RECURSO DE REVISÃO
ASSISTENTE
LEGITIMIDADE PARA RECORRER
ABSOLVIÇÃO CRIME
DESPACHO DE NÃO PRONÚNCIA
REJEIÇÃO DE REQUERIMENTO DE ABERTURA DE INSTRUÇÃO
ARGUIÇÃO DE NULIDADE
INDEFERIMENTO
ILEGALIDADE
INVALIDADE
NULIDADE DE ACÓRDÃO
INADMISSIBILIDADE
Sumário


I. Nos termos do art. 450.º, n.º 1, al. b), do CPP, a legitimidade do assistente para requerer a revisão de sentença limita-se à revisão de sentenças (decisões que conhecem do objeto do processo – art. 97.º, n.º 1, al. a), do CPP) absolutórias (sentenças não condenatórias ou que aplicam medidas de segurança – arts. 375.º e 376.º do CPP) e de despachos de não pronúncia (despachos proferidos no final da instrução nos casos em que não são recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança – art. 308.º, n.º 1, do CPP).
II. Os recorrentes têm a qualidade de assistentes e a decisão que pretendem rever é um acórdão do tribunal da Relação que indeferiu a arguição de irregularidade, ilegalidade, invalidade e/ ou a nulidade de acórdão que confirmou a decisão de rejeição do requerimento de abertura de instrução.
III. Essa decisão que os recorrentes pretendem que seja revista é uma decisão interlocutória que nunca pode ser equiparada a uma sentença/decisão condenatória e, muito menos, a uma decisão final ou que põe fim ao processo, pois, nem conhece do objeto do processo (artigos 97.º, n.º 1, al. a), do CPP), nem sequer põe fim ao processo, por equiparação à sentença (artigo 449.º, n.º 2, do CPP). Também não é nem uma sentença absolutória nem um despacho de não pronúncia e os fundamentos invocados – previstos no art. 449.º, n.º 1, als. c), d) e g) do CPP – dizem respeito à revisão de sentença condenatória («condenação», diz o preceito), o que não é claramente o caso em análise.
IV. Assim, nem a decisão objeto dos recursos de revisão constitui uma decisão recorrível para efeitos de recurso extraordinário de revisão, nem os recorrentes, enquanto assistentes, tem legitimidade para dela interpor recurso de revisão, pelo que se verificam dois fundamentos de inadmissibilidade dos recursos apresentados conjuntamente, que determinam a sua rejeição, nos termos do disposto nos artigos 414.º, n.º 2, e 420.º, n.º 1, al. b), do CPP, aplicáveis por analogia ex vi do artigo 4.º do CPP, impondo-se a condenação na sanção prevista no artigo 420.º, n.º 3, do CPP.

Texto Integral


Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça


Relatório

I. Os assistentes/recorrentes Comprojecto, Projectos e Construções, Lda, AA, BB e CC, vieram nos termos (entre outros) do artigo 449.º, n.º 1, al. c), al. d) e al. g), do CPP, interpor recurso extraordinário de revisão do acórdão do TRL de 30.06.2021, proferido no inquérito n.º 695/15.0TELSB.L1, que correu termos no DIAP de ..., que referem ter transitada em julgado com o acórdão de 30.03.2023 proferido no processo n.º ....

II. Para o efeito, os recorrentes apresentaram na sua petição deste recurso de revisão, as seguintes Conclusões (transcrição sem negritos, sublinhados, itálicos, que serão consultadas no documento original):

1. A presente revisão é apresentada:

1. na sequência do Acórdão do TRL da 3.ª Secção de 30-06-2021 relativo ao Proc.º NUIPC 695/15.0TELSB.L1 ter transitado em julgado com o Acórdão relativo ao Proc.º 166/2023 do Tribunal Constitucional de 30-03-2023;

2. nos termos do Art.º 449.º/1/al.s c), d) e g) e 450.º/1/al. b) do CPP;

3. porque os factos que serviram de fundamento à condenação dos Recorrentes são inconciliáveis com dados como provados noutras sentenças e da oposição resultam muito graves dúvidas sobre a justiça da condenação dos Recorrentes;

4. porque existem múltiplos factos e meios de prova não foram levados em conta pela decisão condenatória, e, por isso, e porque tiveram efeito de nexo de causalidade direto no acórdão condenatório dos Recorrentes, também suscitam muito graves dúvidas sobre a justiça da condenação daqueles;

5. porque se está a decidir de forma inconciliável com decisões do TJUE que decidiram a título prejudicial sobre questões de proteção da ordem pública e para assegurar a solidez e a integridade do sistema financeiro, e que, quando isso sucede, são suscetíveis de justificar entrave à livre circulação de serviços e de capitais.

2. E porque, o acórdão condenatório está a decidir sem se pronunciar sobre questões, factos e meios de prova que deviam ser apreciados, e conhecendo de questões de que não se podia tomar conhecimento, face ao efeito de nexo de causalidade direto que aquelas infrações tiveram naquela decisão, existe fundamento e legitimidade e não pode ser considerado ofensivo concluir-se que os Recorrentes estão a ser condenados por se estar a decidir cometendo clamorosos e intoleráveis erros judiciários e de flagrante injustiça.

3. Apesar do exposto, o acórdão condenatório dos Recorrentes decidiu que «tudo se ponderou, tudo se analisou, tudo pesou, quer no que tange à matéria de facto, quer ao direito aplicável, nas várias perspetivas que conformavam o objeto do presente recurso e, nele se decidiu fundamentadamente, nos termos que se mostram plasmados no referido aresto», e que, o acórdão de 12-05-2021 «não padece de qualquer «"irregularidade, ilegalidade, invalidade e/ou a nulidade”», «nem carece de qualquer “correção”», e assim, decidiu que «[t]endo sido transferidas ilicitamente verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ..., mediante o uso de cartões de débito, não pode tal ser da responsabilidade do Banco se não se provar que tais cartões e o respectivo PIN foram disponibilizados pelo Banco a esse ....».

4. Por isso, e ao abrigo do Art.ºs 40.º/al.s c) e d), e 41.º/2 do CPP, requer-se que os Mmºs Juízes desembargadores que decidiram o acórdão recorrido se declarem impedidos.

5. Está em causa uma fraude de €1.062.320,00 de capitais realizada pelo Millennium/BCP e outros entre 13-09-21005 e 14-06-2009 através de mais de 500 transferências de fundos não autorizadas intermediadas (maioritariamente) com cartões de débito, e com uma cadência de quase €2.500 por dia movimentados para contas bancárias tituladas por uma ... (DD) e/ou para contas bancárias tituladas pelo ex-... da aqui 1.ª A. (EE) em que, (i) não existe qualquer contrato de prestação de serviços ou relação de negócios (leia-se autorização dos dois cotitulares da conta D.O.) entre a aqui 1.ª A. e aqueles beneficiários, (ii) o Millennium/BCP e outros não obtiveram a justificação nem a informação sobre a finalidade e a natureza pretendida da relação e negócio 192.

6. Ou seja, por outras palavras e em termos práticos e objetivos, está em causa uma fraude que foi realizada em violação do negócio jurídico estabelecido no contrato de abertura de conta D.O. «CONJUNTA», e através de transações de montante anormalmente elevado, pouco habituais e sem qualquer objetivo económico ou lícito aparente ou visível 2.

7. E, para que a fraude não fosse descoberta, nas 508 transferências de fundos intermediadas com cartões e que se realizavam com uma cadência de quase €2.500 para contas bancárias tituladas pela ... e/ou para contas bancárias tituladas pelo ex-..., por manipulação de forma fraudulenta do programa e do sistema informático do Banco, e, com o intuito de ocultar, de dissimular, de auxiliar e de facilitar as operações de transferência de vantagens obtidas pelo Millennium/BCP [pelos elevados dividendos das custas que obtinha pela permanente utilização da CCC (€1.680,20 por mês/€56 por dia), que, pagava o ordenado ao gestor de conta] e pelo ex-... e pela ... [pelos montantes que eram realizados sem autorização e com uma cadência de quase €2.500 por dia], com o fim de evitar que o autor (Millennium/BCP) e o participante (ex-... e a ...) dessas infrações fossem criminalmente perseguidos ou submetidos a uma reação criminal, nos extratos bancários, o Millennium/BCP e outros substituíram os nomes daqueles beneficiários pela terminologia «TRANSF INTERB ORD».

8. Por razões de segurança, e para se evitar fraudes através do sistema financeiro, de boa fé, no objetivo que as partes visaram atingir negocialmente, no acordo jurídico estabelecido no contrato de abertura de conta, os depositantes convencionaram com o depositário Millennium/BCP que os seus capitais apenas podiam ser movimentados com DUAS assinaturas EM SIMULTÂNEO [v. Figura 02 supra e a fls 2514 dos autos do Proc.º NUIPC 695/15.0TELSB, e fls 182 dos Anexos (Anexo 08)].

9. Ou seja, tal e qual como o Millennium/BCP reconhece 3 , e como o Banco de Portugal e os seus funcionários que se pronunciaram sobre a queixa e sobre as diversas insistências apresentadas pelos aqui Recorrentes sabiam e sabem por força do que se estatui no Art.º 81.º-A (Base de dados de contas)/2/al. b) 4 do RGICSF, a conta bancária D.O. em causa era uma conta «CONJUNTA» porque os capitais depositados pela aqui 1.ª A. apenas podiam ser movimentados pelo Millennium/BCP com as DUAS assinaturas dos dois sócios-gerentes e/ou dos seus dois filhos sempre EM SIMULTÂNEO.

10. É um facto notório e do conhecimento geral, e consequentemente, o tribunal e o Banco de Portugal têm conhecimento em virtude das suas funções, que:

1. os cartões bancários (de débito ou crédito) têm apenas uma assinatura que é a do Titular daqueles instrumentos de pagamentos eletrónicos;

2. os cartões associados a uma conta de D.O. «CONJUNTA», se não existir manipulação fraudulenta do programa e do sistema bancário do Banco, o Titular dos cartões apenas pode efetuar pagamentos ou transferir fundos se àquelas operações existir associado um contrato de prestação de serviços ou uma relação de negócio entre todos os cotitulares da conta «CONJUNTA» e os beneficiários em causa;

3.as Instituições de Crédito não podem utilizar ou permitir que se utilize o sistema financeiro para realizar transações de montante anormalmente elevado, pouco habituais sem objetivo económico ou lícito aparente ou visível, podendo isso suceder se obtiverem a justificação das operações em causa 5 , ou por outras palavras, se obtiverem de todos os depositantes as informações sobre a finalidade e a natureza pretendida das relações de negócio6.

11. Por força de circunstâncias que extravasam as responsabilidades dos aqui Recorrentes, subjacente a este processo estão os Proc.ºs conexos 241/10.2... (cível) e NUIPC n.º 3564/09.0...

12. Quando em finais de junho/início de julho de 2009 se descobriu a fraude e depois de se conseguir apurar que os beneficiários das «TRANSF INTER ORD» eram a ... e/ou o ex-..., à cautela, em julho de 2009 foi apresentada queixa crime contra aqueles beneficiários diretos e que resultou no Proc.º conexo NUIPC n.º 3564/09.0...

13. Como o Millennium/BCP e outros não apresentaram as provas que atestariam que foram os aqui Recorrentes que solicitaram que aqueles mais de €1.000.000 tivessem movimentados para as contas bancárias tituladas pela ... e/ou para contas bancárias tituladas pelo ex-..., em 01-02-2010 foi apresentada a Ação de indemnização cível contra aqueles.

14. Essa Ação resultou no Proc.º conexo 241/10.2..., e, apesar de estarem em causa circunstâncias em que o Ministério Público tinha que ter sido citado como parte principal, isso não aconteceu.

15. Apesar do supramencionado sobre a forma como os capitais dos aqui Recorrentes podiam ser movimentados, porque na Contestação à P.I. do Proc.º conexo 241/10.2... os ali réus Millennium/BCP e outros invocaram ao Tribunal que a gerência da aqui 1.ª A. atribuiu ao ex-... «os máximos poderes de movimentação, autorizando assim, formalmente o acesso deste a todas as contas, bem como a poder movimentá-las livremente» 7 , se se admitisse a veracidade daqueles «máximos poderes de movimentação» (que foi o que aconteceu), também existia fundamento para ter sido o Titular dos cartões a ter entregue aqueles meios e pagamentos eletrónicos ao ex-....

16. E, por isso, e porque não se encontra outra razão, sustentando-se apenas no princípio da livre apreciação da prova (falsa porque o Millennium/BCP já confessou ao DIAP, que, “afinal”, «NÃO FOI LOCALIZADA QUALQUER EVIDÊNCIA/DOCUMENTAÇÃO ONDE "EE " CONSTE COMO AUTORIZADO A MOVIMENTAR A CONTA .....71»), o Acórdão de 14-06-2012 (Ref.ª .....86 de 18-06-2012 da 8.ª Secção do TRL) relativo ao Proc.º conexo 241/10.2..., decidiu que: «Tendo sido transferidas ilicitamente verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ..., mediante o uso de cartões de débito, não pode tal ser da responsabilidade do Banco se não se provar que tais cartões e o respectivo PIN foram disponibilizados pelo Banco a esse ....».

17. E assim, apesar de se estar perante factos notórios e do conhecimento geral, e que o tribunal tem conhecimento em virtude das suas funções, apesar de não se estar perante um caso de mero expediente, e apesar do que se dispõe no Art.º 205.º/1 da CRP, o Acórdão de 14-06-2012 não se fundou em nenhuma norma de direito, e consequentemente, é uma decisão totalmente arbitrária.

18. E, resumidamente, para concluir daquela forma por se ter sustentado naquela falsa declaração do Millennium/BCP e outros ao Tribunal e no princípio da livre apreciação da prova, além do Acórdão de 14-06-2012 não ter atendido que os cartões têm apenas uma assinatura, e que a conta bancária era uma conta D.O. «CONJUNTA» porque apenas permitia movimentos de capitais com as duas assinaturas dos DOIS sócios-gerentes da aqui 1.ª A. em SIMULTÂNEO, ou dos seus DOIS filhos também em SIMULTÂNEO, aquela decisão cível também não atendeu que o Millennium/BCP e outros, para realizar transações de montante anormalmente elevado, pouco habituais sem objetivo económico ou lícito aparente ou visível, ao abrigo do que determinou nos Art.ºs 6.º/2 da Lei 11/2004, 8.º/1/al. c) da Diretiva 2005/60/CE, e 7.º/4 e 9.º/1/al. b) da lei 25/2008, e ponto 2.4. da Instrução 26/2005 do Banco de Portugal, tinham que obter a justificação e as informações das operações em causa.

19. E consequentemente, nestas circunstâncias, se aquela justificação e informação não fosse admissível, o Millennium/BCP e outros não podiam permitir que se utilizasse o sistema financeiro para as transferências de fundos que se realizavam com uma cadência de €2.500 por dia e para contas bancárias tituladas por uma ... e/ou para contas bancárias tituladas pelo ex-....

