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CONTRATO DE ARRENDAMENTO PARA HABITAÇÃO
OPOSIÇÃO À RENOVAÇÃO DO CONTRATO
PRAZO DE RENOVAÇÃO
Sumário
I - A nova redação dos artigos 1096º e 1097º do Código Civil, introduzida pela Lei 13/2019, de 12 de fevereiro, aplica-se não apenas aos contratos futuros, mas (e também) aos contratos que subsistam à data da sua entrada em vigor, como decorre da regra geral do artigo 12º, nº2, 2ª parte, do Código Civil, por se tratar de lei que regula o conteúdo da relação jurídica do arrendamento, aplicando-se às relações de arrendamento já constituídas e que se mantêm, por se tratarem de contratos de execução duradoura, com ressalva, salvo exceção legal – art.º 12.º n.º 1 do Código Civil - dos efeitos já produzidos pelos factos que a lei visa regular. II - O nº3, do artigo 1097º, do Código Civil, não fixa um prazo inicial de duração mínima do contrato de arrendamento para fins habitacionais sujeito a prazo certo, antes regula os efeitos da oposição à primeira renovação desse contrato, que apenas se produzirão decorridos três anos da celebração do mesmo. Consequentemente, nada obsta a que se considere válida e eficaz a cláusula contratual que fixa o prazo de duração do contrato de arrendamento em um ano, operando a primeira renovação no termo final daquele prazo e, as subsequentes, no termo final de cada período de renovação (conforme previsto no n.º 1 do artigo 1096.º do Código Civil). III - Tendo o contrato em análise a duração inicial de um ano, com início em 1 de outubro de 2015 e termo em 30 de setembro de 2016, a partir da entrada em vigor da Lei nº 13/2019, que ocorreu em 13 de fevereiro de 2019 (artigo 16º da Lei), o prazo de renovação aplicável passou a ser o determinado pela nova redação do artigo 1096º, nº1, do Código Civil. Assim, o prazo de renovação de um ano, que resultava da redação anterior do artigo 1096º, nº1, do Código Civil, deverá ser considerado alargado para três anos.
Texto Integral
Processo nº 63/23.0T8MTS.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo Local Cível de Matosinhos – Juiz 2
Acordam na 5ª Secção do Tribunal da Relação do Porto:
I - RELATÓRIO
Recorrente: AA
Recorridos: BB e CC
BB e CC propuseram a presente ação, sob a forma de processo comum, contra AA, pedindo que:
a) Seja declarada a cessação do contrato de arrendamento por oposição à renovação operada pelos Autores.
b) O Réu seja condenado a desocupar de pessoas e bens o locado e a entregá-lo aos Autores.
c) O Réu seja condenado no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de 10 euros por cada dia de atraso na entrega do imóvel.
Alegaram, como fundamento, terem celebrado, enquanto senhorios, com o Réu, arrendatário, um contrato de arrendamento habitacional. O contrato foi celebrado em 1 de outubro de 2015, com início nesse mesmo dia, pelo prazo de um ano, sendo omisso quanto a renovações e prazos das mesmas. Por comunicação datada de 4 de maio de 2022, os Autores comunicaram ao Réu a oposição à renovação do contrato de arrendamento para o termo de vigência da segunda renovação, verificada a 30 de setembro de 2022, data na qual cessou aquele contrato. A essa comunicação respondeu o Réu, alegando que, face às renovações de que foi alvo, o contrato apenas cessaria em agosto de 2024.
Citado o Réu, apresentou contestação, na qual sustentou que o contrato de arrendamento celebrado entre ele e os Autores se mantém em vigor até 30 de setembro de 2024, porquanto da conjugação dos artigos 1096.º n.º 1 e 1097.º n.º 3 do Código Civil decorre que a primeira renovação do contrato apenas se verificou 3 anos após o início de vigência daquele, ou seja, em 1 de outubro de 2018, e todas as renovações subsequentes foram e serão por 3 anos após. Mais alegou sofrer de diversos problemas de saúde, com uma incapacidade de 32% em virtude de acidente de trabalho, e exercer a profissão de trabalhador de limpeza, auferindo o vencimento mensal correspondente ao salário mínimo nacional, o que o impede de conseguir arrendar um outro imóvel para onde possa ir viver. Conclui pela improcedência da ação, com a sua consequente absolvição do pedido.
Na sequência de despacho a ordenar a notificação dos Autores para responderem à “matéria de exceção deduzida pelo Réu na contestação”, aqueles apresentaram articulado no qual concluíram como na petição inicial.
Foi designada data para a realização da audiência prévia, com os objetivos de tentar conciliar as partes e facultar-lhes a discussão de facto e de direito com vista ao conhecimento imediato do mérito da causa, no âmbito da qual o Tribunal deferiu a suspensão da instância por 15 dias, nos termos do disposto no artigo 272º, nº4, do Código de Processo Civil. Após duas prorrogações de suspensão da instância, veio o Réu informar da impossibilidade de as partes lograrem um entendimento, requerendo o prosseguimento dos autos.
Cessada a suspensão da instância, foi proferido saneador-sentença, que julgou a ação parcialmente procedente, declarando cessado o contrato de arrendamento celebrado entre os Autores e o Réu por oposição à renovação operada pelos Autores e condenado o Réu a desocupar de pessoas e bens o locado e a entregá-lo aos Autores, absolvendo-o do restante pedido.
