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RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
RESPONSABILIDADE DO EMPREITEIRO PELOS DANOS CAUSADOS A TERCEIRO
PODER DE FACTO SOBRE A COISA
Sumário
O artigo 493.º, n.º 1 do CC estabelece uma presunção de culpa relacionada com a guarda de coisas ou animais, a recair sobre quem tiver em seu poder a coisa móvel ou imóvel geradora do evento danoso e, cumulativamente, tenha o dever de a vigiar, cabendo na sua previsão apenas os danos causados pelas coisas e não os danos causados por alguém com o emprego das coisas, designadamente quando tal implique o respetivo controlo físico ou poder de facto, condição indispensável para a tomada de medidas de segurança que o caso exija e, por isso, suficiente para responsabilizar o respetivo agente no âmbito do regime geral da responsabilidade civil.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:
I. Relatório
AA, intentou ação declarativa comum contra EMP01..., S.A., peticionando que, pela sua procedência, se condene a ré:
A) a proceder à correção das patologias causadoras das infiltrações na sua fração;
B) no pagamento ao autor da quantia de 55.361,89€, sendo 45.361,89€ a título de danos patrimoniais e 10.000,00€ a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros vincendos, à taxa legal, até efetivo e integral pagamento.
Para tanto, alegou, em síntese, ser dono de uma fração onde exerce a sua profissão de arquiteto. Por força de obra levada a cabo no prédio da ré, o seu imóvel sofreu infiltrações de água o que veio a causar diversos prejuízos patrimoniais e danos não patrimoniais.
Foi apresentada contestação, na qual a ré admite ser efetivamente proprietária do prédio descrito no artigo 2.º da petição inicial, impugnando a restante matéria alegada pelo autor. Alega que, a existir algum tipo de responsabilidade ou culpa nos alegados danos sofridos, o autor teria de ter demandado a sociedade EMP02..., Unip., Lda., com quem a ré celebrou um contrato de empreitada referente à reabilitação e construção do edifício. Requereu o chamamento da empreiteira e ainda a condenação do autor como litigante de má fé, visto pretender obter da ré com este processo quase o dobro da quantia que despendeu para adquirir a fração em causa.
Foi admitida a intervenção principal provocada requerida pela ré, procedendo-se à citação da interveniente/chamada EMP02..., Unip., Lda.
Foi dispensada a audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador, fixado o valor da causa, delimitado o objeto do litígio e selecionados os temas da prova.
Foram admitidos os meios de prova, entre os quais a realização da perícia requerida por ambas as partes, encontrando-se junto aos autos o respetivo relatório, sujeito a ulteriores esclarecimentos, também constantes do processo e oportunamente notificados às partes.
Realizou-se a audiência final, após o que foi proferida sentença, absolvendo as rés dos pedidos e o autor do pedido de condenação como litigante de má fé.
Inconformado, o autor apresentou-se a recorrer, pugnando no sentido da revogação da sentença.
Termina as respetivas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem):
«1) Primeiramente, importa referir que a douta sentença recorrida é nula, porquanto, se a petição inicial enfermava de “escassez de factos», então, impunha-se que o Mmº. Juiz a quo convidasse o autor a aperfeiçoá-la e, assim não tendo procedido, deu prevalência à forma sobre a substância e violou o princípio do dispositivo, do contraditório e da gestão processual, o que torna a decisão recorrida absolutamente nula;
2) Não tendo sido esse o caminho seguido, há um vício de procedimento que se reflete na sentença;
3) É de primeira evidência que se impunha que o tribunal proferisse despacho de convite ao aperfeiçoamento da petição inicial. A falta desse despacho configura omissão de um ato que a lei prescreve e a situação é especialmente ostensiva porquanto o Mmº. Juiz do Tribunal a quo, além de omitir a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento, extraiu da deficiência da p.i. efeitos que se projetaram na improcedência da ação;
4) É isso que não pode acontecer, no nosso modesto entendimento: o juiz aperceber-se de uma deficiência de alegação fáctica e omite o despacho de convite ao aperfeiçoamento, para, logo de seguida, julgar a ação improcedente, a pretexto de tal deficiência de alegação. Ao proceder assim, o juiz viola a lei, na medida em que omite a prolação de um despacho que a lei impõe;
5) Resulta clara a ratio essendi dessa imposição legal, qual seja a de que nenhuma ação pode findar com um juízo de improcedência fundado na mera deficiência da alegação de facto, pois isso revelará que foi omitido o despacho de convite ao aperfeiçoamento fáctico do respetivo articulado;
6) Consequentemente a omissão de cumprimento desse dever traduz-se numa nulidade processual, porque o tribunal deixa de praticar um ato devido que não podia omitir e que se revela particularmente patente quando, como é o caso, acabe por ter reflexo na forma como a ação vem a ser decidida, mormente através de uma decisão de improcedência por insuficiência ou imprecisão na exposição ou concretização da matéria de facto;
7) Daí que o tribunal não pode deixar de dirigir o convite ao aperfeiçoamento do articulado e, mais tarde, considerar o pedido da parte improcedente precisamente pela falta do facto que a parte poderia ter alegado se tivesse sido convidada a aperfeiçoar o seu articulado;
8) Admitir o contrário seria desconsiderar por completo o dever de cooperação do tribunal: afinal, mesmo que este dever não tivesse sido cumprido, o tribunal poderia decidir como se tivesse sido dirigido à parte um convite ao aperfeiçoamento do articulado;
9) O juiz a quo omitiu esse convite de aperfeiçoamento e considerando que, como se assinalou, a omissão desse ato devido influiu no exame e decisão da causa, tal implica, pois, a nulidade da decisão, posto que a mesma julgou improcedente o pedido aduzido pelo autor pela falta de factos que poderiam ter sido invocados em cumprimento desse convite;
10) Face ao artigo 590.º, nº 2, al. b), e 4, do CPC, não há margem para controvérsia: o poder do juiz de convidar as partes a aperfeiçoar os seus articulados quando estes revelem insuficiências ou imprecisões na exposição ou concretização da matéria de facto alegada não é um poder discricionário, mas antes um poder-dever, um poder vinculado;
11) O convite ao aperfeiçoamento procura completar o que é insuficiente ou corrigir o que é impreciso, na certeza de que a causa de pedir existe e é percetível; apenas sucede que não foram alegados todos os elementos fácticos que a integram, ou foram-no em termos pouco precisos. Daí o convite ao aperfeiçoamento, destinado a completar ou a corrigir um quadro fáctico já traçado nos autos;
12) O Mm.º Juiz considerou a petição inicial “escassa”, quer por insuficiência de factos, quer por insuficiente concretização, mas não convidou o autor a aperfeiçoá-la, como lhe incumbia (citado artigo 590º, nº 2, al. b), e 4, do CPC);
13) Ferindo a sentença de uma causa de nulidade, nos termos do disposto no artigo 195º e 590º, nº2 al. b) e nº 4 do CPC;
14) A decisão do Mm.º Juiz recorrida desconsiderou as declarações de parte do autor AA e da testemunha BB, arquiteta, que explicou de acordo com o que viu, a execução da obra da Ré;
15) Sendo que esta testemunha do autor afirma perentoriamente que a Ré chamada procedeu, na obra adjacente ao imóvel do autor, à retirada do telhado numa altura em que chovia há, pelo menos, 2 dias, tendo aquela obra ficado completamente a descoberto, o que levou a que a água da chuva entrasse diretamente dentro da obra e consequentemente fez com que entrasse água de forma abrupta dentro do imóvel do autor, mais concretamente pela parede noroeste do seu gabinete de arquitetura;
16) Do mesmo modo, entendeu o Mm.º Juiz a quo que o depoimento da testemunha CC, testemunha do Autor, engenheiro civil, que de forma assertiva disse que na sua grande maioria, os danos teriam sido provocados pela entrada abrupta de água proveniente da obra da Ré e não da água da chuva, não tendo em consideração as declarações da mesma;
17) Igualmente, o Mm.º Juiz a quo, não teve em consideração o depoimento da testemunha DD, testemunha do autor, que demonstrou o profundo desgosto sentido pelo Autor provocado pelos danos da infiltração;
18) Os depoimentos dessas testemunhas revelaram-se isentos, coerentes e espontâneos e para além de se basearem nas mais válidas e sólidas razões de ciência, foram prestadas de forma clara, firme, serena e desinteressada, em termos de deverem merecer toda a credibilidade;
19) Entende-se que a sentença padece de um erro de julgamento, no que toca a estes factos porquanto, contrariamente ao que o Mm. º Juiz a quo considerou não provado, resultou amplamente provado que as infiltrações provêm da obra da Ré;
20) A testemunha BB esclareceu ao douto tribunal que se encontrava a realizar uma obra adjacente à parede noroeste da fração do Autor. Esclareceu também que as infiltrações advieram daquela obra uma vez que a mesma se encontrava a descoberto e não tinha acautelada a devida proteção para escoamento das águas, impedindo assim o infiltramento de água na parede meeira;
21) Nada houve neste depoimento que pusesse em causa a verdade e as razões de ciência do seu depoimento que prestou sempre de forma clara, descomprometida, coerente e segura. No entanto, este depoimento não foi valorado pelo tribunal;
22) O depoimento desta testemunha foi corroborado pelas declarações de parte do Autor AA, o qual prestou um depoimento credível, coerente, merecedor de toda a credibilidade;
23) Não se conforma o Apelante por as suas declarações não terem sido valoradas, uma vez que foi claro no sentido de descrever a situação física dos prédios, a infiltração, a descrição do momento em que a infiltração ocorreu de forma abrupta, bem como onde se encontra a parede noroeste;
24) O Mm.º Juiz a quo, desvalorizou o relatório de peritagem realizada no dia 21 de janeiro de 2023, pelo Sr. perito EE, em que ficou amplamente demonstrado que a fração do autor ficou danificada, nomeadamente a nível generalizado, registando níveis máximos de humidade nas paredes orientadas a noroeste;
25) No Relatório Pericial, pedido pelo Autor e realizado no dia 3 de março de 2020, foi junto várias fotos demonstrativas dos danos na fração do Autor;
26) Não percebe o Apelante como pôde o Mm.º Juiz do Tribunal a quo ter considerado o facto 11) e 12) como factos provados, mas ter considerado o facto c) como facto não provado, uma vez que todos eles vêm explícitos em ambas as perícias.