20. Por isso, ao decidir daquela forma, o Acórdão de 14-06-2012 do TRL do Proc.º conexo 241/10.2... violou o que se estabeleceu nos Art.ºs 15.º, 16.º e 21.º/al. g) do DL 446/85, 342.º/1, 483.º, 486.º, 493.º, 796.º/1, 798.º, 799.º/1 e 1189.º do Código Civil, 54.º (Consentimento e retirada de consentimento)/1/2 e 4, 59.º (Prova de autenticação e execução das operações de pagamento)/1, e 60.º (Responsabilidade do prestador do serviço de pagamento por operações de pagamento não autorizadas) da Diretiva 2007/64/CE relativa aos serviços de pagamentos no mercado interno, 65.º (Consentimento e retirada de consentimento)/1/2/3 e 6, 70.º (Prova de autenticação e execução das operações de pagamento) e 71.º (Responsabilidade do prestador do serviço de pagamento por operações de pagamento não autorizadas) do DL 317/2009 (que transpôs da Diretiva 2007/64/CE), 3.º/4, 6.º, 7.º/1, 8.º/1 e 2, 11.º/1, 15.º, 18.º/1 e 44.º/al.s a), b), d) e f) da Lei 11/2004 que estabelece o regime de prevenção e repressão do branqueamento (que transpôs a Diretiva 91/308/CEE), 1.º/1 e 2/al.s a) e d), 7.º/al.s b) e c), 8.º/al. c), 9.º/5, 20.º, 22.º/1/al. a) e 24.º da Diretiva 2005/60/CE relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais, 1.º/1/al. d) da Lei 36/94 relativa às medidas de combate à corrupção e criminalidade económica e financeira, 368.º-A (Branqueamento)/1 e 2 do Código Penal, e 101.º, 103.º/1 e 205.º/1 da CRP.

21. Tendo em conta que por força daquela falsa declaração do Millennium/BCP e outros ao Tribunal cível, em violação daqueles dispositivos se estava a decidir que, (i) a conta bancária D.O. «CONJUNTA» podia ser movimentada pelo Millennium/BCP e outros com apenas UMA assinatura (cartões de débito), (ii) o Millennium/BCP podia realizar transações de montante anormalmente elevado, pouco habituais sem objetivo económico ou lícito aparente ou visível sem ter que obter a justificação das operações que se realizavam com uma cadência de €2.500 por dia e para contas tituladas por uma ... e/ou para contas tituladas pelo ex-...,

22. como por força do que se dispõe no Art.º 81.º-A (Base de dados de contas)/2/al. b) do RGICSF o Banco de Portugal sabia que o ex-... NUNCA tinha tido podres de movimentação das contas da aqui 1.ª A., e como no exercício das suas funções os tribunais têm direito à coadjuvação das outras autoridades (cf. Art.º 202.º/3 da CRP), e ainda, como o Banco de Portugal,

(i)nos termos do Art.º 102.º da CRP exerce as suas funções nos termos da lei e das normas internacionais a que o Estado Português se vincule,

(ii) ao abrigo do Art.º 127.º/2, quarto travessão, do TFUE, tem como uma das atribuições básicas fundamentais a promoção do bom funcionamento dos sistemas de pagamentos como é o caso dos pagamentos intermediados com cartões bancários (débito ou crédito),

(iii) nos termos do Art.º 211.º/1/al. b) do RGICSF, sanciona as IC que realizem operações não autorizadas ou que lhes estejam especialmente vedadas como é o caso,

a) das operações realizadas em violação do negócio jurídico estabelecido no contrato de abertura de conta D.O. «CONJUNTA»,

b) das transações de montante anormalmente elevado pouco habituais sem objetivo económico ou lícito aparente ou visível 8 , que, por serem movimentos suscetíveis de configurarem na prática do crime de branqueamento por se estar a utilizar o sistema financeiro para se suprimirem receitas dos orçamentos do Estado por motivos fiscais, é justamente aquilo que se reflete nas transferências de fundos que se operaram com uma cadência de quase €2.500 por dia de contas bancárias de uma conta de empresa de construção para contas bancárias tituladas por uma ... e/ou por contas bancárias tituladas pelo ex-...,

23. tendo presente o que se consagra no Art.º 436.º do CPC, e atendendo os princípios da garantia de acesso aos tribunais, do contraditório, da boa gestão processual, e da colaboração para a descoberta da verdade estatuídos nos Art.ºs 2.º, 3.º, 6.º, 7.º/1 e 2, e 417.º/1 do CPC, e 13.º, 20.º/1/4 e 5, 29.º/6, e 32.º/1/5 e 7 da CRP, para que se pudesse apresentar o parecer do Banco de Portugal em instâncias judiciais, extrajudicialmente, junto do supervisor bancário nacional e contra o Millennium/BCP, em junho de 2013 foi apresentada reclamação.

24. Mas, em violação do que se dispõe no Art.º 92.º/1 do CPA, o BdP através dos seus funcionários, decidiu(ram) sem fundamentar em qualquer dispositivo legal.

25. E assim, aqueles, (i) encontram a forma para decidirem que, «analisada a reclamação em apreço, não foi possível concluir que o BCP tenha violado algumas das normas pelas quais este Banco esteja incumbido de zelar», (ii) sustentando-se naquilo que foi decidido «pelas instâncias judiciais competentes», nomeadamente no Acórdão de 14-06-2012 do TRL relativo ao Proc.º conexo 241/10.2..., também decidiram que, «[t]endo sido transferidas ilicitamente verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ..., mediante o uso de cartões de débito, não pode tal ser da responsabilidade do Banco se não se provar que tais cartões e o respectivo PIN foram disponibilizados pelo Banco a esse ....».

26. Por isso, depois da reclamação apresentada em junho de 2013, até 15 maio de 2015 foram apresentadas diversas insistências junto do BdP, mas, de nada serviu.

27. Como, sem fundamentar, o BdP e os seus funcionários decidiram daquela forma, pode-se concluir que aqueles também decidiram que o Millennium/BCP:

1. podia movimentar capitais com cartões de débito (uma assinatura) em violação do negócio jurídico estabelecido no contrato de abertura de conta D.O. «CONJUNTA»;

2. apesar do que se determinou nos Art.ºs 6.º/2 da Lei 11/2004, 8.º/1/al. c) da Diretiva 2005/60/CE, e 7.º/4 e 9.º/1/al. b) da Lei 25/2008, e ponto 2.4. da Instrução 26/2005 do Banco de Portugal, aqueles não tinham que obter a justificação nem as informações das operações em causa, e assim, podiam efetuar as transferências de fundos que se operaram com uma cadência de quase €2.500 por dia de uma conta de empresa de construção para contas bancárias tituladas por uma ... e/ou pelo ex-..., e, por isso, tendo presente o critério-padrão utilizável por um "homem médio" na análise de idêntica situação (cf. ponto 8 da Instrução 26/2005 do Banco de Portugal), o BdP e os seus funcionários terão entendido que:

(i) aquelas operações não eram transações de montante anormalmente elevado, nem transações pouco habituais sem objetivo económico ou lícito aparente ou visível (cf. 20.º da Diretiva 2005/60/CE);

(ii) não eram operações suspeitas nem suscetíveis de configurarem na prática do crime de branqueamento (cf. Art.º 40.º/1 da Lei 25/2008) por se estar a utilizar o sistema financeiro para se suprimirem receitas dos orçamentos do Estado por motivos fiscais.

28. Nestes termos, face às infrações do foro penal subjacentes ao facto do Millennium/BCP e outros terem realizado mais de €1.000.000 sem a autorização dos DOIS cotitulares/DOIS vinculantes da conta bancária, e, em transações pouco habituais e sem qualquer objetivo económico ou lícito aparente ou visível, e face ao facto do Banco de Portugal e dos seus funcionários que se pronunciaram sobre a queixa e sobre as diversas insistências estarem a legitimar a IC para proceder daquela forma, em 25-05-2015 foi apresentada queixa crime contra, (i) o Millennium/BCP e outros, (ii) o BdP e contra os funcionários que se pronunciaram sobre a reclamação e sobre as diversas insistências.

29. Essa queixa que foi apresentada em 25-05-2015 e resultou neste Proc.º NUIPC 695/15.0TELSB.

30. E, como em 26-03-2014 já tinha existido Acórdão da extinta 8.ª Secção do TRL relativo ao Proc.º NUIPC n.º 3564/09.0..., e como ali já se tinha decidido que «A VERDADE é que NÃO FICÁMOS COM QUAISQUER DÚVIDAS de que o arguido [o ex-...] utilizou os referidos cartões e respectivos códigos de acesso sem o conhecimento e contra a vontade dos gerentes da "Comprojecto", ÚNICA QUESTÃO ESSENCIAL PARA OS FACTOS QUE CUMPRE APRECIAR NOS PRESENTES AUTOS.»,

31. como no Proc.º conexo 241/10.2... se estava a decidir que «não pode tal ser da responsabilidade do Banco se não se provar que tais cartões e o respectivo PIN foram disponibilizados pelo Banco a esse ...», para se transmitir ao DIAP que o Millennium/BCP e outros tinham abusado da confiança e que estavam a agir em conluio com o ex-..., no artigo 612.º da queixa crime apresentada em 25-05-2015 (Proc.º NUIPC 695/15.0TELSB) foi desde logo invocada aquela decisão de 26-03-2014 do Acórdão da extinta 8.ª Secção do TRL do Proc.º NUIPC n.º 3564/09.0...

32. E, o facto de no Acórdão de 26-03-2014 da extinta 8.ª Secção do TRL do Proc.º NUIPC n.º 3564/09.0... se ter decidido que «A VERDADE é que NÃO FICÁMOS COM QUAISQUER DÚVIDAS de que o arguido [o ex-...] utilizou os referidos cartões e respectivos códigos de acesso sem o conhecimento e contra a vontade dos gerentes da "Comprojecto", ÚNICA QUESTÃO ESSENCIAL PARA OS FACTOS QUE CUMPRE APRECIAR NOS PRESENTES AUTOS.», ficou registado na pág. 5/54 do Acórdão de 12-05-2021 relativo ao Proc.º NUIPC 695/15.0TELSB.L1, decisão esta que foi integralmente confirmada pelo acórdão condenatório dos Recorrentes de 30-06-2021.

33. Entretanto, em 04-02-2016, o Proc.º conexo NUIPC n.º 3564/09.0... transitou definitivamente em julgado.

34. E, sobre quem é que entregou os cartões ao ex-..., foi definitivamente decidido que:

1. «A VERDADE é que NÃO FICÁMOS COM QUAISQUER DÚVIDAS de que o arguido [o ex-...] utilizou os referidos cartões e respectivos códigos de acesso sem o conhecimento e contra a vontade dos gerentes da "Comprojecto", ÚNICA QUESTÃO ESSENCIAL PARA OS FACTOS QUE CUMPRE APRECIAR NOS PRESENTES AUTOS.»;

2. «De onde resulta, afinal, que OS CARTÕES BANCÁRIOS UTILIZADOS PELO ARGUIDO [o ex-...] NÃO LHE HAVIAM SIDO ENTREGUES OU POSTO NA SUA DISPONIBILIDADE PELA EMPRESA (…).».

35. Por conseguinte, se não foi a gerência da aqui 1.ª A. a entregar os cartões e os respetivos códigos de acesso ao ex-..., tendo presente que quem emitiu os cartões foi o Banco, tem que se concluir que foi o Banco que entregou os cartões àquele ex-funcionário da aqui 1.ª A..

36. E consequentemente, a partir de 04-02-2016 já não existia fundamento para se decidir que «não pode tal ser da responsabilidade do Banco se não se provar que tais cartões e o respectivo PIN foram disponibilizados pelo Banco a esse ...».

37. Mesmo assim, para atestar se os cartões em causa podiam efetuar transferências de fundos para a ... e/ou para o ex-... com uma assinatura, a fls 2463 dos autos do Proc.º NUIPC 695/15.0TELSB, a Mmª Procuradora natural do DIAP requereu ao Millennium/BCP que apresentasse:

1. o «CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS entre os DOIS VINCULANTES da conta de DO [Depósito à Ordem]» e os beneficiários dos mais de €1.000.000;

2. o «contrato da conta de depósito á ordem (documento) titulada por Comprojecto, que ateste que a conta bancária em QUESTÃO PASSOU A SER MOVIMENTADA APENAS POR AA [aqui 2.º A. e Titular dos cartões]».

38. O Millennium/BCP não apresentou aqueles documentos de prova.

39. Depois de tudo aquilo que a Mmª Procuradora natural/Juíza natural tinha conseguido apurar e alcançar com o «Pedido de elementos bancários» requeridos ao Millennium/BCP, e, quando tudo indiciava que o Millennium/BCP e outros iam ser pronunciados das múltiplas infrações penais subjacentes, (i) às infrações relativas aos mais de €1.000.000 de transferências de fundos realizados «ILICITAMENTE» para as contas bancárias da ... e/ou do ex-... com uma cadência de quase €2.500 por dia sem autorização dos dois cotitulares da conta «CONJUNTA» D.O., (ii) às infrações relativas às transações de montante anormalmente elevado, pouco habituais e sem qualquer objetivo económico ou lícito aparente ou visível, (iii) às infracções económico-financeiras cometidas de forma [meticulosamente] organizada, com recurso à tecnologia informática, (iv) às infrações relativas aos mais de €1.000.000 de movimentos a débito e a crédito realizados «ILICITAMENTE» na CCC sem a autorização dos dois sócios-gerentes, (v) às falsas declarações daqueles no Proc.º conexo n.º 241/10.2..., (vi) ao facto de terem entregue os cartões que intermediaram a fraude ao ex-...,

40. subitamente, e sem que exista no processo qualquer pedido de substituição requerido daquela Mmª Procuradora natural/Juíza natural, quase cinco anos depois do Proc.º NUIPC 695/15.0TELSB estar sob alçada da Mmª Procuradora natural/Juíza natural, subitamente, e em violação dos Art.ºs 16.º/al. b), 21.º/2/al. a), 150.º/1/2 e 3 e 152.º do EMP, 605.º do CPC, e 216.º/1 e 219.º/4 e 5 da CRP, em 09-01-2020, sem que no Proc.º NUIPC 695/15.0TELSB exista qualquer pedido de substituição requerido por aquela Mmª Procuradora natural/Juíza natural, a Mmª Diretora do DIAP de Lisboa decidiu efetuar a redistribuição/substituição/movimentação da Mmª Procuradora natural/Juíza natural.

41. E, sem que os aqui Recorrentes tivessem perguntado se aquela redistribuição/substituição/ movimentação da Mmª Procuradora natural tinha interferido na decisão relativa ao despacho de arquivamento do inquérito, a Mmª Diretora do DIAP antecipou-se desde logo a informar que aquela decisão «em nada interfere com as decisões a proferir no âmbito dos processos».

42. E assim, deixando de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, o despacho de arquivamento do inquérito encontrou a forma para não atender:

1. ao facto de no Proc.º conexo NUIPC n.º 3564/09.0... já se ter decidido definitivamente que quem entregou os cartões ao ex-... foi o Banco;

2. a nada daquilo que tinha sido requerido pela Mmª Procuradora natural ao Millennium/BCP a fls 2462 e 2463;

3. às confissões do Millennium/BCP em resposta àqueles pedidos;

4. às falsas declarações dos ali réus no Proc.º 241/10.2...;

5. ao direito subjacente a este caso e às questões colocadas pela Mmª Procuradora natural ao Millennium/BCP;

6. que o Millennium/BCP não apresentou qualquer prova que o pudesse ilibar das infrações penais (e cíveis) subjacentes:

a) aos movimentos não autorizados instituídos nos diplomas para cumprimento obrigatório das Instituições de Crédito;

b) às transações de montante anormalmente elevado pouco habituais sem objetivo económico ou lícito aparente ou visível.

43. E, relativamente ao Proc.º conexo NUIPC n.º 3564/09.0..., conhecendo de questões de que não podia tomar conhecimento, a Mmª Procuradora substituta invocou que o ex-... foi CONDENADO por abuso de confiança qualificado.

44. Mas, EFETIVAMENTE, no Proc.º conexo NUIPC n.º 3564/09.0... o ex-... foi ABSOLVIDO daquele crime de abuso de confiança qualificado, porque, foi dado como provado que, (i) foi o Banco que entregou os cartões ao ex-..., (ii) aquele ex-funcionário da aqui 1.ª A. nunca teve poderes de movimentação das contas da empresa.

