EMBARGOS DE EXECUTADO
SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE PARTILHA
COBRANÇA DE TORNAS
Sumário

I – A cobrança de tornas pelo procedimento previsto no art. 1122º nº2 do CPC, como decorre do verbo “poder” ali utilizado pelo legislador, é apenas um meio possível de tal cobrança e, como assim, não um meio obrigatório; aquele regime, incidental e simplificado, não obsta a que possam seguir-se as regras gerais, podendo o credor dar à execução, em processo autónomo, a decisão que condenou na dívida de tornas, efetivando, por essa via, a responsabilidade patrimonial do devedor.
II – A sentença homologatória de partilha transitada em julgado e não afetada por qualquer decisão posterior que altere os termos daquela partilha é título com plena exequibilidade para a cobrança dos créditos de tornas nela reconhecidos.
III – A sentença homologatória de partilha, além de ser discernível de uma sentença homologatória de transação, está sujeita a um regime de impugnação/anulação próprio, que é o previsto no art. 1127º do CPC, não se subsumindo por isso ao fundamento de embargos previsto sob a alínea i) do art. 729º do CPC.

Texto Integral

Processo nº816/23.0T8MAI-B.P1

(Comarca do Porto – Juízo de Execução da Maia – Juiz 1)

Relator: António Mendes Coelho

1º Adjunto: Teresa Maria Sena Fonseca

2º Adjunto: Ana Olívia Esteves Silva Loureiro

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I Relatório

Por apenso aos autos de execução para pagamento de quantia certa que AA, BB e herança de CC, representada pelo cabeça-de-casal DD, intentaram contra EE, em que o título dado à execução é uma sentença homologatória de partilha proferida em processo de inventário, veio o executado deduzir embargos.

Nestes, invocou a incompetência material do Juízo Local Cível para a tramitação do processo de execução, o erro na forma de processo e a inexistência de título válido face à alegada nulidade da sentença de homologação da partilha em virtude de não se ter procedido à partilha dos bens da falecida mulher do inventariado.

Para tal, alegou:

- que foi citado para os termos do processo de execução a correr termos no Juízo Local Cível de Santo Tirso;

- que pese embora o embargante ainda não tenha procedido ao depósito das tornas devidas, o processo executivo comum não é o meio próprio para efetivar o pagamento coercivo de tornas devidas em processo de inventário;

- que o inventariado faleceu no estado de viúvo, que dos bens que alegadamente pertenciam ao inventariado este tinha apenas a meação nos mesmos bem como a sua quota devido ao falecimento da mulher, nunca se tendo procedido ao inventário por óbito da mulher do inventariado, nem à partilha dos bens desta, e que por isso o embargante já requereu o inventário judicial por óbito da sua falecida mãe, concluindo que só após se proceder à partilha por óbito da mãe do embargante e mulher do inventariado se poderá proceder à partilha dos bens por óbito do inventariado.

Conclusos os autos ao Sr. Juiz, por este foi proferido despacho em que, depois da fundamentação de facto e de direito que dele consta, decidiu nos seguintes termos:

Pelo exposto:

Indefiro liminarmente os presentes embargos de executado em virtude de, para além de serem manifestamente improcedentes, o fundamento dos mesmos não se ajustar ao disposto no artigo 729º, do Código de Processo Civil.

De tal despacho veio o embargante interpor recurso, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

1.ª

O presente recurso tem por objecto a decisão proferida que indeferiu liminarmente os embargos de executado deduzidos pelo Recorrente, com o fundamento de que os mesmos são manifestamente improcedente e não se ajustam ao disposto no artigo 729º do Código de Processo Civil. O Recorrente não se conforma com a referida decisão.

2.ª

Quanto ao erro na forma do processo, ressalvado o devido respeito por melhor opinião, entende-se que o mesmo se verifica.

3.ª

Assim, o exercício coercivo do direito a receber tornas tem normas e disposições próprias consignadas na lei, ou seja, está consagrado na lei o procedimento próprio destinado a efectivar o direito ao recebimento das mesmas, em concreto no artigo 1376º, n.º 3 do C.P.C, à data e agora 1122º, n.º 2. Estas normas eram e são o meio processual próprio para os Recorridos exerceram o seu direito ao pagamento de tornas por parte do Recorrente, e não o processo executivo que intentaram, verificando-se assim erro na forma do processo, com as legais consequências.

