencionado nas reivindicações da patente de base invocada em apoio desse pedido, através de uma definição estrutural ou até mesmo, em determinadas condições, funcional, desde que, com base em tais reivindicações, interpretadas em particular de acordo com a descrição da invenção, conforme prescrito no artigo 69 da Convenção Europeia de Patentes e no Protocolo Interpretativo da mesma, seja possível concluir que essas reivindicações visavam, implícita mas necessariamente, o princípio ativo em causa, de forma específica.
II - Para o efeito, dois requisitos cumulativos se devem verificar: Por um lado, o produto deve necessariamente ser incluído, para o especialista na matéria, à luz da descrição e dos desenhos da patente básica, na invenção objeto da referida patente. Por outro lado, o técnico no assunto deve ser capaz de identificar especificamente este produto à luz de todos os elementos divulgados pela referida patente e com base nos seus conhecimentos gerais no domínio em questão à data de depósito ou de prioridade da patente de base e na evolução técnica nessa mesma data.
“MERCK SHARP & DOHME, CORP”, “MERCK SHARP & DOHME, LIMITED” e “MERCK SHARP & DOHME, LDA.”, melhor identificadas nos autos, instauraram acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra “SANDOZ, BV” e “SANDOZ FARMACÊUTICA, LDA.”, melhor identificadas nos autos, em que pedem que estas últimas sociedades sejam condenadas a:
a) Abster-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, por si ou por terceiro importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer quaisquer medicamentos que contenham sitagliptina como substância ativa, como única substância ativa ou em associação com outras substâncias ativas, incluindo, mas não apenas, os que são objeto dos pedidos de AIM identificados no art. 140.º da petição inicial, enquanto a EP 142357 e/ou o CCP 278 se encontrarem em vigor.
b) Abster-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, por si ou por terceiro importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer quaisquer medicamentos que contenham sitagliptina como substância ativa, como única substância ativa ou em associação com outras substâncias ativas, incluindo, mas não apenas, os que são objeto dos pedidos de AIM identificados no art. 140.º da petição inicial, até ao termo da vigência do CCP 339.
c) abster-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, por si ou por terceiro, importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer quaisquer medicamentos que compreendam a associação de substâncias ativas sitagliptina e metformina, até ao termo da vigência do CCP 339;
As rés “SANDOZ, BV” e “SANDOZ FARMACÊUTICA, LDA.” apresentaram contestação e deduziram reconvenção, na qual pediram a revogação do CCP 339 e o cancelamento do seu registo, conforme requerimento que aqui se dá por integralmente reproduzido.
Foi proferido saneador-sentença, que, para além do mais, absolveu às rés “SANDOZ, BV” e “SANDOZ FARMACÊUTICA, LDA.” do pedido formulado na al. a) da petição inicial respeitante ao CCP 278, com fundamento na verificação da excepção dilatória da litispendência.
Na parte respeitante à excepção dilatória da litispendência, esta decisão veio a ser confirmada pelo acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no dia 21-10-2021, no âmbito do Proc. n.º 83/20.7YHLSB-A.L1.
Por sentença proferida no dia 26-03-2023, que aqui se dá por integralmente reproduzida, o Tribunal da Propriedade Intelectual – J3 julgou improcedentes os pedidos principais, absolvendo as rés “SANDOZ, BV” e “SANDOZ FARMACÊUTICA, LDA.” desses pedidos e julgou procedente o pedido reconvencional apresentado pelas rés e, em consequência, declarou a nulidade do certificado complementar de protecção n.º 339.
APELAÇÃO
Inconformadas com a sentença proferida, as autoras “MERCK SHARP & DOHME, LLC”, “MERCK SHARP & DOHME, BV” e “MERCK SHARP & DOHME, LDA.” dela interpuseram recurso de apelação para o tribunal da Relação de Lisboa, de facto e de direito, concluindo que “o Tribunal a quo violou o disposto no art. 3.º, als. a), c) e d), do Regulamento CCP e – pelo menos – os arts. 69.º da CPE, e o respetivo artigo 1.º do Protocolo Interpretativo e ainda os arts. 83.º e 84.º da CPE.”.
As Rés SANDOZ, BV” e “SANDOZ FARMACÊUTICA, LDA.” responderam ao recurso, sustentado, muito em síntese, que “(…) resulta por demais evidente que o CCP339 é nulo por não preencher os requisitos das alíneas a), c) e d) do artigo 3.º do Regulamento CCP, pelo que o Tribunal a quo andou bem ao declarar a nulidade e, em consequência, revogar aquele CCP, devendo, assim, o recurso interposto pelas Recorrentes ser julgado totalmente improcedente em conformidade (…)”.
Foi proferido Acórdão que teve o seguinte dispositivo:
Em face do exposto, acordam os juízes que integram a secção da propriedade intelectual, concorrência, regulação e supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa em:
--declarar a impossibilidade e inutilidade superveniente da lide, no que diz respeito aos pedidos apresentados pelas autoras/recorrentes “MERCK SHARP & DOHME, LLC”, “MERCK SHARP & DOHME, BV” e “MERCK SHARP & DOHME, LDA.” nas als. b) e c) da petição inicial;
--julgar procedente o recurso interposto pelas autoras/recorrentes “MERCK SHARP & DOHME, LLC”, “MERCK SHARP & DOHME, BV” e “MERCK SHARP & DOHME, LDA.” e, em consequência, determina-se a eliminação dos arts. 36.º, 37.º, 38.º, 98.º, 102.º, 103.º e 104.º da matéria de facto considerada como provada pelo tribunal de primeira instância.
- julgar procedente o recurso interposto pelas autoras/recorrentes “MERCK SHARP & DOHME, LLC”, “MERCK SHARP & DOHME, BV” e “MERCK SHARP & DOHME, LDA.” e, em consequência, revoga-se a sentença recorrida na parte em que declarou a nulidade do certificado complementar de protecção n.º 339.
Inconformadas, as Rés Sandoz BV e Sandoz Farmacêutica Lda. apresentaram revista, nos termos dos arts. 627º, n.º 2, 671º, n.º 1 e n.º 3, este último interpretado a contrario sensu, 672º, n.º 1, al. a) do CPC, oferecendo as suas alegações, que concluem nos termos seguintes:
A. O presente recurso tem por objeto o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboanodia 22.04.2024que, julgandooCertificadoComplementarde Proteçãon.º 339 (“CCP339”) válido, revogou a sentença proferida pelo Tribunal da Propriedade Intelectual - que, em sentido diametralmente oposto, declarara a nulidade do CCP339 - conduzindo, em consequência, à absolvição das ora Recorridas do pedido reconvencional deduzido contra as mesmas pelas Recorrentes.
B. No seu recurso de apelação, as Recorridas impugnaram a sentença quanto à matéria de facto dada como provada, face à prova produzida, nomeadamente prova testemunhal e prova documental e as Recorrentes dedicaram uma parte substancial das suas contra-alegações de recurso a contestar a referida impugnação da matéria de facto.
C. O acórdão recorrido não se pronunciou relativamente à referida impugnação sobre a matéria de facto.
D. Com base no artigo 615º, n.º 1 al. d) do CPC a sentença deve considerar-se nula sempre que o Tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
E. A omissão de pronúncia significa, fundamentalmente, a ausência de posição ou de decisão do Tribunal sobre matérias em que a lei imponha que o juiz tome posição expressa.
F. A omissão da reapreciação da prova gravada inquina a sentença com a sanção da nulidade, nos termos do artigo 615º, n.º 1 al. d) do CPC, a qual aqui se deixa arguida para todos os efeitos legais, e invocando-se a violação do artigo 205.º da C.R.P.
G. As questões essenciais colocadas à apreciação deste Douto Tribunal são as seguintes: a. Pode um Tribunal da Relação omitir a apreciação da prova produzida nos autos, quando a reapreciação da matéria de facto está associada, em sede de recurso, à reapreciação da prova produzida? b. Pode o Tribunal eliminar factos dados como provados quando os mesmos refletem os temas da prova fixados nos autos e que não foram objeto de reclamação pelas Partes? c. O artigo 3º, al. a) do Regulamento CCP, não exige que a reivindicação identifique especificadamenteo produto a proteger, bastando paratanto, pois, que o produto possa identificar-se, mesmo que de forma indireta, num grupo de milhões (ou biliões) de combinações de compostos? d. O artigo 3.º, al. a) do Regulamento não exige que a invenção descrita na patente divulgue essa invenção, na perspetiva de um especialista na matéria? e. O artigo 3º, al. c) do Regulamento CCP não exige, para a concessão de um CCP, que a invenção na patente base possa ser identificada pelo perito de acordo com a descrição e desenhos da patente, à luz da jurisprudência do TJUE atual? f. O artigo 3.º, al. d) do Regulamento CCP fica automaticamente preenchido quando a alínea c) estiver preenchida, não constituindo um requisito em separado?
H. Nos presentes autos estão preenchidos os requisitos para admissibilidade da revista ordinária, tal como se prevê nos artigos 629º e 671º do CPC, nomeadamente no que concerne ao valor da ação (superior ao valor da alçada) e de sucumbência (decisão desfavorável quanto às Recorrentes em valor superior a metade da alçada do tribunal).
I. Subsidiariamente, mesmo que não se admitisse o recurso de revista ordinário, o que por mero dever de patrocínio se concebe, sempre seria de admitir o presente recurso enquanto recurso de revista excecional, ao abrigo do disposto nos artigos 627.º, n.º 2, 672.º, n.º 1, alínea a), todos do CPC.
J. As questões colocadas têm indubitável complexidade e o número muito alto de litígios envolvendo titulares de direitos de propriedade industrial e requerentes de pedidos de AIM (ou como abaixo severá titulares de AIM) implicaque a apreciação destas questões jurídicas tem uma relevância que ultrapassa largamente os presentes autos, tendo um impacto previsível em vários outros litígios pendentes, atualmente e no futuro, nos tribunais portugueses.
K. Estão pendentes de apreciação e/ ou julgamento dois reenvios prejudiciais em que parte das questões acima referenciadas serão apreciadas pelo Tribunal de Justiça da União Europeia.
L. Um dos reenvios prejudiciais presentemente pendentes e sob análise pelo Tribunal de Justiça da União Europeia respeita, precisamente, a um CCP para a combinação sitagliptina/metformina com base na patente europeia EP’357.
M. Em particular, estão presentemente pendentes os processos de reenvio prejudicial C-119/22 e C-149/22 no qual o Tribunal de Justiça da União Europeia irá apreciar, entre outros, oacórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça Português no processo n.º 281/17.0YHLSB.L1.S1.
N. Os processos de reenvio prejudicial acima referenciados constituem uma questão prejudicial relevante para os presentes autos,na medida em que as decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia constituem fonte de direito imediata, permitindo a uniformidade e a harmonização na aplicação do direito da União no território dos Estados-Membros, pelo que deverá ordenar-se a suspensão da instância até que sejam proferidas decisões nos processos acima referenciados, por constituírem questão prejudicial aos presentes autos, o que as Recorrentes expressamente requerem.
O. O acórdão recorrido eliminou factos dados como provados, nomeadamente os factos contidos nos pontos 98.º, 102.º, 103.º e 104.º da matéria de facto dada como provada.
P. A presente revista não tem por objeto a reapreciação por este Douto Tribunal da prova produzida nos autos.
Q. As Recorrentes pretendem, ao invés, que este Douto Tribunal aprecie as seguintes questões de direito: Pode um Tribunal da Relação omitir a apreciação da prova produzida nos autos, quando a reapreciação da matéria de facto está associada, em sede de recurso, à reapreciação da prova produzida? e Pode o Tribunal eliminar factos
dados como provados quando os mesmos refletem os temas da prova fixados nos autos
e que não foram objeto de reclamação das Partes?
R. Nenhuma das partes apresentou reclamação sobre os temas da prova fixados em audiência prévia realizada no dia 30 de maio de 2022.
S. Os factos eliminados no acórdão recorrido estão diretamente relacionados com os temas da prova 1) e 2) definidos pelo Tribunal da Propriedade Intelectual e, bem assim, com a causa de pedir deduzida pelas Recorrentes em sede de pedido reconvencional.
T. Ao eliminar os factos contidos nos pontos 98.º, 102.º a 104.º, o Tribunal a quo reduziu, de forma exponencial, a instrução nos termos definidos, e transitados em julgado, pelo Tribunal da Propriedade Intelectual.
U. O Tribunal da Relação, salvo o devido respeito, não aplicou corretamente o disposto no artigo 410.º do CPC, na medida em que desconsiderou a instrução nos termos definidos pelo Tribunal de Primeira Instância.
V. Nos termos da jurisprudência do TJUE aplicável aos presentes autos, caberia às Partes produzir a prova necessária para demonstrar aquilo que seria percecionado pelo especialista na matéria, mas ao eliminar os factos contidos nos pontos 98.º, 102.º a 104.º, o Tribunal aquosimplesmente eliminou a possibilidade do exercício de um direito condigno à produção de prova, no caso por parte das Recorrentes, de modo a demonstrarem os factos subjacentes à sua causa de pedir.
W. O Tribunal a quo interpretou incorretamente o artigo 410.º do CPC, que deverá ser interpretado no sentido de que não podem ser eliminados factos subjacentes a temas da prova definidos pelo Tribunal de Primeira Instância, e que não foram objeto de reclamação pelas Partes.
X. A interpretação da lei deverá partir do princípio dos pressupostos do direito de propriedade industrial, em particular no que concerne ao facto de que estes direitos, incluindo os certificados complementares de proteção, têm como propósito compensar o titular daquele direito por uma invenção.
Y. O direito exclusivo resultante (da concessão) de um certificado complementar de proteção é um desvio às regras da concorrência, com o desígnio e/ ou a justificação (únicos) de incentivar a inovação, de acordo com o interesse público.
Z. O certificado complementar de proteção e o seu monopólio dependem de uma compensação por parte do titular da patente - a divulgação completa da invenção.
AA. Esta troca de um monopólio por uma contribuição técnica é muitas vezes referida como a "contrapartida" do sistema: a divulgação de informações é "o preço que o inventor paga em troca do seu monopólio".
BB. O CCP339 rege-se pelas regras previstas no Regulamento CCP.
CC. A Jurisprudência do TJUE é clara na afirmação de que existem pressupostos que são transversais a todos os requisitos para a concessão de um CCP, e que são os seguintes: i) A apreciação da invençãocontida na patente deve ser feita “aos olhos” do especialista na matéria; ii) Documentos posteriores à data da prioridade da patente não podem ser considerados para efeitos dos requisitos de concessão de um CCP
DD. Da matéria de facto dada como provada jamais se poderia concluir que a reivindicação 30 da EP’357 comporta uma referência específica a uma combinação dos compostos sitagliptina/metformina.
E. Com efeito, apenas foi dado como provado que a reivindicação 30 inclui a sitagliptina, entre milhões de outros compostos, mas não foi julgado provado que aquele composto (a sitagliptina) está especificamente identificado naquela reivindicação.
FF. A interpretação do que significa estar “protegido por uma patente de base em vigor” no sentido da alínea a) do artigo 3.º do Regulamento CCP foi objeto de algumas decisões do TJUE, nomeadamente o Acórdão Medevavs. Comptroller General of Patents, Designs and Trade Marks (C-322/10), de 24.11.2011; Acórdão Eli Lilly vs. Human Genome Sciences (C-493/12), de 12.12.2013; Acórdão Teva vs. Gilead (C‑121/17), de 25.07.2018, proferido pela Grande Secção do TJUE; Acórdão Royalty Pharma Collection (C-650/17) de 30.04.2020, proferida pela Quarta Seção do Tribunal de Justiça.
GG. O que resulta claro das decisões do TJUE é que este último considera que não se poderá ter uma proteção adicional fruto de um CCP que não compreende características técnicas ou características que resolvam o problema técnico objetivo.
HH. A invenção protegida pela patente deverá referir “especificamente um efeito combinado” das duas substâncias ativas, que deverá emergir da descrição da patente base em questão.
II. O mesmo decorre da jurisprudência nacional, nomeadamente do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça no processo n.º 174/21.7YHLSB.L1.S1.