Inconformado com esta decisão, veio o Réu dela interpor o presente recurso, pretendendo a revogação do saneador-sentença e substituição por decisão que julgue totalmente improcedente a ação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
1. O presente recurso vem interposto da sentença proferida nos presentes autos em 14 de abril de 2024 que julgou parcialmente procedente a ação instaurada pelos autores e condenou o réu nos seguintes termos:
a) Declara-se cessado o contrato de arrendamento celebrado entre autores e réu por oposição à renovação operada pelos autores;
b) Condena-se o réu a desocupar de pessoas e bens o locado e a entregá-lo aos autores.
2. O diferendo entre as partes centra-se no prazo de vigência inicial do contrato, mais especificamente, em saber quando é que se operou a primeira renovação contratual.
3. Entre autores e réu foi celebrado o Contrato de Arrendamento para Fim Habitacional com Prazo Certo que se encontra junto com a petição inicial.
4. O contrato celebrado teve início em 01 de outubro de 2015, nada tendo sido estipulado quanto a renovações e prazos das mesmas, razão pela qual se aplica o disposto no artigo 1096.º e 1097.º do Código Civil.
5. Resulta da conjugação das referidas disposições legais que o prazo está fixado em 120 (cento e vinte) dias, sendo certo que a primeira oposição ao arrendamento terá que ser após 3 (três) anos e todas as renovações serão no mínimo por 3 (três) anos.
6. O contrato e renovações terão sempre a duração mínima de 3 (três) anos, não podendo, pois, nos termos das referidas disposições legais, a primeira renovação do contrato de arrendamento ser inferior a 3 (três) anos.
7. Tendo o Contrato de Arrendamento em causa nos presentes autos se iniciado em 01 de outubro de 2015, em 01 de outubro de 2018 renovou-se por mais três anos.
8. E em 01 de outubro de 2021 renovou-se por mais três anos, portanto até 30 de setembro de 2024.
9. Tendo o Contrato de Arrendamento sido celebrado por prazo inferior a três anos, e não tendo sido excluída a sua renovação, o contrato irá renovar-se automaticamente sempre por períodos sucessivos de três anos, em face do prazo mínimo imperativo previsto na referida disposição legal.
10. Com a entrada em vigor da Lei n.º 12/2019 (decorre da alegações que o Recorrente incorre em lapso na indicação desta Lei, pretendendo referir-se à Lei 13/2019), de 12 de fevereiro, que teve como desígnio introduzir “medidas destinadas a corrigir situações de desequilíbrio entre arrendatários e senhorios, a reforçar a segurança e a estabilidade do arrendamento urbano e a proteger arrendatários em situação de especial fragilidade”.
11. As partes têm o direito de estipular prazos de renovação diferentes do prazo inicial do contrato, desde que por prazo não inferior a três anos, que corresponde a um limiar mínimo obrigatório.
12. Conforme resulta do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça aludido, é entendimento dominante que a lei permite às partes excluírem a renovação automática do contrato, mas de igual modo, impõe que “caso seja clausulada a renovação, esta tem como período mínimo uma renovação pelo período de 3 anos”.
13. Aplicando-se, pois, um prazo de renovação mínimo imperativo de três anos, quer em relação à primeira renovação do contrato, quer a renovações posteriores.
14. O legislador pretendeu estatuir um prazo inicial mínimo de 3 anos para contratos que prevejam o regime da renovação automática.
15. O disposto no artigo 1096.º, n.º 1 do Código Civil deverá ser interpretado no sentido de que consagra um prazo de renovação mínimo imperativo de três anos.
16. Tendo o contrato de arrendamento para habitação de prazo certo celebrado entre as partes se iniciado em 01 de outubro de 2015, renovou-se por três anos em 01 de outubro de 2018, tendo-se renovado por mais três anos em 01 de outubro de 2021 e finalmente por mais três anos até 01 de outubro de 2024.
17. Mas irá cessar em 30 de setembro de 2024, atenta a comunicação de oposição à renovação do arrendamento remetida pelos autores datada de 04 de maio de 2022.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Foi proferido despacho no qual se considerou o recurso tempestivo e legal e se admitiu o mesmo como sendo de apelação, com subida imediata, nos autos e com efeito devolutivo.
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Recebido o processo nesta Relação, emitiu-se despacho que teve o recurso como próprio, tempestivamente interposto e admitido com efeito e modo de subida adequados.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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Delimitação do objeto do recurso
Da análise das conclusões vertidas pelo Recorrente nas suas alegações, que versam sobre a decisão recorrida e que delimitam o objeto do recurso, estando o Tribunal impedido de conhecer de matérias não incluídas nessas conclusões, com exceção das que sejam de conhecimento oficioso, nos termos do previsto nos artigos 635º, nºs 4 e 5 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, decorre que o objeto do presente recurso está circunscrito à seguinte questão:
- Saber se a oposição à renovação do contrato de arrendamento comunicada pelos Autores/senhorios ao Réu/arrendatário através de carta registada com aviso de receção remetida em 4 de maio de 2022 foi válida e eficaz, determinando a extinção, por caducidade, do arrendamento, no dia 30 de setembro de 2022.
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II – FUNDAMENTAÇÃO Fundamentação de facto
É o seguinte o teor da decisão da matéria de facto constante do saneador-sentença recorrido e que no presente recurso não é impugnada:
Factos provados
1. Encontra-se registado a favor dos Autores a aquisição do prédio urbano sito na Rua ..., ..., casa ...3, freguesia ... e ..., composto por casa de um piso, anexos para garagem e logradouro, descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o n.º ...06 e inscrito na matriz predial urbano sob o artigo ...68.º.
