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PROVIDÊNCIA CAUTELAR DE SUSPENSÃO DE DELIBERAÇÕES SOCIAIS
REQUISITOS
DANO APRECIÁVEL
FINANCIAMENTO ATRAVÉS DE SUPRIMENTOS
AUMENTO DE CAPITAL SOCIAL
Sumário
1. O decretamento da providência cautelar de suspensão de deliberações sociais pressupõe o preenchimento cumulativo de alguns requisitos: - a existência de uma deliberação inválida da sociedade, por violação da lei, dos estatutos ou do contrato; - que o requerente seja sócio ou associado da pessoa coletiva - que a deliberação não tenha sido ainda executada: - e que resulte dessa deliberação a produção de um dano apreciável. 2. A alegação de que, no aumento de capital por incorporação de suprimentos, não foram aportados novos meios financeiros à sociedade, correspondendo, antes, a uma mera operação contabilística e, como tal, meramente nominal, sendo certo que face à situação da empresa, o que a mesma necessitaria era de entradas de capital efetivo, não constitui fundamento idóneo ao preenchimento dos requisitos dos quais depende o decretamento da providência requerida. 3. O dano apreciável (na perspetiva do recorrente) que justificaria o decretamento da providência, seria prevenido a montante pela sua proatividade e/ou de qualquer outro acionista nisso interessado, evitando uma compressão na percentagem relativa da sua participação, mediante a realização de uma entrada em dinheiro, dado não ser titular de suprimentos, em valor que lhe permita assegurar a percentagem da sua “quota de participação”.
Texto Integral
Acordam na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães I – Relatório:
AA residente na Rua ..., ..., intentou a presente providência cautelar de suspensão de deliberações sociais contra EMP01..., SA, com sede na Rua ..., ..., ..., ... peticionando que sejam suspensas as seguintes deliberações tomadas, sob os pontos sete e oito, na Assembleia Geral da Requerida do passado dia 03.10.2023:
1. “Aumento do capital social no montante de 3.000.000,00 euros (três milhões de euros), por novas entradas em espécie, correspondentes à conversão de 3.000.000,00 euros (três milhões de euros) de suprimentos prestados pela acionista EMP02..., SA, passando o capital social dos atuais 1.350.000,00 euros para 4.350.000,00 (…), nos seguintes termos:
a) Modalidade do aumento de capital: por novas entradas;
b) Montante do aumento de capital: 3.000.000,00 euros (três milhões de euros);
c) Montante nominal das novas participações: 1 euro (um euro) cada ação;
d) Natureza da nova entrada: espécie (conversão de suprimentos);
e) Prazo dentro do qual a entrada deve ser efetuada: de imediato;
f) Pessoas que participarão nesse aumento: participa neste aumento de capital a acionista EMP02..., S.A., que subscreve 3.000.000 (três milhões) de novas ações, com o valor nominal de 1 euro (um euro) cada uma, correspondente ao valor nominal de 3.000,000,00 (três milhões de euros).”
2. Alteração da “…redação a dar aos números um e dois do Artigo Cinco do Pacto Social, na parte em que fazem referências às mencionadas cifras, mantendo-se o demais texto inalterado, nos termos seguintes:
Artigo Cinco
(Capital Social)
um – O capital social é de EUR. 4.350.000 (quatro milhões trezentos e cinquenta mil euros), integralmente subscrito e realizado.
dois – O capital social está dividido em 4.350.000 ações, com o valor nominal de um euro, cada uma.
três – mantém-se.
quatro – mantém-se.
cinco – mantém-se.
seis – mantém-se.”
Também foi requerida a suspensão deliberações com inversão do contencioso, nos termos e para os efeitos do disposto nos 369.º e 382.º, ambos do CPC, com todas as consequências legais, incluindo a respetiva inscrição na Conservatória do Registo Comercial da Requerida, em conformidade com os arts. 9º, al h), e 15º, nº 5, incluindo a respetiva publicação prevista no art. 70º, nº 1, al. d), todos do Código do Registo Comercial.
A requerida deduziu oposição impugnando os fundamentos do decretamento da providência requerida e concluindo pela sua improcedência.
Foi realizada audiência final.
Nessa sequência veio a ser prolatada sentença com o seguinte dispositivo:
“Julga-se a presente providência cautelar de suspensão de deliberações sociais improcedente absolvendo-se a requerida da mesma. Indefere-se a inversão do contencioso. Custas pelo A. Registe e Notifique.”
Inconformado com a decisão, o requerente apelou, formulando as seguintes conclusões:
1. A deliberação social cuja suspensão é objeto dos presentes autos traduz-se num aumento de capital que não aporta novos meios financeiros à sociedade, correspondendo antes a uma mera operação contabilística e, como tal, meramente nominal.
2. Tendo em conta, não só a situação económico-financeira da EMP01..., SA, mas igual e principalmente as suas necessidades de “dinheiro vivo” para que a sua unidade industrial de biodiesel atinja a capacidade de produção instalada, temos que o interesse da EMP01... SA apenas se satisfaria com um aumento de capital efetivo, realizado por novas entradas em dinheiro, já que só através dele existirá um incremento real e material do património da sociedade, a que corresponderá um efetivo dispêndio de dinheiro por parte dos seus acionistas.
3. A EMP01... encontra-se numa situação de capitais próprios negativos, carecendo de novos meios financeiros a serem aportados pelos seus acionistas, e não de uma mera operação contabilística de conversão daqueles que já entraram na sociedade - e que já foram por ela gastos na sua atividade - em capital social, operação contabilística esta que, aliás, nunca foi prevista aquando da celebração dos acordos que presidiram à constituição da Requerida EMP01... e que se encontram juntos aos autos, os quais obrigavam a EMP02... a financiá-la através de suprimentos.
4. Através da deliberação cuja suspensão é objeto dos presentes autos, o Grupo EMP02... não teve em vista o prosseguimento do interesse da EMP01..., mas apenas o seu, consubstanciado em aumentar exponencialmente a sua percentagem no capital social da Requerida para mais de 84% do seu capital social, sem aportar mais dinheiro para a Sociedade, servindo-se de uma boa parte dos meios financeiros que nela havia injetado, em conformidade com os Acordos que celebrou com o Requerente e que estiveram na génese da sua constituição, que assim saem violados.
5. Para se poder ponderar se …”o prejuízo resultante da suspensão seja superior ao que pode derivar da execução”, há necessidade de aditar um novo ponto à matéria de facto provada, com a seguinte redação:
“Previamente à deliberação de aumento de capital por conversão de suprimentos cuja suspensão é objeto dos presentes autos, os acionistas não foram ouvidos nem chamados a pronunciar-se sobre se estavam disponíveis para aportarem mais capital social para a sociedade”,
6. Facto este que, apesar de não ter sido alegado pelas partes, configura facto complementar / acessório resultante da instrução, com relevância para a decisão da causa e, por isso, pode (e deve) ser tido em consideração [cfr. art. 5.º, n.º 2, als. a) e b) do CPC)],
7. E que assenta no depoimento prestado pela testemunha BB - administrador da acionista EMP02..., SA e exclusiva beneficiária da deliberação a suspender -, na sessão da audiência de discussão e julgamento realizada em 20.02.2024, conforme se encontra gravado através do sistema integrado de gravação digital, designadamente quando ouvido aos minutos 58.56 e ss, e 59:52 e ss.
8. Tendo em conta que os supra referidos interesses da Requerida, prima facie, preenchem-se com novos aportes de dinheiro por parte dos acionistas, haveria que, previamente à deliberação em causa nos autos, ter-lhes sido questionado sobre se o pretendiam fazer, sendo que, apenas na eventual negativa se poderia indiciar que do seu decretamento resulta …”um dano superior ao passível de ser obtido com o decretamento da providencia”.