JJ. O CCP339 é nulo por não cumprir o requisito previsto no artigo 3.º, al. a) do Regulamento CCP., devendo, em consequência, julgar-se o recurso procedente e ordenar-se a revogação do CCP339 em conformidade.
KK. O Tribunal a quo interpretou incorretamente o artigo 3.º, al. a) do Regulamento CCP, que deverá ser interpretado no sentido de que o produto deverá estar identificado especificadamente na reivindicação.
LL. O objeto do produto protegido pelo CCP278, contrariamente ao ajuizado pelo acórdão recorrido, é o mesmo do CCP339.
MM. Uma interpretação equidistante do artigo 3.º al. c) do Regulamento CCP juntamente com a matéria de facto dada como provada impõe que se conclua que o objeto do produto protegido pelo CCP278 é o mesmo do CCP339.
NN. A interpretação do que é “ter sido já objeto de um certificado” na aceção da al. c) do artigo 3.º do Regulamento CCP também foi objeto de aturada análise pelo Tribunal da Justiça da União Europeia (“TJUE”), nomeadamente no Acórdão Actavis vs. Sanofi (C-443/12), de 12.12.2013; Acórdão Actavis vs Boehringer (C-577/13), de 12.03.2015.
OO. A jurisprudência do TJUE nos casos C-443/12 e C-577/13 deixa claro que não é possível obter um segundo CCP para uma combinação de substâncias ativas, mesmo que essa combinação esteja especificada nas reivindicações da patente base, se já tiver sido concedido anteriormente um CCP para a substância ativa que constitui o "objeto da invenção" da patente base.
PP. O CCP339 não preenche os requisitos do artigo 3.º, alínea c) do Regulamento CCP, nomeadamente face à supra referida jurisprudência do TJEU.
QQ. As Recorridas já beneficiaram de um certificado complementar de proteção para o produto que constitui, na realidade, o objeto da invenção da patente base EP’357, isto é, o CCP278, relativo ao produto sitagliptina.
RR. Aplicando a jurisprudência do TJUE acima citada, o CCP339 não preenche igualmente o requisito do artigo 3º, al. c) do Regulamento CCP.
SS. Dispõe o artigo 3.º do Regulamento CCP que: O certificado é concedido se no Estado-Membro onde for apresentado o pedido previsto no artigo 7.o e à data de tal pedido.
TT. Foi dado como provado nos pontos 86, 87, 109 a 111 e 113 a 116 da matéria de facto dada como provada que a autorização de introdução no mercado do medicamento Januvia já previa a combinação de sitagliptina e metformina. E, tal autorização de introdução no mercado (com base na qual foi concedido o CCP278) é anterior ao medicamento – Janumet – e respetivo certificado complementar de proteção 339. Logo o produto objeto do CCP339 já tinha sido objeto de CCP anterior.
UU. A escolha da data da apresentação do pedido está em conformidade com as pretensões do Regulamento CCP, que são a harmonização das regras aplicáveis aos CCPs no espaço europeu.
VV. No Considerando 7) do Regulamento CCP, o legislador comunitário foi claro ao afirmar que: “É conveniente prever uma solução uniforme a nível comunitário.”
WW. E no Regulamento n.º 2019/933 que introduz alterações ao Regulamento CCP, o legislador também foi claro ao esclarecer no Considerando 27 daquele Regulamento que: “Habitualmente, um requerente de um certificado apresenta um pedido aproximadamente na mesma data em cada um dos Estados-Membros em que o requer. No entanto, devidoadiferenças nos procedimentosnacionais de apreciação dospedidos, a data de concessão do certificado pode variar significativamente de um Estado-Membro para outro, criando assim disparidades no que se refere à situação jurídica do requerente nos Estados-Membros em que o pedido de certificado foi apresentado. Por conseguinte, prever a exceção com base na data de apresentação do pedido de certificado favorecerá a uniformidade e limitará o risco de disparidades.”
XX. O que importa para a apreciação do artigo 3.º, al. c) do Regulamento CCP é a data do pedido do CCP e não a data da sua concessão, pelo que, não estando preenchido o requisito do artigo 3.º, al. c) do Regulamento CCP, o CCP339 deverá ser declarado nulo em conformidade.
YY. O Tribunal afirmou na decisão recorrida que deveria ter sido provado que o produto do CCP339 havia sido objeto de um CCP278. Ora, conforme resulta da matéria de facto dada como provada nos pontos 86, 87, 109 a 111 e 113 a 116, ficou precisamente demonstrado que o CCP278 (concedido com base no medicamento Janumet) já previa a combinação sitagliptina e metformina.
ZZ. A AIM do medicamento Januvia não foi a primeira AIM para o produto do CCP339, pelo que este (também) não preenche o requisito previsto na alínea d) do artigo 3.º do Regulamento CCP.
AAA. Mesmo que se considere que a reivindicação 30 prevê especificadamente uma associação de sitagliptina/metformina (o que, sem conceder, se equaciona por mero dever de patrocínio), sempre se dirá que nada naquela reivindicação indica que a associação de compostos é fixa ou livre.
BBB. O Tribunal a quo interpretou incorretamente o artigo 3.º, al. d) do Regulamento CCP, que deverá ser interpretado no sentido de que o que importa é o produto nos termos descritos na reivindicação e não o medicamento objeto da AIM.
CCC. O CCP339 é nulo por não preencher os requisitos das alíneas a), c) e d) do artigo 3.º do Regulamento CCP, pelo que deverá o acórdão recorrido ser revogado e substituído por decisão que declare o CCP339 nulo por violação das alíneas a), c) e d) do artigo 3.º do Regulamento CCP.
Termos em que, deve o presente recurso de revista interposto pelas Recorrentes ser admitido, seja pela via ordinário, em primeira linha, ou pela excecional, no limite, e, nessa sequência, apreciado e julgado totalmente procedente, determinando, em consequência, que:
a. O acórdão recorrido deverá ser declarado nulo e ordenada a remessa dos autos ao Tribunal da Relação para reapreciação da prova gravada e proferida nova decisão sobre a matéria de facto dada como provada;
b. Deverá ser ordenada a suspensão da instância até serem decididos os reenvios prejudiciais pendentes no Tribunal de Justiça da União Europeia sobre as matérias de direito em apreço nos presentes autos;
c. O acórdão recorrido deverá ser revogado e ordenada a remessa dos autos ao Tribunal da Relação para inclusão dos factos dados como provados nos pontos 98.º, 102.º a 104.º ou apreciadosostemas daprovaem consonância com a prova produzida nos autos;
d. O acórdão recorrido deverá ser revogado e declarada a nulidade do CCP339 com fundamento na violação do artigo3.º, al. a), c) ou d) do Regulamento CCP.
As autoras MERCK SHARP & DOHME LLC., MERCK SHARP & DOHME B.V. e MERCK SHARP & DOHME LDA. apresentaram contra-alegações, nas quais pugnam pela improcedência da revista e manutenção do decidido no acórdão recorrido, e requereram a ampliação do âmbito do recurso nos termos do art. 636.º do CPC.
As rés apresentaram resposta na qual pugnam pela inadmissibilidade da ampliação do âmbito do recurso.
Admitida a revista e corridos os vistos, cumpre decidir, tendo presente que são as conclusões das alegações recursivas que delimitam o objeto do recurso, estando vedado ao tribunal de recurso conhecer de matérias ou questões nelas não incluídas, com excepção daquelas que são de conhecimento oficioso (cfr. art. 635º nº 4, 639º nº 1, 608º nº 2, ex vi art. 679º, todos do CPC).
OBJECTO DO RECURSO:
Em face das conclusões apresentadas pelas recorrentes, as questões a decidir são as seguintes:
1 - Nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia (conclusões C. a F.);
2 - Violação dos poderes da Relação ao eliminar factos que reflectem os temas da prova e não foram objecto de reclamação (conclusão G., O. a W.);
3 - Suspensão da instância até decisão os reenvios prejudiciais pendentes no TJUE (conclusões K. a N.);
4 – (In)validade do CCP 339 à luz do art. 3.º do Regulamento (CE) n.º 469/2009 (conclusões X. a CCC.);
5 - Nulidade da sentença e do acórdão recorrido por excesso de pronúncia (ampliação do âmbito do recurso pelas recorridas).
Antes do mais, reproduzamos aqui a factualidade que as instâncias julgaram provada:
1. As Autoras “MERCK SHARP & DOHME, CORP”, “MERCK SHARP & DOHME, LIMITED”, e “MERCK SHARP & DOHME, LDA têm como atividades a investigação, a indústria e/ou o comércio de produtos farmacêuticos, integrando o chamado Grupo MSD.
2. Em 1999, a MSD iniciou a investigação na área da diabetes.
3. A Diabetes Mellitus é uma doença crónica causada por fatores hereditários e/ou deficiência na produção de insulina no pâncreas, ou ainda pela ineficácia da insulina produzida.
4. Esta deficiência resulta num aumento da concentração de glucose no sangue, provocando danos, por exemplo, nos vasos sanguíneos e nos nervos.
5. As duas principais formas de diabetes são a Diabetes Mellitus tipo 1 e a tipo 2.
6. Na diabetes tipo 1, mais comum em pessoas jovens, o organismo deixa de produzir, de forma súbita, a única hormona capaz de baixar a glicemia: a insulina.
7. As pessoas com diabetes tipo 1 têm de ser tratadas com insulina e precisam de injeções desta hormona para viver.
8. A diabetes tipo 2 surge habitualmente em pessoas com mais idade estando na sua origem uma incapacidade do organismo para produzir em quantidade suficiente a insulina aliada a uma resistência do organismo a esta mesma hormona.
9. A diabetes tipo 2 é muito mais frequente do que a diabetes tipo 1 (cerca de 90-95% dos casos de diabetes em todo o mundo), sendo que dados recentes mostram que cerca de 150 (cento e cinquenta) milhões de pessoas, em todo o mundo, sofrem de Diabetes Mellitus.
10. Este aumento deverá ocorrer sobretudo nos países em desenvolvimento e será devido ao crescimento populacional, ao envelhecimento, às dietas não saudáveis, à obesidade e ao sedentarismo.
11. Em Portugal, cerca de 13% da população tem diabetes.
12. Sitagliptina é o nome genérico usado em Farmácia (DCI – Denominação Comum Internacional) do composto cujo nome químico é:
(2R)-4-oxo-4-[3-(trifluorometil)-5,6-di-hidro[1,2,4]triazolo[4,3 a]pirazin-7(8H)-il]-1-(2,4,5-trifluorofenil)butan-2-amina
Ou
(3R)-3-Amino-1-[5,6-di-hidro-3-(trifluorometil)-1,2,4-triazolo[4,3-
a]pirazin7(8H)-il]-4-(2,4,5-trifluorofenil)-1-butanona (nome CAS10),
também conhecido por 7-[(3R)-3-amino-1-oxo-4-(2,4,5-trifluorofenil)butil]-5,6,7,8-tetra-hidro-3-(trifluorometil)-1,2,4-triazolo[4,3 a]pirazina, de fórmula:
13. O nome químico e a estrutura da Sitagliptina podem verificar-se por via das publicações e bases de dados científicas internacionais de referência neste âmbito, como é o caso da enciclopédia clássica “The Merck Index”, cujo excerto se encontra junto aos autos como Doc. n.º 1 e cujo teor se dá por reproduzido.
14. As primeiras referências que aparecem em "The Merck Index", referentes à Sitagliptina, são o pedido de patente internacional com o número de publicação WO 03004498 (publicado em 2003) e a patente norte-americana correspondente US 6699871 (concedida em 2004), ambos da Merck & Co, Inc.
15. Esta família de patentes diz respeito a uma família de compostos à qual pertence a Sitagliptina.
16. A Sitagliptina é normalmente utilizada sob a forma de Fosfato Mono-hidratado como substância ativa em medicamentos.
17. A Sitagliptina encontra-se indicada no tratamento de doentes adultos com Diabetes Mellitus tipo 2, para melhorar o controlo dos níveis de glucose (açúcar), quer em monoterapia, quer em terapêutica oral dupla em associação com a metformina, quer ainda em terapêutica oral tripla em associação com, por exemplo, metformina e uma sulfonilureia. Está também indicado como terapêutica adjuvante à insulina, com ou sem metformina, quando a dieta e o exercício, associados a uma dose estável de insulina, não proporcionam um adequado controlo dos níveis de glucose no sangue.
18. A diabetes de tipo 2 é uma doença na qual o pâncreas não produz insulina suficiente para controlar os níveis de glucose no sangue ou em que o organismo não é capaz de utilizar a insulina de forma eficaz.
19. A substância Sitagliptina é um inibidor da dipeptidil peptidase-4 (doravante designada apenas por “DPP-IV”), que atua bloqueando a degradação das hormonas “incretinas” no organismo.
20. Estas hormonas são libertadas após as refeições e estimulam a produção de insulina pelo pâncreas.
21. Ao aumentar os níveis de hormonas incretinas no sangue, a Sitagliptina estimula a produção de mais insulina pelo pâncreas quando os níveis de glucose no sangue são elevados. A Sitagliptina não atua quando os níveis de glucose no sangue são baixos.
22. A Sitagliptina também reduz igualmente a quantidade de glucose produzida pelo fígado, através do aumento dos níveis de insulina e da redução dos níveis da hormona glucagon.
23. Antes de a substância ativa Sitagliptina ser divulgada, já se sabia que os inibidores da DPPIV poderiam ser úteis no tratamento da diabetes, em particular, da diabetes tipo 2.
24. No entanto, os novos compostos inibidores da enzima DPP-IV divulgados na EP 1 412 357, em particular para o tratamento ou prevenção da diabetes tipo 2, incluindo a Sitagliptina, não eram ainda conhecidos.
25. A metformina pertence a uma classe de medicamentos denominados biguanidas e é um agente antidiabético que permite o controlo do açúcar no sangue por via da inibição da produção de glucose pelo fígado e da redução da sua absorção no intestino.
*** PATENTE EUROPEIA 1 412 357 ***
26. A Primeira Autora é titular da EP 1 412 357, com a epígrafe "BETA-AMINO-TETRAHIDROIMIDAZO (1,2-A) PIRAZINAS E BETA-AMINOTETRA-HIDROTRIAZOLO (4,3-A) PIRAZINAS COMO INIBIDORES DA DIPEPTIDIL-PEPTIDASE PARA O TRATAMENTO OU PREVENÇÃO DE DIABETES", sendo as demais Autoras licenciadas da MSD CORP (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
27. A EP 1 412 357 foi pedida ao Instituto Europeu de Patentes em 05.07.2002, tendo sido publicada a menção da sua concessão no Boletim da Patente Europeia n.º 2006/12 (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação).
28. A EP 1 412 357 reivindica a prioridade da patente norte-americana US 303474 P, de 06.07.2001 (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação).
29. Em Portugal, foi apresentada no INPI a tradução em português do fascículo da Patente em 17.05.2006, conforme publicação no Boletim da Propriedade Industrial n.º 7/2006, assegurando-se assim a produção de efeitos da mesma em Portugal (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação).
30. A EP 1 412 357 vigorou até 5 de julho de 2022. ((facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação).
31. As reivindicações da EP 1 412 357 são as que constam do documento junto como Doc. n.º 2 que aqui se dá por integralmente reproduzido (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
32. A reivindicação 1 abrange uma família de compostos, à qual pertence a Sitagliptina, e que apresenta a fórmula geral (I):
e os seus sais farmaceuticamente aceitáveis e os seus diastereómeros individuais. (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
33. Os diferentes substituintes representados na fórmula geral (I) representada no artigo anterior têm os significados referidos nesta reivindicação 1 ((facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
34. Esta fórmula corresponde à Sitagliptina e seus sais farmaceuticamente aceitáveis quando:
a. Ar representa 2,4,5-trifluorofenilo, ou seja, Ar é fenilo e está substituído com 3 R3, sendo R3 um halogéneo (1);
b. X é N (1); e
c. R1 representa CF3, ou seja, R1 é um alquilo C1 substituído com 3 halogéneos (3). (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação).
