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EXECUÇÃO
HIPOTECA SOBRE BEM DE TERCEIRO
Sumário
I - A executada, na qualidade de adquirente por compra do imóvel previamente hipotecado a favor da exequente, tem legitimidade para ser demandada na execução provida de garantia real, na precisa medida em que o imóvel, de que é proprietária por via dessa aquisição, responderá pelas quantias devidas no âmbito das obrigações abrangidas pela hipoteca. II - O credor com garantia real, designadamente hipoteca, sobre bem de terceiro que pretenda fazer valer essa garantia deve instaurar a acção executiva contra o titular do bem. III - A hipoteca prestada por terceiro em garantia da dívida apenas abrange, na execução, os juros relativos a três anos, contados desde incumprimento.
Texto Integral
Processo nº 6757/22.0T8MAI-A.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Maia - Juízo Execução - Juiz 1,
Relatora: Ana Vieira
1º Adjunto Juiz Desembargador Dra. Judite Pires
2º Adjunto Juiz Desembargador Dra. Isoleta Almeida Costa
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Sumário
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
I- RELATÓRIO
Por apenso aos autos de execução sumária para pagamento de quantia certa que a Banco 1..., com sede na Rua ..., ... Lisboa, intentou contra A..., Lda., com sede na Rua ..., ... ..., veio a executada deduzir embargos de executado
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No requerimento executivo foi alegado em resumo o seguinte: «… QUESTÃO PRÉVIA:
1. Por escritura pública de 27.12.2013, que aqui se junta sob o doc. n.º 1, AA e BB, constituíram hipoteca unilateral para garantir, até ao limite de 285.000,00€ todas e quaisquer responsabilidades assumidas ou a assumir pela sociedade “B... Unipessoal Lda.”, concretamente: – o pagamento de toda e qualquer letra, livrança, cheque ou extracto de factura de que a Exequente seja portadora e em que a sociedade Executada, isoladamente, conjunta ou solidariamente com terceiros, se haja obrigado por aceite, subscrição, saque, aval ou endosso e ainda, que por actos diferentes;
– o pagamento de toda e qualquer quantia que a exequente viesse a emprestar, através de mútuo, abertura de crédito, saldos devedores ou descobertos em conta de depósitos e de que a sociedade executada, isolada, conjunta ou solidariamente com terceiros viesse a ser devedora ou fiadora e ainda de qualquer crédito concedido pela exequente proveniente de contrato de locação financeira mobiliária ou imobiliária, de contrato de renting, de contrato de factoring, de contrato de desconto, ou de aceite em títulos de crédito dos quais seja sacadora a sociedade executada, por forma isolada, solidaria ou conjunta;
– reembolso de quaisquer quantias que a mesma exequente viesse a despender ou tenha despendido, por quaisquer garantias bancárias já prestadas ou a prestar, de que seja ordenadora a sociedade, executada. – o pagamento de juros à taxa nominal anual de 19,965% que incidam sobre qualquer montante em dívida à exequente, e proveniente de quaisquer operações já sobreditamente referidas – o pagamento de cláusula penal indemnizatória que incide sobre o capital em dívida à taxa de 3% ao ano, em caso de incumprimento de quaisquer contratos.
2. Essa garantia hipotecária unilateral tem como objecto o prédio rústico sito no lugar ..., freguesia ... concelho de Santo Tirso, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ... registado a favor da sociedade executada, inscrito na matriz sob o artº ..., da União das freguesias ... e de ....
3. A referida hipoteca encontra-se registada a favor da Exequente pela inscrição AP. ... de 2013/12/27, conforme se observa da certidão emitida pela competente Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso e cujo conteúdo aqui se dá como integralmente reproduzido para todos os efeitos legais - Cfr. doc. n.º 2.
4. Ulteriormente, em 17-01-2015, o imóvel foi alvo de penhora no âmbito do processo executivo nº 3237/14.1T8MAI, instaurado em 23-12-2014, que corre seus termos no Juiz 2 do Juízo de Execução do Tribunal Judicial da Comarca de Porto, na qual a Banco 1... consta como Exequente e em que são Executados CC, AA, DD, BB e B..., Unipessoal Lda.
5. Tal penhora encontra-se registada pela AP. ... de 2015/01/17 - conforme se observa da certidão emitida pela competente Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso e cujo conteúdo aqui se dá como integralmente reproduzido para todos os efeitos legais - Cfr. doc. n.º 2.
6. Sucede, porém, que os então proprietários, AA e BB venderam à sociedade “A... LDA.” o imóvel acima identificado, conforme se observa pela AP. ... de 2019/09/06 da certidão emitida pela competente Conservatória do Registo Predial que se junta sob o doc. n.º 2.
7. Ora, nos termos e ao abrigo do disposto no n.º 2 do art.º 54º do Cód. Proc. Civil, “a execução por dívida provida de garantia real sobre bens de terceiro seguirá directamente contra este, se o Exequente pretender fazer valer a garantia, sem prejuízo de poder desde logo ser também demandado o devedor”.
8. A verdade é que o imóvel adquirido pela Executada “A... LDA.” encontra-se hipotecado e penhorado a favor da Exequente, pelo que, apesar deste não lhe ser devedor, tem legitimidade passiva para ser executado na presente execução hipotecária nos termos do art.º 731º do Cód. Civil.
9. Ademais, nos termos da cláusula segunda da escritura de hipoteca, uma das obrigações relativas ao imóvel, e que consta da alínea b) da cláusula terceira, é: “não alienar, conferir posse, ou onerar o imóvel hipotecado sem o consentimento da Banco 1..., nem por outra forma limitar o objecto ou a eficácia da garantida prestada”.
10. Nesta conformidade, verificando-se a venda do imóvel hipotecado à Executada “A... LDA.”, sem expresso consentimento da Banco 1..., declara a Exequente imediatamente vencidas todas as obrigações emergentes do contrato de mútuo que se discriminará:
CONTRATO DE MÚTUO Nº ...:
11. No dia 29.01.2014 a Exequente e “B... Unipessoal Lda.” celebraram contrato de mútuo como Nº ... – que aqui se junta sob o doc. n.º 3.
12. Mercê desse referido contrato, a Banco 1... concedeu à mutuária, um crédito na quantia de € 285.000,00.
13. O aludido contrato foi celebrado pelo prazo de 15 (quinze) anos, a contar da data da sua celebração.
14. No âmbito desse contrato, por um lado, para garantia do pontual cumprimento das obrigações assumidas pela “B... Unipessoal Lda.”, AA e mulher, BB, constituíram a sobredita garantia hipotecária unilateral (AP. ... de 2013/12/27), conforme se explicou supra.
15. Por outro lado, os executados CC e DD, constituíram-se solidariamente fiadores e principais pagadores das dívidas contraídas pela “B... Unipessoal, Lda.”, sendo, por isso, solidariamente responsáveis pelo pagamento da quantia mutuada.
16. Os fiadores renunciaram expressamente ao benefício de excussão prévia, sendo, portanto, exigível o cumprimento da obrigação ainda que não estejam executados todos os bens da mutuária “B... Unipessoal, Lda.”, alínea a) do art. 640° C.C.
17. Sucede que nem a mutuária “B... Unipessoal, Lda.” nem os seus garantes, cumpriram as obrigações a que estavam contratualmente adstritos, não pagando o capital e juros e demais encargos à aqui Exequente.
18. Razão pela qual a Exequente instaurou, em 23-12-2014, o supra referido processo executivo nº 3237/14.1T8MAI, que corre seus termos no Juiz 2 do Juízo de Execução do Tribunal Judicial da Comarca de Porto, na qual a aqui Exequente consta como Exequente e são Executados CC, AA, DD, BB e B..., Unipessoal Lda.
19. Através da qual o imóvel aqui em causa foi, também, alvo de penhora (AP. ... de 2015/01/17) – cfr. supra referenciado.
20. Apraz ainda esclarecer que a sociedade mutuária foi declara insolvente no processo n.º 2691/18.7T8STS, que corre termos no Juiz 2 do Juízo de Comércio de Santo Tirso, do Tribunal Judicial da Comarca do Porto.
21. Atualmente, dado o incumprimento do contrato aqui em causa, está em dívida a quantia total de € 576.055,14.
22. Assim, e como já referido, a adquirente do imóvel em causa tem legitimidade passiva para ser executada na presente execução hipotecária nos termos do art.º 731º do Cód. Civil – nos termos do qual lhe foi enviada a carta de interpelação que aqui se junta sob o doc. n.º 4.
23. A referida escritura de hipoteca e a certidão predial que se juntam são títulos executivos que servem de base à presente execução, nos termos das alíneas b) e d) do art.º 46º do Cód. Proc. Civil.
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Os embargos de executado foram liminarmente admitidos e foi proferido o saneador sentença recorrido nos seguintes termos, transcrito parcialmente na parte atinente ao recurso: «… O estado dos autos permite que se conheça, desde já, do pedido, pois o processo contém já todos os elementos necessários à prolação da decisão e não depende da prova a produzir.