9. Como resulta deste novo facto que deverá ser aditado aos factos provados, a verdade é que nunca foi perguntado ao Requerente se estava ou não na disposição de proceder a esse mesmo aporte de capital para a Requerida, podendo mesmo afirmar-se que, como decorre do depoimento da testemunha BB - , SA e exclusiva beneficiária da deliberação a suspender -, tal não seria do interesse da acionista EMP02..., já que inviabilizaria o seu plano de ficar com mais de 84% do capital social de Requerida.
10. Apenas com o decretamento da suspensão da deliberação em causa na presente providencia se consegue satisfazer o interesse da Requerida - que manifestamente é o do aumento do seu capital social através de novas entradas -, sendo que, só se os acionistas eventualmente viessem a manifestar a sua indisponibilidade para o efeito, é que, então sim, teríamos de concordar com a ponderação dos prejuízos realizada na douta Sentença recorrida, já que restaria à Requerida a solução do aumento do seu capital social por conversão de suprimentos, por forma a evitar males maiores.
11. A douta Sentença recorrida violou, designadamente, os comandos do art. 381º, nº 2 do CPC, bem como os do art. 58º, nº 1, als. a) e b) do CSC., sendo igualmente a douta Sentença ferida de nulidade, em conformidade com o disposto na al. c) do nº 1 do art. 615º do CPC.
Foram apresentadas contra-alegações pugnando pela manutenção do decidido.
Foi prolatada decisão sumária em 16 de julho de 2024 que julgou o recurso improcedente.
O recorrente reclamou para a conferência, pedindo a prolação de acórdão.
Os autos foram aos vistos dos excelentíssimos adjuntos.
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II – Questões a decidir:
Nos termos do disposto nos artºs 608º, nº2, 609º, nº1, 635º, nº4, e 639º, do CPC, as questões a decidir em sede de recurso são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo daquelas que o tribunal deve conhecer oficiosamente, não sendo admissível o conhecimento de questões que extravasem as conclusões de recurso, salvo se de conhecimento oficioso.
As questões a decidir são, assim, apurar:
- ......
- da verificação dos pressupostos de decretamento da requerida providência.
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III – Fundamentação:
A. Fundamentos de facto:
1. A Requerida, EMP01..., SA, é uma sociedade comercial anónima que tem como objeto a fabricação de biodiesel e valorização de resíduos não metálicos.
2. Tendo um capital social de € 1.350.000,00, integralmente subscrito e realizado, dividido em 1.350.000 ações nominativas, no valor nominal de € 1,00 cada, assim formalmente distribuídas:
a) EMP02..., SA, NIPC ...09, com sede na R. ..., Frações ... e ..., ... ..., ..., titular de 688.250 ações, representando 50,98% do capital social (de ora em diante, conjuntamente com os acionistas identificados em d) e e) infra, também designada por Grupo EMP02...);
b) CC, solteiro, maior, contribuinte fiscal nº ...46, residente na R. dos ..., ... ..., titular de 330.750 ações, representando 24,50% do capital social;
c) O A. AA é titular de 330.750 ações, representando 24,50% do capital social;
d) DD, casado, contribuinte fiscal nº ...29, residente em .... ..., nº ...2, ..., ..., titular de 125 ações, representando 0,01% do capital social (de ora em diante, conjuntamente com os acionistas identificados em a) supra e e) infra, também designado por Grupo EMP02...);
e) EE, casado, contribuinte fiscal nº ...20, residente na R. ..., ... ..., titular de 125 ações, representando 0,01% do capital social (de ora em diante, conjuntamente com os acionistas identificados em a) e d) supra, também designado por Grupo EMP02...).
3. No dia 27 de abril de 2023, realizou-se na sede da Requerida uma Assembleia Geral de Acionistas, para o efeito convocada, com a seguinte Ordem de Trabalhos:
“Ponto Único: Deliberar sobre a designação de Revisor Oficial de Contas sem interesses na Sociedade, para elaboração do Relatório previsto no art. 28º do Código das Sociedades Comerciais, tendo por objeto os suprimentos prestados por EMP02..., SA, tendo em vista um subsequente aumento do capital social por conversão de suprimentos.”
Nesta Assembleia Geral, todos os acionistas supra identificados estiveram presentes ou representados, pelo que esteve representada a totalidade do capital social.
3. Tendo sido apresentada pelo representante do acionista Sr. Dr. EE, uma proposta de …”designação da sociedade de revisores oficiais de contas «FF, GG e Associado, Sociedade de Revisores Oficiais de Contas», inscrita na Ordem dos Revisores Oficiais de Contas sob o nº 131, e inscrita na CMVM sob o nº ...47, com sede na Rua ..., ..., ..., pessoa coletiva nº ...80, representada por HH, inscrito na Ordem dos Revisores Oficiais de Contas sob o nº ...54 e na CMVM sob o nº ...64, casado, com domicilio profissional na Rua ..., ..., ..., ou, por, FF, inscrito na Ordem dos Revisores Oficiais de Contas sob o nº 753 e na CMVM sob o nº ...86, casado, com domicilio profissional na Rua ..., ..., ..., sem interesses na Sociedade, como sociedade revisora de contas responsável pela elaboração do relatório previsto no art. 28º do Código das Sociedades Comerciais, tendo por objeto os suprimentos prestados por EMP02..., SA, tendo em vista um subsequente aumento do capital social por conversão de suprimentos.”.
4. No âmbito desta deliberação, o representante dos …”acionistas EMP02..., SA e do Senhor DD, declarou que não votará a proposta apresentada no âmbito do ponto único da ordem de trabalhos”.
5. Mas igual declaração não foi efetuada pelo representante do acionista Sr. Dr. EE.
6. Pelo que tal Proposta foi considerada aprovada pelos votos a favor desse mesmo acionista e do acionista CC, tendo o Requerente votado contra.
7. Se este acionista, Sr. Dr. EE, através do seu representante, não tivesse sido admitido a votar a Proposta em causa não teria sido considerada aprovada, posto que, dado o A. e o acionista CC, terem o mesmo número de ações no capital da Requerida.
8. O resultado da votação seria sempre um empate com a consequente não aprovação da Proposta.
9. O Requerente, com o concurso do supra identificado CC, estava a construir, nas instalações da sociedade comercial designada por EMP03... - Unipessoal, Lda, com o NUIPC ...14, da qual o Requerente é o único sócio e gerente, uma fábrica de biodiesel.
10. Tendo sido contactados, no final de 2018 por um colaborador do Grupo EMP02..., de nome II, que para esse mesmo Grupo se encontrava a fazer prospeção de novos negócios e de áreas de investimento.
11. O qual se mostrou interessado nesta área estratégica de negócio relacionada com o ambiente, razão pela qual as conversações evoluíram para negociações, que se foram desenvolvendo e aprofundando com a intervenção de outros Colaboradores do Grupo EMP02..., sendo que, a partir de Março de 2019, após o Sr. DD ter sido pessoalmente apresentado ao Requerente e ao supra identificado CC, a representação do Grupo EMP02... passou a ser efetuada com o Sr. Dr. EE.
12. O Requerente, o Grupo EMP02... avaliou positivamente o investimento tendente à constituição da sociedade Requerida, que visava, no imediato, a conclusão da construção e exploração da suprarreferida fábrica de biodiesel.
13. Sendo que no dia 02.04.2019 ocorreu uma visita às instalações, com a presença do Sr. DD e do Sr. Dr. EE, na qual foi verificado o local, bem como a máquina que então estava parcialmente construída, tendo sido abordados alguns detalhes da materialização da operação.
14. Designadamente que ambos estes interlocutores do Requerente iriam ser formalmente acionistas da sociedade a criar - ie, a ora requerida -, com uma fração muito pequena do capital da empresa, e apenas para se obter os cinco sócios necessários para a constituição de uma Sociedade Anónima.
15. Na qual o Grupo EMP02... seria titular de ações representativas de 51% do capital social, enquanto o bloco formado pelo A. e pelo Sr. CC, seria titular de ações representativas de 49% do capital social.