4.ª

De facto, é o que resulta das disposições do Código de Processo Civil atrás citadas, bem como é a interpretação correcta das mesmas. Aliás, se assim não o fosse as mesmas não tinham qualquer razão para estarem consagradas na lei processual. A que acresce, ainda, o disposto no artigo 1378º, n.º 4 do C.P.C., agora, 1122º, n.º 3 e 4 do mesmo diploma que refere expressamente que os credores de tornas beneficiam de hipoteca legal sobre os bens adjudicados ao devedor. A lei confere-lhes assim precisamente o direito a hipoteca legal sobre bens adjudicados ao devedor, e não sobre quaisquer outro bens que lhe pertençam. Esta norma, vem assim reforçar qual o procedimento para o credor de tornas no âmbito de um processo de inventário para receber as mesmas.

5.ª

Face ao exposto, verifica-se erro na forma do processo, o que constitui nulidade, de conhecimento oficioso, mas que expressamente se invoca com as legais consequências

6.ª

Por outro lado mas sem prescindir, o Recorrente invocou outros fundamentos em sede de oposição à execução, mas foi entendimento na decisão em recurso que os mesmos eram manifestamente improcedentes e o fundamento dos mesmos não se ajusta ao disposto no artigo 729º do C.P.C.

7.ª

Esses fundamentos invocados pelo Recorrente, traduzem-se em que o título dado à execução é uma sentença que homologou uma partilha realizadas pelas partes nos termos da lei. Essa decisão homologatória não é uma decisão que conheceu sobre o mérito de uma causa, mas apenas uma decisão que homologou o que foi a vontade das partes, no caso partilha através de licitação. Essa decisão apenas curou de verificar a legalidade do acto, a legitimidade dos intervenientes e verificar a legalidade do objecto, e neste ponto, como a seguir se procurará desmontar, laborou em evidente erro.

8.ª

Com efeito, o artigo 729º do C.P.C., sob a epígrafe fundamentos de oposição à execução baseada em sentença, na alínea f) diz expressamente “Tratando-se de sentença homologatória de confissão ou transação, qualquer causa de nulidade ou anulabilidade desses actos”.

9.ª

O que se entende e compreende face ao que atrás se descreve sobre o conteúdo das sentenças homologatórias, no caso dos autos homologatória de partilha.

10.ª

Assim sendo, em sede de embargos de executado, o Recorrente alegou como fundamento da oposição que, como consta a sentença dada à execução e junta aos autos, nos presentes autos de inventário para partilha da herança aberta por óbito de EE, homologo pela presente sentença a partilha constante do mapa de fls. 271 e seguintes, adjudicando aos interessados os respectivos quinhões.

11.ª

Sucede que, o Inventariado faleceu no estado de viúvo, pois a sua mulher havia pré falecido. E dos bens que alegadamente pertenciam ao Inventariado, nomeadamente os bens imóveis partilhados, ele apenas tinha a meação dos mesmos, bem como a sua quota devido ao falecimento da mulher. De maneira que é evidente que esses bens não lhe pertenciam em pleno, e não podiam ser partilhados da forma em que o foram.

12.ª

Isto porque, nunca se procedeu efectivamente à partilha por óbito da mulher do inventariado. E este facto era condição essencial para que se procedesse à partilha dos bens do inventariado. E, consequentemente, a partilha efectuada pelas partes e homologada dos bens do inventariado EE incidiu sobre um objecto impossível e ilegal, pois esses bens foram partilhados como lhe pertencessem, quando como vimos não pertenciam.

13.ª

Por essa razão, o Recorrente tão pouco consegue ou conseguirá registar os bens que lhe foram adjudicados e cujas tornas lhe estão as ser exigidos, junto da Conservatória do Registo Predial, pois os bens partilhados eram pertença do inventariado e da sua falecida mulher e não existe título válido de que se tenha procedido à partilha dos bens por óbito da mesma, e, por conseguinte, demonstrar o exigido trato sucessivo.

14.ª

E, o Recorrente não pode assim proceder ao pagamento dos bens que lhe foram adjudicados pois o acto de adjudicação está ferido de ilegalidade, e não constitui título bastante para o mesmo adquirir a propriedade desses bens. Isto porque, como se referiu, o objecto sobre que incidiu o acto judicial de homologação é nulo.

15.ª

E, por essa razão, o Recorrente, como referiu em sede de oposição, já requereu o inventário judicial por óbito da sua falecida mãe.

16.ª

Por conseguinte o Recorrente, em sede de oposição, invocou precisamente factos e que estão até demonstrados nos documentos dados à execução bem como nos que foram juntos com a oposição, que são causa de nulidade da partilha homologada. Isto porque, a mesma incidiu sobre objecto (bens) impossível e ilegal, e, como tal, esses actos são nulos.

