Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
Sumário
Discutia-se essencialmente matéria de facto relativa à efetiva expedição de cartas registadas, em determinadas datas, para convocatória de reunião de assembleia de condóminos e para comunicação das deliberações que naquela foram tomadas. De direito, discutia-se se o administrador do condomínio tem o dever de, a cada convocatória ou outra comunicação, procurar nos registos comerciais as sedes atualizadas das sociedades condóminas; a resposta é negativa, cabendo aos condóminos, sociedades incluídas, atualizar junto do administrador do condomínio a morada (e outros dados) sempre que haja alteração (artigo 3.º, n.º 2, do DL 268/94, com a redação introduzida pela Lei 8/2022).
Texto Integral
Acordam os abaixo assinados juízes do Tribunal da Relação de Lisboa:
I. Relatório
O Condomínio do Edifício «BB», sito no … Funchal, réu na presente ação de anulação de deliberação de assembleia de condóminos que lhe é movida por «AA», Unipessoal, Lda., notificado da sentença proferida em 12/12/2023, que julgou a ação procedente e anulou as deliberações tomadas na assembleia de condóminos de 22/09/2022, e com essa sentença não se conformando, interpôs o presente recurso.
A sociedade autora tinha intentado a presente ação contra o identificado condomínio, pedindo que fosse declarada a anulabilidade das deliberações tomadas na assembleia de condomínio realizada no dia 22 de setembro de 2022, constantes da ata n.º 70.
Alegou, para tanto e em síntese, que: nunca foi convocada para qualquer assembleia geral de condóminos do Edifício «BB» (parte comercial e habitacional); nunca participou em qualquer assembleia geral de condóminos do mesmo edifício; nunca foi notificada e nunca recebeu qualquer ata relativa a assembleias gerais de condóminos do Edifício «BB», nem recebeu nenhuma convocatória para a realização de qualquer assembleia geral do mesmo, durante todo o ano de 2022. Mais alegou que, na assembleia de 22/09/2022, foram tomadas diversas deliberações que já haviam sido declaradas nulas por sentenças e acórdãos transitados em julgado.
Citado, veio o réu contestar, alegando, em síntese, que a convocatória e atas foram remetidas para a morada da autora, não tendo o réu conhecimento de outras moradas, nem tendo o dever de as conhecer. Alegou, no mais, que cabia à autora, enquanto condómina, comunicar a alteração de morada. Acrescentou que não se verifica violação de caso julgado, uma vez que as deliberações realizadas em sede de assembleia geral de 22/09/2022 são totalmente distintas das deliberações efetuadas pelas Galerias «BB» (a parte comercial do edifício em causa), que foram objeto dos processos judiciais a que fez menção a autora. Concluiu pela improcedência da ação.
O processo seguiu os regulares termos e, após audiência final, foi proferida a sentença de 12/12/2023, ora em recurso, que julgou a ação totalmente procedente, anulando as deliberações tomadas na assembleia de condomínio realizada no dia 22/09/2022. O réu não se conformou e recorreu, concluindo as suas alegações de recurso da seguinte forma:
«I. O presente recurso tem por objeto o pedido de reapreciação da sentença proferida pelo Tribunal a quo, no respeitante à declaração de anulabilidade das deliberações tomadas em sede de Assembleia Geral de Condóminos datada de 22/09/2022, em virtude da alegada falta de convocatória da aqui Recorrida, condómina “«AA», Unipessoal, Lda.” e da alegada não comunicação de tais deliberações tomadas nessa sede junto da condómina ausente.
II. O que se pretende é que seja proferida nova decisão que confirme e que reconheça a validade das deliberações discutidas e aprovadas àquela Assembleia, em razão da inexistência de qualquer preterição das formalidades impostas pelos n.º 1 e 9 do artigo 1432.º do Código Civil.
