I – A justa causa compreende três elementos: o comportamento culposo do trabalhador; comportamento grave em si mesmo e de consequências danosas e o nexo de causalidade entre este comportamento e a impossibilidade de subsistência da relação laboral face àquela gravidade, ou seja, o comportamento tem de ser imputado ao trabalhador a título de culpa (com dolo ou negligência) e a gravidade e impossibilidade devem ser apreciadas em termos objetivos e concretos relativamente à empresa.
II – Tendo em conta que a sanção disciplinar visa reagir contra o comportamento inadequado do trabalhador, procurando harmonizar este para o futuro com o interesse do empregador, e sendo o objetivo natural daquela sanção, de natureza corretiva, intimidatória e conservatória, só no caso de uma sanção deste tipo se mostrar inadequada ou insuficiente para repor a normalidade da relação de trabalho, se poderá aceitar, como razoável e justo, aplicar-se uma sanção rescisória do contrato.
III – A existência de justa causa só será, assim, de admitir se os factos praticados pelo trabalhador se refletirem sobre o desenvolvimento normal da relação de trabalho, afetando-o em termos tais que o interesse do despedimento deva prevalecer sobre o interesse oposto da permanência do contrato.
(Sumário elaborado pela Relatora)
I - Relatório
AA, residente em ...,
intentou a presente ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, contra
Banco 1..., SA, com sede em ....
Para tanto, apresentou o formulário de fls. 1, opondo-se ao despedimento de que foi alvo e requerendo que seja declarada a ilicitude ou a irregularidade do mesmo, com as legais consequências.
*
Procedeu-se à realização de audiência de partes e a empregadora, notificada para apresentar articulado motivador do despedimento veio fazê-lo alegando, em síntese, que:
A trabalhadora abriu duas contas das quais era a única titular e nas quais foram registadas transferências SEPA provenientes da sociedade A..., Ldª, no montante de € 74.512,78 e € 107.347,54, respetivamente; a atuação da trabalhadora viola os deveres de realizar o trabalho com zelo e diligência, cumprir as ordens e instruções do empregador e guardar lealdade ao empregador; as transações efetuadas para a conta da trabalhadora referentes a uma atividade profissional que a mesma não desempenhava e com a qual não tinha qualquer ligação aferível, deveria ter sido recusada ao invés de promovida pela mesma; tais operações não foram rejeitadas dada a ligação privilegiada que o destinatário das transações mantinha com a trabalhadora e através desta, com a empregadora; tal atuação e o incumprimento das normas e procedimentos internos previstos na instrução de serviço, expuseram a empregadora a riscos sérios de sanções pelas autoridades competentes; a conduta da trabalhadora viola as obrigações previstas no Código de conduta, nomeadamente, o dever de pautar toda a sua atuação por comportamentos pessoais e profissionais de acordo com inquestionáveis padrões de integridade, honestidade e lealdade, sendo que o exercício e o respeito por estes valores nunca poderão ser comprometidos; os factos descritos levaram a uma quebra irremediável da confiança da empregadora na boa fé e retidão da conduta da trabalhadora e pela sua gravidade e possíveis consequências, tornaram imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral.
*
A trabalhadora apresentou contestação e reconvenção alegando, em síntese, que:
A nota de culpa padece de vícios e de nulidade; inexiste um comportamento grave, culposa e consciente por parte da trabalhadora que impossibilite a manutenção do vínculo laboral, pelo que, o despedimento será sempre desproporcional à alegada infração; as movimentações bancárias imputadas à arguida foram feitas pela empresa A... e nesse sentido nada ocultam; a proveniência e os destinatários e montantes dessa operações encontram-se totalmente identificados e não é reintroduzida em circulação qualquer quantia ilícita, disfarçando-a (quanto à sua origem, proveniência ou natureza) ou ocultando a sua proveniência ilícita.
Termina pedindo que:
“Termos em que deve a presente Contestação ser considerada provada e procedente, e em consequência:
a) Ser declarado Nulo, ou invalido, o Procedimento Disciplinar, por violação das regas ínsitas no artigo 382º nº 1 e ou 2, alíneas a) e d), todos do CT, e inerentemente a ilicitude do despedimento da Autora;
b) Ser declarado improcedente o motivo justificativo do despedimento da Autora, e consequentemente, declarada a ilicitude do seu despedimento, por inexistência de justa causa, nos termos do disposto no artigo 381º al. b) e ou c),
c) Ser o Reu condenado, em substituição da sua reintegração, a pagar à Autora a indemnização por antiguidade, prevista no artigo 391º do CT, mas calculada nos termos da Clausula 114ª nº1 do AE aplicável, na quantia de 35.630,92€
d) Ser o Reu condenado a pagar à Autora as retribuições, intercalares, que esta deixou de auferir desde a data do seu despedimento e até ao transito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do mesmo, nos termos do disposto no artigo 390º nº 1 do CT, e que neste momento totalizam 3.886,8€
e) Ser o Réu condenado a liquidar à Autora os montantes devidos a título de ferias, subsídios de ferias e de natal, e proporcionais de ferias, subsídios de ferias e de natal que entretanto se vencerem desde a data do seu despedimento e até ao transito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do mesmo, nos termos do disposto no artigo 390º nº 1 do CT,
f) Ser o Réu condenado a indemnizar a Autora na quantia de 5.000,00€ por danos não patrimoniais, nos termos do artigo 389º nº1 al. a) do CT
g) Ser o Reu condenado a liquidar à Autora a quantia devida a título de Créditos Laborais, respeitante a formação não concedida, no valor de 1.495,29€, e a título de distribuição de dividendos, em pelo menos 800,00€, ou quantia superior, a apurar quando o Reu prestar os esclarecimentos e juntar os documentos que se requereram
h) Ser o Reu condenado a pagar juros de mora sobre todas as prestações suprarreferidas, contados desde a data do seu vencimento e até integral pagamento, bem como em custas
Tudo com as legais consequências.”
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A empregadora apresentou resposta concluindo nos seguintes termos:
“Termos em que, e nos melhores de direito doutamente supridos, requer a V. Exa. se digne:
i. A julgar improcedente, por não provadas e por carecerem de fundamento legal, todas as exceções deduzidas pela Autora;
ii. A julgar improcedente, por não provado e por o despedimento da Autora ter sido lícito, o pedido de condenação do Réu ao pagamento, à Autora, de indemnização em substituição da reintegração;
iii. A julgar improcedente, por não provado e por o despedimento da Autora ter sido lícito, o pedido de condenação do Réu ao pagamento, à Autora, dos salários intercalares entre a data do seu despedimento e a data de trânsito em julgado dos presentes autos;
iv. A julgar improcedente, por não provado e por o despedimento da Autora ter sido lícito, o pedido de condenação do Réu ao pagamento, à Autora, de indemnização a título de danos não patrimoniais.
v. A julgar improcedente, por não provado, o pedido reconvencional da Autora ao pagamento, pelo Réu, de créditos laborais decorrentes de horas de formação não ministradas, vencidas e não pagas.
vi. A julgar improcedente, por não provado e não exigível nos termos do Regulamento do Modelo de Incentivos dos Colaboradores do Banco 1..., S. A., o pedido reconvencional da Autora ao pagamento, pelo Réu, de quaisquer prémios de desempenho.”
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Foi proferido o despacho saneador de fls. 143 e segs. e dispensada a enunciação do objeto do litígio e dos temas da prova.
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Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento.
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De seguida foi proferida a sentença de fls. 163 e segs., cujo dispositivo tem o seguinte teor:
“VII- Decisão:
I - declaro ilícito o despedimento de AA promovido pelo Banco 1..., S.A.;
II - condeno Banco 1..., S.A. a pagar a AA, as retribuições, férias, subsídio de férias e de Natal, vencidos desde 12 de setembro de 2023 até ao trânsito em julgado da presente sentença, no valor unitário de €1.295,67, acrescidos dos juros de mora computados à taxa legal de 4% desde a data do vencimento de cada prestação até efetivo e integral pagamento, descontadas as importâncias que a trabalhadora tenha obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e o subsídio de desemprego atribuído à trabalhadora, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social;
III- condeno Banco 1..., S.A. a pagar a AA, a quantia de €1.574,79, por cada ano completo ou fração, a título de indemnização de antiguidade, desde 30 de outubro de 2002 até ao trânsito em julgado da presente sentença, acrescida dos juros de mora computados à taxa legal de 4% desde a data do trânsito em julgado da presente decisão até efetivo e integral pagamento;
IV- absolvo Banco 1..., S.A. dos restantes pedidos formulados por AA;”
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A empregadora, notificada desta sentença, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte:
(…).
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O trabalhador apresentou resposta que conclui nos seguintes termos:
(…).
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O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto parecer de fls. 230 e segs., no sentido de que a “sentença não enferma de qualquer dos vícios que lhe são apontados, pelo que deve ser negado provimento ao recurso, e a sentença ser confirmada nos seus precisos termos.”
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A recorrente veio responder a este parecer remetendo para as alegações de recurso.
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Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.
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II – Questões a decidir
Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (art.º 639.º do C.P.C.), com exceção das questões de conhecimento oficioso.
Questões prévias:
1. Intempestividade do recurso
Veio a recorrida alegar a intempestividade do presente recurso.
Como resulta do despacho de admissão do recurso proferido no tribunal de 1ª instância, o mesmo é tempestivo, posto que deu entrada em juízo no dia 01/04/2024, último dia do prazo de 15 dias de que dispunha para o efeito.
Assim sendo, inexiste qualquer razão à recorrida.
2. Valor da causa
Alega a recorrente que o tribunal a quo cometeu um erro de julgamento no que respeita à fixação do valor da causa, violando o disposto no n.º 2 do artigo 98.º-P do CPT.
Compulsados os autos constatamos que por despacho de fls. 220 foi retificado o que se considerou ser um lapso, passando a constar da parte decisória:
“Valor da causa
Fixo à ação o valor de €33.060,79 (art.º 09.º-P, n.º 2 do CPT).”