27) Face à prova produzida, não podia o Tribunal a quo, ter decidido pela absolvição da Ré, como decidiu, uma vez que ficou amplamente provado que as infiltrações advieram da obra na propriedade da Ré. Tendo posteriormente, a água infiltrada permanecendo nas paredes, teto e chão da fração do Autor, o que tornou a humidade mais explicita, humidade essa que o Sr. Perito analisou;
29) Além da prova testemunhal foi junto ao processo, pelo Autor, vasta prova documental, como fotografias juntas na P.I. sob. Doc. n.º 5 a 27; Relatório Pericial, que se trata de um documento emitido pelo perito CC, em 03/03/2020, aquando da visita realizada à fração do Autor, a pedido do mesmo, em que o mesmo nas suas conclusões refere que “os problemas encontrados, na sua maioria, não são justificados pelo uso e idade do edifício, mas com o contacto continuado com água originando humidade extrema”;
30) A prova testemunhal pode muitas vezes ser subjetiva, contudo, a prova documental tem uma força probatória muito mais forte e eficaz na descoberta da verdade;
31) Resultou amplamente provado, quer da prova documental junto aos autos, quer da prova produzida em audiência que as infiltrações advieram da entrada de água abrupta por força da obra que se encontrava a ser realizada na propriedade da Ré e que se encontrava a descoberto, permitindo que as águas pluviais ficassem retidas nas lajes da obra e consequentemente infiltrassem na fração do Autor e, por isso, a Ré é responsável pelos danos causados ao Autor;
32) O Relatório Pericial efetuado em 21/01/2023 pelo Sr. Perito EE defende que as infiltrações se deviam a uma má impermeabilização do edifício;
33) Essa versão foi contradita na medida em que a testemunha BB e o próprio Autor, acabaram por admitir que mal a obra da Ré foi coberta, as infiltrações cessaram. Tendo apenas ficado a humidade presente fruto daquelas infiltrações;
34) Assim, as infiltrações foram causadas pelo facto de a obra da Ré ter estado a descoberto, permitindo que as águas pluviais encostassem na parede meeira entre os dois prédios, e daí ter ocorrido as infiltrações na fração do Autor;
35) O dono do edifício sempre assumiu, ainda que na pessoa da empreiteira, que todos os danos seriam reparados e seria dada solução a esta questão;
36) Impõe-se assim a reapreciação da Douta Sentença, em primeira linha, quanto à nulidade da falta de convite ao aperfeiçoamento, nos termos do disposto no artigo 6º, 195º e 590º, nº2 al. b) e nº 4 do CPC;
37) Por outra via, impõe-se a reapreciação quanto ao incorreto julgamento da matéria de facto, por não extração de forma correta das consequências jurídicas da matéria de facto apurada no decurso da audiência;
38) Na reapreciação dos meios de prova, tal como no regime anterior, a Relação procede a novo julgamento da matéria de facto impugnada, em busca da sua própria convicção, assim assegurando o duplo grau de jurisdição sobre essa mesma matéria, com a mesma amplitude de poderes da 1.ª instância;
39) Conforme decorre dos depoimentos das testemunhas, as infiltrações advieram da obra que se encontrava a ser realizada no prédio ao lado, propriedade da Ré e, por conseguinte, responsabilidade da mesma;
40) A verdade é que aquela água, não fosse a demolição do prédio da propriedade da Ré, primitivamente existente, por mais precipitação que se verificasse, nunca teria causado tais danos;
41) Quando a cobertura da obra da Ré foi efetivamente concluída, as infiltrações deixaram de ocorrer, tendo cessado;
42) O artigo 493º, nº 1 do Código Civil estatui: “Quem tiver em seu poder coisa móvel ou imóvel, com o dever de a vigiar, e bem assim quem tiver assumido o encargo da vigilância de quaisquer animais, responde pelos danos que a coisa ou os animais causarem, salvo se provar que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa.”;
43) O legislador presume a culpa do agente, onerando-o com a prova de que o evento se não deveu a culpa sua, podendo ser ilidível mediante prova em contrário pelo lesante de que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua. O que, nos presentes autos, não se verificou, pois não há qualquer prova por banda da Ré da sua ausência de culpa;
44) A Ré alega que transferiu a sua responsabilidade para a empreiteira tendo em conta a existência de um contrato de empreitada que apresentou com o seu articulado, escudando-se de responsabilidade, quando na realidade sempre a Ré tinha o dever de vigilância da sua coisa, nos termos do artigo 493º, nº 1 do CC;
45) Contudo, salvo melhor e mais douto entendimento, tal contrato não nos é vinculativo. A Ré sempre terá responsabilidade na medida em que é a proprietária da coisa, podendo em segunda via, a Ré imputar aquela responsabilidade à empreiteira, pelo exercício do direito de regresso;
46) A Ré Chamada, a empreiteira, nem sequer veio aos autos oferecer contestação ou declarar que fazia seus os articulados da Ré, nos termos do artigo 319º, nº 3 do CPC. A Ré Chamada não teve qualquer intervenção no processo, nem sequer veio invocar a existência de um contrato de seguro colocando-a assim numa aparente situação de “revelia”, tendo-se tratado, muito provavelmente, de uma estratégia para dificultar a pretensão do Autor;
47) O Mm.º Juiz do Tribunal a quo, tinha o dever de convidar o Autor ao aperfeiçoamento do seu articulado. Não o fazendo, o Juiz poderia no decorrer da audiência de julgamento, ter ficado convicto dos factos extraindo as suas conclusões. O que, não fez e que deveria, e podia, ter feito, tendo em conta a prova produzida;
48) “No julgamento da matéria de facto, importa ter presente a prevalência do princípio da liberdade de julgamento, o tribunal aprecia livremente as provas, decidindo segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto controvertido, não invalidando a convicção do tribunal o facto de não existir uma prova direta e imediata da generalidade dos factos em discussão, sendo legítimo que se extraiam conclusões em função de elementos de prova, segundo juízos de normalidade e de razoabilidade, ou que se retirem ilações a partir de factos conhecidos.”;
49) O juiz pode utilizar livremente, sem necessidade de prova sobre elas, as regras de experiência cujo conhecimento se pode supor numa pessoa com a sua formação. O próprio ordenamento jurídico parte da liberdade do juiz para utilizar estas máximas da experiência de conhecimento geral sem que as mesmas se inscrevam no processo através da produção de prova;
50) É notório que em pleno inverno, em dias com forte incidência de precipitação, encontrando-se uma obra sem telhado (a descoberto) e não tendo sido providenciado o escoamento das águas, estas ficam retidas dentro da obra, inundam as lajes e começam a infiltrar nas paredes. Neste caso, havendo paredes meeiras, é lógico que facilitaria a entrada de água na fração lateral. Logo, só por aqui, fica demonstrada a culpa da Ré.
51) Em síntese, a decisão recorrida violou o disposto, entre outros, nos artigos 3º, 6º, 195º e 590º, nº2 al. b) e nº 4 do CPC bem como violou o disposto no artigo 493º, nº 1 do CC, devendo declarar-se a nulidade da sentença por omissão do despacho de convite ao aperfeiçoamento.
52) Assim revogando a douta decisão recorrida e substituindo-a por outra que se coadune com a pretensão ora formulada, farão V/ Exa. inteira e merecida justiça!».
A ré apresentou resposta, sustentando a improcedência da apelação e a consequente manutenção do decidido.
O Tribunal a quo proferiu o despacho previsto nos artigos 617.º, n.º 1, e 641.º, n.º 1, do CPC, entendendo não padecer a decisão recorrida de qualquer nulidade.
O recurso foi admitido como apelação, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
Os autos foram remetidos a este Tribunal da Relação, confirmando-se a admissão do recurso nos mesmos termos.
II. Delimitação do objeto do recurso
Face às conclusões das alegações do recorrente, e sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso - cf. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC) - o objeto da apelação circunscreve-se às seguintes questões:
A) Nulidade da decisão recorrida;
B) Impugnação da decisão sobre a matéria de facto;
C) Reapreciação do mérito da decisão recorrida em função da pretendida modificação da matéria de facto: aferir se a sentença recorrida incorreu em erro na interpretação e aplicação do direito.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
III. Fundamentação
1. Os factos
1.1. Os factos, as ocorrências e elementos processuais a considerar na decisão deste recurso são os que já constam do relatório enunciado em I. supra, relevando ainda os seguintes factos considerados provados pela 1.ª instância na sentença recorrida:
1. O Autor é proprietário da fração ... do prédio urbano sito na Rua ..., ... ..., inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...49... da União de Freguesias ..., ... e ... (... e ...).