III. No entendimento do Recorrente, andou mal o Tribunal a quo ao ter considerado os pontos A), B) e C) como não provados, sendo certo que a prova documental junta aos autos, nomeadamente os Documentos 1, 2 e 10 juntos com a Contestação, quando valorados em conjugação com a prova por declaração de parte produzida em sede de audiência de julgamento eram aptos, suficientes e bastantes a provar que as cartas que continham a convocatória para a referida Assembleia bem como as deliberações tomadas nessa sede foram atempadamente enviadas para a morada da condómina e do conhecimento do condomínio às datas de envio, entenda-se, “Rua …, n.º 467, 3.º Direito, Trás Matosinhos, Leça do Balio, … Porto”.
IV. A este título, atendendo ao depoimento prestado pela Sra. …, na qualidade de representante legal do Condomínio Edifício «BB» e a que supra se fez menção, é notória a confirmação do envio atempado e conforme demanda a lei civil, entenda-se, por carta registada com aviso de receção, de tais comunicações (vide áudio 20231102102942_1768701_2871390, a partir do 04min31seg até 08min41seg e ainda 12min14seg, 14min44seg e 15min48seg).
V. Meio probatório que, não obstante não se descurar que deva ser livremente apreciado pelo Tribunal, sempre deveria ter sido valorado e assumido relevância para fins de motivação da matéria de facto (pontos A), B) e C), atendendo que o mesmo foi prestado sob juramento, entenda-se, sob dever de ser fiel à verdade (vide artigo 459.º ex vi 466.º, n.º 1 e n.º 2, ambos do CPC).
VI. Com efeito, a par do referido meio probatório, é certo que, dos documentos para que supra se aludiu e juntos com a Contestação, resulta indiscutivelmente que, aos dias 12/09/2022 e 19/10/2022, foram enviadas a convocatória para a Assembleia Geral de Condóminos à Recorrida e as deliberações tomadas nessa sede, respetivamente, pelo que dúvidas não subsistem que, no presente caso, o Tribunal a quo incorreu num erro de julgamento da matéria de facto.
VII. Aliás, tendo exigido requisitos adicionais aos legalmente preceituados ao artigo 1432.º, n.º 1 e n.º 9 do CC, entenda-se, a menção expressa nas comunicações para a referência de envio dos CTT, o Tribunal a quo fez uma interpretação desconforme e em tudo excessiva do disposto na letra da lei.
VIII. Ademais, apraz referir que, ao contrário do que ficou exposto na sentença recorrida, o Recorrente juntou comprovativo da devolução e/ou não reclamação de ambas as comunicações que relevam para o presente (vide Doc. 2 e 10 da Contestação), o que, sublinhe-se, apenas sucedeu por culpa e responsabilidade exclusiva da Recorrida, visto que as cartas que continham a convocatória para a Assembleia e as deliberações tomadas nessa sede, foram enviadas atempadamente para a morada cujo Recorrente tinha conhecimento, por via dos seus registos internos bem como pela consulta das certidões prediais das frações autónomas da propriedade da Recorrida.
IX. Por outras palavras, se as comunicações não foram entregues à condómina, tal não pode ser imputado ao Recorrente que tudo fez e encetou todos os esforços para o envio e recebimento atempado das mesmas, pelo que a consequência daí adveniente não lhe pode ser assacada, desde logo, a errónea declaração de anulabilidade das declarações tomadas na Assembleia Geral de Condóminos do Edifício «BB», realizada a 22/09/2022.
X. Por todo o exposto e com o douto suprimento de V. Exa., deverá decidir-se conforme supra se enuncia, com a respetiva alteração da sentença, que deverá ser revogada e substituída por outra que considere os pontos A), B) e C) como provados e que reconheça a validade das deliberações discutidas e aprovadas àquela Assembleia, atendendo o respeito integral pelo disposto nos n.º 1 e 9 do artigo 1432.º do Código Civil.
Termos em que, invocando-se o Douto suprimento do Venerando Tribunal, deverá ser dado provimento ao presente recurso e em consequência, revogar-se a decisão recorrida, substituindo-se por outra que reconheça a validade das deliberações tomadas em sede de Assembleia Geral de Condóminos datada de 22/09/2022, por cumprimento integral das formalidades exigidas pelo artigo 1432.º, n.º 1 e n.º 9 do Código Civil.