Assim sendo, e porque nada foi alegado pelas partes no que concerne à retificação, a questão suscitada pela recorrente encontra-se prejudicada, nada mais se impondo dizer.
3. Invalidade parcial da nota de culpa no que concerne ao artigo 29.º
Alega a recorrente que o tribunal a quo não fundamentou a não circunstanciação do artigo 29.º da nota de culpa tendo determinado a invalidade parcial da mesma no tocante a tal facto.
Compulsados os autos constatamos que por despacho de fls. 220 foi determinada a retificação da sentença proferida nos seguintes termos:
“- na folha 53 onde se lê invalidade parcial da nota de culpa no tocante ao factos descrito no art.º 29. da nota de culpa deve passar a ler-se invalidade parcial da nota de culpa no tocante ao facto descrito no art.º 30.º da nota de culpa;”
Assim sendo, e porque nada foi alegado pelas partes no que concerne à retificação, a questão suscitada pela recorrente encontra-se prejudicada, nada mais se impondo dizer.
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Cumpre, assim, apreciar as questões suscitadas pela recorrente, quais sejam:
1ª – Se não devia ter sido determinada a invalidade da nota de culpa no que concerne ao facto descrito no artigo 30.º.
2ª – Se existe justa causa para o despedimento da trabalhadora.
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III – Fundamentação
a) - Factos provados e não provados constantes da sentença recorrida:
1.º AA desempenhou funções correspondentes à categoria profissional de assistente comercial sob as ordens, direção e fiscalização do Banco 1..., S.A. desde 30 de outubro de 2002;
2.º No âmbito das funções que exercia, AA tinha de assegurar o atendimento e o desenvolvimento das atividades operativas inerentes à atividade comercial desenvolvida pela agência e apoiar na promoção de produtos e serviços bancários, estabelecendo relações de confiança com os clientes;
3.º Para cumprimento de tais funções, competia a AA, entre outras tarefas:
a) desenvolver atividade por forma a cumprir os objetivos comerciais da agência, em articulação com o gerente, assegurando o respetivo grau de concretização, implementando as medidas corretivas que vierem a ser definidas em caso de desvios;
b) realizar o atendimento dos clientes da agência, nomeadamente no que se refere a operações de caixa e demais atividades relacionadas, bem como as respetivas operações de BackOffice, nomeadamente, as remessas de numerário e valores, a conferência do cofre e caixa, entre outras, em conformidade com as normas e procedimentos instituídos e os requisitos legais aplicáveis;
c) apoiar os gestores (365 e especializados) na sua ação comercial, nomeadamente na promoção e venda das soluções universais mais adequadas ou no encaminhamento de clientes para um atendimento mais especializado, contribuindo desta forma para o cumprimento dos objetivos comerciais da agência;
d) assegurar o tratamento operacional das operações realizadas na agência relativas aos clientes, nomeadamente, no que se refere à abertura de novos clientes e respetivas contas, transferências, operações sobre cartões ou operações sobre produtos passivos, entre outras, de acordo com os procedimentos e as normas em vigor;
e) analisar com o gestor de cliente da agência a correspondência devolvida, apoiando-o na resolução das situações, nomeadamente, na atualização dos dados do cliente;
f) assegurar a gestão do arquivo documental da agência, bem como promover o respetivo envio para arquivo externo e digital, de acordo com as regras estabelecidas;
g) gerir o economato da agência, em articulação com o gerente;
h) contribuir com sugestões de melhoria relativas à organização, processos e procedimentos, que visem a concretização dos objetivos do Banco bem como dar feedback das impressões/sugestões apresentadas pelos clientes;
i) manter-se atualizada no âmbito da sua função e contribuir proactivamente para o seu desenvolvimento profissional, participando e/ou propondo iniciativas que visem a aquisição ou reforço de competências;
j) cumprir com outras responsabilidades que lhe sejam delegadas, no seu âmbito de atuação ou necessárias à prossecução dos objetivos do Banco;
4.º No momento do seu despedimento, AA exercia funções na agência do Banco 1... de ..., desde 25 de março de 2017, respondendo hierarquicamente ao trabalhador BB;
5.º AA tinha conhecimento e formação no âmbito do código de conduta do Banco 1..., S.A., da Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto (Lei do Branqueamento de Capitais e Financiamento do Terrorismo), do Regulamento (UE) 2015/847, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2015, do Aviso do Banco de Portugal n.º 1/2022, de 6 de junho e das normas internas em vigor no Banco 1...;
6.º Em fevereiro de 2023, no âmbito do plano anual de auditoria interna para o ano de 2023 no Banco 1..., foi efetuada uma auditoria à agência de ..., onde AA exercia as suas funções;
7.º No âmbito da auditoria referida em 6.º, foi verificada a existência de uma conta com o n.º ...95, com movimentação individual e titulada por AA, designada como conta de Depósito Ordem Particular Normal;
8.º Esta conta foi aberta por AA em outubro de 2021;
9.º AA era a única titular e última beneficiária efetiva desta conta, sendo a única com poderes de movimentação da mesma;
10.º Nessa conta foram registadas, entre dezembro de 2021 e fevereiro de 2023, 30 transferências SEPA, provenientes da sociedade A..., Lda, que totalizaram o montante de € 74.512,78;
11.º Por email datado de 2 de março de 2023, depois de questionada sobre a existência das referidas movimentações numa conta titulada unicamente por si, AA informou que:
Conforme mail infra e de acordo com o solicitado, informo que os fluxos verificados na conta ...95, são referentes a movimentos de pessoa próxima, a qual possui alguma idade, que exerce atividade de promoção imobiliária.
Dada a relação próxima existente e tendo em conta que atravessámos uma época pandémica, disponibilizei-me para proceder abertura conta, por forma a facilitar os seus recebimentos, provenientes da sua atividade e desta forma igualmente possibilitar/agilizar as compras para a sua habitação, bem como proceder ao pagamento de respetivos impostos.
Presentemente e dado que pandemia se encontra devidamente controlada, tendo da minha parte tomado consciência que por algum motivo ou inconscientemente, fui protelando a situação, contudo, informo que os recebimentos em causa já cessaram no passado mês de fevereiro, pelo que, a conta em questão será saldada e encerrada nas próximas semanas;
12.º Em novembro de 2002, AA abriu a conta n.º ...16, de titulação e movimentação individual, internamente designada como Conta Ordenado Colaborador;
13.º No âmbito da auditoria interna referida em 6.º apurou-se que AA já recebia, desde 2018, transferências provenientes da sociedade A..., Lda., então creditadas na Conta Ordenado Colaborador, com o n.º ...16;
14.º Entre agosto de 2018 e outubro de 2021 - ou seja, muito antes da pandemia de SARS-COV-2 - as transferências recebidas na Conta Ordenado Colaborador, com o n.º ...16, totalizaram € 107.347,54, divididos por 45 transferências;
15.º Através da conta Ordenado Colaborador, com o n.º ...16, foram efetuados pagamentos de cinco DUC, no montante global de € 8.937,52, associados ao NIF ...18..., pertencente a CC;
16.º Através da conta Depósito Ordem Particular Normal, com o n.º ...95, foram efetuados pagamentos de seis DUC, no montante global de € 14.282,78, associados ao NIF ...18..., pertencente a CC;
17.º O produto das várias transferências recebidas em ambas as contas, provenientes da sociedade A..., Lda, foi sendo debitado das referidas contas através de levantamentos de numerário ao balcão e da utilização de cartão de débito ou amortização de cartão de crédito, ambos os cartões da titularidade da AA;
18.º AA não comunicou a existência de quaisquer conflitos de interesses ao Banco 1..., nomeadamente, o exercício de atividades de mediação imobiliária;
19.º AA não exercia outra atividade profissional que não seja a que desenvolvia ao abrigo do contrato de trabalho que a vinculava ao Banco 1..., nomeadamente, na sociedade A..., Lda.;
20.º DD - que foi titular de uma conta solidária com AA - estava integrado na equipa da agência imobiliária B... (franquiada por A..., Lda.), constando como seu assistente o pai deste, CC;
21.º A conta n.º ...95 foi encerrada em 13 de março de 2023, após AA ter sido interpelada para tal pela direção de auditoria interna do Banco 1...;
22.º e desde essa data até à instauração do procedimento disciplinar, não se verificaram transferências da A..., Lda., na conta n.º ...16;
23.º Em 17 de maio de 2023 a comissão executiva do Banco 1... deliberou a instauração de processo disciplinar contra EE nos termos do documento junto a fls. 2 do processo disciplinar apenso cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos e do qual consta, designadamente:
(…) Deste modo, apreciada a conduta da trabalhadora AA e havendo fortes indícios da violação dos mais elementares deveres dos trabalhadores, a Comissão Executiva deliberou mandar instaurar um procedimento disciplinar contra a referida trabalhadora com a intenção de despedimento com justa causa.