45. E, também conhecendo de questões de que não podia tomar conhecimento, designadamente que os extratos bancários continham «todas as movimentações ocorridas nas contas da mesma», que, «[a]s transferências e todos os movimentos associados ao cartão em causa, encontravam-se reflectidos nos extractos bancários», que, nos extratos bancários «estavam detalhadas todas as utilizações feitas com o cartão», e que, os extratos bancários «documentaram e informavam todos esses movimentos»,

46. por outras palavras, o despacho de arquivamento do inquérito encontrou a forma para decidir que, para que as operações não autorizadas e suspeitas não fossem descobertas e para se facilitar aqueles movimentos realizados «ILIICITAMENTE», por manipulação fraudulenta do programa e do sistema informático do Banco, com o intuito de ocultar, de dissimular, de auxiliar e de facilitar as operações de transferência de vantagens obtidas pelo Millennium/BCP [pelos elevados dividendos das custas que obtinha pela permanente utilização da CCC - €1.680,20 por mês/€56 por dia] e pelo ex-... e pela ... [pelos montantes que eram realizados sem autorização e com uma cadência de quase €2.500 por dia], com o fim de evitar que o autor (Millennium/BCP) e o participante (ex-... e a ...) dessas infrações fossem criminalmente perseguidos ou submetidos a uma reação criminal, nos extratos bancários, o Millennium/BCP e outros podiam ocultar e substituir os nomes da ... e do ex-... pela terminologia «TRANSF INTERB ORD».

47. Por outro lado, não atendendo que o Millennium/BCP já tinha confessado ao DIAP que «NÃO FOI LOCALIZADA QUALQUER EVIDÊNCIA/DOCUMENTAÇÃO ONDE "EE" CONSTE COMO AUTORIZADO A MOVIMENTAR A CONTA .....71», também conhecendo de questões de que não podia tomar conhecimento, o despacho de arquivamento do inquérito encontrou a forma para invocar e admitir que os Sócios-gerentes da A. Comprojecto atribuíram ao seu ex-... «os máximos poderes de movimentação, autorizando assim, formalmente o acesso deste a todas as contas, bem como a poder movimentá-las livremente», e que, «ao EE foi dado poderes máximos para actuar sozinho e fazer tudo aquilo que entendesse em todas as operações».

48. E assim, decidindo que,

1. numa conta bancária «CONJUNTA» em que se convencionou que apenas se podiam movimentar capitais com as duas assinaturas daqueles DOIS ordenantes, podia ser movimentada com apenas uma assinatura e mesmo sem nenhuma assinatura, e, por isso, o Millennium/BCP e outros não podiam ser acusados de abuso de confiança por terem realizado transferências de fundos sem a autorização dos DOIS ordenantes,

2. o Millennium/BCP e outros podiam utilizar ou permitir que se utilizasse o sistema financeiro para realizar transações de montante anormalmente elevado, pouco habituais e sem qualquer objetivo económico ou lícito aparente ou visível,

3. o Banco de Portugal não tinha que sancionar o Millennium/BCP nos termos dos Art.ºs 210.º/al. m), e 211.º/1/al. b), m) e p) do RGICSF,

4. o Banco de Portugal e os seus funcionários não tinham que ser pronunciados das infrações penais subjacentes à decisão relativa à reclamação e às diversas insistências apresentadas pelos aqui Recorrentes junto do supervisor bancário contra o Millennium/BCP,

49. sustentando-se apenas no que se decidiu no Proc.º 241/10.2... de 14-06-2012, o despacho de arquivamento do inquérito do Proc.º NUIPC 695/15.0TELSB, encontrou a forma para decidir «que tendo sido transferidas ilicitamente verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ..., mediante o uso de cartões de débito [UMA ASSINATURA e sem que, (i) exista um «CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS entre os DOIS VINCULANTES da conta de DO» e os beneficiários dos mais de €1.000.000, (ii) o Titular dos cartões tivesse poderes de movimentação], não pode tal ser da responsabilidade do Banco se não se provar que tais cartões e o respectivo PIN foram disponibilizados pelo Banco a esse ....».

50. E assim, deixando de se pronunciar sobre questões, factos e de meios de prova que devesse apreciar, e conhecendo de questões de que não podia tomar conhecimento, a Mmª procuradora substituta encontrou a forma para decidir, (i) que o Millennium/BCP e outros não abusaram da confiança nem que agiram em conluio com o ex-..., (ii) que o Millennium/BCP e outros não cometeram as demais infrações do foro penal subjacentes a todas aquelas infrações, (iii) condenar os Recorrentes.

51. Ou seja, pode-se concluir que o despacho de arquivamento do inquérito ao deixar de se pronunciar sobre questões, de factos e de meios de prova que devesse apreciar, e ao conhecer de questões de que não podia conhecer, cometeu clamorosos e intoleráveis erros judiciários e de flagrante injustiça.

52. Pelo exposto, e sem necessidade de mais considerandos em relação à redistribuição/substituição/ movimentação da Mmª Procuradora natural, pode-se concluir que a substituição da Mmª Procuradora natural/Juíza natural interferiu totalmente com as decisões que vieram a ser proferidas.

53. Face ao exposto, foi apresentado RAI.

54. Como o despacho de arquivamento do inquérito invocou que no Proc.º conexo NUIPC n.º 3564/09.0... o ex-... tinha sido condenado do crime de abuso de confiança qualificado, quando, efetivamente, aquele ex-funcionário da aqui 1.ª A. foi absolvido daquela infração penal, porque, naquele processo se deu como provado que não foi a gerência da empresa que entregou os cartões ao ex-...,

55. e como daquela forma se estava a conhecer de factos e de questões de que não se podia conhecer, e a encontrar a solução para se decidir que o Millennium/BCP e outros não podiam ser condenados do crime de abuso de confiança e de conluio com o ex-..., nos artigos 116.º, 175.º/14 e 206.º das Alegações, e 13.º/15 das Conclusões do RAI, foi invocado que o despacho de arquivamento do inquérito estava a conhecer de factos e de questões de que não se podia conhecer.

56. E como assim se estava a encontrar a forma para se decidir que «não pode tal ser da responsabilidade do Banco se não se provar que tais cartões e o respectivo PIN foram disponibilizados pelo Banco a esse ...», nos artigos 113.º, 119.º, 175.º/15, 206.º, 262.º/4/al. b), 330.º, 336.º e 340.º das Alegações, e nos pontos 4/5 e 13/15 das Conclusões do RAI foi invocado que no Proc.º conexo NUIPC n.º 3564/09.0... já se tinha decidido definitivamente que «A VERDADE é que NÃO FICÁMOS COM QUAISQUER DÚVIDAS de que o arguido [o ex-...] utilizou os referidos cartões e respectivos códigos de acesso sem o conhecimento e contra a vontade dos gerentes da "Comprojecto", ÚNICA QUESTÃO ESSENCIAL PARA OS FACTOS QUE CUMPRE APRECIAR NOS PRESENTES AUTOS.» e que, «[d]e onde resulta, afinal, que OS CARTÕES BANCÁRIOS UTILIZADOS PELO ARGUIDO [o ex-...] NÃO LHE HAVIAM SIDO ENTREGUES OU POSTO NA SUA DISPONIBILIDADE PELA EMPRESA (…).».

57. E, repita-se, se não foi a gerência que entregou os cartões ao ex-..., atendendo que quem emitiu os cartões foi o Banco, tem que se concluir que foi a IC que entregou aqueles cartões àquele ex-funcionário da aqui 1.ª A..

58. E, como se referiu supra, conhecendo de mais questões, de factos e meios de prova de que não podia tomar conhecimento, o despacho de arquivamento do inquérito invocou que:

1. os extratos bancários continham «todas as movimentações ocorridas nas contas da mesma»;

2. «As transferências e todos os movimentos associados ao cartão em causa, encontravam-se reflectidos nos extractos bancários»;

3. nos extratos bancários «estavam detalhadas todas as utilizações feitas com o cartão»;

4. os extratos bancários «documentaram e informavam todos esses movimentos».

59. Apesar de no RAI se ter invocado que aquelas afirmações do despacho de arquivamento do inquérito não tinham NENHUM fundamento porque nos extratos bancários fornecidos pelo Millennium/BCP aos autos do Proc.º NUIPC 695/15.0TELSB os 508 movimentos não autorizados e suspeitos em causa intermediados com cartões para contas bancárias tituladas pela ... e/ou pelo ex-... os nomes daqueles beneficiários tinham sido substituídos pela terminologia «TRANSF INTERB ORD», o JIC não atendeu a este facto e meio de prova ESSENCIAL para se atestar que a fraude foi meticulosamente organizada pelo Millennium/BCP e outros, e pelo ex-....

60. Por conseguinte, além do JIC ter omitido que no Proc.º conexo NUIPC n.º 3564/09.0... já se tinha decidido que foi o Banco que entregou os cartões ao ex-..., o JIC também decidiu que:

1. numa conta bancária «CONJUNTA» em que se convencionou que apenas se podiam movimentar capitais com as duas assinaturas daqueles DOIS ordenantes, podia ser movimentada com apenas uma assinatura e mesmo sem nenhuma assinatura, e, por isso, o Millennium/BCP e outros não podiam ser acusados de abuso de confiança por terem realizado transferências de fundos sem a autorização dos DOIS ordenantes;

2. apesar dos Art.ºs 6.º/2 da Lei 11/2004, 8.º/1/al. c) da Diretiva 2005/60/CE, e 7.º/4 e 9.º/1/al. b) da Lei 25/2008, e o ponto 2.4. da Instrução 26/2005 do Banco de Portugal, determinarem que as IC têm que obter a justificação e as informações sobre a finalidade e a natureza pretendida da relação de negócio, o Millennium/BCP e outros podiam não atender a essas obrigações, e, por isso, podiam utilizar ou permitir que se utilizasse o sistema financeiro para realizar transações de montante anormalmente elevado, pouco habituais e sem qualquer objetivo económico ou lícito aparente ou visível;

3. para que as operações não autorizadas e suspeitas não fossem descobertas e para se facilitar aqueles movimentos realizados «ILIICITAMENTE», por manipulação fraudulenta do programa e do sistema informático do Banco, com o intuito de ocultar, de dissimular, de auxiliar e de facilitar as operações de transferência de vantagens obtidas pelo Millennium/BCP [pelos elevados dividendos das custas que obtinha pela permanente utilização da CCC - €1.680,20 por mês/€56 por dia] e pelo ex-... e pela ... [pelos montantes que eram realizados sem autorização e com uma cadência de quase €2.500 por dia], com o fim de evitar que o autor (Millennium/BCP) e o participante (ex-... e a ...) dessas infrações fossem criminalmente perseguidos ou submetidos a uma reação criminal, nos extratos bancários, o Millennium/BCP e outros podiam ocultar e substituir os nomes da ... e do ex-... pela terminologia «TRANSF INTERB ORD» (v. Figura 05 supra);

4. o Banco de Portugal não tinha que sancionar o Millennium/BCP nos termos dos Art.ºs 210.º/al. m), e 211.º/1/al. b), m) e p) do RGICSF,

5. o Banco de Portugal e os seus funcionários não tinham que ser pronunciados das infrações penais subjacentes à decisão relativa à reclamação e às diversas insistências apresentadas pelos aqui Recorrentes junto do supervisor bancário contra o Millennium/BCP.

61. Face ao indeferimento do RAI pelo JIC, foi apresentado recurso junto do TRL.

62. E, além de ter sido novamente invocado aquilo que se invocou no RAI, tendo presente que se estava a decidir que «[t]endo sido transferidas ilicitamente verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ..., mediante o uso de cartões de débito [UMA ASSINATURA], não pode tal ser da responsabilidade do Banco», ou seja, tendo em conta que se estava a decidir que uma conta bancária «CONJUNTA» podia ser movimentada por apenas UM dos DOIS ordenantes, foi invocado o Acórdão relativo ao Proc.º 3358-15.3T8LSB.L1-8 da 8.ª Secção do TRL produzido em 10-03-2016 e transitado em julgado em 28-03-2016.

63. E, o Acórdão do Proc.º 3358-15.3T8LSB.L1-8, decidiu:

1. que «O CARÁCTER CONJUNTO OU SOLIDÁRIO DE UMA CONTA BANCÁRIA COM VÁRIOS COTITULARES, DIZ RESPEITO AO REGIME DE MOVIMENTAÇÃO DA CONTA e não a uma obrigação conjunta ou solidária dos cotitulares perante o Banco.»;

2. «Com efeito, A CONTA COM VÁRIOS CO-TITULARES DIZ-SE CONJUNTA quando SÓ PODE SER MOVIMENTADA POR TODOS OS SEUS TITULARES EM SIMULTÂNEO»;

3. «É que NO CASO DE UMA CONTA CONJUNTA, como já dissemos, essa designação TEM A VER COM A POSSIBILIDADE DE MOVIMENTAÇÃO DA CONTA (…) [e] O BANCO NÃO TEM A FACULDADE DE OPTAR POR UM CO-TITULAR DE CONTA SOLIDÁRIA PARA SATISFAZER A OBRIGAÇÃO GLOBAL.».

64. Ou seja, face ao que se decidiu no Acórdão do Proc.º 3358-15.3T8LSB.L1-8, e tendo presente que o Millennium/BCP não apresentou ao DIAP o «CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS entre os DOIS VINCULANTES da conta de DO [Depósito à Ordem]» e os beneficiários dos mais de €1.000.000, nem apresentou o justificativo que o «contrato da conta de depósito á ordem (documento) titulada por Comprojecto, que ateste que a conta bancária em QUESTÃO PASSOU A SER MOVIMENTADA APENAS POR AA [aqui 2.º A. e Titular dos cartões]»,

65. atendendo que é um facto notório e do conhecimento geral que, (i) os cartões bancários têm apenas UMA assinatura, (ii) os cartões bancários associados a uma conta «CONJUNTA» de D.O. para que o Titular dos cartões possa transferir fundos ou efetuar pagamentos, associado àquelas operações tem que existir um contrato de prestação de serviços entre todos os cotitulares da conta «CONJUNTA» e os beneficiários em causa, pois, se assim não fosse, o Titular dos cartões tinha poderes de movimentação, e a conta já não era «CONJUNTA», mas sim, uma conta «solidária» porque bastava «a intervenção de qualquer representante»,

66. se pelas razões e fundamentos supramencionados já não existia nenhum fundamento para se decidir que «não pode tal ser da responsabilidade do Banco se não se provar que tais cartões e o respectivo PIN foram disponibilizados pelo Banco a esse ...», com a invocação do Acórdão do Proc.º 3358-15.3T8LSB.L1-8 também já não existia nenhum fundamento para se decidir que «[t]endo sido transferidas ilicitamente verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ..., mediante o uso de cartões de débito, não pode tal ser da responsabilidade do Banco».

67. Mas, apesar do exposto, em Acórdão do TRL de 12-05-2021 que foi integralmente confirmado pelo acórdão condenatório dos Recorrentes de 30-06-2021 que decidiu que o acórdão recorrido «não padece de qualquer «"irregularidade, ilegalidade, invalidade e/ou a nulidade”», «nem carece de qualquer “correção”», e assim, foi encontrada a forma para também se decidir que «[t]endo sido transferidas ilicitamente verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ..., mediante o uso de cartões de débito, não pode tal ser da responsabilidade do Banco se não se provar que tais cartões e o respectivo PIN foram disponibilizados pelo Banco a esse ....».