2. A 05/10/2015, Autores e Réu outorgaram documento, que denominaram de “contrato de arrendamento de prazo certo”, com o seguinte teor: «(…) Entre si estabelecem o presente contrato de arrendamento para habitação de duração limitada, que tem por objeto a fração autónoma designada pela letra “…”, de que os primeiros outorgantes são legítimos donos e possuidores, correspondente ao … do prédio urbano sito em Rua ..., ..., ... freguesia ..., concelho ..., União Freguesias ..., ..., inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ...30 (…) e que se regulará pelos precisos termos das condições constantes das cláusulas seguintes: PRIMEIRA – O prazo de duração do arrendamento é de 1 ano, com início em 1-10-2015 e com termo em 30-09-2016. SEGUNDA – A renda anual é de Euros 3120 (três mil, cento e vinte euros), a pagar mensalmente em duodécimos de Euros 260 (duzentos sessenta euros), ao senhorio, ou ao seu representante legal, na respetiva residência, ou através de depósito ou transferência bancária a efetuar em conta numa instituição de crédito casa do senhorio, no primeiro dia do mês anterior a que respeitar. (…)».
3. A 04/05/2022, os Autores remeteram carta regista com aviso de receção ao Réu, sob o assunto “Oposição à renovação do contrato de arrendamento”, com o seguinte teor: «(…) Na qualidade de senhorios do prédio urbano sito à Rua .... Traseiras, ... ..., inscrito na matriz predial da União Freguesias ... e ... sob o art. ...30, de que V. Exa. é arrendatário, vimos pela presente comunicar-lhe a oposição à renovação do contrato de arrendamento urbano habitacional com prazo certo e referente ao arrendado supra identificado, tudo ao abrigo do disposto no art. 1097.º n.º 1 b) do Código Civil. Assim sendo, o referido contrato cessará os seus efeitos no dia 30 de setembro de 2022, data em que o arrendado deverá ser entregue livre de pessoas e bens. (…)».
4. A 14/07/2022, o réu remeteu carta registada aos autores, com o seguinte teor:
«(…) Considerando o exposto na Lei 13/2019 de 12 de fevereiro, destinada a corrigir os desequilíbrios contratuais entre senhorios e arrendatários, reforçando a segurança e a estabilidade do arrendamento urbano e proteger arrendatários em situação de especial fragilidade como é o meu caso. De acordo com o disposto no 1097.º n.º 3 do Código Civil, a oposição à primeira renovação do contrato, por parte do senhorio, apenas produz efeitos decorridos três anos da celebração do mesmo, mantendo-se o contrato em vigor até essa data. Acresce que, no seu termo, os contratos de arrendamento com prazo para habitação permanente se renovam automaticamente, por períodos sucessivos de igual duração ou, se esta for inferior, de três anos, em conformidade com o estipulado no número 1 do artigo 1096.º do Código Civil. O que significa que se o contrato de arrendamento foi celebrado por prazo inferior a três anos, e não foi excluída a renovação, o contrato se irá renovar automaticamente sempre por períodos sucessivos de três anos, em face do prazo mínimo imperativo previsto na referida disposição legal. Considerando o que acabo de referir o contrato de arrendamento que nos liga, manter-se-á em vigor até, pelo menos, 31 de agosto de 2024. (…)».
Não foram elencados factos não provados.
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Fundamentação de direito
Entre os Autores e o Réu foi celebrado um contrato de arrendamento urbano para fim habitacional com prazo certo, previsto nos artigos 1022º e ss. e em especial nos artigos 1064º e ss. e 1092º e ss., todos do Código Civil, qualificação contratual que as partes não colocam em causa e à qual o saneador-sentença recorrido aderiu.
O contrato de arrendamento urbano pode ser descrito como aquele mediante o qual uma das partes se obriga a proporcionar a outra o gozo temporário de um prédio urbano, no todo ou em parte, mediante retribuição.
Quanto à sua cessação, o artigo 1079º do Código Civil prevê que se verifique por acordo das partes, resolução, caducidade, denúncia ou outras causas previstas na lei.
No que respeita à caducidade são várias as causas que a determinam, atento o disposto no artigo 1051º do Código Civil, entre as quais, no que ao caso em análise interessa, o contrato de arrendamento caduca findo o prazo de duração contratual ou legalmente estipulado (alínea a) do citado preceito).
Relativamente à sua duração regem os artigos 1095º e ss. do Código Civil, atualmente na redação introduzida pela Lei nº 13/2019, de 12 de fevereiro, com início de vigência em 13 de fevereiro de 2019.
No caso vertente, resulta dos factos provados que as partes celebraram o contrato de arrendamento pelo prazo de duração de um ano, com início em 1 de outubro de 2015 e com termo em 30 de setembro de 2016, não tendo sido estipulado qualquer prazo de renovação.
Em 1 de outubro de 2015, data do início de vigência do identificado contrato de arrendamento, o artigo 1096º do Código Civil tinha a redação que lhe fora conferida pela Lei nº 31/2012, de 14 de agosto, que era a seguinte.
«Artigo 1096º Renovação automática 1 - Salvo estipulação em contrário, o contrato celebrado com prazo certo renova-se automaticamente no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração, sem prejuízo do disposto no número seguinte. 2 - Salvo estipulação em contrário, não há lugar a renovação automática nos contratos celebrados por prazo não superior a 30 dias. 3 - Qualquer das partes pode opor-se à renovação, nos termos dos artigos seguintes.»
