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EMBARGO DE OBRA NOVA
CASO JULGADO
PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO FORMAL
Sumário
I - O caso julgado material é suscetível de se impor por via da exceção do caso julgado, que impede a reapreciação da relação jurídica material definida por sentença transitada, e por via da autoridade do caso julgado, que vincula ao acatamento noutras decisões que venham a ser proferidas do que ali ficou definido. II - Tendo ficado definido por sentença transitada em julgado o direito de propriedade do embargado sobre o prédio em que pretende efetuar demolições, em cuja execução a embargante foi condenada, inexistindo dúvida de que está em causa o mesmo imóvel e as mesmas construções, não existe fundamento para a prossecução dos embargos de obra nova. III - O princípio da adequação consente que o juiz decida conhecer do mérito da causa antes do início da produção de prova por se convencer de que, independentemente da prova que vier a ser produzida, o procedimento sempre terá que ser julgado improcedente.
Texto Integral
Proc. 472/24.8T8PRD.P1
Sumário
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Relatora: Teresa Maria Fonseca
1.ª adjunta: Maria de Fátima Andrade
2.ª adjunta: Maria Fernanda Almeida
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I - Relatório
AA intentou procedimento cautelar de ratificação de embargo extrajudicial de obra nova contra BB, na qualidade de acompanhante do maior CC.
Alega:
- que é dona e legítima proprietária do prédio rústico, com a área de 631,00m2, inscrito a seu favor na matriz sob o artigo ..., sito no lugar ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ..., da freguesia ...;
- que o prédio confronta a norte com CC e outro, a nascente com DD e herdeiros, a poente com caminho e a sul com EE;
- que o prédio foi adquirido por escritura pública de 8 de fevereiro 2002 pelo pai da requerente que doou a sua filha por escritura pública de 2 de outubro de 2006;
- que a requerente, por si e seus antecessores, há mais de 20 anos, que planta, colhe frutos, paga imposto e nele tem edificado muros, portão de ferro, arrumos e anexos, destinados à criação de animais e estaleiro da construção civil;
- utilização que faz, a requerente e toda a sua família, à vista de toda a gente, com o conhecimento de todas as pessoas que aí residem e nomeadamente da requerida e dos seus antecessores, sem oposição de quem quer que seja, ininterruptamente, convicta de estar a exercer um direito próprio, sem prejudicar ou lesar direitos alheios, em tudo se comportando como proprietário;
- o que faziam já os seus pais, antecessores na posse e propriedade do referido imóvel;
- o que faziam e fazem de forma pública, pacífica e sem oposição de quem quer que seja;
- em 20-4-2009 adquiriu por documento particular ao ora requerido 500m2 de terreno a desanexar do artigo rústico ...- ..., propriedade deste, confinante com o prédio identificado no item 1 do presente articulado;
- porque adquiriu sem título próprio e suficiente esses 500m2 de terreno veio o requerido requerer a restituição desta área de terreno;
- como essa parcela de terreno não foi voluntariamente entregue ao requerido, foi exigida a sua entrega através do proc. 3819/15.4T8LOU Juiz 1;
- o requerido pretende tomar posse do prédio propriedade exclusiva da requerente e identificado em 1;
- tendo no passado dia 12 de fevereiro 2024, às 15h e 15m, entrado com uma máquina retroescavadora no terreno da requerente, artigo ... rústico, para demolir alpendre, anexos, cultura, muros e portão, tendo para o efeito abalroado com a referida máquina, o carro da irmã da requerente, que se encontrava estacionado diante do portão e muro cuja destruição pretende fazer, dando assim inicio à obra nova demolição;
- as obras consistiam na destruição do muro de pedra, portão e todas as construções existentes no prédio da requerente, destruição essa que lhe causará prejuízos avultados, incomensuráveis e de difícil e/ou impossível de reparação;
- obras essas que eram executadas, segundo ordem e instrução da requerida, pelo empreiteiro Sr. FF e dois funcionários, os quais se recusaram a identificar e nomeadamente acatar ordem extrajudicial de embargo, apenas tendo aceite após deslocação da GNR ao local;
- tendo o supra referido empreiteiro ameaçado regressar ao local e avançar para a demolição;
- a obra de demolição foi suspensa em virtude de embargo extrajudicial efetuado pela mandatária do requerente com poderes para tal;
- a continuação da demolição do muro, anexos, alpendre e culturas, causa à requerente danos insuscetíveis de reparação, em virtude de existirem no prédio culturas, árvores de fruto e criação de animais que morrerão com tal ato;
- dada a urgência da suspensão da continuação das obras de demolição a mandatária do requerente, em 12 de fevereiro 2024, cerca das 16h30m, deslocou-se ao local da obra e na presença de duas testemunhas - GG e HH, notificou em substituição do dono da obra o construtor responsável pela obra - FF e dois funcionários do mesmo, para suspender imediatamente a execução desta;
- ordem que estes inicialmente não acataram, mas após a deslocação da GNR ao local, acabaram por observar, tendo inclusivamente retirado a máquina retroescavadora do local;
- o recurso a este procedimento cautelar visa a ratificação judicial do embargo que efetuou.
