PLATAFORMA DIGITAL
“ESTAFETA”
PRESUNÇÃO DE LABORALIDADE - ART.º 12-A DO CT
CONTRATO DE TRABALHO
Sumário


. I – Verificando-se três caraterísticas das previstas nas diversas alíneas do art. 12.º-A do CT, está preenchida a presunção de existência do contrato de trabalho, sem prejuízo de poder vir a ser ilidida.
II - Operando a referida presunção de laboralidade cabe à ré a prova do contrário, nos termos previstos no art. 350.º/2 do CC e no n.º 4 do art. 12.º-A do CT, não lhe bastando a contraprova destinada a tornar duvidoso o facto presumido.

Texto Integral


Acordam na Secção Social da Relação de Guimarães

I – RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo especial de acção para reconhecimento da existência de contrato de trabalho, contra EMP01..., UNIPESSOAL, LDA, nos autos já melhor identificada, pedindo a condenação desta a reconhecer a existência de um contrato individual de trabalho por tempo indeterminado, com início em 01/06/2023, relativo a AA, também nos autos melhor identificado.

Alegou, para o efeito e muito em síntese, que em visita inspectiva realizada pela ACT/... no dia 20/09/2023 junto ao ponto de recolha de pedidos do EMP02... - Restaurante, sito na rotunda do ..., verificou aquela entidade que no local estava a prestar a sua actividade o mencionado AA, em situação de prestação de actividade aparentemente autónoma e mediante a celebração, com a dita EMP01..., Unipessoal, Lda, de contratos designados de prestação de serviços, mas em condições análogas ao contrato de trabalho, e beneficiando da presunção de laboralidade prevista no art. 12.º, n.º 1 do CT, para o que basta a verificação de duas das circunstâncias indiciadoras nela elencadas e sendo que, no caso aqui em apreço, a factualidade apurada integra, conforme descreve, as quatro  circunstâncias indiciárias que identifica.

 A ré apresentou contestação na qual, e no que ora releva, sustentou que AA desenvolve a sua actividade de estafeta de forma autónoma.

Prosseguindo os autos, veio a proferir-se sentença com o seguinte diapositivo:

“a) Julgar improcedente o pedido formulado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO de reconhecimento da existência de um contrato de trabalho por tempo indeterminado que teria sido celebrado entre a EMP01..., UNIPESSOAL, LDA., e AA, absolvendo-se a ré, em conformidade, de tal pretensão;”

Inconformado com esta decisão, dela veio o autor/Ministério Público interpor o presente recurso de apelação para este Tribunal da Relação de Guimarães, apresentando alegações que terminam mediante a formulação das seguintes conclusões (transcrição):

“1.O Ministério Público não concorda, quanto ao decidido na sentença de julgar improcedente a acção.
2.Desse modo, importa verificar se resulta dos factos provados a verificação de algumas das características referidas nas alíneas do n.º 1, do referido artigo 12.ºA do Código do Trabalho.
3.Nos termos do art. 12.º-A, n.º 1, al. a), do C.T., cumpre averiguar se “A plataforma digital fixa a retribuição para o trabalho efetuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela”.
4. Conforme resulta dos factos provados, é a plataforma G... que, unilateralmente, fixa a retribuição e, além disso, estabelece também um limite mínimo e um limite máximo para o prestador de atividade/estafeta por cada serviço prestado. O estafeta pode, é verdade, recusar o serviço, mas isso não traduz qualquer possibilidade de negociação da sua parte - contrariamente ao que se lê na sentença, rejeitar o serviço não é, em parte alguma, sinónimo de negociar o preço do mesmo. Se os estafetas aderiram à plataforma para exerceram as funções respetivas, naturalmente não o fizeram para rejeitarem os pedidos por ela submetidos – só o fazem se, v.g., o local de recolha ou o local de entrega se situarem bastante longe do local onde se encontrem.
5. Os “estafetas” podem alterar o chamado multiplicador – por forma a modificarem o limite mínimo do valor de cada serviço. Mas se o fizerem, conforme constitui regra de mercado, poucos ou nenhuns pedidos receberão. E mesmo nesse caso, o “limite mínimo” de cada serviço não deixa de ser fixado unilateralmente pela plataforma – os estafetas apenas lograrão “subir” esse limite mínimo, sem que consigam proceder, inversamente, à redução desse montante (“mínimo”) já previamente determinado pela plataforma.
6. Por isso é a plataforma que fixa o valor da retribuição, uma vez que esta se encontra, na sua totalidade, dependente do seu critério unilateral.
7.Pelo exposto, deve considerar-se preenchida a característica de contrato de trabalho prevista no art. 12.º-A, n.º 1, al. a), do Código do Trabalho.
8.Nos termos do art. 12.º-A, n.º 1, al. b): “A plataforma digital exerce o poder de direção e determina regras específicas, nomeadamente quanto à forma de apresentação do prestador de atividade, à sua conduta perante o utilizador do serviço ou à prestação da atividade”.
9. A nosso ver, a Ré G..., além de estipular as regras (rectius, todas as regras) para acesso/inscrição na plataforma por parte dos “estafetas” – fase que não se pode excluir de todo o processo de prestação da atividade, igualmente dirige, estipula, concretiza e define a forma como toda a atividade deve ser por eles prestada.
10.Citando a sentença proferida no âmbito do processo n.º 1980/23...., do Juízo do Trabalho de Castelo Branco, em ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho movida contra a plataforma digital “...”, a qual tem aqui igual aplicação, “O procedimento de entrega da EMP03... encontra-se perfeitamente padronizado e decorrerá da mesma forma, independentemente do local onde é prestado e da pessoa concreta do estafeta, que se limitará a seguir todo um esquema previamente definido pela ré, que assim, segundo se entende, determina as regras especificas quanto à prestação da atividade por parte do estafeta mostrando-se nessa medida também verificado o indicio previsto no artigo 12º-A, nº 2, al. b) do Código do Trabalho.”
11. Já quanto à alínea e) do art. 12.º-A, n.º 1, do Código de Trabalho, é a própria sentença do Tribunal “a quo” que reconhece estar preenchida esta característica de contrato de trabalho.
12.Por fim, diz-se na alínea f) do art. 12.º-A, n.º 1, do Código de Trabalho, que “Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertencem à plataforma digital ou são por esta explorados através de contrato de locação”.
13.Salvo melhor opinião o principal “instrumento de trabalho” (a aplicação informática EMP01...) é da exclusiva propriedade da Ré, conforme resulta dos factos provados, sendo que, sem ela, seria impossível a prestação da atividade em análise.
14.Socorrendo de novo da fundamentação expressa na mencionada sentença do Juízo do Trabalho de Castelo Branco, “se os estafetas em questão pretendessem ser verdadeiramente autónomos e não utilizassem a marca de que a ré é titular, estariam condenados ao fracasso, já que o êxito deste tipo de plataformas deve-se à publicidade que elas fazemnas redes sociais e nos motores de busca, sendo estes os sites que os clientes procuram quando querem o tipo de produtos que a plataforma anuncia. Assim para o desenvolvimento da atividade, os meios que o trabalhador usa e de que é proprietário, o veículo ou o telemóvel, têm um valor escasso quando comparado com a plataforma ou com o valor da marca no mercado, que são da titularidade de ré.”
15. Aqui chegados, não podemos deixar de aludir à conclusão expressa por João LealAmado(ob. cit. pág. 89) de que “aoolhar para umqualquer estafeta, daqueles que percorrem velozmente as ruas nas suas motos (ou, mais lentamente, pedalando nas suas bicicletas), creio que nenhum de nós se convence, seriamente, de que ali vai um empresário - seja um microempresário, um motoempresário ou um cicloempresário…Não(…) Alivai, motorizado ou pedalando, um trabalhador dependente, um trabalhador do século XXI, diferente, decerto, dos seus pais, avós ou bisavós, mas, afinal, ainda um trabalhador dependente um subordinado de novo tipo, com contornos distintos dos tradicionais, mas, em última instância, ainda dependente e subordinado na forma como desenvolve a sua atividade”.
16.Nestes termos, concluindo-se pela verificação das presunções enunciadas nas alíneas a), b), e) e f) do art. 12.º-Ado Código do Trabalho, deverá a douta sentença ser revogada e substituída por outra que condene a Ré no reconhecimento dos contratos de trabalho relativamente ao trabalhador AA, desde ../../2023, data da sua inscrição na plataforma G....”

A ré apresentou contra-alegações pugnando pela improcedência do recurso.

Dado cumprimento ao disposto na primeira parte do n.º 2 do artigo 657.º do Código de Processo Civil foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II OBJECTO DO RECURSO

Questão prévia:

Da admissibilidade da junção dos documentos com as contra-alegações de recurso:
Resulta da aplicação do Código do Processo Civil (subsidiariamente aplicável; art. 1.º/2 a) do CPT), designadamente do seu art. 651.º n.º 1, que as partes podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º do mesmo Código, ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância.
Estabelece o referido art. 425.º do CPC que “Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.” (com efeito, e sem prejuízo do disposto no n.º 2 do art. 63.º do CPT e da aplicação subsidiária de outras disposições do CPC, como seja o art. 423.º/2) resulta do prescrito no n.º 1 do art. 63.º do CPT que com os articulados devem as partes juntar os documentos, apresentar o rol de testemunhas e requerer quaisquer outras provas).

Como se sintetizou no sumário de Ac. da RG de 10.7.2023 (Proc. 1159/18.6T8VRL.G1, in www.dgsi.pt):

(…) 2 – A impossibilidade de apresentação anterior ao momento do encerramento da discussão em 1ª instância pode resultar de:
a) o documento se ter formado posteriormente, mas referir-se a facto já anteriormente alegado;
b) a parte só posteriormente ter tido conhecimento da existência do documento (o documento apenas veio ao conhecimento da parte após aquele momento);
c) ocorrência de um impedimento inultrapassável à sua apresentação tempestiva;
d) o facto probando ser posterior ao encerramento da discussão.
3 – A junção será considerada necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância se a decisão recorrida contiver elementos de novidade, isto é, que tenha sido absolutamente surpreendente para o apresentante do documento, face ao que seria de esperar em face dos elementos do processo. (…)

A recorrida juntou com as contra-alegações cópias de diversas decisões da 1.ª instância (sentenças) e de um requerimento apresentado junto do Tribunal Constitucional pela Sra. Provedora de Justiça.
Não diz a recorrida/apresentante a razão porque só agora junta os mencionados documentos (sendo que pelo menos dois ostentam datas de emissão anteriores a 22-04-2024, data em que foi encerrada a audiência de julgamento), nem esclarece para prova de cuja factualidade são relevantes, sendo que, aliás, não está impugnada a matéria de facto.

Dispõe todavia o n.º 2 do art. 651.º do CPC que “2 - As partes podem juntar pareceres de jurisconsultos até ao início do prazo para a elaboração do projeto de acórdão.
Assim, e atenta a interpretação desta norma que vem sendo feita em alguns arestos dos nossos Tribunais Superiores, donde se extrai que a junção é admissível se, como é o caso, os documentos “na economia dos presentes autos, tem a feição de um parecer jurídico, por representar uma posição opinativa sobre determinadas questões jurídicas, que se suscitam também nos presentes autos[1], admite-se a junção dos mesmos.

Delimitado que é o âmbito do recurso pelas conclusões da recorrente, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso (artigos 608.º n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 3, todos do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 87.º n.º 1 do CPT), enuncia-se então a única questão que cumpre apreciar:
- Apurar se a relação profissional estabelecida entre a EMP01..., Unipessoal, Lda e o já identificado AA é de qualificar como contrato de trabalho, ou não, e em caso de resposta afirmativa fixar a data do início do contrato.