O que equivale a dizer que à data da contratualização do arrendamento – 5 de outubro de 2015 –, por força da lei então vigente, a renovação do contrato teria que observar o prazo inicial de duração daquele, qual seja, um ano.
Porém, com a entrada em vigor da Lei nº13/2019, de 12 de fevereiro, o citado artigo 1096º, do Código Civil, passou a ter a seguinte redação:
«Artigo 1096º Renovação automática 1 - Salvo estipulação em contrário, o contrato celebrado com prazo certo renova-se automaticamente no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração ou de três anos se esta for inferior, sem prejuízo do disposto no número seguinte. 2 - Salvo estipulação em contrário, não há lugar a renovação automática nos contratos previstos n.º 3 do artigo anterior. 3 - Qualquer das partes pode opor-se à renovação, nos termos dos artigos seguintes.»
À luz desta nova redação o prazo de renovação mínimo no contrato de arrendamento para habitação com prazo certo, quando as partes nada estipulam quanto ao prazo de renovação, passou a ser de três anos. Dito de outro modo, resulta da atual redação do artigo 1096º, nº 1, do Código Civil que, inexistindo no contrato qualquer cláusula em sentido contrário, o mesmo renovar-se-á por período igual ao estipulado para a sua duração inicial, desde que este seja igual ou superior a três anos, ou renovar-se-á por três anos, quando a duração estipulada para o contrato for inferior.
Importa ainda atentar no disposto no artigo 1097º, do Código Civil, que, à data do início da vigência do contrato – 1 de outubro de 2015 –, tinha a seguinte redação, resultante da Lei nº 31/2012, de 14 de agosto:
«Artigo 1097º Oposição à renovação deduzida pelo senhorio 1 - O senhorio pode impedir a renovação automática do contrato mediante comunicação ao arrendatário com a antecedência mínima seguinte: a) 240 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a seis anos; b) 120 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a um ano e inferior a seis anos; c) 60 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a seis meses e inferior a um ano; d) Um terço do prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação, tratando-se de prazo inferior a seis meses. 2 - A antecedência a que se refere o número anterior reporta-se ao termo do prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação.»
Atualmente, por força da entrada em vigor da Lei nº13/2019, de 12 de fevereiro, esse artigo 1097º, do Código Civil, passou a ter a seguinte redação: «Artigo 1097º Oposição à renovação deduzida pelo senhorio 1 - O senhorio pode impedir a renovação automática do contrato mediante comunicação ao arrendatário com a antecedência mínima seguinte: a) 240 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a seis anos; b) 120 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a um ano e inferior a seis anos; c) 60 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a seis meses e inferior a um ano; d) Um terço do prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação, tratando-se de prazo inferior a seis meses. 2 - A antecedência a que se refere o número anterior reporta-se ao termo do prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação. 3 - A oposição à primeira renovação do contrato, por parte do senhorio, apenas produz efeitos decorridos três anos da celebração do mesmo, mantendo-se o contrato em vigor até essa data, sem prejuízo do disposto no número seguinte. 4 - Excetua-se do número anterior a necessidade de habitação pelo próprio ou pelos seus descendentes em 1.º grau, aplicando-se, com as devidas adaptações, o disposto no artigo 1102.º e nos nºs 1, 5 e 9 do artigo 1103º».
Resulta do disposto no atual nº3, do artigo 1097º, do Código Civil, que, sem prejuízo do disposto no nº4 desse preceito, a oposição à primeira renovação do contrato só produz efeitos decorridos três anos da celebração do contrato, o que significa que no caso de o contrato ter uma duração inferior a três anos e o senhorio quiser impedir a sua renovação através da oposição à renovação, a lei difere os efeitos de tal oposição para o momento em que decorram três anos desde a data da celebração do contrato. Note-se que este nº 3 do artigo 1097º do Código Civil regula a produção de efeitos da oposição à 1ª renovação do contrato, ou seja, uma situação em que, caso essa oposição seja válida, não chega sequer a haver qualquer renovação do contrato.
A referida Lei 13/2019, de 12 de fevereiro, aplica-se não apenas aos contratos futuros, mas (e também) aos contratos em curso, como decorre da regra geral do artigo 12º, nº2, 2ª parte, do Código Civil, por se tratar de lei que regula o conteúdo da relação jurídica do arrendamento, aplicando-se às relações de arrendamento já constituídas e que se mantêm, por se tratarem de contratos de execução duradoura, com ressalva, salvo exceção legal – art.º 12.º n.º 1 do Código Civil - dos efeitos já produzidos pelos factos que a lei visa regular – neste sentido, cf. Maria Olinda Garcia, in Alterações em matéria de Arrendamento Urbano introduzidas pela Lei nº12/2019 e pela Lei 13/2019, in Revista Julgar Online, março de 2019/25.
Importa ainda ter presente que sobre esta matéria do prazo de renovação dos arrendamentos habitacionais com prazo certo regista-se divergência de entendimentos, tanto na doutrina como na jurisprudência.
