DISPENSA DE AUDIÊNCIA PRÉVIA
ALTERAÇÃO DO REQUERIMENTO PROBATÓRIO
Sumário

I- Na situação prevista no nº 1 do artigo 598º permitiu o legislador às partes alterar o requerimento probatório que inicialmente / anteriormente tenham apresentado, sem qualquer limitação quanto ao tipo de prova que está em causa, à que inicialmente indicaram e à que no momento em causa pretendem passar a ver considerado.
Seja a indicação pela primeira vez de um rol de testemunhas. Seja a junção de prova documental.
II- Caso tenha ocorrido, por decisão do tribunal, dispensa da realização da audiência prévia, não podem as partes ser penalizadas e limitadas no seu direito de proceder à alteração dos requerimentos probatórios que a lei consagrou com a abrangência acima já indicada.
Motivo por que e não sendo requerida a realização de audiência prévia no prazo de 10 dias após a notificação do despacho que dispensou a realização daquela (vide artigo 593º nº 3 do CPC), tem a parte o prazo geral de dez dias para fazer uso do direito referido em I.

Texto Integral

Apelação em Separado

Processo nº. 8690/21.4T8VNG-A.P1

3ª Secção Cível

Relatora – M. Fátima Andrade

Adjunto – Miguel Baldaia Morais

Adjunto – António Mendes Coelho

Tribunal de Origem do Recurso – T J Comarca do Porto – Jz. Local Cível de Vila Nova de Gaia

Apelantes / AA

Sumário (artigo 663º nº 7 do CPC):

………………………………

………………………………

………………………………

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I- Relatório

i- AA instaurou (em 16/11/2021) ação declarativa sob a forma de processo comum contra BB, peticionando pela procedência da ação, a condenação do R.:

“- à reparação dos danos causados à Autora com a realização de todos os atos médicos necessários à reparação da intervenção realizada;

-ao pagamento de 23.000,00 € (vinte e três mil euros) pelos danos não patrimoniais sofridos pela Autor, bem como, de juros até efetivo e integral pagamento desde a citação.”

ii- Ofereceu juntamente com a petição inicial prova documental.

iii- Citado o R., contestou e suscitou o incidente de intervenção acessória provocada de “A..., S.A.”.

E a final, pelo por si alegado concluiu dever:

“a) Julgar-se procedente a exceção de ilegitimidade passiva do R. e nessa medida, absolver o R. do pedido, com todas as consequências legais;

b) Julgar-se procedente a exceção de prescrição, porquanto, mesmo não concedendo ser o R. parte legítima na presente ação, o pretenso direito que a A. pretende exercer está claramente prescrito e aqui se argui, especificadamente para os legais efeitos (art.º 498º, C.C.);

CASO ASSIM SE NÃO ENTENDA:

c) A presente ação ser julgada totalmente improcedente por não provada, dela se absolvendo o R., com todas as consequências legais;

d) Ser, ainda, a A. condenada como litigante de má fé, com sanção exemplar numa multa nunca inferior a € 5.000,00 e em indemnização ao R. em € 5.000,00 (cinco mil euros);”

iv- A A. respondeu (em 06/05/22), nos termos do artigo 3º nº 3, motivando por sua vez resposta do R..

v- Tendo o tribunal a quo entendido poder conhecer do mérito da totalidade do pedido, agendou audiência prévia para o efeito.

Nesta foi tentada a conciliação entre as partes, tal como consta da ata, cujo teor aqui em parte se reproduz:

“(…) o Mm.º Juiz tentou a conciliação entre as partes, o que resultou infrutífero.

Ato contínuo, o Mm.º Juiz, após expor algumas questões às ilustres mandatárias das partes, proferiu o seguinte:

DESPACHO

Façam-se os autos conclusos para proferir Saneador sentença.”

vi- Conclusos os autos e exposto pelo tribunal a quo o entendimento de não ser possível conhecer de imediato do pedido, foi ordenado o cumprimento do disposto no artigo 318º nº 2 do CPC.

Após tendo sido admitido o incidente de intervenção acessória provocado antes suscitado.

A chamada contestou.

E na sequência de tal contestação, deduziu a A. incidente de intervenção acessória provocada de outra seguradora – a “B... – Companhia de Seguros, S.A.”.

Chamamento admitido, após o que foi a nova chamada citada. Apresentando igualmente contestação.