III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Os factos relevantes para a decisão da causa são os que assim constam da decisão recorrida (pois que não houve recurso da matéria de facto nem se vislumbra fundamento para alterar oficiosamente a decisão proferida sobre essa matéria):

Matéria de facto provada:
1. A ré possui como objecto social:
“Desenvolvimento e exploração de uma plataforma tecnológica, comércio a retalho por via electrónica, comércio não especializado de produtos alimentares e não alimentares, bebidas e tabaco e, de um modo geral, de todos os produtos de grande consumo, comercialização de medicamentos não sujeitos a receita médica, produtos de dermocosmética e de alimentos para animais, a importação de quaisquer produtos, o comércio de refeições prontas a levar para casa e a distribuição ao domicílio de produtos alimentares e não alimentares. Exploração, comercialização, prestação e desenvolvimento de todos os tipos de serviços complementares das actividades constantes do seu objecto social. Realização de actividades de formação, consultoria, assistência técnica, especialização e de pesquisa de mercado relacionadas com o objecto social. Qualquer outra actividade que esteja directa ou indirectamente relacionada com as actividades acima Identificadas”
2. Para efeitos tributários, no ano de 2023, AA declarou ter auferido rendimentos da categoria B (Rendimentos Empresariais e Profissionais), no montante global de € 2.618,79, no âmbito de serviços prestados à ré.
3. Para efeitos de Segurança Social, AA encontra-se enquadrado no regime de trabalhadores independentes desde ../../2023.
4. No dia 20/09/2023, pelas 14h30m, decorreu acção inspectiva da A.C.T., no decurso da qual AA foi identificado, quando se encontrava a exercer funções de estafeta, junto do ponto de recolha de pedido no Restaurante EMP02..., sito na rotunda do ....
5. (…) tendo nessa ocasião AA recebido uma oferta de entrega, recolhido uma encomenda e a colocado numa mochila térmica, após o que se retirou daquele local.
6. AA encontra-se registado na plataforma App “EMP01...”2 desde ../../2023.
7. Com a adesão à App AA declarou consentir os termos apostos no documento denominado “Termos e Condições de Utilização da Plataforma G... para Estafetas”.
8. No documento com a epígrafe “Termos e Condições de Utilização da Plataforma G... para Estafetas”, com a redacção que lhe foi dada em 04/05/2023, constava:
Condições Gerais:
“(…) Os presentes Termos e Condições de Utilização da Plataforma G... aplicam-se à prestação de todos os serviços tecnológicos oferecidos pela EMP01... Unipessoal Lda. (…) a «Plataforma G...», ou «Nós» consoante o contexto), ao país no qual o Prestador de Serviços (o «Estafeta», o «Utilizador» ou «Você», consoante o contexto) tem de se registar na nossa Plataforma. A principal actividade da G... é o desenvolvimento e a gestão de uma plataforma tecnológica através da qual certos estabelecimentos comerciais locais (adiante designados por «Estabelecimentos Comerciais») de algumas cidades oferecem os seus produtos através de uma aplicação móvel ou da Web (adiante designados por «serviços G...», «Serviços» ou «App»); e, acessoriamente, quando apropriado e se solicitado pelo utilizador cliente final (adiante designado por «Utilizador Cliente») dos referidos estabelecimentos comerciais através da aplicação, podem actuar como intermediários na entrega imediata dos produtos. Os seus objectivos incluem a intermediação nos processos de recolha e/ou pagamento e a aceitação e execução de pedidos para fazer recolhas e receber entregas em nome do cliente Utilizador e dos Estabelecimentos Comerciais. (…)“

2.2. A sua aceitação:
“(…) Ao aceder aos Serviços G... e registar-se pela primeira vez na Plataforma, inserindo os seus dados de identificação de conta (adiante designado por «Dados de Identificação de Conta»), está a aceitar os presentes Termos e Condições, bem como todos os anexos que incluem (…) Tem de aceder à sua conta pessoa (a «Conta») iniciando sessão com o nome de utilizador que escolheu e o código de segurança pessoal (o «Código de Segurança»). Aceita manter a confidencialidade do seu Código de Segurança e alterá-lo frequentemente. Cada Conta é pessoal e única, pelo que está proibido de registar ou ter mais do que uma Conta. Além disso, a Conta é intransmissível, salvo nos países em que legislação local o permita (…) Em caso de utilização ilegítima ou fraude, a G... pode cancelar, suspender ou desactivar duas ou mais Contas com os mesmo dados ou dados relacionados que possa detectar, mediante intervenção humana sempre por parte de um agente da G... e permitindo, em todo o caso, que o Estafeta apresente uma queixa e/ou reclame contra essa decisão em caso de discrepância. Será responsável por todas as transacções realizadas na sua Conta (por Si ou por eventuais substitutos), uma vez que só é possível aceder à mesma com o Código de Segurança e estão sujeitas à aceitação dos nossos Termos e Condições, incluindo, nomeadamente, responsabilidade penal. Aceita notificar imediatamente, através de meios apropriados e seguros, qualquer utilização fraudulenta ou ilegítima da sua Conta, bem como qualquer acesso à mesma por terceiros não autorizados. Para evitar dúvidas, qualquer venda, cessão e transferência da Conta sempre que possa ser considerada ilegal é proibida em quaisquer circunstâncias, salvo nos casos de sublocação/subcontratação da sua conta em conformidade com a regulamentação local aplicável (…)“

3.1 Opções de Serviço:
“(…) No nosso sítio Web encontrará uma descrição das nossas opções de Serviço de Tecnologia e explicaremos que opções de Serviço tem à sua disposição quando cria uma Conta G.... Os presentes Termos e Condições serão aplicáveis a todos os nossos Serviços Tecnológicos se se registar na Plataforma como Utilizador Estafeta.
Serviços incluídos na Taxa de Utilização da Plataforma: - Acesso à plataforma que lhe permitirá oferecer voluntária e livremente os seus serviços de entrega, podendo conectar-se em qualquer altura de acordo com a possibilidade de escolher livremente os pedidos que pretende realizar. Esse acesso inclui a possibilidade de prestar os seus serviços a qualquer um dos Utilizadores da Plataforma (Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais, etc.), independentemente da empresa do Grupo G... (G... e/ou as suas filiais e/ou empresas coligadas) que gere a Plataforma à qual se conectou e sempre de acordo com a disponibilidade do país no qual se conecta. - Acesso a cobertura de seguro durante o período de conexão à Plataforma. - Acesso a apoio e serviço de assistência para qualquer inconveniente técnico que possa ocorrer. - Gestão e intermediação no serviço de recolha e pagamentos. - Aquisição e / ou uso de materiais que podem ser solicitados por você. Serviços incluídos dentro da taxa de activação (…) a G... pode oferecer outros Produtos e Serviços não incluídos na Tarifa e que o Estafeta, consoante apropriado de acordo com a legislação de cada país, pode adquirir ou contratar voluntariamente através de um dos nossos canais de venda (…)”
4.1. Quem é o Estafeta?
“(…) Ao aceitar os presentes Termos e Condições, também se torna um utilizador da aplicação G.... Deste modo, pode usar e conectar-se à Plataforma G... de forma flexível e a seu critério. Acede à Plataforma para usar uma tecnologia da Plataforma que lhe permite conectar-se a outros Utilizadores da Plataforma. Os mesmos poderão ser: Estabelecimentos Comerciais, Utilizadores, outros Estafetas ou outros Utilizadores. Se estiver no seu país, usa a G... como: ● Utilizador Estafeta Independente: pode definir os seus próprios horários para se conectar à Plataforma e manter o seu perfil registado. Actuará em seu próprio nome e interesse, também usando os seus próprios equipamentos para exercer a actividade. ● Utilizador Estafeta numa empresa de serviços de logística: enquanto profissional de uma empresa de serviços de logística que usa os Serviços da Plataforma, estará dependente das instruções da sua empresa. A G... não dirigirá, controlará ou será considerada dirigir ou controlar as acções ou conduta da empresa no âmbito dos presentes Termos e Condições, nomeadamente no que diz respeito à prestação dos seus serviços a outros Utilizadores da Plataforma. Reconhece que não existe nenhuma obrigação ou relação de exclusividade entre Si e a G..., de tal modo que pode, a seu exclusivo critério, oferecer serviços ou exercer qualquer outra actividade comercial ou profissional relacionada ou não com o sector de actividades da G.... (…)”

4.2. Cessação de Serviços
“(…) Antes da cessão dos Serviços, as Partes aceitam liquidar qualquer dívida, obrigações pendentes ou quaisquer compromissos previamente acordados. As Partes podem cessar os Serviços pelas seguintes razões: a. Por vontade própria, em qualquer altura sem aviso prévio, salvo se acordado de outro modo por escrito. b. Por violação de qualquer uma das obrigações previstas nos presentes Termos e Condições. c. Em caso de impossibilidade de cumprir qualquer disposição dos presentes Termos e Condições. d. O não cumprimento das Normas de Ética e Conduta Empresarial para Terceiros da G... e/ou de qualquer outra Política da G... aplicável a todos os Utilizadores da Plataforma. e. Por violação da legislação local por parte do Estafeta que possa constituir uma violação do princípio de boa-fé entre as Partes. f. Quaisquer outras circunstâncias resultantes em danos fiscais, de segurança social, financeiros, comerciais, organizacionais ou de reputação para a outra Parte ou um Terceiro, independentemente do montante ou dimensão do dano causado. g. A utilização da Plataforma G... para fins abusivos ou fraudulentos susceptíveis de causar danos materiais e/ou imateriais a qualquer um dos Utilizadores da plataforma. h. Em situações de força maior, de acordo com a cláusula 8.5 destes Termos e Condições. (…)”

5.1.1. A sua Utilização dos Serviços de Tecnologia da G...:
“(…). Para utilizar os Serviços de Tecnologia da G... é necessário registar e criar uma Conta completa, actualizada e activa. Tal inclui, consoante apropriado, mas sem carácter exaustivo, as seguintes obrigações: a. Estar registado correctamente para poder exercer a actividade de entrega para todos os fins legais, de segurança social e fiscais e em conformidade com a regulamentação local em vigor na altura. b. Pagar pontualmente os Serviços acordados com a Plataforma. c. Tem de enviar à G... certas informações, pessoais ou enquanto empresa prestadora de serviços, tais como o seu nome, endereço, número de telemóvel e idade (aplicar-se-á a idade legal da sua jurisdição), bem como, pelo menos, um método de pagamento válido. d. Tem de manter informações exactas, completas e actualizadas na sua Conta. Será responsável por quaisquer inexactidões nas informações fornecidas. e. Será responsável por todas as actividades realizadas na sua Conta, incluindo as que terceiros realizam em seu nome, bem como por manter sempre a segurança e o sigilo do nome de utilizador e da palavra-passe (Código de Segurança) da sua conta. f. Aceita cumprir toda a legislação aplicável, incluindo regulamentação local, nacional e supranacional ao utilizar os Serviços de Tecnologia G... e apenas pode utilizar os Serviços para fins legítimos. g. Aceita não utilizar a Plataforma de Tecnologia G... para causar inconvenientes, fraude ou danos materiais a terceiros. h. Caso decida subcontratar a sua Conta de Utilizador Estafeta, tem de fazê-lo em conformidade com a regulamentação local, sempre que a mesma o permita, e serão aplicados processos internos para adaptar a operação. A G... não será responsável por quaisquer danos ou infracção que você e/ou as suas subcontratações possam cometer. Neste sentido, a G..., a fim de evitar comportamento abusivo e/ou fraudulento, pode pedir documentação relativa à conformidade do Estafeta titular da Conta G... e dos seus subcontratantes. i. Declara que dispõe da capacidade jurídica para celebrar contratos e ser de maioridade no país correspondente. j. Apenas os produtos e serviços que não sejam tácita ou expressamente proibidos nos Termos e Condições e outras políticas da G... ou pela legislação em vigor podem ser incluídos no âmbito dos presentes Termos e Condições. Para mais informações sobre os produtos ou serviços proibidos, consulte as nossas Políticas de Artigos Proibidos nos presentes Termos e Condições ou nos Termos e Condições Gerais de Utilização aplicáveis aos Utilizadores Cliente. k. A G... irá sempre dar prioridade à sua experiência de Utilizador enquanto parte dos seus serviços. A G... pode criar painéis de informação para incluir as suas preferências enquanto Utilizador da Plataforma Digital da G... e melhorar a sua experiência na mesma. l. Você, enquanto profissional e Estafeta, é responsável pela prestação dos seus serviços e pelas vicissitudes da sua actividade. Bem como, se for caso disso, pelos estafetas por si subcontratados. m. O Estafeta compromete-se a verificar e cumprir os requisitos legais pertinentes, em termos de saúde e segurança apropriados para diferentes tipos de produtos (a título de exemplo, mas sem carácter exaustivo: os relacionados com farmácia, álcool e tabaco) e isenta a G... de qualquer responsabilidade caso a regulamentação supracitada não seja respeitada. n. No caso de transporte de alimentos, em conformidade com a regulamentação aplicável a este respeito, o Estafeta compromete-se a transportá-los em meios de transporte e recipientes adequados para os mesmos. o. Declara cumprir a legislação aplicável na prestação dos seus serviços de entrega, tais como legislação fiscal, laboral, civil, penal, de transporte de mercadorias, de saúde, segurança e higiene e a legislação inerente à actividade, nomeadamente apólices de seguro aplicáveis à sua região (como o seguro obrigatório de veículos (…)”