Para o efeito, a Comissão Executiva designa como instrutores do processo disciplinar, os Senhores Dr. FF e Dr. GG, (…) a quem incumbirá, isolada ou conjuntamente, a promoção, condução e prática de todas as diligências e atos processuais nos presentes autos de procedimento disciplinar, nomeadamente a realização de diligências probatórias requeridas pela trabalhadora e/ou pelo Banco e outras que os instrutores julguem convenientes, o envio das notificações e comunicações que forem devidas, incluindo assinar e remeter a Nota de culpa e a comunicação de instauração de processo disciplinar e a elaboração de relatório e proposta de decisão final (…);
24.º A deliberação referida em 23.º está assinada pelos membros da comissão executiva HH e II;
25.º Em 29 de maio de 2023 os instrutores do processo disciplinar, FF e GG, subscreveram a nota de culpa junta de fls. 18 verso a 22 do processo disciplinar apenso cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos, da qual consta, designadamente:
(…) III- Enquadramento jurídico:
24. Os comportamentos da trabalhadora-arguida acima descritos, a darem-se como provados a final, configuram a violação dos deveres previstos nos números 1 e 2 do capítulo II do Código de Conduta do EUROBIC e, bem assim, uma violação dos seus outros deveres, nomeadamente, do dever de realizar o trabalho com zelo e diligência, cumprir as ordens e instruções do empregador respeitantes à execução ou disciplina do trabalho e de guardar lealdade ao empregador, previstos nas alíneas c), e) e f) do número 1 do artigo 128.º do Código do Trabalho (adiante CT);
25. Nos termos da I.S. n.º 02/10- Transações em Numerário, a abertura de conta de depósito bancário constitui uma operação bancária central pela qual se inicia, com frequência, uma relação de negócio entre Cliente e Banco;
26. No âmbito dessa relação, são impostas ao EUROBIC deveres de identificação e diligência, previstos nos artigos 23.º e seguintes da Lei do Branqueamento de Capitais e Financiamento do Terrorismo;
27. Entre tais obrigações, impostas ao EUROBIC e cujo cumprimento é exigido à trabalhadora-arguida enquanto trabalhadora da referida instituição bancária, conta-se a observação de procedimentos de identificação e diligência previstos nos artigos 24.º a 26.º da Lei do Branqueamento de Capitais e Financiamento do Terrorismo e procedimentos complementares de diligência previstos no artigo 27.º da Lei do branqueamento de Capitais e Financiamento do Terrorismo;
28. A darem-se como provados, a final, os factos praticados pela trabalhadora-arguida, os mesmos são passíveis de fazer incorrer o EUROBIC em incumprimento do Dever de Identificação e Diligência ou, no limite, em violações do dever de identificação do Ultimate Beneficial Owner dos fundos depositados nas contas tituladas pela trabalhadora-arguida;
29. Tais violações, consubstanciadas na aceitação da utilização de contas bancárias por si tituladas para recebimento de fundos provenientes de uma atividade económica especialmente sujeita a obrigações de Know Your Client, como é a atividade de mediação imobiliária, expuseram e expõem o EUROBIC a riscos sérios de sanções pelas autoridades competentes, nomeadamente o Banco de Portugal;
30. A conduta praticada pela trabalhadora-arguida, a provar-se a final, não se demonstra adequada aos standars de boa conduta definidos pelo EUROBIC para todos os seus trabalhadores e colaboradores;
31. E, mais grave, sujeitos o EUROBIC a riscos sérios de danos patrimoniais e reputacionais;
32. A trabalhadora-arguida, como experiente assistente comercial, não podia ignorar que, ao atuar da forma como atuou, punha em causa tais interesses do EUROBIC;
33. A trabalhadora-arguida revelou indiferença por tais interesses e pela reputação do EUROBIC;
34. Não sendo de afastar que as condutas praticadas, a provarem-se a final, possam configurar ilícitos de natureza penal, que poderão ser apreciados em sede própria;
35. As mencionadas violações, a darem-se como provadas a final, configuram infrações graves, que a trabalhadora-arguida não podia ignorar e, que, por esse motivo, consubstanciam um comportamento inaceitável e reprovável, principalmente considerando que estamos a falar de uma trabalhadora com vários anos de antiguidade;
36. Os factos acima descritos, que sujeitam a Entidade Empregadora a sérios riscos patrimoniais e reputacionais, minam irremediavelmente a confiança depositada pela Entidade Empregadora na trabalhadora-arguida, bem como colocam em causa a sua retidão e honestidade constituindo ainda um mau exemplo para os demais trabalhadores;
37. Tudo isto leva a uma quebra irremediável da confiança da Entidade Empregadora na boa-fé e retidão da conduta futura da trabalhadora-arguida, sendo que, dada a reiteração dos comportamentos - que duraram desde 2018 e só cessaram com a exposição dos mesmos na auditoria realizada - existe fundado e intenso perigo de renovação do mesmo tipo de comportamentos;
38. Os factos acima descritos, quer pela sua gravidade, quer pela gravidade possível das suas consequências, são suscetíveis de tornar imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 351.º do Código do Trabalho;
39. Sendo que, além disso, se traduzem no desinteresse repetido pelo cumprimento, com a diligência devida, de obrigações inerentes ao exercício do cargo ou posto de trabalho a que está afeta e na lesão (potencial) de interesses patrimoniais sérios da empresa, nos termos e para os efeitos do disposto nas alíneas d) e e) do número 2 do artigo 351.º do CT.
Nos termos expostos, considera o EUROBIC que os referidos comportamentos da trabalhadora-arguida, a darem-se, a final, como provados, são suscetíveis de censura e constituem fundamento para aplicação de sanção disciplinar de despedimento com justa causa, cuja intenção expressamente se comunica.
(…);
Meios de prova:
a) Prova documental: documentos juntos aos autos
26.º O Banco 1... remeteu a nota de culpa para o domicilio pessoal de AA, mediante carta registada, com aviso de receção, datada de 7 de junho de 2023 e rececionada em 16 de junho de 2023;
27.º O Banco 1... não remeteu a nota de culpa para o local de trabalho de AA;
28.º Constam de fls. 13 e 14 do processo disciplinar apenso extratos bancários das contas n.º ...16 (Anexo 3) e n.º ...95 (Anexo 4) cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos;
29.º AA não autorizou a junção ao processo disciplinar apenso dos extratos bancários referidos em 28.º;
30.º Os extratos bancários referidos em 28.º permitem identificar a ordenante das transferências bancárias (A..., Lda.), as contas de destino (n.ºs ...16 e ...95) e através da análise dos DUC os impostos que foram pagos;
31.º Todos os movimentos a crédito documentados nos extratos bancários referidos em 28.º foram concretizados através de transferências bancárias (SEPA) e nunca através de depósitos em numerário;
32.º As quantias creditadas pela A..., Lda. nas contas n.ºs ...16 e ...95 tituladas por AA, destinavam-se ao pagamento de comissões devidas ao seu companheiro - DD - e ao pai deste - CC -, por serviços de mediação imobiliária por eles prestados;
33.º A cópia da instrução de serviço n.º 02/10, com entrada em vigor em 24 de março de 2023, relativa a transações em numerário foi junta ao processo disciplinar em 7 de julho de 2023, data posterior à elaboração e envio da nota de culpa a AA (fls. 46 e 47 verso a 58 do processo disciplinar apenso);
34.º Em 6 de setembro de 2023 a comissão executiva do Banco 1... deliberou aplicar a AA a sanção disciplinar de despedimento com justa causa, sem qualquer indemnização ou compensação, aderindo à fundamentação de facto e de direito constante do relatório final junto de fls. 69 verso a 82 do processo disciplinar apenso cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos;
35.º AA foi notificada da deliberação e do relatório final referidos em 34.º, por carta registada com aviso de receção, datada de 8 de setembro de 2023, rececionada em 12 de setembro de 2023, nos termos que constam de fls. 83 a 96 do processo disciplinar apenso cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos;
36.º Ao serviço do Banco 1..., AA não tinha antecedentes disciplinares;
37.º Ao serviço do Banco 1..., AA teve sempre avaliações positivas;
38.º Ao serviço do Banco 1..., AA era uma trabalhadora competente e cumpridora das suas funções;
39.º Na data do despedimento, AA auferia ao serviço do Banco 1... retribuição base mensal de € 1.116,47, acrescida de € 179,20 a título de diuturnidades;
40.º O Banco 1... ministrou a AA as seguintes horas de formação:
- 2019: 59 horas de formação; - 2020: 106 horas de formação; - 2021: 61 horas de formação; - 2022: 42 horas de formação; - 2023: 18 horas de formação;
41.º Em consequência do despedimento, AA sentiu tristeza, angústia, ansiedade, revolta e injustiça;
42.º À relação laboral entre o Banco 1... e AA aplica-se o Acordo de Empresa celebrado entre o Banco 1..., S.A. e a Federação dos Sindicatos Independentes da Banca - FSIB- revisão global, publicado no BTE n.º 12, de 20 de março de 2020;
Factos não provados:
1.º Os extratos bancários juntos a fls. 13 e 14 do processo disciplinar permitem identificar a conta de onde provêm os fundos, a origem e justificação para os valores em causa e o beneficiário efetivo de tais verbas;
2.º O propósito de AA de utilizar as contas, para receber as transferências de comissões devidas por serviços prestados pelo seu sogro, foi de o auxiliar, porque sendo uma pessoa de idade, não estava habituado aos procedimentos bancários, não dominava a informática e encontrava-se debilitado quanto à sua saúde;
3.º Em consequência do despedimento, AA sofreu enorme indignação, angústia e ansiedade que se prolongam e prolongarão no tempo;
4.º O que levou e leva a trabalhadora a vivenciar dias de terrível sofrimento e angústia;
5.º Em consequência do despedimento, AA passou a ter uma postura diferente, de maior intransigência e inquietude, para com os seus familiares e amigos mais próximos, que frequentemente comentam o seu estado de saúde;
6.º Em consequência do despedimento, AA passou a viver um autêntico pesadelo, pois dorme mal e todos os dias revive essa angústia, de ser penalizada por algo que não é tão grave quanto o Banco 1... o qualifica;
7.º O Banco 1... pagou aos demais colaboradores, logo no mês de junho de 2023, um prémio a título de distribuição de dividendos, respeitante ao ano de 2022, em valor aproximado de €800,00;
8.º AA tem direito a este prémio porque outros colaboradores com a mesma antiguidade e nível o receberam.
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b) - Discussão
1ª questão
Se não devia ter sido determinada a invalidade da nota de culpa no que concerne ao facto descrito no artigo 30.º.
Alega a recorrente que:
O artigo 30.º da nota de culpa não se deve considerar como não circunstanciado, já que o mesmo não constitui matéria de facto imputada à recorrida, mas um facto conclusivo, inserido no enquadramento jurídico dos factos.
Por outro lado, a este propósito consta da sentença recorrida o seguinte:
“No que concerne ao artigo 30.º da nota de culpa ocorre falta de circunstanciação dos factos assinalados pela trabalhadora porque não são concretizados os standards de boa conduta definidos pelo EUROBIC e que alegadamente foram desrespeitados pela trabalhadora.