*

Em 09/11/2023 foi proferido despacho saneador, declarando-se dispensar a realização de audiência prévia, uma vez que se destinaria “apenas aos fins referidos no artigo 593.º, 1 do Código de Processo Civil”

Identificado o objeto do litígio e elencados os temas de prova, foi quanto aos requerimentos de prova determinado:

“Admito o rol de testemunhas da ré e da interveniente.

Admito a prestação de declarações do réu aos temas da prova.”

vii- Notificado este despacho a 10/11, foi ao mesmo apresentado reclamação pelo R. e chamadas a 13/11 e 20/11.

Tendo a A. a 22/11/23 apresentado o seguinte requerimento:

“AA, Autora nos autos à margem identificados, notificada da não realização da Audiência Prévia, vem, respeitosamente, ao abrigo do art.º 598º, n.º1 do C.P.C., requerer alteração ao requerimento probatório apresentado, nos termos seguintes:

1- Prova documental:

Requer a junção de três documentos:

-Relatório Médico Dr. CC (doc. 12, considerando os documentos juntos na P.I.);

-Relatório e Scanner Tomografia Computorizada (doc. 13, considerando os documentos juntos na P.I.)

-Relatório consulta 2018 Dr. DD e que só agora foi possível localizar, (doc. 14, considerando os documentos juntos na P.I.);

2- Prova testemunhal, cuja notificação requer:

- EE, residente em Rua ..., ... ..., Gondomar;

3- Requer, ao abrigo do art.º 466.º do C.P.C., Prova por Declarações de Parte da Autora AA;

4- Requer, ainda, Prova Pericial médica, ao abrigo do art.º 467.º C.P.C., indicando, desde já, nos termos do art.º 475.º do C.P.C. o objeto de perícia a resposta aos seguintes quesitos:

(…)”

viii- A este requerimento respondeu o R. pugnando pela extemporaneidade deste requerimento quanto à prova testemunhal e pericial apresentada/requerida pela autora.

Quanto aos documentos oferecidos pugnando pela condenação da A. em multa, pela sua junção tardia, quanto aos docs. 13 e 14), assim justificado:

“7 (…) quanto aos documentos 13 e 14, juntos pelas A., atendendo a que não foi alegada, nem feita qualquer prova, de que os mesmos não puderem ser oferecidos anteriormente, até porque estão datados de 25/07/2022 e 11/05/2018, respetivamente, a admitir-se a sua junção, deverá a A. ser condenada em multa, sendo que, vão aqueles documentos expressamente impugnados para todos os legais efeitos, impugnando-se o seu teor e assinaturas, bem como os efeitos que a A. pretende obter com a junção dos mesmos”.

ix- Apreciando o requerido (no que ora releva), decidiu o tribunal a quo:

“Requerimento da autora de 22.11 / requerimento do réu de 29.11:

Independentemente daquilo que se passou a 22.9.2022, para os efeitos de fixação de temas da prova e objeto do litígio, a audiência prévia foi dispensada.

O requerimento de alteração de meios de prova é apresentado nos termos dos artigos 593.º, 3 e 598.º,1 do CPC. Em dez dias, a parte ou requer audiência prévia ou requer alteração do requerimento probatório.

O rol de testemunhas, todavia, tem de ser apresentado com a petição inicial (artigo 552.º, 6 da petição inicial). Daí em diante o rol só pode ser, ou aditado ou alterado. Não tendo sido apresentado qualquer rol de testemunhas com a petição inicial, impõe-se o indeferimento do requerimento para inquirição de EE, por inadmissibilidade de apresentação do primeiro rol de testemunhas após a petição inicial, ou seja, indefere-se por intempestividade (artigo 598.º, 2 do Requerimento da autora de 22.11 / requerimento do réu de 29.11:

Independentemente daquilo que se passou a 22.9.2022, para os efeitos de fixação de temas da prova e objeto do litígio, a audiência prévia foi dispensada.

O requerimento de alteração de meios de prova é apresentado nos termos dos artigos 593.º, 3 e 598.º,1 do CPC. Em dez dias, a parte ou requer audiência prévia ou requer alteração do requerimento probatório.

O rol de testemunhas, todavia, tem de ser apresentado com a petição inicial (artigo 552.º, 6 da petição inicial). Daí em diante o rol só pode ser, ou aditado ou alterado. Não tendo sido apresentado qualquer rol de testemunhas com a petição inicial, impõe-se o indeferimento do requerimento para inquirição de EE, por inadmissibilidade de apresentação do primeiro rol de testemunhas após a petição inicial, ou seja, indefere-se por intempestividade (artigo 598.º, 2 do CPC, por efeito contrário).