5.1.4.
“(…) Ao aceitar um pedido, o Estafeta reconhece que esse pedido pode incluir a entrega/devolução/serviço de devolução ou conforme a morada/localização/descrição indicado pelo Utilizador Cliente ou o Estabelecimento Comercial com o qual celebrou um contrato (…)”
5.1.5.
“(…) Por força dos acordos alcançados com os Utilizadores Cliente, e para efeitos de evitar fraude, no momento da entrega, os Estafetas e Utilizadores Clientes aguardarão dez minutos antes de cancelar um pedido. (…).”
5.1.6.
“(…) O Estafeta aceita que os Estabelecimentos Comerciais e o Utilizador Cliente peça um serviço de entrega de acordo com o preço e a qualidade em conformidade com as orientações de mercado. (…).”
5.2 Restrições
“(…) Sem prejuízo de quaisquer medidas adicionais que possam ser adoptadas, uma Conta Estafeta pode ser temporária ou permanentemente desactivada se: a. Em conformidade com o Código de Ética que rege todos os Utilizadores da Plataforma, utilizar a Plataforma para insultar, ofender, ameaçar e/ou agredir Terceiros, nomeadamente, Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais, outros Estafetas e pessoal da G.... b. Violar a lei ou quaisquer outras disposições dos Termos e Condições Gerais ou outras políticas da G.... c. Participar em actos ou conduta violentos. d. Violar os seus direitos na aplicação da G..., causando danos materiais e/ou imateriais a outro Utilizador da plataforma (Estafetas, Utilizadores Cliente e/ou Estabelecimentos Comerciais). e. Na prevenção de acções fraudulentas, se a identidade do Utilizador da Plataforma e/ou dos seus substitutos ou subcontratantes não puder ser verificada e/ou qualquer informação prestada por si e/ou os seus substitutos ou subcontratantes estiver incorrecta. f. A fim de prevenir a segurança de todos os Utilizadores da Plataforma em caso de violação da Política de Mercadorias (…)”
5.3.1 Facturação e pagamentos
“(…) O processamento dos pagamentos estará sujeito a todas as condições do Processador de Pagamento, às condições e políticas de privacidade e deverá ter sua própria conta individual ou comercial, dependendo do país em questão, junto do Processador de Pagamento. A G..., através de um processador de pagamento, conectar-se-á e actuará como um intermediário nos pagamentos entre Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais e Estafetas (ou empresa de serviços de logística conexa). Aceita e concorda que, dependendo da regulamentação local aplicável, bem como da forma na qual se conecta à Plataforma (directamente ou através de uma empresa de serviços de logística), os serviços que oferece podem e terão de ser facturados ou refaturados ao Cliente Utilizador e/ou ao Estabelecimento Comercial, que em última instância paga o preço dos serviços por si oferecidos. Aceita que a taxa pelos serviços que pagará à G... inclui, se autorizado por si e conforme apropriado de acordo com a legislação local do seu país, bem como da forma como se conecta à Plataforma (directamente ou através de uma empresa de serviços de logística), a gestão e intermediação da facturação correspondente aos seus serviços. Neste caso, estas facturas serão consideradas aceites caso a G... não receba qualquer comunicação da sua parte no prazo de 5 dias a contar da emissão das facturas. O Estafeta reconhece e concorda que a G..., em conformidade com o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), pode proceder a uma revisão periódica dos pagamentos que lhe são efectuados. Tal revisão pode resultar na retenção do imposto sobre o rendimento caso o limite, em conformidade com o disposto no Artigo 53 do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado e no Artigo 101 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), seja ultrapassado. O Estafeta reconhece e aceita a sua responsabilidade pelo dinheiro que lhe foi entregue pelos Utilizadores Cliente e que é propriedade dos Estabelecimentos Comerciais. Neste sentido, aceita que, consoante apropriado à forma como se conecta à Plataforma, o preço que lhe foi pago pelo serviço pelo Estabelecimento Comercial inclui o serviço de recolha do dinheiro que tem de ser entregue ao referido Estabelecimento Comercial. (…)”
5.3.2 Pagamento e Taxas da G...
“(…) Aceita que a sua utilização dos Serviços G... tem um custo associado para os serviços ou produtos que recebe («Encargos»). A G... pode cobrar a seu exclusivo critério uma taxa padrão, uma taxa adicional ou um ajustamento aplicável pela utilização da Plataforma e os custos de activar o Perfil da sua Conta. A taxa que tem de pagar corresponderá à utilização dos serviços contratados por si através da Plataforma, ou aos eventuais produtos/bens que pode adquirir através da mesma. Para que conste, a utilização dos serviços e os produtos podem ser momentânea ou definitivamente suspensos ou desactivados na Plataforma, dependendo do país a partir do qual se conecta. A G... reserva-se o direito de adoptar as medidas judiciais e extrajudiciais que considere apropriadas para obter o pagamento dos montantes em dívida. A G... reserva-se o direito de modificar, alterar, aumentar ou cancelar as taxas actuais em qualquer altura notificando os Utilizadores da sua Plataforma. Além disso, a G... pode temporariamente modificar a Taxa e a Política e as taxas dos seus Serviços em resultado de promoções ou descontos. Estas modificações produzem efeitos quando a promoção é tornada pública ou o Utilizador beneficiário é notificado. Todas as Taxas para Produtos e/ou Serviços contratados à G... serão cobradas imediatamente em conformidade com o método de pagamento permitido no seu país e o método preferencial indicado na sua Conta e disponibilizado aos Serviços G.... Quando carregado, a G... enviar-lhe-á um recibo por e-mail. O pagamento também pode ser efectuado mediante a compensação de facturas pendentes entre as partes. Se o método de pagamento da sua conta principal for considerado expirado, inválido ou indisponível para a cobrança, a G... irá contactá-lo e/ou providenciar outros métodos de pagamento aplicáveis à sua Conta. A G... envidará esforços razoáveis para o informar sobre quaisquer encargos aplicáveis. A G... pode ocasionalmente eliminar e/ou rever quaisquer taxas, ofertas e/ou descontos aplicáveis a todos os Utilizadores da Plataforma, você incluído. A G... pode aplicar taxas de Serviço ou outras taxas previamente anunciadas nas redes sociais aplicáveis, salvo se a G... não a aplicar na sua região, caso no qual não lhe serão cobradas. A forma de cobrança dos Encargos irá sempre depender da forma na qual se conecta à Plataforma, directamente ou através de uma empresa de serviços de logística. (…)”
5.4.1
“(…) Em certos casos, por uma questão de prevenção de fraudes, poderá ter de apresentar prova da sua identidade e/ou, se aplicável nos termos da legislação local, dos seus substitutos ou subcontratantes para aceder ou utilizar os Serviços e aceita que lhe pode ser negado acesso aos Serviços e à utilização dos mesmos se você ou os seus substitutos ou subcontratantes recusarem fornecer essa prova de identidade. A G... pode também recorrer a terceiros fornecedores de serviços para efeitos de verificar a sua identidade ou a dos seus substitutos ou subcontratantes. (…)”
5.4.2
“(…) A G... pode, mas não é obrigada, monitorizar, rever e/ou editar a sua Conta. A G... reserva-se o direito de, em qualquer caso, eliminar ou desactivar o acesso a qualquer Conta por qualquer motivo ou sem motivo, até mesmo se considerar, a seu critério exclusivo, que a sua Conta viola os direitos de terceiros ou direitos protegidos pelos Termos e Condições. (…)”
5.4.3
“(…) A G... pode adoptar essa acção sem aviso prévio feito a si ou a um terceiro. A eliminação ou desactivação do acesso à sua Conta de Utilizador será a critério exclusivo da G... e não há qualquer obrigação de eliminar ou desactivar o acesso em relação a Estafetas específicos. (…)”
5.5.1
“(…) Você pode determinar e escolher o preço dos seus serviços através da Plataforma G.... A G..., para fins informativos, com base em informações de mercado, irá sugerir um preço de mercado que poderá ser alterado diariamente pelo Estafeta através do seu Perfil de Utilizador, sem que isso implique garantias de adjudicação do serviço. (…)”
5.7
“(…) O Estafeta terá uma Reputação associada ao seu perfil fácil de usar e consultar. Este sistema é automático e é actualizado periodicamente à medida que os diferentes Utilizadores realizam transacções na Plataforma G... e está sujeito às regra aí contidas e sobre as quais os Utilizadores são informados no presente documento e/ou na APP e/ou através dos canais de comunicação apropriados, para que o conheçam exaustivamente e o considerem útil. O sistema baseia-se em dados objectivos, informação numérica e métricas fornecidas pelos Utilizadores da Plataforma e os clientes do Estafeta: Utilizadores Cliente e Estabelecimentos Comerciais. A G... não manipula ou intervém no processo de formação da Reputação, mas apenas consolida informação objectiva obtida dos Utilizadores Cliente e Estabelecimentos Comerciais, beneficiários dos serviços do Estafeta. A G... não verifica a veracidade ou precisão dos comentários feitos por outros Utilizadores e não é responsável pelo que é expresso no sítio Web ou por outros meios, nomeadamente e-mail. Todas as informações fornecidas pelos Utilizadores serão incluídas no sítio Web sob a exclusiva responsabilidade do seu autor. (…)”
9.2 Dados tratados
“(…) Os dados do Estafeta recolhidos através da Plataforma e das ferramentas tecnológicas que a G... fornece ao Estafeta estarão, regra geral, limitados aos dados necessários para executar a relação entre as Partes e são necessários para a poder desenvolver correctamente (adiante designados por os «Dados»). Não obstante o que precede, é possível que no momento do registo ou da criação da Conta pelo Estafeta ou durante a relação, sejam pedidos dados adicionais, através de campos opcionais na Conta do Estafeta, ou através de campanhas promocionais ou outras acções que a G... possa realizar. Em consonância com o que precede, a G... pode tratar as seguintes categorias de dados, sem prejuízo de outras que possam ser pedidas durante a relação: (…) Os dados relacionados com a geolocalização do Estafeta são necessários para a execução dos Termos e Condições, bem como para utilizar a Plataforma, a fim de permitir aos Consumidores e Estabelecimentos Comerciais saber o estado e localização do Estafeta durante a recolha ou entrega (…)“
9.3. Geolocalização
“(…) Ao utilizar a aplicação fornecida pela G... para a execução da relação e, portanto, para exercer a actividade, a G... pode receber os dados de geolocalização do Estafeta caso o mesmo tenha activado esta função directamente no seu telemóvel. A G... usará os Dados obtidos para prestar os Serviços ao Estafeta e partilhá-los com o Utilizador Cliente e o Estabelecimento Comercial cujo pedido o Estafeta aceitou executar, para que o Utilizador Cliente e o Estabelecimento Comercial possam contactar o Estafeta no caso de algum incidente. É expressamente indicado que o Estafeta tem total liberdade de decisão em relação ao itinerário e/ou percursos escolhidos para a oferta e especificação dos seus serviços e em nenhum caso a G... utilizará esses dados para fins de controlo. (…)”
9.4. Finalidade e base jurídica do tratamento
“(…) Os Dados serão tratados exclusivamente para cumprir a relação estabelecida e, nomeadamente: (…) A geolocalização é uma informação importante e básica para a prestação do Serviço, porquanto serve apenas para informar o Estabelecimento Comercial ou o Utilizador Cliente da localização do Estafeta e, portanto, calcular o tempo de recolha ou entrega, mas que é também usada pela G... para a oferta de pedidos. A proximidade do ponto de recolha é um dos critérios utilizados no momento da oferta do pedido, pelo que, se não estiver activada, a G... não poderá garantir que são oferecidos pedidos, ou que são razoáveis em termos do tempo previsto de recolha ou entrega. Neste sentido, e sem prejuízo do sistema operativo do dispositivo do Estafeta que pede consentimento para o uso da geolocalização, a utilização desta informação é necessária para correcta execução dos Termos e Condições. Em todo o caso, o Estafeta pode desactivar a geolocalização quando não está a usar a Plataforma, embora a G... não use esta informação fora do âmbito da oferta de pedidos ou fora das horas em que o Estafeta está a usar a Plataforma. De igual modo, é expressamente indicado que o Estafeta tem total liberdade de decisão em relação ao itinerário e/ou percursos escolhidos para a oferta e concretização dos seus serviços e em nenhum caso a G... utilizará esses dados para fins de controlo do Estafeta. Neste sentido, a geolocalização é meramente temporária e não de modo algum exaustiva. A informação de geolocalização pode também ser usado para efeitos de facturação (…)”
9.5 Métricas e outras informações relacionadas com a execução do serviço
“(…) Em relação ao sistema de Reputação e às avaliações dos Utilizadores Cliente e Estabelecimentos Comerciais sobre o serviço oferecido pelo Estafeta, o mesmo deverá ter em conta que: - Não são estabelecidos perfis ou realizadas avaliações de pessoas, mas sim sobre a execução do serviço. - O Consumidor e o Estabelecimento Comercial podem avaliar a qualidade do serviço prestado. - Todas as métricas obtidas pela G... referem-se sempre, em qualquer caso e exclusivamente, ao serviço prestado. - Não são recolhidos dados relacionados com a vida privada, a personalidade ou os hábitos do Estafeta. De igual modo, no tocante à existência de decisões automatizadas com efeitos legais para o Estafeta, deve ter-se em conta que: - As decisões não são tomadas baseadas exclusivamente no tratamento automatizado dos dados pessoais do Estafeta, mas quando apropriado baseadas numa avaliação da execução do serviço.- Todos os parâmeros a ter em conta foram gerados manualmente pelos Clientes e Estabelecimentos Comerciais. - Todos os parâmetros e métricas usadas para tomar essas decisões referem-se sempre e exclusivamente ao serviço e à execução dos Termos e Condições, independentemente do Estafeta que os executa. - Não são estabelecidos perfis, conforme indicado no ponto anterior. - Em caso algum são tidos em conta características da personalidade ou a esfera não profissional da Parte. - Os resultados dependem de acções anteriores e voluntárias do Estafeta. - Os resultados podem ser corrigidos caso tenha havido um erro e/ou discrepância entre o Estafeta e a G.... - O Estafeta não é impedido de exercer um direito. - O Estafeta não é impedido de aceder a um bem ou serviço. - O Estafeta não é impedido de ser parte num contrato. Com base no que precede, e em conformidade com as disposições do RGPD, não são estabelecidos perfis sobre os Estafetas ou tomadas decisões automatizadas com efeitos legais para o Estafeta com base nos seus dados ou características pessoais, mas apenas são tidas em conta uma avaliação do serviço e características objectivas sobre a capacidade de prestar o serviço pelo Estafeta (…)”
9. O documento com a epígrafe “Termos e Condições de Utilização da Plataforma G... para Estafetas” apresentou a versão datada de 28/12/2023, constante da ref. n.º ...42 (cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
10. Para ter acesso às propostas de entregas, através da App, AA teve de fazer um registo, fornecendo o seu endereço de correio electrónico e criando uma conta.
11. Através da App, AA recebe toda a informação relacionada com a oferta de serviços de entrega, remuneração a receber pela prestação de serviço, destinatário do produto e local de entrega.
12. Mediante a App AA consegue ver o histórico das entregas que fez por dia, semana e no mês, e quanto irá receber pelos serviços prestados.
13. Um estafeta pode recusar, ignorar ou aceitar uma oferta de entrega sugerida pela App.
14. Para ter acesso às ofertas de entregas disponibilizadas pela ré AA necessita ter a App instalada no seu smartphone.
15. Para um estafeta poder receber uma proposta de entrega necessita de ter a geolocalização activa, de forma a poder ser seleccionado de acordo com a proximidade ao local de recolha.
16. Após o pedido de entrega ser aceite, e até os produtos serem disponibilizados aos clientes, a geolocalização pode ser desactivada pelo estafeta.
17. Se a geolocalização permanecer activada, a App permite o acompanhamento do trajecto desenvolvido pelos estafetas entre a recolha e entrega, quer pela ré, quer pelo cliente, quer pelos estabelecimentos comerciais que fornecem os produtos a serem entregues.
18. AA desempenha as funções de estafeta na recolha e entrega de produtos na zona urbana de Chaves.
19. AA pode decidir o local onde presta a sua actividade, desde que se trate de uma zona coberta pela App, sendo livre de alterar a sua zona de actividade.
20. AA é que decide se trabalha num dia em concreto, ou se fica inactivo por alguns períodos e desenvolve a sua actividade em horários que o próprio define, bastando para o efeito colocar-se online na App nos períodos respectivos, sem que esteja sujeito a horários pré-estabelecidos ou a turnos, nem a indicação prévia dos seus horários.
21. A título de contrapartida pela realização dos serviços de entrega o estafeta aufere uma prestação que varia em cada entrega, a qual corresponde ao produto da taxa de entrega por um coeficiente, denominado multiplicador, de acordo com a fórmula taxa de entrega * multiplicador.
22. O montante da taxa de entrega para cada serviço resulta da consideração de valores de referência pré-estabelecidos na App, relevando factores como a distância entre o local de recolha dos produtos e o local onde estes deverão ser entregues, o período em que decorre o serviço de entrega e as eventuais condições atmosféricas adversas que se fazem sentir.
23. Uma vez por dia AA pode definir o valor do multiplicador, o qual poderia oscilar entre 0,9 e 1,1, mas actualmente somente permite escolher entre 1,0 e 1,1.
24. O valor a receber pelo estafeta por serviço não depende do tempo de demora na sua realização, do tempo de ligação à App ou da decisão anterior de aceitar ou recusar entregas.
25. A ré gere a App, a qual permite a ligação entre comerciantes (os que fornecem bens e serviços) e clientes (os que adquirem esses bens e serviços), através de serviços de entregas das mercadorias, assegurados por estafetas, sendo tais serviços de entrega geridos e organizados pela App, designadamente quanto à indicação de locais de recolha e entrega dos produtos, recebendo em contrapartida os estafetas um valor por cada entrega.
26. AA mantém actividade aberta como empresário em nome individual junto da A.T. e emite facturas/recibos pelos serviços de entrega que realizou, que lhe são pagos pela ré.
27. AA pode realizar entregas disponibilizadas por plataformas geridas por outras entidades que não a ré, ou efectuar entregas directamente por sua conta, sem que necessite de disso dar conta à ré.
28. Os contactos telefónicos entre estafeta e clientes que se justificam pelos serviços de entrega, nomeadamente, se não se consegue localizar o endereço de entrega, são assegurados através da plataforma gerida pela ré.
29. Os estafetas são livres de escolherem as suas rotas para realizarem as entregas.
30. O estafeta pode escolher o sistema de navegação que pretende utilizar no serviço de entrega, ou não utilizá-lo, se não necessitar dessa ajuda.
31. Não existem penalizações pelo modo como os estafetas realizam as suas entregas.
32. Os estafetas é que escolhem a roupa com que se apresentam nas entregas.
33. A imposição de utilização de mochila para serem efectuadas entregas de produtos alimentares (a qual não é necessário dispor do logotipo da ré) deve-se à necessidade de serem adoptadas boas práticas de higiene e segurança alimentar, para além de permitirem que o estafeta passa transportar os produtos no veículo utilizado, que poderá ser uma bicicleta ou uma mota.
34. Os estafetas podem substituir-se por outra pessoa na realização de entregas, sem que careçam de autorização da ré.
35. Para realizar as suas entregas AA utiliza o seu veículo, o seu telemóvel e uma mochila que adquiriu.
36. A ré não efectua avaliação da qualidade da actividade dos estafetas, apenas dispondo de uma avaliação de satisfação pelos clientes que não interfere no valor da remuneração devida aos estafetas pelas entregas.
37. AA realizou as entregas discriminadas no print da ref. n.º ...42 (cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
 