(…)
E, assim sendo, apenas se determina a invalidade parcial da nota de culpa no tocante ao facto descrito no art.º 30.º da nota de culpa, com repercussão na decisão final (art.º 357.º n.º 4) e na ação de impugnação judicial de regularidade e licitude do despedimento (art.º 387.º n.º 3), (…).”
Vejamos:
Do artigo 30.º da nota de culpa consta:
30. A conduta praticada pela Trabalhadora-Arguida, a provar-se a final, não se demonstra adequada aos standards de boa conduta definidos pelo EUROBIC para todos os seus trabalhadores e colaboradores.
Na verdade, esta matéria tem natureza conclusiva, no entanto, ao contrário o alegado pela recorrente, também encerra factos no que respeita aos standards (padrões) de boa conduta definidos pelo empregador que ficamos sem saber quais são pois não é feita qualquer concretização, pese embora a empregadora entenda que a conduta da trabalhadora não se mostra adequada aos mesmos.
Pelo exposto, bem andou o tribunal de 1ª instância ao considerar a invalidade parcial da nota de culpa no que concerne ao artigo 30.º da mesma.
Improcede, por isso, a conclusão da recorrente.
2ª questão
Se existe justa causa para o despedimento da trabalhadora
Alega a empregadora recorrente que:
- O Tribunal a quo fundamentou a sua decisão de não aplicar a Instrução de Serviço n.º 02/10, no n.º 4 do art.º 357.º do Código do Trabalho, nomeadamente no facto de a referida instrução de serviço ter sido junta aos autos após a receção, pela Recorrida, da Nota de Culpa.
- A decisão é manifestamente errada, já que, por um lado, o Código do Trabalho não impõe à Entidade Empregadora a obrigação de realizar, no âmbito do procedimento disciplinar, diligências probatórias tendentes a demonstrar a bondade das acusações que imputa ao trabalhador.
- E, por outro, não resulta da lei a impossibilidade de realização de diligências instrutórias após a receção, pelo trabalhador, da Nota de Culpa.
- Não podia o Tribunal a quo dar como provado que a Recorrida tem conhecimento das normas internas em vigor na Recorrente e concluir, a final, que uma dessas normas não lhe é aplicável pelo simples facto de o seu texto ter sido junto ao procedimento disciplinar após a nota de culpa.
- A Recorrida foi acusada de violar as instruções de serviço n.º 02/10 – Transações em Numerário, algo que a Recorrida vem impugnar ao afirmar que não violou as normas internas da Recorrente.
- Por fim, contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo, não corresponde à verdade que a Instrução de Serviço 02/10 apenas estivesse em vigor desde março de 2023. Essa é a data da última atualização do texto da referida instrução de serviço, cuja versão original data de 11/11/2016.
- Tendo o Tribunal a quo dado como provado que a Recorrida conhecia todas as normas internas em vigor na Recorrente, não poderia, em caso algum, desaplicar a referida instrução de serviço.
A este propósito decidiu-se na sentença recorrida o seguinte:
“- a cópia da instrução de serviço n.º 02/10, com entrada em vigor em 24 de março de 2023, relativa a transações em numerário foi junta ao processo disciplinar em 7 de julho de 2023, data posterior à elaboração e envio da nota de culpa a AA (fls. 46 e 47 verso a 58 do processo disciplinar apenso);
- em 6 de setembro de 2023 a comissão executiva do Banco 1... deliberou aplicar a AA a sanção disciplinar de despedimento com justa causa, sem qualquer indemnização ou compensação, aderindo à fundamentação de facto e de direito constante do relatório final junto de fls. 69 verso a 82 do processo disciplinar apenso;
A indicação da prova documental na nota de culpa através da mera remissão para os documentos juntos aos autos, sem os identificar, não produz o efeito invalidante da nota de culpa e do procedimento disciplinar nos termos alegados pela trabalhadora, porque não integra qualquer uma das causas, comuns ou específicas, da ilicitude do despedimento enumeradas nos art.ºs 381.º e 382.º do CT.
A lei - art.º 353.º do CT - e o AE aplicável - cláusula 108.ª - não estabelecem a obrigação de a nota de culpa conter o elenco exaustivo dos documentos que constam nos autos e serviram de sustentação à nota de culpa.
De resto, decorre claramente do teor da nota de culpa, para um intérprete normal colocado na posição da trabalhadora, que os documentos que a sustentam são aqueles que foram juntos aos autos previamente à sua elaboração.
E contrariamente ao alegado pela trabalhadora, a resposta à nota de culpa que apresentou, demonstra à saciedade que conheceu a prova que sustentou a nota de culpa, não se vislumbrando que a remissão em causa para documentos não identificados, tenha de alguma forma coartado o seu direito de defesa.
Também a junção da instrução de serviço 02/10 ao processo disciplinar posteriormente à receção da nota de culpa, não produz o efeito invalidante da nota de culpa e do procedimento disciplinar nos termos alegados pela trabalhadora, porque não integra qualquer uma das causas, comuns ou específicas, da ilicitude do despedimento enumeradas nos art.ºs 381.º e 382.º do CT.
Porém, e ao contrário do alegado pelo banco em resposta a esta nulidade, esta instrução de serviço não constitui um mero compêndio de alertas, normas e circulares baseadas em legislação nacional e europeia aplicáveis no réu que devem ser respeitadas pelos trabalhadores e que são do conhecimento destes.
Não constitui simples matéria de direito e não de facto e a data da sua junção ao processo disciplinar - por mera conveniência organizativa - não é irrelevante para efeitos da sua aplicabilidade à trabalhadora.
De facto, o que resulta desta instrução de serviço são regras precisas e específicas sobre o procedimento a adotar pelos trabalhadores do banco empregador, nas transações em numerário e na abertura de conta de depósito bancário, designadamente:
- Se o montante da operação (ou de operações aparentemente relacionadas entre si) for igual ou superior a 10.000 euros (ou equivalente em qualquer moeda) ou existirem dívidas relativamente à veracidade ou adequação dos dados ou documentos de identificação fornecidos, deve ser solicitado o preenchimento e assinatura da Declaração de Proveniência e Justificação de Fundos nos moldes previstos no ponto 2 do presente capítulo;
- Sempre que estejamos perante depósitos em numerário em conta D.O. Empresa e o respetivo montante em numerário seja igual ou superior a 10.000 euros (ou equivalente em qualquer moeda), ou a soma de transações fracionadas totalizem ou ultrapassem este valor, e que se verifique que os depositantes são entidades particulares terceiras à conta e/ou o cliente empresa não se encontra em sistema como desenvolvendo uma atividade CAE na lista de atividades Cash Intensive3, o Órgão Comercial deve imprimir (….) a Declaração de Proveniência e Justificação de Fundos e assegurar o cumprimento dos seguintes passos:
- O documento tem de ser preenchido e assinado pelo depositante em momento anterior à efetiva realização da operação. A Declaração deve estar preenchida, assinada, analisada criticamente e conferida antes de ser premido o botão Confirmar no ecrã da transação;
- É obrigatória, para além da identificação nos termos do ponto, a indicação do real ordenante (se o está a fazer em nome próprio ou por conta de outrem), a razão do movimento e a indicação da relação do terceiro depositante com o titular da conta;
- A informação disponibilizada deve ser analisada criticamente, não se aceitando justificações gerais ou abstratas;
Nas operações de depósito a Declaração deve justificar a origem/proveniência dos fundos; nas operações de levantamento, a Declaração deve, ao invés, justificar o destino dos fundos; em caso de dúvida sobre a justificação dada, deve o DC ser imediata e telefonicamente contactada; Este contacto deve ser efetuado num sítio reservado e sem acesso ao público;
- Adicionalmente, o terceiro deve ser identificado conforme descrito no ponto anterior e respetivos subpontos;
- Caso o depositante recuse preencher e/ou assinar a Declaração, o Órgão Comercial não deve efetuar a operação em causa, informando o requisitante desse facto e devendo igualmente a situação ser comunicada à DC, por correio eletrónico (…);
Aliás, regista-se que de todos os normativos invocados pelo banco empregador réu na decisão de despedimento - Código de Conduta do Eurobic, disposições do CT e Lei do Branqueamento de Capitais e Financiamento do Terrorismo - o normativo do qual se retiram regras e procedimentos mais claros e específicos e não meramente programáticos e genéricos, é precisamente a instrução de serviço em apreço (vide fls. 78 a 80 da decisão de despedimento).
Acresce que esta instrução de serviço apenas entrou em vigor em 24 de março de 2023, ou seja, em data posterior à prática dos factos imputados à trabalhadora, pelo que as regras e os procedimentos aí enunciados não poderiam ser do conhecimento da trabalhadora e ela aplicáveis.
Por conseguinte, o facto desta ordem de serviço ter sido junta ao processo disciplinar após a elaboração e envio à trabalhadora da nota de culpa, não gera a nulidade da nota de culpa, mas impede a sua consideração na decisão final de despedimento, nos termos do disposto no art.º 357.º, n.º 4, in fine do CT.
E, assim sendo, improcede a nulidade da nota de culpa por omissão na mesma dos meios de prova, mas determina-se a exclusão da decisão de despedimento da invocação da instrução de serviço n.º 02/10.”
Pois bem, ao contrário do alegado pela recorrente, resulta da matéria de facto provada (ponto 33) que a cópia da instrução de serviço n.º 02/10 entrou em vigor em 24/03/2023.
Assim sendo, e independentemente de outras considerações a propósito da data da sua junção ao processo disciplinar, certo é que a mesma entrou em vigor em data posterior à da prática dos factos imputados à trabalhadora e, consequentemente, não pode ser aplicada.