Já quanto aos demais meios de prova: nada impede a autora de os requerer, alterando, nesta fase, o requerimento probatório inicial. Com a petição inicial a autora requereu a junção de 11 documentos. Requer agora a junção de mais 3 documentos (requerimento, em teoria, admissível até ao trânsito em julgado – artigo 423.º, 3 do CPC); a prova por declarações de parte (requerimento admissível até ao início das alegações orais – artigo 466.º, 3 do CPC) e prova pericial (requerimento cuja admissibilidade está dependente, para além do mais, da pretensão ser deduzida tempestivamente, ou seja, precisamente, até ao termo do prazo de 10 dias previsto no artigo 593.º, 3 (artigo 598.º, 1 do CPC).

Assim sendo, admito a junção de documentos, sujeitando a admissibilidade da junção ao pagamento de 1UC de multa, dado que nenhuma justificação para a apresentação tardia foi apresentada.

A autora ouvir-se-á em declarações.

Quanto à perícia pretendida. A mesma é de pertinência manifesta, pelo que se admite a sua realização. Em consequência, decide-se:

- ouvir a parte contrária para os termos do disposto no artigo 476.º, 1 do CPC; e

- desde já, dar sem efeito a data designada para a audiência final.

Notifique”.

x- Notificada a A. do assim decidido, interpôs recurso de apelação, para tanto alegando e apresentando as seguintes conclusões:

“CONCLUSÕES

I- A Apelante não se conformando com o Douto Despacho do Tribunal a quo, apresenta o presente recurso pedindo a sua parcial revogação, porquanto e salvo o devido respeito, o Meritíssimo Juiz interpretou e aplicou incorretamente as normas de direito relevantes para o caso.

II- A Autora/Apelante notificada do Despacho que dispensou a Audiência Prévia, requereu a 22/11/2023, ao abrigo dos artigos 593, n.º 3 e 598º, n. º1 do C.P.C., a alteração ao requerimento probatório apresentado na Petição Inicial, entre outros, requerendo a junção de 3 documentos e audição de uma testemunha.

III- Por Douto de Despacho de 07/12/2023, o Meritíssimo Juiz a quo admitiu o requerimento de alteração de meios de prova (admitindo a prova pericial e por declarações de parte também requerida) contudo indeferindo o requerimento para audição de testemunha “por intempestividade” e admitindo a junção de documentos requerida, mas “sujeitando a admissibilidade da junção ao pagamento de 1UC de multa, dado que nenhuma justificação para apresentação tardia foi apresentada”.

IV- Quanto ao indeferimento do requerimento quanto à prova testemunhal por intempestividade, ao abrigo do art.º 598, n.º 2 C.P.C.: A Autora na sua Petição Inicial apresentou requerimento probatório através da junção de prova documental da qual constavam 11 documentos e o requerimento para alteração do requerimento probatório apresentado pode legitimamente abranger qualquer meio de prova.

V- Considera a Apelante que o art.º 598, n.º 2 do C.P.C. permite a alteração do requerimento probatório em todos os meios de prova mesmo não tendo sido indicados na P.I., exigindo-se apenas a existência prévia de um requerimento probatório, tal como a apelante apresentou em sede de P.I..

VI-Quanto a esta questão e segundo Abrantes Geraldes/Paulo Pimenta/Luís Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, 2018, pág. 704, «o requisito mínimo é que tenha sido anteriormente apresentado algum requerimento probatório, podendo a alteração traduzir-se, se necessário, na indicação de outros meios de prova que tenham sido indicados ou apenas na alteração dos meios de prova que não tenham sido indicados ou apenas na alteração dos meios de prova já enunciados».

VII- Assim, por ser legítima, foi requerida a alteração do requerimento probatório para audição de testemunha ex novo (sendo o rol de testemunhas apenas um dos meios de prova a constar do requerimento probatório) pelo que, a sua apresentação foi em tempo e a sua não admissão por intempestividade incorretamente decida pelo Tribunal Ad quo, pelo que se impõe a sua revogação.

VIII- Quanto à admissão da junção de documentos, sujeitando a admissibilidade da junção ao pagamento de 1 UC de multa, dado não ter sido dada “nenhuma justificação para apresentação tardia foi apresentada”.