16. Sendo que a acordada atribuição da maioria do capital social da Requerida ao Grupo EMP02..., teve na sua génese a sua grande capacidade financeira para o sucesso do investimento.
17. Posto que para tanto havia necessidade de injetar vários milhões de euros na conclusão do projeto e respetiva exploração, o que o Grupo EMP02... se comprometeu a efetuar.
18. E com vista à criação da Requerida, o Requerente negociou com o referido Sr. Dr. EE, na invocada qualidade, todos os aspetos relativamente à formalização da sua constituição - o qual, contudo, nunca participou em qualquer discussão referente à sua atividade, às decisões financeiras ou quaisquer outras que foram necessárias consensualizar.
19. Tendo sido constituída a sociedade Requerida, na qual a sociedade EMP02..., SA, ficou com 25.250 ações, tendo as remanescentes 250 ações que cabiam ao Grupo EMP02..., sido divididas em dois lotes de 125 ações cada.
20. Ficando o Sr. DD com um, e o outro em nome do Sr. Dr. EE - que, aliás, integra o Comité de Ética e Conduta da identificada EMP02..., SA, e nela era titular igualmente, pelo menos à data, do cargo de Secretário da Sociedade -, que assim formalmente figuram como respetivos titulares.
21. Sendo as remanescentes 24.500 ações divididas em dois lotes de 12.250 ações cada, que foram subscritas, respetivamente, um pelo Requerente e outro pelo Sr. CC.
22. Como corolário deste mesmo acordo entre as partes, foi consensualizado entre o Grupo EMP02... e o Requerente, que o Conselho de Administração da Requerida seria composto por cinco Administradores, cabendo ao Grupo EMP02... a indicação de três deles, e ficando os remanescentes dois reservados para o Requerente e para o Sr. CC.
23. Sendo que os três Administradores indicados pelo Grupo EMP02... constituiriam um Grupo, e o Requerente e o Sr. CC constituiriam o outro Grupo.
24. Pelo que a Sociedade só se obrigaria pela assinatura conjunta de um Administrador de cada Grupo.
25. O que foi efetivamente materializado aquando da respetiva formalização e, como tal, ficou devidamente registado na Conservatória do Registo Comercial.
26. Posto que a Requerida obriga-se, ab initio, pela assinatura conjunta de um Administrador de cada um dos Grupos.
27. Até à Assembleia Geral identificada em supra, este acordo de divisão do capital social da Requerida, bem como da sua gestão, designada e especificamente no que respeita à sua vinculação, tinha vindo a ser cumprido por estes três protagonistas supra identificados.
28. Os quais mantiveram esta acordada repartição do capital social quando, em maio de 2020, procederam ao aumento do capital social da Requerida para o montante de € 1.350.000,00.
29. O qual foi apenas subscrito pela EMP02..., SA, pelo Sr. CC e pelo Requerente.
30. O Sr. Dr. EE estava completamente integrado no Grupo EMP02....
31. Pretendendo diluir a participação social do Requerente no capital da Requerida, já que os atuais 24,5% que este detém no seu capital, passariam certamente para menos de
10%, bem como (ii) aumentar a correspondente participação social do Grupo EMP02... para mais de 80% desse mesmo capital social.
32. Ficando assim com uma maioria qualificadíssima no capital social da Requerida, que lhe permitiria, sem necessidade de prévios consensos, exercer sobre a Requerida um poder absoluto tal, que passaria a poder decidir autonomamente toda a vida social, incluindo “…a alteração do contrato de sociedade, fusão, cisão, transformação, dissolução”… .
33. Já que, como aliás consta da Proposta em causa, o Relatório a elaborar tinha …” em vista um subsequente aumento do capital social por conversão de suprimentos”.
34. Suprimentos estes que, pese embora o Requerente não os conseguisse sequer mensurar - posto que não tinha nem tem acesso à contabilidade da Requerida -, imaginava que pudessem atingir mais de dois milhões de euros - o que, se veio a confirmar pecar por defeito.
35. Sendo certo que, sem o voto do Sr. Dr. EE, a deliberação sub judice não seria aprovada.
36. A verdade é que o Presidente da Assembleia Geral da Requerida convocou uma nova Assembleia Geral, que ocorreu no passado dia 3 de outubro de 2023, pelas 15 h, na sede social, com a seguinte Ordem de Trabalhos:
“Um: apreciar e deliberar sobre o relatório de gestão e contas do exercício de 2021; Dois: apreciar e deliberar sobre uma proposta de aplicação de resultados do exercício de 2021; Três: com referência ao exercício de 2021, proceder à apreciação geral da administração e fiscalização da sociedade; Quatro: apreciar e deliberar sobre o relatório de gestão e contas do exercício de 2022; Cinco: apreciar e deliberar sobre uma proposta de aplicação de resultados do exercício de 2022; Seis: com referência ao exercício de 2022, proceder à apreciação geral da administração e fiscalização da sociedade; Sete: Deliberar sobre um aumento de capital, no montante de 3.000.000,00 (três milhões de euros) de suprimentos prestados pelo acionista EMP02..., SA, que foram objeto, previamente, de relatório elaborado por revisor oficial de contas sem interesses na sociedade, nos termos do disposto no art. 28º do Código das Sociedade Comerciais, sendo criadas 3.000.000 (três milhões) de novas ações, com o valor nominal de 1 € (um euro) cada uma, a atribuir ao acionista EMP02..., SA, titular do referido crédito de suprimentos que será convertido em capital; Oito: alteração, subsequente ao ponto anterior, dos números 1 e 2 do art. 5 do pacto social; Nove: deliberar sobre a destituição com justa causa de todos os membros do conselho de administração com exceção do administrador AA, ou seja, JJ, KK, LL e CC.” (cfr. Doc. nº 3 que ao diante se junta e aqui se dá por integralmente reproduzido para os legais efeitos).
37. Sendo que, apesar de na Convocatória ser referido que a mesma decorria de uma …“solicitação dos acionistas AA”… aqui Requerente, a verdade é que este apenas a requereu a respetiva convocação para apreciação e votação do ponto nove dela constante.
38. Nesta Assembleia Geral sub judice, estiveram presentes e ou representados todos os acionistas, sendo que os acionistas Sr. DD e EMP02..., S.A. foram nela representados pelo Sr. BB.
39. No ponto sete da Ordem de Trabalhos: …“o Sr. BB (em representação da acionista EMP02..., SA., parêntesis nosso), propôs o aumento do capital social no montante de 3.000.000,00 euros (três milhões de euros), por novas entradas em espécie, correspondentes à conversão de 3.000.000,00 euros (três milhões de euros) de suprimentos prestados pela acionista EMP02..., SA, passando o capital social dos atuais 1.350.000,00 euros para 4.350.000,00.”.
40. ” Submetida à votação a proposta do aumento do capital no montante de 3.000.000,00 euros (três milhões de euros), passando dos atuais 1.350.000,00 (um milhão trezentos e cinquenta mil euros) para 4.350.000,00 euros (quatro milhões, trezentos e cinquenta mil euros), votaram a favor os acionistas EMP02..., SA, CC, DD e EE e votou contra o acionista AA. Em função dos votos expressos, a proposta do aumento do capital social foi aprovada por maioria qualificada dos votos emitidos, nos seguintes termos:
a) Modalidade do aumento de capital: por novas entradas;
b) Montante do aumento de capital: 3.000.000,00 euros (três milhões de euros);
c) Montante nominal das novas participações: 1 euro (um euro) cada ação;
d) Natureza da nova entrada: espécie (conversão de suprimentos);
e) Prazo dentro do qual a entrada deve ser efetuada: de imediato;
f) Pessoas que participarão nesse aumento: participa neste aumento de capital a acionista EMP02..., S.A., que subscreve 3.000.000 (três milhões) de novas ações, com o valor nominal de 1 euro (um euro) cada uma, correspondente ao valor nominal de 3.000,000,00 (três milhões de euros).”