35. A reivindicação 1 abrange, assim, uma família de compostos, a que pertence a Sitagliptina, ou seja:
(facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
Factos provados n.ºs 36, 37 e 38 eliminados pelo acórdão recorrido.
39. A reivindicação 2 compreende uma subfamília de compostos de fórmula Ia, que é semelhante à fórmula I, mas especifica qual a configuração estereoquímica dos compostos:
40. A reivindicação 3 reivindica uma subfamília de compostos de fórmula Ib, que é semelhante à fórmula I, mas especifica qual a configuração dos compostos, em que X representa N:
41. A reivindicação 4 inclui compostos de fórmula Ic, que é semelhante à fórmula I, mas especifica a configuração dos compostos, na qual X não representa N:
42. A reivindicação 5 é uma reivindicação dependente de qualquer uma das reivindicações 1 a 4 e revela uma realização preferencial do substituinte Ar.
43. A reivindicação 6 é uma reivindicação dependente da reivindicação 5 e revela uma realização ainda mais preferencial do substituinte Ar.
44. A reivindicação 7 é uma reivindicação dependente de qualquer uma das reivindicações 1 a 6 e revela uma realização preferencial do substituinte R1.
45. A reivindicação 8 é uma reivindicação dependente da reivindicação 7 e revela uma realização ainda mais preferencial do substituinte R1.
46. A reivindicação 9 é uma reivindicação dependente da reivindicação 8 e revela uma realização ainda mais preferencial do substituinte R1.
47. A reivindicação 10 é uma reivindicação dependente da reivindicação 9 e revela uma realização ainda mais preferencial do substituinte R1.
48. A reivindicação 11 é uma reivindicação dependente de qualquer uma das reivindicações 1 a 10 e revela uma realização preferencial do substituinte R2.
49. A reivindicação 12 é uma reivindicação dependente da reivindicação 11 e revela uma realização preferencial do substituinte R2.
50. A reivindicação 13 é uma reivindicação dependente da reivindicação 12 e revela uma realização preferencial do substituinte R2.
51. A reivindicação 14 é uma reivindicação dependente de qualquer uma das reivindicações 1 a 13 e revela uma realização preferencial do substituinte R3.
52. A reivindicação 15 reivindica uma série de compostos, bem como os seus sais farmaceuticamente aceitáveis, devidamente representados pelas suas fórmulas. (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
53. Sitagliptina é o segundo composto da página 8 das reivindicações. (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
54. A reivindicação 16 reivindica uma composição farmacêutica que compreende um veículo inerte e um composto de qualquer das reivindicações 1 a 15 ou um seu sal farmaceuticamente aceitável.
55. A reivindicação 17 reivindica um composto de qualquer uma das reivindicações 1 até 15 ou um seu sal farmaceuticamente aceitável para ser utilizado na inibição da atividade da enzima dipeptidil-peptidase-IV.
56. A reivindicação 18 reivindica um composto de qualquer uma das reivindicações 1 até 15 ou um seu sal farmaceuticamente aceitável no fabrico de um medicamento para tratar, controlar ou prevenir uma série de doenças, nomeadamente, a diabetes e a diabetes mellitus não insulinodependente (tipo 2
57. A reivindicação 19 reivindica a utilização de um composto de qualquer uma das reivindicações 1 até 15, ou um seu sal farmaceuticamente aceitável, no fabrico de um medicamento para tratar, controlar ou prevenir uma série de estados, nomeadamente a hiperglicemia (1), ou outros distúrbios nos quais a resistência à insulina é uma componente.
58. A reivindicação 20 reivindica a associação de um composto de qualquer uma das reivindicações 1 até 15, ou um seu sal farmaceuticamente aceitável, e um ou mais de outros compostos selecionados dos grupos aí devidamente listados (de (a) a (n)).
59. A reivindicação 20 compreende, inter alia, a associação da Sitagliptina, ou de um seu sal farmaceuticamente aceitável, com um ou mais dos compostos listados nessa reivindicação (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
60. Em concreto, esta reivindicação compreende a associação da Sitagliptina, ou de um seu sal farmaceuticamente aceitável, e sensibilizadores para a insulina do grupo constituído por biguanidas (em (b) (ii)) – classe a que pertence a Metformina. (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
61. A reivindicação 21 reivindica a associação de um composto de qualquer uma das reivindicações 1 até 15 ou um seu sal farmaceuticamente aceitável, e um inibidor de HMGCoA-redutase. (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
62. A reivindicação 22 é uma reivindicação dependente da reivindicação 21 e especifica que o inibidor de HMG-CoA-redutase é uma estatina.
63. A reivindicação 23 especifica que a estatina é selecionada a partir de um grupo aí devidamente identificado.
64. A reivindicação 24 reivindica uma composição farmacêutica para o tratamento, prevenção e controlo da aterosclerose que compreende (1) um composto de qualquer das reivindicações 1 a 15 ou um seu sal farmaceuticamente aceitável, (2) um inibidor de HMG-CoA-redutase e (3) um veículo farmaceuticamente aceitável.
65. A reivindicação 25 é uma reivindicação independente e reivindica uma composição farmacêutica que compreende:
1.º um composto de qualquer das reivindicações 1 a 15, ou um seu sal farmaceuticamente aceitável (onde se inclui a Sitagliptina); e
2.º um ou mais de outros compostos selecionados dos grupos aí devidamente listados (de (a) a (n)) (onde se inclui a Metformina); e
3.º um veículo farmaceuticamente aceitável. (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
66. A reivindicação 26 é uma reivindicação dependente da reivindicação 15 e especifica melhor uma série de compostos, e os seus sais farmaceuticamente aceitáveis, devidamente representados pelas suas fórmulas.
67. A Sitagliptina é o quarto composto da página 18 das reivindicações.
68. A reivindicação 27 é uma reivindicação dependente da reivindicação 26 e refere-se especificamente a um composto que não é a Sitagliptina nem um seu sal farmaceuticamente aceitável.
69. A reivindicação 28 é uma reivindicação dependente da reivindicação 26 e refere-se especificamente à Sitagliptina, bem como aos seus sais farmaceuticamente aceitáveis, representada da seguinte forma:
70. A reivindicação 29 é uma reivindicação dependente da reivindicação 26 e refere-se especificamente a um composto que não é a Sitagliptina nem um seu sal farmaceuticamente aceitável.
71. A reivindicação 30 é uma reivindicação dependente da reivindicação 25 e diz respeito a uma composição farmacêutica compreendendo um composto de qualquer das reivindicações 1 a 15, ou um seu sal farmaceuticamente aceitável, com metformina e um veículo farmaceuticamente aceitável. (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
*** CCP 278 ***
72. A Primeira Autora é igualmente titular, sendo as demais Autoras suas licenciadas, do Certificado Complementar de Proteção n.º 278. (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
73. A Certidão do CCP 278 refere que o produto abrangido é “SITAGLIPTINA”.
74. O CCP 278 indica a EP 1 412 357 como a “patente base”. (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
75. Do do CCP 278 também consta que a primeira autorização de introdução no mercado europeu de um medicamento contendo a Sitagliptina como substância ativa ocorreu em 21.03.2007 (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
76. Tal como foi certificado pelo INPI, o CCP 278, cuja patente base é a EP 1 412 357, produziria efeitos a partir do dia 6 de julho de 2022, mas, nos termos do artigo 13.º, n.º 1 Regulamento (CE) 469/2009, o mesmo tem uma duração inferior à da sua Patente Base (a sua vigência terminaria em 23.03.2022), pelo que não chegará a vigorar. (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
*** CCP 339 ***
77. A Primeira Autora é ainda titular, sendo as demais Autoras suas licenciadas, do Certificado Complementar de Proteção n.º 339. (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
78. A certidão do CCP refere que o produto abrangido é a sitaglitina/ (cloridrato de) Metformina.
79. O CCP 339 indica a EP 1 412 357 como a “patente base”.
80. Como também consta do CCP 339, a primeira autorização de introdução no mercado europeu de um medicamento compreendendo a associação de substâncias ativas Sitagliptina e Metformina ocorreu em 08.04.2008, na Suíça, a qual faz parte do Espaço Económico Europeu (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
81. Tal como foi certificado pelo INPI, o CCP 339, cuja patente base é a EP 1 412 357, produzirá efeitos a partir do dia 6 de julho de 2022 e a sua vigência terminará em 8 de abril de 2023 (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação)
****
82. Em Portugal, a MSD obteve Autorizações de Introdução no Mercado para medicamentos contendo Sitagliptina como única substância ativa e sitagliptina em associação com Metformina.
83. No mercado português, os medicamentos de referência que contêm Sitagliptina como única substância ativa, encontram-se efetivamente disponíveis na forma farmacêutica de comprimido revestido por película, nas dosagens de 25mg, de 50 mg e de 100 mg, e são comercializados sob as marcas comerciais Januvia® e Xelevia® (cf. Docs. n.ºs 10 e 11, que se juntam e dão por integralmente reproduzidos).
84. Encontram-se igualmente disponíveis no mercado português medicamentos que compreendem como substâncias ativas Sitagliptina em associação com Metformina, os quais são comercializados na forma farmacêutica de comprimido revestido por película, nas dosagens 1000 mg + 50 mg e 850 mg + 50 mg, sob as marcas comerciais Janumet®, Efficib® e Velmetia® (cf. Docs. nº 4).
85. A MSD LDA, filial do Grupo MSD, é a sociedade que, em Portugal, comercializa todos os medicamentos de referência contendo Sitagliptina como substância ativa, em monoterapia ou em associação com Metformina entre os quais se encontra o medicamento de referência Januvia® (Sitagliptina) e o medicamento Janumet® (Sitagliptina + Metformina).
86. Do Resumo do EPAR (Relatório Público Europeu de Avaliação) destinado ao público do Januvia® resulta que este medicamento se encontra indicado para o tratamento de (cf. cit. Doc. n.º 12, páginas 1 e 2) “(…) de doentes com diabetes de tipo 2 para melhorar o controlo dos níveis de glucose (açúcar) no sangue. É utilizado em associação com dieta e exercício das seguintes formas:
- em monoterapia (medicamento único), em doentes não controlados de forma adequada com dieta e exercício físico e para os quais a administração de metformina (um medicamento antidiabético) não é apropriada;
- em associação com metformina ou um agonista do PPAR-gama (um tipo de medicamento antidiabético) como a tiazolidinediona, em doentes não controlados de forma adequada com metformina ou o agonista do PPAR-gama em monoterapia;
- em associação com uma sulfonilureia (outro tipo de medicamento antidiabético) em doentes não controlados de forma adequada com uma sulfonilureia em monoterapia e para os quais a administração de metformina é inapropriada;
- em associação com metformina e uma sulfonilureia ou um agonista do PPAR-gama quando uma terapêutica dupla com estes fármacos não proporciona o controlo adequado;
- em associação com insulina, associada ou não à metformina, em doentes não controlados de forma adequada com uma dose estável de insulina.”
87. Do Resumo do EPAR destinado ao público do Janumet® resulta que este medicamento se encontra indicado para o tratamento de (cf. cit. Doc. n.º 13, página 1) “(…) e doentes com diabetes de tipo 2, para melhorar o controlo dos níveis de glucose (açúcar) no sangue. É utilizado em associação com dieta e exercício físico das seguintes formas:
- em doentes não controlados de forma satisfatória com metformina (um medicamento antidiabético) em monoterapia (isoladamente);
- em doentes que já tomam uma associação de sitagliptina e metformina, em comprimidos separados;
- em associação com uma sulfonilureia, um agonista do PPAR-gama (como uma tiazolidinediona) ou com insulina (outros tipos de medicamentos antidiabéticos) em doentes não controlados de forma satisfatória com cada um destes medicamentos e metformina.”
88. De acordo com as listas publicitadas no dia 6 de novembro de 2019, na página eletrónica oficial do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos da Saúde I.P., a Primeira Ré requereu as AIMs a seguir identificadas nos termos em que constam da mesma lista: (facto assente por acordo – cf. art. 41.º da contestação
Quadro explicativo.
89. Os Genéricos SANDOZ compreendem a associação de substâncias ativas Sitagliptina e Metformina.
90. As Autoras não concederam às Rés qualquer autorização para explorar, por qualquer meio, as invenções protegidas pela Patente e pelos CCPs supra mencionados.
(Requerimento de ampliação do pedido)
91. Enquanto titular da AIM em causa, a Ré Sandoz Lda. iniciou os procedimentos administrativos atinentes à comercialização do seu medicamento genérico, nomeadamente em matéria de preços – tendo sido atribuído o preço de venda ao público de € 21,08 para o blister de 56 unidades para a dosagem 1000 mg + 50 mg e o preço de venda ao público de € 23,08 para o blister de 56 unidades para a dosagem 850 mg + 50 mg – e de comparticipação pelo Sistema Nacional de Saúde, no caso, de 90%.
92. Uma vez concluídos os procedimentos administrativos acima referidos, a Ré Sandoz notificou o INFARMED do início da comercialização dos seus medicamentos genéricos, constando os mesmos da base de dados oficial do INFARMED como “comercializados” em ambas as dosagens.
93. A Ré Sandoz Lda lançou efetivamente os seus medicamentos genéricos contendo sitagliptina + metformina no mercado, encontrando-se os mesmos a ser comercializados no território português desde, pelo menos, 03-01-2023.
(Contestação)
94. Os compostos da invenção são apresentados na EP1412357 através de uma fórmula de Markush (Fórmula I), que abrange uma classe de, potencialmente, milhares de compostos, compartilhando um elemento estrutural comum.
95. As reivindicações 1 a 15 referem-se à fórmula Markush que se reporta a milhares de compostos diferentes.
96. Segundo se refere na descrição da EP1412357, eram necessários novos compostos para encontrar melhores inibidores da DPP-IV para o tratamento da diabetes e, potencialmente, de outras doenças e condições de saúde – cf. 1º parágrafo da página 6.
97. Os Exemplos da EP1412357 revelam a síntese de compostos que podem atuar como inibidores da DPP-IV.
Facto 98.º eliminado pelo acórdão recorrido.
99. A metformina é um composto que pertence à classe das biguanidas e não é representada pela Fórmula I da EP1412357.
100. A utilização de metformina no tratamento da diabetes tipo 2 já era conhecida na data de prioridade da EP1412357.
***
101. A EP1412357 faz menção a combinações dos compostos de fórmula I nas págs. 30 a 34 da descrição.
Factos 102.º, 103 e 104.º eliminados pelo acórdão recorrido.
105. A EP1412357 também não apresenta dados específicos sobre a atividade da sitagliptina em particular.
106. Do RCO do medicamento Janumet consta que a combinação de sitagliptina e metformina possui um efeito aditivo.
***
107. O medicamento Januvia® tem o fosfato de sitagliptina monohidrato como substância ativa.
108. O medicamento Janumet® contém a combinação de fosfato de sitagliptina monohidrato e cloridrato de metformina.
109. Comparando a secção 5.1 "Propriedades farmacodinâmicas" dos RCMs dos medicamentos Januvia e Janumet constata-se que os resultados dos estudos são os mesmos:
Quadro explicativo.
110. A secção “4.1 Indicações terapêuticas” do RCM do medicamento Januvia® diz que em doentes adultos com diabetes mellitus tipo 2, Januvia está indicado para melhorar o controlo da glicemia: Em terapêutica oral dupla em associação com: - metformina quando a dieta e o exercício, associados a metformina em monoterapia não proporcionam um adequado controlo da glicemia.
111. Por seu turno, a seção 4.2 do RCM reitera que o Januvia® pode ser administrado concomitantemente com metformina.
112. Da AIM do medicamento Janumet® consta na secção “4.1 Indicações terapêuticas”: em doentes adultos com diabetes mellitus tipo 2: Janumet é indicado como adjuvante da dieta e do exercício para melhorar o controlo da glicemia nos doentes em que a dose máxima tolerada de metformina em monoterapia não proporciona um controlo adequado ou nos doentes que estão já a ser tratados com a associação de sitagliptina e metformina.