68. E tal como o Acórdão do Proc.º 3358-15.3T8LSB.L1-8 do TRL, o Acórdão do STJ da 1.ª Secção relativo ao Proc.º 1561/07.9TBLRA.C1.S1 de 22-02-2021 também decidiu que, «TRATANDO-SE DE DEPÓSITO COLECTIVO CONJUNTO SÓ PODE SER MOVIMENTADO A DÉBITO POR TODOS (OU COM AUTORIZAÇÃO) DE TODOS OS DEPOSITANTES.».

69. Assim, mesmo que a decisão condenatória dos Recorrentes não tivesse levado em consideração que no Proc.º conexo NUIPC n.º 3564/09.0... já se tinha decidido definitivamente que foi o Banco que entregou os cartões os cartões àquele ex-funcionário da aqui 1.ª A., por força de ser um facto notório e do conhecimento geral que o tribunal tem conhecimento em virtude das suas funções, nomeadamente que os cartões têm apenas uma assinatura, e atendendo que não existe nenhum contrato de prestação de serviços entre a aqui 1.ª A. com a ... e/ou com o ex-..., e muito menos para que se movimentassem €2.500 por dia para as contas bancárias daqueles,

70. tendo presente que o Millennium/BCP não apresentou ao DIAP o «CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS entre os DOIS VINCULANTES da conta de DO [Depósito à Ordem]» e os beneficiários dos mais de €1.000.000, nem apresentou o justificativo que o «contrato da conta de depósito á ordem (documento) titulada por Comprojecto, que ateste que a conta bancária em QUESTÃO PASSOU A SER MOVIMENTADA APENAS POR AA»,

71. atendendo ao que se decidiu no Proc.º conexo NUIPC n.º 3564/09.0... e no Proc.ºs 3358-15.3T8LSB.L1-8 do TRL, já não existia mesmo nenhum fundamento para que o acórdão condenatório dos Recorrentes tivesse decidido que «[t]endo sido transferidas ilicitamente verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ..., mediante o uso de cartões de débito, não pode tal ser da responsabilidade do Banco se não se provar que tais cartões e o respectivo PIN foram disponibilizados pelo Banco a esse ...».

72. Por isso, tendo em conta que o acórdão condenatório dos Recorrentes,

1. está a decidir de forma inconciliável com o Proc.º conexo NUIPC n.º 3564/09.0... em que já se decidiu definitivamente que foi o Banco que entregou os cartões ao ex-...,

2. está a decidir de forma inconciliável e com os Proc.ºs 3358-15.3T8LSB.L1-8 do TRL e 1561/07.9TBLRA.C1.S1 do STJ,

3. apesar dos Art.ºs 6.º/2 da Lei 11/2004, 8.º/1/al. c) da Diretiva 2005/60/CE, e 7.º/4 e 9.º/1/al. b) da Lei 25/2008, e do ponto 2.4. da Instrução 26/2005 do Banco de Portugal, determinarem que para as IC poderem realizar transações de montante anormalmente elevado, pouco habituais e sem qualquer objetivo económico ou lícito aparente ou visível, têm que obter a justificação e as informações sobre a finalidade e a natureza pretendida da relação de negócio, o Millennium/BCP e outros podiam não atender a essas obrigações, e, por isso, podiam utilizar ou permitir que se utilizasse o sistema financeiro para se realizarem aquelas operações suspeitas e não autorizadas,

4. está a decidir que para que as operações não autorizadas e suspeitas não fossem descobertas e para se facilitar aqueles movimentos realizados «ILIICITAMENTE», por manipulação fraudulenta do programa e do sistema informático do Banco, com o intuito de ocultar, de dissimular, de auxiliar e de facilitar as operações de transferência de vantagens obtidas pelo Millennium/BCP [pelos elevados dividendos das custas que obtinha pela permanente utilização da CCC - €1.680,20 por mês/€56 por dia] e pelo ex-... e pela ... [pelos montantes que eram realizados sem autorização e com uma cadência de quase €2.500 por dia], com o fim de evitar que o autor (Millennium/BCP) e o participante (ex-... e a ...) dessas infrações fossem criminalmente perseguidos ou submetidos a uma reação criminal, nos extratos bancários, o Millennium/BCP e outros podiam ocultar e substituir os nomes da ... e do ex-... pela terminologia «TRANSF INTERB ORD»,

73. o Tribunal tem que admitir que existe fundamento para se admitir a revisão nos termos do Art.º 449.º/1/al.s c) e d) do CPP.

74. E, por isso, por se estar perante clamorosos e intoleráveis erros judiciários e de flagrante injustiça, pelo facto de se ESTAR A CONDENAR OS RECORRENTES por o Millennium/BCP e outros,

1. terem entregue os cartões que intermediaram a fraude ao ex-...,

2. terem realizado mais de €1.000.000 em operações não autorizadas pelos DOIS ordenantes da conta D.O.,

3. terem realizado mais de €1.000.000 a débito e a crédito na CCC em operações não autorizadas pelos DOIS ordenantes, e, para sustentar aqueles movimentos, aqueles, prestaram falsas declarações no Proc.º conexo 241/10.2... e ao DIAP 9 quando invocaram que a gerência da aqui 1.ª A. atribuiu ao ex-..., «os máximos poderes de movimentação, autorizando assim, formalmente o acesso deste a todas as contas, bem como a poder movimentá-las livremente»,

4. terem realizado transferências de montante anormalmente elevado, pouco habituais e sem qualquer objetivo económico ou lícito aparente ou visível, e, sem que nos termos dos Art.ºs 6.º/2 da Lei 11/2004, 8.º/1/al. c) da Diretiva 2005/60/CE, e 7.º/4 e 9.º/1/al. b) da Lei 25/2008, e no ponto 2.4. da Instrução 26/2005 do Banco de Portugal, tivesse obtido a justificação e as informações sobre a finalidade e a natureza pretendida da relação de negócio,

5. para que as operações não autorizadas e suspeitas não fossem descobertas e para se facilitar aqueles movimentos realizados «ILIICITAMENTE», por manipulação fraudulenta do programa e do sistema informático do Banco, com o intuito de ocultar, de dissimular, de auxiliar e de facilitar as operações de transferência de vantagens obtidas pelo Millennium/BCP [pelos elevados dividendos das custas que obtinha pela permanente utilização da CCC - €1.680,20 por mês/€56 por dia] e pelo ex-... e pela ... [pelos montantes que eram realizados sem autorização e com uma cadência de quase €2.500 por dia], com o fim de evitar que o autor (Millennium/BCP) e o participante (ex-... e a ...) dessas infrações fossem criminalmente perseguidos ou submetidos a uma reação criminal, nos extratos bancários, o Millennium/BCP e outros podiam ocultar e substituir os nomes da ... e do ex-... pela terminologia «TRANSF INTERB ORD»,

6. cometido as demais supramencionadas infrações penais invocadas no subcapítulo «a. Do Millennium/BCP e outros» do Capítulo «VII- Das infrações penais»,

75. tendo em conta que o Millennium/BCP e outros realizaram mais de €1.000.000 sem estarem autorizados pelos DOIS ordenantes, e consequentemente, realizaram aquelas operações em abuso de confiança, depois de nos termos do Art.º 453.º/1 do CPP se proceder às diligências indispensáveis para a descoberta da verdade conforme se requereu no subcapítulo «I. Das diligências de prova indispensáveis para a descoberta da verdade no âmbito do Art.º 453.º/1 do CPP» do Capítulo «IV- Do Art.º 449.º/al. d) do CPP», e se requer infra nos pontos 82 e 84 destas Conclusões, e depois de remetido o processo para o STJ com a informação de mérito, o STJ:

1. deverá pronunciar o Millennium/BCP e outros daquelas infrações do foro penal;

2. se o Banco de Portugal não sancionar o Millennium/BCP nos termos dos Art.ºs 210.º/al. m), e 211.º/al.s b), m) e p) do RGICSF, também deve ser pronunciado das infrações penais invocadas no subcapítulo «b. Do BdP e dos seus funcionários » do Capítulo «VII- Das infrações penais»;

3. deve atribuir imediata razão aos Recorrentes, devendo decidir que o Millennium/BCP e outros creditem os montantes em causa acrescidos dos juros e das demais indemnizações nos termos do Art.º 71.º (Responsabilidade do prestador do serviço de pagamento por operações de pagamento não autorizadas) do DL 317/2009.

76. E, sublinhe-se, relativamente à aplicabilidade do DL 317/2009, o Acórdão do STJ de 18-12-2016 relativo ao Proc.º 6479/09.8..., decidiu: «VI. A esse mesmo resultado se chega com a aplicação do DL 317/2009, de 30 de Outubro, que transpôs para a nossa ordem jurídica o novo enquadramento comunitário em matéria de serviços de pagamentos, maxime a Directiva 2007/64/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 13 de Novembro, o qual, não obstante seja posterior aos factos em causa nesta acção, a eles é aplicável, ex vi do seu artigo 101º, nº1 no qual se predispõe que «O regime constante do presente diploma regime jurídico não prejudica a validade dos contratos em vigor relativos aos serviços de pagamento nele regulados, sendo-lhes desde logo aplicáveis as disposições do presente regime jurídico que se mostrem mais favoráveis aos utilizadores de serviços de pagamentos.».».

77. O acórdão condenatório dos Recorrentes, além de não ter levado em consideração nenhum dos elementos de prova obtidos pela a Mmª Procuradora natural ao Millennium/BCP a fls 2462 e 2463 dos autos (v. Anexo 08), não levou em consideração as confissões do Banco ao DIAP, nem atendeu que o Millennium/BCP não apresentou a maioria dos documentos e informações ali requeridos, e que, se tivessem sido apresentados, então, existia fundamento para absolver o Millennium/BCP e outros.

78. Por outro lado, o acórdão condenatório do Recorrentes também não levou em consideração:

1. que no Proc.º conexo NUIPC n.º 3564/09.0... o ex-... foi absolvido do crime de abusos de confiança porque se deu como provado que foi o Banco que entregou os cartões ao ex-...;

2. que no Proc.º 3358-15.3T8LSB.L1-8 do TRL se decidiu que as contas «CONJUNTAS» só permitem movimentos de capitais ou transferências de fundos com a assinatura de todos os seus cotitulares;

3. que os cartões bancários têm apenas uma assinatura, e que, quando aqueles instrumentos de pagamentos eletrónicos estão associados a uma conta D.O. «CONJUNTA» apenas podem realizar transferências de fundos se aos movimentos em causa existir associado um contrato de prestação de serviços entre todos os cotitulares da conta e os beneficiários em causa;

4. que o Millennium/BCP não apresentou os contratos e as cláusulas contratuais dos sete cartões novos/iniciais que foram emitidos, apresentando um daqueles contratos, mas que não pertence a nenhum cartão emitido;

5. que no Proc.º conexo 241/10.2... e ao DIAP 10, o Millennium/BCP e outros prestaram falsas declarações quando invocaram que a gerência da aqui 1.ª A. atribuiu ao ex-..., «os máximos poderes de movimentação, autorizando assim, formalmente o acesso deste a todas as contas, bem como a poder movimentá-las livremente» 11 ;

6. que o Millennium/BCP confessou ao DIAP que a primeira transferência de €2.000 realizada para a conta da ... não foi realizada com nenhum cartão, e, não existe nenhum documento assinado pelos dois ordenantes que justificasse a razão daquela operação;

7. que, no Proc.º conexo 241/10.2..., o Millennium/BCP e outros prestaram falsas declarações quando invocaram que «todas as quantias que os AA. alegam terem sido desviadas sem a sua autorização pelo EE foram movimentadas por intermédio de cartões de débito»;

8. que as transferências em causa eram de montante anormalmente elevado, pouco habituais e sem objetivo económico ou lícito aparente ou visível, e, quando isso sucede, nos termos dos Art.ºs 6.º/2 da Lei 11/2004, 8.º/1/al. c) da Diretiva 2005/60/CE, e 7.º/4 e 9.º/1/al. b) da Lei 25/2008, e do ponto 2.4. da Instrução 26/2005 do Banco de Portugal, para as IC poderem permitir esse tipo de transferências de fundos, têm que obter dos depositantes a justificação e as informações sobre a finalidade e sobre a natureza da relação de negócio, e isso não aconteceu;

9. as confissões do Millennium/BCP ao DIAP, nomeadamente em relação à forma como as contas bancárias D.O. e CCC podiam ser movimentadas;

10. que inexistem mais de €1.000.000 de movimentos a débito e a crédito na CCC assinados pelos dois vinculantes;

11. que o Millennium/BCP confessou ao DIAP que ex-... nunca teve poderes de movimentação;

12. que nos extratos bancários juntos aos autos deste processo pelo Millennium/BCP, por manipulação fraudulenta do programa e do sistema informático do Banco, com o intuito de ocultar, de dissimular, de auxiliar e de facilitar as operações de transferência de vantagens obtidas pelo Millennium/BCP [pelos elevados dividendos das custas que obtinha pela permanente utilização da CCC - €1.680,20 por mês/€56 por dia] e pelo ex-... e pela ... [pelos montantes que eram realizados sem autorização e com uma cadência de quase €2.500 por dia], com o fim de evitar que o autor (Millennium/BCP) e o participante (ex-... e a ...) dessas infrações fossem criminalmente perseguidos ou submetidos a uma reação criminal, e, para que aquelas transferências de fundos suspeitas e não autorizadas não fossem descobertas, em lugar de colocar o nome da ... (DD) e do ex-... (EE), o Millennium/BCP e outros substituíram os nomes daqueles beneficiários pela terminologia “TRANSF INTERB ORD”.

79. E, se o acórdão condenatório dos Recorrentes tivesse levado em consideração os supramencionados factos e meios de prova, e se o Millennium/BCP tivesse apresentado as provas e as informações requeridas pela Mmª Procuradora natural a fls 2462 e 2462 dos autos, então, existia fundamento para se decidir que «[t]endo sido transferidas ilicitamente verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ..., mediante o uso de cartões de débito, não pode tal ser da responsabilidade do Banco se não se provar que tais cartões e o respectivo PIN foram disponibilizados pelo Banco a esse ...».

80. E assim, foi encontrada a forma para que o Millennium/BCP e outros não tivessem sido condenados de abuso de confiança e de conluio com o ex-..., assim como foi encontrada a forma para que aqueles não tivessem sido pronunciados das demais infrações penais invocadas no subcapítulo «a. Do Millennium/BCP e outros» do Capítulo «VII- Das infrações penais».

81. Por conseguinte, pode-se concluir que o acórdão condenatório dos Recorrentes cometeu clamorosos e intoleráveis erros judiciários e de flagrante injustiça, que, é motivo e fundamento para ser admitida a revisão, e para ser atribuída razão aos Recorrentes.