Acresce que também não colhe a argumentação da recorrente no sentido de que o Tribunal a quo não podia dar como provado que a Recorrida tem conhecimento das normas internas em vigor na Recorrente e concluir, a final, que uma dessas normas não lhe é aplicável pelo simples facto de o seu texto ter sido junto ao procedimento disciplinar após a nota de culpa, na medida em que, por um lado, o que resultou provado foi que a trabalhadora tinha conhecimento e formação no âmbito do código de conduta do Banco 1..., da Lei n.º 83/2017, de 18/08, do regulamento (EU) 2015/847 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20/05/2015, do Aviso do BP n.º 1/2022, de 06/06 e das normas internas em vigor no Banco 1... e, por outro, como já referimos, a referida instrução de serviço n.º 02/10 entrou em vigor em 24/03/2023.
Pelo exposto, acompanhamos a sentença recorrida na sua decisão de não considerar aplicável à trabalhadora a referida instrução n.º 02/10.
Mais alega a recorrente que:
- A exigência da verificação de uma consequência económica/reputacional para o Empregador, para que a sua conduta ilícita e culposa constitua fundamento para o despedimento, é manifestamente contrário à lei, violando o disposto no número 3 do artigo 351º do Código do Trabalho.
- O Tribunal a quo, ao exigir tal consequência, ignorou um elemento essencial à relação laboral: a confiança que subjaz à referida relação.
- A referida quebra de confiança é fundamento suficiente para constituição de justa causa de despedimento, independentemente do montante ou sequer da verificação efetiva de prejuízos na esfera da entidade empregadora.
- A atuação da recorrida dada como provada pelo Tribunal a quo, é fundamento bastante para a quebra irremediável de confiança que a Recorrente nela depositava.
- A recorrida, como trabalhadora bancária, estava especialmente vinculada a um grau de confiança qualificado, já que na atividade bancária, a exigência geral de boa‑fé na execução dos contratos assume um especial significado e reveste-se por isso de particular acuidade pois a relação juslaboral pressupõe a integridade, lealdade de cooperação e absoluta confiança da/na pessoa contratada.
- O Tribunal a quo atribui nenhuma importância ao valor dessa mesma confiança, focando-se apenas na ausência de um prejuízo matemático para fundamentar a falta de gravidade da conduta da Recorrida.
- A própria atuação da Recorrida após a descoberta, pela Recorrente, da sua atuação, não poderia deixar de ter sido considerada pelo Tribunal a quo, para decidir pela quebra irremediável da confiança essencial à manutenção da relação laboral.
- A apresentação de uma justificação falsa e a ocultação da existência de outra conta utilizada não podiam deixar de relevar para a conclusão inevitável de que a confiança que subjaz à relação laboral, entre Recorrente e Recorrida, ficou irremediavelmente quebrada, constituindo a atuação ilícita e culposa da Recorrida justa causa de despedimento.
- Não é legítimo considerar-se que a Recorrente teria de aguardar ser sancionada pela prática ilegal e culposa da Recorrida para que estivesse constituída justa causa de despedimento.
- A conduta da Recorrida fez a Recorrente incumprir os deveres de identificação e diligência a que está obrigada nos termos da Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto, o que constitui a prática de contraordenações especialmente graves, cuja coima pode ascender a €5.000.000,00 (cinco milhões de euros), expondo a Recorrente à aplicação de coima elevadíssima, sendo esse juízo de prognose póstuma que tem de orientar o juízo sobre a gravidade da conduta do trabalhador.
- A opacidade das operações concretas é absolutamente irrelevante para o nível de gravidade do incumprimento dos referidos deveres a que a Recorrida está especialmente adstrita por ser trabalhadora de uma instituição bancária.
- Também a inexistência de benefício para a Recorrida é manifestamente irrelevante para efeitos de atenuação da gravidade do comportamento.
- A não aplicação de medida de suspensão preventiva da Recorrida é, também ela, irrelevante para a aferição da possibilidade de manutenção do vínculo laboral.
- Andou mal o Tribunal a quo por ter julgado a diminuição da gravidade da conduta da Recorrida pelo facto de esta ter cessado a sua conduta e ter putativamente esclarecido os factos.
Apreciando:
O contrato de trabalho pode cessar, além de outras causas, por despedimento por iniciativa do empregador, por facto imputável ao trabalhador.
Na verdade, conforme o disposto no n.º 1, do artigo 351.º, do C.T. <<constitui justa causa de despedimento o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho>>, nomeadamente, os previstos no n.º 2 do mesmo normativo.
Por outro lado, a justa causa compreende três elementos: o comportamento culposo do trabalhador; comportamento grave em si mesmo e de consequências danosas e o nexo de causalidade entre este comportamento e a impossibilidade de subsistência da relação laboral face àquela gravidade, ou seja, o comportamento tem de ser imputado ao trabalhador a título de culpa (com dolo ou negligência) e a gravidade e impossibilidade devem ser apreciadas em termos objetivos e concretos relativamente à empresa - neste sentido, entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 22-09-2010 e 29-09-2010, disponíveis em www.dgsi.pt.
Acresce que <<para apreciação da justa causa deve atender-se, no quadro da gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes>> – n.º 3 do citado artigo 351.º, do C.T..
Cumpre, ainda, dizer que compete ao trabalhador fazer a prova da existência do contrato de trabalho e do despedimento e ao empregador incumbe provar os factos constitutivos da justa causa do despedimento que promoveu.
Após estas considerações jurídicas, cumpre verificar se a empregadora logrou provar, como lhe competia, os comportamentos que imputou ao trabalhador e se os mesmos integram aquele conceito de justa causa, ou seja, se este praticou factos culposos que pela sua gravidade e consequências tornem imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.
Na sentença recorrida considerou-se, a este propósito, além do mais, o seguinte:
“Na sequência do processo disciplinar que o banco empregador lhe moveu, foi aplicada a AA a sanção de despedimento por, alegadamente, os seus comportamentos traduzirem desinteresse repetido pelo cumprimento, com a diligência devida, de obrigações inerentes ao exercício do seu cargo ou posto de trabalho a que estava afeta e a lesão (potencial) de interesses patrimoniais sérios da empresa, consubstanciando as justas causas de despedimento previstas no art.º 351.º, n.º 2, als. a), d) e e) do CT.
No essencial, é imputado à trabalhadora o facto de ter aceite a utilização de duas contas bancárias de que era titular no banco empregador, para recebimento de fundos provenientes de uma atividade de mediação imobiliária, que era exercida pelo seu companheiro e sogro.
Na perspetiva do banco empregador, a trabalhadora, com esta sua conduta, violou culposamente os seus deveres laborais previstos:
» nos art.ºs. 128.º, n.ºs 1, als. c), e) e f) do CT;
» nos números 1 e 2 do capítulo II do Código de Conduta do Eurobic;
» nos art.ºs 23.º a 27.º, 46.º e 50.º da Lei do Branqueamento de Capitais e Financiamento do Terrorismo (Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto);
» na instrução de serviço n.º 02/10 (que não será considerada pelo tribunal por ter sido junta ao processo disciplinar após a notificação à trabalhadora da nota de culpa e pelos motivos anteriormente explanados);
o que determinou uma quebra irremediável da confiança na boa-fé e retidão da conduta futura da trabalhadora e tornou imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral com a mesma.
(…)
O dever de lealdade corresponde a uma obrigação acessória de conduta, que advém da boa fé ínsita no princípio geral constante do art.º 102.º do CT e do art.º 762.º, n.º 2 do CC (vide, neste sentido, o Ac. do STJ de 16.10.1996, CJSTJ 1996, tomo III, p. 243 e Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, p. 230).
A nível laboral, o princípio do cumprimento das prestações contratuais de boa fé encontra concretização, nomeadamente, no dever de lealdade.
Entre os deveres acessórios de lealdade a lei laboral indica, exemplificativamente, os deveres de sigilo e de não concorrência (art.º 128.º, n.º 1, al. f) do CT), mas os deveres de lealdade são bastante mais amplos do que este.
Efetivamente, por força do princípio da boa fé (art.º 102.º do CT) e do intuitus personae que caracteriza o contrato de trabalho deve entender-se que ele institui uma relação de confiança entre as partes, que tem que ser mantida pelo trabalhador através do dever de lealdade.
O conteúdo deste dever será tanto mais intenso, quanto maior for a posição hierárquica do trabalhador na empresa.
Para além dos deveres de sigilo e de não concorrência o dever de lealdade abrange, ainda, a proibição de outros comportamentos.
Viola, por exemplo, este dever o trabalhador que proceda ao furto de bens do empregador ou que utilize os instrumentos de trabalho da empresa, como os computadores, a internet ou o telefone, em proveito próprio (vide, neste Menezes Leitão, Direito do Trabalho, Almedina, 2008, pp. 273-275).
Dispõem os números 1 e 2, do capítulo II, do Código de Conduta do Banco 1..., S.A. que:
1. Integridade, transparência, honestidade, lealdade e respeito:
a) As Pessoas Sujeitas devem pautar toda a sua atuação por comportamentos pessoais e profissionais de acordo com inquestionáveis padrões de integridade, honestidade e lealdade, sendo que o exercício e o respeito por estes valores nunca poderão ser comprometidos, independentemente da natureza dos motivos e das pessoas em causa;
b) Na tomada de decisões, as Pessoas Sujeitas devem efetuar uma cuidada ponderação entre os factos concretos em causa e os seus impactos atuais e potenciais, utilizando, para além dos seus conhecimentos, o bom senso e a prudência;
c) O Banco promove uma atitude transparente perante a sociedade como valor fundamental de conduta, prestando, para o efeito, informação exata, fidedigna e clara sobre as suas operações, comissões e condições dos produtos e serviços, bem como definindo e comunicando os procedimentos para apresentar reclamações e resolver litígios;
d) Na sua atuação, o Banco respeita as diferenças culturais, de género, religiosas, políticas e demais, atuando sem ter em consideração sexo, orientação sexual, nacionalidade, religião, opinião ou filiação política e demais circunstâncias que possam ofender a dignidade da pessoa;
e) O Banco compromete-se a adotar e promover práticas ambientais sustentáveis, procurando a otimização dos recursos disponíveis e a redução e/ou eliminação do desperdício, assegurando, assim, a redução dos impactos ambientais da sua atividade.