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1. RELATÓRIO:
Por apenso aos autos de execução sumária para pagamento de quantia certa que a Banco 1..., com sede na Rua ..., ... Lisboa, intentou contra A..., Lda., com sede na Rua ..., ... ..., veio a executada deduzir os presentes embargos de executado, pedindo a final que:
a) As invocadas excepções peremptórias de inexequibilidade do título executivo fossem julgadas totalmente procedentes;
b) A invocada excepção peremptória de inexigibilidade da obrigação exequenda fosse julgada totalmente procedente;
Caso assim não se entenda,
c) A invocada prescrição dos juros fosse julgada totalmente procedente por provada; e em consequência,
d) A oposição à execução fosse julgada procedente por provada, sendo a executada absolvida do pedido;
Caso assim não se entenda,
- Fosse a quantia exequenda reduzida ao capital que se vier a demonstrar devido, por não estarem garantidas pela hipoteca as quantias referentes à cláusula penal, juros (além dos três anos), mutuários conta despesas e respectivos juros moratórios, imposto sobre despesas e imposto de selo.
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Através da acção executiva de que os presentes embargos são apenso, a exequente pretende que sejam efectuadas as diligências necessárias à cobrança da quantia global de € 576.055,14 (quinhentos e setenta e seis mil e cinquenta e cinco euros e catorze cêntimos), sendo € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros) a título de capital, € 158.728,58 (cento e cinquenta e oito mil e setecentos e vinte e oito euros e cinquenta e oito cêntimos) a título de juros de mora às taxas contratuais desde 27 de Fevereiro de 2014 até efectivo e integral pagamento, € 76.142,50 (setenta e seis mil e cento e quarenta e dois euros e cinquenta cêntimos) a título de cláusula penal, € 43.230,25 (quarenta e três mil e duzentos e trinta euros e vinte e cinco cêntimos) a título de mutuários conta despesas, € 1.874,02 (mil e oitocentos e setenta e quatro euros e dois cêntimos) a título de juros moratórios sobre mutuários conta despesas, € 1.684,93 (mil e seiscentos e oitenta e quatro euros e noventa e três cêntimos) a título de imposto sobre despesas e € 9.394,86 (nove mil e trezentos e noventa e quatro euros e oitenta e seis cêntimos) a título de imposto de selo.
Para tal, deu à execução o contrato de mútuo outorgado através de documento particular autenticado, datado de 29 de Janeiro de 2014, através do qual B..., Unipessoal, Lda., representada pelo seu sócio gerente AA, declarou dever à Banco 1..., a quantia de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros), que esta lhe mutuou, obrigando-se a restituir tal quantia em prestações de capital e juros, e ainda na escritura pública outorgada no dia 27 de Dezembro de 2023, através da qual AA e BB declararam constituir hipoteca sobre o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o nº ..., da freguesia ..., para garantia do capital no valor de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros), até ao valor máximo de € 481.310,75 (quatrocentos e oitenta e um mil e trezentos e dez euros e setenta e cinco cêntimos), para garantia de todas e quaisquer responsabilidades assumidas ou a assumir pela B..., Unipessoal, Lda., hipoteca que foi registada pela apresentação nº 2240, datada de 27 de Dezembro de 2013.
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No requerimento executivo, a exequente alegou que outorgou com B..., Unipessoal, Lda., um contrato de mútuo através de documento particular autenticado, datado de 29 de Janeiro de 2014, através do qual B..., Unipessoal, Lda., representada pelo seu sócio gerente AA, declarou dever à ora exequente a quantia de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros), que esta lhe mutuou, obrigando-se a restituir tal quantia em prestações de capital e juros durante o prazo de quinze anos.
Alegou depois que através da escritura pública outorgada no dia 27 de Dezembro de 2023, AA e BB, para além de se constituírem fiadores e principais pagadores das dívidas contraídas pela B..., Unipessoal, Lda., perante a ora exequente, declararam ainda constituir hipoteca sobre o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o nº ..., da freguesia ..., para garantia do capital no valor de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros), até ao valor máximo de € 481.310,75 (quatrocentos e oitenta e um mil e trezentos e dez euros e setenta e cinco cêntimos), para garantia de todas e quaisquer responsabilidades assumidas ou a assumir pela B..., Unipessoal, Lda., hipoteca que foi registada pela apresentação nº 2240, datada de 27 de Dezembro de 2013.
Alegou de seguida que nem a mutuária nem os fiadores procederam ao cumprimento das obrigações emergentes desse contrato, não tendo procedido ao pagamento do capital, dos juros e demais encargos.
Alegou depois que por tal facto, em 23 de Dezembro de 2014 instaurou contra CC, AA, DD, BB e B..., Unipessoal Lda., a acção executiva que, sob o nº 3237/14.1T8MAI, corre termos pelo Juiz 2 do Juízo de Execução do Tribunal Judicial da Comarca de Porto, onde o referido imóvel veio a ser penhorado, encontrando-se a penhora registada pela apresentação nº 35, datada de 17 de Janeiro de 2015.
Alegou de seguida que, entretanto, a mutuária B..., Unipessoal Lda., foi declarada insolvente (em 7 de Setembro de 2018 - ver fls. 25 v.º deste apenso) no processo nº 2691/18.7T8STS, que corre termos no Juiz 2 do Juízo de Comércio de Santo Tirso, do Tribunal Judicial da Comarca do Porto.
Alegou depois que os referidos AA e BB venderam tal imóvel onerado com a garantia real à ora executada, a qual procedeu ao registo de aquisição a seu favor, através da apresentação nº ..., datada de 6 de Setembro de 2019.
Alegou de seguida que previamente à citação nos presente autos, a Sr.ª Agente de Execução procedeu ao registo de penhora desse imóvel a favor da ora exequente, pela apresentação nº 2622, datada de 26 de Janeiro de 2023.
Concluiu que a execução de que a presente oposição à execução e à penhora é apenso, mostra-se provida de garantia real, onerando bem actualmente pertencente à executada embargante, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 752º nº 1, do Código de Processo Civil.
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Objecto do litígio: responsabilidade da embargante perante a exequente face à aquisição pela embargante de imóvel onerado com garantia real a favor da exequente.
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Questões a decidir:
A) Saber se se verifica a inexistência ou inexequibilidade do título;
B) Saber se se verifica a inexigibilidade da obrigação exequenda;
C) Saber de se verifica a prescrição parcial dos juros;
D) Abrangência da hipoteca face aos termos do respectivo registo.
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Nos embargos, a executada invocou em primeiro lugar a inexistência ou inexequibilidade do título.
…A embargante invocou depois a inexigibilidade da obrigação exequenda.
…. Invocou depois os limites inscritos no registo para se aferir da sua responsabilidade na qualidade de proprietária do prédio onerado com garantia real.
Para tal, alegou que a hipoteca inscrita no registo predial só garante o capital no valor de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros) e o montante máximo assegurado de € 481.310,75 (quatrocentos e oitenta e um mil e trezentos e dez euros e setenta e cinco cêntimos), concluindo que a quantia exequenda a opor à embargante e garantida pela hipoteca teria de ser necessariamente reduzida a esse valor máximo, não estando o remanescente abrangido pela garantia.
Alegou depois que a hipoteca não abrange os juros de prazo superior a três anos, pelo que, tendo por referência a nota de débito junta pela exequente, em causa estão os juros que respeitam ao período compreendido entre 27 de Fevereiro de 2014 e 27 de Fevereiro de 2017, no montante global de € 56.273,69 (cinquenta e seis mil e duzentos e setenta e três euros e sessenta e nove cêntimos), concluindo que o restante valor peticionado a título de juros não está abrangido pela hipoteca.
Alegou de seguida que a hipoteca não abrange as quantias peticionadas a título de cláusula penal, mutuários conta despesas, juros moratórios sobre mutuários conta despesas, imposto sobre despesas e imposto de selo, em virtude de não constarem do registo de hipoteca.
Invocou ainda a prescrição dos juros com mais de cinco anos.
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Por despacho proferido no dia 19 de Setembro de 2023, foi liminarmente indeferida a oposição à penhora por manifesta improcedência da mesma, tendo sido recebidos os embargos de executado, determinando-se a notificação da exequente para contestar, querendo.
Notificada, a exequente não contestou.
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Por despacho proferido no dia 31 de Outubro de 2023, uma vez que a exequente não contestou, consideraram-se confessados os factos articulados pela embargante, não se considerando porém, confessados os factos que estiverem em oposição com os expressamente alegados pelo exequente no requerimento executivo, nos termos do disposto no art. 567º, nº 1, ex vi art. 732º, nº 3, do Código de Processo Civil.
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Determinou-se que se facultasse o processo às partes para alegarem por escrito, querendo, nos termos do disposto no art. 567º, nº 2, do Código de Processo Civil.
Notificada, a embargante alegou, pugnando pela procedência dos embargos.
Por seu turno, a exequente alegou, pugnando pela improcedência das excepções e dos embargos.
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A instância mantém-se válida e regular.
2. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO E DE DIREITO:
Face ao acordo das partes e dos documentos juntos aos autos, e com interesse
para a decisão a proferir, resultam provados os seguintes factos:
a) A exequente, na qualidade de primeiro contraente e mutuante, B... Unipessoal, Lda., na qualidade de segundo contraente e mutuária, representada pelo seu sócio gerente AA, e este AA e CC, na qualidade de terceiros contraentes e fiadores, outorgaram o acordo designado por “Contrato de mútuo Nº ...”, através de documento particular autenticado, datado de 29 de Janeiro de 2014, do qual consta o seguinte:
“Cláusula 1ª (Montante e finalidade do capital mutuado)
1. O segundo contraente confessa a sociedade sua representada devedora à Banco 1... da quantia de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros), que a título de mútuo dela recebeu, destinando-se a investimentos diversos (…).