41. “De seguida, passando-se para o ponto oito da ordem de trabalhos, e como consequência da deliberação anteriormente tomada, que alterou o valor do capital social e o número de ações, foi proposta a correspondente redação a dar aos números um e dois do Artigo Cinco do Pacto Social, na parte em que fazem referências às mencionadas cifras, mantendo-se o demais texto inalterado, nos termos seguintes:
Artigo Cinco
(Capital Social)
um – O capital social é de EUR. 4.350.000 (quatro milhões trezentos e cinquenta mil euros), integralmente subscrito e realizado.
dois – O capital social está dividido em 4.350.000 ações, com o valor nominal de um euro, cada uma.
três – mantém-se.
quatro – mantém-se.”
cinco – mantém-se.
seis – mantém-se.”
42. “Submetida à votação a proposta de alteração da redação a dar aos números um e dois do Artigo Cinco do Pacto Social, votaram a favor os acionistas EMP02..., SA, CC, DD e EE e votou contra o acionista AA. Em função dos votos expressos, a proposta da supra referida redação dos números um e dois do Artigo Cinco do Pacto Social foi aprovada por maioria qualificada dos votos emitidos.” Sendo que nesta, ao invés de naquela, os acionistas EMP02..., SA e DD, através do seu representante, não anunciaram o seu impedimento de voto.
43. Pois que, como resulta da respetiva Ata supra junta, conjuntamente com o acionista Dr. EE, todos os acionistas que formam o identificado Grupo EMP02... votaram o aumento de capital da Requerida e a alteração do seu Pacto Social.
44. Caso estes acionistas do Grupo EMP02... não tivessem sido admitidos a votar, o resultado de ambas as votações seria a não aprovação das propostas contidas nos pontos números sete e oito da ordem de trabalhos, não só por ausência da necessária maioria qualificada, como igualmente pelo empate a que a votação teria conduzido, já que neles o A. votou contra e o acionista Sr. CC votou a favor, tendo ambos o mesmo número de votos.
45. Tal diluiu a participação social do Requerente no capital da Requerida, já que os atuais 24,5% que este detém no seu capital, passam para menos de 7,6%, bem como aumentam a correspondente participação social do Grupo EMP02... para mais de 84% desse mesmo capital social.
46. Ficando assim o Grupo EMP02... com uma maioria qualificadíssima no capital social da Requerida, que lhe permitiria, sem necessidade de prévios consensos, exercer sobre a Requerida um poder absoluto tal, que passaria a poder decidir autonomamente toda a vida social.
47. Incluindo a possibilidade de, sem a necessidade dos votos dos demais acionistas, proceder à alteração total e ou parcial do Pacto Social da Requerida, incluindo, designadamente, a alteração da sua forma de vinculação - que passaria exclusivamente a ser detida pelo Grupo EMP02... -, bem como decidir sobre a sua fusão, cisão, transformação ou dissolução.
48. Até porque na Assembleia Geral sub judice, esse mesmo representante da acionista EMP02..., SA, invocou, além do mais, uma informação financeira da Requerida reportada a julho de 2023 que, se existisse, necessariamente teria de ter sido previamente objeto de analise pelo Conselho de Administração da Requerida.
49. O requerimento apresentado pelo Requerente e dirigido ao Presidente da Assembleia Geral e demais Sócios da Requerida, de convocação da sua Assembleia Geral para …”deliberar sobre a destituição com justa causa de todos os membros do conselho de administração com exceção do administrador AA, ou seja, JJ, KK, LL e CC” consta do ponto nove da Ordem de Trabalhos da Assembleia Geral sub judice.
50. O Requerente deu o seu aval num dos contratos de financiamento contraídos pela Requerida, contrato este que se mantém em vigor.
51. A REQUERIDA EMP01... S.A., é uma sociedade comercial anónima constituída em 19/04/2019, tendo como objeto social a fabricação de biodiesel, tendo o capital social de € 1.350.000,00 (um milhão trezentos e cinquenta mil euros).
52. À data da deliberação de aumento de capital posta em crise nos autos, a REQUERIDA tinha como acionistas a sociedade comercial anónima EMP02..., S.A. (com ações representativas de 50,98% do capital social da REQUERIDA), o REQUERENTE AA (com ações representativas de 24,50% do capital social da REQUERIDA), o Sr. CC (com ações representativas de 24,50% do capital social da REQUERIDA), o Dr. EE (com ações representativas de 0,01 % do capital social da REQUERIDA) e o Sr. DD (com ações representativas de 0,01% do capital social da REQUERIDA).
53. A acionista EMP02..., S.A. (doravante EMP02...) é uma sociedade comercial anónima constituída em 08/07/1998, tendo como objeto social a construção de estradas, vias férreas e instalações desportivas; construção de edifícios: construção e engenharia civil, construção de coberturas; engenharia hidráulica; outras obras especializadas de construção, demolição e terraplanagens, perfuração e sondagens, instalações elétricas, obras de isolamento, aluguer de equipamentos de construção e de demolição com operador, compra e venda de bens imobiliários, fornecedor de obras públicas. Atividades de consultoria, científicas, técnicas e similares. Transporte rodoviário de mercadorias.
54. O requerente AA é publicamente conhecido no âmbito do desenvolvimento de tecnologias de produção de biodiesel.
55. O REQUERENTE AA é sócio único e gerente da sociedade comercial EMP03..., Unipessoal, Lda. (doravante sociedade EMP03...) que é uma sociedade comercial por quotas tendo por objeto a pesquisa, desenvolvimento, importação, exportação e comércio de máquinas e equipamentos utilizáveis em processos de transformação de energias renováveis. Promoção da produção ou importação, distribuição, comércio e da utilização de biocombustiveis e outros combustíveis renováveis e produtos similares e derivados.
56. À data da constituição da REQUERIDA EMP01..., o REQUERENTE AA e o acionista da REQUERIDA Sr. CC, encontravam-se a desenvolver e a construir uma refinaria de biodiesel na ... ainda que a mesma nesse momento se encontrasse parada.
57. Nessa altura, tendo em conta a planeada expansão de negócios da acionista EMP02... para o ramo da energia, os mesmos (REQUERENTE AA e CC) apresentaram o plano de negócios associado à dita refinaria de biodiesel, com vista a que a referida acionista EMP02... realizasse o investimento necessário à concretização do dito projeto, uma vez que, segundo aqueles, os mesmos não dispunham dos recursos financeiros para tal desiderato.
58. Nessa altura, e segundo os mesmos, o projeto já estava concebido e parte dos equipamentos já estariam instalados, e o REQUERENTE AA procurava investidores para o projeto da refinaria, tendo apresentado um business plan (da lavra do REQUERENTE AA) que previa alterações à perspetiva inicial.
59. A REQUERIDA foi constituída com vista à prossecução do agora projeto comum dos seus acionistas.
60. E foram elaborados um Acordo de Parceria Comercial e Acordo Parassocial celebrado entre os acionistas, aquando da sua constituição.
61. O REQUERENTE AA liderou a apresentação da proposta comercial à acionista EMP02..., referindo o pioneirismo da tecnologia na Europa que se encontrava a desenvolver na dita refinaria, referindo que a mesma se encontrava na vanguarda deste tipo de processos produtivos, sendo a mesma extremamente eficiente, e capaz de gerar uma elevada rentabilidade.
62. Não obstante a experiência da acionista EMP02... no mercado em geral, cumpre referir que a mesma não dispunha de conhecimentos privilegiados no ramo da energia, nem de capital humano com experiência na referida área de negócios, sendo esta uma nova realidade a que se dispôs, então, a investir.
63. O mesmo REQUERENTE AA, em 2019, referiu, igualmente, que, não obstante o avultado investimento necessário (que não conseguia ele próprio aportar), a unidade de produção encontrava-se a poucos meses de se encontrar apta a iniciar a sua produção (e com isso capaz de gerar rendimentos).