82. Assim, para se obter uma decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo, tendo presente que o Art.º 453.º/1 do CPP determina que o juiz procede às diligências que considerar indispensáveis para a descoberta da verdade, mandando documentar, por redução a escrito ou por qualquer meio de reprodução integral, as declarações prestadas, o Tribunal deve requerer ao Millennium/BCP e outros:

1. que apresentem o «CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS entre os DOIS VINCULANTES da conta de DO [Depósito à Ordem]» e os beneficiários dos mais de €1.000.000, conforme requereu a Mmª Procuradora natural fls 2463 dos autos (v. Anexo 08);

2. que, se não apresentarem o contrato de prestação de serviços entre a aqui 1.ª A. e a ... e/ou com o ex-..., o Millennium/BCP e outros devem informar e justificar que se a aqui 1.º A. pretendesse realizar as transferências de fundos em causa com uma cadência de €2.500 por dia para contas bancárias tituladas por aqueles beneficiários, o Millennium/BCP e outros podia permitir que isso acontecesse;

3. «[q]ue apresente contrato da conta de depósito á ordem (documento) titulada por Comprojecto, que ateste que a conta bancária em QUESTÃO PASSOU A SER MOVIMENTADA APENAS POR AA [aqui 2.º A. e Titular dos cartões]», conforme requereu a Mmª Procuradora natural a fls 2463;

4. «que apresente o registo informático/notação técnica ou o documento que ateste quem foi o funcionário que permitiu que o cofre/contrato de DO passasse a poder ser aberto/movimentado apenas com uma das chaves, designadamente com recurso a cartões cujo titular era AA», conforme requereu a Mmª Procuradora natural a fls 2463;

5. que apresentem o «documento que justifique que o cofre podia ter sido aberto através do cartão», conforme o DIAP requereu a fls 2463;

6. que a prova que «sócio-gerente [AA aqui 2.º A. e Titular dos cartões] da Comprojecto [era o] representante legal da mesma [empresa]», conforme a IC transmitiu ao Banco de Portugal, e conforme se atesta na pág. 254 do processo do Banco de Portugal, apresentado no Documento 14 com a queixa que resultou no Proc.º NUIPC 695/15.0...;

7. tendo em conta que o Millennium/BCP confessou ao DIAP que a transferência de €2.000 realizada em 13-09-2005 não foi intermediada com nenhum cartão, então, relativamente àquela transferência, o Millennium/BCP e outros devem apresentar o «documento que ateste que o cofre/contrato de conta DO, foi aberto com as duas chaves, ou seja, AA e FF ou BB e CC», conforme requereu a Mmª Procuradora natural a fls 2462 dos autos (Anexo 08);

8. que apresentem os contratos e as cláusulas contratuais dos sete cartões novos/iniciais que foram emitidos, conforme requereu a Mmª Procuradora natural a fls 2462;

9. que apresentem e que «informem se existe algum documento que permite/autorize as alegadas transferências bancárias para a conta da DD [e para o EE] (quer pelos vinculativos da conta ou por qualquer outra pessoa)», conforme requereu a Mmª Procuradora natural a fls 2463;

10. que apresentem o «documento que ateste que os dois vinculantes das contas tributadas pela Comprojecto pediram que se transferissem capitais para DD com uma cadência de 2.500€ por dia» assim como para o ex-..., conforme requereu a Mmª Procuradora natural a fls 2463;

11. que «informem se foi averiguado o motivo dos diversos movimentos para a conta de DD [e para o ex-...];», conforme requereu a Mmª Procuradora natural a fls 2463;

12. que informem «se as alegadas operações/transferências não levantaram suspeitas», conforme requereu a Mmª Procuradora natural a fls 2463;

13. que informem «se tais operações foram comunicadas a alguma entidade e, na afirmativa, a qual», conforme requereu a Mmª Procuradora natural a fls 2463;

14. que «informem se existe algum documento que permite/autorize as alegadas transferências bancárias para a conta da DD [e para o EE] (quer pelos vinculativos da conta ou por qualquer outra pessoa);», conforme requereu a Mmª Procuradora natural a fls 2463;

15. que, tendo presente o que se dispõe nos Art.ºs 6.º da Lei 11/2004, 8.º/1/al. b), primeira parte, da Diretiva 2005/60/CE, e 7.º/4 e 13.º/1/al. b) da Lei 25/2008, e no ponto 2.2. da Instrução 26/2005 do Banco de Portugal, informem porque é que nos extratos bancários todas as 508 transferências de fundos intermediadas com cartões para as contas bancárias tituladas pela ... e/ou para contas bancárias tituladas pelo ex-... os nomes daqueles beneficiários foram substituídos pela terminologia “TRANSF INTERB ORD”;

16. que, tendo presente o que se se determinou nos Art.ºs 6.º da Lei 11/2004, 8.º/1/al. c) e 9.º/5 da Diretiva 2005/60/CE, e 13.º/1 da Lei 25/2008, e no ponto 2.3. da Instrução 26/2005 do Banco de Portugal, e atendendo que também para se impedir a utilização do sistema financeiro para se realizarem transações de montante anormalmente elevado, pouco habituais e sem qualquer objetivo económico ou lícito aparente ou visível, o Art.º 54.º/2, primeiro parágrafo, da Diretiva 2007/64/CE determinou que «[o] consentimento para executar uma operação de pagamento ou um conjunto de operações de pagamento deve ser dado na forma acordada entre o ordenante e o respectivo prestador do serviço de pagamento», o Millennium/BCP e outros, devem informar se tivesse sido a aqui 1.º A. a pretender realizar as transferências de fundos em causa com uma cadência de €2.500 por dia para contas bancárias tituladas pela ... e/ou para o ex-... em que não existe nenhum contrato de prestação de serviços ou relação de negócio para se realizarem aquelas operações, sem obter dos depositantes a justificação e as informações sobre a finalidade e sobre a natureza da relação de negócio, o Millennium/BCP e outros podiam permitir que isso acontecesse.

83. E, tendo presente que não existem justificativos de movimentos a débito e a crédito no montante de €1.000.000 na CCC, também para a descoberta da verdade, e nos termos do Art.º 453.º/1 do CPP, a fls 2463 dos autos, a Mmª Procuradora natural do DIAP requereu que o Millennium/BCP apresentasse «todos os documentos justificativos a débito e crédito dos movimentos realizados entre 01.10.2005 e 14.06.2009; informação acerca dos funcionários que viabilizaram tais operações; que apresente contrato da CCC em que se ateste que esta conta passou a poder movimentar capitais a debito e a crédito sem qualquer autorização de nenhum dos vinculantes».

84. Para se atestar que esta fraude foi ou não meticulosamente organizada pelo Millennium/BCP e outros e pelo ex-..., e para que o Millennium/BCP e outros não serem acusados dos crimes de abuso de confiança e de conluio com o ex-..., o Tribunal deve requerer que o Millennium/BCP e outros apresentem:

1. aqueles documentos da CCC subscritos pelos DOIS ordenantes;

2. o contrato da CCC em que se ateste que aquela conta podia «movimentar capitais a debito e a crédito sem qualquer autorização de nenhum dos vinculantes»;

3. a informação ali requerida.

85. Sem prejuízo das operações em causa não terem sido autorizadas pelos DOIS ordenantes e de serem de montante anormalmente elevado, pouco habituais e sem qualquer objetivo económico ou lícito aparente ou visível, atendendo à aferição do grau de suspeição evidenciado pelo facto das transferências de fundos em causa se operarem com uma cadência de quase €2.500 por dia para contas bancárias tituladas por uma ... e/ou pelo ex-..., tendo presente o critério-padrão utilizável por um "homem médio" na análise de idêntica situação e que se está perante infrações económico-financeiras cometidas de forma [meticulosamente] organizada, com recurso à tecnologia informática, tem que se concluir que aquelas operações eram altamente suspeitas e suscetíveis de configurar na prática do crime de branqueamento por se estar a utilizar o sistema financeiro para se suprimirem receitas dos orçamentos do Estado por motivos fiscais.

86. Mesmo assim, o acórdão condenatório dos Recorrentes decidiu que «[t]endo sido transferidas ilicitamente verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ..., mediante o uso de cartões de débito, não pode tal ser da responsabilidade do Banco se não se provar que tais cartões e o respectivo PIN foram disponibilizados pelo Banco a esse ...».

87. E, com esta decisão, está-se a legitimar a instituição de crédito a utilizar o sistema financeiro para, com uma cadência de quase €2.500 por dia, realizar transferências de fundos entre uma empresa de construção e uma ... e/ou para o ex-... da aqui 1.ª A., e, sem que se tivesse obtido dos depositantes a informação sobre a finalidade e sobre a natureza pretendida da relação de negócio, nem a justificação daquelas transferências de fundos, conforme se determinou nos Art.ºs 6.º/2 da Lei 11/2004, e 8.º/1/al. c) da Diretiva 2005/60/CE.

88. Ou seja, por outras palavras, o acórdão condenatório dos Recorrentes está a legitimar que o Millennium/BCP e outros a utilizar o sistema financeiro para realizar operações de montante anormalmente elevado, bem como pouco habituais sem objetivo económico ou lícito aparente ou visível (20.º da Diretiva 2005/60/CE).

89. Por outro lado, o acórdão condenatório está a decidir que por manipulação fraudulenta do programa e do sistema informático do Banco, com o intuito de ocultar, de dissimular, de auxiliar e de facilitar as operações de transferência de vantagens obtidas pelo Millennium/BCP [pelos elevados dividendos das custas que obtinha pela permanente utilização da CCC - €1.680,20 por mês/€56 por dia] e pelo ex-... e pela ... [pelos montantes que eram realizados sem autorização e com uma cadência de quase €2.500 por dia], com o fim de evitar que o autor (Millennium/BCP) e o participante (ex-... e a ...) dessas infrações fossem criminalmente perseguidos ou submetidos a uma reação criminal, e, por isso, e para que aquelas transferências de fundos suspeitas e não autorizadas não fossem descobertas, em lugar de colocar de nos extratos bancários se colocar o nome da ... (DD) e do ex-... (EE), naqueles documentos, o Millennium/BCP e outros podiam substituir os nomes daqueles beneficiários pela terminologia “TRANSF INTERB ORD”.

90. Por isso, o acórdão condenatório dos Recorrentes, além de estar a legitimar o Millennium/BCP e outros a violar o Art.º 368.º-A (Branqueamento)/1 (que inclui o Art.º 1.º/al. d) a Lei 36/96) e 2 do Código Penal, está a legitimar aqueles a infringir o Art.º 1.º/1e 2/al.s a) e d) da Diretiva 2005/60/CE, que estabelece:

«1. Os Estados-Membros devem ASSEGURAR a PROIBIÇÃO do branqueamento de capitais (…).

2. Para os efeitos da presente directiva, entende-se por branqueamento de capitais os comportamentos a seguir descritos, quando adoptados intencionalmente:

a) A conversão ou transferência de bens, com conhecimento de que esses bens provêm de uma actividade criminosa ou da participação numa actividade dessa natureza, com o fim de encobrir ou dissimular a sua origem ilícita ou de auxiliar quaisquer pessoas implicadas nessa actividade a furtarem-se às consequências jurídicas dos seus actos;

(…)

d) A participação num dos actos referidos nas alíneas anteriores, a associação para praticar o referido acto, as tentativas de o perpetrar, o facto de ajudar, incitar ou aconselhar alguém a praticá-lo ou o facto de facilitar a sua execução.».

91. E assim, o acórdão condenatório dos Recorrentes, além de estar a legitimar que o Millennium/BCP e outros a infringir o Art.º 368.º-A (Branqueamento)/1 (que inclui o Art.º 1.º/al. d) a Lei 36/96) e 2 do Código Penal, está a legitimar aqueles a violarem os Art.ºs 1.º/1 e 2/al.s a) e d), 9.º/5 e 24.º/1 da Diretiva 2005/60/CE, que, quando estão em causa operações de montante anormalmente elevado, bem como pouco habituais sem objetivo económico ou lícito aparente ou visível (20.º da Diretiva 2005/60/CE), se as IC não obtiverem as informações sobre a finalidade e a natureza pretendida das relações de negócio (8.º/1/al. c) da Diretiva 2005/60/CE), para se evitar as fraudes e a evasão fiscal através do sistema financeiro, por força do que se dispõe naqueles Art.ºs 9.º/5 e 24.º/1 da Diretiva 2005/60/CE, IMPEDEM QUE AS INSTITUIÇÕES DE CRÉDITO REALIZEM MAIS QUALQUER OPERAÇÃO.

92. E, por outro lado, o acórdão condenatório dos Recorrentes está a legitimar o Millennium/BCP e outros a infringir o Art.º 54.º (Consentimento e retirada de consentimento)/1 e 2 da Diretiva 2007/64/CE, que, para se evitar as fraudes e a utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamentos de capitais, se determina:

«1. OS ESTADOS-MEMBROS ASSEGURAM que uma operação de pagamento apenas seja considerada autorizada se o ordenante tiver dado o seu consentimento à execução da respectiva operação de pagamento. (…).

2. O CONSENTIMENTO PARA EXECUTAR uma operação de pagamento ou UM CONJUNTO DE OPERAÇÕES DE PAGAMENTO DEVE SER DADO NA FORMA ACORDADA ENTRE O ORDENANTE E O RESPECTIVO PRESTADOR DO SERVIÇO DE PAGAMENTO.

NA FALTA DESSE CONSENTIMENTO, CONSIDERA-SE QUE A OPERAÇÃO DE PAGAMENTO NÃO FOI AUTORIZADA.».

93. Por conseguinte, o acórdão condenatório dos Recorrentes, está a encontrar a forma para:

1. SEM A AUTORIZAÇÃO dos DOIS ordenantes, terem sido «TRANSFERIDAS ILICITAMENTE verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ... (…) não pode tal ser da responsabilidade do Banco»;

2. legitimar o Millennium/BCP e outros a utilizar o sistema financeiro, para, através de operações NÃO AUTORIZADAS e suspeitas, realizarem transações de montante anormalmente elevado, pouco habituais e sem qualquer objetivo económico ou lícito aparente ou visível.

94. Ou, por outras palavras, ao se decidir que foram «TENDO SIDO TRANSFERIDAS ILICITAMENTE verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ... (…) NÃO PODE TAL SER DA RESPONSABILIDADE DO BANCO», o acórdão condenatório dos Recorrentes está a decidir que o Millennium/BCP pode, (i) realizar operações NÃO AUTORIZADAS e suspeitas, (ii) utilizar ou permitir que se utilize o sistema financeiro para se suprimir receitas dos orçamentos do Estado por fraude fiscal, (iii) operar em concorrência desleal com as empresas do setor, que, sublinhe-se, não podem infringir os regimes relativos à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais, nem o relativo ao aos serviços de pagamento no mercado interno.

95. E, esta decisão e as respetivas infrações tiveram efeito de nexo de causalidade direto:

1. na fraude, porque, se o Banco tivesse cumprido o que se dispõe nos supramencionados dispositivos12, incluindo os Art.ºs 54.º/1/2 e 4 da Diretiva 2007/64/CE, 1.º/2/al.s a) e d), 7.º, 8.º/1/al.s b) e c), 9.º/5 e 24.º/2 da Diretiva 2007/64/CE, os mais de €1.000.000 não tinham sido roubados;

2. na supressão de receitas do Estado por evasão fiscal através do sistema financeiro.

96. Mas, o facto de se estar a decidir que «TENDO SIDO TRANSFERIDAS ILICITAMENTE verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ... (…) NÃO PODE TAL SER DA RESPONSABILIDADE DO BANCO», além de ser inconciliável com o que se decidiu nos supramencionados Acórdãos relativos aos Proc.ºs 3358-15.3T8LSB.L1-8 de 10-03-2016 do TRL, e 1561/07.9TBLRA.C1.S1 de 22-02-2021 do STJ, é inconciliável com o que se decidiu a título prejudicial nos Proc.ºs C-212/11 e C-235/14 do TJUE (v. Anexos 10, 11, 12 e 13).

97. E, resumidamente, os Proc.ºs C-212/11 e C-235/14 do TJUE decidiram que as instituições de crédito não podem operar em concorrência desleal para com as empresas do setor.

98. Ou seja, apesar do Art.º 56.º do TFUE estabelecer que «as restrições à livre prestação de serviços na União serão proibidas»:

1. «O Tribunal de Justiça [TJUE] já admitiu, de resto, que o combate ao branqueamento de capitais, que está ligado ao objetivo de proteção da ordem pública, constitui um objetivo legítimo, suscetível de justificar um entrave à livre prestação de serviços (v., neste sentido, acórdão de 30 de junho de 2011, Zeturf, C‑212/08, Colet., p. I‑5633, n.os 45 e 46).»;

2. «A este respeito, há que recordar, em primeiro lugar, que o combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo constituem um objetivo legítimo, suscetível de justificar um entrave à livre prestação de serviços (acórdão Jyske Bank Gibraltar, C‑212/11, EU:C:2013:270, n.os 62 a 64, 85 e jurisprudência referida).».