2. A quantia mutuada será creditada na conta de depósito à ordem nº ..., constituída no balcão da Banco 1... em ... C..., em nome da pare devedora. Cláusula 2ª (Prazo)
Este contrato é celebrado pelo prazo de 15 (quinze) anos, a contar da presente data. Cláusula 3ª (Juros)
1. O capital mutuado vence juros, à taxa anual nominal (TAN) de 6,774 % (seis vírgula setecentos e setenta e quatro por cento) (…).
Cláusula 4ª (Carência de capital e juros. Reembolso)
1. Entre os contraentes, nas respectivas qualidades, é acordado um período de carência de capital e juros de 6 (seis) meses, a contar da data de celebração do presente contrato.
2. Os juros vencidos e não pagos pela parte devedora durante o período de carência concedido, irão acrescer ao capital inicial. (…)
4. Findo o mencionado período de carência, o presente contrato será reembolsado em 174 (cento e setenta e quatro) prestações mensais, constantes e sucessivas, compostas por capital e juros (…).
Cláusula 7ª (Mora e cláusula penal indemnizatória)
1. Em caso de mora no cumprimento de qualquer obrigação contratual e enquanto a mesma se mantiver, serão devidos, pela parte devedora, juros moratórios mediante aplicação de uma sobretaxa anual máxima nos termos legais em vigor, nesta data fixada em 3 % (três por cento), a qual acrescerá à taxa de juros remuneratórios aplicável ao presente contrato, calculados sobre o montante em dívida desde a data da mora.
2. Em caso de incumprimento definitivo e resolvido o contrato, será devida uma indemnização com natureza de cláusula penal indemnizatória mediante aplicação de uma sobretaxa de 3 % (três por cento) ao ano, a qual acrescerá à taxa de juros remuneratórios aplicável ao presente contrato, calculada sobre o capital em dívida desde o incumprimento definitivo. (…)
Cláusula 10ª (Garantia hipotecária)
Para garantia do integral cumprimento das obrigações emergentes e assumidas no presente contrato pela parte devedora, foi constituída pelo segundo contraente e mulher BB, uma garantia hipotecária unilateral com cláusula de efeito abrangente por escritura de 27/12/2013, lavrada (…) do Livro ...-C, do Cartório Notarial da Dr.ª EE, em Vizela.”
Cláusula 11ª (Fiança)
1. Os terceiros contraentes confessam-se e constituem-se solidariamente fiadores e principais pagadores das dívidas contraídas pela parte devedora no âmbito do presente contrato, renunciando expressamente o benefício da excussão prévia. (…)
Cláusula 15ª (Direito de resolução)
1. Sem prejuízo de quaisquer outros direitos que lhe sejam conferidos por lei ou pelo presente contrato, constituem causa bastante e fundamentada de resolução do presente contrato, as que designadamente se indicam:
a) Incumprimento, ainda que parcial, de qualquer das obrigações assumidas ao abrigo do presente contrato (…). (…)
d) Diminuição das garantias prestadas ou do seu valor, bem como a alienação ou oneração, sem consentimento prévio e expresso da Banco 1..., do respectivo objecto;
e) Insolvência, ainda que não judicialmente declarada (…) da parte devedora, bem como o arresto, penhora ou qualquer intervenção judicial que possa afectar a garantia do contrato; (…)
2. Vale como interpelação para efeitos de determinação do vencimento da dívida a simples citação nos termos legais para a acção executiva ou outra a que a Banco 1... recorra para manter, garantir ou haver o seu crédito.” (cfr. documento cuja cópia digitalizada se encontra a fls. 10 e segs., dos autos principais);
b) Do extrato bancário datado de 27 de Novembro de 2014, consta que a quantia de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros) foi disponibilizada na conta bancária titulada pela B... Unipessoal, Lda. (cfr. cópia digitalizada de extracto bancário de fls. 74, deste apenso);
c) No dia 27 de Dezembro de 2023, AA e BB outorgaram no Cartório Notarial de EE a escritura pública denominada “Escritura pública de hipoteca voluntária unilateral”, através da qual declararam constituir a favor da Banco 1... hipoteca sobre o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o nº ..., da freguesia ..., para garantia de todas e quaisquer responsabilidades assumidas ou a assumir pela B..., Unipessoal, Lda., perante a Banco 1..., designadamente para garantia do capital no valor de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros), o pagamento de juros de mora à taxa nominal anual de 19,965 % que incidem sobre qualquer montante em dívida à Banco 1..., o pagamento da cláusula penal indemnizatória que incide sobre o capital em dívida, à taxa de 3 % ao ano, em caso de incumprimento definitivo do contrato, até ao valor máximo de € 481.310,75 (quatrocentos e oitenta e um mil e trezentos e dez euros e setenta e cinco cêntimos), constando da cláusula terceira que “1. Os outorgantes obrigam-se a: (…) b) Não alienar, conferir a posse ou onerar o imóvel hipotecado sem o consentimento da Banco 1..., nem por outra forma limitar o objecto ou a eficácia da garantia prestada.”, e que “2. Os outorgantes reconhecem à Banco 1... o direito de, a todo o momento, determinar o vencimento antecipado de qualquer crédito que tenha sido concedido à sociedade B..., Unipessoal, Lda., se a natureza do título que representa não o impedir, quando o outorgante deixar de cumprir qualquer das obrigações previstas no número anterior.” (cfr. cópia digitalizada de certidão de escritura pública de fls. 4 e segs., dos autos principais);
d) Sobre o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o nº ..., da freguesia ..., incidiu registo de aquisição por compra a favor de AA, no estado de casado com BB, pela apresentação nº 75, datada de 24 de Janeiro de 2013 (cfr. cópia digitalizada de descrição predial de fls. 7 e segs., dos autos principais);
e) Sobre o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o nº ..., da freguesia ..., incide registo de hipoteca voluntária a favor da ora exequente, pela apresentação nº 2240, datada de 27 de Dezembro de 2013, para garantia de pagamento do capital no valor de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros), sendo o montante máximo assegurado de € 481.310,75 (quatrocentos e oitenta e um mil e trezentos e dez euros e setenta e cinco cêntimos), constando do registo predial o seguinte:
“Garantia de todas e quaisquer responsabilidades assumidas ou assumir pela sociedade “B..., Unipessoal, Limitada”, NIPC- ..., com sede na Rua ..., Fafe, concretamente:
- O Pagamento de toda e qualquer letra, livrança, cheque ou extracto de factura de que a Banco 1... seja portadora e em que a sociedade B..., Unipessoal, Limitada, isoladamente em conjunto ou solidariamente com terceiros, se haja obrigado por aceite, subscrição, saque, aval ou endosso e ainda que por actos diferentes - O pagamento de toda e qualquer quantia que a referida Banco 1... tenha emprestado ou venha a emprestar, através de mútuo, abertura de crédito, saldos devedores ou descobertos em contas de depósito, e de que a sociedade “B..., Unipessoal, Limitada”, isoladamente, em conjunto ou solidariamente com terceiros, seja devedora ou fiadora, e ainda de qualquer crédito concedido pela mesma Banco 1... proveniente de contrato de locação financeira mobiliária ou imobiliária, de contrato de renting, de contrato de factoring, de contrato de desconto ou de aceite em títulos de crédito, do qual seja sacadora a sociedade “B..., Unipessoal, Limitada”, por forma isolada, solidária ou conjunta.
- Reembolso de quaisquer quantias que a mesma Banco 1... tenha despendido ou venha a despender por quaisquer garantias bancárias já prestadas ou a prestar, de que seja ordenadora a sociedade “B..., Unipessoal, Limitada”. Taxa de juro de 19,965%, acrescida de 3%.” (cfr. cópia digitalizada de descrição predial de fls. 7 e segs., dos autos principais);
f) Sobre o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o nº ..., da freguesia ..., incide registo de aquisição por compra a favor da ora executada embargante A..., Lda., em venda efectuada por AA e BB, pela apresentação nº ..., datada de 6 de Setembro de 2019 (cfr. cópia digitalizada de descrição predial de fls. 7 e segs., dos autos principais);
g) B..., Unipessoal, Lda., foi declarada insolvente por sentença proferida no dia 7 de Setembro de 2018, transitada em julgado, nos autos de processo de insolvência que, sob o nº 2691/18.7T8STS, correu termos pelo Juízo de Comércio de Santo Tirso - Juiz 2 (cfr. certidão digitalizada de fls. 24 e segs., deste apenso);
h) No processo de insolvência da B..., Unipessoal, Lda., por sentença proferida em 31 de Janeiro de 2019, transitada em julgado no dia 19 de Fevereiro de 2019, foi homologado o plano de recuperação da insolvente (cfr. certidão digitalizada de fls. 24 e segs., deste apenso);
i) Nesse plano de recuperação foi reconhecido à ora exequente o crédito no valor de € 565.017,96 (quinhentos e sessenta e cinco mil e dezassete euros e noventa e seis cêntimos) (cfr. certidão digitalizada de fls. 24 e segs., deste apenso);
j) Do plano de insolvência e recuperação aprovado consta o seguinte: “Créditos Comuns – Instituições Financeiras
a) Pagamento de 45% do capital e juros e dívida;
b) Período de carência de capital de 24 meses, contados a partir do mês seguinte ao transito em julgado da homologação do Plano de Insolvência;
c) Pagamento do capital não perdoado em 96 prestações, mensais, iguais e sucessivas, a iniciar após o término do período de carência;
d) Taxa de juro associada aos pagamentos: Euribor 12m + spread de 2,00
% e) Manutenção das garantias atualmente em vigor;
f) Capitalização dos juros vencidos até à data do transito em julgado da sentença;
g) No que concerne a garantias bancárias ainda não executadas, reconhecidas sob condição, caso as mesmas sejam acionadas o seu pagamento será efetuado nos termos previstos nas alíneas anteriores para os créditos efetivos; (cfr. (cfr. certidão digitalizada de fls. 24 e segs., deste apenso);
l) A exequente enviou à ora executada embargante a carta datada de 14 de Dezembro de 2021, concedendo-lhe o prazo de 10 (dez) dias a contar do recebimento da carta para proceder ao pagamento da quantia de € 544.955,49 (quinhentos e quarenta e quatro mil e novecentos e cinquenta e cinco euros e quarenta e nove cêntimos), sob pena de ser intentada acção judicial para cobrança do referido valor (cfr. cópia digitalizada de carta de fls. 16, dos autos principais);
m) A embargante, através de mandatário, enviou à exequente a carta registada datada de 31 de Dezembro de 2021, da qual conta o seguinte:
“Assunto: interpelação – Processo ...