2. A Ré é proprietária do prédio do prédio urbano sito na Rua ..., ... ..., inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...09 da União de Freguesias ..., ... e ... (... e ...).
3. Em 2019, a chamada (contratada pela ré para o efeito) encontrava-se a efetuar obra adjacente (no prédio mencionado em 2) à parede noroeste do escritório do Autor.
4. A 12-12-2019, num dia chuvoso, o Autor saiu do escritório para almoçar e, quando regressou, encontrou o pavimento do escritório com água, e escorria água pela parede noroeste e pingava pelo teto em diversos pontos do espaço.
5. Face ao sucedido, o Autor dirigiu-se à obra de construção adjacente, onde encontrou dois trabalhadores da Ré a executar trabalhos ao nível da cobertura da obra, tendo-os informado de que estava a entrar água de forma abundante na sua fração, proveniente da obra em curso, tendo os trabalhadores se deslocado de imediato à fração do Autor para confirmar a situação, sendo que, após verificarem que a inundação provinha da obra, os trabalhadores rapidamente se apressaram e disseram ao Autor que iriam tomar as providências necessárias e informar o responsável pela mesma.
6. Tendo continuado a entrar água no escritório do Autor nos dias seguintes, o que impediu o prosseguimento da atividade laboral na fracção.
7. E fez com que o Autor e os seus colegas de trabalho que ali laboram, tivessem que retirar a água do chão e a apanhar água que caía do tecto.
8. No dia seguinte, o Autor dirigiu-se à sede da Ré com vista a alertar pessoalmente o legal representante da mesma, o Sr. FF, da situação em crise.
9. Nessa sequência, o Autor foi contactado pelo construtor, que agendou uma visita à fração do Autor.
10. As infiltrações cessaram em dia não concretamente apurado.
11. Na sequência daquelas infiltrações a fração do Autor ficou danificada no teto em gesso cartonado da sala do imóvel e na respetiva parte elétrica, e na zona revestida a cortiça.
12. O custo de reparação destas situações implica o montante de 6300 euros sem IVA.
13. O Autor sentiu desgosto por ter o seu escritório, onde mantém o seu domicílio profissional, com um aspeto danificado e sujo.
14. E durante um período de tempo absteve-se de realizar consultas com os clientes naquele espaço, sentindo vergonha quando tem de lá levar clientes e/ou colegas de profissão.
15) O teor do acordo denominado de contrato de empreitada entre a ré e a chamada que aqui se dá por reproduzido.
16) Designadamente, Clausula Oitava (Responsabilidade e Seguros): 1. O empreiteiro é responsável perante o dono da obra ou terceiros, nos termos gerais de direito e, designadamente, por factos imputáveis ao comportamento dos seus empregados, colaboradores ou subempreiteiros, pelas consequências resultantes de deficiente execução dos trabalhos ou má qualidade dos matérias e/ou utensílios utilizados. 2. O empreiteiro deverá segurar contra acidentes de trabalho todo o seu pessoal. Deverá igualmente ser possuidor de um seguro de responsabilidade civil, perante terceiros, que cubra eventuais danos causados a pessoas e bens durante a execução dos trabalhos.
17) E Clausula Decima Segunda (Responsabilidade do Empreiteiro): Para alem da Responsabilidade do Empreiteiro relativamente à boa execução e utilização de materiais por parte dos seus funcionários, fica também responsável em termos de indemnização civil perante danos que estes causem a terceiros.
1.2. Factos considerados não provados pela 1.ª instância na sentença recorrida:
a) A partir de novembro de 2019, o Autor começou a notar escorrimentos de água na parede noroeste do seu escritório e pequenas poças de água dispersas no chão.
b) A fração do autor sofreu infiltrações durante toda a execução da obra e permanece, até hoje, com infiltrações e humidades provenientes da execução da obra da Ré.
c) Para além do supra mencionado, a fração do autor ficou danificada com o seguinte: na generalidade do espaço, mas mais visivelmente nas paredes orientadas a noroeste em alvenaria de tijolo rebocado e pitado a cinzento “é visível a degradação das mesmas, com empolamento da pintura em várias zonas, desprendimento de tintas, mudança da cor própria e afloramento de manchas de infiltração em vários locais bem como fissuras e zonas de escorrimentos diversos. Verifica-se ainda o desprendimento nos rebocos base das tintas em zonas diversas e a presença de bolores. Identifico o desabamento parcial da padeira de uma gateira.”; O sistema elétrico ficou ainda danificado, apresentando mau funcionamento, resultando em duas salas não eletrificadas e em equipamentos de iluminação que não funcionam, além de várias tomadas de parede e pavimento que ficaram completamente danificadas e outras não funcionam devidamente.
d) E que tudo isto implica o custo de reparação de €24.872,76 (vinte e quatro mil, oitocentos e setenta e dois euros e setenta e seis cêntimos).
e) As infiltrações danificaram os seguintes bens do autor: 56 Caixa de capa arquivo; 56 Caixa de capa arquivo A4; 136 Capas A4; 8 tampos de mesa; 2 telas decorativas; 20 capas de CD; 1 diversos (separadores, tubos, etc.); 19 caixas cartão; 2 papel ploter 610mm; 1 papel ploter 914mm; 4 resmas papel A4; 50 resmas de papel A4 em processos; 1 resma de papel A3 em processos; 4 cadeiras de madeira; 1 agrafador; 1 agrafos; 1 papel higiénico;1 tinteiro azul; 1 guilhotina 1,3m; 1 molas; 1 porta lápis; 2 resmas papel A3; 2 sofás individuais; 12 estantes metálicas; 7 tampos de secretária; 14 pernas de secretária; 10 prateleiras para molduras; 20 quadros e molduras; 1 guitarra GG; 1 baixo warwick rock bass; 1 coluna de som fame; 1 limpeza geral de fungos e bolores; 1 teclado casio; 8 capas A4 elástico; 1 caixa de guitarra; 1 caixa de baixo; 1 plotter; 1 arquivo de catálogos e materiais; 1 mesa de reuniões; 1 coluna de som peavey c/ amplificador; 1 coluna de som fender; 1 bateria ...; 1 ...; 1 baixo artz; 6 cabos de ligação; 1 auscultadores; 1 plastificador; 1 mesinha de apoio; 1 cadeira de rodízio elevatórias; 8 triplas; 1 encadernadora A4; 1 Escalfeta; 1 Impressora Epson; 1 Portátil para 3D; 1 Impressora 3d BQ; 1 mochila Samsonite; 1 plotter A1; 1 balde de lixo em pele; 1 pasta camel;
f) Estes bens têm o valor global de € 20.489,13 (vinte mil, quatrocentos e oitenta e nove euros e treze cêntimos).
g) Com as infiltrações supra mencionadas, a humidade presente na fracção causou o aparecimento de bolor, que continuou a crescer a olho nu, tornando o ar totalmente contaminado e irrespirável, sujeitando o Autor e os seus colegas de escritório à convivência diária com aquele fungo e com a inalação daquele mesmo ar contaminado, situação esta que dura há pelo menos oito meses e que se mantém até ao dia de hoje.
2. Apreciação sobre o objeto do recurso.
2.1. Da invocada nulidade da sentença recorrida.
Insurge-se o apelante contra a sentença final que, após produção de prova em audiência final, absolveu as rés dos pedidos.
Sobre a questão agora em apreciação sustenta o apelante/autor, no essencial, que o Tribunal a quo fundamenta a sua decisão na inexistência de factos que permitam operar a responsabilidade extracontratual - “atenta a escassez de factos alegados e necessariamente demonstrados, o tribunal não consegue extrair a omissão culposa da empreiteira…” - pelo que se impunha que proferisse despacho de convite ao aperfeiçoamento da petição inicial.
Conclui que a falta desse despacho configura omissão de um ato que a lei prescreve e a situação é especialmente ostensiva porquanto o Mmº. Juiz do Tribunal a quo, além de omitir a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento, extraiu da deficiência da p.i. efeitos que se projetaram na improcedência da ação, ferindo a sentença recorrida de uma causa de nulidade, nos termos do disposto nos artigos 195.º e 590.º, n.º 2, al. b) e n.º 4 do CPC.
Apreciando, importa salientar que as nulidades processuais - que são habitualmente classificadas em principais, nominadas ou típicas, tal como previstas nos artigos 186.º, 187.º, 191.º, 193.º e 194.º CPC e, por outro lado, secundárias, inominadas ou atípicas[1], estas residualmente incluídas na previsão geral do artigo 195.º CPC[2] - têm como uma das particularidades o regime de arguição perante o tribunal que omitiu o ato e não em sede de recurso, não consubstanciando, por isso, causa de nulidade da decisão, implicando, assim, com referência às causas de nulidade da sentença previstas no artigo 615.º do CPC, «que se estabeleça uma separação entre nulidades de processo e nulidades de julgamento, sendo que o regime do preceito apenas a esta se aplica; as demais deverão ser arguidas pelas partes ou suscitadas oficiosamente pelo juiz, nos termos previstos noutros normativos»[3].
No caso vertente está em causa a invocação de uma nulidade processual, dependente, como se viu, da omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, sendo certo, ainda assim, que tal omissão só produz nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.
Com efeito, não configurando uma nulidade principal, nominada ou típica, nos termos previstos nos artigos 186.º, 187.º, 191.º, 193.º e 194.º CPC, a aludida nulidade processual inclui-se residualmente na previsão geral do artigo 195.º CPC, devendo ser classificada como secundária, inominada ou atípica.