2. Cumprimento da lei e das normas
a) O Banco, em toda a sua atividade assegura o total respeito e o integral cumprimento das normas legais e regulamentares vigentes, bem como dos seus normativos internos aplicáveis (negritos meus);
Por último, dispõe a Lei do Branqueamento de Capitais e Financiamento do Terrorismo (Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto) nos seus art.ºs 23.º a 27.º, 46.º e 50.º o seguinte:
Artigo 23.º - Dever de identificação e diligência
1 - As entidades obrigadas observam os procedimentos de identificação e diligência previstos na presente secção quando:
a) Estabeleçam relações de negócio;
b) Efetuem transações ocasionais, independentemente de a transação ser realizada através de uma única operação ou de várias operações aparentemente relacionadas entre si:
i) De montante igual ou superior a 15 000 (euro); ou
ii) Que constituam uma transferência de fundos ou uma transação executada no âmbito de atividade com ativos virtuais, sempre que o montante das mesmas exceda 1000 (euro);
c) Se suspeite que as operações, independentemente do seu valor e de qualquer exceção ou limiar, possam estar relacionadas com o branqueamento de capitais ou com o financiamento do terrorismo;
d) Existam dúvidas sobre a veracidade ou a adequação dos dados de identificação dos clientes previamente obtidos;
2 - Os prestadores de serviços de jogo referidos nas alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 4.º observam os procedimentos de identificação e diligência previstos na presente secção quando efetuem transações de montante igual ou superior a 2000 (euro), independentemente de a transação ser realizada através de uma única operação ou de várias operações aparentemente relacionadas entre si;
3 - No mais curto prazo possível, e com base em critérios de materialidade e de risco, as entidades obrigadas aplicam os procedimentos de identificação e diligência aos clientes já existentes em conformidade com a presente secção;
4 - Ao darem cumprimento ao disposto no número anterior as entidades obrigadas têm em conta os procedimentos de identificação e diligência previamente adotados, o momento em que foram aplicados e a adequação dos elementos obtidos.
Artigo 24.º - Elementos identificativos
1 - A identificação dos clientes e dos respetivos representantes é efetuada:
a) No caso de pessoas singulares, mediante recolha e registo dos seguintes elementos identificativos:
i) Fotografia
ii) Nome completo;
iii) Assinatura;
iv) Data de nascimento;
v) Nacionalidade constante do documento de identificação;
vi) Tipo, número, data de validade e entidade emitente do documento de identificação;
vii) Número de identificação fiscal ou, quando não disponha de número de identificação fiscal, o número equivalente emitido por autoridade estrangeira competente;
viii) Profissão e entidade patronal, quando existam;
ix) Endereço completo da residência permanente e, quando diverso, do domicílio fiscal;
x) Naturalidade;
xi) Outras nacionalidades não constantes do documento de identificação;
b) No caso das pessoas coletivas ou de centros de interesses coletivos sem personalidade jurídica, mediante recolha e registo dos seguintes elementos identificativos:
i) Denominação;
ii) Objeto;
iii) Morada completa da sede social e, quando aplicável, da sucursal ou do estabelecimento estável, bem como, quando diversa, qualquer outra morada dos principais locais de exercício da atividade;
iv) Número de identificação de pessoa coletiva ou, quando não exista, número equivalente emitido por autoridade estrangeira competente;
v) Identidade dos titulares de participações no capital e nos direitos de voto de valor igual ou superior a 5 /prct.;
vi) Identidade dos titulares do órgão de administração ou órgão equivalente, bem como de outros quadros superiores relevantes com poderes de gestão;
vii) País de constituição;
viii) Código CAE (Classificação das Atividades Económicas), código do setor institucional ou outro código de natureza semelhante, quando exista.
2 - No caso dos representantes dos clientes, as entidades obrigadas verificam igualmente o documento que habilita tais pessoas a agir em representação dos mesmos.
Artigo 25.º - Meios comprovativos dos elementos identificativos
1 - Para efeitos da verificação da identificação das pessoas singulares, as entidades obrigadas exigem sempre a apresentação de documentos de identificação válidos, dos quais constem os elementos identificativos previstos nas subalíneas i) a vi) da alínea a) do n.º 1 do artigo anterior;
2 - A comprovação dos dados referidos no número anterior é efetuada pelos seguintes meios, sempre que os clientes e os respetivos representantes disponham dos elementos necessários para o efeito e manifestem à entidade obrigada a intenção de recorrer aos mesmos:
a) Através dos meios de identificação eletrónica, assinatura eletrónica qualificada e autenticação segura do Estado disponíveis através do sítio na Internet autenticacao.gov.pt;
b) (Revogada.)
c) Com recurso a plataformas de interoperabilidade entre sistemas de informação emitidos por serviços públicos, nos termos do Regulamento (UE) n.º 910/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de julho de 2014;
d) Através da autorização do titular dos dados para a sua transmissão, nos termos dos n.os 1 e 4 do artigo 4.º-A da Lei n.º 37/2014, de 26 de junho.
3 - Para efeitos do disposto no número anterior, as entidades obrigadas disponibilizam os meios e serviços tecnológicos necessários.
4 - Fora dos casos previstos no n.º 2, a comprovação dos documentos referidos no n.º 1 é efetuada mediante:
a) Reprodução do original dos documentos de identificação, em suporte físico ou eletrónico;
b) Cópia certificada dos mesmos;
c) O acesso à respetiva informação eletrónica com valor equivalente, designadamente através:
i) Do recurso a dispositivos seguros, reconhecidos, aprovados ou aceites pelas autoridades competentes, que confiram certificação qualificada, nos termos a definir por regulamentação;
ii) Da recolha e verificação, mediante prévio consentimento, dos dados eletrónicos junto das entidades competentes responsáveis pela sua gestão;
iii) Da autorização para a transmissão dos dados nos termos dos n.os 1 e 4 do artigo 4.º-A da Lei n.º 37/2014, de 26 de junho;
iv) Do recurso a prestadores qualificados de serviços de confiança, nos termos previstos no Regulamento (UE) n.º 910/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de julho de 2014.
5 - Para efeitos da verificação da identificação das pessoas coletivas ou de um centro de interesses coletivos sem personalidade jurídica, as entidades obrigadas exigem sempre a apresentação do cartão de identificação da pessoa coletiva, da certidão do registo comercial ou, no caso de entidade com sede social situada fora do território nacional, de documento equivalente emitido por fonte independente e credível, que comprovem os elementos identificativos previstos nas subalíneas i) a iv) da alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º
6 - A comprovação dos dados referidos no número anterior é efetuada mediante o recurso a plataformas de interoperabilidade entre sistemas de informação emitidos por serviços públicos ou através de qualquer dos meios de comprovação previstos no presente artigo.
7 - Sempre que os meios de comprovação utilizados não contemplem alguns dos elementos identificativos previstos no artigo 24.º, as entidades obrigadas procedem à recolha dos mesmos através de outros meios complementares admissíveis.
8 - Sempre que os suportes comprovativos, referentes a quaisquer elementos identificativos, apresentados às entidades obrigadas ofereçam dúvidas quanto ao seu teor ou à sua idoneidade, autenticidade, atualidade, exatidão ou suficiência, aquelas entidades promovem as diligências adequadas à cabal comprovação dos elementos identificativos em causa.
Artigo 26.º - Momento da verificação da identidade
1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 3, a verificação da identidade do cliente e dos seus representantes é efetuada antes do estabelecimento da relação de negócio ou da realização de qualquer transação ocasional.
2 - No caso das transações ocasionais, as entidades obrigadas verificam a atualidade dos elementos de identificação apresentados, independentemente de já terem recolhido elementos de informação sobre o cliente durante a realização de uma transação ocasional anterior.
3 - A verificação da identidade prevista no n.º 1 pode ser completada após o início da relação de negócio, desde que se verifiquem cumulativamente os seguintes pressupostos:
a) Se tal for necessário para não interromper o desenrolar normal do negócio;
b) O contrário não resulte de norma legal ou regulamentar aplicável à atividade da entidade obrigada;
c) A situação em causa apresente um risco reduzido de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo, expressamente identificado como tal pelas entidades obrigadas;
d) As entidades obrigadas executem as medidas adequadas a gerir o risco associado àquela situação, designadamente através da limitação do número, do tipo ou do montante das operações que podem ser efetuadas.
4 - Sempre que façam uso da faculdade conferida pelo número anterior, as entidades obrigadas concluem os procedimentos de verificação da identidade no mais curto prazo possível.
Artigo 27.º - Procedimentos complementares de diligência
Em complemento dos procedimentos de identificação previstos nos artigos 24.º e 25.º, as entidades obrigadas procedem ainda:
a) À obtenção de informação sobre a finalidade e a natureza pretendida da relação de negócio;
b) À obtenção de informação sobre a origem e o destino dos fundos movimentados no âmbito de uma relação de negócio ou na realização de uma transação ocasional, quando o perfil de risco do cliente ou as características da operação o justifiquem;
c) À manutenção de um acompanhamento contínuo da relação de negócio, a fim de assegurar que as operações realizadas no decurso dessa relação são consentâneas com o conhecimento que a entidade tem das atividades e do perfil de risco do cliente e, sempre que necessário, da origem e do destino dos fundos movimentados.
Artigo 46.º- Comunicação de atividades imobiliárias
1 - As entidades obrigadas que exerçam atividades imobiliárias comunicam ao IMPICI.P.:
a) A data de início da sua atividade, acompanhada do código de acesso à certidão permanente do registo comercial, no prazo máximo de 60 dias a contar dessa data;
b) Em base trimestral, os seguintes elementos sobre cada transação imobiliária e contrato de arrendamento efetuados:
i) Identificação clara dos intervenientes;
ii) Montante global do negócio jurídico e do valor de cada imóvel transacionado;
iii) Menção dos respetivos títulos representativos;
iv) Identificação clara dos meios de pagamento utilizados, com indicação, sempre que aplicável, dos números das contas de pagamento utilizadas;
v) Identificação do imóvel;
vi) Prazo de duração do contrato de arrendamento, quando aplicável.