Só assim se fazendo JUSTIÇA.» A autora respondeu, pugnando pela improcedência do recurso e, subsidiariamente, requerendo a ampliação do âmbito do mesmo, com as seguintes conclusões:
«1 - A A. alegou que existe a violação do caso julgado, na sua vertente de Autoridade de caso julgado, quando o R. tenta fazer "tábua rasa" das decisões judiciais transitadas em julgado, devidamente enumeradas, citadas e certificadas nos autos e tenta repristinar todas as "deliberações" que foram ilegalmente tomadas nas anteriores Assembleias gerais do outro "condomínio das Galerias «BB» – zona comercial" entidade equiparada a pessoa colectiva com o NIPC 911 006 281 – e as quais foram declaradas ilegais e, ou, irregulares e, por isso, definitivamente anuladas.
2 - Ou seja, o R. pretende ratificar ou, pior do que isso, aprovar "contas" e "orçamentos" reportados a anos anteriores que dizem respeito a um outro e diferente Condomínio – “condomínio das Galerias «BB» – zona comercial" entidade equiparada a pessoa colectiva com o NIPC 911 006 281 – que, por ilegais, foram definitivamente declaradas nulas e anuladas.
3 - O R. procura contornar a eficácia "erga omnes" de caso julgado, seja com caracter de caso formal, seja com caracter de autoridade de caso julgado, que resulta das decisões judiciais decretadas por Sentenças Judiciais transitadas em julgado.
4 - Sendo certo que, os efeitos jurídicos que advêm da anulabilidade das referidas "deliberações", nomeadamente, a anulabilidade daquelas "deliberações" do dito, mas diferente, "condomínio das Galerias «BB»" influencia o processo formativo e, ou, o conteúdo das deliberações subsequentes, levadas a cabo por outro condomínio e com a pretensão de fazer "ressuscitar" o antes denominado "condomínio das Galerias «BB»" impossibilitando de foram absoluta a tentativa de contornar aquelas doutas decisões judiciais e contornar a lei.
5 - Pelo que, as referidas Sentenças proferidas nos indicados processos n.ºs …6TBFUN, ...5TBFUN e ...0T8FNC e ...2T8FNC, todas transitadas em julgado e que anularam as deliberações tomadas por aquele dito e diferente "condomínio das Galerias D«BB»" – zona comercial" impedem que o R., Condomínio do Edifício «BB», pessoa equiparada a pessoa colectiva com um NIF diferente daquele, possa repristinar ou ratificar "contas" e "orçamentos" que nenhuma relação directa tiveram com o Condomínio R. e que dizem respeito a períodos e anos civis reportados a 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2013, 2014, 2015, 2016, 2017, 2018, 2019, 2020, 2021 e até Setembro de 2022.
6 - Os limites objectivos do caso julgado devem alargar a respectiva força obrigatória à resolução de questões preliminares que a sentença teve necessidade de resolver, como premissa da conclusão retirada: embora as premissas da decisão recorrida não revistam, por via de regra, força de caso julgado, deve reconhecer-se-lhes essa natureza, quer quando a parte decisória se referir a elas, de modo expresso, quer quando constituam antecedente lógico necessário e imprescindível da decisão final.
7 - Por outro lado, ainda, a força e autoridade do caso julgado tem igualmente por finalidade evitar que a relação jurídica material, já definida por uma decisão com trânsito, possa vir a ser apreciada diferentemente por outra decisão, com ofensa da segurança jurídica.
8 - Assim, por força da autoridade de caso julgado, impõe-se aceitar a decisão anteriormente proferida, na medida em que o núcleo fulcral das questões de direito e de facto apreciadas e decididas são exatamente as mesmas que aqui se pretendem ver apreciadas.
9 - Por isso, é firme entendimento da A. que, no caso dos autos, pode e deve ser reconhecida e declarada a excepção de caso julgado, seja numa — caso julgado formal –, seja noutra das modalidades – autoridade de caso julgado.