Tratando-se de nulidade para a qual a lei não prevê um regime específico de arguição, é aplicável o regime previsto no artigo 199.º, n.º 1, do CPC, que estabelece a regra geral sobre o prazo de arguição de nulidades secundárias: se a parte estiver presente, por si ou por mandatário, no momento em que forem cometidas, podem ser arguidas enquanto o ato não terminar; se não estiver, o prazo para a arguição conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum ato praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência.
O citado artigo 590.º do CPC, com a epígrafe «Gestão inicial do processo», dispõe, no que ora releva, o seguinte:
«(…)
2 - Findos os articulados, o juiz profere, sendo caso disso, despacho pré-saneador destinado a:
a) Providenciar pelo suprimento de exceções dilatórias, nos termos do n.º 2 do artigo 6.º; b) Providenciar pelo aperfeiçoamento dos articulados, nos termos dos números seguintes;
c) Determinar a junção de documentos com vista a permitir a apreciação de exceções dilatórias ou o conhecimento, no todo ou em parte, do mérito da causa no despacho saneador.
3 - O juiz convida as partes a suprir as irregularidades dos articulados, fixando prazo para o suprimento ou correção do vício, designadamente quando careçam de requisitos legais ou a parte não haja apresentado documento essencial ou de que a lei faça depender o prosseguimento da causa. 4 - Incumbe ainda ao juiz convidar as partes ao suprimento das insuficiências ou imprecisões na exposição ou concretização da matéria de facto alegada, fixando prazo para a apresentação de articulado em que se complete ou corrija o inicialmente produzido.
5 - Os factos objeto de esclarecimento, aditamento ou correção ficam sujeitos às regras gerais sobre contraditoriedade e prova.
6 - As alterações à matéria de facto alegada, previstas nos n.os 4 e 5, devem conformar-se com os limites estabelecidos no artigo 265.º, se forem introduzidas pelo autor, e nos artigos 573.º e 574.º, quando o sejam pelo réu.
7 - Não cabe recurso do despacho de convite ao suprimento de irregularidades, insuficiências ou imprecisões dos articulados».
Na determinação das consequências da falta de prolação do despacho pré-saneador, nos termos e para os efeitos do artigo 590.º, n.º 4 do CPC, há que ter em conta que a formulação nele consagrada «pôs termo à discussão que vinha existindo, por referência ao art. 508º, nº 3, do CPC de 1961, acerca da natureza do despacho destinado ao aperfeiçoamento dos articulados, ficando agora (mais) claro o seu carácter vinculado, arredando a possibilidade de o juiz optar entre proferir ou não tal despacho», pelo que, «[a] falta de prolação do despacho pré-saneador nos termos e para os efeitos do art. 590.º, nº 4, configura a omissão de um ato que a lei prescreve. Essa situação é especialmente ostensiva quando o juiz, além de omitir a prolação do despacho pré-saneador de convite ao aperfeiçoamento, extrai das deficiências do articulado efeitos que se projetam de imediato na procedência ou na improcedência da ação ou da exceção perentória»[4].
Conforme já explicitava o Prof. Alberto dos Reis[5], «[a] arguição da nulidade só é admissível quando a infracção processual não está ao abrigo de qualquer despacho judicial; se há um despacho a ordenar ou autorizar a prática ou a omissão do acto ou da formalidade, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade que se tenha cometido, não é a arguição ou reclamação por nulidade, é a impugnação do respectivo despacho pela interposição do recurso competente.
(…) Desde que um despacho tenha mandado praticar determinado acto, por exemplo, se porventura a lei não admite a prática dêsse acto é fora de dúvida que a infracção cometida foi efeito do despacho; por outras palavras, estamos em presença dum despacho ilegal, dum despacho que ofendeu a lei do processo. Portanto a reacção contra a ilegalidade traduz-se num ataque ao despacho que a autorizou ou ordenou», sendo o meio idóneo a interposição do respetivo recurso».
Também à luz do regime processual vigente a doutrina vem defendendo de forma consistente que em situações nas quais a prática de alguma nulidade processual de conhecimento oficioso ou a omissão de alguma formalidade de cumprimento obrigatório (como a que demanda o exercício do contraditório) se projeta na sentença, a reação da parte interessada passa pela interposição de recurso em cujo âmbito se inscreva a arguição daquelas nulidades[6].
Sucede que os n.ºs 5 e 6 do citado artigo 590.º do CPC definem os parâmetros em que o aperfeiçoamento pode ocorrer, estipulando expressamente este último normativo que as alterações à matéria de facto alegada, previstas nos n.ºs 4 e 5, devem conformar-se com os limites estabelecidos no artigo 265.º, se forem introduzidas pelo autor.
Neste domínio, o artigo 265.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, sob a epígrafe Alteração do pedido e da causa de pedir na falta de acordo, dispõe que:
1 - Na falta de acordo, a causa de pedir só pode ser alterada ou ampliada em consequência de confissão feita pelo réu e aceita pelo autor, devendo a alteração ou ampliação ser feita no prazo de 10 dias a contar da aceitação.
2 - O autor pode, em qualquer altura, reduzir o pedido e pode ampliá-lo até ao encerramento da discussão em 1.ª instância se a ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo.
Este preceito, a par do artigo 264.º do CPC[7], enuncia as exceções à regra da estabilização da instância quanto ao seu elemento objetivo[8].
Por seu turno, o artigo 5.º, n.º 1 CPC dispõe que cabe às partes, além do mais, «alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir (…)», correspondendo esta ao facto ou factos jurídicos concretamente invocados para sustentar o direito que o autor se propõe fazer declarar, o efeito jurídico pretendido ou o pedido formulado - cf. artigo 581.º, n.ºs 3 e 4 CPC[9] - cabendo a cada uma das partes o ónus da alegação dos factos cujo efeito lhe é favorável[10].
Assim, «[f]ora o caso de acordo das partes (art. 264), a alteração e a ampliação da causa de pedir só podem ter lugar quando os novos factos sejam introduzidos no processo já provados, em consequência de confissão feita pelo réu (art. 265-1), ou sejam supervenientes, isto é, tenham ocorrido ou sido conhecidos depois da petição inicial (art. 88-1)»[11].
Daí que o convite ao aperfeiçoamento, previsto no referido artigo 590.º, n.º 4 do CPC, se destine a «completar ou a corrigir um quadro fáctico já traçado nos autos. Coisa diversa, e afastada do âmbito do art. 590º, nº 4, seria permitir à parte, na sequência desse despacho, apresentar, ex novo, um quadro fáctico até então inexistente ou de todo impercetível (o que, aqui, equivale ao mesmo), restrição que, aliás, também decorre do art. 590, nº 6»[12].
Decorre do exposto que «[a] intervenção do juiz, apontando defeitos na narração dos factos, deve pautar-se por grande rigor e sobriedade, não cabendo ao juiz imiscuir-se nas opções assumidas pelas partes, nem sugerir outras alternativas, ainda que, eventualmente, mais vantajosas. Neste âmbito, a estratégia da parte baliza a intervenção do juiz e será dentro desses limites que o juiz deve cuidar de verificar se a alegação fáctica apresente insuficiências ou imprecisões, proferindo o despacho de convite ao aperfeiçoamento quando conclua haver imperfeições»[13].
Tal como se refere no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24-01-2019[14] «[o] princípio da cooperação deve ser conjugado com os princípios do dispositivo e da auto-responsabilidade das partes, que não comporta o suprimento por iniciativa do juiz da omissão de indicação do pedido ou de alegação de factos estruturantes da causa de pedir.
O convite ao aperfeiçoamento de articulados previsto no artigo 590.º, n.ºs 2, alínea b), 3 e 4, do CPC, não compreende o suprimento da falta de indicação do pedido ou de omissões de alegação de um núcleo de factos essenciais e estruturantes da causa de pedir.
Tal convite, destina-se somente a suprir irregularidades dos articulados, designadamente quando careça de requisitos legais, imperfeições ou imprecisões na exposição da matéria de facto alegada.
As deficiências passíveis de suprimento através do convite têm de ser estritamente formais ou de natureza secundária, sob pena de se reabrir a possibilidade de reformulação substancial da própria pretensão ou da impugnação e dos termos em que assentam (artigos 590.º, n.º 6 e 265.º, do CPC).
De outra forma, afrontar-se-ia o princípio da estabilidade da instância, previsto no art.º 260.º do CPC, nos termos do qual, após a citação do réu, a instância estabiliza-se quanto ao objecto e às partes, sendo legalmente limitada qualquer possibilidade de alteração objectiva ou subjectiva».
Retomando a específica arguição de nulidade em apreciação, logo se observa que o recorrente nem sequer indica de forma especificada quais os concretos factos que poderiam ter sido invocados em cumprimento de um eventual convite ao aperfeiçoamento. Em todo o caso, resulta manifesto que a matéria agora genericamente invocada pelo apelante em sede de apelação, e cuja alegação fáctica foi omitida por estes no âmbito dos articulados da presente ação, não se destina simplesmente a densificar ou a concretizar de forma adequada algum aspeto ou vertente dos factos essenciais inicialmente alegados e em que o autor funda a pretensão deduzida, nem tal vem devidamente explicitado pelo apelante, antes implicando a invocação de um quadro fáctico estruturante, inovador e de todo impercetível à luz da concreta causa de pedir delimitada na petição inicial.