Matéria de facto não provada:
1. A área de actuação de AA é determinada pela plataforma digital.
2. O valor da taxa de entrega depende do número de entregas realizadas, do tempo despendido na entrega, da avaliação do cliente e do número total de pedidos concretizados.
3. As ofertas de serviços de entrega que AA recebe na App já vêm com uma retribuição estabelecida, e esse valor não pode ser negociado antes de o estafeta poder aceitar ou recusar através da App.
4. AA só sabe quanto vai receber por cada pedido que lhe seja direccionado pela ré depois de o aceitar.
5. O multiplicador não permite ao estafeta aumentar qualquer rendimento uma vez que, se escolher o valor mais alto do multiplicador, poderá não receber pedidos ou receber em menos quantidade, por os pedidos serem distribuídos por escolha algorítmica a quem tem um multiplicador menor.
6. O número de propostas de entregas por dia a um estafeta depende da ré.
7. A única forma através da qual o estafeta pode aumentar os seus rendimentos consiste em trabalhar mais horas.
8. O trabalho desenvolvido pelo estafeta é permanentemente acompanhado por GPS com recurso ao sistema de geolocalização, utilizando para o efeito o telemóvel da estafeta.
9. AA tem na actividade associada à App a sua única fonte de rendimento.”

IV – APRECIAÇÃO DO RECURSO
           
Nos termos do art. 2.º/3 da 107/2009, de 14 de Setembro (na redacção dada pelo art. 4.º da Lei n.º 13/2023, de 03 de Abril) “3 - A ACT é igualmente competente e instaura o procedimento previsto no artigo 15.º-A da presente lei, sempre que se verifique a existência de características de contrato de trabalho, nomeadamente:
a) Nos termos previstos no n.º 1 do artigo 12.º e no n.º 1 do artigo 12.º-A do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, incluindo nos casos em que o prestador de serviço atue como empresário em nome individual ou através de sociedade unipessoal; e
(…)”

Foi na sequência de participação adrede efectuada pela ACT/..., e entendendo, conforme alegação do articulado inicial, que o prestador de actividade em causa beneficia da presunção de laboralidade prevista no art. 12.º, n.º 1, do CT, que o autor/Ministério Público instaurou a presente acção.

Ora, o artigo 12.º do CT (aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro) estabelece:
Presunção de contrato de trabalho
1 - Presume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre a pessoa que presta uma actividade e outra ou outras que dela beneficiam, se verifiquem algumas das seguintes características:
a) A actividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado;
b) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da actividade;
c) O prestador de actividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo beneficiário da mesma;
d) Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de actividade, como contrapartida da mesma;
e) O prestador de actividade desempenhe funções de direcção ou chefia na estrutura orgânica da empresa.
2 - Constitui contra-ordenação muito grave imputável ao empregador a prestação de actividade, por forma aparentemente autónoma, em condições características de contrato de trabalho, que possa causar prejuízo ao trabalhador ou ao Estado.
3 - Em caso de reincidência são aplicadas ao empregador as seguintes sanções acessórias:
a) Privação do direito a apoio, subsídio ou benefício outorgado por entidade ou serviço público, designadamente de natureza fiscal ou contributiva ou proveniente de fundos europeus, por período até dois anos;
b) Privação do direito de participar em arrematações ou concursos públicos, por um período até dois anos.
4 - Pelo pagamento da coima, são solidariamente responsáveis o empregador, as sociedades que com este se encontrem em relações de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, bem como o gerente, administrador ou director, nas condições a que se referem o artigo 334.º e o n.º 2 do artigo 335.º

Por sua vez o art. 12.º-A (aditado ao Código do Trabalho pelo Artigo 13.º da Lei n.º 13/2023, de 3 de Abril) prescreve:
Presunção de contrato de trabalho no âmbito de plataforma digital
1 - Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, presume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre o prestador de atividade e a plataforma digital se verifiquem algumas das seguintes características:
a) A plataforma digital fixa a retribuição para o trabalho efetuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela;
b) A plataforma digital exerce o poder de direção e determina regras específicas, nomeadamente quanto à forma de apresentação do prestador de atividade, à sua conduta perante o utilizador do serviço ou à prestação da atividade;
c) A plataforma digital controla e supervisiona a prestação da atividade, incluindo em tempo real, ou verifica a qualidade da atividade prestada, nomeadamente através de meios eletrónicos ou de gestão algorítmica;
d) A plataforma digital restringe a autonomia do prestador de atividade quanto à organização do trabalho, especialmente quanto à escolha do horário de trabalho ou dos períodos de ausência, à possibilidade de aceitar ou recusar tarefas, à utilização de subcontratados ou substitutos, através da aplicação de sanções, à escolha dos clientes ou de prestar atividade a terceiros via plataforma;
e) A plataforma digital exerce poderes laborais sobre o prestador de atividade, nomeadamente o poder disciplinar, incluindo a exclusão de futuras atividades na plataforma através de desativação da conta;
f) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertencem à plataforma digital ou são por esta explorados através de contrato de locação.
2 - Para efeitos do número anterior, entende-se por plataforma digital a pessoa coletiva que presta ou disponibiliza serviços à distância, através de meios eletrónicos, nomeadamente sítio da Internet ou aplicação informática, a pedido de utilizadores e que envolvam, como componente necessária e essencial, a organização de trabalho prestado por indivíduos a troco de pagamento, independentemente de esse trabalho ser prestado em linha ou numa localização determinada, sob termos e condições de um modelo de negócio e uma marca próprios.
3 - O disposto no n.º 1 aplica-se independentemente da denominação que as partes tenham atribuído ao respetivo vínculo jurídico.
4 - A presunção prevista no n.º 1 pode ser ilidida nos termos gerais, nomeadamente se a plataforma digital fizer prova de que o prestador de atividade trabalha com efetiva autonomia, sem estar sujeito ao controlo, poder de direção e poder disciplinar de quem o contrata.
5 - A plataforma digital pode, igualmente, invocar que a atividade é prestada perante pessoa singular ou coletiva que atue como intermediário da plataforma digital para disponibilizar os serviços através dos respetivos trabalhadores.
6 - No caso previsto no número anterior, ou caso o prestador de atividade alegue que é trabalhador subordinado do intermediário da plataforma digital, aplica-se igualmente, com as necessárias adaptações, a presunção a que se refere o n.º 1, bem como o disposto no n.º 3, cabendo ao tribunal determinar quem é a entidade empregadora.
7 - A plataforma digital não pode estabelecer termos e condições de acesso à prestação de atividade, incluindo na gestão algorítmica, mais desfavoráveis ou de natureza discriminatória para os prestadores de atividade que estabeleçam uma relação direta com a plataforma, comparativamente com as regras e condições definidas para as pessoas singulares ou coletivas que atuem como intermediários da plataforma digital para disponibilizar os serviços através dos respetivos trabalhadores.
8 - A plataforma digital e a pessoa singular ou coletiva que atue como intermediário da plataforma digital para disponibilizar os serviços através dos respetivos trabalhadores, bem como os respetivos gerentes, administradores ou diretores, assim como as sociedades que com estas se encontrem em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, são solidariamente responsáveis pelos créditos do trabalhador emergentes de contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação, celebrado entre o trabalhador e a pessoa singular ou coletiva que atue como intermediário da plataforma digital, pelos encargos sociais correspondentes e pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contraordenação laboral relativos aos últimos três anos.
9 - Nos casos em que se considere a existência de contrato de trabalho, aplicam-se as normas previstas no presente Código que sejam compatíveis com a natureza da atividade desempenhada, nomeadamente o disposto em matéria de acidentes de trabalho, cessação do contrato, proibição do despedimento sem justa causa, remuneração mínima, férias, limites do período normal de trabalho, igualdade e não discriminação.
10 - Constitui contraordenação muito grave imputável ao empregador, seja ele a plataforma digital ou pessoa singular ou coletiva que atue como intermediário da plataforma digital para disponibilizar os serviços através dos respetivos trabalhadores que nela opere, a contratação da prestação de atividade, de forma aparentemente autónoma, em condições características de contrato de trabalho, que possa causar prejuízo ao trabalhador ou ao Estado.
11 - Em caso de reincidência, são ainda aplicadas ao empregador as seguintes sanções acessórias:
a) Privação do direito a apoio, subsídio ou benefício outorgado por entidade ou serviço público, designadamente de natureza fiscal ou contributiva ou proveniente de fundos europeus, por período até dois anos;
b) Privação do direito de participar em arrematações ou concursos públicos, por um período até dois anos.
12 - A presunção prevista no n.º 1 aplica-se às atividades de plataformas digitais, designadamente as que estão reguladas por legislação específica relativa a transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados a partir de plataforma eletrónica.