113. O RCM do medicamento Januvia® inclui na Tabela 2 instruções de dosagem específicas para a combinação dos dois ingredientes ativos sitagliptina e metformina: Terapia inicial (duas vezes ao dia): Sitagliptina 50 mg + metformina 1.000 mg (N = 178).
114. Essa dosagem também é comercializada pela MSD com o medicamento Janumet®, como consta da seção “4.2 Posologia e modo de administração” do respetivo RCM: “Para obter as diferentes doses de metformina, Janumet apresenta-se em dosagens de 50 mg de sitagliptina e 850 mg de cloridrato de metformina ou 1.000 mg de cloridrato de metformina”.
115. Não são descritas propriedades diferentes para a combinação livre e para a combinação em dose fixa de sitagliptina e metformina.
116. Na seção “4.2 Posologia e modo de administração” do RCM do medicamento Janumet® é referida a equivalência da combinação fixa com a combinação livre, na medida em que é dito o seguinte: “Caso não esteja disponível uma dosagem adequada de Janumet, devem utilizar-se os componentes individuais em separado em vez da combinação de dose fixa”.
(Réplica)
117. Previamente à introdução do medicamento Janumet, as AA promoveram a realização de um estudo de bioequivalência.
118. O referido estudo demonstrou que Janumet (sitagliptina/cloridrato de metformina) comprimidos com associação é bioequivalente à coadministração de fosfato de sitagliptina e cloridrato de metformina em comprimidos individuais.”
1 - Da nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia (conclusões C. a F.)
Invocam as recorrentes Sandoz que o acórdão recorrido padece de nulidade por omissão de pronúncia, porquanto não se pronunciou relativamente à impugnação da matéria de facto, designadamente não efectuou a reapreciação da prova gravada, o que além do mais, viola do disposto no art. 205.º da CRP.
As nulidades da sentença/acórdão mostram-se previstas no art. 615.º do CPC e conforme é jurisprudência neste STJ, reportam-se a danos estruturais da própria decisão não sendo confundíveis com os erros de julgamento, quer de facto ou de direito.
O art. 615.º do CPC preceitua o seguinte:
1 - É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
A nulidade por omissão de pronúncia, al. d), verifica-se quando o acórdão não resolve todas as questões que lhe foram submetidas à sua apreciação pelas partes, sem prejuízo dos casos em que esse conhecimento fique prejudicado pela solução a outras questões antes apreciadas.
É esta a orientação abundante do STJ, conforme se constata dos seguintes Acs. do STJ de 17-02-2022 (Revista n.º 23/09.4TBSSB.E2.S1), de 09-03-2022 (Revista n.º 1600/17.5T8PTM.E1.S1) e de 31-01-2023 (Revista n.º 1593/17.9T8LRA.C1.S2).
Da análise do acórdão recorrido verificamos que ocorreu uma efectiva reapreciação da prova, de acordo com o que foi alegado pelas Autoras apelantes, o que se revela patente desde a página 50 à página 58, e que consequentemente determinou a alteração da matéria de facto provada no acórdão recorrido.
A circunstância de o acórdão recorrido não fazer referência ao depoimento das testemunhas não é significativo, uma vez que o tribunal da Relação não se mostra vinculado a apreciar todos os meios de prova indicados pelas partes, tão só os que considere relevantes. Acrescendo que, tendo a Relação considerado que alguns dos factos não se mostram relevantes para o mérito da causa ou são com conclusivos, desnecessária se lhe tornou a referência à prova gravada.
Não se pronunciou o acórdão recorrido, como é bom de ver, sobre todos os fundamentos da resposta das agora recorrentes, ali recorridas, pois não foram as Rés que impugnaram a matéria de facto, nem ampliaram o âmbito da apelação relativamente a esta matéria, pelo que, caso pretendessem ver apreciadas as suas pretensões neste campo, deveriam tê-lo feito.
O acórdão recorrido não padece de qualquer omissão de pronúncia, nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. d), do CPC, pois analisou a impugnação da matéria de facto, de acordo com a delimitação do recurso proposto pelas Autoras na apelação.
Igualmente, não constitui qualquer decisão surpresa pois o acórdão recorrido apenas se pronunciou sobre questões que foram sujeitas a contraditório entre as partes, inexistindo qualquer novidade nas questões analisadas, pois foram todas analisadas a pedido e após contraditório.
Refira-se também que a apreciação levada a cabo pelo acórdão recorrido relativamente à reapreciação da matéria de facto não viola o art. 205.º da CRP, porquanto o tribunal da Relação procedeu a uma efectiva reapreciação da prova, de acordo com a alegações de apelação das autoras/recorrentes, que delimitam o objecto do recurso, cfr. arts. 633.º, 635.º e 639.º do CPC, e não tendo as ora recorrentes ampliado o âmbito do recurso, nos termos do art. 636.º do CPC, não se impunha ao tribunal recorrido conhecer de outros fundamentos do recurso para além dos que constassem da apelação.
Inexiste, assim, qualquer nulidade por omissão de pronúncia, improcedendo esta parte do recurso das recorrentes.
2 - Da violação dos poderes da Relação ao eliminar factos que reflectem os temas da prova e não foram objecto de reclamação (conclusão G., O. a W.)
Mais invocam as recorrentes que o acórdão recorrido violou os poderes que a lei lhe confere ao eliminar factos que reflectem os temas da prova e que não foram objecto de reclamação, em concreto os factos 98.º, 102.º, 103.º e 104.º da matéria de facto dada como provada, interpretando incorrectamente o disposto no art. 410.º do CPC.
No recurso de revista, a regra é a de que o STJ não pode sindicar o modo como o tribunal da Relação decidiu acerca da impugnação da matéria de facto, quando os meios de prova envolvidos se mostram sujeitos ao princípio da livre apreciação da prova, cfr. arts. 662.º, n.º 4, e 674.º, n.º 3, do CPC.
A intervenção do STJ no conhecimento da impugnação da matéria de facto mostra-se circunscrito às situações em que seja invocado o erro de direito, por violação de lei adjetiva civil ou a ofensa a disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova, ou que fixe a força de determinado meio de prova, com força probatória plena, cfr. art. 674.º, n.º 3, do CPC.
A intervenção do STJ, no âmbito da matéria de facto, visa garantir, essencialmente, o cumprimento de normas de direito probatório material, sendo irrecorríveis as decisões da Relação, tomadas a abrigo dos n.ºs 1 e 2 do art. 662.º do CPC, irrecorríveis, cfr. art. 662.º, n.º 4, do CPC.
Mas, o STJ não fica, igualmente, dispensado de intervir nas situações em que verifique que o tribunal da Relação não cumpriu o ónus de análise crítica da análise da produção de prova.
Conforme nos explica Abrantes Geraldes (In Recursos em Processo Civil, 6.ª edição, Almedina, p. 358), esta delimitação não é totalmente rígida. Com efeito, é admissível recurso de revista quando sejam suscitadas questões relacionadas com o modo como a Relação aplicou as normas de direito adjectivo conexas com a apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, maxime quando seja invocado pelo recorrente o incumprimento de deveres previstos no art. 662º” ou quando se trate de “sindicar a decisão da matéria de facto nas circunstâncias referidas no art.. 674º, nº 3, e apreciar criticamente a suficiência ou insuficiência da matéria de facto provada e não provada em conexão com a matéria de direito aplicável, nos termos do art. 682º, nº 3.
Deste modo, o art. 662.º do CPC consagra um efectivo 2.ª grau de jurisdição sobre a apreciação da prova produzida, sendo imposto ao tribunal da Relação, por força do que se mostra previsto no art. 607.º, n.º 4, ex vi art. 663.º, n.º 2, ambos do CPC, que aprecie de forma crítica as provas indicadas em fundamento da impugnação, de forma conjugada e contextualizada, a fim de criar a sua própria convicção.
É esta a posição dominante neste STJ conforme facilmente se comprova através dos Acs. do STJ de 04-07-2023 (Revista 19645/18.6T8LSB.L1.S1), de 15-06-2023 (Revista 6132/18.1T8ALM.L1.S2), de 24-10-2023 (Revista 24966/19.8T8PRT.P1.S1), de 14-07-2021 (Revista n.º 1333/14.4TBALM.L2.S1) e de 25/01/2024 (Revista 19343/19.3T8PRT.P1.S1), relatado pelo ora relator.
Temos, assim, que a actuação do tribunal da Relação, por força do disposto no art. 662.º do CPC, no que aos meios de provas sujeitos à livre apreciação diz respeito, mostra-se, à partida, limitada pela necessária impugnação da matéria de facto pelo recorrente, com cumprimento dos ónus previstos no art. 640.º, n.º 1, do CPC, sem prejuízo de, cumprido que se mostre o ónus do recorrente, poder o tribunal da Relação proceder à análise dos demais meios de prova e dos demais factos provados e não provados, ainda que não impugnados, efectuando uma verdadeira substituição da 1.ª instância no que se refere à apreciação da matéria de facto.
Por outra banda, este poder conferido pelo art. 662.º do CPC, no que toca à prova vinculada, violação de direito probatório material ou contradição entre os factos, permite ao tribunal da Relação, mesmo sem que haja impugnação da matéria de facto por parte do recorrente, proceder à reapreciação da prova e alteração dos factos provados e não provados.
E a reapreciação da prova que a Relação deve levar a cabo tem como norte o método da análise crítica da prova, nos termos do art. 607.º, n.º 4, do CPC, podendo o tribunal de revista apreciar se foi observado este método (neste sentido o Ac. do STJ de 11-07-2019, Revista n.º 24369/16.6T8LSB.L1.S1).
Diga-se, antes do mais, em termos gerais, que, tal como se pronunciou este Supremo Tribunal no Acórdão de 08-06-2017 (Revista 6264/12.0TBLRA.C1.S1), é de admitir o recurso de revista sobre a fixação da matéria de facto quando a questão suscitada pelo recorrente tem como objecto o conteúdo dos poderes da Relação relativamente à reapreciação da matéria de facto e ao ónus do recorrente que a impugna, ou seja, a invocada violação das normas dos arts. 640º e 662º nº 1, ambos do CPC.
Como se refere no Ac. STJ de 19-01-2017 (Revista 841/12.6TBMGR.C1.S1), “é residual a intervenção do STJ no apuramento da factualidade relevante da causa, restringindo-se, afinal, a fiscalizar a observância das regras de direito probatório material, a determinar a ampliação da matéria de facto ou o suprimento de contradições sobre a mesma existentes.”
A este respeito veja-se o “post” que MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA inseriu no dia 22 de Fevereiro de 2016, no blogue do IPPC, em comentário ao Ac STJ 3/12/2015, proc. 1297/11.6TBPBL.C1.S1, a que deu o título “Livre apreciação da prova; poderes do STJ; forma ad substantiam; prova testemunhal”.
Entre o mais, afirma o Professor que “o Supremo não deve ficar indiferente a erros de apreciação da prova resultantes da violação de direito probatório material, de modo que pode constituir fundamento de revista a violação de disposição legal expressa que exija certa espécie de prova ou que fixe a respectiva força probatória. Afinal, em tais situações, defrontamo-nos com verdadeiros erros de direito que, nesta perspectiva, se integram também na esfera de competências do Supremo, inscrevendo-se a sua correcção nas atribuições do Supremo.
Assim, quando na enunciação da matéria de facto provada ou não provada se constate que as instâncias desrespeitaram norma expressa de direito probatório material, o Supremo, por iniciativa própria ou do recorrente, deve modificar a decisão e ajustá-la ao preceito imperativo violado.
Tal acontece designadamente quando o confronto com os articulados revele que existe acordo das partes quanto a determinado facto, que o facto alegado por uma das partes foi objecto de declaração confessória com força probatória plena que não foi atendida ou que encontra demonstração plena em documento junto aos autos, naquilo que dele emerge com força probatória plena, incluindo a eventual confissão nele manifestada.
Na verdade, em tais circunstâncias, confrontamo-nos com verdadeiros erros de aplicação do direito, tornando justificada a “intromissão” do Supremo na delimitação da realidade que será objecto de qualificação jurídica, como questão de direito que realmente é, deve ser considerada (art. 4º, nº 3).
…
o STJ só pode controlar a apreciação da prova realizada pela Relação, se esta tiver violado nessa apreciação uma regra legal, ou seja, se tiver usado os seus poderes de livre apreciação da prova numa situação em que tal não é permitido. Portanto, o STJ pode controlar se a Relação julgou dentro dos limites legais da livre apreciação, mas não pode controlar a livre apreciação realizada pela Relação.”
Realçou-se também no Acórdão de 30-05-2019 (Revista n.º 156/16.0T8BCL.G1.S1) que “Não obstante a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça no tocante à decisão sobre a matéria de facto ser residual e de o n.º 4 do artigo 662.º do CPC ser peremptório a determinar a irrecorribilidade das decisões através das quais o Tribunal da Relação exerce os poderes previstos nos n.ºs 1 e 2 da mesma norma, é admissível julgar o modo de exercício destes poderes, dado que tal previsão constitui “lei de processo” para os efeitos do artigo 674.º nº 1 al. b) do CPC”.
Importa, porém, destacar que este poder de apreciar do cumprimento das regras adjetivas referentes à reapreciação da matéria de facto, não deve ser confundido com a sindicância do percurso probatório percorrido pelo tribunal da Relação ou com a validade da argumentação probatória efectuada pelo acórdão recorrido.
De facto, nesta matéria, (…) compete ao tribunal de revista ajuizar se o Tribunal da Relação observou o método de análise crítica da prova prescrito no n.º 4 do indicado artigo 607.º, mas já não imiscuir-se na valoração da prova feita segundo o critério da livre e prudente convicção do julgador, genericamente editado no n.º 5 do artigo 607.ºdo CPC, cfr. Ac. do STJ de 16-12-2020, proc. n.º 4016/13.9TBVNG.P1.S3.
Ora, cumprindo-nos apreciar se o Tribunal da Relação de Lisboa operou correcta intervenção decisória ao nível dos factos, importará ter presente, desde logo, como lucidamente se afirmou no AC. STJ de 20-06-2017 (Revista 2975/12.8TBSTS.P1.S2) que “Os poderes de reapreciação contidos no art. 662º nº 1 do CPC traduzem um verdadeiro e efectivo grau de jurisdição sobre a apreciação do conteúdo da prova produzida, pretendendo-se que a Relação faça novo julgamento da matéria de facto impugnada e que vá à procura da sua própria convicção.”
Constituindo jurisprudência consolidada a de que “ao STJ permite-se verificar se o uso dos poderes conferidos pelo art. 662º nº 1 e 2 do CPC foi exercido dentro da imposição de reapreciar a matéria de facto de acordo com o quadro e os limites configurados pela lei para o exercício de tais poderes (deveres) – não uso ou uso deficiente ou patológico –, que, no essencial e no que respeita ao nº 1 do art. 662º, resultam da remissão do art. 663º nº 2 para o art. 607º nº 4 e 5, do CPC (o n.º 2 já é reforço dos poderes em segundo grau)” (Ac. STJ de 03-11-2021, Revista n.º 4096/18.0T8VFR.P1.S1).
Como sublinha Abrantes Geraldes (Recursos em Processo Civil, 6ª Edição Atualizada, Coimbra, Almedina, 2020, p. 332), o actual art. 662.º do Código de Processo Civil (através dos seus n.ºs 1 e 2 al. a) e b) representa uma clara evolução no sentido de que a Relação dispõe de autonomia decisória, competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis e com observância do princípio do dispositivo no que concerne à identificação dos pontos em discórdia.”
Poderes que foram bem evidenciados no Ac. STJ de 24/09/2013, 1965/04, de cujo sumário se extrai que “ao afirmar que a Relação aprecia as provas, atendendo a quaisquer elementos probatórios, o legislador pretende que a Relação faça novo julgamento da matéria de facto impugnada, vá à procura da sua própria convicção, assim se assegurando o duplo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto em crise”.
MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, ao comentar este aresto (in Cadernos de Direito Privado, nº 44, pag. 29 e seg.), aduz lucidamente que “o actual art. 662º aumenta os poderes da Relação sobre o julgamento da matéria de facto, pelo que o standard que o Supremo Tribunal de Justiça passará a dever utilizar para controlar esse julgamento é o da aplicação pela Relação de todos os poderes eu agora lhe estão legalmente concedidos”.
Segundo Abrantes Geraldes “está afastada, em definitivo, a defesa de que a modificação na decisão da matéria de facto apenas deve operar em casos de «erros manifestos» de reapreciação (…).” (ob. cit. pag. 349).
No mesmo sentido o Ac. STJ 14-2-2012 (Revista 6823/09.3TBBRG.G1.S1) sustenta que a Relação deverá formar e fazer reflectir na decisão a sua própria convicção, na plena aplicação e uso do princípio da livre apreciação das provas, nos mesmos termos em que o deve fazer a 1ª instância, sem que se lhe imponha qualquer limitação, relacionada com convicção que serviu de base à decisão impugnada, em função do princípio da imediação da prova".
A Relação atua como um tribunal de substituição em matéria de facto, aplicando a plenitude das regras gerais de prova: "a reapreciação da matéria de facto por parte da Relação tem de ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância pois só assim poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição", enunciam os Acs. STJ 2-12-2013 (Revista 34/11.0TBPNI.L1.S1) e de 29-11-2016 (revista 2170/05.2TVLSB-A.L1.S1).
Ainda neste contexto, constitui jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal de Justiça, como feito notar pelo acórdão de 08-06-2017 (Revista n.º 271/07.1TBALJ.G2.S1), que “a reapreciação da decisão de facto pela Relação, nos termos do art. 662º nº 1 do CPC não se deve limitar à verificação da existência de erro notório por parte do tribunal a quo, mas implica uma reapreciação do julgado sobre os pontos impugnados, em termos de formação, por parte do tribunal de recurso, da sua própria convicção, em resultado do exame das provas produzidas e das que lhe for lícito ainda renovar ou produzir, para só, em face dessa convicção, decidir sobre a verificação ou não do erro invocado, mantendo ou alterando os juízos probatórios em causa.”
E nessa senda decisória se pronunciou também o Ac. STJ 07 de Setembro de 2017 (Revista 959/09.2TVLSB.L1.S1) confirmando que “o nosso regime de sindicância da decisão de facto pela 2.ª instância tem em vista não um segundo julgamento latitudinário da causa, mas sim a reapreciação dos juízos de facto parcelares impugnados, na perspetiva de erros de julgamento específicos, o que requer, por banda do impugnante, uma argumentação probatória que, no limite, os configure”.
Em breves palavras nossas, diremos, em registo conclusivo do tanto já escrito a este respeito, que em caso de recurso com impugnação da decisão relativa à matéria de facto, a Relação pode e deve formar a sua própria convicção mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis, no gozo pleno do princípio da livre apreciação das provas (arts. 640º e 662º nº 1 do CPC), exactamente nas mesmas condições em que o fez o Tribunal recorrido, nada obstando a que o faça de forma díspar ou divergente deste, mesmo quando não se verificou erro notório de julgamento de facto recorrido.
Contudo, como já se disse, o STJ pode censurar o mau uso que o Tribunal da Relação tenha eventualmente feito dos seus poderes sobre a modificação da matéria de facto, bem como pode verificar se foi violada ou feita aplicação errada da lei de processo (art. 674º nº 1 al. b) do CPC).
Relativamente a esta parte o acórdão recorrido pronunciou-se nos seguintes termos:
Seguidamente, as recorrentes “Merck Sharp & Dome, LLC”, “Merck Sharp & Dome, BV” e “Merck Sharp & Dome, Lda.” vieram sustentar que também deve ser eliminado o art. 98.º da matéria de facto provada ou que, em alternativa, deve ser substituído por outro que contenha uma redacção isenta de dúvidas nos seguintes termos: “(…) a substância activa metformina não é reivindicada per se, já sendo um composto conhecido no estado da técnica (…)”.
Para o efeito, vieram alegar que o art. 51.º da contestação (que esteve na origem do mencionado art. 98.º da matéria de facto provada) foi expressamente impugnado na réplica, que contém uma redacção que induz em erro e que está em contradição com o art. 71.º da matéria de facto provada.
Por seu turno, as rés “Sandoz, BV” e “Sandoz Farmacêutica, Lda.” vieram afirmar a este propósito que as recorrentes nunca impugnaram esse facto, nem em sede de réplica, nem em sede de audiência de julgamento.
Vejamos:
(…)
No caso vertente, ao contrário do que sustentam as rés/recorridas “Sandoz, BV” e “Sandoz Farmacêutica, Lda.”, o art. 51.º da contestação foi expressamente impugnado pelo art. 236.º da réplica, quando as autoras/recorrentes “Merck Sharp & Dome, LLC”, “Merck Sharp & Dome, BV” e “Merck Sharp & Dome, Lda.” afirmam que impugnam “(…) os factos alegados nos artigos (…) 45.º a 61.º (…) da contestação das Rés por serem falsos, inexatos, irrelevantes e/ou as conclusões retiradas dos mesmos incorretas (…)”.
Acresce que o art. 98.º, apresentado na negativa, pressupõe a formulação de um juízo de valor e consubstancia uma conclusão que pode vir a ser retirada da matéria de facto provada, de acordo com os elementos de prova documental juntos aos autos (v.g. certificado de patente de invenção europeia n.º 1 412 357 e certificado complementar de protecção n.º 339) e com a posição processual que foi assumida pelas empresas contestantes.
As reivindicações respeitantes à patente europeia com o n.º 1 412 357, incluindo as substâncias activas que lhe dizem respeito, encontram-se descritas nos arts. 32.º a 71.º da matéria de facto provada, o que se afigura suficiente para a delimitação do quadro factual relevante para a decisão.
O art. 98.º traduz uma mera conclusão a respeito do que está (ou não) incluído, directa ou indirectamente, nas reivindicações da patente europeia com o n.º 1 412 357, as quais se mostram descritas de modo detalhado, pela afirmativa, nos precedentes artigos da matéria de facto considerada provada.
Para além de não comportar, verdadeiramente, matéria de facto, pressupõe a formulação de um juízo de valor a respeito do conteúdo das reivindicações da patente europeia e traduz uma conclusão que pode vir a interessar, exclusivamente, para a discussão da questão jurídica em causa.
O mesmo se diga, mutatis mutandis, a respeito dos arts. 102.º (“A Reivindicação 30 da EP faz referência à metformina, mas não especifica a sitagliptina como possível parceiro da composição”), 103.º (“A EP1412357 não contém quaisquer dados, experimentais ou outros, que mostre ou sugira um efeito terapêutico da combinação específica de sitagliptina e metformina”) e 104.º (“A EP1412357 não contém dados que mostrem, ou sequer que sugiram, que a combinação de sitagliptina e metformina seja vantajosa de alguma forma”) da matéria de facto considerada como provada pelo tribunal a quo.
A este propósito, as recorrentes “Merck Sharp & Dome, LLC”, “Merck Sharp & Dome, BV” e “Merck Sharp & Dome, Lda.” vieram, grosso modo, sustentar que estes artigos comportam juízos de valor, que não são factos e que se mostram redigidos de modo pouco claro e ambíguo.
Ao invés, as recorridas “Sandoz, BV” e “Sandoz Farmacêutica, Lda.” defendem que o recurso deve vir a ser julgado improcedente e que os artigos em causa devem permanecer como matéria de facto provada, o que sustentam resultar da prova testemunhal e documental produzida nos autos.
Vejamos:
Na realidade, os arts. 102.º, 103.º e 104.º, todos eles apresentados na negativa, pressupõem a formulação de juízos de valor e traduzem conclusões que podem, eventualmente, vir a ser retiradas dos factos que ficaram demonstrados nestes autos, muito em particular nos arts. 26.º a 71.º.
A composição da reivindicação n.º 30 da patente europeia com o n.º 1 412 357 ressalta, essencialmente, da matéria de facto que se mostra vertida no art. 71.º, ainda que por confronto com os precedentes artigos do quadro factual provado, todos formulados ou apresentados de modo afirmativo.
A questão de saber se a reivindicação n.º 30 abrange (ou não), expressa ou implicitamente, a sitagliptina, deverá obter resposta, em sede própria, através da análise de todo o quadro factual apurado, levando-se em consideração que esta reivindicação está “dependente da reivindicação 25 e diz respeito a uma composição farmacêutica compreendendo um composto de qualquer das reivindicações 1 a 15”, conforme resulta do aludido art. 71.º.
Por outro lado, a patente europeia com o n.º 1 412 357 encontra-se descrita, com particular incidência, nos arts. 26.º a 31.º da matéria de facto julgada provada, tendo, inclusive, se considerado como integralmente reproduzido o documento n.º 2, oferecido pelas autoras na petição inicial, que contém todas as reivindicações respeitantes a esta patente.
Deste modo, esses factos mostram-se suficientes, em conjunto com a demais factualidade provada, para a apreciação das questões jurídicas levantadas no presente processo, tanto mais que o tribunal de primeira instância, como se viu, considerou como integralmente reproduzido o documento acima referido, pelo que abrangerá tudo aquilo que dele resultar.
A questão de saber se a patente europeia com o n.º 1 412 357 contém (ou não) dados que mostrem ou que sugerem que a combinação da sitagliptina com a metformina é vantajosa para os doentes, constitui uma conclusão a retirar da análise do documento em causa, eventualmente, de modo conjugado, com os demais elementos probatórios constantes dos autos.
Não consubstancia, verdadeiramente, um facto, não constitui matéria que deva ser levada ao quadro factual, antes traduz uma conclusão a retirar, em sede de discussão da questão jurídica, da globalidade da matéria de facto, apurada com base nos elementos probatórios produzidos nestes autos.
Em face do exposto, sem necessidade de outras considerações, o recurso interposto merece, nesta parte, procedência, e, em consequência, determina-se a eliminação dos arts. 98.º, 102.º, 103.º e 104.º da matéria de facto considerada como provada pelo tribunal de primeira instância.
Com efeito, o acórdão recorrido, relativamente às alterações que operou nos arts. 98.º, 102.º, 103.º e 104.º dos factos provados actuou dentro dos poderes que lhe são conferidos pelo art. 662.º do CPC, sendo factos que foram impugnados pelas recorrentes da apelação, as autoras e ora recorridas, por se tratar de factos que, grosso modo, o acórdão recorrido entendeu serem factos que integravam conceitos conclusivos, determinou a sua eliminação.
Ao contrário daquilo que as ora recorrentes da revista invocam, os factos em causa foram impugnados pelas agora recorridas no seu recurso de apelação, por entenderem tratar-se de factos redigidos de modo pouco claro e ambíguo, integrando factos conclusivos, sendo que não eram factos que tivessem resultado do acordo das partes, pelo que deveriam ser eliminados, conforme resulta de pp. 27 a 36 da apelação deduzida pelas autoras.
O Tribunal da Relação, no acórdão recorrido, na reapreciação da factualidade provada sob os pontos 98, 102, 103 e 104, ao ordenar a sua eliminação, por se tratar de factos conclusivos, relativamente a saber se a patente europeia com o n.º 1 412 357 contém (ou não) dados que mostrem ou que sugerem que a combinação da sitagliptina com a metformina é vantajosa para os doentes, actuou porque a questão lhe havia sido colocada pelas recorrentes na apelação e fê-lo no âmbito dos poderes que lhe são conferidos pelo art. 662.º do CPC.
Através de um raciocínio claro e de uma exposição lógica de argumentos explicou os motivos pelos quais eliminou aqueles factos da matéria provada, actuando dentro dos limites de poderes que a lei lhe confere.
Quanto ao mais, por se mostrar arredado do conhecimento deste Supremo Tribunal, uma vez que se trata de uma verdadeira sindicância da matéria de facto, não pode este tribunal conhecer da bondade de julgamento quanto à reapreciação da prova relativamente a estes factos.
Temos, assim, que, igualmente, deverá esta parte do recurso de revista improceder.
3 - Da suspensão da instância até decisão os reenvios prejudiciais pendentes no TJUE (conclusões K. a N.)
Mais pedem as recorrentes que deverá ser ordenada a suspensão da instância até serem decididos os reenvios prejudiciais pendentes no Tribunal de Justiça da União Europeia sobre as matérias de direito em apreço nos presentes autos respeitantes aos reenvios com os n.ºs 119/22 e C-149/22, por constituírem “questão prejudicial” relativamente aos presentes autos.
Alegam para tanto que em tais reenvios prejudiciais vai ser decidida matéria relativa a um CCP para a combinação sitagliptina/metformina com base na patente europeia EP’357, e nos quais o Tribunal de Justiça da União Europeia irá apreciar, entre outros, o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça Português no processo n.º 281/17.0YHLSB.L1.S1.
E bem assim que tais processos constituem uma questão prejudicial relevante para os presentes autos, na medida em que as decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia constituem fonte de direito imediata, permitindo a uniformidade e a harmonização na aplicação do direito da União no território dos Estados-Membros, pelo que deverá ordenar-se a suspensão da instância até que sejam proferidas decisões nos processos acima referenciados, por constituírem questão prejudicial aos presentes autos, o que as Recorrentes expressamente requerem.
Em resposta, as recorridas sustentam inexistir qualquer prejudicialidade entre a presente decisão e/ou o acórdão recorrido e as decisões a proferir pelo TJUE no âmbito dos referidos reenvios prejudiciais, nem as recorrentes alegam convenientemente a existência de questão prejudicial.
Vejamos:
Nos termos do art. 272.º, n.º 1, do CPC, O tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado.
No Ac. do STJ de 09-05-2023, Revista n.º 826/21.1T8CSC-A.L1.S1, lançando mão das palavras do Prof. Alberto dos Reis, escreveu-se que (…) uma causa é prejudicial é relação a outra quando a decisão na primeira pode afetar ou destruir o fundamento ou razão de ser da segunda, quando a decisão naquela pode prejudicar a decisão nesta.
E o Prof. Manuel de Andrade (in "Lições de Processo Civil", págs. 491 e 492) explica que a (…) verdadeira prejudicialidade e dependência só existirá quando na primeira causa se discuta, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da segunda e que não pode resolver-se nesta em via incidental, como teria de o ser, desde que a segunda causa não é a reprodução, pura e simples, da primeira. Mas nada impede que se alargue a noção de prejudicialidade, de maneira a abranger outros casos. Assim pode considerar-se como prejudicial, em relação a outra em que se discute a título incidental uma dada questão, o processo em que a mesma questão é discutida a título principal.
Assim, o tribunal, em face da verificação que estão pendentes duas ou mais causas, em que a decisão da acção que foi interposta em primeiro lugar pode prejudicar ou destruir a decisão da acção interposta em segundo lugar, decide-se pela suspensão da instância da acção proposta em segundo lugar.
Nos termos do art. 267.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia para o Tribunal de Justiça da União
“O Tribunal de Justiça da União Europeia é competente para decidir, a título prejudicial
a) Sobre a interpretação dos Tratados;
b) Sobre a validade e a interpretação dos actos adoptados pelas instituições, órgãos ou organismos da União.
Sempre que uma questão desta natureza seja suscitada perante qualquer órgão jurisdicional de um dos Estados-Membros, esse órgão pode, se considerar que uma decisão sobre essa questão é necessária ao julgamento da causa, pedir ao Tribunal que sobre ela se pronuncie.
Sempre que uma questão desta natureza seja suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam susceptíveis de recurso judicial previsto no direito interno, esse órgão é obrigado a submeter a questão ao Tribunal.
Se uma questão desta natureza for suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional relativamente a uma pessoa que se encontre detida, o Tribunal pronunciar-se-á com a maior brevidade possível.”.
Da análise deste normativo resulta que o reenvio prejudicial é um instituto comunitário que visa a aplicação uniforme do direito comunitário pelos tribunais nacionais dos estados-membros da União Europeia, o que decorre do primado do direito europeu e do princípio da aplicabilidade directa das normas comunitárias. Nos casos em que os tribunais nacionais tenham fundadas dúvidas acerca da interpretação a dar a uma norma comunitária, impõe-se-lhe proceder ao reenvio prejudicial da questão concreta a decidir à luz das normas comunitárias.