17.ª

Pelo que, a sentença em recurso ao indeferir liminarmente os embargos de executado deduzidos pelo Recorrente, com fundamentos em que os mesmos são manifestamente improcedentes, e que o fundamento dos mesmos não se ajusta ao disposto no artigo 729º, do C.P.C. violou precisamente o disposto na alínea f) dessa norma, devendo ser revogado e proferida decisão que admita os embargos de executado, seguindo-se os ulteriores termos.

Assim se fazendo Justiça!

Não foram apresentadas contra-alegações.

Foram dispensados os vistos ao abrigo do art. 657º nº4 do CPC.

Considerando que o objeto do recurso, sem prejuízo de eventuais questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas suas conclusões (arts. 635º nº4 e 639º nº1 do CPC), são as seguintes as questões a tratar:

a) – saber se a propositura da execução integra erro na forma de processo, por a cobrança de tornas devidas ter que ser efetuada nos termos previstos no art. 1378º nº3 do CPC anterior (o aplicável ao processo de inventário em que foi proferida a sentença homologatória exequenda) e no art. 1122º nº2 do CPC atual (com igual previsão);

b) – apurar da exequibilidade da sentença homologatória de partilha e, neste âmbito, saber se a nulidade a ela imputada pelo recorrente é subsumível ao fundamento de embargos previsto sob a alínea i) do art. 729º do CPC.


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II – Fundamentação

É a seguinte a factualidade dada pelos autos a ter em conta (já assim selecionada na decisão recorrida e que aqui se aproveita, a qual não se mostra questionada):

A) Os exequentes apresentaram à execução, como título executivo, a sentença homologatória de partilha proferida no dia 3 de junho de 2015, transitada em julgado no dia 8 de julho de 2015, nos autos de inventário que, sob o nº 3732/10.1TBSTS, correram termos pelo Juízo Local Cível de Santo Tirso, por óbito de EE, e onde eram interessados os ora exequentes e o ora executado, através da qual foi homologada a partilha constante do respetivo mapa, adjudicando aos interessados os bens relacionados conforme licitação em sede de conferência de interessados, do qual consta, para além do mais, que o interessado EE, para preenchimento do seu quinhão, recebe os imóveis descritos sob as verbas nºs 1 (um), 2 (dois) e 3 (três), tendo de repor tornas à interessada AA no valor de € 15.367,08 (quinze mil e trezentos e sessenta e sete euros e oito cêntimos), ao interessado CC no valor de € 15.367,08 (quinze mil e trezentos e sessenta e sete euros e oito cêntimos) e ao interessado BB no valor de € 15.367,09 (quinze mil e trezentos e sessenta e sete euros e nove cêntimos);

B) No processo de inventário, o ora embargante foi notificado, através da carta registada datada de 2 de dezembro de 2014, do mapa informativo da partilha e para, no prazo de 10 (dez) dias, proceder ao pagamento das tornas;

C) O ora embargante não procedeu ao depósito nem ao pagamento das tornas devidas aos interessados AA, CC e BB;

D) Os exequentes requereram execução de sentença através do requerimento de execução de decisão judicial condenatória que deu entrada no dia 11 de janeiro de 2023;

E) Tendo os autos sido remetidos para distribuição por transferência eletrónica à unidade central da Maia, onde foram distribuídos ao Juízo de Execução da Maia.

Vamos à primeira questão enunciada.

Desde já se adianta que a pretensão do recorrente no sentido de, com a propositura da execução, ocorrer erro na forma de processo, não pode lograr qualquer acolhimento.

A sentença homologatória de partilha homologa, designadamente, as operações aritméticas constantes do mapa de partilha (como previsto no art. 1120º nº3 do CPC) das quais pode decorrer, nomeadamente, a existência de crédito de tornas a favor de determinado interessado ou determinados interessados e a satisfazer por outro ou outros interessados, constituindo, pois, por via da previsão do art. 703º nº1 a) do CPC[1], título executivo para a imposição coerciva dos direitos que nela são reconhecidos.

No caso, a cada um dos exequentes foi ali reconhecido um crédito de tornas no montante referido na alínea A) do elenco factual acima enunciado, crédito esse a pagar pelo executado.

Como se prevê no nº2 do art. 1122º do CPC, “Depois do trânsito em julgado da sentença homologatória e se houver direito a tornas, os requerentes podem pedir que se proceda, no processo, à venda dos bens adjudicados ao devedor até onde seja necessário para o seu pagamento”.