Por outro lado, e tal como sublinha José Lebre de Freitas [15]«é com incorreção terminológica que o art. 410 diz que a instrução tem por “objeto” os temas da prova enunciados e, pleonasticamente, que, só na falta dessa enunciação o seu objeto são os factos “necessitados de prova”. Provam-se factos; não se provam temas».
E, neste domínio, esclarece ainda o referido Autor[16] «os temas da prova (…) constituem apenas quadros de referência, dentro dos quais há que recorrer, como no CPC de 1961, aos factos alegados pelas partes».
Assim, resta concluir que o Tribunal a quo não omitiu a prática de qualquer ato ou de formalidade que a lei prescreva, nem violou o dever de gestão processual os princípios da cooperação, da adequação processual ou do inquisitório, não ocorrendo a violação de qualquer dos normativos invocados pelo recorrente.
Por conseguinte, a sentença recorrida não enferma da arguida nulidade.
2.2. Da impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
O apelante impugna a decisão relativa à matéria de facto incluída na sentença recorrida, pretendendo o aditamento à matéria provada dos factos julgados não provados em b) - «A fração do autor sofreu infiltrações durante toda a execução da obra e permanece, até hoje, com infiltrações e humidades provenientes da execução da obra da Ré» - c) - «Para além do supra mencionado, a fração do autor ficou danificada com o seguinte: na generalidade do espaço, mas mais visivelmente nas paredes orientadas a noroeste em alvenaria de tijolo rebocado e pitado a cinzento “é visível a degradação das mesmas, com empolamento da pintura em várias zonas, desprendimento de tintas, mudança da cor própria e afloramento de manchas de infiltração em vários locais bem como fissuras e zonas de escorrimentos diversos. Verifica-se ainda o desprendimento nos rebocos base das tintas em zonas diversas e a presença de bolores. Identifico o desabamento parcial da padeira de uma gateira.”; O sistema elétrico ficou ainda danificado, apresentando mau funcionamento, resultando em duas salas não eletrificadas e em equipamentos de iluminação que não funcionam, além de várias tomadas de parede e pavimento que ficaram completamente danificadas e outras não funcionam devidamente» - e g) - «Com as infiltrações supra mencionadas, a humidade presente na fração causou o aparecimento de bolor, que continuou a crescer a olho nu, tornando o ar totalmente contaminado e irrespirável, sujeitando o Autor e os seus colegas de escritório à convivência diária com aquele fungo e com a inalação daquele mesmo ar contaminado, situação esta que dura há pelo menos oito meses e que se mantém até ao dia de hoje».
Relativamente à impugnação referente à al. b) dos factos não provados, o apelante alega que o Tribunal a quo desvalorizou o depoimento da testemunha BB e as declarações de parte do próprio autor, aludindo para o efeito a diversas passagens da gravação e transcrição de segmentos dos respetivos depoimentos.
Por seu turno, em relação à impugnação referente à al. c) dos factos não provados, alega o apelante que o Tribunal recorrido desvalorizou o relatório de peritagem realizado no dia 2-01-2023 pelo perito EE, sustentando que do mesmo resulta que a fração do autor ficou danificada, nomeadamente a nível generalizado, registando níveis máximos de humidade nas paredes orientadas a noroeste. Alude ainda a relatório pericial, pedido por si e realizado no dia 3-03-2020, ao qual foram juntas várias fotos que refere serem demonstrativas dos danos na sua fração.
O apelante insurge-se contra a resposta negativa dada à al. g) dos factos não provados, aludindo para o efeito a curtos segmentos do depoimento da testemunha BB e das declarações de parte do próprio autor, em conjunto com o relatório pericial de 21-01-2023 dos quais sustenta ser manifesto a existência de humidades, causando o aparecimento de bolor e que consequentemente tornou o ar irrespirável.
Por último, o apelante alude ainda genericamente às fotografias juntas com a petição inicial e ao relatório que juntou com tal articulado, subscrito pelo perito CC, em 03-03-2020 aquando da visita realizada à fração do autor, a pedido deste,e às seguintes conclusões nele enunciadas: “os problemas encontrados, na sua maioria, não são justificados pelo uso e idade do edifício, mas com o contacto continuado com água originando humidade extrema”.
Com vista à completa perceção da facticidade impugnada pelo recorrente, e no intuito de evitar conclusões descontextualizadas sobre tal matéria, uma vez que a prova terá de ser analisada globalmente e não de forma parcial ou restrita a certos meios de prova que o recorrente entende serem favoráveis à sustentação da impugnação deduzida, foram revistos e analisados criticamente e de forma atenta todos os meios probatórios produzidos, o que envolve a globalidade dos depoimentos/declarações prestados em audiência final, o relatório da perícia realizada nos presentes autos, subscrito pelo perito Eng.º EE (de 21-01-2023), os esclarecimentos por este prestados em relatório adicional junto a 14-03-2023 e em sede de audiência final, a ponderação dos documentos juntos pelas partes ao processo, sem esquecer os factos já devidamente consolidados no autos, sendo que da respetiva análise não decorrem motivos consistentes que imponham a alteração preconizada pelo apelante quanto aos aludidos segmentos controvertidos da matéria de facto.
No âmbito dos factos agora em referência estamos indiscutivelmente perante matéria que assume natureza essencialmente técnica, exigindo conhecimentos especiais para o efeito.
Nos termos do artigo 388.º do Código Civil (CC), a prova pericial tem por fim a perceção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objeto de inspeção judicial.
Muito embora a força probatória das respostas do perito seja fixada livremente pelo Tribunal (artigo 389.º CC), importa atender à especial relevância que no caso em apreciação assume a aferição, análise e indicação, no relatório pericial, da(s) causa(s) ou origem das patologias ou dos danos verificados no local em referência pois tais aspetos configuram elementos absolutamente indispensáveis para o juiz decidir,
Importa, por isso, atender à especial relevância que assume no caso o referido relatório da perícia realizada nos presentes autos, subscrito pelo perito Eng.º EE (de 21-01-2023), que não foi impugnado pelas partes, e os esclarecimentos por este prestados em relatório adicional junto a 14-03-2023 e em sede de audiência final.
No contexto em que determinados meios de prova apresentam versões distintas, e mesmo contraditórias, sobre factos que se mostram impugnados, como sucede nos presentes autos, é normal que o julgador procure analisar criticamente os depoimentos prestados, confrontando-os entre si e com os restantes meios de prova disponíveis de modo a evidenciar a credibilidade de tais depoimentos à luz das regras da experiência.
No caso, o Tribunal a quo formou o seu convencimento sobre a(s) causa(s) ou origem das patologias ou dos danos verificados no local em referência com base no aludido relatório pericial, para o qual remeteu de forma expressa no âmbito da fundamentação atinente às impugnadas als. c) e g) dos factos não provados e com extensas citações no âmbito da motivação da decisão sobre a matéria de facto atinente aos pontos 11 e 12 dos factos provados, que qualificou de consistente, técnico, detalhado, crítico e fundado.
Deste modo, contrariamente ao que alega o recorrente, resulta manifesto que o Tribunal recorrido ponderou a globalidade da prova produzida, o que inclui o depoimento da testemunha BB, colega de trabalho do autor, e as declarações de parte do próprio autor, ainda que valorando de forma decisiva as conclusões da perícia realizada nos presentes autos, a propósito da(s) causa(s) ou origem das patologias ou dos danos verificados no local em referência.
Como tal, o resultado da perícia foi determinante para alicerçar a valoração crítica que o Tribunal recorrido efetuou relativamente aos restantes meios de prova produzidos, bem como a respetiva convicção a propósito da factualidade provada e não provada.
Reapreciado o relatório da perícia realizada nos presentes autos, confirma-se que só ignorando as conclusões nele vertidas se poderia admitir outra decisão para os concretos pontos da matéria de facto agora impugnados pelo apelante.
Basta atentar na resposta ao quesito em que se perguntava, quais as causas das infiltrações, esclarecendo o perito nomeado pelo Tribunal sobre esta matéria: «[a]tendendo à generalidade dos danos observados na fração do Autor, estes decorrem de infiltrações generalizadas propiciadas pela falta de impermeabilização das áreas envolventes do imóvel, a saber, fundações do pavimento onde assenta o imóvel e paredes contíguas dos dois prédios. Verifica-se que na parede contígua ao imóvel do Réu, o nível de humidade é baixo, contudo no pavimento integral, parede traseira (nascente) e parede contigua do imóvel do Autor com a habitação particular (sul), os níveis de humidade encontram-se no máximo, pelo que os danos nestas áreas são, inequivocamente, decorrentes de infiltrações por falta de impermeabilização lateral e de fundações do imóvel. O clima, ou seja, as condições climatéricas são um grande inimigo em locais em que não há uma impermeabilização de ambientes externos, como é o caso das lajes, paredes e coberturas. Se essas zonas não são impermeabilizadas ou a impermeabilização ocorre da forma errada, o contato direto da água da chuva, ainda mais de maneira constante, pode causar diversos estragos, o que, em opinião do perito signatário se verifica. Estas infiltrações decorrentes das chuvas podem atingir o solo, tetos e as paredes do imóvel, como é o caso. Pelo exposto, o único dano que considera o perito ser possível ter decorrido no dia 12/11/2019 pela entrada de água da chuva e, por eventual culpa imputável ao imóvel do Réu, seria o teto em gesso cartonado da sala do imóvel e eletricidade. Ainda assim, pese embora não possa o perito afirmar com rigor, pois não esteve presente na obra, não viu a obra e desta forma não pode afirmar, a ocorrer uma infiltração do prédio do Réu, a mesma seria pontual e poderia ter danificado o teto, contudo não no nível de dano que se encontra atualmente. Esta situação está a agravar-se pela falta de impermeabilização do imóvel, aliás como é visível nos registos fotográficos».