Exmos Senhores (…)
Fui incumbido pelo nossa constituinte A..., Lda., (…) em face da notificação recebida de lhe expor e requerer o seguinte:
A interpelação não tem efeitos jurídicos em virtude do plano aprovado e no seu cumprimento por parte da B....
Nesse sentido, não há incumprimento definitivo e culposo, pelo que não opera a resolução contratual.” (cfr. cópia digitalizada de carta de fls. 63, deste apenso);
n) Nos autos de execução de que os presentes embargos de executado são apenso, foi penhorado o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o nº ..., da freguesia ..., tendo a penhora sido registada pela apresentação nº 2622, datada de 26 de Janeiro de 2023, para garantia da quantia exequenda no valor de € 576.055,14 (quinhentos e setenta e seis mil e cinquenta e cinco euros me catorze cêntimos) (cfr. auto de penhora e descrição predial junta aos autos principais – Citius)
o) A exequente emitiu nota de débito referente ao contrato de mútuo outorgado com a B... Unipessoal, Lda., contendo a indicação do capital em dívida no montante de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros), juros vencidos entre 27 de Fevereiro de 2014 e 9 de Dezembro de 2022 no valor global de € 158.728,58 (cento e cinquenta e oito mil e setecentos e vinte e oito euros e cinquenta e oito cêntimos), cláusula penal de 28 de Fevereiro de 2014 a 9 de Dezembro de 2022 no valor de € 76.142,50 (setenta e seis mil e cento e quarenta e dois euros e cinquenta cêntimos), mutuário conta despesas no valor de € 43.230,25 (quarenta e três mil e duzentos e trinta euros e vinte e cinco cêntimos), juros moratórios sobre mutuários conta despesas no valor de € 1.874,02 (mil e oitocentos e setenta e quatro euros e dois cêntimos), imposto sobre despesas no valor de € 1.684,93 (mil e seiscentos e oitenta e quatro euros e noventa e três cêntimos) e imposto de selo no valor de 9.394,86 (nove mil e trezentos e noventa e quatro euros e oitenta e seis cêntimos) (cfr. Cópia digitalizada se encontra a fls. 17, dos autos principais,
p) A acção executiva de que os presentes embargos são apenso deu entrada em juízo no dia 9 de Dezembro de 2022 (cfr. certificação electrónica do requerimento executivo);
q) A executada foi citada no dia 16 de Março de 2023 (cfr. ofício da Sr.ª Agente de Execução datado de 22 de Março de 2023, junto aos autos principais);
3. MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO:
Os factos provados supra enunciados resultam da documentação junta aos autos, enunciada com os mesmos, bem como das posições das partes em relação à factualidade alegada pela parte contrária.
4. DO DIREITO:
…. A embargante invocou em primeiro lugar a inexistência ou inexequibilidade do título.
… ….Improcede por isso, sem necessidade de mais considerandos, a alegação da embargante nesta parte.
B) Saber se se verifica a inexigibilidade da obrigação exequenda:
A embargante invocou depois a inexigibilidade da obrigação exequenda.
….Na verdade, não tendo a embargante logrado alegar nem provar a existência de qualquer pagamento de qualquer prestação referente ao aludido contrato de mútuo, é inócua a invocação da existência de um período de carência, face ao incumprimento contratual da mutuária.
Improcede por isso a invocação da inexigibilidade da obrigação, devendo em consequência, sem necessidade de mais considerandos, improceder a alegação da embargante
C) Saber de se verifica a prescrição parcial dos juros: … D) Abrangência da hipoteca face aos termos do respectivo registo: A embargante invocou ainda os limites inscritos no registo para se aferir da sua responsabilidade na qualidade de proprietária do prédio onerado com garantia real. Para tal, alegou que a hipoteca inscrita no registo predial só garante o capital no valor de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros) e o montante máximo assegurado de € 481.310,75 (quatrocentos e oitenta e um mil e trezentos e dez euros e setenta e cinco cêntimos), concluindo que a quantia exequenda a opor à embargante e garantida pela hipoteca teria de ser necessariamente reduzida a esse valor máximo, não estando o remanescente abrangido pela garantia. Alegou depois que a hipoteca não abrange os juros de prazo superior a três anos, pelo que, tendo por referência a nota de débito junta pela exequente, em causa estão os juros que respeitam ao período compreendido entre 27 de Fevereiro de 2014 e 27 de Fevereiro de 2017, no montante global de € 56.273,69 (cinquenta e seis mil e duzentos e setenta e três euros e sessenta e nove cêntimos), concluindo que o restante valor peticionado a título de juros não está abrangido pela hipoteca. Alegou de seguida que a hipoteca não abrange as quantias peticionadas a título de cláusula penal, mutuários conta despesas, juros moratórios sobre mutuários conta despesas, imposto sobre despesas e imposto de selo, em virtude de não constarem do registo de hipoteca. Nas alegações, a exequente pugnou pela improcedência do requerido, alegando, para tal e em síntese, que todas as quantias peticionadas estão previstas no título constitutivo da mesma do registo, nos termos do disposto no art. 693º, do Código Civil. Cumpre apreciar e decidir. Sob a epígrafe “Acessórios do crédito”, preceitua o art. 693º, nº 1, do Código Civil, que “A hipoteca assegura os acessórios do crédito que constem do registo.” Preceitua depois o nº 2, da mesma disposição legal, que “Tratando-se de juros, a hipoteca nunca abrange, não obstante convenção em contrário, mais do que os relativos a três anos.” Conforme já se decidiu, “I - A eficácia da hipoteca depende do registo dos respectivos factos constitutivos, mesmo em relação às partes outorgantes no contrato. II - O seu registo, funcionando como condição verdadeira da eficácia absoluta do acto/negócio de constituição, acaba por assumir também verdadeiros efeitos constitutivos, como verdadeiro registo constitutivo. III - Só os acessórios do crédito – cláusula penal, juros ou despesas – que constem do registo, ou seja, de que no registo exista menção, são abrangidos pela garantia da hipoteca (princípio da especialidade do registo quanto ao crédito). IV - Não tendo sido levada ao registo menção relativa à cláusula penal estabelecida no contrato de cessão de exploração celebrado entre a cedente/exequente e a cessionária/beneficiária da garantia para a hipótese de denúncia do contrato por falta de pagamento das prestações mensais locatícias, menção também omitida na escritura de constituição de hipoteca em que outorgaram a exequente e o executado/terceiro, não pode entender-se que a garantia hipotecária abrange o crédito da exequente relativo à aludida cláusula penal convencionada ou os juros de mora até ao valor limite da dita garantia.” (Acórdão do S.T.J. de 1 de Abril de 2014, proferido no processo nº 3204/12.0YYLSB-A.L1.S1, in in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf) Ora, conforme resulta da matéria de facto apurada, sobre o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o nº ..., da freguesia ..., incide registo de hipoteca voluntária a favor da ora exequente, pela apresentação nº …, datada de 27 de Dezembro de 2013, para garantia de pagamento do capital no valor de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros), sendo o montante máximo assegurado de € 481.310,75 (quatrocentos e oitenta e um mil e trezentos e dez euros e setenta e cinco cêntimos), constando do registo predial o seguinte: “Garantia de todas e quaisquer responsabilidades assumidas ou assumir pela sociedade “B..., Unipessoal, Limitada”, NIPC- ..., com sede na Rua ..., Fafe, concretamente: - O Pagamento de toda e qualquer letra, livrança, cheque ou extracto de factura de que a Banco 1... seja portadora e em que a sociedade B..., Unipessoal, Limitada, isoladamente em conjunto ou solidariamente com terceiros, se haja obrigado por aceite, subscrição, saque, aval ou endosso e ainda que por actos diferentes; - O pagamento de toda e qualquer quantia que a referida Banco 1... tenha emprestado ou venha a emprestar, através de mútuo, abertura de crédito, saldos devedores ou descobertos em contas de depósito, e de que a sociedade “B..., Unipessoal, Limitada”, isoladamente, em conjunto ou solidariamente com terceiros, seja devedora ou fiadora, e ainda de qualquer crédito concedido pela mesma Banco 1... proveniente de contrato de locação financeira mobiliária ou imobiliária, de contrato de renting, de contrato de factoring, de contrato de desconto ou de aceite em títulos de crédito, do qual seja sacadora a sociedade “B..., Unipessoal, Limitada”, por forma isolada, solidária ou conjunta; - Reembolso de quaisquer quantias que a mesma Banco 1... tenha despendido ou venha a despender por quaisquer garantias bancárias já prestadas ou a prestar, de que seja ordenadora a sociedade “B..., Unipessoal, Limitada”; Taxa de juro de 19,965%, acrescida de 3%.” Assim sendo, a hipoteca registada sobre o referido imóvel, só garante o crédito