Como se pode ler no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 20 de Setembro de 2023, proferido no âmbito do processo nº 3966/21.3T8GDM.P1.S1, disponível in www.dgsi.pt, que em parte aqui se transcreve:
«-Uma tese propugna a integral supletividade das previsões normativas contidas no n.º 1 do art.º 1096.º do Código Civil, sem prejuízo das limitações impostas pelo art.º 1097.º n.º 3 do Código Civil. É a posição de Jorge Pinto Furtado (Comentário ao Regime do Arrendamento Urbano, Almedina, 3.ª edição, 2021, páginas 655 a 657): “Com a Reforma de 2012, tinha-se estabelecido, neste art. 1096-1, que, salvo estipulação contratual em contrário, o contrato de prazo certo renovava-se “no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração”. A Reforma de 2017 não aflorou este ponto, mas, com a Lei n.º 13/2019, veio estabelecer-se, pegando na redação de 2012, que, “salvo estipulação em contrário, o contrato celebrado com prazo certo renova-se automaticamente no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração ou de três anos se esta for inferior”. Limitou-se, pois, a acrescentar à frase “períodos sucessivos de igual duração” a expressão “ou de três anos se esta for inferior”. De realçar, que estamos aqui em presença de arrendamentos habitacionais; para os não habitacionais, rege o disposto no art. 1110. O que se determina no presente n.º 1, como se viu, é que o contrato de arrendamento urbano, com prazo certo, no termo da sua duração contratual, se renova, “salvo estipulação em contrário”, por períodos sucessivos de igual duração, ou de três anos quando essa duração for inferior. A ressalva é expressa, surgindo, soberana, a encabeçar o preceito”.
(…)
Já se pretendeu, no entanto, sem mais, que o preceito “diz que a renovação do contrato opera por um período mínimo de 3 anos”. Não cremos, porém, salvo o devido respeito, que a presente disposição, só por si, permita semelhante conclusão. Por este n.º 1 do artigo, e só por ele, a ressalva à cabeça da livre estipulação das partes poderia até abranger o próprio limite de três anos, previsto na sua parte final. Somente acontece, a nosso ver, que, sobre o tema, terá de atender-se ao disposto no art. 1097-3 que, desgarradamente embora, voltando a dispor sobre a oposição à renovação, determina uma importante limitação ao normativo do n.º 1 do presente artigo obrigando o intérprete a coordenar as duas disposições.
(…)
Ora, já se viu que o n.º 1 do presente artigo só dispõe para o silêncio contratual e, como no art. 1097-3 também não se estabelece qualquer dimensão para o ulterior período de renovação, em si, daí se seguirá, se bem nos parece, que, quando pretenda estabelecer-se renovação para um arrendamento habitacional de prazo certo terá de atribuir-se à própria duração desse contrato, pela aplicação conjugada dos dois preceitos, uma duração mínima de três anos. Cremos, por conseguinte e em conclusão poder, pois, validamente estabelecer-se, ao celebrar-se um contrato, que este terá, necessariamente, uma duração de três anos, prorrogando-se, no seu termo, por sucessivas renovações, de dois ou de um ano, quatro ou cinco – como, enfim, se pretender (…).” Embora a propósito do regime dos contratos de arrendamento urbano para fins não habitacionais, também Jéssica Rodrigues Ferreira (“Análise das principais alterações introduzidas pela Lei n.º 13/2019, de 12 de fevereiro, aos regimes da denúncia e oposição à renovação dos contratos de arrendamento urbano para fins não habitacionais”, in RED – Revista Electrónica de Direito, FDUP, fevereiro 2020, páginas 82 e 83) propugna a plena autonomia das partes na fixação do prazo de renovação do contrato: “A nova redação do art. 1096.º suscita várias dúvidas interpretativas, desde logo relacionadas com o alcance da expressão “salvo estipulação em contrário”. Reportar-se-á apenas à possibilidade de as partes afastarem a renovação automática do contrato, ou permitirá também a estipulação de um prazo de renovação diferente do aí previsto? Neste último caso, poderão as partes estipular um prazo inferior a cinco anos? Parece-nos que o legislador pretendeu que as partes fossem livres não apenas de afastar a renovação automática do contrato, mas também que fossem livres de, pretendendo que o contrato se renovasse automaticamente no seu termo, regular os termos em que essa mesma renovação ocorrerá, podendo estipular prazos diferentes – e menores – dos supletivamente fixados pela lei, e não, conforme poderia também interpretar-se da letra do preceito em análise – cuja redação pouco precisa gera estas dúvidas – um pacote de “pegar ou largar”, em que as partes estariam adstritas a optar entre contratos não renováveis ou, optando por um contrato automaticamente renovável no seu termo, com períodos sucessivos de renovação de duração obrigatoriamente igual à duração do contrato ou de cinco anos [tem-se aqui em vista o prazo mínimo previsto no art.º 1110.º n.º 2 do CC para os contratos não habitacionais, correspondente ao art.º 1096.º n.