2 - A comunicação referida na alínea a) do número anterior:
a) É apenas aplicável às entidades referidas na alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º;
b) É acompanhada de certidão do registo comercial, caso a entidade comunicante não possua a certidão permanente mencionada na alínea a).
3 - Para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 1, apenas são comunicados os contratos de arrendamento de bens imóveis cujo montante de renda seja igual ou superior a 2500 (euro) mensais.
4 - O disposto no presente artigo é objeto de regulamentação pelo IMPIC, I. P., designadamente quanto à forma e aos prazos das comunicações devidas.
5 - A Autoridade Tributária e Aduaneira disponibiliza ao IMPIC, I. P., os elementos de que disponha quanto às obrigações previstas nas alíneas a) e b) do n.º 1 relativamente às entidades obrigadas que exerçam atividades imobiliárias.
Artigo50.º - Dever de recusa
1 - As entidades obrigadas recusam iniciar relações de negócio, realizar transações ocasionais ou efetuar outras operações, quando não obtenham:
a) Os elementos identificativos e os respetivos meios comprovativos previstos para a identificação e verificação da identidade do cliente, do seu representante e do beneficiário efetivo, incluindo a informação para a aferição da qualidade de beneficiário efetivo e da estrutura de propriedade e de controlo do cliente; ou
b) A informação prevista no artigo 27.º sobre a natureza, o objeto e a finalidade da relação de negócio.
2 - Nas situações previstas no número anterior, as entidades obrigadas põem termo à relação de negócio, analisam as possíveis razões para a não obtenção dos elementos, dos meios ou da informação e, sempre que se verifiquem os respetivos pressupostos, efetuam a comunicação prevista no artigo 43.º
3 - Para além das situações previstas no n.º 1, quando não possam dar cumprimento aos demais procedimentos de identificação e diligência previstos na presente lei, incluindo os procedimentos de atualização previstos no artigo 40.º, as entidades obrigadas:
a) Recusam iniciar relações de negócio, realizar transações ocasionais ou efetuar outras operações;
b) Põem termo às relações de negócio já estabelecidas, quando o risco de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo concretamente identificado não possa ser gerido de outro modo;
c) Analisam as possíveis razões para a impossibilidade do cumprimento de tais procedimentos e, sempre que se verifiquem os respetivos pressupostos, efetuam a comunicação prevista no artigo 43.º;
d) Atuam, sempre que possível, em articulação com as autoridades judiciárias ou policiais competentes, consultando-as previamente, sempre que tenham razões para considerar que a cessação da relação de negócio prevista na alínea b) é suscetível de prejudicar uma investigação.
4 - As entidades obrigadas fazem constar de documento ou de registo escrito:
a) As conclusões que sustentam as análises referidas no n.º 2 e na alínea c) do número anterior;
b) As conclusões que fundamentam a decisão de pôr termo à relação de negócio prevista na alínea b) do número anterior;
c) A referência à realização das consultas às autoridades referidas na alínea d) do número anterior, com indicação das respetivas datas e dos meios de comunicação utilizados.
5 - As entidades obrigadas conservam, nos termos previstos no artigo 51.º, os documentos ou registos a que se refere o número anterior e colocam-nos, em permanência, à disposição das autoridades setoriais.
6 - As autoridades setoriais definem os termos em que deve ter lugar a restituição dos fundos ou outros bens que estejam confiados às entidades obrigadas à data do termo da relação de negócio a que se refere o n.º 2 e a alínea b) do n.º 3, sempre que tal restituição não seja inviabilizada por medida judiciária ou outra legalmente prevista.
7 - O exercício do dever de recusa ou a cessação da relação de negócio ao abrigo do presente artigo não determinam qualquer responsabilidade para a entidade obrigada que atue de boa-fé.
À luz dos critérios e das normas enunciados analisemos os comportamentos que a Banco 1... imputa a AA e que fundaram a sanção disciplinar de despedimento com justa causa que lhe veio a aplicar.
(…)
No essencial, ressalta da factualidade apurada que:
- desde agosto de 2018 até fevereiro de 2023 a autora permitiu que fossem efetuadas transferências nas duas contas bancárias de que era titular no banco empregador, provenientes da sociedade de mediação imobiliária A...;
- tais transferências destinavam-se ao pagamento de comissões devidas ao seu companheiro e ao pai deste, por serviços de mediação imobiliária por estes prestados;
- numa das contas foram registadas 30 transferências que totalizaram €74.512,78 (conta n.º ...95);
- na outra conta foram registadas 45 transferências que totalizaram €107.347,54 (conta n.º ...16);
- através destas contas foram efetuados pagamentos de onze DUC associados ao NIF do pai do companheiro da trabalhadora;
- os extratos bancários referentes a estas contas permitem identificar a ordenante das transferências bancárias (A..., Lda.), as contas de destino (n.ºs ...16 e ...95) e através da análise dos DUC os impostos que foram pagos;
- todos os movimentos a crédito documentados nesses extratos bancários foram concretizados através de transferências bancárias (SEPA) e nunca através de depósitos em numerário;
A trabalhadora tinha conhecimento e formação sobre as normas do código de conduta do Banco empregador das quais decorre que deve pautar toda a sua atuação por comportamentos pessoais e profissionais de acordo com inquestionáveis padrões de integridade, honestidade e lealdade, sendo que o exercício e o respeito por estes valores nunca poderão ser comprometidos, independentemente da natureza dos motivos e das pessoas em causa; na tomada de decisões, deve efetuar uma cuidada ponderação entre os factos concretos em causa e os seus impactos atuais e potenciais, utilizando, para além dos seus conhecimentos, o bom senso e a prudência e que o banco, em toda a sua atividade assegura o total respeito e o integral cumprimento das normas legais e regulamentares vigentes, bem como dos seus normativos internos aplicáveis (n.ºs 1 e 2 do capítulo II do código de conduta do Eurobic).
Assim como também tinha conhecimento e formação sobre os procedimentos de identificação e diligência previstos nos citados art.ºs 23.º a 27.º da Lei do Branqueamento de Capitais e Financiamento do Terrorismo.
O comportamento pessoal e profissional de acordo com inquestionáveis padrões de integridade, honestidade e lealdade e a cuidada ponderação na tomada de decisões, entre os factos concretos em causa e os seus impactos atuais e potenciais, utilizando, para além dos seus conhecimentos, o bom senso e a prudência, que eram exigidos à trabalhadora no exercício das suas funções bancárias, impunham-lhe o dever de comunicação ao banco empregador do motivo pelo qual recebia nas suas contas quantias de uma empresa imobiliária e da identidade dos beneficiários efetivos dessas quantias.
Por outro lado, mesmo sendo duvidosa a aplicação das normas da Lei do Branqueamento de Capitais e Financiamento do Terrorismo, o bom senso e a prudência também impunham à trabalhadora o cumprimento dos procedimentos de identificação e diligência previstos nos art.ºs 23.º a 27.º desta Lei, para que não se suscitassem quaisquer dúvidas ou suspeições sobre a legalidade da sua conduta e a licitude da proveniência e do destino das quantias depositadas nas suas contas.
É que desempenhando funções numa instituição bancária, a trabalhadora sabe que impendia sobre si um acrescido dever de transparência, por lidar com dinheiro, num setor de atividade altamente escrutinado e fiscalizado e em que a transparência, a lealdade e a confiança são valores absolutamente essenciais.
Omitindo os referidos dever e procedimentos, a trabalhadora não realizou o seu trabalho com zelo e diligência e incumpriu instruções do banco empregador respeitantes à execução do seu trabalho, incumprindo, assim, os deveres enunciados no art.º 128.º, n.º 1, alíneas c) e e) do CT.
No mais, regista-se que as obrigações decorrentes do art.º 46.º da Lei do Branqueamento de Capitais e Financiamento do Terrorismo são aplicáveis às empresas de mediação imobiliária e às transações em que estas intervêm como mediadoras imobiliárias, não se aplicando à trabalhadora.
Assim como também não se aplica à trabalhadora o dever de recusa previsto no art.º 50.º desta Lei porque para ela, a proveniência e o destino das quantias depositadas nas suas contas não eram suspeitas, e esta natureza suspeita também não resultou comprovada nos autos.
Por conseguinte, ao não comunicar ao banco réu o motivo pelo qual recebia nas suas contas quantias de uma empresa imobiliária e a identidade dos beneficiários efetivos dessas quantias, a trabalhadora incumpriu, deliberadamente, os referidos deveres de transparência que sobre ela impendiam, pelo que praticou uma infração disciplinar ilícita e culposa.
E assim é que o desvalor desta conduta foi espontânea e livremente assumida pela própria trabalhadora, pois logo após ter sido interpelada para tal pela direção de auditoria interna do banco empregador, encerrou a conta n.º ...95 e deixou de receber transferência da empresa A... na sua outra conta ordenado.
Afigura-se, porém, que a conduta da trabalhadora, apesar de ilícita e culposa, não assume a gravidade pressuposta pela lei para aplicação da sanção disciplinar de despedimento.
Em primeiro lugar, porque do comportamento da trabalhadora não resultou qualquer consequência para o banco empregador, designadamente, uma qualquer sanção imposta pelo Banco de Portugal ou um qualquer prejuízo económico e/ou reputacional.
Em segundo lugar, porque os extratos bancários das contas tituladas pela trabalhadora permitiam identificar a ordenante das transferências bancárias (A..., Lda.), as contas de destino (n.ºs ...16 e ...95) e através da análise dos DUC os impostos que foram pagos e todos os movimentos a crédito documentados nesses extratos bancários foram concretizados através de transferências bancárias (SEPA) e nunca através de depósitos em numerário, pelo que não era total a opacidade sobre as operações bancárias em apreço, não sendo líquido que o banco empregador estivesse sequer sujeito à aplicação de qualquer sanção.
Ou seja, as quantias depositadas nas contas da autora não provinham de uma entidade desconhecida, suspeita e não identificável e a grande parte delas serviram para pagamento de impostos.