64. Tendo em conta o referido supra, as partes celebraram, em 15/04/2019 os referidos acordos.
65. Tal acordo, destinou-se, inter alia, a formalizar o objeto social da REQUERIDA EMP01... tendente à exploração da refinaria de biodiesel localizada na ..., bem como a estabelecer as premissas em que cada uma das partes assentou a sua vontade de contratar, bem como assim as obrigações das partes na concretização/desenvolvimento do projeto.
66. Aquando da sua constituição, a REQUERIDA EMP01... tinha o seu capital social (de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) inteiramente realizado em dinheiro) dividido da seguinte forma:
a. Uma participação com o valor nominal de € 25.250,00 (vinte e cinco mil duzentos e cinquenta euros), equivalente a 50,5% do capital social, detida pela acionista EMP02...,
b. Uma participação com o valor nominal de € 12.250,00 (doze mil duzentos e cinquenta euros), equivalente a 24,5% do capital social, detida pelo Requerente AA.
c. Uma participação com o valor nominal de € 12.250,00 (doze mil duzentos e cinquenta euros), equivalente a 24,5% do capital social, detida por CC,
d. Uma participação com o valor nominal de € 125,00 (cento e vinte e cinco euros), equivalente a 0,5% do capital social, detida por DD, e
e. Uma participação com o valor nominal de € 125,00 (cento e vinte e cinco euros), equivalente a 0,5% do capital social, detida pelo Dr. EE.
67. Em 06/05/2020 a REQUERIDA EMP01... foi objeto de um aumento de capital, tendo o capital social da sociedade passado para € 1.350.000,00 (um milhão e trezentos e cinquenta mil euros), que se realizou da seguinte forma:
a. Uma entrada em dinheiro de € 663.000,00 (seiscentos e sessenta e três mil euros) realizada pela acionista EMP02..., ficando a mesma com uma participação com o valor nominal de € 688.250,00 (seiscentos e oitenta e oito mil duzentos e cinquenta euros), equivalente a 50,98% do capital social.
b. Uma entrada em espécie de € 318.500,00 (trezentos e dezoito mil e quinhentos euros) realizada pelo acionista AA (aqui REQUERENTE), ficando o mesmo com uma participação com o valor nominal de € 330.750,00 (trezentos e trinta mil setecentos e cinquenta euros), equivalente a 24,5% do capital social.
c. Uma entrada em espécie de € 318.500,00 (trezentos e dezoito mil e quinhentos euros) realizada pelo acionista CC, ficando o mesmo com uma participação com o valor nominal de € 330.750,00 (trezentos e trinta mil setecentos e cinquenta euros), equivalente a 24,5% do capital social, e mantendo-se as restantes participações, isto é,
d. Uma participação com o valor nominal de € 125,00 (cento e vinte e cinco euros), equivalente a 0,01% do capital social, detida por EE.
e. Uma participação com o valor nominal de € 125,00 (cento e vinte e cinco euros), equivalente a 0,01% do capital social, detida por DD.
68. Se, por um lado, a acionista EMP02... era responsável pelo investimento necessário à concretização do projeto, por outro lado, o REQUERENTE AA, pela sociedade EMP03..., da qual é o único sócio e gerente, era responsável pela tecnologia, sua incorporação, bem como de garantir a boa execução dos trabalhos para que a unidade atingisse a capacidade produtiva almejada.
69.Inicialmente, a capacidade produtiva garantida pelo REQUERENTE AA em relação à unidade de produção da REQUERIDA EMP01..., era de 30.000 toneladas por ano, o que foi sujeito a revisões quanto à capacidade.
70. Para tal acontecer, isto é, para que se tivesse uma capacidade produtiva de 30.000 toneladas por ano, era necessário um investimento de 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil euros) por banda da acionista EMP02....
71. O investimento global em questão, por banda da acionista EMP02..., teve, sumariamente, as seguintes premissas:
a. A unidade de produção, que já se encontrava em construção pelo REQUERENTE AA, deveria ter, no final, a capacidade produtiva de 30.000 toneladas por ano;
b. Os custos da unidade de produção estavam detalhadamente definidos, tendo a acionista EMP02... como limite de investimento € 3.600.00,00 (três milhões e seiscentos mil euros), incluindo-se o valor referente às entradas de capital, bem como suprimentos necessários;
c. O início da produção deveria ocorrer dali (abril de 2019) a poucos meses.
d. O REQUERENTE AA, por si e por intermédio da sociedade EMP03..., deveriam ser responsáveis pela execução do projeto e por garantir a conclusão da refinaria com a capacidade produtiva acordada, o que aconteceria com elevadas contrapartidas financeiras a serem pagas com o investimento assegurado pela acionista EMP02... (e que de facto vieram a acontecer).
72. Subsequentemente (em ../../2020) foram revistas as metas, passando-se para uma capacidade produtiva de 16.000 toneladas por ano (depois de numa primeira fase seriam só 8 mil toneladas), mediante um investimento necessário por parte da acionista EMP02... de € 760.000,00 (setecentos e sessenta mil euros).
73. A tal investimento acrescia, pois, o valor já investido pela acionista EMP02... na REQUERIDA EMP01..., entre abril de 2019 e ../../2020, e que naquela altura já ascendia a € 1.140.00 (um milhão cento e quarenta mil euros).
74. O investimento total da acionista EMP02..., até ../../2023 cifra-se em de € 5.867.636,03 € (cinco milhões oitocentos e sessenta e sete mil seiscentos e trinta e seis euros e tês cêntimos (considerando o capital social realizado por entradas em dinheiro e os suprimentos prestados).
75. Ademais, a REQUERIDA EMP01..., para fazer face às suas despesas correntes, teve igualmente de recorrer à banca.
76. Logo, o plano de negócios apresentado pelo REQUERENTE AA, frustrou-se, o que teve como consequência imediata a necessidade acrescida de investimento adicional por banda da REQUERIDA EMP01....
77. Tais necessidades de investimento foram supridas por via de suprimentos prestados pela acionista EMP02... (e ainda por garantia prestada por esta nas obrigações assumidas perante a banca).
78. Uma parte substancial dos referidos suprimentos foram canalizados para o próprio REQUERENTE AA.
79. Na verdade, e como o mesmo não pode ignorar, por via da refinaria que ao mesmo se impunha colocar em funcionamento, por intermédio da sociedade EMP03..., foram a esta entregues avultadas quantias, que na sua globalidade ascendem a € 2.007.250,00 (dois milhões sete mil duzentos e cinquenta euros).
80. O Requerente votou favoravelmente quanto às contas relativas ao exercício de 2021, não tendo colocado qualquer objeção, ou alegado qualquer falta de informação.
81. O que igualmente sucedeu quanto às contas relativas aos exercícios de 2019 e 2020.
82. O Requerente foi convocado para a assembleia geral de 3.10.20231, a qual tinha por objeto, entre outros, temas como:
- “apreciar e deliberar sobre o relatório de gestão e contas do exercício de 2021” (ponto um)
- “apreciar e deliberar sobre o relatório de gestão e contas do exercício de 2022” (ponto quatro);
- “deliberar sobre um aumento de capital, no montante de 3.000.000 € (três milhões de euros), por novas entradas em espécie, correspondentes à conversão de 3.000.000 € (três milhões de euros) de suprimentos prestados pela acionista EMP02..., S.A., que foram objeto, previamente, de relatório elaborado por revisor oficial de contas sem interesses na sociedade, nos termos disposto no art.º 28.º do Código das Sociedades Comerciais, sendo criadas 3.000.000 (três milhões) de novas ações, com o valor nominal de 1 € (um euro) cada uma, a atribuir ao acionista EMP02..., S.A., titular do referido crédito de suprimentos que será convertido em capital” (ponto sete).
83. O Requerente não solicitou o envio dos documentos de suporte à discussão dos pontos da ordem de trabalhos, por carta ou correio eletrónico.