º 1 para os contratos habitacionais] se esta for inferior, pois ainda que a ratio subjacente a esta alteração legislativa tenha sido reforçar a estabilidade dos contratos, se o legislador deixou ao critério das partes o mais – optar por renovar ou não o contrato – também se deve entender que lhes permite o menos – optando por renovar o contrato, regular os termos dessa renovação.” Na mesma linha se insere a posição de André Mena Hüsgen (“As novas regras sobre a duração, denúncia e oposição à renovação do arrendamento urbano”, in Estudos de Arrendamento Urbano, vol. I, Universidade Católica Editora, Porto, 2020, páginas 86 e 87): “Ainda que a expressão «salvo estipulação em contrário» tenha sido deslocada para a parte inicial da norma, a redação atual não impossibilita a leitura de que tal salvaguarda deve também abranger o prazo mínimo de renovação de três anos, i.e., de que deve estar na possibilidade das partes estipular um prazo de renovação inferior. Na verdade, o prazo de três anos poderá ter exclusivamente como objectivo conferir proteção adicional aos arrendatários cujo contrato seja omisso em relação à duração do prazo de renovação. Sobretudo numa ótica de política legislativa, a proibição de prazos de renovação inferiores a três anos prejudicará os arrendatários que não pretendam manter o arrendamento por um período tão alargado, uma vez que só poderão denunciar o contrato após terem decorrido 16 meses, contados desde a data de renovação do contrato, nos termos do artigo 1098.º (3), alínea a) do CC.” Esta tese liberalizadora é seguida também por Edgar Alexandre Martins Valente (Arrendamento urbano – Comentário às Alterações Legislativas introduzidas ao regime vigente, Almedina, 2019, pág. 31) e por Isabel Rocha e Paulo Estima (Novo Regime do Arrendamento Urbano – Notas práticas e Jurisprudência, 5.ª edição, Porto Editora, 2019, pág. 286). Na jurisprudência, decidiu-se à luz desta interpretação da lei (caráter integralmente supletivo do disposto no n.º 1 do art.º 1096.º do CC, na sua redação atual), nos acórdãos seguintes: Relação de Lisboa, 17.3.2022, processo 8851/21.6T8LRS.L1-6; Relação de Lisboa, 10.01.2023, processo 1278/22.4YLPRT.L1-7; Relação do Porto, 23.3.2023, processo 3966/21.3T8GDM.P1 (o acórdão ora em revista); Relação de Lisboa, 27.4.2023, processo 1390/22.0YLPRT.L1-6 (todos, assim como os adiante mencionados, consultáveis em www.dgsi.pt). - Outra corrente entende que a lei impõe um limite mínimo, de três anos, à renovação do contrato, reduzindo-se a autonomia contratual das partes à possibilidade de arredamento da renovabilidade do contrato e à possibilidade de estipulação de prazos de renovação do contrato superiores a três anos. Na doutrina, neste sentido, vejam-se as palavras de Maria Olinda Garcia (“Alterações em matéria de Arrendamento Urbano introduzidas pela Lei n.º 12/2019 e pela Lei n.º 13/2019”, in Julgar Online, março de 2019, páginas 11 e 12): “Quanto à renovação do contrato, a nova redação do artigo 1096.º suscita alguma dificuldade interpretativa, nomeadamente quanto ao alcance da possibilidade de “estipulação em contrário” aí prevista. Por um lado, pode questionar-se se tal convenção poderá excluir a possibilidade de renovação do contrato ou apenas estabelecer um diferente prazo de renovação. Parece-nos que (na sequência do que já se verificava anteriormente) as partes poderão convencionar que o contrato não se renova no final do prazo inicial (o qual tem de ser de, pelo menos, um ano). O contrato caducará, assim, verificado esse termo. Mais delicada é a questão de saber se as partes podem estipular um prazo de renovação inferior a 3 anos (hipótese em que o prazo legal de 3 anos teria natureza supletiva). Atendendo ao segmento literal que diz que o contrato se renova “por períodos sucessivos de igual duração”, pareceria poder concluir-se que, se o período inicial pode ser de 1 ou de 2 anos, as partes também teriam liberdade para convencionar igual prazo de renovação. Todavia, ao estabelecer o prazo de 3 anos para a renovação, caso o prazo de renovação seja inferior, parece ser de concluir que o legislador estabeleceu imperativamente um prazo mínimo de renovação. Afigura-se, assim, que a liberdade das partes só terá autónomo alcance normativo se o prazo de renovação estipulado for superior a 3 anos. Conjugando esta disposição com o teor do artigo 1097.º, n.º 3, que impede que a oposição à renovação, por iniciativa do senhorio, opere antes de decorrerem 3 anos de duração do contrato, fica-se com a ideia de que o legislador pretende que o contrato tenha, efetivamente, uma vigência mínima de 3 anos (se for essa a vontade do arrendatário). Assim, o contrato só não terá duração mínima de 3 anos se o arrendatário se opuser à renovação do contrato no final do primeiro ou do segundo ano de vigência. No final destes períodos (tratando-se de contrato celebrado por 1 ano), o senhorio não terá direito de oposição à renovação. Tal direito extintivo cabe, assim, exclusivamente ao arrendatário antes de o contrato atingir 3 anos de vigência”. Na mesma senda seguem Rui Paulo Coutinho de Mascarenhas Ataíde e António Barroso Ramalho Rodrigues (“Denúncia e oposição à renovação do contrato de arrendamento urbano”, in Revista de Direito Civil, ano IV (2019), n.º 2, pág. 303: “A inovação da Lei n.º 13/2019, de 12 de Fevereiro, consistiu na consagração da renovação automática pelo período mínimo de 3 anos, independentemente de duração inicial inferior.