Conclui pedindo que seja ratificado o embargo extrajudicial e seja reconhecido o direito e ordenada a restituição à requerente da posse do prédio.
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O requerido, na pessoa da sua representante legal, sua acompanhante, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 366.º/1/2 e 5 do C.P.C., deduziu oposição. Pediu que a providência seja julgada improcedente, por infundada, e por o direito se mostrar caducado.
Alegou nos termos que se seguem:
- a requerente pretende a ratificação de embargo de obra nova, limitando-se a alegar superficialmente factos que poderiam estribar o seu pedido, mas que são falsos, omitindo ao tribunal de que obra se trata, ou seja, omite a decisão judicial que está na base dos atos praticados pelo exequente;
- em 2014, o requerido intentou ação declarativa de condenação contra a requerente e II, alegando ser o proprietário do prédio rústico denominado ... ou ..., sito no lugar ..., freguesia ..., concelho de Paredes, inscrito na respetiva matriz rústica sob os artºs. ... e ... e descrito na Conservatória do Registo Predial do mesmo concelho sob o nº ... (antiga descrição nº ... do Livro nº ...), a confrontar do Norte com herdeiros de JJ, do Sul com caminho, do Nascente e Poente com a estrada, com a área total de 4.300,18 m2;
- com a petição inicial, a exequente juntou o levantamento topográfico do prédio em questão, identificando com rigor a delimitação e a área a que corresponde cada um dos artigos matriciais que o compõe;
- por si e antepossuidores, o referido CC está na posse daquele seu prédio há mais de 20, 30 e mais anos, agricultando-o, fazendo melhoramentos, pagando as respetivas contribuições, usufruindo de todas as suas utilidades, ininterruptamente, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja, com a convicção de ser o seu verdadeiro dono com exclusão de outrem.”;
- que “em meados de 2009, os RR., agindo concertadamente, invadiram o descrito prédio do A. e nele realizaram as seguintes obras:
1) na parte poente do aludido prédio edificaram um imóvel de razoáveis dimensões;
2) edificaram um muro no sentido sul-norte, aparentemente para isolar a referida edificação da restante parte do prédio, muro esse que vem assinalado no desenho de fls. 30 com um duplo traço a cor preta;
3) terraplanaram todo o prédio, destruindo e apropriando-se da vegetação que nele existia;
4) plantaram ao longo das extremas norte e sul do dito prédio, no sentido poente-nascente, vários arbustos, aparentemente para simularem uma situação de posse;
5) e fizeram ao longo do prédio depósitos de resíduos vários, aparentemente com o mesmo propósito.
- os factos alegados foram julgados provados na sentença proferida, em que, além do mais, se lê: “no que tange à titularidade do direito de propriedade, verifica-se, sem margem para dúvidas, que o prédio identificado em C) dos factos provados é pertença do A.. Com efeito, resultou provado que da respetiva certidão da Conservatória do Registo Predial resulta registada, desde 02/09/1965, a favor do A., a aquisição do prédio identificado em C) dos factos provados, inscrito na respetiva matriz predial sob os nºs. ... e ....”, reforçando ainda que “Da factualidade dada como provada, retira-se efetivamente que o prédio identificado em C) dos factos assentes está na posse do A. e seus antepossuidores há mais de 30 anos, agricultando-o, fazendo melhoramentos, pagando as respetivas contribuições, usufruindo de todas as suas utilidades, ininterruptamente, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja, com a convicção de ser o seu verdadeiro dono com exclusão de outrem. Sendo certo que tal posse foi exercida de boa fé. Assim, e nos termos do disposto nos artigos 1251º, 1287º e 1296º, verificou-se também o preenchimento dos pressupostos necessários à aquisição do prédio, por parte do A., por usucapião”;
- desde então que a requerente tudo faz para se eximir ao cumprimento da decisão judicial transitada em julgado;
- desde 2015 que corre termos no Juízo de Execução de Lousada, Juiz 1, proc. 3819/15.4T8LOU, a execução da decisão judicial condenatória, em que o requerido requer a execução para prestação de facto;
- nesses autos, não foi deduzida oposição, mas foram deduzidos embargos de terceiro (A), julgados extintos por inutilidade superveniente, oposição à penhora pela executada (B), indeferida por falta de legitimidade, e oposição à penhora pelo cônjuge da executada (C), que desistiu do pedido deduzido;