IX- Dispõe o art. º 423.º, n. º2 do C.P.C. “Se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado.”

X- Ora, também aqui o Douto Despacho não aplicou corretamente a lei, nomeadamente o art.º 423.º, n.º 2, C.P.C., pois, considera a ora recorrente que a apresentação foi objetivamente e explicitamente justificada, e em face disso, insuscetível de condenação em multa, nos termos do n.º 2 do art.º 423.º do CPC.

XI- Ora, a Apelante juntou com petição inicial 11 documentos, tendo requerido a alteração do requerimento probatório ao abrigo do art.º 598.º C.P.C., requerendo a admissão de mais 3 documentos.

XII -Analisando os mesmos, verifica-se que o documento –Relatório Médico Dr. CC (doc. 12, considerando os documentos juntos na P.I.;) é um relatório datado de 17/11/2023 (enviado à apelante por email, mas que, por lapso, o corpo do email não foi junto com o relatório) com data posterior à data da entrada da petição inicial (datada de 16/11/2021), pelo que, não poderia ter sido junto com a P.I., logo, objetivamente provado que, a essa data, não foi possível a sua junção.

From: C...

Sent: Friday, November 17, 2023 6:42 PM

To: ..........@.....

Subject: Relatório da paciente AA

Boa tarde!

Como conversa telefónica, envio relatório em anexo.

Com os melhores cumprimentos,

FF

C...

Rua ..., Nr.º ... R/c Esq.

... ..., Vila Nova de Gaia

Tel: ...

Tlm: ...

XIII- Quanto ao documento - Relatório e Scanner Tomografia Computorizada (doc. 13, considerando os documentos juntos na P.I.) - estão aqueles datados de 25 de julho de 2022, data posterior à data da entrada da petição inicial (datada de 16/11/2021), pelo que, não poderiam ter sido juntos com a P.I., logo, objetivamente provado que, a essa data, não foi possível a sua junção.

XIV- Finalmente e quanto ao documento -Relatório consulta 2018 Dr. DD - e que só agora foi possível localizar, (doc. 14, considerando os documentos juntos na P.I.) é datado de 04/05/2018, em data efetivamente anterior à data de entrada da petição inicial. É, no entanto, um relatório, tal como o doc. 10 junto com a P.I., também do Centro Hospitalar ... e do mesmo Dr. DD, anterior a este e que entre documentação vária apenas agora se localizou (considerando que dada a semelhança se considerou serem ambos apenas e só um relatório).

XV- O Tribunal ad quo não analisou os documentos cuja admissão a Apelante requereu nem as datas dos mesmos, nem atendeu ao facto da Apelante ter indicado que o documento – Relatório consulta 2018 Dr. DD - só agora foi possível localizar, considerando sem mais, os mesmos apresentados sem justificação.

XVI - Pelo que a junção dos 3 documentos deveria ter sido, como foi, admitida, mas também considerada justificada a sua apresentação, logo, insuscetível de aplicação de multa.

XVII- Ao não considerar assim, o Tribunal a quo violou, entre outros, o disposto nos artigos 598.º, n.ºs 1 e 2 e art.º 423.º, n.º 2 do C.P.C.

XVIII - Pelo que, deve o Douto Despacho ser revogado na parte que se impugna, considerando-se que o Tribunal a quo interpretou e aplicou erradamente as normas de direito supra indicadas, e substituído por Decisão que admita o requerimento para inquirição de testemunha por legalmente admissível e tempestivo e considere tempestiva e justificada a requerida junção de documentos, logo insuscetível de aplicação de multa, com as demais consequências legais.

(…)


*

Contra-alegou o R., apresentado alegações e a final concluindo:

“(…)

2ª- A A./apelante, a fls… alegando ter sido “notificada da não realização da Audiência Prévia … ao abrigo do art.º 598º, n.º 1 do C.P.C., requerer a alteração ao requerimento probatório apresentado”, requerendo, entre outra prova, a prova testemunhal, prova essa que, salvo o devido respeito, além de intempestiva, era legalmente inadmissível, pelo que bem andou o Tribunal “a quo”, ao indeferir a inquirição da testemunha arrolada.