10 - Resultando daqui que, sempre salvo o devido e merecido respeito, nesta parte da decisão da matéria de facto aqui impugnada, respeitante à decisão de declarar como "não provado" o que foi declarado na alínea D), não há na Sentença recorrida o necessário e obrigatório "exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal" — n.º 4 do art. 607º do C.P.Civil
11 - Tal vício que afectou a fundamentação e sobretudo o conteúdo da decisão relativa à matéria de facto, apenas na parte aqui impugnada, deve ter como consequência que este Tribunal "ad quem", em obediência ao disposto nos arts. 607º nº 4 e 662º nº 1 do C.P.Civil, e tendo em conta tudo o supra invocado, altere a resposta dadas de "Não Provado" pelo Tribunal "a quo" à matéria de facto constante da alínea D), passando tal factualidade para o elenco dos factos provados.
12 - Pelo que, e apenas nesta parte, reportada à factualidade declarada como não provada na alínea D) do elenco dos factos não provados, a douta decisão proferida pelo Tribunal "a quo" viola e, ou, interpreta erradamente o conjugadamente disposto nos arts. 607º n.º 4 e arts. 576º, 577º, al. i), 578º, 580º e 581º do CPC.»
Foram colhidos os vistos e nada obsta ao conhecimento do mérito. Objeto do recurso
Sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, são as conclusões das alegações de recurso que delimitam o âmbito da apelação (artigos 635.º, 637.º, n.º 2, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC).
Tendo em conta o teor daquelas, colocam-se as seguintes questões:
a) Os factos provados devem ser acrescentados nos termos requeridos pelo réu no seu recurso?
b) E nos termos pedidos pela autora em sede de ampliação do objeto do recurso?
c) A autora foi regularmente convocada para a assembleia de condóminos de 22/09/2022, e as deliberações ali tomadas foram-lhe oportunamente comunicadas?
d) As deliberações tomadas na assembleia de condóminos de 22/09/2022 repetem deliberações anteriores anuladas por decisões transitadas em julgado? II. Fundamentação de facto
Estão provados seguintes factos, que correspondem aos adquiridos na sentença recorrida (1 a 14), aditados dos que resultam da impugnação da matéria de facto pelo réu recorrente, conforme fundamentado em III.1. (15 a 17):
1- A Autora é senhoria e legítima proprietária das frações autónomas “AF”, “AG”, “AH”, “AI”, “AJ” e “AL”, que se encontram implantadas no Edifício – Centro Comercial Galerias «BB» inscrito e descrito na Conservatória do Registo Predial do Funchal sob o nº …13, da Freguesia do Imaculado Coração de Maria e inscrito na matriz predial urbana no artigo …66 da dita freguesia.
2- O dito prédio encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial do Funchal sob o número …87 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …66, e compõe-se de um edifício de grande porte, que se desenvolve num corpo inferior o qual é constituído por uma zona comercial e dois corpos superiores em forma de torre, que lhe estão sobrepostos e dispostos na direção oeste-leste, constituídos por frações autónomas destinadas a habitação, dividindo-se ainda em quatro blocos – bloco A-1 com 7 pisos e 20 frações autónomas, bloco A-2 com 8 pisos e 23 frações, bloco B-3 que é igual ao bloco A-1, e bloco B-4 com 6 pisos e 18 frações autónomas.
3- A Sociedade Autora, em razão de alterações societárias que tiveram lugar no mês de Julho do ano de 2019, alterou a sua residência para Rua …, n.º 119, Seide, … Vila Nova de Famalicão.
4- Esta alteração societária foi registada na Conservatória do Registo Comercial em 2 de Julho de 2019.
5- A Autora apenas comunicou ao Réu a alteração de morada no dia 17 de Novembro de 2022.
6- Tal alteração só foi averbada na Conservatória do registo predial à data de 24 de Novembro de 2022.
7- No passado dia 31 de Outubro de 2022, a Sociedade Autora alterou a sua sede para a Avenida …, n.º 50, 1.º andar, sala 5, … Vila Nova de Famalicão.