da exequente de capital no valor de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros), acrescido de juros pelo período de três anos, e ainda de 3%, a título de cláusula penal, até ao limite máximo assegurado de € 481.310,75 (quatrocentos e oitenta e um mil e trezentos e dez euros e setenta e cinco cêntimos), face ao teor do registo predial. Com efeito, na escritura pública de constituição de hipoteca, quanto à cláusula penal, escreveu-se o seguinte: “pagamento da cláusula penal indemnizatória que incide sobre o capital em dívida, à taxa de 3 % ao ano, em caso de incumprimento definitivo do contrato”, pelo que, conforme resulta do teor do registo predial, a mesma foi levada ao registo, resultando do registo, quando à mesma, o seguinte: “Taxa de juro de 19,965%, acrescida de 3%.” E por isso, contrariamente ao que vem alegado pela embargante, mas sem qualquer suporte factual, a cláusula penal indemnizatória que incide sobre o capital em dívida, à taxa de 3 % ao ano, em caso de incumprimento definitivo do contrato, consta do registo predial, pelo que a mesma é devida. O Imposto de Selo incide sobre todos os actos, contratos, documentos, títulos, livros, papéis e outros factos previstos na Tabela Geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens, conforme resulta do art. 1º, nº 1, do Código do Imposto de Selo. E incide sobre os juros de mora, à taxa de 4 %, face ao disposto nos arts. 1º e 3º, nºs 1 e 3, g), Código de Imposto de Selo e no ponto 17.3.1, da Tabela Geral do Imposto de Selo. É por isso de concluir que o imóvel onerado com a garantia real responde pelo montante de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros) a titulo de capital, € 52.168,04 (cinquenta e dois mil e cento e sessenta e oito euros e quatro cêntimos) a título de juros, € 76.142,50 (setenta e seis mil e cento e quarenta e dois euros e cinquenta cêntimos) a título de cláusula penal), e ainda de € 9.394,86 (nove mil e trezentos e oitenta e quatro euros e oitenta e seis cêntimos) a título de imposto de selo, tudo no valor total de € 422.705,40 (quatrocentos e vinte e dois mil e setecentos e cinco euros e quarenta cêntimos). Sob a epígrafe “Momento da constituição em mora”, preceitua o art. 805º, nº 1, do Código Civil, que “O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.” E por isso, face ao incumprimento por parte da mutuária, é lícito à exequente recorrer à acção de cumprimento e execução, face ao disposto no art. 817º, do Código Civil, que preceitua que, “Não sendo a obrigação voluntariamente cumprida, tem o credor o direito de exigir judicialmente o seu cumprimento e de executar o património do devedor (…).”. Assim sendo, as obrigações emergentes para a mutuária do documento dado à execução são certas, líquidas e exigíveis, impendendo por outro lado sobre a embargante, na qualidade de actual proprietária do imóvel onerado com a garantia real, a obrigação de pagar ao exequente as quantias tituladas pelo mesmo, bem como os respectivos juros de mora e demais quantias peticionadas, até ao valor do bem dado em garantia real, actualmente propriedade do embargante, face ao disposto no art. 54º, nº 2, do Código de Processo Civil. E por isso, a executada, ora embargante, na qualidade de adquirente por compra do imóvel previamente hipotecado a favor da exequente, tem legitimidade para ser demandada na presente execução provida de garantia real, na precisa medida em que o imóvel, de que é proprietária por via dessa aquisição, responderá pelas quantias devidas no âmbito das obrigações abrangidas pela hipoteca. Em consequência, deverá reduzir-se a quantia exequenda em dívida relativamente à qual responde o imóvel onerado com garantia real, para o montante de € 422.705,40 (quatrocentos e vinte e dois mil e setecentos e cinco euros e quarenta cêntimos), a que acrescem juros de mora vincendos, até efectivo e integral pagamento. 4. DECISÃO: Pelo exposto: - Julgo os presentes embargos de executado parcialmente procedentes e em consequência: a) Determino a redução da quantia exequenda em dívida relativamente à qual responde o imóvel onerado com garantia real, para o montante de € 422.705,40 (quatrocentos e vinte e dois mil e setecentos e cinco euros e quarenta cêntimos), a que acrescem juros de mora vincendos, até efectivo e integral pagamento; b) Improcedendo os embargos de executado no demais peticionado. Custas pela embargante e pela exequente, na proporção do decaimento, nos termos do disposto no art. 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil. Fixo à causa o valor € 576.055,14 (quinhentos e setenta e seis mil e cinquenta e cinco euros e catorze cêntimos), nos termos do disposto nos arts. 297º, nº 1 e 306º, nº 2, do Código de Processo Civil. Registe e notifique.».
*
Inconformada com a predita decisão, veio a embargante interpor o presente recurso (o qual foi admitido como de apelação, sobe nos próprios autos e com efeito suspensivo dado a embargante ter prestado caução) com o requerimento de interposição do recurso apresentar alegações, formulando, a final, as seguintes conclusões: «… III) CONCLUSÕES:
DO LIMITE DA HIPOTECA
Nos embargos deduzidos pela executada aqui recorrente, vem a mesma sindicar que a quantia exequenda a opor à aqui recorrente e garantida pela hipoteca, seja qual for o montante determinado, jamais poderia ultrapassar o montante máximo assegurado, ou seja, o prédio da embargante responderia pelo valor máximo de 481.310,75 €, sendo que o remanescente não estará abrangido pela garantia real.
Na hipoteca o registo tem eficácia constitutiva - a hipoteca deve ser registada, sob pena de não produzir efeitos, mesmo em relação às partes, determina o art. 687.º do CCiv.
Constando do registo aquele montante máximo assegurado, jamais a quantia exequenda poderá ultrapassar o mesmo.
Devendo, imperativamente, constar da sentença que o valor em que a recorrente seja condenada, em caso algum poderá ultrapassar aquele montante.
DA CLÁUSULA PENAL
Conforme referido, o registo da hipoteca tem efeitos constitutivos.
Quanto às menções obrigatórias do registo, determina o art. 96.º do Código do Registo Predial que a inscrição de hipoteca deve conter o fundamento da hipoteca, o crédito e seus acessórios e o montante máximo assegurado.
Releva considerar que a executada aqui recorrente não é parte interveniente no ato de titulação da hipoteca.
Assumindo a executada tal qualidade por via do desvio à regra geral da determinação da legitimidade, que determina que a execução por dívida provida de garantia real sobre bens de terceiro seguirá diretamente contra este, art. 54.º do CPC.
Portanto, sendo a executada proprietária do imóvel onerado com hipoteca, só terá conhecimento e só lhe é oponível a amplitude da mesma por via das menções constantes do registo, face à sua natureza constitutiva e ao facto de não ter participado na titulação da mesma.
Para tanto, transcreve-se parte do registo da hipoteca na parte que abrange: “Reembolso de quaisquer quantias que a mesma Banco 1... tenha despendido ou venha a despender por quaisquer garantias bancárias já prestadas ou a prestar, de que seja ordenadora a sociedade "B..., Unipessoal, Limitada". Taxa de juro de 19,965%, acrescida de 3%.” (negrito e sublinhado nossos).
Na sentença, o tribunal a quo cita jurisprudência do STJ, nomeadamente o Acórdão do S.T.J. de 1 de Abril de 2014, proferido no processo nº 3204/12.0YYLSB-A.L1.S1, onde refere que “Só os acessórios do crédito – cláusula penal, juros ou despesas – que constem do registo, ou seja, de que no registo exista menção, são abrangidos pela garantia da hipoteca (princípio da especialidade do registo quanto ao crédito).”
No entanto, adiante o Tribunal a quo para determinação da abrangência da hipoteca socorre-se da escritura pública de constituição de hipoteca, quanto à cláusula penal.
Ora, salvo melhor entendimento, tendo o registo efeito constitutivo, o título de constituição e o seu conteúdo não são oponíveis a terceiros, nomeadamente, à aqui executada que não foi interveniente nessa escritura pública, mas apenas os elementos constantes do registo.
Ainda que eventualmente conste do título a abrangência da cláusula penal, certo é que a mesma não constando do registo, não tem efeitos jurídicos junto da executada ou de terceiros.
Caso assim não fosse, esvaziar-se-ia o efeito constitutivo do registo - princípio da especialidade do registo quanto ao crédito invocado na sentença.
A sentença foi fundamentada em determinado sentido, mas decidiu em sentido diverso, até mesmo antagónico.
Na sua fundamentação começa por referir o efeito constitutivo da hipoteca, a obrigatoriedade da menção dos acessórios que abrange, mas conclui “Com efeito, na escritura pública de constituição de hipoteca, quanto à cláusula penal, escreveu-se o seguinte: “pagamento da cláusula penal indemnizatória que incide sobre o capital em dívida, à taxa de 3 % ao ano, em caso de incumprimento definitivo do contrato”.