A questão relativa à suspensão da instância por prejudicialidade já foi alvo de pronúncia por parte deste Supremo Tribunal de Justiça, no recente acórdão de 19-09-2024, Revista n.º 166/20.3YHLSB.L2.S1, que contrapôs as ora autoras contra outras rés relativamente a acção que visava, igualmente, impedir a comercialização de medicamentos que compreendiam as substâncias activas Sitagliptina e Metformina, enquanto a EP 1 412 357 e/ou o CCP 278 e/ou o CCP 339 se encontrassem em vigor.
Nesse aresto, decidiu-se inexistir qualquer relação de prejudicialidade daqueles reenvios relativamente àqueles autos com a seguinte fundamentação, que agora transcrevemos, por se tratar de matéria idêntica e constituir fundamentação transponível para os presentes autos:
Ora, do funcionamento e objectivos do instrumento jurídico em análise - reenvio prejudicial - impõe-se retirar a conclusão de que não existe qualquer relação de prejudicialidade entre a decisão a proferir nestes autos e a decisão a proferir pelo TJUE no âmbito dos referidos reenvios prejudiciais. No âmbito destes processos o que vai ser apreciada é a interpretação que o TJUE vai elaborar relativamente a uma norma de direito comunitário e não decidir qualquer questão susceptível de destruir o fundamento ou a razão de ser da presente acção, caso em que seria uma causa prejudicial.
É certo que nos presentes autos a questão apreciada diz respeito à invocada violação do artigo 3.º, alíneas a), c) e d), do Regulamento (CE) n.º 469/2009 e do artigo 69.º da Convenção sobre a Patente Europeia e o respectivo artigo 1.º do Protocolo Interpretativo, normas de direito comunitário. Está igualmente em apreço a interpretação a dar àquelas normas. Pelo que, em tese, poderiam surgir dúvidas interpretativas sobre tais normas que suscitassem a necessidade de, neste próprio processo, se recorrer ao instrumento jurídico do reenvio prejudicial, ou vislumbrar-se utilidade em aguardar a decisão que viesse a ser proferida sobre essas hipotéticas dúvidas.
(…)
De qualquer modo, o eventual risco de contradição de julgados constitui uma realidade diferente da relação de prejudicialidade e só esta fundamenta a suspensão da instância.
No caso, como questão de mérito, impõe-se apreciar a interpretação do art. 3.º, als. a), c) e d), do Regulamento (CE) n.º 469/2009 e do art. 69.º da Convenção sobre a Patente Europeia e o respectivo art. 1.º do Protocolo Interpretativo, que constituem normas de direito comunitário.
O Supremo Tribunal de Justiça já teve oportunidade de, recentemente, interpretar as supracitadas normas, de acordo com a jurisprudência do TJUE, que também já se pronunciou sobre os referidos normativos comunitários, pelo que não se trata de matéria que possa apresentar necessidade de reenvio, ou, como pretendem as recorrentes, a suspensão da instância para aguardar a referida decisão, pelo que não há qualquer prejudicialidade, nem um patente risco de contradição com a jurisprudência comunitária.
De igual modo, a junção das conclusões do Advogado Geral junto TJUE não constitui qualquer precedente para os presentes autos, pois o TJUE não se mostra vinculado a decidir de acordo com aquela opinião, o que também não constituí fundamento para a suspensão da instância. E, da sua análise, verificamos que as conclusões se afastam da jurisprudência do TJUE, uma vez que propõem uma interpretação não totalmente coincidente com aquela que o TJUE vem fazendo, designadamente nos Acs. Teva e Royalty Pharma.
Assim, e no seguimento do que ficou decidido no referido Acórdão do STJ de 19-09-2024 (Revista 166/20.3YHLSB.L2.S1), deve improceder a pretensão das Recorrentes, não sendo de declarar a suspensão da instância, em face da inexistência de causa prejudicial e inexistência de qualquer fundamento legal para tanto.
4 - Da (in)validade do CCP 339 à luz do art. 3.º do Regulamento (CE) n.º 469/2009 (conclusões X. a CCC.)
O mérito da presente revista prende-se com a validade do CCP 339 à luz do art. 3.º do Regulamento (CE) n.º 469/2009, uma vez que na 1.ª instância foi decidido declarar a nulidade do CCP 339, por entender que não se mostravam preenchidos os pressupostos legais previstos nas als. a), c) e d) do citado normativo, ao passo que na Relação, através do acórdão recorrido, decidiu-se revogar a sentença e considerou que o produto para o qual foi concedido o CCP 339 se mostra protegido pela EP 357, a qual estava em vigor à data da concessão do CCP, mostrando-se preenchido o requisito previsto na al. a) do citado art. 3.º do Regulamento.
Inconformadas, as rés, ora recorrentes, relativamente a esta matéria, invocam as seguintes questões:
c. O artigo 3º, al. a) do Regulamento CCP, não exige que a reivindicação identifique especificadamente o produto a proteger, bastando para tanto, pois, que o produto possa identificar-se, mesmo que de forma indireta, num grupo de milhões (ou biliões) de combinações de compostos?
d. O artigo 3.º, al. a) do Regulamento não exige que a invenção descrita na patente divulgue essa invenção, na perspetiva de um especialista na matéria?
e. O artigo 3º, al. c) do Regulamento CCP não exige, para a concessão de um CCP, que a invenção na patente base possa ser identificada pelo perito de acordo com a descrição e desenhos da patente, à luz da jurisprudência do TJUE atual?
f. O artigo 3.º, al. d) do Regulamento CCP fica automaticamente preenchido quando a alínea c) estiver preenchida, não constituindo um requisito em separado?
O acórdão recorrido, relativamente às als. c) e d) do art. 3.º do Regulamento entendeu que as rés não lograram provar que o produto composto pelas substâncias activas sitagliptina e metformina tenha sido objecto de um anterior certificado complementar de protecção ou que a primeira autorização para introdução no mercado não tenha sido aquela que foi concedida ao medicamento “Janumet®”, que, conforme acima se deixou assinalado, combina as substâncias activas sitagliptina e metformina.
Mais ficou provado que CCP 279 indica que “(…) o produto abrangido é a sitaglitina”, pelo que o certificado complementar de protecção n.º 339 é o único que contempla a associação das substâncias activas sitagliptina e metformina.
Por isso, nada aponta que o certificado tenha sido concedido em desrespeito das als. c) e d) do art. 3.º do Regulamento (CE) n.º 469/2009, como alegam as recorridas “Sandoz, BV” e “Sandoz Farmacêutica, Lda.”.
E, no que se refere à al. a) do art. 3.º do Regulamento, considerou o acórdão recorrido, com apoio em recente jurisprudência deste STJ, que não existe fundamento para ser anulado o certificado complementar de protecção com o n.º 339, na medida em que os princípios activos (sitagliptina e metformina) contidos no medicamento para as diabetes constam, senão explicitamente, pelo menos, implicitamente, das reivindicações da patente de base (patente europeia com o n.º 1 412 357).
Avançamos que, sobre a interpretação do art. 3.º do Regulamento 469/2009/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6.5.2009, já tivemos oportunidade de nos pronunciar, no Acórdão de 17-03-2023 (Revista n.º 174/21.7YHLSB.L1.S1), relatado pelo aqui também relator, ao qual, naturalmente, aqui vamos regressar.
Resulta dos considerandos preliminares do dito regulamento que com o mesmo se procura criar um regime que proteja e incentive, na Comunidade e na Europa, a investigação farmacêutica, que é longa e onerosa, pondo termo a uma protecção insuficiente que a vem penalizando, atenuando-se os riscos de deslocalização dos centros de investigação situados nos Estados-Membros para países que oferecem uma melhor protecção, para tanto se criando uma solução uniforme a nível comunitário, evitando-se uma evolução divergente das legislações nacionais que origine novas disparidades susceptíveis de criar entraves à livre circulação dos medicamentos na Comunidade e de, consequentemente, afectar directamente o funcionamento do mercado interno.
Prevê-se, para tanto, um certificado complementar de protecção (CCP) [que fora introduzido na ordem jurídica da União pelo Regulamento (CEE) n.º 1768/92, do Conselho, de 18.6.1992], para os medicamentos relativamente aos quais tenha sido dada autorização de introdução no mercado (AIM) e estritamente limitada ao produto abrangido por esta como medicamento, e que possa ser obtido a pedido do titular de uma patente nacional ou europeia nos mesmos termos em cada Estado-Membro, sendo que duração da protecção conferida pelo certificado deverá ser determinada de forma a permitir uma protecção efectiva suficiente, devendo o titular de uma patente poder beneficiar no total de um período máximo de quinze anos de exclusividade a partir da primeira autorização de introdução no mercado da Comunidade do medicamento em causa.
Contudo, todos os interesses em causa num sector tão complexo e sensível como o farmacêutico, incluindo os relativos à saúde pública, deverão ser tomados em consideração, pelo que, para se atingir tal efeito, o certificado não poderá ser concedido por um período superior a cinco anos.
O Certificado Complementar de Protecção (CCP) visa, pois, prolongar a duração da proteção da patente para os princípios ativos utilizados em medicamentos até um período máximo de cinco anos, desde que esse produto esteja protegido pela referida patente de base e devidamente identificado na AIM (cf. artigo 4º do Regulamento (CE) n.º 469 de 6 de Maio de 2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, relativo ao CCP para os medicamentos), sendo que, uma vez concedido, confere os mesmos direitos que os atribuídos pela patente de base, estando sujeito às mesmas limitações e obrigações.
Contudo, a proteção que o mesmo concede apenas abrange o produto coberto pela AIM do medicamento correspondente para qualquer utilização do produto, como medicamento, que tenha sido autorizada antes do termo de validade do certificado (arts. 4.º e 5.º do Regulamento CCP).
Dispõe o artigo 1º deste Regulamento, sob a epígrafe “Definições”, o seguinte:
“Para efeitos do presente regulamento entende-se por:
a) ‘Medicamento’: qualquer substância ou associação de substâncias com propriedades curativas ou preventivas em relação a doenças humanas ou animais, bem como qualquer substância ou associação de substâncias que possa ser administrada ao homem ou a animais com vista a estabelecer um diagnóstico médico ou a restaurar, corrigir ou alterar funções orgânicas no homem ou nos animais;
b) ‘Produto’: o princípio activo ou associação de princípios activos contidos num medicamento;
c) ‘Patente de base’: a patente que protege um produto como tal, um processo de obtenção de um produto ou uma aplicação de um produto e que tenha sido designado pelo seu titular para efeitos do processo de obtenção de um certificado;
d) ‘Certificado’: o certificado complementar de protecção”.
Por seu turno, preceitua o artigo 2º , sob a epígrafe “Âmbito de aplicação”, que “‘Os produtos protegidos por uma patente no território de um Estado-Membro e sujeitos, enquanto medicamentos, antes da sua introdução no mercado, a um processo de autorização administrativa por força da Directiva 2001/83/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos para uso humano ou da Directiva 2001/82/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos veterinários, podem ser objecto de um certificado, nas condições e segundo as regras previstas no presente regulamento.”
Já o art. 3º, sob a epígrafe “Condições de obtenção do certificado”, dispõe nos termos seguintes:
“O certificado é concedido se no Estado-Membro onde for apresentado o pedido previsto no artigo 7º e à data de tal pedido:
a) O produto estiver protegido por uma patente de base em vigor;
b) O produto tiver obtido, enquanto medicamento, uma autorização válida de introdução no mercado, nos termos do disposto na Directiva 2001/83/CE ou na Directiva 2001/82/CE, conforme o caso;
c) O produto não tiver sido já objecto de um certificado;
d) A autorização referida na alínea b) for a primeira autorização do produto no mercado, como medicamento.”
Acerca do âmbito de protecção da patente, o art. 69.º da Convenção de Munique sobre a Patente Europeia, aprovada pelo Decreto n.º 52/91, preceitua que:
1 - O âmbito da protecção conferida pela patente europeia ou pelo pedido de patente europeia é determinado pelo âmbito das reivindicações. Contudo, a descrição e os desenhos servem para interpretar as reivindicações.
2 - Durante o período até à concessão da patente europeia, o âmbito da protecção conferida pelo pedido de patente europeia é determinado pelas reivindicações depositadas em último lugar contidas na publicação prevista no artigo 93. 0. Contudo, a patente europeia tal como concedida ou modificada no decurso do processo de oposição determina retroactivamente essa protecção, desde que esta não seja alargada.
Por seu lado, através do Protocolo Interpretativo1, o qual faz parte integrante da citada Convenção da Patente Europeia, entendeu-se relativamente ao art. 69.º que:
“O artigo 69.º não deve ser interpretado como significando que a extensão da protecção conferida por uma patente europeia é determinada no sentido estrito e literal do texto das reivindicações e que a descrição e os desenhos servem unicamente para dissipar as ambiguidades que poderiam ocorrer nas reivindicações. Nem deve ser considerado como significando que as reivindicações servem unicamente como orientação e que a protecção se estende também ao que, da consideração da descrição e desenhos por um especialista na matéria, o titular da patente entendeu proteger. Pelo contrário, o artigo 69.º deve ser interpretado como definindo uma posição, entre estes extremos, que assegura simultaneamente uma protecção justa ao titular da patente e um grau razoável de segurança jurídica para terceiros.”.
De acordo com os factos provados 77 a 79 a 1.ª autora é titular do certificado complementar de protecção 339, sendo as demais autoras, suas licenciadas. Este CCP 339 abrange o produto correspondente à associação entre a sitagliptina e a metformina (cloridrato), sendo que o CCP 339 indica a EP 1 412 357 como sendo a “patente base”.
A propósito da al. a) do art. 3.º do Regulamento (CE) n.º 469/2009, de 06-05-2009, entendeu a sentença prolatada na 1.ª instância que o produto em causa não estava protegido pela patente de base (ou seja, pela patente europeia com o n.º 1 412 357). O que foi contraditado pelo acórdão recorrido, decidindo em sentido contrário e considerando que que aquela associação se mostrava protegida pela EP 1 0412 357 e consequentemente pelo CCP 339.
O TJUE tem procurado dissipar dúvidas que vão surgindo sobre a interpretação do art. 3.º al. a) do dito Regulamento.
Para essa tarefa interpretativa, releva o acima transcrito art. 69.º do Convénio sobre a Patente Europeia (CPE, assinado em Munich em 5.10.1973, que estabelece um procedimento único de concessão de patentes entre os Estados membros, que entrou em vigor em Portugal em 01-01-1992.
Importa, para além disso, ter presente o art. 1.º do Protocolo Interpretativo do art. 69.º da referida Convenção, por força do art. 164.º n.º 1, da CPE, dela faz parte integrante, que o art. 69.º não deve ser interpretado como significando que a extensão da proteção conferida por uma patente europeia é determinada no sentido estrito e literal do texto das reivindicações e que a descrição e os desenhos servem unicamente para dissipar as ambiguidades que poderiam ocorrer nas reivindicações. Nem deve ser considerado como significando que as reivindicações servem unicamente como orientação e que a proteção se estende também ao que, da consideração da descrição e desenhos por um especialista na matéria, o titular da patente entendeu proteger. Pelo contrário, o art. 69º deve ser interpretado como definindo uma posição, entre estes extremos, que assegura simultaneamente uma proteção justa ao titular da patente e um grau razoável de segurança jurídica para terceiros.
No que toca à descrição da invenção, prescreve o art. 83º do Convénio sobre a Patente Europeia (CPE) que a invenção deve ser descrita no pedido de patente europeia de forma suficientemente clara e completa para que um perito na matéria a possa executar.
Mais estatuindo o art. 84º do mesmo instrumento, a propósito das reivindicações, que estas, definindo o objeto da proteção pedida, devem ser claras e concisas e apoiar-se na descrição.
Dispõe, no mesmo sentido, o art. 66.º do Código da Propriedade Industrial (aplicável em tudo o que não contrarie a CPE, como dispõe o art. 77.º, n.º 2), que a invenção deve ser descrita no pedido de patente de maneira suficientemente clara e completa que permita a sua execução por um perito na especialidade.