8- No passado dia 17 de Novembro de 2022, ao ter conhecimento da realização da assembleia, o mandatário forense da Autora, dirigiu email à sociedade “Inteliges – Unipessoal, Lda., com o seguinte teor:
“Exma. Senhora,
A sociedade «AA», Lda., NIPC 507897145, minha constituinte é proprietária das frações autónomas “AF”, “AG”, “AH”, “AI”, “AJ” e “AL”, que se encontram implantadas no Edifício Centro Comercial Galerias «BB» inscrito e descrito na Conservatória do Registo Predial do Funchal sob o nº …13, da Freguesia do Imaculado Coração de Maria e inscrito na matriz predial urbana no artigo 1666 da dita freguesia. Em razão de antigo litígio pendente entre o denominado “Condomínio do Centro Comercial Galerias «BB»” está ainda pendente e corre termos no Juiz Local Cível do Funchal Juiz 2 Acção Comum sob o nº ...4T8FNC, cujo objetivo e pedido está diretamente relacionado com a existência, ou não, de um condomínio respeitante a essa parte do edifício. Sucede que, no dia de ontem, um senhor condómino, igualmente proprietário de fração autónoma do mencionado edifício, contactou o meu escritório para informar que teria, em data que ao certo não soube dizer, sido organizado uma assembleia geral de condóminos do edifício «BB», englobando a parte habitacional e a parte comercial.
Contactada a sociedade minha constituinte, proprietária daquelas frações autónomas, a mesma informou-me que não recebeu nenhuma convocatória para AG do condomínio durante todo o corrente ano de 2022, tal como também não havia recebido convocatórias para quaisquer AG de condomínio nos anos de 2017, 2018, 2019, 2020 e 2021.
A última convocatória que recebeu foi em Junho de 2016, para uma AG marcada para o dia 8/07/2016, mas que, tanto quanto foi dado saber, não chegou a ter lugar. Aliás, nunca foi enviado à sociedade a eventual ata que nessa reunião agendada para 8/07/2016, se a assembleia teve lugar, aí foi lavrada.
Acresce dizer que a sociedade minha constituinte também não foi notificada de qualquer ata de assembleias gerais de condomínio reportadas a qualquer daqueles mencionados anos civis e, designadamente, até ao dia de hoje também não lhe foi enviada nenhuma ata da eventual AG que tenha tido lugar no corrente ano de 2022.
Solicito, por isso, caso seja verdade que tenha existido alguma AG de condomínio que englobe as frações autónomas que são propriedade da sociedade minha constituinte, e caso a vossa sociedade tenha tido intervenção na mesma, a gentileza de, por esta mesma via, informar:
a) No corrente ano de 2022 existiu alguma assembleia geral de condóminos do edifício «BB» e que engloba as supra citadas frações autónomas de que a sociedade «AA», Lda., é proprietária?
b) Se existiu essa AG, foi a sociedade «AA», Lda. notificada na forma legal, para estar presente ou fazer-se representar nessa assembleia?
c) Se existiu essa AG, foi a sociedade «AA», Lda. notificada na forma legal, do teor da ata da assembleia e deliberações que aí, porventura, possam ter sido tomadas?
Por outro lado, solicito ainda, caso efetivamente tenha existido AG e tenha sido lavrada ata, o envio de cópia completa dessa mesma ata.
Aproveito para indicar a atual morada e sede da sociedade «AA», Lda.: Av. … V.N. de Famalicão
Solicito ainda, e finalmente, a gentileza de acusar a receção desta comunicação, e apresento, Melhores cumprimentos,
…”
9- A sociedade “Inteliges Unipessoal, Lda. respondeu ao mandatário da Autora, em 18 de novembro de 2022, com um e-mail com o seguinte teor:
“Exmo. Sr. Dr.
Agradecemos os seus emails
Em relação ao respetivo conteúdo gostaríamos de esclarecer:
- a assembleia geral foi precedida de aviso convocatório para todos os condóminos, conforme cópia que anexamos;
- o que foi deliberado na assembleia é o que consta da ata que se anexa
- a cópia da ata foi enviada para a sua cliente «AA», Lda., NIPC 507897145, conforme cópia que anexamos”, conforme igualmente tudo melhor se alcança da copia de tal comunicação, documento que adiante se junta e aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos – doc. n.º 3.
10- A Autora não recebeu a convocatória nem as atas na Rua …, n.º 119, Seide, … Vila Nova de Famalicão.