A abrangência da cláusula penal consta exclusivamente da escritura pública de constituição de hipoteca e não da menção do registo onde faz menção exclusivamente a juros.
Para entendimento da menção do registo, decorre de uma compreensão clara, simples e objetiva que a hipoteca abrange juros à taxa de 19,965%, acrescidos de uma sobretaxa de 3%.
A construção frásica é a mais elementar, não é passível de qualquer outra interpretação além da que aqui se pugna.
Da formulação “Taxa de juro de 19,965%, acrescida de 3%.” concluir que está abrangida a cláusula penal, seria admitir uma interpretação excessiva, que não corresponde à menção espelhada no registo e que viola até a natureza constitutiva do registo da hipoteca e a segurança jurídica do comércio jurídico.
Da leitura das menções do registo de hipoteca só se pode concluir que a mesma apenas abrange capital (por conta das diversas naturezas da divida que garante) e juros.
Mais nenhum acessório está garantido pela hipoteca.
E esta sendo uma hipoteca genérica, é perfeitamente compreensível que assim fosse.
Acresce que a linguagem dos atos e dos registos é clara e precisa.
Dita o nº 1 do art. 42.º do Código do Notariado que “Os actos notariais são escritos em língua portuguesa, devendo ser redigidos com a necessária correcção, em termos claros e precisos.”
Tais normativos são aplicáveis tanto aos atos notariais quanto às regras do registo.
E contendo o registo a menção acima transcrita, o entendimento mais rigoroso, explícito e literal é considerar-se que tais valores se reportam exclusivamente a taxas de juro.
Não se trata de linguagem dúbia, ambígua, que pudesse levar a uma dupla interpretação.
Pelo contrário, trata-se de linguagem clara, taxativa e objetiva: Taxa de juro de 19,965%, acrescida de 3%.
Portanto, contrariamente ao decidido pelo douto Tribunal e sem qualquer suporte factual, a cláusula penal não consta das menções do registo.
Acresce que o registo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define, art. 7.º do Código do Registo Predial.
Seria uma violação grosseira, entender que a menção “acrescida de 3%.” na continuidade da referência a juros, se referisse ao valor da cláusula penal.
O tribunal a quo mal andou ao decidir que a cláusula penal consta do registo e estará abrangida pela hipoteca.
Pelo que esse valor deverá ser excluído da responsabilidade abrangida pela hipoteca e, a ser devido, não poderá ser assacado da executada.
DOS JUROS: DA ABRANGÊNCIA E PRESCRIÇÃO
Nos embargos deduzidos, veio a recorrente invocar que a hipoteca constituída não abrange juros de prazo superior a três anos, nos termos do disposto no art. 693.º, nº 2 CCiv.
Veio a recorrente ainda alegar, com referência à jurisprudência dominante, que a contagem dos três anos de juros a que alude o artigo 693.°, n°2 do CCiv. se conta a partir do início do incumprimento e não do início do financiamento ou da data do registo da hipoteca.
Ou seja, os juros abrangidos pela hipoteca serão os que respeitam ao período compreendido entre 27/02/2014 e 27/02/2017.
Conclui invocando a prescrição dos juros no prazo de cinco anos, nos termos do disposto no art. 310.º, alínea d) do CCiv.
Porém, o tribunal a quo bem andou quando na sentença decidiu estarem abrangidos pela hipoteca apenas 3 anos de juros, bem como estarem prescritos os juros com prazo superior a cinco anos.
No entanto, decidiu que “o imóvel onerado com a garantia real responde pelo montante de (…) € 52.168,04 (cinquenta e dois mil e cento e sessenta e oito euros e quatro cêntimos) a título de juros, (…)”
Ou seja, o tribunal a quo não teve em conta a jurisprudência unânime, condenando a executada ao pagamento de juros.
Para efeitos de determinação dos mesmos, teve em consideração os últimos três anos de juros, quando na verdade deveriam ter sido os invocados pela recorrente nos embargos, com a consequente prescrição dos mesmos.
Nesse sentido, pugna-se pela prescrição dos juros respeitantes ao período entre 27/02/2014 e 27/02/2017, que são os abrangidos pela hipoteca.
No mesmo sentido, veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 12/06/2019, no Processo 2029/17.0T8SLV-A.E1, em que o proprietário do imóvel não corresponde ao mutuário:
“É certo que, relativamente ao devedor, o artigo 693º do Código Civil não proíbe que se executem juros de mais de três anos, apenas os exclui da garantia. Sendo os juros que excedam o período de três anos exigíveis como crédito comum, isto é, são devidos mas não beneficiam da garantia hipotecária. No entanto, neste particular, o campo de acção está limitado à pessoa do devedor.
Todavia, o beneficiário de uma hipoteca constituída por terceiro não é credor deste, nem este, logicamente, é seu devedor. Ao não ter a recorrente a posição de devedor, a sua responsabilidade limita-se ao alcance objectivo contratualizado na hipoteca. E, assim, perante um crédito garantido por hipoteca sobre um bem de um terceiro, que não do devedor, não pode o credor reclamar os juros vencidos que não se encontrem no lapso temporal posterior aos três anos seguintes ao do vencimento do crédito, ao abrigo do disposto no nº 2 do artigo 693º do Código Civil.
Ou seja, como se nota na jurisprudência mais qualificada, enquanto que, no caso do devedor ser o titular do bem, os juros de mais de três anos podem ser objecto da execução e esta prosseguir para o seu pagamento, com a simples limitação de que não beneficiam de preferência que a hipoteca confere, já no caso do titular do bem não ser o devedor mas sim um terceiro garante, os juros de mais de três anos, não podem, sequer, ser objecto da execução, ou, sendo-o, estão excluídos da garantia hipotecária.
E, nesse quadro referencial, como síntese final, é de concluir que os terceiros garantes (proprietários do imóvel hipotecado e responsáveis pela dívida na estrita medida das forças do imóvel) não respondem pelos juros que ultrapassem os três anos, contados a partir da data do incumprimento. Do mesmo modo, o credor não pode invocar a garantia quanto a tais juros a preferência que a garantia lhe confere.”
Pugnando o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 27/06/2006,
Processo 06A1677, que: “A contagem desse período dos três anos de juros abrangidos pela hipoteca deve ter lugar a partir do momento em que os primeiros juros forem exigíveis”
E ainda no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 13/11/2007,
Processo 130-D/1999: “Perante o disposto no nº2 do art. 693 do CC, é ponto assente que a garantia hipotecária não cobre juros superiores a três anos (…) Como norma imperativa, de interesse e ordem pública, pode ser invocada por qualquer legítimo interessado, e deve ser oficiosamente aplicada pelo tribunal. (…)
O texto da norma não refere o início da contagem do período de três anos dos juros abrangidos pela hipoteca, e, numa interpretação meramente literal, poder-se-ia concluir ser apenas relevante o período temporal, independente do início do seu vencimento.
Porém, o elemento sistemático e teleológico, apontam para a interpretação no sentido de que a contagem do período dos três anos de juros abrangidos pela hipoteca deve fazer-se a partir do momento em que os primeiros juros forem exigíveis, ou seja, o início do período dos três anos é o dia do vencimento e consequente exigibilidade dos juros.”
DO IMPOSTO DO SELO
A recorrente nos embargos deduzidos alega não serem devidos os restantes valores considerados acessórios à hipoteca, porquanto os mesmos não constam da inscrição predial.
Como alegado anteriormente, só os acessórios do crédito que constem do registo, são abrangidos pela garantia hipotecária.
Porque tal valor não consta das menções do registo, seja genericamente referidas seja de forma específica, tal valor a ser devido não pode ser imputado à quantia concretamente exequenda porquanto não se encontra abrangido pela garantia real.
Sem prescindir,
Sempre se dirá que o valor em dívida a título de imposto do selo sempre teria de ser reduzido na medida daquele sobre o qual incide.
Vale isto por dizer que, reduzidos os juros e a cláusula penal, o imposto do selo devido resultará da aplicação da taxa de 4% sobre tais montantes e não o valor apurado na sentença (9.394,86 €) que incide sobre os juros prescritos e não abrangidos pela hipoteca e cláusula penal.
Termos em que, nos melhores de direito e sempre com o Mui Douto suprimento de Vª. Exª., requer-se seja dado provimento ao presente recurso e revogando-se a douta sentença recorrida, substituindo-se por outra que dê como procedente a pretensão do recorrente, no sentido de determinar o limite máximo da quantia exequenda assegurado pela hipoteca de 481.310,75 €, que a cláusula penal e imposto do selo não estão abrangidos por garantia hipotecária e os juros abrangidos por hipoteca são ao relativos aos três primeiros anos que, por efeito da prescrição, não são devidos pela executada,
com o que se fará inteira Justiça!...».
A parte contrária deduz contra-alegações, pugnando em resumo pela improcedência do recurso e pela manutenção do saneador sentença.
Nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre decidir.
***
II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Cód. Processo Civil.
Porque assim, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pela apelante, são as seguintes as questões a analisar: determinar o limite máximo da quantia exequenda assegurado pela hipoteca, determinar se a cláusula penal e imposto do selo não estão abrangidos por garantia hipotecária e os juros abrangidos por hipoteca são ao relativos aos três primeiros anos que, por efeito da prescrição, não são devidos pela executada,
*
III- FUNDAMENTOS DE FACTO
Os factos a considerar são os que resultam do relatório antecedente e a factualidade de facto constante da decisão recorrida, cujo teor aqui se dá por reproduzido e integrado.