Note-se, porém, que a cobrança de tornas pelo procedimento ali previsto, como decorre do verbo “poder” ali utlizado pelo legislador, é apenas um meio possível de tal cobrança e, como assim, não um meio obrigatório.

Como em anotação ao art. 1122º do CPC referem Miguel Teixeira de Sousa, Carlos Lopes do Rego, António Abrantes Geraldes e Pedro Pinheiro Torres[2], aquele procedimento, enxertado no próprio processo de inventário, é “uma opção que fica dependente da iniciativa do credor”, adiantando depois, no mesmo sentido, que “O regime, incidental e simplificado, de cobrança de tornas estabelecido no nº2 não obsta a que possam seguir-se as regras gerais, podendo o credor dar à execução, em processo autónomo, a decisão que condenou na dívida de tornas, efetivando, por essa via, a responsabilidade patrimonial do devedor (…)”.

Assim, tem pleno cabimento legal a propositura de execução para, em processo autónomo do inventário, o credor de tornas proceder à cobrança destas e dos juros legais sobre elas vencidos nos termos previstos no nº3 do art. 1122º.

Como tal, improcede a questão recursória em apreço.

Passemos para a segunda questão enunciada.

A sentença exequenda, não obstante a nulidade que o recorrente/embargante lhe imputa – por, na sua tese, incidir sobre “um objeto impossível e ilegal”, pois os bens partilhados não pertenciam em pleno ao inventariado (apenas tinha a meação e a sua quota neles devido ao falecimento da sua mulher) –, não padece de qualquer inexequibilidade.

Efetivamente, como ali se diz e com a devia vénia se transcreve:

«(…) a obrigação de pagamento titulada pela sentença goza de todos os requisitos de exequibilidade previstos nos arts. 703º, nº 1, a), 704º, nº 1 e 713º, do Código de Processo Civil, tendo a sentença transitado em julgado e sendo a quantia exequenda certa, líquida e exigível.

É certo que o trânsito em julgado da sentença homologatória de partilha não obsta a que se proceda à emenda ou à anulação da partilha ou até à partilha adicional, nos termos anteriormente previstos nos anteriores arts. 1386º, do Código de Processo Civil, entretanto nos arts. 70º e segs. do Regime Jurídico do Processo de Inventário, aprovado pela Lei nº 23/2013, de 5 de Março, e actualmente nos arts. 1126º e segs., do Código de Processo Civil, na redacção operada pela Lei nº 117/2019, de 13 de Setembro.

Com efeito, sob a epígrafe “Emenda da partilha”, preceitua o art. 1126º, nº 1, do Código de Processo Civil, que “Ainda que a decisão homologatória tenha transitado em julgado, a partilha pode ser emendada no próprio inventário por acordo de todos os interessados, se tiver havido erro de facto na descrição ou qualificação dos bens ou qualquer outro erro suscetível de viciar a vontade das partes.”

E de acordo com o disposto no nº 2, da mesma disposição legal, “Na falta de acordo quanto à emenda, o interessado requer fundamentadamente, no próprio processo, que a ela se proceda, no prazo máximo de um ano a contar da cognoscibilidade do erro, desde que esta seja posterior à decisão, aplicando-se à tramitação o disposto quanto aos incidentes da instância.”

Sob a epígrafe “Anulação da partilha”, preceitua depois o art. 1127º, nº 1, do mesmo Código, que “Sem prejuízo dos casos de recurso extraordinário de revisão, a partilha confirmada por sentença homologatória transitada em julgado só pode ser anulada quando tenha havido preterição ou falta de intervenção de algum dos co-herdeiros e se mostre que os outros interessados procederam com dolo ou má-fé, seja quanto à preterição, seja quanto ao modo como a partilha foi preparada.”

E de acordo com o nº 2, da mesma disposição legal, “O pedido de anulação constitui incidente do processo de inventário, ao qual se aplicam as regras gerais dos incidentes da instância.”

E finalmente, sob a epígrafe “Partilha adicional”, preceitua o art. 1129º, nº 1, do mesmo Código, que “Quando se reconheça, depois de feita a partilha, que houve omissão de alguns bens, procede-se a partilha adicional no mesmo processo.”

E de acordo com o nº 2, da mesma disposição legal, “No inventário a que se proceda por óbito do cônjuge supérstite, são descritos e partilhados os bens omitidos no inventário do cônjuge predefunto, quando a omissão só venha a descobrir-se por ocasião daquele inventário.”