84. O Requerente também não se deslocou à sede da sociedade, nos 15 dias anteriores à realização da assembleia geral (ou em qualquer dia após receber a convocatória), e aí pediu para consultar os documentos de suporte à discussão dos pontos da ordem de trabalhos.
85. No que respeita à apresentação do IES, aquando da sua submissão, e uma vez que o formulário da AT disponível para o efeito o permite, foi devidamente assinalado que a apresentação do mesmo ocorria sem que as contas estivessem ainda aprovadas, o que se deu devida nota ao Requerente.
86. Por outro lado, no que respeita ao Modelo 22, a verdade é que o formulário não permite igual menção.
87. A Requerida, pelo seu contabilista expôs e pediu parecer à Ordem dos Contabilistas Certificados, tendo obtido, sobre este assunto, o seguinte parecer:
“o facto de o órgão de administração não ter aprovado as contas não constitui impeditivo ao envio atempado das declarações fiscais, até porque, posteriormente, pode ser apresentada uma declaração de substituição nos termos do disposto no nº 1 e nº 2 do artigo 122º do CIRC. Na IES, teria de fazer menção a contas não aprovadas no caso de não terem sido apresentadas aos sócios em assembleia geral.
A não ser que o órgão de administração que lhe tenha comunicado, por escrito, para não proceder a essa entrega e, nesse caso, deve dar cumprimento, no Portal da AT, ao disposto no artigo 8º, nº 3 do RGIT.”
88. A REQUERIDA EMP01..., até outubro de 2023, produziu o equivalente a 1.333 toneladas de biodiesel, isto é, a sua capacidade instalada encontra-se abaixo de 10% da capacidade garantida pelo REQUERENTE AA (mesmo considerando a redução acordada), não se podendo olvidar que era a este a quem cabia, a título principal, assegurar a capacidade produtiva da unidade de produção.
89. A licença necessária ao seu funcionamento somente foi emitida a ../../2023.
90. O Dr. EE é advogado e procurou veicular e dar forma àquela que foi a vontade das partes.
91. O Dr. EE é advogado, sócio e administrador da sociedade de advogados EMP04..., sociedade de advogados, SP, RL.
92. O acionista CC, que se encontra exatamente na mesma posição do REQUERENTE AA, votou favoravelmente a dita deliberação de aumento de capital.
93. O mesmo sucedendo com os acionistas DD e Dr. EE.
94. Com o dito aumento de capital o REQUERENTE ficou com uma menor percentagem de capital social.
95. Os balanços da REQUERIDA EMP01... em 31/12/2021 e 31/12/2022, revelam que a REQUERIDA EMP01... tem um passivo de € 7.887.183,00 (sete milhões oitocentos e oitenta e sete mil cento e oitenta e três euros), o que é do conhecimento do REQUERENTE.
96. A REQUERIDA EMP01... teve resultados líquidos negativos de € 90.836,00 no exercício de 2021 e de € 357.153,00 no exercício de 2022, o que é do conhecimento do REQUERENTE.
97. A REQUERIDA EMP01... tem resultados negativos acumulados (na conta de resultados transitados) de € 497.277,00.
98. Faltaria apenas um resultado negativo de € 177.722,00 (cento e setenta e sete mil setecentos e vinte e dois euros) para que a REQUERIDA EMP01... entrasse na situação estatuída no art. 35.º do Código das Sociedades Comerciais, tendo em conta que o capital próprio da REQUERIDA era de € 852.722,00 (oitocentos e cinquenta e dois mil setecentos e vinte e dois euros) e metade do seu capital social ascende a € 675.000,00 (seiscentos e setenta e cinco mil euros).
99. Na Assembleia Geral de 03/10/2023, cujas deliberações são colocadas em crise pelo REQUERENTE AA, os motivos do aumento de capital foram explicados a todos os acionistas e encontram-se vertidos no documento disponibilizado a todos os presentes, onde se inclui o REQUERENTE AA.
100. No que respeita à Autonomia Financeira, a evolução da situação da EMP01..., S.A. revela o seguinte:
Um valor aceitável pela generalidade dos economistas para o rácio de autonomia financeira situa-se entre os 30% e os 60%.
101. O rácio de autonomia financeira da EMP01... tem vindo progressivamente a degradar-se ao longo do tempo. Em 31.12.2022 já estava bastante longe do mínimo exigido para elegibilidade de financiamento, sendo que em 31.07.2023, por força dos capitais próprios negativos da Empresa, o referido rácio tornou-se negativo e altamente deficitário.
102. No que respeita a Dívida Financeira Líquida / EBITDA (Net Debt/EBITDA), a evolução da situação da EMP01..., S.A. revela o seguinte:
Um valor aceitável pela generalidade dos economistas para o rácio de Net Debt/EBITDA é que seja inferior ou igual a 3x.
103. O rácio de Net Debt / EBITDA da EMP01... tem vindo a demonstrar-se constantemente deficitário ao longo do tempo. Uma vez que o EBITDA tem sido sempre negativo, este rácio nunca poderia apresentar valores razoáveis.
104. No que respeita à composição e montante do Passivo, a evolução da situação da EMP01..., S.A. revela o seguinte:
Pode constatar-se no quadro acima que o passivo da EMP01... tem vindo a aumentar progressivamente ao longo do tempo, com uma grande predominância dos financiamentos obtidos e dos fornecedores.
105. O valor elevado de passivo, em conjunto com os restantes indicadores económicos e rácios financeiros, dificultam a obtenção de financiamento e crédito por parte de entidades externas, quer sejam financiadores, quer sejam fornecedores.
106. No que respeita à composição e montante do Passivo, a evolução da situação da EMP01..., S.A. revela o seguinte:
- Diz-se no documento:
“Como podemos facilmente constatar, a EMP01... apresenta acumulada e consecutivamente:
i EBITDAs negativos;
ii Resultados operacionais negativos (EBIT); e
iii Resultados líquidos negativos. “
107. A evolução do rácio entre o capital social /subscrito e o total do capital próprio da EMP01..., S.A. é como segue:
Degradação muito significativa nos capitais próprios da EMP01..., provocada pelos sucessivos e acumulados resultados líquidos negativos.
108. Outro risco respeita ao cumprimento de obrigações contratuais, concretamente, ao nível dos contratos que adiante se indicam:
A) Quanto ao contrato de mútuo com a Banco 1... no montante de 1.500.000 Euros:
Trata-se de um “Contrato de Mútuo ao Abrigo do Protocolo Banco 1... / EMP05..., IP/ ... / ... (Linha de Crédito Específica – Apoio Desenvolvimento Negócio 2028)”, assinado com a Banco 1... (Banco 1...), datado de 6 de junho de 2022, no montante de 1.500.000 Euros.
B) Quanto ao Financiamento do Banco 2... no montante de 1.500.000 Euros:
Trata-se do “Financiamento n.º ...35”, assinado com o Banco 2..., datado de 30 de maio de 2022, no montante de 1.500.000 Euros.
C) Quanto ao Contrato de confirming com o Banco 3... até ao montante de 350.000 Euros:
Trata-se do “Contrato de Gestão de Pagamento a Fornecedores n.º ...83 – Automático
(Número Único Contrato: ...01”, assinado com o Banco 3..., datado de 25 de março de 2022, no montante máximo de 350.000 Euros.
109. O Requerente continua a ser administrador da Ré.
110. O REQUERENTE recebeu tudo quanto tinha de receber por via da instalação da unidade de produção.
111. O REQUERENTE sabe que, de todos os acionistas, é a acionista EMP02... quem mais está exposta a um eventual incumprimento generalizado da REQUERIDA EMP01....
Factos Não Provados.
- O REQUERENTE sabe que a REQUERIDA EMP01... não é rentável e que carece de ver reforçada a sua situação financeira.