***
IV - FUNDAMENTOS DE DIREITO
A Apelante, discorda da Sentença ora recorrida, na parte em que:
I. não determina o limite máximo da quantia exequenda para o montante máximo assegurado pela hipoteca (481.310,75 €), atendendo que se vencem juros e demais despesas
II. considera que a Cláusula Penal consta do registo da hipoteca e, por isso, está coberta pela garantia hipotecária
III. não considerou que o período dos três anos de juros abrangidos pela hipoteca deve contar-se a partir do momento em que os primeiros juros forem exigíveis, ou seja, o início do período dos três anos é o dia do vencimento e consequente exigibilidade dos juros
IV. o imposto do selo estar abrangido por garantia hipotecária, mesmo não constando do registo
Quanto ao limite da hipoteca refere a apelante que veio nos embargos sindicar que a quantia exequenda a opor à aqui recorrente e garantida pela hipoteca, seja qual for o montante determinado, jamais poderia ultrapassar o montante máximo assegurado, ou seja, o prédio da embargante responderia pelo valor máximo de 481.310,75 €, sendo que o remanescente não estará abrangido pela garantia real.
Refere que, não obstante o alegado, ainda que a sentença tenha determinado valor substancialmente inferior, face aos juros vincendos, não poderia executar-se, de forma alguma, montante superior a 481.310,75 €.
Refere que a hipoteca “global” ou “genérica”, que é uma hipoteca voluntária em que se convenciona que o devedor a constitui para garantia do pagamento das responsabilidades assumidas ou a assumir (dívidas futuras) com o credor, é válida (cfr. artigo 686º, nº 2 do do CCiv.), existindo um critério objetivo para determinação da prestação garantida ou a garantir e fixação de limites dos montantes dos créditos garantidos. Mais refere que a hipoteca o registo tem eficácia constitutiva (a hipoteca deve ser registada, sob pena de não produzir efeitos, mesmo em relação às partes, determina o art. 687.º do CCiv).
Invoca que constando do registo aquele montante máximo assegurado, jamais a quantia exequenda poderá ultrapassar o mesmo e conclui que na sentença deve constar que o valor em que a recorrente seja condenada, em caso algum poderá ultrapassar aquele montante.
Quanto á cláusula penal a apelante refere que tendo o registo da hipoteca efeitos constitutivos, a hipoteca não faz referência à existência da cláusula penal. A executada não é parte interveniente no ato de titulação da hipoteca, sendo a executada proprietária do imóvel onerado com hipoteca, só terá conhecimento e só lhe é oponível a amplitude da mesma por via das menções constantes do registo, face à sua natureza constitutiva e ao facto de não ter participado na titulação da mesma.
Assim, considera que a mesma não abrange as quantias peticionadas a título de cláusula penal.
Refere que transcrevendo parte do registo da hipoteca na parte que abrange: “Reembolso de quaisquer quantias que a mesma Banco 1... tenha despendido ou venha a despender por quaisquer garantias bancárias já prestadas ou a prestar, de que seja ordenadora a sociedade "B..., Unipessoal, Limitada". Taxa de juro de 19,965%, acrescida de 3%.”
Alega que a sentença para determinação da abrangência da hipoteca socorre-se da escritura pública de constituição de hipoteca, quanto à cláusula penal.
E considera que, tendo o registo efeito constitutivo, o título de constituição não são oponíveis a terceiros, nomeadamente, à aqui executada que não foi interveniente nessa escritura pública, mas apenas os elementos constantes do registo, sob pena de se esvaziar o efeito constitutivo do registo.
Alega que da leitura das menções do registo de hipoteca só se pode concluir que a mesma apenas abrange capital (por conta das diversas naturezas da divida que garante) e juros, sendo que mais nenhum acessório está garantido por hipoteca.
Considera, que contrariamente ao decidido pelo douto Tribunal e sem qualquer suporte factual, a cláusula penal não consta das menções do registo.
Entende que seria uma violação grosseira, entender que a menção “acrescida de 3%.” na continuidade da referência a juros, se referisse ao valor da cláusula penal.
Conclui, que o tribunal a quo mal andou ao decidir que a cláusula penal consta do registo e estará abrangida pela hipoteca e nessa medida esse valor deverá ser excluído da responsabilidade abrangida pela hipoteca e, a ser devido, não poderá ser assacado da executada.
Por outro lado, quanto ao objecto do recurso a apelante impugna a abrangência da prescrição quanto aos juros.
Refere que no nos embargos deduzidos, veio a recorrente invocar que a hipoteca constituída não abrange juros de prazo superior a três anos, atento o teor do disposto no art. 693.º, nº 2 CCiv. que a hipoteca nunca abrange, não obstante convenção em contrário, mais do que os relativos a três anos.
Mais alega que a contagem dos três anos de juros a que alude o artigo 693.°, n°2 do CCiv. se conta a partir do início do incumprimento e não do início do financiamento ou da data do registo da hipoteca. Assim, os juros abrangidos pela hipoteca serão os que respeitam ao período compreendido entre 27/02/2014 e 27/02/2017.
Considera que o tribunal a quo bem andou quando na sentença decidiu estarem abrangidos pela hipoteca apenas 3 anos de juros, bem como estarem prescritos os juros com prazo superior a cinco anos. No entanto, decidiu que “o imóvel onerado com a garantia real responde pelo montante de (…) € 52.168,04 (cinquenta e dois mil e cento e sessenta e oito euros e quatro cêntimos) a título de juros, (…)”, tendo considerado quanto aos juros teve em consideração os últimos três anos de juros, quando na verdade deveriam ter sido os invocados pela recorrente nos embargos, com a consequente prescrição dos mesmos.
Pugna assim a recorrente pela prescrição dos juros respeitantes ao período entre 27/02/2014 e 27/02/2017, que são os abrangidos pela hipoteca, (é de concluir que os terceiros garantes (proprietários do imóvel hipotecado e responsáveis pela dívida na estrita medida das forças do imóvel) não respondem pelos juros que ultrapassem os três anos, contados a partir da data do incumprimento).
Quanto ao segmento do recurso relativo ao imposto de selo a recorrente alega não serem devidos os restantes valores considerados acessórios à hipoteca, porquanto os mesmos não constam da inscrição predial. Como alegado anteriormente, só os acessórios do crédito que constem do registo, são abrangidos pela garantia hipotecária. Alega que porque tal valor não consta das menções do registo, seja genericamente referidas seja de forma específica, tal valor a ser devido não pode ser imputado à quantia concretamente exequenda porquanto não se encontra abrangido pela garantia real.
Por outro lado, alega que o valor em dívida a título de imposto do selo sempre teria de ser reduzido na medida daquele sobre o qual incide, isto é, reduzidos os juros e a cláusula penal, o imposto do selo devido resultará da aplicação da taxa de 4% sobre tais montantes e não o valor apurado na sentença (9.394,86 €) que incide sobre os juros prescritos e não abrangidos pela hipoteca e cláusula penal.
*
Atento o teor das alegações de recurso, resulta que em resumo a apelante veio alegar que a sentença recorrida não teve em consideração os “limites da hipoteca”, nomeadamente quanto à clausula penal, juros e imposto de selo.
Verifica-se que na sentença recorrida, quanto ao objecto do recurso refere em resumo que a embargante invocou os limites inscritos no registo para se aferir da sua responsabilidade na qualidade de proprietária do prédio onerado com garantia real e referiu que a hipoteca inscrita no registo predial só garante o capital no valor de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros) e o montante máximo assegurado de € 481.310,75 (quatrocentos e oitenta e um mil e trezentos e dez euros e setenta e cinco cêntimos), concluindo que a quantia exequenda a opor à embargante e garantida pela hipoteca teria de ser necessariamente reduzida a esse valor máximo, não estando o remanescente abrangido pela garantia.
Estabelece o artigo 693, nº1 do Código Civil, que “A hipoteca assegura os acessórios do crédito que constem do registo.”. E o nº 2, da mesma disposição legal, que “Tratando-se de juros, a hipoteca nunca abrange, não obstante convenção em contrário, mais do que os relativos a três anos.”
Portanto nos termos do art. 693º, n.º 1 do CC, a hipoteca garante o crédito, os acessórios do mesmo e os juros, desde que no registo se tenha feito menção a estes aspectos, não podendo, no entanto, quanto aos juros, ainda que as partes tenham convencionado o contrário, a hipoteca abranger mais do que os relativos a três anos.