11- No âmbito do processo n.º ...6TBFUN, foi proferida Sentença, aos 27/05/2015, já transitada em julgado, que julgou a ação de anulação intentada pela Autora procedente, declarando a anulação das deliberações tomadas na assembleia do denominado “condomínio das “Galerias «BB»” realizada aos 24 de junho de 2011 e constantes da ata numero treze (13), bem como as deliberações tomadas na assembleia extraordinária realizada em 15 de Dezembro de 2011, tendo por base a falta de quórum.
12- No âmbito do processo n.º ...5TBFUN foi proferida Sentença, que julgou a ação de anulação intentada pela Autora procedente, declarando a anulação deliberações tomadas na assembleia do denominado “condomínio das Galerias «BB»” realizada aos 28 de Março de 2014 e constantes da ata número 17, designadamente, as deliberações constantes dos pontos números um, quatro e cinco, sendo o ali Réu condenado a reconhecer que tais deliberações não produzem qualquer efeito jurídico, tendo por base a falta de quórum.
13- No âmbito do processo n.º ...0T8FNC foi proferida Sentença que anulou as deliberações tomadas na assembleia do denominado “condomínio das Galerias «BB»” realizada aos 30 de Outubro de 2015 e constantes da ata número 19, designadamente, as deliberações constantes dos pontos números um, dois, três, quatro e quinto, condenando o ali R. a reconhecer que tais deliberações não produzem qualquer efeito jurídico, tendo por base a falta de quórum.
14- No âmbito do processo n.º ...2T8FNC foi proferida Sentença, que julgou a ação de anulação intentada pela Autora procedente, declarando a anulação das deliberações tomadas na assembleia do dito “condomínio das Galerias «BB»” realizada aos 8 de Maio de 2017 e constantes da ata numero vinte e um, designadamente, as deliberações constantes dos pontos um, dois, três e quatro sendo o ali R. condenado a reconhecer que tais deliberações não produzem qualquer efeito jurídico, tendo por base a falta de quórum.
15- A carta registada que continha a convocatória para a Assembleia de 22 de setembro de 2022 foi enviada para Rua …, n.º 467, 3.º Direito, Trás Matosinhos, Leça do Balio, … Porto, visto ser essa a morada que vem indicada nas certidões permanentes prediais relativas às frações autónomas propriedade da autora, à data de 12/09/2022.
16- O réu comunicou à autora as deliberações tomadas em sede de Assembleia Geral de Condóminos de 22 de setembro de 2022, na qualidade de condómina ausente, por carta enviada no dia 19 de outubro de 2022, ou seja, dentro do prazo de 30 (trinta) dias a contar da data da realização da Assembleia.
17- Ambas as cartas foram enviadas para a morada “Rua …, n.º 467, 3.º Direito, Trás Matosinhos, Leça do Balio, … Porto”. III. Apreciação do mérito do recurso III.1. Da impugnação da matéria de facto pelo condomínio réu
O recorrente pode impugnar a decisão sobre a matéria de facto, caso em que deverá observar as regras contidas no artigo 640.º do CPC.
Segundo elas, e sob pena de rejeição do respetivo recurso, o recorrente deve especificar:
- Os pontos da matéria de facto de que discorda;
- Os meios probatórios que impõem decisão diversa da recorrida;
- A decisão que, em seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
O recorrente cumpriu estes ónus de forma cabal, pedindo que se considerasse provada a matéria constante dos factos não provados sob as alíneas A), B) e C); e indicando que a sua prova resulta dos documentos n.ºs 1, 2 e 10 juntos com a contestação e do depoimento de …, representante do condomínio (localizou, ainda, as passagens do depoimento referentes aos factos em causa).
Os factos ora em discussão, que o tribunal a quo considerou não provados são: A) A carta registada que continha a convocatória para a Assembleia de 22 de setembro de 2022 foi enviada para Rua …, n.º 467, 3.º Direito, Trás Matosinhos, Leça do Balio, … Porto, visto ser essa a morada que vem indicada nas certidões permanentes prediais relativas às frações autónomas propriedade da Autora, à data de 12/09/2022. B) O Réu comunicou as deliberações tomadas em sede de Assembleia Geral de Condóminos de 22 de setembro de 2022 à Autora, na qualidade de condómina ausente, por carta enviada no dia 19 de outubro de 2022, ou seja, dentro do prazo de 30 (trinta) dias a contar da data da realização da Assembleia. C) Ambas as cartas foram enviadas para a morada “Rua …, n.º 467, 3.º Direito, Trás Matosinhos, Leça do Balio, … Porto”.