99. Assim, os Proc.ºs C-212/11 e C-235/14 do TJUE decidiram que as Instituições de Crédito não podem infringir os regimes relativos à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais, e, por isso, decidiram:

1. «A Diretiva 2005/60 revogou a Diretiva 91/308/CEE tem por objetivo prevenir a utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais (…), EXIGINDO AOS ESTADOS‑MEMBROS QUE, por um lado, PROÍBAM O BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS (…) e, por outro, IMPONHAM ÀS INSTITUIÇÕES DE CRÉDITO, designadamente, OBRIGAÇÕES DE VIGILÂNCIA DA CLIENTELA E DE COMUNICAÇÃO DA REALIZAÇÃO DE TRANSAÇÕES SUSPEITAS. ESTAS MEDIDAS CONSTITUEM REQUISITOS MÍNIMOS, COMUNS A TODOS OS ESTADOS‑MEMBROS»;

2. «O Tribunal de Justiça [da União Europeia] JÁ RECONHECEU QUE A PREVENÇÃO E O COMBATE AO BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS e ao financiamento do terrorismo são objetivos legítimos que DIZEM RESPEITO À PROTEÇÃO DA ORDEM PÚBLICA e SÃO SUSCETÍVEIS DE JUSTIFICAR UM ENTRAVE À LIVRE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS (52) [“52 - Acórdão Jyske Bank Gibraltar (C-212/11, EU:C:2013:270, n.ºs 62 a 64 e 85 e jurisprudência referida).”].» E DE CAPITAIS;

3. «Em todo o caso, OS ESTADOS-MEMBROS TÊM DE GARANTIR que AS MEDIDAS REFORÇADAS DE VIGILÂNCIA DA CLIENTELA APLICADAS TÊM POR BASE A AVALIAÇÃO DA EXISTÊNCIA E DO NÍVEL DE RISCO DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS (…)»;

4. «OS DEVERES DE VIGILÂNCIA da clientela e de informação que incumbem às instituições de crédito (…) constituem um conjunto de medidas PREVENTIVAS E DISSUASIVAS PARA COMBATER COM EFICÁCIA O BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS e o financiamento do terrorismo e para ASSEGURAR A SOLIDEZ E A INTEGRIDADE DO SISTEMA FINANCEIRO»;

5. «(…) importa salientar que, ao fazê‑lo, O ESTADO‑MEMBRO EM CAUSA DEVE, no entanto, EXERCER ESSA COMPETÊNCIA NO RESPEITO DO DIREITO DA UNIÃO, nomeadamente, das liberdades fundamentais garantidas pelos Tratados (v., por analogia, acórdão Jyske Bank Gibraltar, C‑212/11, EU:C:2013:270, n.º 49)» (cf. C-235/14, nº 96);».

100. Ou seja, resumidamente, aqueles processos do TJUE decidiram que, por respeito à proteção da ordem pública e para assegurar a solidez e a integridade do sistema financeiro, as Instituições de Crédito NÃO PODEM UTILIZAR OU PERMITIR QUE SE UTILIZE o sistema financeiro para se realizar transações de montante anormalmente elevado, pouco habituais sem objetivo económico ou lícito aparente ou visível (20.º da Diretiva 2005/60/CE), ou, por outras palavras, decidiram que as Instituições de Crédito NÃO PODEM UTILIZAR OU PERMITIR QUE SE UTILIZE o sistema financeiro para se suprimir receitas dos orçamentos dos Estados-Membros e da União Europeia.

101. Consequentemente, ao se decidir que «TENDO SIDO TRANSFERIDAS ILICITAMENTE verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ..., mediante o uso de cartões de débito, NÃO PODE SER POR TAL RESPONSABILIZADO O BANCO», está-se a decidir de forma inconciliável com uma sentença vinculativa do Estado Português, proferida por uma instância internacional» (cf. Art.º 449.º/1/al. g) do CPP), nomeadamente naquilo que se decidiu nos Proc.ºs C-212/11 e C-235/14 do TJUE.

102. E consequentemente, por força do que se decidiu nos Proc.ºs C-212/11 e C-235/14 do TJUE, sem que se tivessem colocado questões prejudiciais ao TJUE no âmbito do que se dispõe no Art.º 267.º do TFUE, não existia fundamento para que o acórdão condenatório dos Recorrentes tenha decidido que «TENDO SIDO TRANSFERIDAS ILICITAMENTE verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ..., mediante o uso de cartões de débito, NÃO PODE SER POR TAL RESPONSABILIZADO O BANCO».

103. Nestes termos, sem prejuízo do que se estabelece no Art.º 8.º/4 da CRP, se o STJ também entender decidir que «TENDO SIDO TRANSFERIDAS ILICITAMENTE verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ..., mediante o uso de cartões de débito, NÃO PODE SER POR TAL RESPONSABILIZADO O BANCO», tendo presente que subjacente àquela decisão estão em causa circunstâncias estatuídas, (i) no direito primário da União Europeia, nomeadamente o que se dispõe no Art.º 56.º do TFUE, (ii) no direito derivado da União Europeia, nomeadamente o que se dispõe nos Art.ºs 1.º/1 e 2/al.s a) e d), 7.º, 8.º/al.s b) e c), 9.º/5, 20.º, 22.º/1/al. a), e 24.º da Diretiva 2005/60/CE, 54.º/1/2 e 4, 59.º e 60.º da Diretiva 2007/64/CE, 65.º/1/2/3 e 6, 70.º e 71.º do DL 317/2009, e nas decisões relativas aos Proc.ºs C-212/11 e C-235/14 do TJUE,

104. ao abrigo do Art.º 267.º/al. b), terceiro parágrafo, do TFUE, o STJ deve colocar as questões prejudiciais ao TJUE mencionadas no Capítulo «VI- Das questões prejudiciais a colocar ao TJUE», e que, para os devidos efeitos e por uma questão de economia processual, se dão aqui por integralmente reproduzidas.

105. Tendo presente o que se decidiu nos Proc.ºs C-212/11 e C-235/14 do TJUE, assim como pelo que se estabelece no supramencionado direito primário e derivado da União Europeia, pode-se concluir que no acórdão condenatório dos Recorrentes:

1. não se está apenas perante graves dúvidas sobre a justiça da condenação dos Recorrentes, mas sim, perante clamorosos e intoleráveis erros judiciários e de flagrante injustiça;

2. está-se a encontrar a forma para o Millennium/BCP e outros não serem condenados por abuso de confiança, de conluio com o ex-..., e do crime de branqueamento de capitais, assim como das demais infrações penais supramencionadas no subcapítulo «A. Do Millennium/BCP e outros» do Capítulo «VII- Das infrações penais».

106. Face ao exposto, e tendo em conta que o Acórdão do TRL de 30-06-2021 do Proc.º NUIPC 695/15.0TELSB.L1 transmitiu e decidiu que, «TUDO SE PONDEROU, TUDO SE ANALISOU, TUDO PESOU, QUER NO QUE TANGE À MATÉRIA DE FACTO, quer ao Direito aplicável, nas várias perspetivas que conformavam o objeto do presente recurso e, nele se decidiu fundamentadamente, nos termos que se mostram plasmados no referido aresto.», pode-se concluir que o acórdão condenatório dos Recorrentes decidiu que:

1. numa conta bancária D.O. «CONJUNTA» em que se determinou que apenas se podiam movimentar capitais com DUAS ASSINATURAS e EM SIMULTÂNEO, o Millennium/BCP e outros têm a faculdade de optar por movimentar capitais com apenas UMA das DUAS assinaturas dos DOIS representantes/DOIS cotitulares da conta Depósito à Ordem «CONJUNTA» para satisfazer a obrigação global, e, se isso acontecer, «NÃO PODE SER POR TAL RESPONSABILIZADO O BANCO»;

2. para que as operações não autorizadas e suspeitas não fossem descobertas e para se facilitar aqueles movimentos realizados «ILIICITAMENTE», por manipulação fraudulenta do programa e do sistema informático do Banco, com o intuito de ocultar, de dissimular, de auxiliar e de facilitar as operações de transferência de vantagens obtidas pelo Millennium/BCP [pelos elevados dividendos das custas que obtinha pela permanente utilização da CCC - €1.680,20 por mês/€56 por dia] e pelo ex-... e pela ... [pelos montantes que eram realizados sem autorização e com uma cadência de quase €2.500 por dia], com o fim de evitar que o autor (Millennium/BCP) e o participante (ex-... e a ...) dessas infrações fossem criminalmente perseguidos ou submetidos a uma reação criminal, nos extratos bancários, o Millennium/BCP e outros podiam ocultar e substituir os nomes da ... e do ex-... pela terminologia «TRANSF INTERB ORD»;

3. o Millennium/BCP pode utilizar ou permitir que se utilize o sistema financeiro para realizar transações pouco habituais sem qualquer objetivo económico ou lícito aparente ou visível, ou seja, está a decidir que Millennium/BCP pode realizar operações para se suprimirem receitas dos orçamentos do Estado por motivos fiscais, e, se isso acontecer, «NÃO PODE SER POR TAL RESPONSABILIZADO O BANCO».

107. Mas, salvo melhor opinião e com o devido respeito, subjacente à decisão condenatória dos Recorrentes estão clamorosos e intoleráveis erros judiciário e de flagrante injustiça.

108. Face ao exposto, requer-se que, (i) o Millennium/BCP e outros, assim como o Banco de Portugal e seus funcionários, respondam ao que se invoca no subcapítulo «I. Das diligências de prova indispensáveis para a descoberta da verdade no âmbito do Art.º 453.º/1 do CPP» do Capítulo «IV- Do Art.º 449.º/al. d) do CPP», (ii) o Millennium/BCP e outros também respondam ao que se invocou nos pontos 82 e 84 destas Conclusões.

109. E, se isso não acontecer, para a descoberta da verdade e para e obter uma decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo, nos termos do Art.º 453.º/1 do CPP é indispensável que o Tribunal intime aqueles a responderem ao que ali é solicitado e pedido.

110. Face ao exposto, se o Millennium/BCP e outros não responderem ao que ali é solicitado, devem serem pronunciados dos crimes invocados no subcapítulo «A. Do Millennium/BCP e outros» do Capítulo «VII- Das infrações penais» e que se dão aqui por integralmente reproduzidos.

111. E, se o Banco de Portugal e os seus funcionários que se pronunciaram sobre a queixa e sobre as diversas insistências, insistirem em decidir que,

(i) «analisada a reclamação em apreço, não foi possível concluir que o BCP tenha violado algumas das normas pelas quais este Banco esteja incumbido de zelar»13 ,

(ii) «[j]ulga-se que as operações de transferência em causa não seriam suspeitas» 14 ,

(iii) «não há nenhuma norma que impeça a movimentação regular de uma conta à ordem para outras contas» 15 ,

(iv) «[q]uanto ao crédito "imediato" na conta da sociedade dos montantes em causa por parte do BCP, é porque não existia norma aplicável que impedisse tal» 16 ,

(v) «não existiam indícios de infracção pelo BCP» 17,

(vi) «[t]endo sido transferidas ilicitamente verbas da conta de uma empresa para a conta pessoal do seu ..., mediante o uso de cartões de débito, não pode tal ser da responsabilidade do Banco se não se provar que tais cartões e o respectivo PIN foram disponibilizados pelo Banco a esse ....»,

112. e se o Banco de Portugal não sancionar o Millennium/BCP nos termos dos Art.ºs 210.º/al. m), e 211.º/al.s b), m) e p) do RGICSF, apresentando, pelo menos, a citação da IC daquelas infrações, devem ser acusados das infrações penais invocadas no subcapítulo «B. Do BdP e dos seus funcionários» do Capítulo «VII- Das infrações penais» e que são relativas aos crimes estatuídos nos Art.ºs 16.º (Erro sobre as circunstâncias do facto)/1, 27.º (Cumplicidade), 368.º (Favorecimento pessoal praticado por funcionário), 381.º (Recusa de cooperação), e 382.º (Abuso de poder) do Código Penal.

113. Se o Millennium/BCP e outros não apresentarem Contestação a esta revisão, e se apresentarem e se não responderem e se não apresentarem os documentos e as informações requeridas no SUB subcapítulo «a. Ao Millennium/BCP e outros» do subcapítulo «I. Das diligências de prova indispensáveis para a descoberta da verdade no âmbito do Art.º 453.º/1 do CPP» do Capítulo «IV- Do Art.º 449.º/al. d) do CPP», e nos pontos 82 e 84 destas Conclusões,

114. ao abrigo do que se estabelece no Art.º 71.º do DL 317/2009, requer-se que o Tribunal condene o Millennium/BCP e outros a indemnizar os Recorrentes no valor de €15.337.154,87 (quinze milhões, trezentos e trinta e sete mil cento e cinquenta e quatro euros e oitenta e sete cêntimos) acrescidos de juros e das custas até ao integral pagamento, devendo-se atender àquilo que se invocou supra no Capítulo «VIII- Das indemnizações».

115. Sem prejuízo do acórdão condenatório dos Recorrentes ter transitado em julgado com o Acórdão relativo ao Proc.º 166/2023 do Tribunal Constitucional de 30-03-2023, conforme se observa no Anexo 15, foi requerida a certidão do acórdão condenatório com nota de trânsito em julgado, mas, tendo em conta que a mesma ainda não foi rececionada, quando isso acontecer, protesta-se juntar aos autos.

Terminam, com o ponto 116, pedindo que, pelos motivos e fundamentos supramencionados,

1. na Contestação, os demandados devem responder àquilo que é invocado e requerido no subcapítulo «I. Das diligências de prova indispensáveis para a descoberta da verdade no âmbito do Art.º 453.º/1 do CPP» do Capítulo «IV- Do Art.º 449.º/al. d) do CPP», e nos pontos 82 e 84 destas Conclusões,

2. se isso não acontecer, nos termos do Art.º 453.º/1 do CPP o juiz deve proceder às diligências indispensáveis para a descoberta da verdade invocadas e requeridas naquele subcapítulo «I. Das diligências de prova indispensáveis para a descoberta da verdade no âmbito do Art.º 453.º/1 do CPP» do Capítulo «IV- Do Art.º 449.º/al. d) do CPP», e nos pontos 82 e 84 destas Conclusões, seguindo-se os ulteriores termos.

III. Notificados os recorridos nos termos do despacho de 31.10.2023, para, querendo, responderem ao requerimento inicial do recurso, nos termos ali indicados, vieram:

i- o Ministério Público na Relação informar que nada tinha a acrescentar à posição expressa no processo;

ii- o Banco de Portugal, GG, HH, II e JJ, vieram referir que o referido requerimento inicial “apresenta um teor manifestamente incompreensível e inadmissível processualmente, sendo nesses termos improcedente e a todos os títulos artificioso, desde logo porque os requisitos previstos no artigo 449.º do Código de Processo Penal de que depende a revisão de sentença transitada em julgado, não se verificam in casu, consubstanciando a respetiva interposição, mais um, dos muitos, expedientes processuais, com que os Recorrentes têm pautado a sua atuação nos presentes autos, da qual perpassa, de forma reiterada, um uso reprovável do processo e das garantias processuais que lhes assistem.”