- O REQUERENTE sabe que a REQUERIDA EMP01... careceu dos suprimentos prestados para garantir a instalação da unidade de produção de biodiesel, e que a mesma não corresponde ao que garantiu aos demais acionistas, seja quanto à rentabilidade, seja quanto ao início da operação (que deveria ter ocorrido cerca de três anos antes da data em que efetivamente se verificou).
- O REQUERENTE sabe que, com vista a corrigir o que o REQUERENTE AA fez, por si, ou pela sociedade EMP03..., bem como com vista a realizar o que aquele não fez, ou não prestou/entregou, e era essencial para o início da produção da unidade de produção, foram necessários investimentos adicionais na REQUERIDA EMP01..., e que somente a acionista EMP02... ocorreu nesses encargos.
- O Requerente, apesar de ser membro do Conselho de Administração da Requerida, está privado de acesso à sua contabilidade.
**********
B. Fundamentos de direito.
....
Improcede, assim, a requerida impugnação.
Vejamos então o que está aqui em causa, e que nos permitirá fundamentar também a irrelevância jurídica do citado ponto que se pretendeu ver aditado para o objeto deste recurso.
O decretamento da providência cautelar de suspensão de deliberações sociais pressupõe o preenchimento cumulativo de alguns requisitos:
- a existência de uma deliberação inválida da sociedade, por violação da lei, dos estatutos ou do contrato;
- que o requerente seja sócio ou associado da pessoa coletiva
- que a deliberação não tenha sido ainda executada:
- e que resulte dessa deliberação a produção de um dano apreciável.
Vejamos, desde logo, se a situação em apreço se subsume ao primeiro dos apontados requisitos.
Dispõe o artº 58º, do Código das Sociedades Comerciais:
1. São anuláveis as deliberações que:
a) Violem disposições quer da lei, quando ao caso não caiba a nulidade, nos termos do artigo 56º, quer do contrato de sociedade;
b) Sejam apropriadas para satisfazer o propósito de um dos sócios de conseguir, através do exercício do direito de voto, vantagens especiais para si ou para terceiros, em prejuízo da sociedade ou de outros sócios ou simplesmente de prejudicar aquela ou estes, a menos que se prove que as deliberações teriam sido tomadas mesmo sem os votos abusivos;
c) Não tenham sido precedidas do fornecimento ao sócio de elementos mínimos de informação.
2.Quando as estipulações contratuais se limitarem a reproduzir preceitos legais, são estes considerados diretamente violados, para os efeitos deste artigo e do artigo 56º.
3.Os sócios que tenham formado maioria em deliberação abrangida pela alínea b) do nº1 respondem solidariamente para com a sociedade ou para com os outros sócios pelos prejuízos causados.
4.Consideram-se, para efeitos deste artigo, elementos mínimos de informação:
a) As menções exigidas pelo artigo 377º, nº8;
b) A colocação de documentos para exame dos sócios no local e durante o tempo prescritos pela lei ou pelo contrato.
Sobre as deliberações abusivas, previstas na alínea b), do número 1, escreve Coutinho de Abreu[1]: “Temos aqui duas espécies de deliberações abusivas: as apropriadas para satisfazer o propósito de alcançar vantagens especiais em prejuízo da sociedade ou de sócios; as apropriadas para satisfazer o propósito tão-só de prejudicar a sociedade ou sócios – as chamadas deliberações emulativas. As deliberações de uma e outra espécie têm pontos em comum: pressupostos subjetivos (o “propósito” de um ou mais votantes) e pressupostos objetivos (a deliberação há de ser objetivamente “apropriada” ou apta para satisfazer o propósito). Mas têm também pontos distintivos. Relativamente às deliberações da primeira espécie, o propósito relevante é o de alcançar vantagens especiais; relativamente às emulativas, o propósito relevante é o de causar prejuízos. É certo que aquelas não dispensam o prejuízo (“em prejuízo da sociedade ou de outros sócios”). Trata-se, porém, de dano resultante da consecução de vantagens especiais; entre aquele e esta existe imediata ou mediata conexão causal. Já o prejuízo visado nas deliberações emulativas é indiferente às eventuais não desvantagens, vantagens ou desvantagens dos votantes com propósito emulativo ou de terceiros. Quer tudo isto dizer que o “propósito” exigido nas deliberações da primeira espécie limita-se à consecução de vantagens especiais – não sendo necessário que abarque o prejuízo; e o propósito exigido nas deliberações emulativas limita-se à inflição de prejuízo.(…). Vantagens especiais são proveitos patrimoniais (ao menos indiretamente) por deliberação concedidos, possibilitados ou admitidos a sócios e/ou não sócios, mas não a todos os que se encontram perante a sociedade em situação semelhante à dos beneficiados, bem como os proveitos que, quando não haja sujeitos em situação semelhante à daqueles, não seriam (ou não deviam ser) concedidos, possibilitados ou admitidos a quem hipoteticamente ocupasse posição equiparável. (…). O “prejuízo” ou dano relevante (consequência da vantagem especial assegurada pela deliberação, ou da medida estabelecida pela deliberação emulativa) é sofrido pela “sociedade” ou “outros sócios” – sócios outros que não os votantes com os assinalados propósitos. (…). O enunciado normativo do artº 58º, 1, b), exige, já se viu, “o propósito de um ou mais, dos sócios”. E demos já a entender que ele significa dolo de um ou mais sócios votantes em determinada proposta deliberativa. Trata-se, pois, de um elemento subjetivo e atual (não virtual) que há de ser provado por quem impugna a deliberação. Também a referência aos “votos abusivos” na parte final do preceito vai no mesmo sentido. No entanto, deve entender-se que o dolo aqui em causa não tem de ser direto nem necessário, basta que seja eventual. Bastará provar, portanto, que um ou mais sócios, ao votarem, previram como possível a vantagem especial para si ou para outrem, ou o prejuízo da sociedade ou de outros sócios, e não confiaram que tal efeito eventual se não verificaria. (…).”
Por último, exige-se a chamada “prova de resistência”. O impugnante prova que a deliberação é apropriada para satisfazer propósito ilícito de um sócio, dela derivando prejuízo para a sociedade e/ou sócios. Ainda assim, a deliberação não será anulada se a sociedade provar que, sem os votos daquele sócio, a deliberação teria sido igualmente adotada.”.
A conversão de suprimentos foi objeto de alteração legislativa que pretendeu criar um regime simplificado, criado pelo DL nº 79/2017, de 30 de junho[2], que alterou os artigos 4º-A, 87º, 88º, e 89º, do Código das Sociedades Comerciais (doravante CSC).
O referido procedimento possibilitou que um sócio que detenha a maioria de capital, no mínimo de 75%, possa desencadear o procedimento de aumento de capital social através de uma comunicação à gerência, mas dependendo o prosseguimento do mesmo da concordância de todos os outros sócios.
Não é este, no entanto, o caso em análise, dado que a deliberação aqui em causa foi tomada no âmbito de uma assembleia geral.
Dispõe o artº 87º do CSC: Requisitos da deliberação ou decisão 1 - A deliberação de aumento do capital deve mencionar expressamente: a) A modalidade do aumento do capital; b) O montante do aumento do capital; c) O montante nominal das novas participações; d) A natureza das novas entradas; e) O ágio, se o houver; f) Os prazos dentro dos quais as entradas devem ser efetuadas, sem prejuízo do disposto no artigo 89.º; g) As pessoas que participarão nesse aumento. 2 - Para cumprimento do disposto na alínea g) do número anterior, bastará, conforme os casos, mencionar que participarão os sócios que exerçam o seu direito de preferência, ou que participarão só os sócios, embora sem aquele direito, ou que será efetuada subscrição pública. 3 - Não pode ser deliberado aumento de capital na modalidade de novas entradas enquanto não estiver definitivamente registado um aumento anterior nem estiverem vencidas todas as prestações de capital, inicial ou proveniente de anterior aumento. 4 - O sócio de sociedade por quotas que por si ou juntamente com outros reunir a maioria de votos necessária para deliberar a alteração do contrato de sociedade pode comunicar à gerência o aumento do capital social por conversão de suprimentos registados no último balanço aprovado de que seja titular. 5 - O órgão de administração procede à comunicação por escrito, no prazo máximo de 10 dias, aos sócios que não hajam participado no aumento referido no número anterior, com a advertência de que a eficácia do aumento depende da não oposição expressa de qualquer um daqueles, manifestada por escrito, no prazo de 10 dias, contados da comunicação de conversão. 6 - O disposto no presente artigo não é aplicável: a) No âmbito de instrumentos, poderes e mecanismos de resolução; b) Durante a pendência de qualquer processo de reestruturação de empresas previsto no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
O recorrente não pôs em causa uma eventual inobservância de qualquer um destes requisitos, alegando, antes, que só se os acionistas manifestassem a sua indisponibilidade para a capitalização da sociedade se poderia, então, concluir pela solução do aumento de capital social por conversão de suprimentos.