Diga-se que, a montante, o mesmo Código contém, no seu artigo 11.º - e em consonância com o disposto no art. 1152.º do CC -, a seguinte Noção de contrato de trabalho:
Contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a autoridade destas.” (realce nosso)
Embora o legislador, na noção de contrato de trabalho, no actual Código do Trabalho tenha substituído a expressão “direcção”, constante da anterior versão, pelo termo “organização” (“no âmbito de organização e sob a autoridade destas”), impõe-se constatar que para a definição legal de trabalho subordinado, não basta que o trabalho seja prestado “no âmbito de organização” sendo ainda necessário que o seja “sob a autoridade” do detentor dessa organização.
A propósito da redacção do art. 11.º do CT e da noção de contrato de trabalho aí vertida, escreve Maria do Rosário Palma Ramalho que “no que se refere à supressão das referências tradicionais ao elemento da direcção do empregador, tal supressão não significa, quanto a nós, a dispensa do elemento da subordinação jurídica como elemento essencial do contrato de trabalho, com as inerentes dúvidas sobre a extensão do regime laboral ao trabalho autónomo. É que, como decorre da norma, mantém-se expressamente a referência à «autoridade» do empregador na delimitação do negócio laboral. Ora, como já tivemos ocasião de demonstrar noutra sede, a posição de autoridade do empregador no contrato de trabalho inclui não apenas uma componente de direcção (que não carece assim de ser expressamente referida) como também uma componente disciplinar;”[2]
Assim, e numa primeira aproximação, pode dizer-se que a qualificação jurídica da situação dependerá da forma como a prestação é executada, posto que se se verificar uma situação de subordinação jurídica o contrato celebrado corresponde a um contrato de trabalho, enquanto se na execução da prestação o profissional em causa tem autonomia o que existirá então é um contrato de prestação de serviços.
Com efeito, como é consabido e tem sido reiteradamente afirmado pelos nossos Tribunais Superiores, o contrato de trabalho tem como elemento distintivo a subordinação jurídica do trabalhador, traduzida no poder do empregador de conformar, através de ordens, directivas e instruções, a prestação a que o trabalhador se obrigou (consequentemente, a subordinação jurídica reconduz-se ao dever de obediência do trabalhador, no que concerne à execução e disciplina da prestação de trabalho fixados pelo empregador), e contrato de trabalho que, assim, se apreende, determina, através de um conjunto de indícios – assumindo cada um deles um valor relativo, pelo que o juízo a fazer deve ser de globalidade face à situação concreta apurada – como sejam a vinculação a horário de trabalho, a prestação da actividade em local definido pelo empregador, a actividade exercida sob as ordens deste, a sujeição do trabalhador à disciplina da empresa, a modalidade da retribuição, a propriedade dos instrumentos de trabalho e a observância dos regimes fiscal e de segurança social próprios dos trabalhadores por conta de outrem.[3]
É que face à rica e exponencial variabilidade das situações da vida, é por todos reconhecida a, muitas vezes extrema, dificuldade em surpreender os elementos que permitam a identificação da subordinação jurídica, noção a que bastas vezes se não chega directamente através do simples método subsuntivo.[4]

Por outro lado, o contrato de prestação de serviços é definido no art. 1154.º do Código Civil como sendo aquele contrato “em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.”, podendo, não obstante, a parte que encarrega outra de executar autonomamente certa actividade dar-lhe instruções e exigir-lhe contas (v. art.s 1156.º e 1158.º/1, 2.ª parte, e 1161.º, al.s a) e d), do CC).
Efectivamente, a existência de instruções específicas e a obrigatoriedade do seu cumprimento, só por si, não importa a conclusão de que existe subordinação jurídica, na medida em aquela é compatível e própria do contrato de prestação de serviços, como resulta do disposto no art. 1161.º, al. a), conjugado com o art. 1156.º, ambos do CC; o mesmo se diga quanto à obrigação, também no contrato de prestação de serviços, da pessoa que se obriga a prestar a sua actividade, prestar à outra parte as informações que esta lhe peça quanto ao desenvolvimento dessa actividade (cf. al. b) e d) do art. 1161.º do CC).
Como também discorre Maria do Rosário Palma Ramalho, “(…) com frequência, não é a componente directiva da autoridade do empregador que permite resolver dúvidas de qualificação do contrato, porque o poder directivo pode estar diluído, não ser exercido ou mesmo ser atribuído a terceiros sem que o contrato se descaracterize, e ainda porque tal poder também existe noutros contratos envolvendo a prestação de um trabalho ou de um serviço, dependendo assim a sua aptidão qualificativa do acompanhamento pelo poder disciplinar.”[5] (sublinhamos)

Postos estes considerandos de índole geral, para respondermos à questão supra enunciada, temos desde já de discernir qual o regime jurídico aplicável, e muito particularmente se tem aqui aplicação a presunção (de contrato de trabalho) prevista no citado art. 12.º-A do CT.
Até porque – e sem prejuízo de, como já decorre do n.º 3 do art. 5.º do CPC, “O juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito” – o recorrente invoca agora, em sede de apelação, que se mostram preenchidas as circunstâncias, base da presunção de laboralidade, previstas nas alíneas a), b), e) e f) do art. 12.º-A, n.º 1, do CT.

O artigo 35.º/1 da já referida Lei n.º 13/2023, de 3 de Abril dispõe, para o que ora importa, sobre a Aplicação no tempo:
1 - Ficam sujeitos ao regime do Código do Trabalho, com a redação dada pela presente lei, os contratos de trabalho celebrados antes da entrada em vigor desta lei [de acordo com o art. 37.º/1 da mesma Lei, as alterações e aditamentos ao regime do CT da mesma decorrentes entraram em vigor no primeiro dia do mês seguinte ao da sua publicação., isto é, em 01/5/2023], salvo quanto a condições de validade e a efeitos de factos ou situações anteriores àquele momento.”
Esta norma sobre a aplicação da lei no tempo não diverge do regime a propósito previsto no art. 7.º/1 da Lei 7/2009, de 12/02, que aprovou o actual Código do Trabalho, nem, como se nota na decisão recorrida, do regime geral previsto no art. 12.º do Código Civil.
Por isso, e tendo presente que a relação profissional estabelecida entre o identificado AA e a aqui ré se iniciou em 18 de Agosto de 2023 (cf. facto provado n.º 6), é de concluir que a presunção do artigo 12.º-A, n.º 1, do CT, introduzida pela Lei n.º 13/2023, de 13 de Abril, deve ser também convocada para efeitos de qualificação da relação jurídica estabelecida entre o identificado prestador da actividade e a ré.

Posto o que, vejamos em primeiro lugar se funciona aqui a presunção prevista no, também já citado, art. 12.º do CT.
Contendendo com a questão supra enunciada, na decisão recorrida entendeu-se que dos factos provados não resulta estar verificada qualquer das circunstâncias/características previstas nas alíneas a) a e) do n.º 1 do art. 12.º do CT, justificando-se, relativamente a cada uma dessas alíneas, porque não ocorre o seu preenchimento, fundamentação essa
[ «al. a): “a actividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado”
A actividade de AA, enquanto estafeta, é desenvolvida assegurando entregas de produtos, disponibilizados pelos estabelecimentos comerciais, como restaurantes, aos seus clientes, mediante o pagamento de uma contrapartida monetária, sendo que a execução desse serviço envolve o transporte desses produtos e a deslocação entre o ponto A (o sítio de recolha dos bens no estabelecimento comercial) e o ponto B (o domicílio do cliente ou outro sítio onde este se encontra), no perímetro urbano da cidade ..., após previamente o estafeta ter aceite uma proposta de entrega disponibilizada na App administrada pela ré.
Porém, foi a estafeta AA quem escolheu a sua área de actividade, optando pela cidade ..., para além de lhe ser permitido modificar a sua zona de actuação, desde que seja numa zona coberta pela App administrada pela ré.
Nesse enquadramento, não se pode concluir que foi a ré quem determinou o local de actividade de AA ou que este execute a sua actividade em local pertencente à ré.
al. b): “os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da actividade”
Para realizar as entregas dos produtos que recolhe nos estabelecimentos comerciais e que disponibiliza aos clientes, AA socorre-se, no essencial, de três objectos distintos, que lhe pertencem: o smartphone, que lhe permite aceder à App administrada pela ré e aceitar as propostas de entrega que lhe são disponibilizadas na App (além de lhe permitir visualizar o valor a receber em cada entrega e o local onde deverão ser deixados os produtos transportados, entre outras informações que podem relevar na prestação da actividade); a mala térmica onde são transportados os produtos disponibilizados pelos estabelecimentos comerciais; o veículo onde se faz transportar quando se desloca para fazer uma entrega de produtos a um cliente.
Estamos, assim, perante bens usados pelo estafeta na prestação da actividade de entrega que não pertença da ré, em consonância, aliás, com o estipulado nos “Termos e Condições de Utilização da Plataforma G... para Estafetas”.
Por sua vez, a App administrada pela ré, enquanto plataforma digital que gere os serviços de entrega que AA assegura, não pode ser incluída nos “equipamentos ou instrumentos de trabalho” que se procura determinar se pertencem à beneficiária da actividade de prestação de serviços de entrega, porquanto:
 uma plataforma digital não pode “pertencer” à ré, pois esse verbo reconduz-nos a uma ideia de propriedade, e o direito de propriedade só pode ser constituído relativamente a coisas corpóreas (cfr. artigo 1302.º, n.º 1, do Código Civil), entre as quais não se conta uma plataforma digital/app22;
 os vocábulos “equipamentos ou instrumentos de trabalho” traduzem uma ideia de materialidade, de utensílio ou aparelho empregado na execução de qualquer trabalho23, um bem físico, sendo que uma plataforma digital de “per si” constitui uma criação do espírito humano e não uma coisa com existência física, à semelhança, por exemplo, do sistema de G.P.S., de que o estafeta poderá utilizar para se orientar durante uma entrega;
 o proémio do artigo 12.º-A, n.º 1, do C.T., faz corresponder, ainda que de forma imprópria, o empregador à “plataforma digital”, pois a entidade patronal será sempre a pessoa singular ou colectiva que gere a plataforma digital (cfr. artigo 12.º-A, n.º 2, do C.T.), enquanto sujeito detentor de personalidade e capacidade jurídicas; mas se assim é, a App, que mais não é do que uma plataforma digital, não pode ser considerada instrumento ou equipamento pertencente a uma plataforma digital que o estafeta utiliza na sua actividade (cfr. artigo 12.º-A, n.º 1, al. f), do C.T.)24;
al. c): “o prestador de actividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo beneficiário da mesma”
AA é que decide se em cada dia faz entregas e, quando resolve prestar tais serviços, e é quem decide em que horários desenvolve a sua actividade, pelo que não existe uma pré-determinação pela ré dos horários de início e termo da prestação, salvo os que resultem da própria natureza das coisas (será compreensível que uma App que gere um serviço de entregas possa não funcionar 24 horas, todos os dias, numa localidade do interior, como Chaves, mas tal já possa suceder na cidade ..., tendo presente que a oferta dos serviços numa economia de mercado não pode estar alheada da procura expectável), sendo certo que não existe qualquer indicação de que este estafeta em concreto viu impedido pela ré um eventual propósito de alargamento das janelas horárias em que desenvolve a sua actividade para lá das permitidas pela App.
al. d): “seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de actividade, como contrapartida da mesma”
A contrapartida auferida por AA em virtude das entregas realizadas depende, no essencial, da intervenção de dois factores: o valor da taxa de entrega, a qual resulta sobretudo da distância a percorrer entre o local de recolha dos produtos e o local de cada uma das entregas (o qual variará de entrega para entrega e dependerá do número de entregas a realizar por dia e semana), embora relevem outros elementos (v.g. o período em que decorre o serviço de entrega e as eventuais condições atmosféricas adversas que se fazem sentir), a qual poderá ser majorado pela intervenção do multiplicador, a escolher pelo estafeta (pode ser mudado diariamente, sem quaisquer penalizações decorrentes da fixação de um valor superior).
Deste modo, os valores devidos por cada entrega variam e os quantitativos a receber em cada período de tempo estarão dependentes do número de entregas e do somatório das importâncias que cada entrega representou, pelo que não se pode considerar que se trate de valores certos, que se repetem no tempo, sendo certo ainda que os registos disponíveis apontam no sentido de que os valores recebidos por AA eram de índole variável (cfr. factos provados n.ºs 2 e 3).
Nessa conformidade, não se afigura que se possa concluir que AA recebia periodicamente uma quantia certa em contrapartida pela actividade que desenvolvia como estafeta.
al. e): “o prestador de actividade desempenhe funções de direcção ou chefia na estrutura orgânica da empresa.”
Não existe qualquer indicação de que AA, no decurso do relacionamento que estabeleceu com a ré, exerça funções com tais responsabilidades, mas tão-somente de estafeta.»]
que merece a nossa concordância, concluindo-se então que “não se pode presumir que a ré celebrou com AA um contrato de trabalho, tomando por referência a presunção de laboralidade do artigo 12.º, n.º 1, do C.T.
Não temos razão para divergir deste entendimento, nem o recorrente aponta qualquer razão que o contradite.