Constam dos autos (docs. 1, 2 e 10 com a contestação) a carta de convocatória e listas de registos de cartas enviadas via CTT dos dias 12/09/2022 e 19/10/2022; em ambas as listagens consta a autora, com a morada Rua …, n.º 467, 3.º Direito, Trás Matosinhos, Leça do Balio, … Porto.
As datas das cartas estão dentro dos períodos legais de convocação de uma assembleia para 22 de setembro (nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 1432.º do CC, a convocatória pode ser efetuada por meio de carta registada, enviada com 10 dias de antecedência), e de comunicação das deliberações aos condóminos ausentes (nos termos do disposto no n.º 9 do mesmo artigo e diploma, as deliberações têm de ser comunicadas a todos os condóminos ausentes, no prazo de 30 dias, por carta registada com aviso de receção ou por correio eletrónico).
Acresce que, conforme se alcança das certidões prediais das frações disponibilizadas em 02/03/2023 e juntas com a contestação, ainda nessa data, como morada da autora constava: Rua …, 467, 3.º Dtº, Traseiras, Leça do Balio, Matosinhos.
O código postal que corresponde aos números ímpares de 1 a 625 da Rua …, em Leça do Balio, Matosinhos, é efetivamente, como consta dos registos: … Porto (www.codigo-postal.pt).
A sócia-gerente da sociedade administradora do condomínio depôs em audiência de forma clara, adequada, diversificada no tom, espontânea (não preparada), de modo que, em suma, não suscita dúvidas sobre a veracidade das suas afirmações. Foi quem presidiu à assembleia de 22 de setembro de 2022. Confirmou o envio das convocatórias e das ulteriores comunicações da ata – foi a sua equipa que tudo preparou e enviou.
Conjugando e interpretando os referidos elementos probatórios à luz da lógica e da experiência comum, impõe-se dar como provados os factos das alíneas A), B) e C)
15- A carta registada que continha a convocatória para a Assembleia de 22 de setembro de 2022 foi enviada para Rua …, n.º 467, 3.º Direito, Trás Matosinhos, Leça do Balio, … Porto, visto ser essa a morada que vinha indicada nas certidões permanentes prediais relativas às frações autónomas propriedade da autora, à data de 12/09/2022.
16- O réu comunicou à autora as deliberações tomadas em sede de Assembleia Geral de Condóminos de 22 de setembro de 2022, na qualidade de condómina ausente, por carta enviada no dia 19 de outubro de 2022, ou seja, dentro do prazo de 30 (trinta) dias a contar da data da realização da Assembleia.
17- Ambas as cartas foram enviadas para a morada “Rua …, n.º 467, 3.º Direito, Trás Matosinhos, Leça do Balio, … Porto”. III.2. Da impugnação da matéria de facto pela autora, em sede de ampliação do âmbito do recurso
A autora, ao abrigo do disposto no artigo 636.º do CPC, requereu a ampliação do âmbito do recurso, para conhecimento de fundamento por si invocado e que não chegou a ser apreciado, prevenindo a necessidade da sua apreciação. Para tanto, e como permitido pelo n.º 2 do mesmo artigo e diploma, impugnar a decisão proferida sobre a al. D) dos factos não provados, pedindo que o mesmo se considere assente.
O facto não provado em questão tem o seguinte conteúdo:
D) As deliberações tomadas em 22 de Setembro de 2022 já haviam sido anuladas por decisões transitadas em julgado.