IV. Em 8.12.2023 A Srª. Juiz Desembargadora titular do processo proferiu o seguinte despacho:

“De acordo com o preceituado no art. º454 do C.P.Penal, e porque não se considera necessário proceder a quaisquer diligências indispensáveis para a descoberta da verdade, ordena-se a remessa dos autos ao Supremo Tribunal de Justiça.

Na medida em que, por força do concurso curricular para o Supremo Tribunal de Justiça o relator do Acórdão recorrido foi promovido a Juiz Conselheiro deste douto tribunal, a informação sobre o mérito do pedido traduz-se no entendimento de que não assiste razão aos recorrentes, devendo manter-se o teor do Acórdão recorrido.

D.N.”

V. Chegou assim o apenso de recurso de revisão ao STJ (sem a informação sobre o mérito do pedido) e, depois de se terem suscitado vários equívocos, v.g. quanto à decisão que os recorrentes pretendiam rever (tal como resulta das promoções do Sr. PGA de 21.12.2023 e de 4.01.2024 que aqui se dão por reproduzidas, em que suscita a hipótese da decisão revidenda ser antes o despacho de indeferimento do requerimento para abertura de instrução de 30.10.2020, o qual foi confirmado pelo Ac. do TRL de 12.05.2021, para além de se promover a junção de certidões por causa do alegado do recurso), bem como após esclarecimento dos recorrentes (de 29.12.2023, em que reafirmavam que a decisão que pretendiam rever era o acórdão do TRL de 30.06.2021, juntando as certidões que entenderem), tendo inclusivamente os mesmos recorrentes invocado (no seu requerimento de 3.01.2024) a nulidade do processado e do despacho de 8.12.2023 por falta da informação sobre o mérito do pedido (art. 454.º do CPP) a prestar pelo Sr. Juiz, foi pelo nosso despacho de 7.01.2024 regularizado o processado e respetiva tramitação deste recurso extraordinário de revisão, nos moldes aí referidos, sendo ordenada a remessa dos autos à Relação de Lisboa, 9ª secção, à Senhora Juíza Desembargadora a quem foi redistribuído o processo em 2.10.2023, para cumprimento do aí determinado, após o que deveria voltar a ser devolvido, para permitir a ulterior tramitação neste Supremo Tribunal, com vista ao oportuno conhecimento do recurso de revisão (e, assim, depois se poder apreciar o recurso, ou seja, avaliar se estão ou não preenchidos os pressupostos para autorizar ou negar a revisão pedida).

VI. Em 28.05.2024 a Srª. Juíza Desembargadora pronunciou-se sobre o mérito do pedido (art. 454.º, CPP), nos seguintes termos (transcrição sem negritos):

Ao abrigo do disposto no art. 454.º do CPP, é a seguinte a informação concreta sobre o mérito do pedido no presente recurso de REVISÃO:

No processo 695/15.0TELSB a sociedade assistente “Comprojecto, projectos e construções Ldª” e demais assistentes pessoas singulares, não se conformaram com o despacho de arquivamento proferido pelo Ministério Público e vieram requerer abertura de instrução, a qual foi rejeitada.

De tal despacho foi interposto recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, o qual proferiu Acórdão que confirmou a decisão de primeira instância com base essencialmente, nos fundamentos que seguidamente se explanam.

O requerimento de abertura de instrução contém ou não os elementos previstos nas alíneas b) e c) do nº3 do art. 283º C.P.P.?

A este propósito concluiu-se que o requerimento de abertura de instrução não descreve factos concretos, precisos, inteligíveis, claros, rigorosos…praticados por pessoas determinadas, actuando por si ou em nome dos bancos em causa, situando tais factos no espaço e no tempo, preenchendo os ilícitos tipificados na Lei como crime.

Os assistentes não procederam a inventariação precisa, concreta e determinada dos factos que pretendiam indiciados, susceptíveis de integrarem a prática por concretos agentes de ilícitos tipificados na Lei como crime.

Ponderou ainda o Acórdão dos autos que a decisão de rejeição do requerimento de abertura de instrução não está afectada por qualquer por qualquer nulidade, nomeadamente omissão de pronúncia, porquanto nos termos em que o requerimento foi feito não lhe cabia pronunciar-se sobre as eventuais nulidades do inquérito.

Se bem compreendemos a pretensão formulada, é esta a decisão que se pretende ver revista nos termos do art. 449º nº als. c), d) e g) C.P.P.

Importa, por isso, considerar os seguintes fundamentos de revisão de sentença:

- se os factos que servirem de fundamento à condenação forem inconciliáveis com os dados como provados noutra sentença e da oposição resultarem graves dúvidas sobre a justiça da condenação;

- se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação;

- se uma sentença vinculativa do Estado Português, proferida por uma instância internacional, for inconciliável com a condenação ou suscitar graves dúvidas sobre a sua justiça.

Ponderando o requerimento apresentado, não vislumbramos que tenha sido identificada qualquer sentença vinculativa do Estado Português proferida por uma instância internacional que seja inconciliável com a decisão aqui proferida.

Também não logramos identificar no requerimento apresentado a indicação de qualquer sentença que apresente factos inconciliáveis com os relevantes nos autos.

É certo que se mencionam várias decisões judiciais, mas, trata-se de decisões já conhecidas e por isso mesmo ponderadas na decisão dos autos, pelo que não se trata de factualidade nova que fundamente a revisão.

Do mesmo modo, não logramos identificar no requerimento a invocação de quaisquer factos novos, ou seja, supervenientes (porque posteriores ou ao menos de conhecimento posterior) à decisão revidenda.

Importa ainda assinalar o seguinte:

O fundamento essencial da decisão que se pretende rever é a carência de indicação no requerimento de abertura de instrução da actos concretos imputados a sujeitos identificados (seja pessoas físicas ou jurídicas) de onde decorra a existência de indícios de responsabilidade criminal da parte dos mesmos.

Sucede que o recurso de revisão especial não supera, em nossa opinião tal carência.

Da mera indicação de um resultado danoso e da indicação de sujeitos a quem é imputada a sua verificação não decorre indício de responsabilidade criminal.

Para esse efeito seria necessário que se identificasse a prática por cada um dos requeridos de actos concretos, identificados no tempo e no espaço, pré-ordenados (porquanto em causa estão ilícitos de natureza dolosa) à produção do resultado danoso.

Mas, o requerimento de revisão de sentença não satisfaz esse requisito.

Para além disso, seria necessário, em nossa opinião, atento o carácter especial do recurso, acrescer a fundamentação justificativa para a impossibilidade/incapacidade em ter satisfeito tal requisito quando interpôs o recurso que originou a decisão que aqui foi impugnada.

Sendo esta a situação, entende-se inútil encetar qualquer diligência de prova, nomeadamente, tomar novamente declarações à\s testemunha\s arrolada\s, porquanto já foi\ram ouvida\s nos autos, pelo que a sua existência não é de conhecimento superveniente e nada se invoca quanto ao eventual apuramento pela mesma de factos de que antes não tivesse tido conhecimento.

Deste modo, somos de opinião que o recurso não merece provimento.

***

Subam os autos ao Supremo Tribunal de Justiça.

***

Providencie a secção que os autos vão devidamente acompanhados das seguintes peças: queixa crime, despacho de arquivamento, RAI, despacho de rejeição do RAI, recurso do despacho de rejeição do RAI, acórdão do TRL que julgou improcedente esse recurso, com nota de trânsito, acórdão do TRL de 30.06.2021, com notas de trânsito.

*** D.N.

VII. Os recorrentes responderam nos termos que constam do requerimento que apresentaram em 7.06.2024, o qual aqui se dá por reproduzido, considerando, em resumo, a informação prestada em 28.05.2024, como uma decisão-surpresa mas, para a evitar, fazem uma síntese do que na sua perspetiva se passou entre os despachos proferidos desde 31.10.2023 até 28.05.2024, fazendo a sua interpretação dos despachos que foram sendo proferidos e exercendo o contraditório, renovando parte dos factos que já haviam alegado no requerimento do recurso, considerando ainda aquela informação sobre o mérito do pedido como um despacho nulo e, acabando por concluir que, na conferência das secções criminais do STJ deve reconhecer-se que há motivo para a revisão (revogação da decisão recorrida de 30.06.2021 e, bem assim, do despacho de 28.05.2024, deferindo as pretensões dos recorrentes, incluindo a indemnização requerida que não foi objeto de qualquer impugnação dos demandados), evitando assim que o recorrente tenha necessidade de apresentar uma queixa junto do TEDH e um recurso contra o Estado e contra o Banco de Portugal ao abrigo da Lei 67/2007, ou então, se o STJ entender que a causa não se reveste de manifesta simplicidade, deve proceder às diligências que os recorrentes indicam.

VIII. Neste Tribunal o Sr. PGA pronunciou-se no sentido da rejeição da revisão, por manifesta improcedência, por um lado, porque a decisão que os recorrentes pretendem rever ser o acórdão da 3.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, de 30-06-2021, proferido no NUIPC 695/15.0TELSB.L1, que consideram de natureza condenatória, mas que na verdade não tem essa natureza condenatória (antes confirmou a decisão ali impugnada) e, por outro lado, porque os recorrentes enquanto assistentes, qualidade que mantiveram até ao final do processo, apenas teriam legitimidade para requerer a revisão em caso de sentença absolutória ou de despacho de não pronúncia e, por isso, não deveriam ter pedido a revisão desse acórdão da Relação (por ser legalmente inadmissível), mas antes de despacho de não pronúncia.

IX. Notificado do Parecer do Sr. PGA, o recorrente apresentou resposta cujo teor aqui se dá por reproduzido, mantendo tudo o que já havia dito nas alegações de recurso e voltando a repetir parte do que já havia referido em anteriores requerimentos.

X. No exame preliminar a Relatora ordenou que fossem cumpridos os vistos legais, tendo-se realizado depois a conferência e, dos respetivos trabalhos, resultou o presente acórdão.

Cumpre, assim, apreciar e decidir.

Fundamentação

XI. Suscitam-se, antes de mais, as questões prévias da recorribilidade da decisão e da legitimidade dos recorrentes.

Vejamos o que releva com interesse para a decisão das questões prévias acima colocadas.

i. No inquérito n.º 695/15.0TELSB a sociedade assistente Comprojecto, Projectos e Construções, Ldª e os assistentes pessoas singulares AA, BB e CC, não se conformaram com o despacho de arquivamento proferido pelo Ministério Público e requereram a abertura de instrução (RAI), a qual foi rejeitada, por inadmissibilidade legal da instrução (em síntese falta de objeto – “descrição de factos concretos praticados por pessoa determinada, situado no espaço e no tempo, que integrem a tipicidade objetiva e subjetiva dos ilícitos pelos quais se pretende a pronúncia, ou seja, sem a descrição dos factos concretos, situados no tempo e no espaço, praticados pelos arguidos que preencham a tipicidade dos ilícitos referidos) é inadmissível a instrução requerida, pelos assistentes)”.

ii. Do despacho de rejeição do RAI foi interposto recurso pelos referidos assistentes para o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), o qual proferiu Acórdão em 12.05.2021, que negou provimento ao recurso e confirmou a decisão recorrida.

iii. Notificados dessa decisão, os mesmos assistentes apresentaram requerimento de 19.05.2021 a “reclamar de erros de secretaria e invocar irregularidade, ilegalidade, invalidade e/ou nulidade do acórdão do TRL, requerendo-se que o requerimento de 26-mar.-2021 seja notificado às outras partes” (cf. fls. 5308 dos autos (vol. 15.º)”.

iv. Foi então proferido o acórdão do TRL de 30.06.2021, que decidiu (além da condenação em taxa de justiça):

- Em declarar que o acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa de 12-mai.-2021, que integra fls. 5270-5296 verso dos presentes au­tos (vol. 15.°), não padece de qualquer "irregularidade, ilegalidade, invalidade e/ ou a nulidade”, designadamente as invocadas pelos requerentes "Comprojecto, Projectos e Construções, Ld.a", AA, BB e CC, no seu requeri­mento de fls. 5307-5325 (vol. 15.°) nem carece de qualquer "correção”;

- Em indeferir a arguição da "irregularidade, ilegalidade, invalidade e/ou a nulidade” apresentada pelos acima referidos requerentes no seu requerimento de fls. de fls. 5307-5325 (vol. 15.°).

- Em ordenar o desentranhamento dos presentes autos dos docu­mentos que integram fls. 5340-5565 (vol. 16.°) e determinamos a sua entrega aos apresentantes.

v. Antes da prolação do ac. do TRL de 30.06.2021, os assistentes apresentaram o requerimento de 28.06.2021, que integra fls. 5585 a 5589 dos autos (vol. 16.º), onde alegaram o que está vertido nos pontos 1 a 29 e, na sequência do que veio a ser proferido o ac. do TRL de 20.10.2021.

vi. No ac. do TRL de 20.10.2021, onde se fez constar no ponto 1.5. que o teor desse requerimento de 28.06.2021 os assistentes, “na sua verdadeira essência mais não fazem do que repisar “teses argumentativas” anteriormente apresentadas no requerimento de 19-mai.-2021”, escreveu-se a dado passo na fundamentação (além do mais) o seguinte: “Com o devido respeito por opinião em contrário, o requerimento apresenta­do pelos Recorrentes em 28-jun.-2021, mais não faz do que repisar os "argumentos" apresentados no requerimento de 19-mai.-.2021 (e que justificaram a pronúncia dos Recorridos, datada de 01-jun.-2021) para justificar a alegada "irregularidade, ilegalidade, invalidade e/ou nulidade do Acórdão do TRL" datado de 12-mai.-2021, agora invocando novos requerimentos, entretanto juntos, os quais são pro­cessualmente inadmissíveis, numa clara e patente tentativa de estender as "invali­dades" invocadas ao subsequente acórdão proferido por este TRL em 30-jun.-2021 e que integra fls. 5576-5583 verso dos autos (vol. 16.°).

(…)

Ora, o requerimento apresentado pelos Recorrentes em 28-jun.-2021, em­barca num verdadeiro "comboio" de requerimentos por si produzidos, em verdeiros "vagões" sucessivos de "papéis", sem qualquer agasalho na lei ao caso aplicá­vel em sede de jurisdição penal, em instância recursal, que se reporta aos sucessi­vos requerimentos apresentados após a apresentação das contra-alegações de re­curso pelos Recorridos.

Neste particular cumpre aqui deixar expresso que tal requerimento que ora nos ocupa de 28-jun.-2021, não se mostra processualmente admissível - pela singela, mas decisiva razão - de que tal requerimento se apresenta prejudicado pela decisão do acórdão deste TRL 30-jun.-2021 e que integra fls. 5576-5583 verso dos autos (vol. 16.°), que não só indeferiu a referida arguição, como desentra­nhou os alegados documentos constantes dos autos (que justificavam as alegadas invalidades invocadas) e condenou individualmente os Recorrentes em 3 UC de taxa de justiça pelo incidente, nos termos que acima se mostram apontados.

No caso em apreço o requerimento de 28-jun.-2021 apresentado pelos Re­correntes ressalta à evidência que os mesmos compreenderam bem os fundamen­tos da decisão e apenas não concordaram com aqueles e esta.

Por sua vez, como flui do que já acima deixámos dito a alegada "nulidade" não constitui fundamento de admissibilidade do recurso, sendo a decisão impug­nada deste TRL irrecorrível. Ora, como já tivemos ocasião de dizer no nosso ares­to de 30-jun.-2021, a alegada "nulidade", só pode ser arguida e constituir objeto de recurso se a decisão for recorrível (recurso ordinário), o que não ocorre in casu.