Será que funciona, então, a presunção prevista no art. 12.º-A do CT?
O Tribunal recorrido entendeu que não, por se verificar apenas uma das circunstâncias [a prevista na al. e)] relevadas nas várias alíneas do n.º 1 do artigo 12.º-A do CT.
Não concordamos.

Com efeito, entendemos que se mostram verificadas outras circunstâncias previstas naquele normativo – o qual, em tese, sem dúvida se aplica aqui, pois que estamos perante uma “plataforma digital” nos termos definidos no n.º 2 do mesmo artigo -, o que procuraremos de seguida demonstrar.

Assim, relativamente à al. a) do n.º 1 do artigo 12.º-A do CT: “A plataforma digital fixa a retribuição para o trabalho efectuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela
O Mm.º Juiz a quo fundamentou assim a sua posição:
Quando é proposta uma entrega na App administrada pela ré, o estafeta pode consultar o valor que lhe é apresentado a título de contrapartida, o qual depende, no essencial, da intervenção de dois factores: o valor da taxa de entrega (decorrente da agregação de parâmetros como a distância a percorrer entre o local de recolha dos produtos e o local da sua entrega; o período em que decorre o serviço de entrega; as eventuais condições atmosféricas adversas que se fazem sentir), a qual é fixada com base em critérios pré-estabelecidos pela ré na App, mas que em grande medida é conformada pelas opções do cliente (v.g. este escolhe o estabelecimento comercial e o momento em que pretende solicitar o serviço de entregas) e valor o multiplicador, a escolher pelo estafeta (v.g. a sua oscilação depende somente da sua vontade, sem que daí possa sofrer penalizações).
Sendo apurado o valor da contrapartida devida ao estafeta por cada entrega pela intervenção de três agentes (v.g. a ré, o estafeta e o cliente), não será substantivo concluir que é a ré quem determina unilateralmente o quantitativo da contrapartida devida ao estafeta por cada entrega, ainda que a ré também assuma um papel muito relevante na fixação do valor da contrapartida, pois é quem estipula os valores de referência contidos na App.
Poder-se-á objectar que a concorrência com outros estafetas leva a que na prática um dado estafeta não tenha liberdade de aumentar o multiplicador, por assim se sujeitar a não receber propostas de entregas, ou diminuir o número de entregas que lhe são apresentadas (v.g. embora tais reflexos negativos tenham ficado indemonstrados – cfr. facto não provado n.º 5 e a respectiva fundamentação).
De todo o modo, para se alcançar essa conclusão seria necessário evidenciar que ocorreu uma tentativa de fixação de uma taxa de entrega mais elevada, por parte de AA, de forma infrutífera, mas a materialidade provada não permite inferir que tal ocorreu em concreto com este estafeta.
Por outro lado, essa conformação pelo estafeta do valor da taxa mínima por quilómetro leva a que este também concorra para a fixação dos valores mínimos e máximos da contrapartida que lhe é devida, os quais, por essa razão, não são estabelecidos pela ré por via unilateral.
Ademais, assiste ao estafeta a faculdade de recusar a proposta de entrega, se não concordar com a contrapartida que lhe é apresentada pela App, sem que daí advenham represálias ou desvantagens, por não estar obrigado a aceitar as propostas, pelo que não está impelido a aceitar qualquer proposta que lhe seja apresentada.

Ora sustenta o recorrente, e em suma, que quanto à al. a) do n.º 1 do art.º 12º. -A do CT logrou provar-se que é a ré quem fixa unilateralmente a retribuição, sendo irrelevante que o prestador possa recusar o serviço assim como alterar o multiplicador, de forma a alterar o limite mínimo do valor de cada serviço.

E afigura-se-nos que tem razão pois que a ré estabelece os limites máximos e mínimos para a retribuição.

Entendemos que mais do que a ré assumir um papel muito relevante na fixação do valor da contrapartida devida aos estafetas, como concede o Tribunal recorrido, é a ré quem verdadeiramente e no essencial a fixa pois, tal como bem se refere também na decisão recorrida, é “quem estipula os valores de referência contidos na App”: 21. A título de contrapartida pela realização dos serviços de entrega o estafeta aufere uma prestação que varia em cada entrega, a qual corresponde ao produto da taxa de entrega por um coeficiente, denominado multiplicador, de acordo com a fórmula taxa de entrega * multiplicador. 22. O montante da taxa de entrega para cada serviço resulta da consideração de valores de referência pré-estabelecidos na App, relevando factores como a distância entre o local de recolha dos produtos e o local onde estes deverão ser entregues, o período em que decorre o serviço de entrega e as eventuais condições atmosféricas adversas que se fazem sentir.
Daí que não possamos concordar com a afirmação de que a taxa de entrega “em grande medida é conformada pelas opções do cliente” pois que as escolhas do cliente só se reflectem no valor da denominada “taxa de entrega” porque, e na medida, em que a ré o plasmou nas regras por si criadas para achar esse valor.
No que tange ao multiplicador que pode ser escolhido pelo estafeta – ponto 23 da matéria de facto provada -, aderimos ao entendimento perfilhado em recente acórdão desta Relação, no qual interviemos como adjunto, e no qual se defendeu: «(…) o valor auferido pelo estafeta depende da taxa de entrega a qual é determinada pela Ré, sem que previamente tenha ocorrido qualquer negociação com o estafeta. É certo que o estafeta pode alterar o multiplicador por forma a modificar o limite mínimo do valor de cada serviço, mas tal revela-se de irrelevante, pois tal circunstância é excecional, só se poderá verificar uma vez por dia e os limites do aumento do valor mínimo são tão insignificantes que não afastam  a regra que vigora, que é a de ser a plataforma quem determina a retribuição do trabalho, tal como resulta dos “Termos e Condições de Utilização da Plataforma G... para Estafetas”, que o estafeta está obrigado a aceitar sem qualquer margem de manobra para negociar.»[6], afigurando-se de realçar que mesmo quanto à possibilidade dada ao estafeta de, uma vez por dia, alterar o valor do multiplicador, só o pode fazer nos termos padronizados pela ré.
E quanto ao facto do estafeta não estar obrigado a aceitar todas as propostas apresentadas pela App, podendo recusar qualquer proposta de entrega, isso, salvo melhor opinião, em nada contende com a conformação do valor a receber (seria como dizer que um trabalhador que dá uma falta injustificada intervém por isso na determinação do valor da sua retribuição), reforçando até, como também se diz no citado acórdão desta Relação de 03.10.2024, a convicção de que efetivamente há uma fixação unilateral pela plataforma da contrapartida pela prestação do serviço do estafeta, “pois este pode, caso assim, o entenda aceitar ou não prestar o serviço, mas daqui não resulta qualquer possibilidade de negociação do seu preço”.

Concluímos, assim, que está verificada a circunstância prevista na alínea a) do n.º 2 do art. 12.º-A do CT.

al. b): “A plataforma digital exerce o poder de direcção e determina regras específicas, nomeadamente quanto à forma de apresentação do prestador de actividade, à sua conduta perante o utilizador do serviço ou à prestação da actividade

O Tribunal recorrido discorrendo a propósito sustenta nomeadamente que, “(…) assiste ao estafeta liberdade de escolher o concreto percurso que pretende adoptar, sem que esteja vinculado a limites de tempo para as entregas (que poderiam limitar a sua liberdade de decisão), ou adstrito à utilização de sistemas de ajuda à navegação para definir a rota que é necessário seguir (podendo inclusive desligar a App durante o serviço de entrega).
Em paralelo, o estafeta não se encontra vinculado a pré-determinações da ré quanto a indumentária para efectuar entregas, para além de não estar sujeito a avaliações de qualidade de serviço pela ré ou pelos clientes, que pudessem condicionar o valor a receber pelas entregas realizadas ou a sua selecção a candidato a receber futuras propostas de entregas.
Não se afigura, pois, que se possa concluir que a ré conforma a prestação concretamente devida pelo estafeta, controlando o modo como esta é realizada.”

Em relação à alínea b) defende o recorrente que a ré para além de estipular as regras de inscrição na plataforma por parte dos estafetas, também dirige e define a forma como devem prestar a atividade.

Em primeiro lugar, cumpre assinalar que da redacção da norma resulta, a nosso ver, que as circunstâncias aí aludidas se reportam à execução da actividade, enquanto regras conformadoras da apresentação/postura do próprio prestador da atividade e da forma como a desenvolve, mas também precisar que a determinação (pela ré) de “regras específicas” não exige – para que se possa considerar verificada a “característica” -, que tudo o que pudesse ser (em tese) regulamentado pela ré o seja.

Ora, o estafeta tem, em vários aspectos, que cumprir o procedimento instituído pela recorrida.
Assim, há regras que resultam directamente do documento denominado “Termos e Condições de Utilização da Plataforma G... para Estafetas” – v., por ex., 5.1.4 (regra atinente ao momento de aceitação pelo estafeta do pedido de entrega), 5.1.5 (regra respeitante ao momento de entrega), 5.3.1 (regra referente à facturação dos serviços prestados pelo estafeta) 5.7 (o estafeta terá uma reputação associada ao seu perfil) -, como decorrem também dos factos provados sob os n.ºs 15. - Para um estafeta poder receber uma proposta de entrega necessita de ter a geolocalização activa, de forma a poder ser seleccionado de acordo com a proximidade ao local de recolha -, 17. - Se a geolocalização permanecer activada, a App permite o acompanhamento do trajecto desenvolvido pelos estafetas entre a recolha e entrega, quer pela ré, quer pelo cliente, quer pelos estabelecimentos comerciais que fornecem os produtos a serem entregues -, 25. – (…) sendo tais serviços de entrega geridos e organizados pela App, designadamente quanto à indicação de locais de recolha e entrega dos produtos, recebendo em contrapartida os estafetas um valor por cada entrega -, 28. - Os contactos telefónicos entre estafeta e clientes que se justificam pelos serviços de entrega, nomeadamente, se não se consegue localizar o endereço de entrega, são assegurados através da plataforma gerida pela ré -, 33. - A imposição de utilização de mochila para serem efectuadas entregas de produtos alimentares (a qual não é necessário dispor do logotipo da ré) deve-se à necessidade de serem adoptadas boas práticas de higiene e segurança alimentar, para além de permitirem que o estafeta passa transportar os produtos no veículo utilizado, que poderá ser uma bicicleta ou uma mota -.
E tal como sustentado em acórdão desta Relação também de 03-10-2024, “Em especial quanto à utilização do GPS instalado na App diremos que, se é verdade que está provado que poderá não ser usado (ponto provado 30) [no caso, ponto 16], não é menos verdade que esta não passará de uma faculdade aparente dada ao estafeta. A restante matéria provada opõe-se aquela faculdade, na medida em que é através do GPS da App que são apresentadas aos estafetas as propostas de entrega, prolongando-se a sua necessidade durante a execução da entrega para que os clientes possam consultar em tempo real onde e quanto tempo demora a sua encomenda - ponto 31.”[7] [no caso, v. pontos 15 e 17]

O que, tudo ponderado, nos permite concluir que a ré regulou em grande medida as tarefas inerentes às entregas a efectuar pelos estafetas, desde a aceitação do pedido até à facturação do serviço prestado, matéria claramente suficiente para considerarmos preenchida a alínea b) do n.º 1 do 12.º -A do CT (sem prejuízo, como infra se referirá, da possibilidade de escolha que, relativamente a alguns aspectos da sua actividade, a ré concede aos estafetas, nisto se revelando algum grau de autonomia destes).
al. c): “A plataforma digital controla e supervisiona a prestação da actividade, incluindo em tempo real, ou verifica a qualidade da actividade prestada, nomeadamente através de meios electrónicos ou de gestão algorítmica

Refere-se na sentença recorrida:
Como já vimos, assiste ao estafeta liberdade de escolher a rota para efectuar as suas entregas, sem que esteja obrigado a observar limites de tempo, ou adstrito à utilização dos sistemas de ajuda à navegação que lhe são propostos pela App.
Também já se referiu que os estafetas gozam de liberdade de escolha da forma como se apresentam nas entregas, sem que estejam sujeitos a uma avaliação por clientes ou pela ré, que afecte as propostas que lhe serão apresentadas ulteriormente.
É certo, todavia, que o GPS associado à App permite o acompanhamento do trajecto desenvolvido pelos estafetas entre a recolha e entrega, quer pela ré, quer pelo cliente, mas não é forçoso que o serviço de entregas se desenvolva com a App ligada, pois o estafeta poderá desligá-la, se assim o desejar, por alguma razão, sem que sofra penalizações por tal decisão.
Ademais, a materialidade provada é insuficiente para permitir a conclusão de que a App supervisiona e controla em concreto cada entrega realizada por AA.”