Esta afirmação não se pode considerar assente, desde logo porque as deliberações tomadas em assembleias anteriores, descritas nos factos 11 a 14, foram anuladas apenas porque as assembleias respetivas careciam do necessário quórum, não estando presentes condóminos que representassem a percentagem do valor total do prédio necessária ao funcionamento da assembleia. III.3. Da convocatória para a assembleia de condóminos de 22/09/2022 e da comunicação das deliberações ali tomadas
Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 1432.º do CC (na redação introduzida pela Lei 8/2022, que entrou em vigor a partir de 10 de abril de 2022), a assembleia é convocada por meio de carta registada, enviada com 10 dias de antecedência, ou mediante aviso convocatório feito com a mesma antecedência, desde que haja recibo de receção assinado pelos condóminos. A autora foi convocada para a assembleia de 22/09/2022 por carta registada expedida em 12/09/2022, portanto pelo meio e com a antecedência exigidos por lei.
De acordo com o expresso no n.º 9 do mesmo artigo 1432.º do CC, as deliberações têm de ser comunicadas a todos os condóminos ausentes, no prazo de 30 dias, por carta registada com aviso de receção ou por correio eletrónico. No caso, as deliberações foram comunicadas por carta registada expedida em 19/10/2022, mais uma vez pelo modo e no prazo legalmente estabelecidos.
Nos termos do disposto do artigo 3.º, n.º 2, do DL 268/94, de 25 de outubro (com a redação introduzida pela Lei 8/2022, de 10 de janeiro) – Regime da Propriedade Horizontal – os condóminos devem informar o administrador do condomínio do seu número de contribuinte, morada, contactos telefónicos e endereço de correio eletrónico e atualizar tais informações sempre que as mesmas sejam objeto de alteração. A autora não o fez (sobre si recaía o ónus da prova de o ter realizado), não atualizou o seu endereço em momento anterior ao envio da convocatória para Assembleia.
O réu enviou, e bem, as cartas para a morada originária e que constava das certidões prediais. III.4. Do caso julgado sobre a invalidade das deliberações
Pretende o autor que se considere que a invalidade das deliberações de 22 de setembro de 2022 já foi decidida por sentenças transitadas em julgado, estando, no fundo, julgada a causa que o próprio autor intentou. O caso julgado é uma exceção dilatória típica (artigo 577.º, al. i) do CPC), que obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa, dando lugar à absolvição do réu da instância (artigo 576.º, n.º 2, do CPC). É um contrassenso que um autor oponha ao seu pedido uma exceção de caso julgado…
Em todo o caso, conforme expresso nos factos 11 a 14 (ancorados nos documentos autênticos constituídos por certidões judiciais juntas aos autos), no âmbito de quatro processos judiciais (n.º ...6TBFUN, …5TBFUN, ...0T8FNC e ...2T8FNC) foram proferidas sentenças já transitadas em julgado, que anularam deliberações tomadas em assembleias de condóminos do denominado “condomínio das Galerias «BB»”, realizadas, respetivamente, em 24/06/2011 (constantes da ata n.º 13) e em 15/12/2011, em 28/03/2014 (constantes da ata n.º 17), em 30/10/2015 (ata n.º 19), e em 8/05/2017 (constantes da ata n.º 21).
Em todos os quatro referidos processos, o fundamento da anulação consistiu na falta de quórum das respetivas assembleias. Nas ditas ações, a autora (mesma sociedade naquelas ações e nesta) invocava a falta de quórum das assembleias por não terem sido convocados todos os condóminos do prédio, mas apenas os da parte comercial (eram assembleias exclusivas da parte comercial). Foi, então, dada razão à autora e foram anuladas as deliberações com aquele fundamento.
Para a assembleia em crise nos presentes autos foram convocados todos os condóminos, da parte comercial e da parte habitacional.
Consequentemente, ainda que as deliberações anuladas fossem materialmente idênticas às que estão em causa nos presentes autos, o que não se concede, a causa da sua anulação (falta de quórum na assembleia) não impediria que fossem validamente tomadas noutra assembleia.
O caso julgado nos acima identificados processos (falta de quórum das assembleias neles em causa) não afeta a validade das deliberações tomadas na assembleia de 22/09/2022.
IV. Decisão
Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar procedente a apelação do réu, revogando a sentença recorrida e julgando a ação totalmente improcedente por não provada, dela absolvendo o Condomínio réu.
Custas pela autora, recorrida.
Lisboa, 26/09/2024
Higina Castelo
Susana Maria Mesquita Gonçalves
António Moreira