E, em terceiro lugar, porque a trabalhadora não retirou qualquer benefício da sua conduta, esclareceu prontamente os factos e cessou imediatamente a sua conduta ilícita.
Neste contexto, não revestindo a conduta da trabalhadora particular gravidade, conclui-se pelo não preenchimento do requisito subjetivo da justa causa de despedimento.
E é também entendimento do tribunal que do comportamento da trabalhadora não decorreu uma impossibilidade prática e imediata da subsistência do vínculo laboral.
A ideia de inexigibilidade que uma boa parte da jurisprudência relaciona com a perda irremediável de confiança do empregador na viabilidade futura do vínculo e que é a que melhor se adequa ao caráter intuitus personae do contrato de trabalho.
Desde logo, porque, apesar de ilícita e culposa, a infração da trabalhadora, na prática, não obstou à subsequente execução normal do contrato, pois após o conhecimento da infração pelo banco empregador, pelo menos desde 17 de maio de 2023 (data da deliberação da instauração do procedimento disciplinar) e até ao dia 12 de setembro de 2023, data em que lhe foi comunicado o despedimento, a trabalhadora continuou a exercer as mesmas funções que antes exercia.
E mesmo após o banco empregador ter comunicado a proposta de despedimento à trabalhadora através da nota de culpa, em 16 de junho de 2023, continuou a receber o trabalho que esta lhe prestou, no exercício das mesmas funções que anteriormente desempenhava e com recurso aos mesmos meios, não tendo sido determinada a sua suspensão preventiva que neste momento era possível (art.º 354.º do CT) ou a alteração das suas funções.
Esta execução do contrato durante, pelo menos, quatro meses após o conhecimento da infração pelo banco empregador, demonstra que a infração não comprometeu definitivamente o futuro do vínculo contratual entre as partes e que não se perdeu irremediavelmente a confiança do banco empregador na viabilidade futura do vínculo.
E, assim sendo, também se conclui pelo não preenchimento do requisito objetivo da justa causa.
Por último, entende-se que a sanção de despedimento é desproporcionada, porquanto a trabalhadora tinha já 20 anos completos ao serviço do banco empregador, este nunca a censurou disciplinarmente, teve sempre avaliações positivas, era uma trabalhadora competente e cumpridora das suas funções e da sua conduta não resultou qualquer prejuízo económico, reputacional ou outro para o banco empregador.
Neste contexto, afigura-se desproporcionado aplicar à trabalhadora, no quadro de uma primeira censura disciplinar que lhe foi dirigida pela sua empregadora, a sanção capital do despedimento.
O banco empregador poderia - e deveria - ter sancionado a trabalhadora com uma outra sanção conservatória da relação laboral de entre as que estão legalmente previstas para o efeito (as elencadas de a) a e) do n.º 1, do art.º 328.º do CT).
Por tudo o exposto, conclui-se que o comportamento da trabalhadora, embora ilícito e culposo, dentro do circunstancialismo concreto que o rodeou, não é um comportamento de tal modo grave que deixe de ser razoavelmente exigível a um qualquer empregador (um empregador médio) manter a trabalhadora ao serviço, sendo desproporcional e excessiva a sanção de despedimento, ponderando também o diminuto desvalor do resultado da ação.
Nas circunstâncias concretas, a permanência do contrato e das relações pessoais e patrimoniais que ele importa, não são de forma a ferir, de modo exagerado e violento, a sensibilidade e a liberdade psicológica de uma pessoa normal, colocada na posição do empregador, ou seja, a continuidade do vínculo não representa uma insuportável e injusta imposição ao empregador.
E, assim sendo, porque desprovido de justa causa que o suporte, o despedimento de AA promovido pelo Banco 1... é ilícito (art.º 381.º, al. b) do CT).” – fim de citação.
*
Pois bem, tendo em conta a matéria de facto provada, acompanhamos a sentença recorrida, pouco mais se impondo dizer.
Na verdade, certo é que, como se refere na sentença recorrida, o comportamento do trabalhador violou os deveres de realizar o trabalho com zelo e diligência e de cumprir as instruções do empregador respeitantes à execução do trabalho (artigo 128.º, n.º 1, c) e e), ambos do CT).
Acontece que resultaram provados os seguintes factos:
- Os extratos bancários referidos em 28.º permitem identificar a ordenante das transferências bancárias (A..., Lda.), as contas de destino (n.ºs ...16 e ...95) e através da análise dos DUC os impostos que foram pagos;
- Todos os movimentos a crédito documentados nos extratos bancários referidos em 28.º foram concretizados através de transferências bancárias (SEPA) e nunca através de depósitos em numerário;
- As quantias creditadas pela A..., Lda. nas contas n.ºs ...16 e ...95 tituladas por AA, destinavam-se ao pagamento de comissões devidas ao seu companheiro - DD - e ao pai deste - CC -, por serviços de mediação imobiliária por eles prestados;
- Ao serviço do Banco 1..., AA não tinha antecedentes disciplinares;
- Ao serviço do Banco 1..., AA teve sempre avaliações positivas;
- Ao serviço do Banco 1..., AA era uma trabalhadora competente e cumpridora das suas funções;
Acresce que não se apurou que o comportamento da trabalhadora tenha causado danos ou prejuízos à empregadora, nem que a conduta da mesma tenha exposto, em concreto, a empregadora ao risco de ser sancionada.
O artigo 351.º do CT, como refere a recorrente, não exige a verificação de uma consequência económica/reputacional, no entanto, tal não constitui qualquer proibição de a ausência da mesma ser valorada na apreciação da justa causa nem significa o esquecimento da confiança que subjaz à relação laboral e com mais premência no âmbito da atividade bancária.
Na verdade, como refere a recorrente, a recorrida, como trabalhadora bancária, estava vinculada a um grau de confiança qualificado, já que na atividade bancária a exigência geral de boa fé na execução dos contratos assume um especial significado e reveste-se de particular acuidade, posto que a relação laboral pressupõe a integridade, lealdade de cooperação e absoluta confiança da/na pessoa contratada. No entanto, conjugando todos os factos provados e pelas razões já expostas, não acompanhamos a recorrente na sua alegação de que a atuação da recorrida é fundamento bastante para a quebra irremediável da confiança que a recorrente nela depositava.
Também não acompanhamos a recorrente na sua pretensão de considerar como agravante o comportamento da trabalhadora após a interpelação da empregadora, na medida em que não resulta da matéria de facto provada que a justificação apresentada seja falsa mas, tão só, que a trabalhadora foi questionada sobre as movimentações da conta n.º ...95 e apresentou a justificação constante do ponto 11 que não resultou provada, nem a ocultação da existência de outra conta utilizada, tendo-se apurado, apenas, que a trabalhadora já recebia, desde 2018, transferências da mesma sociedade creditadas noutra conta com o n.º ...16, o que ocorreu entre agosto de 2018 e outubro de 2021.
Acresce que, como já ficou dito, a maior ou menor opacidade, a inexistência de benefício económico e a não suspensão preventiva da trabalhadora são relevantes para a apreciação da existência ou não de justa causa.
Desta forma, face ao que ficou dito, entendemos que o comportamento da trabalhadora supra descrito, pese embora ilícito e culposo, não é grave em si mesmo e nas suas consequências de forma a originar uma absoluta quebra de confiança entre o empregador e o trabalhador, pelo que, não se verifica a impossibilidade prática e imediata da subsistência da relação de trabalho.
Ao contrário do alegado pela recorrente, o comportamento da trabalhadora não é de tal modo grave que abalou de forma irremediável e definitiva a confiança que deve existir entre empregador e trabalhador.
Em suma, não estamos perante um comportamento do trabalhador que tornou impossível a subsistência da relação laboral.
Acresce que a sanção disciplinar deve ser proporcional à gravidade da infração e à culpabilidade do infrator (n.º 1, do artigo 330.º, do C.T.), pelo que, face ao que ficou dito, entendemos também que a sanção de despedimento aplicada à trabalhadora não se mostra proporcional à gravidade do seu comportamento. A trabalhador podia e devia ter sido sancionada mas não com a sanção mais gravosa.
Tendo em conta que a sanção disciplinar visa reagir contra o comportamento inadequado do trabalhador, procurando harmonizar este para o futuro com o interesse do empregador, e sendo o objetivo natural daquela sanção, de natureza corretiva, intimidatória e conservatória, só no caso de uma sanção deste tipo <<se mostrar inadequada ou insuficiente para repôr a normalidade da relação de trabalho prejudicada pelo comportamento imputado ao trabalhador, se poderá aceitar, como razoável e justo, aplicar-se uma sanção rescisória do contrato.
A existência de justa causa só será, assim, de admitir se os factos praticados pelo trabalhador se reflectirem sobre o desenvolvimento normal da relação de trabalho, afectando-o em termos tais que o interesse do despedimento deva prevalecer sobre o interesse oposto da permanência do contrato>>[2].
Face ao comportamento apurado da trabalhadora, temos para nós que uma sanção conservatória seria a mais adequada já que se nos afigura suficiente para repor o normal desenvolvimento da relação laboral devendo, assim, prevalecer o interesse na permanência do contrato.
Pelo exposto, inexistindo justa causa para o despedimento da trabalhadora, o seu despedimento é ilícito tal como consta da sentença recorrida.
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Assim sendo, na improcedência das conclusões da recorrente, impõe-se a manutenção da sentença recorrida em conformidade.
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IV – Sumário[3]
(…).
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V – DECISÃO
Nestes termos, sem outras considerações, na improcedência do recurso, acorda-se em manter a sentença recorrida.
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Custas a cargo da empregadora recorrente.
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(Paula Maria Roberto)
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(Mário Rodrigues da Silva)
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(Felizardo Paiva)
[1] Relatora – Paula Maria Roberto
Adjuntos – Mário Rodrigues da Silva
– Felizardo Paiva
[2] Acórdão do STJ de 09/06/1999, AD, 459.º, 461.
[3] O sumário é da exclusiva responsabilidade da relatora.