Vejamos, então, por força do princípio da interpretação conforme, a interpretação que o TJUE tem feito, à luz das regras acima enunciadas, do art. 3.º, al. a), do Regulamento n.º 469/2009.
O TJUE pronunciou-se no acórdão de 25-07-2018, no processo n.º C-121/17 (Teva v Gilead2), a respeito dos critérios que permitem determinar se um produto composto por vários princípios ativos de efeito combinado é protegido por uma patente de base em vigor na aceção do art. 3.º, al. a), do Regulamento CCP.
Neste processo a apresentante Teva UK Ltd. contestou a validade do CCP concedido à Gilead Sciences Inc. para um produto farmacêutico destinado ao tratamento do vírus da imunodeficiência humana (VIH), estando em causa um CCP, que tem por base a patente n.º 915894 (EP894) e que é relativo ao mesmo medicamento antirretroviral (comercializado sob a marca TRUVADA), que contém dois princípios ativos – o tenofovir disoproxil e a emtricitabina – sendo que a Gilead se apoiava na reivindicação 27 para defender que a emtricitabina vinha aí definida funcionalmente, estando, por isso, a combinação dos ditos princípios protegida pela patente de base3.
Face à sua clareza, renovemos aqui considerandos importantes deste Acórdão em relação à questão que nos ocupa:
Considerou-se neste Acórdão o seguinte:
35. “no que se refere à patente europeia, importa salientar que, nos termos do artigo 69.º da CPE, o âmbito da proteção conferida por essa patente é determinado pelas reivindicações. As indicações que figuram no artigo 1. o do protocolo interpretativo desse artigo 69.º esclarecem que as reivindicações devem assegurar simultaneamente uma proteção justa ao titular da patente e um grau 8 ECLI:EU:C:2018:585 ACÓRDÃO DE 25. 7. 2018 - PROCESSO C-121/17 TEVA UK E O. razoável de segurança jurídica para terceiros. Assim, nem devem servir unicamente de linhas diretrizes nem ser lidas no sentido de que significam que o âmbito da proteção conferido por uma patente é determinado pelo sentido estrito e literal do texto das reivindicações.
36 A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 3.º, alínea a), do Regulamento n.º 469/2009, em princípio, não se opõe a que um princípio ativo que corresponde à definição funcional constante das reivindicações de uma patente emitida pelo IEP possa ser considerado como estando protegido por aquela patente, na condição, porém, de que, com base nessas reivindicações, interpretadas designadamente à luz da descrição da invenção, conforme previsto no artigo 69.º da CPE e no protocolo interpretativo do mesmo, seja possível concluir que essas reivindicações visavam, implícita mas necessariamente, o princípio ativo em causa, de forma específica (Acórdão de 12 de dezembro de 2013, Eli Lilly and Company, C-493/12, EU:C:2013:835, n.º 39). [sublinhado nosso]
37 Em consequência, um produto só pode ser considerado protegido pela patente de base em vigor, na aceção do artigo 3.º, alínea a), do Regulamento nº 469/2009, quando o produto objeto do CCP seja expressamente mencionado, ou seja necessária e especificamente visado, nas reivindicações dessa patente.
38 Para o efeito, em conformidade com a jurisprudência recordada no n.º 36 do presente acórdão, há que atentar na descrição e nos desenhos da patente de base, conforme prescreve o artigo 69.º da CPE, lido à luz do protocolo interpretativo do mesmo, dado que esses elementos permitem determinar se o produto objeto do CCP é visado nas reivindicações da patente de base e é efetivamente abrangido pela invenção coberta por essa patente.
39 Esta exigência é conforme com o objetivo do CCP, que consiste em restabelecer um período suficiente de proteção efetiva da patente de base, permitindo ao seu titular beneficiar de um período suplementar de exclusividade após a expiração dessa patente, destinado a compensar, pelo menos parcialmente, o atraso sofrido na exploração comercial da sua invenção, devido ao lapso de tempo decorrido entre a data do depósito do pedido de patente e a da obtenção da primeira AIM na União. A este respeito, o considerando 4 do Regulamento n.º 469/2009 precisa que a concessão deste período suplementar de exclusividade tem por finalidade incentivar a investigação e, para tal, visa permitir a amortização dos investimentos efetuados na investigação (v., neste sentido, Acórdão de 12 de dezembro de 2013, Eli Lilly and Company, C-493/12, EU:C:2013:835, n. os 41 e 42 e jurisprudência referida).
40 Em contrapartida, o CCP não se destina a ampliar o âmbito da proteção conferida por esta patente para lá da invenção coberta pela referida patente. Com efeito, seria contrário ao objetivo do Regulamento n.º 469/2009, recordado no número precedente do presente acórdão, conceder um CCP para um produto que não fosse abrangido pela invenção coberta pela patente de base, na medida em que esse CCP não teria por objeto os resultados da investigação reivindicados por essa patente.
41 Além disso, atendendo à necessidade, recordada no considerando 10 do Regulamento n.º 469/2009, de considerar todos os interesses em jogo, incluindo os da saúde pública, admitir que um CCP possa conferir uma proteção mais ampla ao titular da patente de base do que a assegurada por esta patente a título da invenção por ela coberta seria contrário à ponderação que deve ser feita, no que se refere ao incentivo da investigação na União através dos CCP, dos interesses da indústria farmacêutica com os da saúde pública (v., por analogia, Acórdão de 12 de março de 2015, Actavis Group PTC e Actavis UK, C-577/13, EU:C:2015:165, n.º 36 e jurisprudência referida).
42 Importa acrescentar que, atendendo aos interesses referidos nos considerandos 4, 5, 9 e 10 do Regulamento n.º 469/2009, não é admissível que o titular de uma patente de base em vigor possa obter um CCP de cada vez que introduzir no mercado de um Estado-Membro um medicamento que contenha, por um lado, um princípio ativo, protegido, enquanto tal, pela sua patente de base, que ECLI:EU:C:2018:585 9 ACÓRDÃO DE 25. 7. 2018 - PROCESSO C-121/17 TEVA UK E O. constitui o objeto da invenção coberta por essa patente, e, por outro lado, outra substância que não é o objeto da invenção coberta pela patente de base (v., nesse sentido, Acórdão de 12 de março de 2015, Actavis Group PTC e Actavis UK, C-577/13, EU:C:2015:165, n. o 37).
43 Daqui resulta que, tendo em conta os objetivos prosseguidos pelo Regulamento n.º 469/2009, as reivindicações não podem permitir ao titular da patente beneficiar, através da obtenção de um CCP, de uma proteção que ultrapasse a que é conferida pela invenção coberta por essa patente. Assim, para efeitos da aplicação do artigo 3.º, alínea a), deste regulamento, as reivindicações da patente de base devem ser entendidas à luz dos limites da invenção divulgada, conforme resulta da descrição e dos desenhos dessa patente.
44 Esta interpretação é corroborada pelo artigo 4.º do Regulamento n.º 469/2009, que precisa que a proteção conferida pelo CCP abrange apenas o produto coberto pela AIM do medicamento correspondente para qualquer utilização do produto, como medicamento, que tenha sido autorizada antes do termo da validade do CCP, mas unicamente «[d]entro dos limites da proteção assegurada pela patente de base».
45 O mesmo sucede com o artigo 5.º deste regulamento, nos termos do qual o CCP confere os mesmos direitos que os conferidos pela patente de base e está sujeito às mesmas limitações e obrigações. Assim, se o titular da patente podia, durante o período de validade desta, opor-se, invocando a sua patente, a qualquer utilização ou a certas utilizações do seu produto sob a forma de um medicamento que consista nesse produto ou que o contenha, o CCP concedido para esse mesmo produto conferir-lhe-á os mesmos direitos para qualquer utilização do produto, enquanto medicamento, que tenha sido autorizada antes de o certificado expirar (Acórdãos de 24 de novembro de 2011, Medeva, C-322/10, EU:C:2011:773, n.º 39, e de 24 de novembro de 2011, Georgetown University e o., C-422/10, EU:C:2011:776, n.º 32).
46 Resulta do que precede que o objeto da proteção conferida por um CCP deve limitar-se às características técnicas da invenção coberta pela patente de base, conforme reivindicadas por essa patente.
47 No que diz respeito à aplicação desta regra, em primeiro lugar importa precisar que, em conformidade com um princípio comum aos direitos das patentes dos Estados-Membros, refletido no artigo 1.º do protocolo interpretativo do artigo 69.º da CPE, as reivindicações de uma patente devem ser interpretadas por referência ao ponto de vista do especialista na matéria e deve, por conseguinte, ser determinado se o produto objeto de um CCP é necessariamente abrangido pela invenção coberta por essa patente.
48 Para o efeito, há que verificar se o especialista na matéria pode compreender de forma unívoca, com base nos seus conhecimentos gerais e à luz da descrição e dos desenhos da invenção que estão contidos na patente de base, se o produto visado nas reivindicações desta patente constitui uma característica técnica necessária para a solução do problema técnico, divulgada por essa patente.
49 Em segundo lugar, à luz do objetivo do Regulamento n.º 469/2009 recordado no n.º 39 do presente acórdão, para apreciar se um produto é abrangido pela invenção coberta por uma patente de base basta apenas ter em consideração a evolução técnica à data de depósito ou à data de prioridade dessa patente, de modo a que o produto possa ser especificamente identificado pelo especialista na matéria à luz de todos os elementos divulgados pela referida patente.
50 Com efeito, se se admitisse que essa apreciação podia ser efetuada à luz dos resultados da investigação realizada após a data de depósito ou de prioridade da patente de base, um CCP poderia permitir ao seu titular beneficiar indevidamente de uma proteção para esses resultados, apesar de estes ainda não 10 ECLI:EU:C:2018:585 ACÓRDÃO DE 25. 7. 2018 — PROCESSO C-121/17 TEVA UK E O. serem conhecidos à data de prioridade ou de depósito da referida patente e, além disso, fora de qualquer processo destinado à obtenção de uma nova patente. Conforme recordado nos n.ºs 40 e 41 do presente acórdão, isso seria contrário ao objetivo do Regulamento n.º 469/2009.
51 Por conseguinte, para determinar se um produto objeto de um CCP está protegido por uma patente de base, na aceção do artigo 3.º, alínea a), desse regulamento, esse produto deve poder ser especificamente identificado pelo especialista na matéria à luz de todos os elementos divulgados pela patente de base e da evolução técnica existente à data de depósito ou de prioridade dessa patente.
52 Tendo em conta todas estas considerações, um produto é «protegido por uma patente de base em vigor», na aceção do artigo 3.º, alínea a), do Regulamento n.º 469/2009, desde que, mesmo que não esteja expressamente mencionado nas reivindicações da patente de base, esse produto seja necessária e especificamente visado por uma das reivindicações dessa patente. Para o efeito, o referido produto deve estar necessariamente abrangido, para o especialista na matéria, à luz da descrição e dos desenhos da patente de base, pela invenção coberta por esta patente. O especialista na matéria deve poder identificar especificamente este produto à luz de todos os elementos divulgados pela referida patente, e com base na evolução técnica à data de depósito ou de prioridade da mesma patente.
53 Essa interpretação do artigo 3.º, alínea a), do Regulamento n.º 469/2009 também deve ser adotada numa situação como a que está em causa no processo principal, em que os produtos objeto de um CCP sejam compostos por vários princípios ativos de efeito combinado.
54 …
55 Em especial, incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, em conformidade com as considerações que figuram nos n.ºs 47 a 51 do presente acórdão, se, do ponto de vista do especialista na matéria, a combinação dos princípios ativos que compõem o produto objeto do CCP em causa está necessariamente abrangida pela invenção coberta por essa patente e se cada um desses princípios ativos é especificamente identificável, com base na evolução técnica à data de depósito ou de prioridade da referida patente.
…”
Terminando o TJUE, neste Acórdão, por declarar que “O artigo 3.º, alínea a), do Regulamento n.º 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de maio de 2009, relativo ao certificado complementar de proteção para os medicamentos, deve ser interpretado no sentido de que um produto composto por vários princípios ativos de efeito combinado é «protegido por uma patente de base em vigor», na aceção desta disposição, quando a combinação dos princípios ativos que o compõem, mesmo que não esteja expressamente mencionada nas reivindicações da patente de base, é necessária e especificamente visada nessas reivindicações. Para o efeito, do ponto de vista do especialista na matéria e com base na evolução técnica à data de depósito ou de prioridade da patente de base:
– A combinação desses princípios ativos deve ser necessariamente abrangida, à luz da descrição e dos desenhos da patente, pela invenção coberta por esta, e
– Cada um dos referidos princípios ativos deve ser especificamente identificável, à luz de todos os elementos divulgados pela referida patente.
Posteriormente, no acórdão de 30-04-2020, proferido no processo C-650/17[26] (Royalty Pharma4), apoiando-se fundamentalmente da doutrina do Acórdão TEVA, o TJUE considerou os seguintes:
37. Consequentemente, o Tribunal de Justiça considerou que, para avaliar se um determinado produto está protegido por uma patente de base em vigor nos termos do artigo 3.º, alínea a), do Regulamento n.º 469/2009, deve verificar-se, quando o produto não expressamente nomeado nas reivindicações da referida patente, se for necessária e especificamente incluída em uma dessas reivindicações. Para tais fins, dois requisitos cumulativos devem ser atendidos. Por um lado, o produto deve necessariamente ser incluído, para os versados no assunto, à luz da descrição e dos desenhos da patente básica, na invenção objeto da referida patente. Por outro lado, o técnico no assunto deve ser capaz de identificar especificamente este produto à luz de todos os elementos divulgados pela referida patente e com base no estado da técnica na data de depósito ou prioridade da mesma patente (v., a este respeito, acórdão de 25 de julho de 2018, Teva UK e outros, C‑121/17, EU:C:2018:585, n.° 52).
[sublinhado nosso]
…
40. A fim de determinar se o segundo requisito referido no n.º 37 do presente acórdão está preenchido, cabe mais especificamente ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se o objeto da CCP em causa se enquadra nos limites do que, na data de depósito ou de prioridade da patente básica, o técnico no assunto pode deduzir objetivamente, direta e inequivocamente, do relatório descritivo da patente, tal como foi depositado, com base em seus conhecimentos gerais na área considerada na data do depósito, apresentação ou prioridade e em face da estado da arte em uma ou outra dessas datas.
41. Assim, mesmo quando o produto objeto da CCP não se deduz individualmente, como modalidade específica, das informações protegidas pela patente básica, em princípio, a concessão de uma CCP não está excluída.
42. No entanto, quando o produto não é explicitamente divulgado pelas reivindicações da patente de base, mas se enquadra em uma definição funcional geral como a utilizada na patente de base em questão no processo principal, o técnico no assunto deve ser capaz de deduzir direta e inequivocamente do fascículo da patente, pois foi depositado que o produto objeto da CCP está coberto pela referida patente.
43. Resulta do exposto que há que responder à primeira e à segunda questões que o artigo 3.º, alínea a), do Regulamento n.º 469/2009 deve ser interpretado no sentido de que um produto está protegido por uma patente de base em vigor, nos termos do referido disposição, se, ainda que não seja deduzida individualmente, como uma forma de realização específica, da informação contida naquela patente, responde a uma definição funcional geral utilizada por uma das reivindicações da patente de base e está necessariamente incluída na invenção abrangida por desde que possa ser especificamente identificada, à luz de todos os elementos divulgados pela referida patente, por um especialista na área, com base em seus conhecimentos gerais na área considerada na data de depósito ou prioridade da patente básica e o estado da arte na mesma data.
Acabando por declarar que:
1) O artigo 3.º, alínea a), do Regulamento (CE) nº 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de maio de 2009, relativo ao certificado complementar de proteção para os medicamentos, deve ser interpretado no sentido de que um produto está protegido por uma patente de base em vigor, na aceção desta disposição, quando responde a uma definição funcional geral utilizada por uma das reivindicações da patente de base e está abrangido necessariamente pela invenção coberta por essa patente, sem que resulte, no entanto, de forma individualizada, enquanto composição concreta, das especificações técnicas da referida patente, desde que seja especificamente identificável, à luz de todos os elementos divulgados pela mesma patente, pelo especialista na matéria, com base nos seus conhecimentos gerais no domínio em questão à data de depósito ou de prioridade da patente de base e na evolução técnica nessa mesma data.