(…)
A renovação automática (de natureza supletiva) pelo período mínimo de 3 anos (período mínimo imperativo de renovação) recupera a regra do RAU de 1990, reiterada no NRAU de 2006)”. Também no mesmo sentido, vide Ana Isabel Afonso (“Sobre as mais recentes alterações legislativas ao regime do arrendamento urbano”, in Estudos de Arrendamento Urbano, vol. I, Universidade Católica Editora, Porto, 2020, páginas 26 e 27): “A entender-se que o prazo é supletivo – conforme inculca a estrutura do sistema e a ressalva inicial da norma -, não vemos efeito útil na previsão de um mínimo de três anos de renovação automática em vez da habitual renovação por períodos sucessivos de igual duração, habitualmente prevista e correspondente à fórmula usual. O «salvo estipulação em contrário» limita-se, quanto a nós, à admissibilidade de previsão de duração indeterminada do contrato (a norma aplica-se apenas aos contratos celebrados com prazo certo) e ao poder não excluído (possivelmente de modo inadvertido) por lei de se convencionar a caducidade do contrato no fim do prazo”; no mesmo sentido, cfr. a mesma autora em “O prazo mínimo de renovação do contrato de arrendamento urbano é imperativo ou supletivo?”, comentário ao acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17.3.2022, Proc. 8851/21.6T(LRS.L1-6, in Cadernos de Direito Privado, 78, abril-junho 2022, p. 53 e seguintes). Esta interpretação do n.º 1 do art.º 1096.º do Código Civil, no sentido da imperatividade de um prazo mínimo de renovação do contrato (três anos) é seguida também por José António de França Pitão e Gustavo França Pitão (Arrendamento urbano anotado, Quid Juris, 3.ª edição, 2019, p. 390), Márcia Passos (“A duração nos contratos de arrendamento com prazo certo”, in Boletim da Ordem dos Advogados, Setembro de 2019, pág. 21), Manteigas Martins, Carlos Nabais, José M. Raimundo (Novo regime do arrendamento urbano, comentários e breves notas, Vida Económica, 2019, pág. 183), Luís Menezes Leitão (Arrendamento urbano, 11.ª edição, 2022, Almedina, p. 179). Tem acolhimento em parte da jurisprudência emitida pelas Relações: vide acórdão da Relação de Guimarães, de 11.02.2021, processo 1423/20.4T8GMR.G1; acórdão da Relação de Guimarães, de 08.04.2021, processo 795/20.5T8VNF.G1; acórdão da Relação de Évora, de 10.11.2022, processo 983/22.OYLPRT.E1; acórdão da Relação de Évora, de 10.11.2022, processo 126/21.7T8ABF.E1; acórdão da Relação de Évora, de 25.01.2023, processo 3934/21.5T8STB.E1 (com um voto de vencido); acórdão da Relação do Porto, de 23.3.2023, processo 1824/22.3T8VCT.G1; acórdão da Relação do Porto, de 04.05.2023, processo 1598/22.8YLPRT.P1. Também o STJ, no acórdão proferido em 17.01.2023, processo 7135/20.1T8LSB.L1.S1 (relator: Pedro de Lima Gonçalves, coadjuvado pelos Exm.ºs adjuntos, Maria João Vaz Tomé e António Magalhães), propendeu para esta tese: “O artigo 1096.º do Código Civil, conforme é entendimento dominante na doutrina, não tem carácter imperativo, pelo que é permitido às partes excluírem a renovação automática. Impõe imperativamente, porém, que, caso seja clausulada a renovação, esta tem como período mínimo uma renovação pelo período de 3 anos. Ou seja, o legislador permite às partes que convencionem um contrato de arrendamento urbano para habitação pelo período de um ou dois anos, não renovável. Mas, caso seja convencionada uma cláusula de renovação automática, terá de obedecer ao disposto neste normativo, ou seja, o contrato sofre uma renovação automática de 3 anos”.
(…)
Cabe tomar posição nesta controvérsia. Tudo ponderado, cremos, com o máximo respeito por quem propugna a posição contrária, que a interpretação correta da solução legal é a da imposição, quanto ao prazo de renovação de contratos de arrendamento habitacional com prazo certo, do limite mínimo de três anos. Só essa interpretação se harmoniza com a norma imperativa contida no n.º 3 do art.º 1097.º do CC, aditada pela Lei n.º 13/2019. Não faria sentido permitir prazos contratuais de renovação de um ano, para contratos com a duração inicial de um ano, para depois se impor uma primeira renovação compulsória do contrato a fim de se garantir uma duração mínima de três anos desse contrato. O n.º 3 do art.º 1097.º obsta a que, estando um contrato de arrendamento renovável, com a duração inicial de um ano, sujeito à renovação mínima de três anos, cesse antes desse “tempo”, por oposição do senhorio à renovação. Este regime está em linha com o objetivo anunciado no art.º 1.º da Lei n.º 13/2019, o de “reforçar a segurança e a estabilidade do arrendamento urbano”. A esta luz, poderá acompanhar-se a estranheza, supramencionada, por se possibilitar a celebração de contratos de arrendamento habitacionais não renováveis, por um prazo mínimo tão curto, como o é um ano. E também se admite que tal regime poderá ter consequências perniciosas, como o serão o estímulo à celebração de arrendamentos curtos não renováveis. Mas o n.º 3 do art.º 1097.º do CC aí está, dando consistência ao disposto no art.º 1096.º n.º 3, norma esta que, tendo em conta a totalidade da sua redação (elemento literal da interpretação das leis), conjugada com o disposto no n.º 3 do art.º 1097.º (elemento sistemático da interpretação da lei), à luz do objetivo tido em vista com a publicação da Lei n.º 13/2019 (elemento teleológico ou racional da interpretação das leis) e os já mencionados antecedentes históricos nesta matéria (elemento histórico da interpretação das leis), segundo a melhor interpretação (art.º 9.º do CC), por um lado possibilita a contratualização não renovável de arrendamentos habitacionais e, por outro lado, quando se perfila um arrendamento habitacional renovável, impõe (em benefício do arrendatário) uma expetativa mínima de três anos para a sua renovação.»