Não vemos motivo, nem o recorrente o indica, para divergir deste entendimento.

al. d): “A plataforma digital restringe a autonomia do prestador de actividade quanto à organização do trabalho, especialmente quanto à escolha do horário de trabalho ou dos períodos de ausência, à possibilidade de aceitar ou recusar tarefas, à utilização de subcontratados ou substitutos, através da aplicação de sanções, à escolha dos clientes ou de prestar actividade a terceiros via plataforma

Com referência à previsão desta alínea do artigo 12.º-A do CT afirma-se na decisão recorrida:
O relacionamento vigente entre a ré e AA assenta na liberdade de escolha por esta dos dias em que fará entregas e dos horários em que desenvolve a sua actividade, os quais não são condicionados pela ré (v.g. o estafeta decide em cada dia se vai efectuar entregas e os horários em que irá prestar tal actividade, podendo não se ligar à App durante os períodos de tempo que lhe aprouver, sem que daí possam resultar penalizações). Essa liberdade de actuação envolve também a faculdade de recusar entregas que lhe sejam propostas pela App, sem que da materialidade apurada se possa extrair que o estafeta tenha pretendido efectuar uma concreta entrega e que tal pretensão lhe tenha sido negada pela App, vedando-lhe o acesso ao cliente respectivo.
Em paralelo, os estafetas podem substituir-se por outra pessoa na realização de entregas, e, para além disso, apurou-se que AA pode realizar entregas disponibilizadas por plataformas geridas por outras entidades que não a ré, ou efectuar entregas directamente por sua conta, sem que necessite de informar a ré de tal actividade concorrencial.
Finalmente, não perpassa da factualidade provada que a ré tenha aplicado sanções a AA, em virtude da forma como este realizou os serviços de entregas.”

Concorda-se, e o recorrente também não questiona nesta parte o acerto da decisão.

al. e): “A plataforma digital exerce poderes laborais sobre o prestador de actividade, nomeadamente o poder disciplinar, incluindo a exclusão de futuras actividades na plataforma através de desactivação da conta”.

A propósito, fundamentou o Tribunal recorrido a posição que adoptou:
Prevê-se nos “Termos e Condições de Utilização da Plataforma G... para Estafetas” que “(…) uma Conta Estafeta pode ser temporária ou permanentemente desactivada se: a. Em conformidade com o Código de Ética que rege todos os Utilizadores da Plataforma, utilizar a Plataforma para insultar, ofender, ameaçar e/ou agredir Terceiros, nomeadamente, Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais, outros Estafetas e pessoal da G.... b. Violar a lei ou quaisquer outras disposições dos Termos e Condições Gerais ou outras políticas da G.... c. Participar em actos ou conduta violentos. d. Violar os seus direitos na aplicação da G..., causando danos materiais e/ou imateriais a outro Utilizador da plataforma (Estafetas, Utilizadores Cliente e/ou Estabelecimentos Comerciais). e. Na prevenção de acções fraudulentas, se a identidade do Utilizador da Plataforma e/ou dos seus substitutos ou subcontratantes não puder ser verificada e/ou qualquer informação prestada por si e/ou os seus substitutos ou subcontratantes estiver incorrecta. f. A fim de prevenir a segurança de todos os Utilizadores da Plataforma em caso de violação da Política de
Mercadorias (…)”, o que, a meu ver, consubstancia a faculdade de exercício de poderes de auto-tutela pela ré, em face do eventual incumprimento pela contraparte, permitindo à ré que decida se o estafeta pode deixar de ter acesso à App, quando a visualização de propostas de entrega depende necessariamente da consulta da App.
Nessa conformidade, ao contrário do que vimos ocorrer quanto às demais alíneas já analisadas, afigura-se que a circunstância relevada pela alínea sob escrutínio se mostra preenchida.”

O Tribunal recorrido concluiu “que a circunstância relevada pela alínea sob escrutínio se mostra preenchida.”
E, não obstante a argumentação em contrário a este propósito expendida pela recorrida (em suma, a desactivação da conta é uma mera consequência da cessação do contrato por iniciativa da ré ou por iniciativa do prestador de actividade), atento o conteúdo do ponto 5.2. dos termos e condições de utilização daplataforma juntos aos autos – Sem prejuízo de quaisquer medidas adicionais que possam ser adotadas, uma Conta Estafeta pode ser temporária ou permanentemente desativada se: (…) - concordamos com o entendimento do Tribunal a quo quanto a poder a ré excluir o prestador de actividade de futuras atividades na plataforma através de desativação da conta.
Efectivamente tal está expressamente previsto naquele convénio.
Já nos parece que configura mera petição de princípio a afirmação de que tal ocorrerá (necessariamente) como exercício do poder laboral, nomeadamente do poder disciplinar, ínsito e típico do contrato de trabalho, que é precisamente o cerne da questão, cuja existência se pretende demonstrar através da presunção. 
É claro que se viermos a concluir que estamos perante um contrato de trabalho e a ré proceder à desactivação da conta do prestador de actividade por força de uma obrigação legal que a obrigue a terminar a sua utilização da App mesmo assim não se poderá dizer, pelo menos de forma liminar, que a ré agiu no exercício do poder laboral, v.g. do poder disciplinar, mas seguramente que a resposta já será afirmativa se a desactivação da conta do prestador de actividade ocorrer porque este infringiu os deveres para si advenientes do contrato que celebrou com a ré.
Mas, nesta sede, de apurarmos se se verifica o facto base da presunção, afigura-se-nos que efectivamente sim, mas com a precisão que este consiste em a ré poder excluir o prestador de atividade de futuras atividades na plataforma através de desativação da conta, nas situações previstas em 5.2./Restrições do n.º 8 da lista dos factos provados.

al. f): “Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertencem à plataforma digital ou são por esta explorados através de contrato de locação

Diz-se a propósito na decisão rtecorrida:
Esta questão já foi escalpelizada (cfr. o que ficou dito a respeito da alínea b) do n.º 1 do artigo 12.º do C.T.), e, por essa razão, remete-se para o que acima ficou dito a esse propósito, quer quanto à propriedade do veículo, do telemóvel e da mala térmica, quer quanto à insusceptibilidade de recondução de uma plataforma digital a um equipamento ou instrumento de trabalho.”

Quanto a esta alínea f) sustenta o recorrente que a mesma se encontra verificada porque o principal instrumento de trabalho é a aplicação informática que é propriedade da ré.

Não nos parece que o recorrente tenha razão.

Sendo certo que se provou que para exercer a sua actividade/realizar as entregas o identificado estafeta utiliza o seu veículo, o seu telemóvel, e uma mochila térmica que o mesmo adquiriu e bens que, portanto, não pertencem à ré, também não se provou a utilização de outros equipamentos e/ou instrumentos que pertençam ou sejam explorados por esta.
E no que em específico concerne à plataforma digital através da qual a ré gere os serviços de entrega, não pode ser considerada de instrumento ou equipamento de trabalho para este efeito, concordando-se com o entendimento perfilhado pelo Tribunal recorrido, particularmente quando defende que «os vocábulos “equipamentos ou instrumentos de trabalho” traduzem uma ideia de materialidade, de utensílio ou aparelho empregado na execução de qualquer trabalho23, um bem físico, sendo que uma plataforma digital de “per si” constitui uma criação do espírito humano e não uma coisa com existência física, à semelhança, por exemplo, do sistema de G.P.S., de que o estafeta poderá utilizar para se orientar durante uma entrega;» e que «o proémio do artigo 12.º-A, n.º 1, do C.T., faz corresponder, ainda que de forma imprópria, o empregador à “plataforma digital”, pois a entidade patronal será sempre a pessoa singular ou colectiva que gere a plataforma digital (cfr. artigo 12.º-A, n.º 2, do C.T.), enquanto sujeito detentor de personalidade e capacidade jurídicas; mas se assim é, a App, que mais não é do que uma plataforma digital, não pode ser considerada instrumento ou equipamento pertencente a uma plataforma digital que o estafeta utiliza na sua actividade (cfr. artigo 12.º-A, n.º 1, al. f), do C.T.)24
Por outro lado, como se sustentou no acórdão desta RG de 03.10.2024 acima identificado, «cabe referir o preenchimento da referida alínea exige que alguns equipamentos/instrumentos pertençam à ré e não apenas um, pois como se escreve no recente ac. da RE de 12.09.2024, proc. 3848/23.5T8PTM.E1, consultável em www.dgsi.pt “…se fosse suficiente para a verificação da característica que a ré gerisse uma aplicação informática, então seria redundante a existência desta característica, pois a própria atividade em causa, trabalho em plataforma digital, já conteria o requisito/característica da alínea f)”»

Entendemos, pois, que não se verifica a circunstância prevista na al. f) do n.º 1 do art. 12.º-A do CT.

Não obstante, verificando-se as características a que se reportam as alíneas a), b) e e) do n.º 1 do art. 12.º-A do CT, opera a presunção de contrato de trabalho (como é pacífico, para que funcione a presunção basta que se verifiquem duas das características enumeradas nas diversas alíneas do n.º 1 do art. 12.º-A do CT).

Operando a referida presunção de laboralidade, cabe à aqui ré a prova do contrário, nos termos do art. 350.º/2 do CC, e do n.º 4 do art. 12.º-A do CT - 4 - A presunção prevista no n.º 1 pode ser ilidida nos termos gerais, nomeadamente se a plataforma digital fizer prova de que o prestador de atividade trabalha com efetiva autonomia, sem estar sujeito ao controlo, poder de direção e poder disciplinar de quem o contrata. -, não lhe bastando a contraprova destinada a tornar duvidoso o facto presumido.
Como se decidiu em recente Ac. da RC, e conforme síntese do respectivo Sumário, “O ónus de provar que não se está perante um contrato de trabalho é mais exigente do que a mera contraprova, esta destinada apenas a lançar a dúvida sobre a realidade do que se pretendia provar.”, respigando-se da sua fundamentação que «Conforme refere Milene Rouxinol[5] “A presunção vincula o julgador – vale por dizer: verificados dois ou mais elementos dos elencados no art.º 12º, nº 1, ele terá de considerar demonstrada a natureza laboral do contrato –, que apenas deverá afastar-se do resultado presuntivo se o interessado em ilidir a presunção lograr fazê-lo, dissipando não apenas a convicção de que o contrato em análise é um contrato de trabalho como a dúvida sobre se o será. Concordamos, neste sentido, com a afirmação vertida no acórdão- do TRP de 14/12/2017[6]: “A verificação [da] presunção transfere para o empregador o ónus de provar o contrário, ou seja, o ónus de provar que não se está perante um contrato de trabalho, prova esta que é mais exigente do que a mera contraprova, esta destinada apenas a lançar a dúvida sobre a realidade do que se pretendia provar.»[8] (sendo que o facto de aí estar em causa a presunção do art. 12.º, n.º 1 do CT em nada afecta a pertinência do entendimento perfilhado)

Será que os factos provados permitem concluir então que, embora achando-se verificada a mencionada presunção legal, a ré logrou elidi-la?

É comum referir-se que constituem características/indícios laborais, entre outras, a hetero-determinação do período de trabalho, ao invés da realização deste nos períodos escolhidos pelo próprio prestador, a execução do trabalho em local da titularidade do beneficiário da actividade ou que este determina, a periodicidade e regularidade do pagamento da retribuição, a disponibilização por este dos meios e instrumentos necessários à realização das funções, a conformação da prestação através de directrizes ou indicações do beneficiário da actividade, a inserção do prestador na estrutura produtiva do beneficiário, designadamente revelada pela existência de hierarquia, e a impossibilidade de substituição do prestador.
Além destes, outros que resultam da observância do regime específico do Direito do Trabalho, como férias remuneradas, pagamento de subsídios de férias e de Natal, protecção, a cargo do beneficiário da prestação de actividade, contra acidentes sofridos no exercício de funções, são também susceptíveis de revelar a natureza laboral do vínculo.