3ª- É que, a A./apelante a pretexto do art.º 598º, n.º 1, do C.P.Civil, vem, apresentar um novo requerimento probatório, quando é certo que, nem na p.i., nem no prazo a que alude o n.º 6, do art.º 552º, do C.P.Civil, arrolou testemunhas.

4ª- Ora, Não tendo a A., ora apelante apresentado qualquer rol de testemunhas, com a petição inicial, como o impunha o art.º 552º, n.º 6, do C.P.Civil não podia, como é bom de ver aditar ou alterá-lo, pelo que bem andou o Meritíssimo Juiz “a quo”, ao decidir:

“…impõe-se o indeferimento do requerimento para inquirição de EE, por inadmissibilidade de apresentação do primeiro rol de testemunhas após a petição inicial, ou seja, indefere-se por intempestividade (artigo 598.º, 2 do CPC, por efeito contrário).” (negrito nosso).

5ª- Veja-se, nesse sentido, o douto acórdão proferido no Proc. N.º 2449/13.0TBABF-A.E1, pelo Tribunal da Relação de Évora, em 09-07-2015: “No nCPC, o rol de testemunhas deverá ser indicado na petição, sendo que após esse momento apenas poderá ser alterado e nunca entregue ex novo, nos termos do seu artº 552º, nº 2.” (552º, n.º 2, a que corresponde o atual 552º, n.º 6, do C.P.Civil) (negrito nosso), in www.dgsi.pt.

6ª- Já quanto aos documentos juntos pelas A./apelante, atendendo a que não foi alegada, nem feita qualquer prova, de que os mesmos não puderam ser oferecidos anteriormente, até porque um documento não estava datado e os outros dois, estavam

datados de 25/07/2022 e 11/05/2018, tendo o Tribunal “a quo” – e bem – admitido a sua junção, sempre teria a A./apelante que ser condenada em multa, como o foi e o art.º

423º, n.º 2, do C.P.Civil, o impõe, não merecendo aquela condenação em multa, qualquer censura.

7ª- Como se afere do Requerimento Probatório, de Ref.ª 47215004, apresentado pela A./apelante, em 22/11/2023, esta não provou que não pôde oferecer aqueles três documentos, com a p.i., limitando-se a referir e apenas quanto ao documento junto sob

o n.º 14, “só agora foi possível localizar”, sem mais, não constituindo, tal alegação, qualquer prova da sua junção tardia.

8ª- Donde, entende o R./apelado, salvo o devido respeito, que é muito, não se verificar a propalada e invocada errada interpretação e aplicação das normas de direito, em que a A./apelante assenta o seu recurso, ou qualquer outro, devendo consequentemente ser negado provimento ao presente recurso e, em consequência, confirmando-se, integralmente, o douto despacho recorrido, como o que se fará Justiça.

9ª- Não violou, por conseguinte, o douto despacho recorrido, os art.s 598º, n. 1 e 2 e 423º, n.º 2, ambos do C.P.Civil, contrariamente ao alegado pela A./apelante.

10ª- Destarte e sem mais considerações, toda a alegação da A./apelante, vertida nas doutas alegações e conclusões de recurso, não trazem aos autos quaisquer elementos que possam infirmar, os fundamentos que subjazem à prolação do douto despacho, sendo que, o mesmo, não é passível de censura, assim se impugnando “in tottum”, a “argumentação” da A./apelante.

TERMOS EM QUE e salvo opinião mais douta, e considerando ter, o douto despacho, ora posto em crise, feito a correta aplicação do direito aos factos e NÃO MERECER QUALQUER CENSURA, DEVE CONFIRMAR-SE NA ÍNTEGRA, NEGANDO-SE PROVIMENTO AO RECURSO, ASSIM SE FAZENDO A SÃ JUSTIÇA.”


*

***


O recurso foi admitido como de apelação, a subir em separado, com efeito “devolutivo quanto ao recurso do despacho que indeferiu o meio de prova, mas com efeito suspensivo da decisão que condenou em multa processual - 647.º, 1 e 2 do Código de Processo Civil.”

*

Foram dispensados os vistos legais.

*

II- Âmbito do recurso.

Delimitado como está o recurso pelas conclusões das alegações, sem prejuízo de e em relação às mesmas não estar o tribunal sujeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito nem limitado ao conhecimento das questões de que cumpra oficiosamente conhecer – vide artigos 5º n.º 3, 608º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4 e 639º n.ºs 1 e 3 do CPC – resulta das formuladas pela apelante serem questões a apreciar:

- da admissibilidade/tempestividade do rol de testemunhas pela recorrente apresentado na sequência da notificação do despacho saneador proferido, com dispensa de audiência prévia;

- da justificação para a condenação em multa pela junção de documentos na sequência da notificação do despacho saneador proferido, com dispensa de audiência prévia.