Pelos argumentos plasmados no Acórdão ora transcrito, aos quais se adere, conclui-se pela imperatividade do limite mínimo de três anos do prazo de renovação de contratos de arrendamento habitacional com prazo certo previsto no nº 1 do artigo 1096º, do Código Civil.
Revertendo ao caso dos autos, sendo o contrato de arrendamento celebrado entre os Autores e o Réu um contrato de execução continuada, a nova versão dada aos artigos 1095º e ss. do Código Civil pela Lei nº 13/2019, de 12 de fevereiro, é-lhe aplicável, por força do disposto nos artigos 14º deste diploma legal e do artigo 12º, nº2, do Código Civil, nos termos do qual quando a lei «dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor». Assim, as regras imperativas da Lei n.º 13/2019 aplicar-se-ão aos contratos já celebrados ao tempo da sua entrada em vigor, com ressalva, salvo exceção legal – art.º 12.º n.º 1 do Código Civil - dos efeitos já produzidos pelos factos que a lei visa regular.
Tendo o contrato em análise a duração inicial de um ano, com início em 1 de outubro de 2015 e termo em 30 de setembro de 2016, a partir da entrada em vigor da Lei nº 13/2019, que ocorreu em 13 de fevereiro de 2019 (artigo 16º da Lei), o prazo de renovação aplicável passou a ser o determinado pela nova redação do artigo 1096º, nº1, do Código Civil. Assim, o prazo de renovação de um ano, que resultava da redação anterior do artigo 1096º, nº1, do Código Civil, deverá ser considerado alargado para três anos. Vale isto por dizer que a primeira renovação do contrato celebrado entre os Autores e o Réu ocorreu em 1 de outubro de 2016. Note-se que não colhe aqui a tese do Recorrente segundo a qual a primeira renovação do contrato ocorreu em 1 de outubro de 2018, pois que a renovação só ocorre depois do prazo de vigência inicial do contrato, ou, como estipulou o legislador no nº 1 do artigo 1096º, do Código Civil, o contrato renova-se “no seu termo”. Antes de decorrido esse prazo não faz qualquer sentido falar-se em renovação do contrato, prazo esse que, no caso, as partes fixaram em um ano. Por outro lado, também não colhe a argumentação do Recorrente quando perfilha o entendimento segundo o qual o contrato, por força da atual redação do artigo 1097º, nº3, do Código Civil, passou a ter uma duração inicial de três anos. Esta norma não fixa o prazo do contrato de arrendamento, prazo esse que se mostra previsto no artigo 1095º do Código Civil, nos termos do qual não pode ser inferior a um nem superior a 30 anos. Em síntese, o nº3, do artigo 1097º, do Código Civil, não fixa um prazo inicial de duração mínima do contrato de arrendamento para fins habitacionais sujeito a prazo certo, antes regula os efeitos da oposição à primeira renovação desse contrato, que apenas se produzirão decorridos três anos da celebração do mesmo. Consequentemente, nada obsta a que se considere válida e eficaz a cláusula contratual que fixa o prazo de duração do contrato de arrendamento em um ano, operando a primeira renovação no termo final daquele prazo e, as subsequentes, no termo final de cada período de renovação (conforme previsto no n.º 1 do artigo 1096.º do Código Civil).
E o que dizer quanto às renovações que se seguem à primeira renovação? Entendemos, de igual modo, que ser-lhes-á de aplicar o prazo alargado de três anos, porquanto, atento o disposto no atual artigo 1096º, nº1, do Código Civil, não havendo estipulação contratual quanto ao prazo de renovação – como sucede no caso em análise – o contrato celebrado com prazo certo renova-se automaticamente no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração ou de três anos se esta for inferior.
Em face de tais considerações, é legítimo concluir que tendo o contrato em análise a duração inicial de um ano, com início em 1 de outubro de 2015 e termo em 30 de setembro de 2016, em 1 de outubro de 2016 renovou-se por três anos até 30 de setembro de 2019 e em 1 de outubro de 2019 renovou-se por mais 3 anos até 30 de setembro de 2022.
Decorre do disposto no artigo 1097º, nº1, alínea b), do Código Civil, sob a epígrafe “Oposição à renovação deduzida pelo senhorio” que o senhorio pode impedir a renovação automática do contrato mediante comunicação ao arrendatário com a antecedência mínima de 120 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a um ano e inferior a seis anos.
Destarte, a oposição à terceira renovação (que ocorreria em 1 de outubro de 2022), comunicada pelos Autores ao Réu por carta de 4 de maio de 2022, produziu efeitos, visto ter sido efetuada com observância da antecedência exigida pela referida alínea b), do artigo 1097º, do Código Civil, obstando, assim, à renovação, por mais três anos, do contrato de arrendamento, que, por tal motivo, cessou os seus efeitos a 30 de setembro de 2022.
Do que vem de se expor resulta a improcedência da apelação e consequente manutenção do decidido no saneador-sentença apelado.
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Sumário (da exclusiva responsabilidade da Relatora – artigo 663º, nº7, do Código de Processo Civil)
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III – DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desta 5ª Secção do Tribunal da Relação do Porto em julgar a apelação improcedente, confirmando integralmente o saneador-sentença recorrido.
Custas pelo Réu/Apelante (artigo 527º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil), sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia.
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Porto, 23 de setembro de 2024
Os Juízes Desembargadores
Teresa Pinto da Silva
Carla Fraga Torres
Jorge Martins Ribeiro