Em conformidade com os fundamentos antes enunciados, o aludido relatório pericial concluiu nos seguintes termos: «CONCLUSÃO Não resta qualquer tipo de dúvida quanto à existência de infiltrações no imóvel do Autor, as quais têm origem em zonas exteriores, como sejam as impermeabilizações deficitárias do imóvel e fundações, tornando-se visíveis em períodos contínuos de chuva. Asinfiltrações continuadas, além do desconforto, salubridade do ar ambiente, poderão provocar danos estéticos e materiais acrescidos e continuados se nada for efetuado. Para eliminação completa das infiltrações, o ideal seria efetuar obras de impermeabilização pelo exterior do imóvel, sabendo que seriam sempre trabalhos bastantes dispendiosos. Não se verificando essa intervenção aconselharíamos primeiro medidas reativas no interior da fração e só depois de eliminar / minimizar as infiltrações existentes proceder às reparações das patologias identificadas anteriormente. Declara ter efetuado esta perícia em boa fé, sem juízo de parte».
Depois, em sede de resposta ao pedido de esclarecimentos formulados pelo autor, no qual se questionava expressamente se a retirada da cobertura do edifício contiguo e a demolição do mesmo não deixa a parede do edifício onde se situa a fração do Autor, à mercê das intempéries, esclareceu o mesmo perito: «[s]im. Conforme exposto supra, no decurso de qualquer obra desta envergadura, a ocorrência de fragilidade de imóveis contíguos pode acontecer. No entanto, caso se verifique, são infiltrações de água pontuais e não danificam a estrutura de igual modo, como infiltrações perpetuadas no tempo, como se verifica no imóvel do Autor».
Neste domínio, importa ainda atentar na resposta ao pedido de esclarecimentos formulado pelo autor, em que se perguntava se o nível de humidade verificado na perícia poderá refletir a infiltração de há três anos, afirmando o perito nomeado pelo Tribunal o seguinte: «[n]ão, a medição apenas foi identificativa e informativa de que, em data solarenga e com a ocorrência do sinistro há mais de 3 anos, os níveis de humidade são elevados no pavimento e paredes, o que claramente indica que o imóvel padece de falta de impermeabilização constante e inequívoca», para depois concluir nos termos seguintes: «Considera pertinente o Perito elucidar este Tribunal que, não há dúvidas que existiu entrada de águas abrupta e pontual no interior da fração do Autor, contudo, é certo que os danos verificados não são consequência direta dessa ocorrência. Não se confunda, entrada de água pontual, com danos perpetuadas e decorrentes de falta de impermeabilização reiterada» - cf. relatório complementar subscrito a 10-10-2023 (junto aos autos a 14-03-2023).
Ademais, resulta da audição do registo da gravação efetuada em audiência final, a que procedemos, que o mesmo perito foi instado em julgamento a esclarecer diversos aspetos relacionados com as conclusões formuladas na perícia, afirmando de forma categórica que a parede do escritório do autor que apresenta mais humidade é a que fica do outro lado do edifício (oposto ao da ré), que confina com uma construção já antiga e que nada tem a ver com a invocada obra.
Deste modo, não assiste razão ao apelante quando se insurge, nas alegações de recurso, «contra o facto de o Mm.º Juiz a quo, na sua motivação de facto ter, quanto a este ponto ter desvalorado o relatório de peritagem realizada no dia 21 de janeiro de 2023, pelo Sr. perito EE, em que ficou amplamente demonstrado que a fração do autor ficou danificada, nomeadamente a nível generalizado, registando níveis máximos de humidade nas paredes orientadas a noroeste», pois, diversamente do que vem alegado em sede recursiva, o relatório pericial de 21-01-2023 esclarece o seguinte: «na parede contígua ao imóvel do Réu, o nível de humidade é baixo, contudo no pavimento integral, parede traseira (nascente) e parede contigua do imóvel do Autor com a habitação particular (sul), os níveis de humidade encontram-se no máximo, pelo que os danos nestas áreas são, inequivocamente, decorrentes de infiltrações por falta de impermeabilização lateral e de fundações do imóvel».
O apelante alude ainda às fotografias juntas com a petição inicial e ao relatóriopericial, pedido por si e realizado no dia 03-03-2020, subscrito pelo perito CC aquando da visita realizada à fração do autor, e às seguintes conclusões nele enunciadas: “os problemas encontrados, na sua maioria, não são justificados pelo uso e idade do edifício, mas com o contacto continuado com água originando humidade extrema”.
No específico domínio probatório, há que ter presente o disposto no artigo 415.º do CPC, consagrando o princípio da audiência contraditória a propósito de cada um dos meios de prova admissíveis e impondo expressamente a regra de que as provas não são admitidas ou produzidas sem audiência contraditória.
Nos termos do n.º 1 do citado preceito, não são admitidas nem produzidas provas sem audiência contraditória da parte a quem hajam de ser opostas, salvo disposição em contrário, estipulando o n.º 2, quanto às provas constituendas, que a parte é notificada, quando não for revel, para todos os atos de preparação e produção da prova, e é admitida a intervir nesses atos nos termos da lei; relativamente às provas pré-constituídas, deve facultar-se à parte a impugnação, tanto da respetiva admissão como da sua força probatória.
Deste modo, «[o] exercício do contraditório varia em função da natureza dos meios de prova. Tratando-se de provas constituendas (v.g. prova testemunhal ou pericial), deve ser observado relativamente à sua admissão, preparação e produção. Tratando-se de provas já constituídas (v.g. documentos), deve ser observado quanto à sua admissão e apreciação»[17].
Ora, o aludido «Relatório Pericial, que se trata de um documento emitido pelo perito CC, em 03/03/2020, aquando da visita realizada à fração do Autor, a pedido do mesmo», tendo sido junto pelo próprio autor com a petição inicial, só pode ser valorado nos presentes autos como documento (alias, expressamente impugnado pela ré nos articulados), e não enquanto prova pericial.
Não obstante, uma vez que a prova deve ser analisada globalmente e de forma crítica, também aqui se constata que os concretos meios de probatórios referenciados pelo recorrente como relevantes para a alteração da concreta matéria de facto impugnada - e designadamente o relatório efetuado por CC, junto sob doc. n.º 30 com a petição inicial -, foram valorados criticamente pelo Tribunal a quo em conjunto com os restantes meios de prova produzidos nos autos, o que se mostra explicitado de forma que julgamos adequada nas seguintes passagens da correspondente motivação da decisão sobre a matéria de facto:
«(…) Pontos 11 e 12: provado tendo em conta a perícia. Como se irá ver melhor infra, o relatório efectuado por CC limitou-se a descrever o que observou, descurando em saber a origem das patologias e revelando uma postura acrítica. Ora, o relatório pericial junto aos autos afigura-se consistente, técnico, detalhado, crítico e fundado. Do mesmo, cite-se as seguintes passagens: Atendendo à generalidade dos danos observados na fração do Autor, estes decorrem de infiltrações generalizadas propiciadas pela falta de impermeabilização das áreas envolventes do imóvel, a saber, fundações do pavimento onde assenta o imóvel e paredes contíguas dos dois prédios. Verifica-se que na parede contígua ao imóvel do Réu, o nível de humidade é baixo, contudo no pavimento integral, parede traseira (nascente) e parede contigua do imóvel do Autor com a habitação particular (sul), os níveis de humidade encontram-se no máximo, pelo que os danos nestas áreas são, inequivocamente, decorrentes de infiltrações por falta de impermeabilização lateral e de fundações do em que não há uma impermeabilização de ambientes externos, como é o caso das lajes, paredes e coberturas. Se essas zonas não são impermeabilizadas ou a impermeabilização ocorre da forma errada, o contato direto da água da chuva, ainda mais de maneira constante, pode causar diversos estragos, o que, em opinião do perito signatário se verifica. Estas infiltrações decorrentes das chuvas podem atingir o solo, tetos e as paredes do imóvel, como é o caso. Pelo exposto, o único dano que considera o perito ser possível ter decorrido no dia 12/11/2019 pela entrada de água da chuva e, por eventual culpa imputável ao imóvel do Réu, seria o teto em gesso cartonado da sala do imóvel e eletricidade. Ainda assim, pese embora não possa o perito afirmar com rigor, pois não esteve presente na obra, não viu a obra e desta forma não pode afirmar, a ocorrer uma infiltração do prédio do Réu, a mesma seria pontual e poderia ter danificado o teto, contudo não no nível de dano que se encontra atualmente. Esta situação está a agravar-se pela falta de impermeabilização do imóvel, aliás como é visível nos registos fotográficos. Mais refere que os danos, maioritariamente, decorrem de infiltrações continuadas no tempo, decorrentes da falta de impermeabilização laterais e nas fundações. As fundações do imóvel assentam em laje térrea, contrariando as práticas de boa construção e sustentação de imóveis, o que por si só, prejudica e facilita a entrada de humidades constantes nas estruturas como pavimento, rodapés e por capilaridade, paredes e tetos». (…) Relativamente aos factos não provados: Alíneas a) e b): ausência de prova cabal nesse sentido, sendo que quanto à alínea b) se afigura claramente empolado. Alíneas c), d) e g): relativamente aos outros danos na fracção, remete-se para a perícia supra referida. Sempre se diga que CC mostrou-se dubitativo quanto à causa das patologias, sendo que o mesmo concordou com a apontada falta de impermeabilização descrita na perícia, embora tenha admitido não ter visto se havia ou não falta de impermeabilização do imóvel».