(…)

Na verdade, da simples leitura dos presentes autos maxime fls. 5307-5325 dos presentes autos (vol. 15.°), afigura-se-nos manifestamente apreensível a total falta de fundamento da reclamação/requerimento apresentados pelos Reclaman­tes/Assistentes, bem como pelo Recorrentes com o requerimento de 28-jun.- 2021, que integra fls. 5585-5589 (vol. 16.°) requerimento esse que somente se compreende como expediente dilatório destinado ao protelamento dos presentes autos de recurso penal, com base em fundamentos insubsistentes que, com o devido respeito por opinião em contrário, a prudência obrigaria mais uma vez a não apre­sentar.

Reafirmamos nesta sede que estamos, pois, perante pretensão infundada.

Na verdade, afigura-se-nos que dos sucessivos requerimentos processual­mente inadmissíveis apresentados pelos Recorrentes, decorre uma atuação que tem vindo a obviar ao desenrolar normal da instância, tentando contrariar osten­sivamente o trânsito em julgado da decisão que rejeitou o RAI.

A atividade processual tida pelos Recorrentes nos presentes autos, já justifi­cou o nosso acórdão datado de 30-jun.-2021, que sobre esta se pronunciou, afigu­ra-se-nos legalmente inadmissível, sendo inusitada e abusiva, sobrecarregando esta instância de Recurso, com atos inúteis que a persistir justificará a condenação dos Recorrentes na taxa sancionatória excecional a que alude o artigo 531.° do Código de Processo Civil, ex vi do n.° 1 do artigo 521.° do Código de Processo Penal. Por tudo isto, sem necessidade de mais considerandos, por despiciendos, por manifesta falta de base legal cumpre determinar o desentranhamento do Re­querimento apresentado pelo Recorrentes de 28-jun.-2021 [que integra fls. 5585-5589 dos autos (vol. 16.°)], em virtude de o mesmo ser processualmente inadmis­síveis e desprovido de fundamento jurídico.

No que tange ao requerimento apresentado pelos Recorrentes de 18-jun.-2021 (este desentranhamento já se mostra determinado no nosso aresto de 30-jun.-2021 [cf. fls. fls. 5576-5583 verso (vol. 16.°)].

Assim, importa declarar que o conhecimento do Requerimento de 28-jun.-2021 se mostra prejudicado pelo decidido no nosso acórdão de 30-jun.-2021 e que integra fls. 5576-5583 verso dos autos (vol. 16.°) e cabe ordenar o seu desen­tranhamento e entrega aos Recorrentes apresentantes do mesmo.

(…)”.

E, termina-se decidindo (além do pagamento de taxa de justiça):

- Em declarar que o conhecimento do Requerimento de 28-jun.-2021 apresentado pelo Recorrentes se mostra prejudicado pelo decidido no nosso acórdão de 30-jun.-2021 e que integra fls. 5576-5583 verso dos autos (vol. 16.°).

- Determinar o desentranhamento do requerimento dos Recorrentes de 28-jun,-2021 que integra fls. 5585-5589 (vol. 16,°) dos presentes autos, e a sua entrega aos apresentantes.

vii. Inconformados com esse acórdão os assistentes interpuseram recurso para o STJ, recurso esse que não foi admitido por despacho do Sr. Desembargador do TRL de 16.11.2021.

viii. Notificados desse despacho, os assistentes reclamaram do mesmo nos termos do art. 405.º do CPP, mas por despacho do Sr. Vice-Presidente do STJ de 16.02.2022 foi indeferida a reclamação.

ix. Notificados dessa decisão os assistentes apresentaram dois requerimentos sucessivos a arguir nulidades, os quais foram sucessivamente indeferidos, tendo depois recorrido para o Tribunal Constitucional, tendo sido por decisão sumária n.º ..., de 16.05.2022, decidido não conhecer do objeto do recurso, após o que reclamaram para a conferência e, por acórdão n.º ..., de 21.09.2022, foi indeferida a reclamação. Entretanto, apresentaram recurso do acórdão para o Plenário do TC, o qual foi não foi admitido por despacho de 17.10.2022. De seguida, apresentaram reclamação desse despacho, sendo então proferido em conferência acórdão n.º ..., de 8.02.2023, a indeferir a referida reclamação. Notificados dessa decisão, deduziram novo incidente pós-decisório, que deu origem ao acórdão n.º ..., de 30.03.2023, no qual foi decidido: a) Indeferir o requerimento apresentado e, em consequência, manter o Acórdão n.º 47/2023; b) Julgar manifestamente anómalo o incidente deduzido e, em consequência, considerar transitado em julgado na presente data o Acórdão n.º 573/2022; c) Ordenar a extração de traslado a partir do requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional, incluindo do presente acórdão; d) Determinar que, após contadas as custas e extraído o traslado, se remetam os autos, de imediato, ao Supremo Tribunal de Justiça, para ali prosseguirem os seus ulteriores termos. (…)

x. No requerimento inicial os recorrentes interpõem conjuntamente recurso de revisão de acórdão proferido pela Relação de Lisboa de 30.06.2021, transitado em julgado, proferido nos autos acima referidos n.º 695/15.0TELSB.L1, no qual eram denunciantes e depois se constituíram assistentes.

XII. Direito

O recurso extraordinário de revisão, previsto nos artigos 449.º a 466.º CPP, é um meio processual (que se aplica às sentenças transitadas em julgado, bem como aos despachos que tiverem posto fim ao processo – art. 449.º, n.º 1 e n.º 2 do CPP – também transitados) que visa alcançar a possibilidade da reapreciação, através de novo julgamento, de decisão anterior (condenatória ou absolutória ou que ponha fim ao processo), desde que se verifiquem determinadas situações (art. 449.º, n.º 1, do CPP) que o legislador considerou deverem ser atendíveis e, por isso, nesses casos deu prevalência ao princípio da justiça sobre a regra geral da segurança do direito e da força do caso julgado (daí podendo dizer-se, com Germano Marques da Silva18, que do “trânsito em julgado da decisão a ordem jurídica considera em regra sanados os vícios que porventura nela existissem.”).

A sua importância (por poder estar em causa essencialmente uma “condenação ou uma a absolvição injusta”) é de tal ordem que é admissível o recurso de revisão ainda que o procedimento se encontre extinto, a pena prescrita ou mesmo cumprida (art. 449.º, n.º 4, do CPP).

O que, quanto às condenações, se conforma com o artigo 29.º, n.º 6, da CRP, quando estabelece que “Os cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei prescrever, à revisão da sentença e à indemnização pelos danos sofridos.”

Tem legitimidade para requerer a revisão os sujeitos indicados no art. 450.º do CPP, entre eles, o condenado ou o seu defensor, relativamente a sentenças condenatórias (ver art. 450.º, n.º 1, al. c), do CPP), assim como o assistente, relativamente a sentenças absolutórias ou a despachos de não pronúncia (art. 450.º, n.º 1, al. b), do CPP).

Comportando o recurso de revisão duas fases (a fase do juízo rescindente decidida pelo STJ e a do juízo rescisório, começando esta última apenas quando é autorizado o pedido de revisão e, por isso, acontecendo quando o processo baixa à 1ª instância para novo julgamento) e, sendo esta, a primeira fase (a do juízo rescindente), importa analisar se ocorrem os pressupostos para conceder a revisão pedida aqui em apreço.

Neste caso concreto, são os assistentes que vem pedir a revisão.

O acórdão do TRL de 30.06.2021, transitado em julgado, que pretendem rever, não é uma decisão condenatória, como referem ao longo do recurso de revisão, nem tão pouco é equiparável a uma condenação.

Esse acórdão também não é um despacho de pronúncia, como os próprios assistentes reconhecem, nem se refere a qualquer despacho de pronúncia.

Aliás, os assistentes haviam recorrido do despacho de rejeição do RAI e foi o acórdão do TRL de 12.05.2021, que negou provimento a esse recurso e manteve a decisão recorrida.

No entanto, a revisão pedida foi do acórdão do TRL de 30.06.2021, que foi uma decisão intercalar, que conheceu do requerimento que apresentaram em 19.05.2021 (reportando-se ao anterior acórdão do TRL de 12.05.2021) a “reclamar de erros de secretaria e invocar irregularidade, ilegalidade, invalidade e/ou nulidade do acórdão do TRL, requerendo-se que o requerimento de 26-mar.-2021 seja notificado às outras partes” e que decidiu, além do mais, pelo seu indeferimento.

Ou seja, esse acórdão do TRL de 30.06.2021 não é uma decisão condenatória, nem tão pouco uma decisão final ou que tenha posto termo ao processo, pois, trata-se antes de uma decisão interlocutória, a que, aliás se seguiu outra, a saber, o ac. do TRL de 20.10.2011.

E que não está em causa nenhum despacho de não pronúncia também é certo, uma vez que foi rejeitado o RAI apresentado pelos assistentes (confirmado por ac. do TRL de 12.05.2021) e, por isso, não chegou a ser aberta a instrução, prevalecendo o arquivamento do inquérito pelo Ministério Público.

Atenta a natureza do acórdão do TRL de 30.06.2021 (decisão interlocutória que nunca pode ser equiparada a uma sentença/decisão condenatória e, muito menos, a uma decisão final ou que põe fim ao processo) os recorrentes, que tem a qualidade de assistentes nos autos, não tem legitimidade para a interposição de recurso de revisão.

Com efeito, esse acórdão do TRL de 30.06.2021, nem conhece do objeto do processo (artigos 97.º, n.º 1, al. a), do CPP), nem sequer põe fim ao processo, por equiparação à sentença (artigo 449.º, n.º 2, do CPP)19.

De resto, os fundamentos invocados (art. 449.º, n.º 1, al. c), d) e g), do CPP20), dizem respeito a sentenças condenatórias, o que não é o caso do acórdão do TRL de 30.06.2021.

Conclui-se, pois, que nem a decisão objeto de recurso (ac. do TRL de 30.06.2021) integra uma decisão recorrível para efeitos de recurso extraordinário de revisão, nem os recorrentes, enquanto assistentes, tem legitimidade para dela interporem recurso de revisão.

Ora, não se verificando os pressupostos da revisão requerida pelos recorrentes, é manifestamente infundado o presente recurso extraordinário (art. 456.º do CPP), desde logo por se verificarem as duas questões prévias apontadas.

Dispositivo

Pelo exposto, acordam nesta Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em negar a revisão pedida pelos assistentes Comprojecto, Projectos e Construções, Lda, AA, BB e CC.

Custas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça devida por cada um deles em 4 (quatro) UC`s.

Nos termos do art. 456.º do CPP, cada um dos recorrentes vai condenado a pagar a quantia de 10 (dez) UC`s, por ser manifestamente infundado o pedido de revisão formulado aqui em apreciação.

Processado em computador e elaborado e revisto integralmente pela Relatora (art. 94.º, n.º 2, do CPP), sendo assinado pela própria, pelos Senhores Juízes Conselheiros Adjuntos e pelo Senhor Juiz Conselheiro Presidente desta Secção Criminal.


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Supremo Tribunal de Justiça, 16.10.2024

Maria do Carmo Silva Dias (Relatora)

Horácio Correia Pinto (Adjunto)

José Luís Lopes da Mota (Adjunto)

Nuno Gonçalves (Presidente desta 3ª Secção Criminal)

________


1. Cfr. Art.ºs 6.º/2 da Lei 11/2004, e 8.º/1/al. c) da Diretiva 2005/60/CE, e ponto 2.4. da Instrução 26/2005 do BdP.

2. Cfr. Art.º 20.º da Diretiva 2005/60/CE.

3. Porque apresentou ao DIAP a “Ficha” relativa ao contrato de abertura de conta (v. Figura 02 supra e a fls 2514 dos autos do Proc.º NUIPC 695/15.0TELSB), e porque, em https://ind.millenniumbcp.pt/pt/Private/Documents/BCP-10900126.pdf (junto no Anexo 08 a fls 176 a 187 dos Anexos) atesta-se que na Cláusula 4ª/2/al. b) em que o Millennium/BCP, reconhece que uma conta é “CONJUNTA” quando é “necessária a intervenção de todos os representantes”.

4. “2 ‐ A base de dados de contas contém os seguintes elementos de informação: (…) b) Identificação dos respetivos titulares e das pessoas autorizadas a movimentá‐las, incluindo procuradores, mandatários ou outros representantes;”.

5. Cfr. Art.º 6.º/2 da Lei 11/2004.

6. Cfr. Art.ºs 8.º/1/al. c) da Diretiva 2005/60/CE, e 9.º/1/al. b) da Lei 25/2008, e ponto 2.4. da Instrução 26/2005 do Banco de Portugal.

7. v. ponto 88 da Contestação à P.I. do Proc.º 241/10.2TVLSB, e pág. 639 (numeração do Tribunal) do subficheiro “401-685-volume_III” do Documento 04 junto com a queixa crime apresentada em 25-05-2015.

8. Cfr. Art.º 20.º da Diretiva 2005/60/CE.

9. Neste caso os funcionários do Millennium/BCP, nomeadamente a KK o LL

10. Neste caso os funcionários do Millennium/BCP, nomeadamente a KK o LL

11. v. ponto 88 da Contestação à P.I. do Proc.º 241/10.2..., e pág. 639 (numeração do Tribunal) do subficheiro “401-685-volume_III” do Documento 04 junto com a queixa crime apresentada em 25-05-2015.

12. Nomeadamente os Art.ºs 3.º/4, 6.º/2, 7.º/1, 8.º/1 e 2, 11.º/1, 15.º, 18.º/1 e 44.º/al.s a), b), d) e f) da Lei 11/2004 , 1.º/1 e 2/al.s a) e d), 7.º/al.s b) e c), 8.º/al. c), 9.º/5, 20.º, 22.º/1/al. a) e 24.º da Diretiva 2005/60/CE, 1.º/1/al. d) da Lei 36/94, e 368.º-A (Branqueamento)/1 e 2 do Código Penal.

13. Cfr. pág. 268 da Conclusão do Banco de Portugal junto aos autos no Documento 14 da queixa crime queixa que resultou no Proc.º NUIPC 695/15.0TELSB.

14. Cfr. II diretora do Departamento de Supervisão Comportamental do Banco de Portugal desde 2011, v. pág. 10 do despacho de arquivamento do inquérito.

15. Idem.

16. Ibidem, e conforme ponto 13 da resposta do BdP e seus funcionários ao Recurso apresentado junto do TRL.

17. Cfr. MM, relatora da queixa e das diversas insistências e funcionária do Banco de Portugal desde 2011, v. pág. 10 do despacho de arquivamento do inquérito.

18. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, Verbo: Lisboa, 1994, p. 359, acrescentando o seguinte: “Há, porém, certos casos em que o vício assume tal gravidade que faz com que a lei entenda ser insuportável a manutenção da decisão. O princípio da justiça exige que a verificação de determinadas circunstâncias anormais permita sacrificar a segurança e a intangibilidade do caso julgado exprime, quando dessas circunstâncias puder resultar um prejuízo maior do que aquele que resulta da preterição do caso julgado, o que é praticamente sensível no domínio penal em que as ficções de segurança dificilmente se acomodam ao sacrifício de valores morais essenciais.”

19. Assim, o mais recente ac. do STJ de 03.07.2024 (Lopes da Mota), que seguimos de perto.

20. Dispõe o artigo 449.º, n.º 1, do CPP, que “A revisão de sentença transitada em julgado é admissível quando: (…)

  c) Os factos que servirem de fundamento à condenação forem inconciliáveis com os dados como provados noutra sentença e da oposição resultarem graves dúvidas sobre a justiça da condenação;

  d) Se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação.

  (…)

  g) Uma sentença vinculativa do Estado Português, proferida por uma instância internacional, for inconciliável com a condenação ou suscitar graves dúvidas sobre a sua justiça; (…)”