III. FUNDAMENTAÇÃO

Para apreciação dos fundamentos de recurso e tempestividade da sua interposição, importa considerar as vicissitudes processuais acima elencadas.


*

***


Apreciando e conhecendo.

É certa a alegação do recorrido, na senda do entendimento expresso pelo tribunal a quo, de que é com a petição inicial que deve ser apresentado o rol de testemunhas – como aliás também aí deve a parte requerer todos os demais meios de prova que entenda por pertinentes – é o que resulta do disposto no artigo 552º nº 6 do CPC.

Não obstante, determina também o artigo 598º do CPC, sob a epígrafe:

“Alteração do requerimento probatório e aditamento ou alteração ao rol de testemunhas”

“1 - O requerimento probatório apresentado pode ser alterado na audiência prévia quando a esta haja lugar nos termos do disposto no artigo 591.º ou nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 593.º.

2 - O rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, sendo a parte contrária notificada para usar, querendo, de igual faculdade, no prazo de cinco dias.

3 - Incumbe às partes a apresentação das testemunhas indicadas em consequência do aditamento ou da alteração ao rol previsto no número anterior.”

Tal como resulta da análise deste normativo, reporta-se o mesmo a dois momentos processuais.

O primeiro, a que corresponde o nº 1, respeita à faculdade concedida à parte de alterar o seu requerimento probatório sem menção a qualquer restrição quanto à alteração introduzida – na audiência prévia - quando a esta haja lugar, nos termos do artigo 591º, ou nos termos do artigo 593º nº 3 do CPC.

O segundo, a que correspondem os nºs 2 e 3 do mesmo artigo, preveem a faculdade concedida à parte de aditar ou alterar ainda o rol de testemunhas, até ao prazo de 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, incumbindo em tal caso à parte que procede a tal alteração ou aditamento, o ónus de apresentar as testemunhas que então indique.

O mesmo é dizer que na segunda situação prevista nos nºs 2 e 3 do artigo 598º do CPC, é pressuposto da sua aplicação que exista já um rol de testemunhas que vai ser alterado ou aditado.

Ao invés da primeira situação a que respeita o nº 1 do mesmo artigo 598º, de acordo com o qual e sem qualquer restrição, permitiu o legislador às partes alterar o requerimento probatório que inicialmente / anteriormente tenham apresentado. Sem qualquer limitação quanto ao tipo de prova que está em causa, à que inicialmente indicaram e à que no momento em causa pretendem passar a ver considerado.

Seja a indicação pela primeira vez de um rol de testemunhas. Seja a junção de prova documental.

Consequentemente, em sede de audiência prévia e em aplicação do previsto no nº 1 do artigo 598º do CPC, podem as partes sem limitação proveniente do anteriormente requerido aquando da apresentação dos seus articulados, alterar os respetivos requerimentos probatórios, incluindo arrolando pela primeira vez prova testemunhal[1].

Caso tenha ocorrido, por decisão do tribunal, dispensa da realização da audiência prévia, não podem as partes ser penalizadas e limitadas no seu direito de proceder à alteração dos requerimentos probatórios que a lei consagrou com a abrangência acima já indicada (sem prejuízo da limitação decorrente do valor da ação não superior a metade da alçada da Relação, a que se reporta o artigo 597º do CPC).

Motivo por que e não sendo requerida a realização de audiência prévia no prazo de 10 dias após a notificação do despacho que dispensou a realização daquela (vide artigo 593º nº 3 do CPC), tem a parte o prazo geral de dez dias para fazer uso de tal direito.

Subjacente à possibilidade de alteração do requerimento probatório em sede de audiência prévia, está a fixação do objeto do litígio e o elencar dos temas da prova aquando da prolação do despacho saneador, que poderão justificar para as partes a necessidade de alterar o seu requerimento probatório, incluindo a indicação ex novo de um rol de testemunhas.

O que poderão fazer no prazo de dez dias – prazo igual ao previsto para requerer a realização de audiência prévia antes dispensada (quando for o caso), nos termos do artigo 593º nº 3 do CPC.