2) O artigo 3.º, alínea a), do Regulamento nº 469/2009 deve ser interpretado no sentido de que um produto não está protegido por uma patente de base em vigor, na aceção desta disposição, quando, embora esteja abrangido pela definição funcional constante das reivindicações dessa patente, tenha sido desenvolvido após a data de depósito do pedido de patente de base, na sequência de uma atividade inventiva autónoma.
Neste processo, o TJUE remeteu, no essencial, para as considerações feitas nos precedentes acórdãos, acrescentando, em face da particularidade do caso [estava em causa um único princípio ativo – a sitaglipina – e o CCP havia sido recusado por se ter considerado que o produto havia sido desenvolvido após a data de depósito do pedido da patente e que, em consequência, o objeto da proteção desta não correspondia ao medicamento posteriormente desenvolvido e comercializado], que quando o produto não está explicitamente divulgado pelas reivindicações da patente de base, mas está compreendido num definição funcional geral como a utilizada pela patente de base em causa no processo principal.
Todavia, o TJUE sublinhou que o facto de esse produto estar abrangido pela definição funcional constante das reivindicações da patente não invalida a interpretação de que se o mesmo tiver sido desenvolvido após a data de depósito ou de prioridade da patente de base, na sequência de uma atividade inventiva autónoma, já não poderá considerar-se abrangido pelo objeto da proteção conferida por essa patente.
Percorrida a jurisprudência dominante do TJUE a respeito da interpretação do art. 3.º, al. a), do Regulamento n.º 469/2009, importará regressar ao caso que nos ocupa, analisando a factualidade apurada a fim de saber se o CCP 339 é valido.
Lançamos mão, novamente, do recente acórdão do STJ de 19-09-2024, Revista n.º 166/20, no qual, igualmente, se discute o CCP 339, e que, necessariamente, porque conforme à posição que adoptámos em anterior Acórdão já referenciado, e bem assim concordante com a citada jurisprudência do TJUE, de acordo com o qual foi decidido que (…) na patente base, designadamente na reivindicação 30, está expressamente prevista a combinação sitagliptina com metformina pelo que terá de concluir-se que estão preenchidos os requisitos a que se reporta o art. 3.º, alínea a) do Regulamento CCP.
Assim, o produto objecto do CCP 339 — sitaglipina /(cloridrato de) Metformina — está abrangido pela EP'357, sendo que a referência na letra de uma reivindicação a uma combinação de princípios é suficiente para considerar que essa associação se encontra protegida pela patente base5.
O caso em análise apresenta-se, assim, bastante simplificado em relação àqueles mencionados na supra citada jurisprudência do TJUE em que a dúvida se colocava relativamente à concessão de um certificado complementar de protecção para princípios activos que não são mencionados no texto das reivindicações da patente de base invocada em apoio do pedido de CCP.
Podemos, contudo, responder à questão formulada pelas Recorrentes sobre se o art. 3.º, alínea a) do Regulamento CCP exige que a reivindicação identifique especificadamente o produto a proteger.
A resposta é que de acordo com a Jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia , a interpretação do art. 3.º alínea a) vai no sentido de que "um produto composto por vários princípios activos, como é o caso que nos ocupa, é protegido por uma patente de base em vigor em duas situações: (i) quando a combinação dos princípios activos que o compõem esteja expressamente mencionada nas reivindicações da patente de base, como é o caso dos presentes autos; (ii) ou ainda que não esteja expressamente mencionada nas reivindicações da patente de base, quando seja implícita, mas necessariamente, visada nas reivindicações da patente de base6. Dado que no caso em análise, a combinação dos princípios activos consta expressamente das reivindicações de base da patente, desnecessário se toma considerar a segunda situação da abrangência implícita mas necessária.
Ora, de acordo com os factos provados 26 a 60, a 1.ª autora é titular da EP 1 412 357, sendo que as reivindicações 1, 2, 3, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 28 e 30 desta EP abrangem uma família de compostos, à qual pertence a sitagliptina, e a reivindicação 30 diz respeito a uma composição farmacêutica compreendendo um composto de qualquer das reivindicações 1 a 15, ou um seu sal farmaceuticamente aceitável, com metformina e um veículo farmaceuticamente aceitável.
Temos, assim, que, em face da factualidade provada, a combinação dos princípios activos sitagliptina e metformina mostra-se mencionada, senão expressamente, pelo menos implicitamente nas reivindicações da EP n.º 1 412 357.
Invocam, ainda as recorrentes a questão de saber se art. 3.º, al. a) do Regulamento não exige que a invenção descrita na patente divulgue essa invenção, na perspetiva de um especialista na matéria e uma vez que foram eliminados dos factos provados os factos 98, 102, 103 e 104, ficaram as recorrentes impedidas de provar o preenchimento deste fundamento.
Nesta parte, também nos apoiamos no citado Ac. do STJ de 19-09-2024, que para resolver esta questão salientou o acórdão do TJUE de 30 de Abril de 2020, proferido no processo C650/17 (Caso Royalty Pharma Collection Trust contra Deutsches Patent- und Markenamt), no qual se esclareceu:
“1. que não é necessário que o produto resulte “de forma individualizada, enquanto composição concreta, das especificações técnicas da... patente”;
2. que é suficiente que resulte do conjunto dos elementos divulgados, considerados por um especialista na matéria, “com base nos seus conhecimentos gerais no domínio em questão”. Quando o produto não é explicitamente divulgado pelas reivindicações da patente de base, (…) “especialista na matéria deve poder deduzir directa e inequivocamente da especificação da patente, tal como foi depositada, que o produto objecto do certificado complementar de protecção se insere no objecto da protecção desta patente” - cfr. o já citado Ac. do STJ de 18-03-2021.
Em primeiro lugar, já se mostra resolvida e decidida a questão da eliminação dos factos provados referidos pelas recorrentes, pelo que nada mais há a acrescentar nesta parte.
Quanto ao demais, ora, tal como explicitámos, nos termos dos factos provados, a combinação dos princípios activos sitagliptina e metformina mostra-se mencionada, senão expressamente, pelo menos implicitamente nas reivindicações da EP n.º 1 412 357, circunstância que é perfeitamente apreensível por especialista na matéria.
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Mais questionam as recorrentes que importa averiguar se o art. 3.º, al. c), do Regulamento CCP não exige, para a concessão de um CCP, que a invenção na patente base possa ser identificada pelo perito de acordo com a descrição e desenhos da patente, à luz da jurisprudência do TJUE atual?
Sustentam as recorrentes que o CCP 339 não preenche os requisitos do art. 3.º, alínea c) do Regulamento, porquanto as autoras e recorridas já beneficiaram de um certificado complementar de protecção para o produto que integra o objecto da invenção da patente base EP n.º 1 412 357, ou seja, o CCP 278 relativo ao produto sitagliptina, que entrou em vigor em 21-03-2007 (facto provado 75) ao passo que o CCP 339 entrou em vigor em 08-04-2008 (facto provado 80).
Preceitua o art. 3.º, al. c) do Regulamento que “o certificado é concedido se no Estado- Membro onde for apresentado o pedido e à data de tal pedido “O produto não tiver sido já objeto de um certificado;”.
A fim de que fosse considerada a invalidade do CCP à luz deste normativo, necessário seria que as recorrentes demonstrassem que que o certificado complementar de protecção n.º 339 tinha sido, indevidamente, concedido, por já ter sido objecto de um anterior certificado.
As recorrentes, ao contrário do que alegam, não demonstraram que o produto protegido pelo CCP n.º 339 já tivesse sido objecto de um outro certificado, nem tão-pouco que esse produto não tenha sido a primeira autorização para introdução no mercado como medicamento.
Em primeiro lugar importa referir que o CCP n.º 339 se refere ao produto composto pela sitagliptina/ (cloridrato de) metformina – facto provado – ao passo que o CCP n.º 278 integra apenas a sitagliptina – facto provado 73.
De acordo com os factos provados 82, 83, 84 e 85, “(…) em Portugal, a MSD obteve Autorizações de Introdução no Mercado para medicamentos contendo sitagliptina como única substância ativa e sitagliptina em associação com metformina (…)”, “(…) no mercado português, os medicamentos de referência que contêm sitagliptina como única substância ativa (…) são comercializados sob as marcas comerciais Januvia® e Xelevia® (…)” e “(…) encontram-se igualmente disponíveis no mercado português medicamentos que compreendem como substâncias ativas sitagliptina em associação com metformina, os quais são comercializados (…) sob as marcas comerciais Janumet®, Efficib® e Velmetia®, e “(…) A MSD LDA (…) é a sociedade que, em Portugal, comercializa todos os medicamentos de referência contendo sitagliptina como substância ativa, em monoterapia ou em associação com metformina entre os quais se encontra o medicamento de referência Januvia® (sitagliptina) e o medicamento Janumet® (sitagliptina + metformina) (…)”.
Daqui resulta que não se mostra provado que o produto composto pelas substâncias activas sitagliptina e metformina tenha sido objecto de um anterior certificado complementar de protecção ou que a primeira autorização para introdução no mercado não tenha sido aquela que foi concedida ao medicamento “Janumet®”, este composto por combinação das substâncias activas sitagliptina e metformina. Terá resultado provado uma anterior certificado, mas tão só respeitante à sitagliptina, o CCP 278, o qual é distinto do CCP 339 que agrega aqueles dois princípios activos, pelo que estamos duas realidades distintas e não comparáveis.
Mas, ainda que assim não se entendesse, conforme foi decidido no citado AC. do STJ de 19-09-2024, acerca deste ponto, sempre diremos o seguinte: Acresce que, como consta do facto provado n.0 76 "Tal como foi certificado pelo INPI, o CCP 278, cuja patente base é a EP 1 412 357, produziria efeitos a partir do dia 6 de julho de 2022, mas, nos termos do artigo 13º, nº 1 Regulamento (CE) 469/2009, o mesmo tem uma duração inferior à da sua Patente Base (a sua vigência terminaria em 23.03.2022), pelo que não chegará a vigorar," Ora, se tal certificado não chegou a vigorar, afigura-se que não deverá considerar-se impedimento da concessão do CCP339, ao abrigo da referida alínea.
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O artigo 3.º, al. d) do Regulamento CCP fica automaticamente preenchido quando a alínea c) estiver preenchida, não constituindo um requisito em separado?
Invocam as recorrentes que o acórdão recorrido errou na interpretação da al. d) do art. 3.º do Regulamento, pois entende que CCP339 foi baseado na AIM para o medicamento Janumet®, mas como vimos acima aquela não foi a primeira AIM para o produto, i.e., a combinação das substâncias sitagliptina e metformina.
Pelo contrário, este produto já estava abrangido pela AIM para o medicamento Januvia®, porquanto as indicações terapêuticas já referiam a terapêutica oral dupla em associação de sitagliptina com metformina.
Em conclusão, a AIM do medicamento Januvia foi a primeira AIM para o produto do CCP339, pelo que este (também) não preenche o requisito previsto na alínea d) do artigo 3.º do Regulamento CCP.
O artigo 3.º do Regulamento preceitua que: “o certificado é concedido se no Estado- Membro onde for apresentado o pedido e à data de tal pedido: d) A autorização referida na alínea b) for a primeira autorização de introdução do produto no mercado, como medicamento.”.
Mais uma vez laboram em erro as recorrentes, pois confundem o CCP 339, que integra o composto sitagliptina e metformina, com o CCP 278 que integra o composto sitagliptina. E, relativamente aos medicamentos de referência contendo sitagliptina como substância ativa, em monoterapia ou em associação com metformina temos o medicamento de referência Januvia® (sitagliptina) e o medicamento Janumet® (sitagliptina + metformina), tratando-se de medicamentos diferentes, com princípios activos distintos e comercializados à luz de diferentes patentes.
Temos, assim, mais uma vez que concluir que o certificado complementar de protecção n.º 339 é o único que contempla a associação das substâncias activas sitagliptina e metformina.
À data em que foi concedido o CCP n.º 339, o produto sitagliptina associado a metformina não tinha sido objecto de qualquer certificado complementar de protecção, uma vez que não tinha sido obtido/concedido um CCP para aquele produto. O CCP n.º 278 apenas abrange a sitagliptina e a AIM concedida ao medicamento Janumet@, que contém o produto que é objecto do CCP 339 (a associação das substâncias activas sitagliptina e metformina), é a primeira autorização de introdução desse produto no mercado, como medicamento, pelo que, também, relativamente a este fundamento improcede o recurso de revista. (no Ac. do STJ de 19-09-2024, na apreciação deste pressuposto foi, igualmente, atendida a data em que foi concedido o CCP 278, 23-04-2012, porém esta data não consta dos factos provados dos presentes autos).
Da análise da factualidade provada, resulta que se mostram preenchidos todos os pressupostos necessários para a concessão do CCP n.º 339, inexistindo qualquer fundamento legal, à luz do art. 3.º do Regulamento (CE) n.º 469/2009, de 06-05-2009, para anular ou declarar a nulidade do CCP 339.
Improcede, assim, totalmente, a revista interposta pelas Rés
5 - Da nulidade da sentença e do acórdão recorrido por excesso de pronúncia (ampliação do âmbito do recurso);
Ao abrigo do disposto no art. 636.º do CPC, vieram as autoras, ora recorridas requerer a ampliação do âmbito do recurso, caso seja dado provimento à revista das rés.
Ora, tendo improcedido a revista, mostra-se desnecessária a apreciação da admissibilidade e dos fundamentos desta ampliação do âmbito do recurso, a qual foi requerida apenas e no caso de provimento da pretensão das rés.
DECISÃO
Por todo o exposto, Acordam os Juízes que integram a 7ª Secção Cível deste Supremo tribunal de Justiça em julgar improcedente o recurso de revista apresentado pelas Rés recorrentes, confirmando-se o Acórdão recorrido.
Custas pelas recorrentes.
Lisboa, 17 de Outubro de 2024
Relator: Nuno Ataíde das Neves
1ª Juíza Adjunta – Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
2º Juiz Adjunto – Conselheiro Ferreira Lopes
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2. Teva UK Ltd e o. contra Gilead Sciences Inc.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pela High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division (Patents Courts)
3. Situação muito idêntica e seguida à que, seguindo de perto o Acórdão Teva Uk Ltd, tratou o Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 20-05-2021, no processo 384/16.9YHLSB.L1.S1, que também seguimos de perto.
Veja-se também o Acórdão deste STJ de 18/03/2021, processo 281/17.0YHLSB.L1.S1.
4. Processo Royalty Pharma Collection Trust contra Deutsches Patent- und Markenamt.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundespatentgericht
5. Tal como foi decidido nos acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça de 18-03-2021 e de 07-03-2023, proferidos, respectivamente, nos processos 281/17.0YHLSB.Ll .SI e 174/21.7YHLSB.L1.S1 (por nós relatado), sendo certo que neste último processo o caso apreciado é diferente do presente, uma vez que o aí produto alvo do pedido de CCP 857-0 atezolizumab — não era referenciado especificamente nas reivindicações da patente EP 428.
6. Cf. designadamente os acórdãos do TJUE de 12 de Novembro de 2012 — processo C-493/12 (Eli Lilly and Company Ltd contra Human Genome Sciences Inc) — de 25 de Julho de 2018 — processo C121/17 (Teva UK Ltd, Accord Healthcare Ltd, Lupin Ltd, Lupin (Europe) Ltd e Generics (UK) Ltd contra Gilead Sciences Inc.) — e de 30 de Abril de 2020 — processo C650/17 (Royalty Pharma Collection Trust contra Deutsches Patent und Markenamt)APUD Acórdão do STJ de 18-03-2021 Nuno Pinto Oliveira), Processo 281/17.0YHLSB.L1.Sl, disponível em www.dgsi.pt.