Em sede de impugnação da decisão da matéria de facto, o apelante invoca ainda uma alegada contradição da matéria de facto dada como provada nos pontos 4 e 6 dos factos provados e a matéria de facto dada como não provada na al. b) dos Factos não provados.
À luz do alegado pela recorrente, importa aferir se é patente algum vício na decisão sobre a matéria de facto que caiba a este tribunal apreciar, ao abrigo do disposto no artigo 662.º, n.º 2, al. c), do CPC.
Contudo, revela-se evidente que só existe contradição entre factos quando eles se mostrem absolutamente incompatíveis entre si, de tal modo que não possam coexistir entre si, sendo certo que se vem entendendo que essa incompatibilidade deve existir entre os próprios factos provados e já não em relação aos factos dados como não provados, pois que em que relação a estes tudo se deve passar como se na verdade não tivessem sido alegados[18].
Por outro lado, da motivação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida não resulta que seria outra a decisão de facto correta para os concretos segmentos em causa, face à valoração probatória e ao raciocínio dedutivo que foi expressamente referenciado pelo Tribunal a quo.
Neste enquadramento, resulta manifestamente inconcludente e inócua a contradição invocada.
Pelo exposto, revistos e analisados criticamente todos os concretos meios de prova indicados pelo apelante como relevantes para a alteração da decisão da matéria de facto vertida na decisão recorrida, em conjunto com os demais depoimentos prestados em audiência final, com o relatório da perícia realizada nos presentes autos, subscrito pelo perito Eng.º EE (de 21-01-2023), os esclarecimentos por este prestados em relatório adicional junto a 14-03-2023 e em sede de audiência final, ponderando ainda os documentos juntos pelas partes ao processo, sem esquecer os factos já devidamente consolidados no autos, esta Relação formula convicção idêntica à que ficou plasmada na decisão recorrida, no que concerne à matéria agora em apreciação, a qual se afigura rigorosa e adequada à globalidade da prova produzida, não resultando da respetiva análise qualquer constatação ou elemento que permita sustentar uma adequada confirmação das concretas circunstâncias enunciadas em b) c) e g) dos factos não provados.
Em consequência, julga-se integralmente improcedente a impugnação da decisão relativa à matéria de facto apresentada pela apelante, mantendo-se a decisão proferida pelo Tribunal a quo sobre os factos vertidos em 1.1. e 1.2. supra.
2.3. Da reapreciação do mérito da decisão de direito.
Atenta a improcedência/rejeição da impugnação da matéria de facto resulta evidente que os factos a considerar na apreciação da fundamentação de direito constante da decisão recorrida são os que se mostram enunciados sob o ponto 1.1., supra.
Assim, o quadro fáctico que releva para a subsunção jurídica da causa é exatamente o mesmo que serviu de base à sentença recorrida.
Na sentença recorrida o Tribunal a quo enquadrou a pretensão formulada pelo autor no âmbito da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, tal como consagrada no artigo 483.º, n.º 1 do CC, norma que impõe a quem, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios, a obrigação de indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.
A 1.ª instância, tendo por base os factos enunciados em 1.1. supra, concluiu pela inexistência de factos que permitissem operar os pressupostos da responsabilidade extracontratual relativamente à ré/chamada empreiteira.
Entendeu, por outro lado, que a inundação ocorrida não permitia integrar a responsabilidade subjetiva emergente do disposto no artigo 492.º, n.º 1 do CC, desde logo porque não configura qualquer desmoronamento da obra, razão pela qual igualmente considerou afastada a responsabilidade da ré empreiteira a título de culpa presumida, determinando a respetiva absolvição.
Em face dos factos que permanecem assentes, observa-se que o recorrente não vem questionar, no recurso, a falta de verificação dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual relativamente à ré/chamada.
Sustenta, porém, que, ante a inexistência de factos que permitam operar a responsabilidade extracontratual (designadamente dos quais fosse possível extrair a omissão culposa da empreiteira), se impunha ao Tribunal recorrido que proferisse despacho de convite ao aperfeiçoamento da petição inicial.
Sucede que tal questão foi invocada pelo apelante em sede de arguição de nulidade da sentença recorrida, por alegadamente configurar a omissão de um ato que a lei prescreve.
Como tal, em face em face da matéria de facto apurada nos autos e considerando a improcedência da questão suscitada pelo apelante a propósito da nulidade da sentença recorrida - já apreciada e decidida supra -, resta concluir que, relativamente à ré/chamada empreiteira, não existem razões que levem à alteração do correspondente dispositivo da sentença recorrida.
Relativamente à responsabilidade da primitiva ré, proprietária do outro imóvel, o Tribunal recorrido entendeu - e bem - ser de afastar qualquer imputação de responsabilidade pelo risco/objetiva, a que se refere o artigo 500.º do CC (responsabilidade do comitente), por falta de verificação do requisito da existência de uma relação de comissão no âmbito do contrato de empreitada, seguindo de perto entendimento que vem sendo defendido na doutrina e jurisprudência dos tribunais superiores. Acrescente-se que a responsabilidade do comitente exige a verificação cumulativa de diversos requisitos, entre os quais, que a conduta do comissário o faça incorrer, a ele mesmo, em responsabilidade face a terceiro, como decorre da parte final do n.º 1 do artigo 500.º do CC, o que, como se viu, não se verifica.
Mais entendeu o Tribunal recorrido que dos factos considerados provados não resultavam condutas ou omissões culposamente imputáveis à primitiva ré que fossem causais dos danos apurados.
Também estes segmentos da fundamentação da sentença recorrida não vêm concretamente impugnados pelo recorrente na presente apelação, impondo-se neste domínio um juízo de total concordância quanto à fundamentação da decisão recorrida, em face do que decorre da matéria de facto definitivamente assente nos autos.
Ainda que a diferente solução que o recorrente defende para a presente ação assente em grande medida na pretendida modificação da decisão de facto no que respeita aos factos que a apelante sustenta terem sido indevidamente julgados, o que não sucedeu, vem o autor, no presente recurso, pugnar pela responsabilidade da primitiva ré, na medida em que é proprietária da coisa, defendendo que lhe é aplicável o disposto no n.º 1 do artigo 493.º do CC.
Segundo o recorrente, a ré alega que transferiu a sua responsabilidade para a empreiteira, tendo em conta a existência de um contrato de empreitada que apresentou com o seu articulado, escudando-se de responsabilidade, quando na realidade sempre tinha o dever de vigilância da sua coisa, nos termos do artigo 493.º, n.º 1 do CC. Assim, sempre terá responsabilidade na medida em que é a proprietária da coisa, podendo em segunda via, imputar aquela responsabilidade à empreiteira, pelo exercício do direito de regresso.
Relativamente a esta questão, o Tribunal a quo, sustentado na doutrina que citou, entendeu que no caso não se verificam os pressupostos normativos do regime previsto no artigo 493.º, n.º 1 do CC, pelo que a presunção de culpa nele prevista não opera relativamente ao dono da obra, aqui ré, conforme decorre, entre o mais, do seguinte excerto da respetiva fundamentação:
«(…) Cabe então averiguar se estão verificados os pressupostos normativos do regime previsto no art. 493.º, n.º 1, do CC. Esquematicamente podem estabelecer-se os seguintes requisitos: i. O agente tem que ter em seu poder coisa móvel ou imóvel com o dever de a vigiar (PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, I, 4.ª edição, 1987, Coimbra editora, p. 495: pode tratar-se do proprietário mas não tem de ser necessariamente o proprietário); ii. A coisa causa danos a terceiros (ANTUNES VARELA, Das obrigações em geral, vol. I, 9.ª edição, Almedina, 1998, p. 615, faz a seguinte ressalva: os danos são os provocados pelas coisas e não os danos causados pelo agente com o emprego das coisas); iii. A presunção de culpa opera salvo se o agente provar que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua. Como se disse supra, a inundação não decorre, à míngua de factos alegados, da coisa em si para efeitos do previsto no art. 493.º, n.º 1, do CC. É o próprio autor que alega a inundação relativa a águas pluviais no decorrer de uma obra realizada pela chamada. Isto é, dos poucos factos alegados, resulta que os danos ocorreram na sequência da empreitada e não da perigosidade própria da coisa, como coisa que acarreta a possibilidade de provocar danos (quanto ao âmbito objectivo desta norma, cfr. RUI DE MASCARENHAS ATAÍDE, Responsabilidade civil por violação de deveres no tráfego, Almedina, reimp., 2019, p. 362: a primeira restrição extrai-se ex rerum natura, ou seja, estão unicamente abrangidas as coisas que, podendo ser objecto de custódia, sejam susceptíveis de causar danos, só estando, portanto, incluídas as coisas corpóreas, entendidas como as que, conhecendo existência física, pertençam ao estado sólido, líquido ou gasoso e que, ocupando um certo espaço, possam, por via das mais diversas forças, incluindo a da gravidade, adquirir um dinamismo próprio susceptível de ofender interesses juridicamente tutelados. Em segundo lugar, o preceito exige que os danos tenham sido causados pelas coisas e não com as coisas, afastando, portanto, do seu âmbito as situações em que a coisa desempenhou um simples papel passivo ou instrumental da actividade humana (como sucede se alguém se servir de um pau para quebrar uma montra). Quando assim for, não se verificam os pressupostos específicos que fundam o regime especial, devendo as lesões ser dirimidas segundo as regras gerais, tal e qual como se a ofensa tivesse sido produzida sem o auxílio da coisa (no exemplo acima, a montra partida com as próprias mãos). Por fim, este Autor, a p. 376, sustenta uma adequada interpretação teleológica de cariz objectivista a qual permite a aplicação directa do artigo 493/1 a estas situações de danosidade, em que coisas, confiadas ao controlo de sujeitos determinados, adquirem propensão lesiva por via de interacção com focos externos de perigo, sejam catalizados por elementos naturais, sejam ditados por comportamentos humanos. No limite, serão legítimas operações de extensão analógica suportadas pela ideia de "esfera", enquanto complexo de meios sob a guarda de vigilantes a quem compete, por isso, acautelar o respectivo potencial danoso). Deste modo, esta presunção de culpa encontra-se afastada relativamente ao dono da obra. De referir ainda que, mesmo que fosse aplicável, ficaram por demonstrar factos (ou omissões) praticados por esta ré e que tenham dado causa aos danos apurados. Afinal, aquela presunção apenas contende com um dos pressupostos da responsabilidade civil não isentando o lesado de demonstrar os demais».