Ora, perpassa pela matéria de facto provada que o prestador da actividade tem algum grau de autonomia na planificação e execução da sua actividade:
7. Com a adesão à App AA declarou consentir os termos apostos no documento denominado “Termos e Condições de Utilização da Plataforma G... para Estafetas”.
8. No documento com a epígrafe “Termos e Condições de Utilização da Plataforma G... para Estafetas”, com a redacção que lhe foi dada em 04/05/2023, constava:
(…)
3.1 Opções de Serviço:
“(…) No nosso sítio Web encontrará uma descrição das nossas opções de Serviço de Tecnologia e explicaremos que opções de Serviço tem à sua disposição quando cria uma Conta G.... Os presentes Termos e Condições serão aplicáveis a todos os nossos Serviços Tecnológicos se se registar na Plataforma como Utilizador Estafeta.
Serviços incluídos na Taxa de Utilização da Plataforma: - Acesso à plataforma que lhe permitirá oferecer voluntária e livremente os seus serviços de entrega, podendo conectar-se em qualquer altura de acordo com a possibilidade de escolher livremente os pedidos que pretende realizar. Esse acesso inclui a possibilidade de prestar os seus serviços a qualquer um dos Utilizadores da Plataforma (Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais, etc.), independentemente da empresa do Grupo G... (G... e/ou as suas filiais e/ou empresas coligadas) que gere a Plataforma à qual se conectou e sempre de acordo com a disponibilidade do país no qual se conecta. - Acesso a cobertura de seguro durante o período de conexão à Plataforma. - Acesso a apoio e serviço de assistência para qualquer inconveniente técnico que possa ocorrer. - Gestão e intermediação no serviço de recolha e pagamentos. - Aquisição e / ou uso de materiais que podem ser solicitados por você. Serviços incluídos dentro da taxa de activação (…)
 4.1. Quem é o Estafeta?
“(…) Ao aceitar os presentes Termos e Condições, também se torna um utilizador da aplicação G.... Deste modo, pode usar e conectar-se à Plataforma G... de forma flexível e a seu critério. Acede à Plataforma para usar uma tecnologia da Plataforma que lhe permite conectar-se a outros Utilizadores da Plataforma. Os mesmos poderão ser: Estabelecimentos Comerciais, Utilizadores, outros Estafetas ou outros Utilizadores. Se estiver no seu país, usa a G... como: ● Utilizador Estafeta Independente: pode definir os seus próprios horários para se conectar à Plataforma e manter o seu perfil registado. Actuará em seu próprio nome e interesse, também usando os seus próprios equipamentos para exercer a actividade. ● Utilizador Estafeta numa empresa de serviços de logística: enquanto profissional de uma empresa de serviços de logística que usa os Serviços da Plataforma, estará dependente das instruções da sua empresa. A G... não dirigirá, controlará ou será considerada dirigir ou controlar as acções ou conduta da empresa no âmbito dos presentes Termos e Condições, nomeadamente no que diz respeito à prestação dos seus serviços a outros Utilizadores da Plataforma. Reconhece que não existe nenhuma obrigação ou relação de exclusividade entre Si e a G..., de tal modo que pode, a seu exclusivo critério, oferecer serviços ou exercer qualquer outra actividade comercial ou profissional relacionada ou não com o sector de actividades da G.... (…)”
(…)
5.5.1
“(…) Você pode determinar e escolher o preço dos seus serviços através da Plataforma G.... A G..., para fins informativos, com base em informações de mercado, irá sugerir um preço de mercado que poderá ser alterado diariamente pelo Estafeta através do seu Perfil de Utilizador, sem que isso implique garantias de adjudicação do serviço. (…)”
(…)
“(…) Ao utilizar a aplicação fornecida pela G... para a execução da relação e, portanto, para exercer a actividade, a G... pode receber os dados de geolocalização do Estafeta caso o mesmo tenha activado esta função directamente no seu telemóvel. A G... usará os Dados obtidos para prestar os Serviços ao Estafeta e partilhá-los com o Utilizador Cliente e o Estabelecimento Comercial cujo pedido o Estafeta aceitou executar, para que o Utilizador Cliente e o Estabelecimento Comercial possam contactar o Estafeta no caso de algum incidente. É expressamente indicado que o Estafeta tem total liberdade de decisão em relação ao itinerário e/ou percursos escolhidos para a oferta e especificação dos seus serviços e em nenhum caso a G... utilizará esses dados para fins de controlo. (…)”
9.4. Finalidade e base jurídica do tratamento
“(…) Os Dados serão tratados exclusivamente para cumprir a relação estabelecida e, nomeadamente: (…)  Em todo o caso, o Estafeta pode desactivar a geolocalização quando não está a usar a Plataforma, embora a G... não use esta informação fora do âmbito da oferta de pedidos ou fora das horas em que o Estafeta está a usar a Plataforma. De igual modo, é expressamente indicado que o Estafeta tem total liberdade de decisão em relação ao itinerário e/ou percursos escolhidos para a oferta e concretização dos seus serviços e em nenhum caso a G... utilizará esses dados para fins de controlo do Estafeta. Neste sentido, a geolocalização é meramente temporária e não de modo algum exaustiva. A informação de geolocalização pode também ser usado para efeitos de facturação (…)”
13. Um estafeta pode recusar, ignorar ou aceitar uma oferta de entrega sugerida pela App.
16. Após o pedido de entrega ser aceite, e até os produtos serem disponibilizados aos clientes, a geolocalização pode ser desactivada pelo estafeta.
19. AA pode decidir o local onde presta a sua actividade, desde que se trate de uma zona coberta pela App, sendo livre de alterar a sua zona de actividade.
20. AA é que decide se trabalha num dia em concreto, ou se fica inactivo por alguns períodos e desenvolve a sua actividade em horários que o próprio define, bastando para o efeito colocar-se online na App nos períodos respectivos, sem que esteja sujeita a horários pré-estabelecidos ou a turnos, nem a indicação prévia dos seus horários.
22. O montante da taxa de entrega para cada serviço resulta da consideração de valores de referência pré-estabelecidos na App, relevando factores como a distância entre o local de recolha dos produtos e o local onde estes deverão ser entregues, o período em que decorre o serviço de entrega e as eventuais condições atmosféricas adversas que se fazem sentir.
23. Uma vez por dia AA pode definir o valor do multiplicador, o qual poderia oscilar entre 0,9 e 1,1, mas actualmente somente permite escolher entre 1,0 e 1,1.
27. AA pode realizar entregas disponibilizadas por plataformas geridas por outras entidades que não a ré, ou efectuar entregas directamente por sua conta, sem que necessite de disso dar conta à ré.
29. Os estafetas são livres de escolherem as suas rotas para realizarem as entregas.
30. O estafeta pode escolher o sistema de navegação que pretende utilizar no serviço de entrega, ou não utilizá-lo, se não necessitar dessa ajuda.
31. Não existem penalizações pelo modo como os estafetas realizam as suas entregas.
32. Os estafetas é que escolhem a roupa com que se apresentam nas entregas.
34. Os estafetas podem substituir-se por outra pessoa na realização de entregas, sem que careçam de autorização da ré.

Por outro lado, os índices «externos» também vão no sentido de uma prestação de trabalho com alguma autonomia:
O prestador da actividade/ AA encontra-se enquadrada para efeitos de Segurança Social no regime de trabalhadores independentes desde ../../2023, e para efeitos tributários no ano de 2023 declarou ter auferido rendimentos da categoria B (números 2 e 3 dos factos provados).

Mas não podemos olvidar que «a subordinação vai mostrando “novas faces” ao sabor do desenvolvimento tecnológico e das sucessivas modas em matéria de organização do trabalho», e que é manifesta a «debilidade contratual dos trabalhadores que actuam no âmbito de plataformas digitais».[9]
E que da matéria de facto provada resulta que a ré não se limita a prestar um serviço de intermediação, prestando um verdadeiro serviço de recolha, transporte e entrega de mercadorias, v.g. refeições, fixando, desde logo no documento denominado “Termos e Condições de Utilização da Plataforma G... para Estafetas as condições gerais para o prosseguimento dessa actividade, inclusive quando destrinça as regras que são obrigatórias daquelas em que concede aos estafetas alguma escolha.
E é ainda certo que da factualidade provada, mormente de algumas das cláusulas inseridas no dito documento Termos e Condições de Utilização da Plataforma G... para Estafetas, para além de evidenciarem a integração dos estafetas no complexo organizacional da empresa ré – como é o caso da factualidade que resulta do n.º 2.2/A sua aceitação e das alíneas a. a d. do n.º 5.1.1/A sua utilização dos Serviços de Tecnologia da G..., n.º 5.1.3/o estafeta declara cumprir as normas de ética e conduta empresarial para terceiros da G..., 5.3.1/Faturação e Pagamentos -, e emergem regras tendentes a de algum modo conformar/dirigir a execução da actividade do prestador – como sejam os factos constantes do n.º 5.7/Sistema de Reputação e do n.º 9.5/Métricas e outras informações relacionadas com a prestação do serviço, porquanto, não obstante o que aí se diz que [o estafeta] “deverá ter em conta”/“deve ter-se em conta”, aí se diz expressamente, “são tidas em conta uma avaliação do serviço e características objetivas sobre a capacidade de prestar o serviço pelo estafeta”.

Isto é, os factos apurados não permitem infirmar a existência de um contrato de trabalho entre o identificado estafeta e a ré.

A recorrida alega porém, em sede de contra-alegações, que é inconstitucional a presunção de laboralidade constante do artigo 12.º-A do CT, por violação do disposto nos artigos 13.º, 18.º n.º 2 e 3, e 61.º/1 da CRP.
O art. 13.º da CRP consagra o principio da igualdade, o art. 18.º/2/3 do mesmo compêndio trata da restrição do exercício de direitos fundamentais, e o art. 61.º desse diploma fundamental consagra o principio de que é livre o exercício da iniciativa económica privada.
Ora, nenhum destes princípios constitucionais se mostram violados pela criação daquela presunção legal.
Em primeiro lugar, cumpre realçar que se trata de uma presunção ilidível.
Depois, e trazendo uma vez mais à colação o acórdão desta Relação em que interviemos de 03.10.2024 e acima identificado, “(…) as novas formas de prestação de trabalho, designadamente nas plataformas digitais, atentas as suas especificidades, tornaram premente adaptação às regras do direito do trabalho de forma a abranger tais situações, surgindo assim a necessidade de criar um regime próprio em matéria de presunção da laboralidade, não configurando tal regime qualquer discriminação relativamente às plataformas digitais.
A proibição de discriminação não significa uma igualdade absoluta em todas as situações, nem proíbe diferenciação de tratamento e sendo assim, nada impede que realidades diferentes sejam tratadas de forma diferente, sem que tal constitua qualquer violação ao princípio da igualdade.”
Aí se prosseguindo:
Quanto à limitação inadmissível à liberdade de iniciativa económica privada que a nova presunção de laboralidade possa constituir, como defende a recorrida, importa atentar noutros direitos/deveres tais como a obrigação que o Estado tem de intervir na organização e desenvolvimento económico (art.º 80 e ss. CRP), designadamente quando surgem situações novas que urge regular por estarem desprovidas e desprotegidas pela lei, designadamente pela lei laboral.”, sendo que no próprio art. 18.º n.º 2 da CRP se admite a restrição de direitos, liberdades e garantias, conquanto “devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”, não podendo deixar de enfatizar-se, a este propósito, os direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores que a CRP consagra nos seus art.s 53.º e ss, como, à cabeça, o direito à segurança no emprego, e, no capítulo dos direitos e deveres económicos, os direitos dos trabalhadores enumerados no art. 59.º da CRP.
Ante o exposto não se vê que a presunção prevista no artigo 12.º-A do CT viole os preceitos constitucionais trazidos à colação pela recorrente.
Destarte, a decisão recorrida não pode subsistir merecendo provimento o recurso.

V - DECISÃO

Nestes termos, acordam os juízes que integram a Secção Social deste Tribunal da Relação em julgar procedente o recurso de apelação interposto pelo Ministério Público e, consequentemente, declara-se reconhecido o contrato de trabalho, por tempo indeterminado, celebrado entre AA e a ré, com início em 18.08.2023
Custas a cargo da recorrida.
Notifique.

Notifique.

Guimarães, 17 de Outubro de 2024

Francisco Sousa Pereira (relator)
Maria Leonor Chaves dos Santos Barroso
Vera Maria Sottomayor
***
Voto de esclarecimento:

Vejo de modo diferente o conceito de “instrumentos de trabalho”. O indicador deve adequar-se a novas ferramentas de trabalho, menos clássicas, ligadas ao trabalho em meio digital. Concorda-se que não é por simplesmente se utilizar uma plataforma digital que esta se converte no principal instrumento de trabalho, mormente quando as suas operadoras são meras intermediárias dos produtos. No caso, a ré detém “instrumento de trabalho” determinante, a saber a infraestrutura informática (software) que comporta inúmeras funcionalidades. Os estafetas, por sua vez, sempre que estão ao serviço, necessariamente têm de com ela se conectar e de a utilizar, sendo ali que tudo se processa, desde a atribuição das encomendas, até aos pagamentos, passando pelo uso de GPS incorporado no software. Sem tal instrumento os estafetas não poderiam trabalhar, sendo também aquela infraestrutura que permite que todo o negócio de compras e vendas de produtos seja gerido e se centralize na ré. Afigura-se menos importante a detenção pelos estafetas de motorizada, mochila e smartphone.
Maria Leonor Barroso (1ª Adjunta)


[1] Ac da RL de 25/05/2023, processo 5555/22.6T8VNG.L1-2, in www.dgsi.pt e Ac. STJ de 03-05-2001, Proc. 99A390, Ribeiro Coelho, www.dgsi.pt
[2] in Delimitação do Contrato de Trabalho e Presunção de Laboralidade no Novo Código do Trabalho – Breves Notas, Cadernos do CEJ, Trabalho Subordinado e Trabalho Autónomo: Presunção legal e Método Indiciário, pág.s 45 e 46, no sítio do CEJ na internet (acrescentamos o sublinhado)
[3] Cf. Ac. do STJ de 13/09/2006, de que foi Relatora A Sr.ª Conselheira Maria Laura Leonardo, in www.gde.mj.pt/jstj, Proc. 06S891.
[4] cf., por todos, António Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, 14.ª Ed., Almedina, pág.s 142 e pág.s 148/149 que adverte que “A subsunção dos factos na noção de trabalho subordinado é, muitas vezes, inviável. Há que recorrer, amiúde, a métodos aproximativos, baseados na interpretação de indícios.”
[5] Ob. e local citados
[6] Ac. RG de 03.10.2024, Proc. 2800/23.4T8VRL.G1, Vera Maria Sottomayor
[7] Proc. 2838/23.1T8VRL.G1, Maria Leonor Barroso
[8] Ac. de 27-09-2024, Proc. 4241/23.4T8LRA.C1, Mário Rodrigues da Silva, www.dgsi.pt
[9] Cf. António Monteiro Fernandes, Emprego na era digital: um novo conceito de trabalhador?, in Trabalho na Era Digital: Que Direito?, Estudos APODIT 9, AAFDL Editora, 2022, pág.s 244 e 245.