Verifica-se do teor da matéria de facto provada que sobre o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o nº ..., da freguesia ..., incide registo de hipoteca voluntária a favor da ora exequente, pela apresentação nº 2240, datada de 27 de Dezembro de 2013, para garantia de pagamento do capital no valor de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros), sendo o montante máximo assegurado de € 481.310,75 (quatrocentos e oitenta e um mil e trezentos e dez euros e setenta e cinco cêntimos), constando do registo predial o seguinte: “Garantia de todas e quaisquer responsabilidades assumidas ou assumir pela sociedade “B..., Unipessoal, Limitada”, NIPC- ..., com sede na Rua ..., Fafe, concretamente: - O Pagamento de toda e qualquer letra, livrança, cheque ou extracto de factura de que a Banco 1... seja portadora e em que a sociedade B..., Unipessoal, Limitada, isoladamente em conjunto ou solidariamente com terceiros, se haja obrigado por aceite, subscrição, saque, aval ou endosso e ainda que por actos diferentes; -
O pagamento de toda e qualquer quantia que a referida Banco 1... tenha emprestado ou venha a emprestar, através de mútuo, abertura de crédito, saldos devedores ou descobertos em contas de depósito, e de que a sociedade “B..., Unipessoal, Limitada”, isoladamente, em conjunto ou solidariamente com terceiros, seja devedora ou fiadora, e ainda de qualquer crédito concedido pela mesma Banco 1... proveniente de contrato de locação financeira mobiliária ou imobiliária, de contrato de renting, de contrato de factoring, de contrato de desconto ou de aceite em títulos de crédito, do qual seja sacadora a sociedade “B..., Unipessoal, Limitada”, por forma isolada, solidária ou conjunta; - Reembolso de quaisquer quantias que a mesma Banco 1... tenha despendido ou venha a despender por quaisquer garantias bancárias já prestadas ou a prestar, de que seja ordenadora a sociedade “B..., Unipessoal, Limitada”; Taxa de juro de 19,965%, acrescida de 3%.”
Aderindo á fundamentação da sentença recorrida verifica-se que no caso dos autos, a hipoteca registada sobre o referido imóvel, só garante o crédito da exequente de capital no valor de € 285.000,00 (duzentos e oitenta e cinco mil euros), acrescido de juros pelo período de três anos, e ainda de 3%, a título de cláusula penal, até ao limite máximo assegurado de € 481.310,75 (quatrocentos e oitenta e um mil e trezentos e dez euros e setenta e cinco cêntimos), face ao teor do registo predial.
Verifica-se que face ao teor do registo da hipoteca está estabelecido que, a cláusula penal indemnizatória que incide sobre o capital em dívida, à taxa de 3 % ao ano, em caso de incumprimento definitivo do contrato, consta do registo predial, pelo que a mesma é devida.
Das inscrições hipotecárias devem constar, além das menções gerais a que se refere o art. 93º C.Reg.Predial, as menções especiais indicadas no art. 96º-1 do mesmo diploma, designadamente, ao que aqui interessa, “o fundamento da hipoteca, o crédito e seus acessórios e o montante máximo assegurado”, dispondo, por sua vez o art. 693º-1 do Código Civil que “A hipoteca assegura os acessórios do crédito que constem do registo”.
Do princípio da especialidade do registo quanto ao crédito, resulta que “em consequência do qual nenhuma garantia pode abranger elementos que não constem da inscrição, e exige-se a indicação do máximo do crédito assegurado para habilitar terceiros a conhecerem o encargo que pesa sobre os bens hipotecados” (P. de LIMA e A. VARELA, “Código Civil, Anotado”, I, 4ª ed., p. 716).
Daí resulta que só os acessórios do crédito – cláusula penal, juros ou despesas – que constem do registo, ou seja, de que no registo exista menção, são abrangidos pela garantia da hipoteca.
Assim, face ao teor do próprio registo, e aderindo-se integralmente á fundamentação da sentença recorrida, resulta que a cláusula penal e o imposto de selo (O Imposto de Selo incide sobre todos os actos, contratos, e incide sobre os juros de mora) se devem considerar abrangidos pela garantia da hipoteca.
No sentido de o imposto de selo se considerar abrangido pela garantia real, atenda a sua obrigação legal de pagamento, por via da cobrança de juros, vide o Ac do Tribunal Central Administrativo, 0258/12, Data do Acórdão: 24-10-2012, Relator: ASCENSÃO LOPES, disponível na página da DGSI (local de origem de toda a jurisprudência), Sumário: * I - O imposto de selo incide sobre todos os actos, contratos, documentos, títulos, livros, papéis e outros factos previstos na Tabela Geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens (artº. 1º, nº 1 do CIS).
II - Nos actos e contratos a obrigação tributária considera-se constituída no momento da assinatura pelos outorgantes (artº. 5º, a) CIS).
III - O imposto de selo incide sobre as garantias das obrigações, qualquer que seja a sua natureza ou forma, designadamente a garantia bancária autónoma e a hipoteca, salvo quando materialmente acessórias de contratos especialmente tributados por aquela Tabela e constituídas simultaneamente com a obrigação garantida, ainda que em instrumento ou título diferente (TGIS nº 10)….»..
E vide, o Ac do Tribunal Central Administrativo Norte, Data do Acórdão: 09-05-2024 Relator: PAULA MOURA TEIXEIRA, Sumário: I. O imposto de selo incide sobre as garantias das obrigações, qualquer que seja a sua natureza ou forma, designadamente a garantia bancária autónoma e a hipoteca, salvo quando materialmente acessórias de contratos especialmente tributados pela Tabela Geral de Imposto de Selo (TGIS) e constituídas simultaneamente com a obrigação garantida, ainda que em instrumento ou título diferente (TGIS nº 10).
II. Estabelece, pois, a verba n.º 10 da TGIS, três requisitos cumulativos para que as garantias não sejam tributadas em sede de imposto do selo: (i) a existência de acessoriedade material entre a garantia e a obrigação;(ii) a obrigação garantida seja especialmente tributada pela TGIS e (iii) simultaneidade entre o nascimento da obrigação garantida e a constituição da respetiva garantia.
III. Da interpretação do n.º 1 do artigo 38.º da LGT, os efeitos tributários reportam-se ao momento em que os negócios jurídicos produzem os efeitos económicos pretendidos pelas partes…».
Por outro lado, pugna a apelante pela prescrição dos juros respeitantes ao período entre 27/02/2014 e 27/02/2017, referindo que a hipoteca não respondem pelos juros que ultrapassem os três anos, contados a partir da data do incumprimento.
Todavia, considera-se, apesar de o nº2 do art. 693º do Código Civil não estabelecer, nem um termo inicial nem um termo final do período de três anos de juros que a hipoteca abrange, e nada tendo sido convencionado pelas partes, resulta que a solução mais conforme aos princípios gerais do direito, leva a considerar que prazo de três anos, deve contar-se desde o início do incumprimento por parte do mutuário.
Temos, assim, por mais consentânea com os princípios que regem o cumprimento das obrigações e a finalidade da garantia hipotecária, que o período de três anos do nº2 do art. 693º do Código Civil se inicia com o incumprimento do devedor.
Neste sentido vide, o Ac do STJ Processo: 1254/07.7TBGDM-A. P1.S1, Relator: FONSECA RAMOS, Data do Acórdão: 30-11-2010, Sumário: I. Sendo a hipoteca um direito real de garantia sujeito a registo, que é constitutivo, importa que no título constitutivo do registo, além da indicação do crédito estar quantificado quanto ao valor máximo que pode atingir e o seu fundamento – a dívida garantida – tenha, ainda, que mencionar a taxa dos juros e os acessórios do crédito, nos termos do art. 96º, nº1, a) do C.R.Predial, princípio da especialidade do registo.
II. A ratio legis da norma é a inerente ao registo – informação (publicidade) acauteladora do interesse de terceiros e protecção do tráfico jurídico em vista da expansão e garantia do crédito.
III. A limitação temporal de três anos prevista no nº2 do art.693º do Código Civil não comporta qualquer discriminação entre juros remuneratórios e moratórios.
IV. Não definindo aquele normativo, nem um termo inicial nem um termo final do período de três anos de juros que a hipoteca abrange, pode até admitir-se que a lei deixou ao arbítrio do credor exercer o direito conforme melhor lhe conviesse, tanto mais que na prática bancária pode não valer a proibição do anatocismo – art.560º, nºs 1 e 3, do Código Civil.
V. Nada tendo sido estipulado pelas partes, a melhor solução, a mais conforme aos princípios gerais do direito, leva a considerar que não havendo lugar a discriminar juros moratórios de juros compensatórios o prazo de três anos, deve contar-se desde o início do incumprimento por parte do mutuário.
VI. Não seria congruente a contagem daquele prazo, com início na data do registo da escritura: pense-se num mútuo de longa duração – como por regra o é o empréstimo para aquisição de habitação própria, por exemplo, e no caso em que o mutuário só muito tarde na vida do empréstimo entra em incumprimento.
VII. Por mais consentânea com os princípios que regem o cumprimento das obrigações e a finalidade da garantia hipotecária, o período de três anos do nº2 do art. 693º do Código Civil, inicia-se com o incumprimento do devedor; para lá desse período os juros não gozam de garantia hipotecária, sendo créditos comuns e, como tal, devem ser graduados….».
Igualmente no mesmo sentido, vide o Ac da RL Processo: 1262/10.0TBCTX-A.L1-8, Relator: ILÍDIO SACARRÃO MARTINS, Data do Acordão:01-10-2015 Sumário: - Tratando-se de juros, a hipoteca nunca abrange, não obstante convenção em contrário, mais do que os relativos a três anos.
- Os três anos de juros abrangidos pela hipoteca são os que imediatamente se seguem ao incumprimento, aí se iniciando os primeiros juros.»
Assim, e quanto á fundamentação jurídica, conclui-se que o presente recurso de apelação terá, por conseguinte, de improceder.
***
V- DISPOSITIVO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas a cargo da apelante (art. 527º, nºs 1 e 2).
Porto, 10/10/2024
(Atestado médico entre 24/9/202024 até 4/10/2024)
Ana Vieira
Judite Pires
Isoleta de Almeida Costa