Perante o quadro fáctico apurado nos autos, entendemos que o Tribunal recorrido fez uma correta interpretação dos pressupostos normativos da presunção de culpa relacionada com a guarda de coisas ou animais, tal como prevista no n.º 1 do artigo 493.º do CC.
Estipula o normativo em referência que, «quem tiver em seu poder coisa móvel ou imóvel, com o dever de a vigiar, e bem assim quem tiver assumido o encargo da vigilância de quaisquer animais, responde pelos danos que a coisa ou os animais causarem, salvo se provar que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua».
Trata-se de norma que «estabelece um título de imputação de responsabilidade civil extracontratual, respeitante aos danos causados por animais e coisas, móveis e imóveis, para aqueles que tiverem o dever de os vigiar. Estão abrangidos apenas os danos causados por esses animais ou por essas coisas, não os danos causados por alguém com o emprego desses mesmos animais ou coisas, enquanto instrumentos da ação delitual - nesse caso, aplica-se o regime geral da responsabilidade civil delitual.
(…)
Não é apenas o proprietário da coisa ou animal que pode ser responsabilizado ao abrigo deste regime. Para que o mesmo seja aplicável, basta que haja mera detenção, isto é, o controlo material da coisa, acompanhado do dever de vigilância, de origem legal ou negocial (apontando a existência de um poder de determinação sobre a coisa, enquanto condição indispensável para a tomada de medidas de segurança necessárias, pessoalmente ou por intermédio de terceiros e, consequentemente, para a responsabilidade pela sua violação (…)»[19].
Sobre este normativo debruçou-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07-04-2011[20], salientando que, “como da leitura do preceito da lei resulta, o que cabe na previsão da norma são apenas os danos causados pelas coisas e não os danos causados por alguém com o emprego de coisas, designadamente intervindo fisicamente sobre aquelas. Neste caso, porque responsável será este agente, vigorará o regime geral da responsabilidade civil. Uma vez que, como referido, a responsabilidade do detentor da coisa que causa os danos «assenta na ideia de que não foram tomadas as medidas de precaução necessárias para evitar o dano», presunção que recai sobre quem detém a coisa e o dever de a vigiar, e sendo a responsabilidade ainda de natureza delitual, relativa ao exercício de actividades perigosas, e não objectiva ou pelo risco, bem se compreende que a mesma só se verifique relativamente a quem mantém uma relação directa de poder de facto sobre a coisa causadora do dano e que, em relação a ela, omitiu as «providências indispensáveis para evitar a lesão (…). Em regra, a responsabilidade cobrirá, nestes casos, danos emergentes de anomalias ou avarias nos imóveis e respectivos equipamentos cujo estado e funcionamento devam, pela sua natureza, estar sujeitos a inspecção com a frequência adequada, em ordem a prevenir eventos causadores de prejuízos a terceiros”.
Em sentido idêntico, elucida o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21-04-2016[21]: «(…) II - Ainda que no art. 493.º do CC se reconheça a existência de um dever genérico de prevenção do perigo ou um dever de segurança relativamente aos donos de coisas privadas, este dever não se estende à prevenção de perigos ou deveres de segurança que estejam a cargo de outros, como é o caso, no contrato de empreitada, da execução da obra. III - Aos donos da obra não são aplicáveis as disposições desse preceito quando da matéria de facto provada resulta que, na etiologia do acidente, a única acção que lhes é imputável consiste na celebração de um contrato de empreitada de substituição de um muro por outro, não tendo esta acção qualquer nexo de causalidade com o acidente dos autos. (…)».
Ora, do enunciado dos factos definitivamente provados nos autos resulta apenas que a inundação em causa ocorreu em consequência da obra levada a cabo pela chamada no prédio mencionado em 2., o que implica a intromissão autónoma de terceiro que, por via da realização da obra em curso, detinha o respetivo controlo físico ou poder de facto, condição indispensável para a tomada de medidas de segurança que o caso exija e, por isso, suficiente para responsabilizar o respetivo agente no âmbito do regime geral da responsabilidade civil, afastando a imputação do dano à coisa enquanto mantida sob administração e vigilância direta da primitiva ré, tanto mais que não se demonstra qualquer intervenção relevante desta no processo causal que originou os danos apurados.
Por conseguinte, não existem razões para censurar a solução adotada na decisão impugnada.
Pelo exposto, em face da factualidade apurada, resta sufragar o entendimento assumido pelo Tribunal a quo na decisão recorrida.
Daí que improcedam integralmente as conclusões da apelação.
Pelo exposto, cumpre julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar integralmente a decisão recorrida.
Tal como resulta da regra enunciada no artigo 527.º, n.º 1 do CPC, a responsabilidade por custas assenta num critério de causalidade, segundo o qual, as custas devem ser suportadas, em regra, pela parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento, pela parte que tirou proveito do processo.
Neste domínio, conforme esclarece o n.º 2 do citado preceito, entende-se que dá causa às custas a parte vencida, na proporção em que o for.
No caso, a apelação foi julgada integralmente improcedente, pelo que as custas da apelação são da responsabilidade do recorrente, atento o seu decaimento.
IV. Decisão
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação, assim confirmando a decisão recorrida.
Custas pelo apelante.
Guimarães, 26 de setembro de 2024
(Acórdão assinado digitalmente)
Paulo Reis (Juiz Desembargador - relator)
Afonso Cabral de Andrade (Juiz Desembargador - 1.º adjunto)
Maria dos Anjos Melo Nogueira (Juíza Desembargadora - 2.º adjunto)
[1]Cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Coimbra, Almedina, 2018, pg. 236. [2] Dispõe o artigo 195.º do CPC, com a epígrafe Regras gerais sobre a nulidade dos atos:
1 - Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.
2 - Quando um ato tenha de ser anulado, anulam-se também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente; a nulidade de uma parte do ato não prejudica as outras partes que dela sejam independentes.
3 - Se o vício de que o ato sofre impedir a produção de determinado efeito, não se têm como necessariamente prejudicados os efeitos para cuja produção o ato se mostre idóneo. [3]Cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa - obra citada -, p. 736, em anotação ao artigo 615.º do CPC. [4]Cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa - obra citada - p. 681. [5]Cf. Prof. Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 2.º, Coimbra-Editora, pgs. 507-508. [6]Cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa - obra citada - p. 683. [7] Sob a epígrafe «Alteração do pedido e da causa de pedir por acordo», o qual prescreve que havendo acordo das partes, o pedido e a causa de pedir podem ser alterados ou ampliados em qualquer altura, em 1.ª ou 2.ª instância, salvo se a alteração ou ampliação perturbar inconvenientemente a instrução, discussão e julgamento do pleito. [8] Segundo o princípio da estabilidade da instância, consagrado no artigo 260.º do CPC, logo que citado o réu deve a instância manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei. [9] «A causa de pedir é o facto concreto que serve de fundamento ao efeito jurídico pretendido» - cf. Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª Edição, pg. 245. [10]Cf. Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil - Conceito e Princípios Gerais à Luz do Novo Código, 4.ª Edição, julho 2017, Coimbra, Gestelegal, p. 171. [11]Cf. Lebre de Freitas - obra citada - p. 214. [12]Cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa - Obra citada -, p. 679. [13]Cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa - Obra citada -, p. 680. [14] Relator Manuel Rodrigues, p. 573/18.1T8SXL.L1-6, disponível em www.dgsi.pt. [15]Cf. José Lebre de Freitas, A Ação Declarativa Comum À Luz do Código de Processo Civil de 2013, 3.ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, 2013, p. 207. [16]Cf. José Lebre de Freitas - obra antes citada -, p. 206. [17] Neste sentido, cf., por todos, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Coimbra, Almedina, 2018, p. 28. [18]Cf., por todos, o Ac. TRC de 12-12-2017 (relator: Isaías Pádua), p. 320/15.0T8MGR.C1, disponível em www.dgsi.pt. [19]Cf. Maria da Graça Trigo/Rodrigo Moreira, Comentário ao Código Civil, Direito das Obrigações - Das Obrigações em Geral, - Coord. José Brandão Proença, Lisboa, Universidade Católica Editora, 2021, p. 321. [20] Relator Alves Velho, p. 5606/03.3TVLSB.L1. S1, disponível em www.dgsi.pt. [21] Relator Orlando Afonso, p. 20/10.7TBBAO.P1. S1, disponível em www.dgsi.pt.