Neste sentido se pronunciou Lebre de Freitas in “A ação declarativa comum”, 4ª edição de 2017, p. 206, citado no Ac. TRC de 15/01/2019, nº de processo 1178/16.7T8CLD.C1 in www.dgsi.pt, conforme trecho que aqui se deixa reproduzido:

“a parte pode alterar o requerimento probatório no prazo geral de 10 dias contados do despacho em que lhe é dado conhecimento da fixação dos temas de prova com dispensa da audiência prévia, pois “não se justificaria que que o direito das partes à alteração do requerimento probatório precludisse com a dispensa da audiência prévia”, até porque “Normas como as que fazem coincidir a preclusão com a prática dum ato ou com o termo, ou certo momento, duma diligência determinada (exs.: art. 3-4; art. 198-1; art. 199-1, l.ª parte; art. 200-2; art. 358-1; arts. 588-3, 611-1 e 729-g; art. 423-2) revestem carácter específico. Na falta duma norma dessas, nenhuma norma processual geral impõe a preclusão. No caso considerado, ela traduzir-se-ia numa desigualdade entre a parte que é convocada para a audiência prévia e a que não é, tido em conta que a pretensão de alteração do requerimento de prova não pode fundar reclamação que leve à realização da audiência dispensada. A faculdade de alteração dos requerimentos probatórios é concedida nesta fase por só nela o juiz enunciar os temas da prova e a enunciação deles fora da audiência prévia equivaler à sua enunciação dentro dela”.

Ac. em que igualmente se citou o Prof. Miguel Teixeira de Sousa in “Questões sobre matéria da prova no nCPC”, publicado em 1/3/2014 no blog do IPPC, como defensor da mesma posição, ainda que entendendo ser aplicável o prazo de 20 dias, analogia com o prazo previsto no artigo 598º nº 2 do CPC.

A nosso ver, por em causa estar a alteração do requerimento probatório (e não a diversa situação prevista nos nºs 2 e 3 do artigo 598º restrita ao rol de testemunhas), em situação não diretamente prevista na lei e que irá contender com a própria programação dos atos a realizar na audiência final já determinada nos termos previstos no nº 2 al. d) do artigo 593º, entendemos que o prazo geral de 10 dias (quando expressamente não tenha sido pelo tribunal fixado prazo superior), coincidindo também com o prazo para requerer a realização de audiência prévia quando as partes são notificadas dos despachos proferidos na sequência da decisão de dispensa da audiência prévia – vide artigo 593º nº 3 do CPC – é o que mais se adequa à tramitação processual em curso em tal fase processual.

Motivo por que se tem de concluir tempestivamente ter in casu a recorrente apresentado requerimento de alteração do requerimento probatório[2].

Determinando a admissibilidade do rol de testemunhas apresentado.

Precisamente com base nos mesmos argumentos e porquanto a junção de novos documentos se enquadra na alteração do requerimento probatório, admissível ao abrigo do circunstancialismo vindo de analisar, por referência ao previsto no artigo 598º nº 1 do CPC, inexiste igualmente fundamento para condenar a parte em multa pela junção tardia de prova documental.

Termos em que procede in totum o recurso apresentado.


***

IV. Decisão.

Pelo exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em julgar procedente o recurso interposto, decidindo revogar a decisão recorrida na parte em que não admitiu o rol de testemunhas que vai admitido.

Assim como na condenação da recorrente em multa pela junção tardia de documentos, que se revoga.

Custas pelo recorrido.


*

Porto, 2024-10-07
Fátima Andrade
Miguel Baldaia de Morais
Mendes Coelho
________________
[1] Neste sentido se decidiu, entre outros, no Ac. TRL de 30/03/2023, nº de processo 20041/20.0T8LSB-A.L1-6; Ac. TRP de 07/11/2019, nº de processo 3338/17.4T8AVR-A.P1 e Ac. TRP de 10/07/2024 (ainda que em situação de suspensão da audiência prévia) nº de processo 19480/22.7T8PRT-A.P1, todos in www.dgsi.pt
[2] Note-se que as partes foram notificadas do despacho saneador proferido na sequência da dispensa da realização da audiência prévia a 10/11, pelo que se consideram notificadas a 14/11 (vide o disposto no artigo 248º nº 1 do CPC), implicando que o requerimento da recorrente apresentado a 22/11/23 o foi em respeito pelo prazo geral de 10 dias.