Todavia, tal alegada necessária precedência não constitui requisito legal.
O recorrente também não pôs em causa a existência, a montante, dos referidos suprimentos[3].
Não se pode, assim, falar de deliberação inválida da sociedade, por violação da lei, dos estatutos ou do contrato, falecendo este pressuposto.
Tomando em consideração que os supra apontados pressupostos são cumulativos, tanto bastaria para considerar improcedente a presente providência.
Não obstante, face à alegação do recorrente, importará tecer algumas considerações sobre o pressuposto “resultar dessa deliberação a produção de um dano apreciável”, dado que os outros dois (que o requerente seja sócio ou associado da pessoa coletiva e que a deliberação não tenha sido ainda executada) estarão verificados.
Debrucemo-nos, então, sobre o que deverá ser entendido como “dano apreciável”.
Atendo-nos a este último requisito, verificamos que “para que esta providência cautelar seja decretada, não se exige a produção de danos irreparáveis ou de difícil reparação em consequência da execução da providência cautelar inválida, sendo suficiente, ao invés, a possibilidade de produção de um dano apreciável. Dano esse que respeita à possibilidade de prejuízos imputáveis à demora do processo comum de anulação de deliberação social, de que o processo cautelar de suspensão da deliberação social é dependência. Neste contexto, o conceito de dano apreciável tanto abrange os danos patrimoniais como os danos morais, independentemente de se refletirem sobre a sociedade ou o sócio.
(…) Diversamente do que sucede com o requisito da invalidade da deliberação impugnada, o qual, para que se considere preenchido, exige apenas um juízo de mera probabilidade, já na apreciação do requisito do receio de produção de um dano apreciável exige-se a prova da certeza ou de uma probabilidade muito forte do dano, por força da execução da deliberação. Para tanto, o requerente deve alegar factos concretos que permitam aferir da existência dos prejuízos e da correspondente gravidade.” – cfr. Marco Carvalho Gonçalves, Providências cautelares, 2015, páginas 267-282.
Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, no seu CPC anotado, vol. I, pág. 451, referem que “O requisito que se reporta ao “dano apreciável” configura um conceito indeterminado, decorrendo de factos dos quais possa extrair-se a conclusão de que a execução da deliberação acarretará um prejuízo significativo, de importância relevante, muito longe, por um lado, dos danos irrisórios ou insignificantes, mas sem atingir, por outro lado, o ponto da irrecuperabilidade ou da grave danosidade.”
Alegou o recorrente que a deliberação social cuja suspensão é objeto dos presentes autos se traduz num aumento de capital[4] que não aporta novos meios financeiros à sociedade, correspondendo, antes, a uma mera operação contabilística e, como tal, meramente nominal, sendo certo que face à situação da empresa, o que a mesma necessitaria era de entradas de capital efetivo.
Não se retira da factualidade provada, muito menos da alegada pelo recorrente, que a deliberação em causa importe dano apreciável. Mais, doutrinalmente há mesmo quem entenda que o financiamento através de suprimentos, em detrimento da opção pelo aumento de capital social provoca uma distorção no funcionamento da sociedade[5].
Importa não esquecer que estamos em sede de providência cautelar, com juízos meramente indiciários, não cabendo aqui fazer uma exegese aprofundada da situação em apreço, sendo a ação principal a sede própria para o efeito.
No entanto, face à alegação do recorrente de que se imporia que os sócios, previamente, tivessem sido ouvidos quanto à sua disponibilidade para financiar a sociedade, dir-se-á ainda que sempre ao recorrente (e aos demais acionistas) teria sido facultada tal possibilidade, evitando uma compressão na percentagem relativa da sua participação. Refere-se, a este respeito, no AcRL de 14/12/2023, processo nº 20963/22.4T8LSB-B.L1-1, que pela sua clareza expositiva citamos nesta parte: “Os suprimentos constituem créditos dos sócios sobre a sociedade, não sendo tais créditos passíveis de ser classificados como dinheiro, logo a entrada com um crédito constitui uma entrada em espécie. A lei faculta ao sócio o direito a requerer que na ordem do dia da assembleia geral para que foi convocado sejam incluídos assuntos dela não constantes – artºs 248º, nº2, e 378º, nºs 1 e ss do CSC. Ao sócio convocado para uma assembleia geral que tem por objeto a conversão em capital social dos suprimentos prestados por um outro sócio, assiste o direito de, à luz do princípio da igualdade de tratamento dos sócios, requerer que na ordem do dia dessa assembleia seja incluída a sua participação no aumento do capital social, mediante a realização de uma entrada em dinheiro, dado não ser titular de suprimentos, em valor que lhe permita assegurar a percentagem da sua “quota de participação.” (sublinhado meu).
Ou seja, o dano apreciável (na perspetiva do recorrente) que justificaria o decretamento da providência, seria prevenido a montante pela proatividade do recorrente e/ou de qualquer outro acionista nisso interessado, bastando, para tanto, ter lançado mão da descrita prerrogativa. O alegado benefício que a acionista maioritária retirou com o aumento de capital era evitável. E se à conduta omitida do ora recorrente obstassem motivos válidos, careciam de ser alegados.
Daí que, também por isso, não possamos falar em “dano apreciável”.
Improcede, assim, o recurso interposto, sendo ainda certo que quanto à questão da inversão do contencioso, que a primeira instância considerou prejudicada, nada foi alegado nas conclusões deste recurso.
Confirma-se, assim, a sentença recorrida.
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V – Dispositivo:
Pelo exposto, acordam os juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente o recurso interposto, confirmando a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente – artº 527º, nº 1 e 2 do CPC.
Notifique.
2024-09-19.
Relator: Fernando Barroso Cabanelas.
1º Adjunto: José Alberto Martins Moreira Dias.
2ª Adjunta: Alexandra Maria Viana Parente Lopes.
[1] Código das Sociedades Comerciais em Comentário, vol. I, 2ª edição, Almedina, págs. 712—718. [2] Sobre esta temática vide Rui Pinto Duarte in “A conversão em capital social de suprimentos e de outros créditos – Notas sobre o Dec-Lei 79/2017, de 30 de junho, e sobre um projeto legislativo relativo à conversão de créditos de terceiros em capital social” apud IV Congresso de Direito da Insolvência, Almedina, 2017, páginas 319 a 340. [3] Vide sobre esta temática Alexandre Mota Pinto, em anotação ao AcSTJ de 30/11/2021, disponível on line no sítio www.oa.pt. [4] Joana Freire Almeida in “Capital social, reservas e suprimentos: seu conteúdo, função e papel na cobertura de prejuízos” – Revista de Direito das Sociedades, 2015, página 843, define o capital social como sendo o correspondente aos montantes que os sócios se obrigam, mediante celebração do contrato de sociedade, a manter na sociedade sob essa qualificação e regime, podendo disponibilizá-lo integralmente até ao momento da constituição da sociedade ou diferir parte desse montante para momento posterior. [5] João Aveiro Pereira in “o Contrato de Suprimento”, Coimbra Editora, 2001, pág. 43.