No entanto, a emenda, anulação da partilha ou partilha adicional apenas é susceptível de produzir efeitos após a decisão que, seja no próprio processo de inventário (no caso de acordo de todos os interessados, quanto à emenda), seja em acção própria (na falta de acordo), venha a ser proferida sobre tal pretensão.

Daqui se pode concluir que, até à prolação de tal decisão, a sentença homologatória de partilha anteriormente proferida, porque transitou em julgado, continua a produzir efeitos, sendo por isso exequível nos seus precisos termos e sem prejuízo de uma eventual emenda, anulação da partilha ou partilha adicional poder justificar, no futuro, a alteração dos direitos decorrentes da sentença de partilha emendada ou anulada.

Assim sendo, independentemente de se verificarem ou não os pressupostos para a emenda da partilha, anulação da partilha ou partilha adicional que o executado alega, o certo é que, não tendo ainda sido decidida tal questão, não existe qualquer fundamento legal para limitar ou impedir os efeitos que resultam de uma sentença condenatória transitada em julgado.»

(o sublinhado é nosso)

Face à completude do argumentado, que se subscreve na íntegra, é óbvio de concluir que a sentença homologatória de partilha em causa – já transitada em julgado desde 8/7/2015 e não afetada por qualquer decisão posterior que altere os termos daquela partilha – é título com plena exequibilidade para a cobrança dos créditos de tornas nela reconhecidos aos exequentes sobre o executado.

Resta ainda dizer, quanto ao argumentado pelo recorrente no sentido de que a nulidade por si imputada à sentença homologatória pelos motivos atrás referidos se subsume ao fundamento de embargos previsto sob a alínea i) do art. 729º do CPC – com o conteúdo “Tratando-se de sentença homologatória de confissão ou transação, qualquer causa de nulidade ou anulabilidade desses atos” –, que não procede tal argumentação.

Por um lado, e como já se mostra referido no tratamento da questão anterior, a sentença homologatória de partilha, além de ser discernível de uma sentença homologatória de transação[3], está sujeita a um regime de impugnação/anulação próprio, que é o previsto no art. 1127º do CPC.

Por outro lado, a sentença homologatória da partilha dos autos, no caso, nem sequer teve na sua base uma qualquer transação sobre a mesma, pois não houve acordo dos interessados quanto à composição dos respetivos quinhões e teve por isso que se proceder a licitações [vide alínea A) do elenco factual referido supra, em conformidade com a ata da conferência de interessados junta na certidão que instrui o recurso], como imposto pelo art. 1113º nº1 do CPC.

Como tal, improcede também esta questão recursória.

Na sequência do se veio de expor, é de julgar improcedente o recurso e confirmar a decisão recorrida.

As custas do recurso ficam a cargo do recorrente, que nele decaiu (art. 527º nºs 1 e 2 do CPC).


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Sumário (da exclusiva responsabilidade do relator – art. 663 º nº7 do CPC):

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III – Decisão

Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente o recurso e confirmar a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente.


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Porto, 7/10/2024
Mendes Coelho
Teresa Fonseca
Ana Olívia Loureiro
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[1] No sentido da consideração da sentença homologatória de partilha como sentença condenatória quanto à satisfação dos direitos nela reconhecidos, vide Miguel Teixeira de Sousa, Carlos Lopes do Rego, António Abrantes Geraldes e Pedro Pinheiro Torres in “O Novo Regime do Processo de Inventário e Outras Alterações na Legislação Processual Civil”, Almedina, 2020, pág.133; também no sentido da consideração daquela mesma sentença como sentença condenatória para efeitos do art. 703º nº1 a) do CPC, vide José Lebre de Freitas, Armindo Ribeiro Mendes e Isabel Alexandre, “Código de Processo Civil Anotado”, volume 3º, 3ª edição, Almedina, 2022, pág. 337 (anotação ao art. 703º).
[2] In “O Novo Regime do Processo de Inventário e Outras Alterações na Legislação Processual Civil”, Almedina, 2020, pág.133.
[3] Vide neste sentido José Lebre de Freitas, Armindo Ribeiro Mendes e Isabel Alexandre, “Código de Processo Civil Anotado”, volume 3º, 3ª edição, Almedina, 2022, pág. 337 (anotação ao art. 703º), onde se diferencia as sentenças homologatórias “nomeadamente de transação ou confissão do pedido (art. 290-3) e de partilha (…)”.