- em 2019, a requerente e marido requereram inventário para separação de meações, que correu termos no cartório notarial da Dr.ª KK, proc. ..., conseguindo a suspensão dos autos de execução até ao início de 2023;
- nunca a aqui requerente veio pôr em crise a configuração do terreno naqueles autos, objeto da prestação de facto requerida;
- apenas em requerimento apresentado em 27-6-2023, e depois de ver determinado o prosseguimento dos autos para entrega do terreno ocupado, veio a aqui requerente apresentar uma versão fantasiosa da decisão judicial dada à execução, considerando que apenas havia sido requerida a entrega de uma área de 550 m2 pertencente ao artigo 514ºR, e alegar que lhe estaria a ser exigida a entrega de um terreno da sua propriedade, requerendo a suspensão daquela execução;
- nessa altura, alegou ter intentado procedimento cautelar comum para reconhecimento dos limites da área de terreno que compõe o artigo ...... da freguesia ..., de que alega ser proprietária, identificando que essa providência cautelar comum corria termos no Juízo Local Cível de Paredes, Juiz 1, proc. 1357/23.0T8PRD;
- nesse mesmo requerimento, declara obrigar-se à entrega dos 550m2, mas apenas em setembro desse ano, por ter procedido ao cultivo nessa área de terreno, entendendo que a entrega antes desse momento causaria um “prejuízo incomensuravelmente maior à executada do que à exequente”, exequente que mantinha o seu terreno indevidamente ocupado pela executada há 9 anos;
- o requerimento de 27.06.23 foi decidido por despacho, proferido em 13.10.23, em que se afirma o seguinte: “antes de mais, diremos que a presente execução está pendente desde 2015 e executa uma sentença de 2014. Tiveram estes autos incidentes de embargos de terceiros e dois de oposição à penhora que se mostram decididos e transitados em julgado. Afigura-se-nos que a executada apenas propôs a providência cautelar pelo facto de estes autos terem chegado finalmente à fase de execução efetiva com a remoção de cadeados e demolição de muros”;
- conclui esse despacho indeferindo a suspensão da execução que havia sido requerida, uma vez que “no caso em apreço, a definição de limites da propriedade da Executada nunca será causa de impossibilidade da lide destes autos pois a sentença exequenda condenou a executada a demolir o imóvel que edificaram na parte poente do prédio do A. referido em G.1) dos factos provados, a demolir o muro que edificaram no mesmo prédio, atravessando-o no sentido sul-norte, referido em G.2) dos factos provados e a arrancar os arbustos que plantaram no dito prédio ao longo das extremas Norte e Sul, no sentido Poente Nascente, referidos em G.4) dos factos provados e a retirar do dito prédio os escombros resultantes das demolições referidas supra e os arbustos após o seu arranque e os resíduos referidos em G.5) dos factos provados e a reporem o prédio no estado em que se encontrava antes da atuação dos RR.. É assim evidente que as demolições ordenadas foram na parte poente do prédio do referido em G.1) dos factos provados, ou seja, na propriedade do Exequente, pelo que a definições de limites não tem a virtualidade de alterar a propriedade do exequente sob pena de ocorrer contradição de julgados.”;
- a providência cautelar que correu termos neste juízo, com o n.º 1357/23.0T8PRD, foi indeferida liminarmente, ainda que a requerente tenha omitido naqueles autos que a decisão proferida na ação declarativa reconhecia os limites, configuração e área descritas em levantamento topográfico junto com a petição inicial.
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Por despacho de 13.05.2024, a requerente foi convidada a “(…) ao abrigo das disposições conjugadas dos arts.6º, 7º e 8º, do C.P.C., a fim de se evitarem condenações em litigância de má fé e atento o teor da oposição deduzida, nomeadamente e no que agora nos interessa, a alegação de que a Requerente, na prática, está a tentar embargar uma obra que corresponde à execução de uma decisão judicial transitada em julgado, limitando-se a atuação do Requerido à execução dos trabalhos nos quais a Requerente foi condenada a realizar, mostrando-se o Requerido respaldado pela decisão judicial condenatória e pela panóplia de decisões proferidas no âmbito da execução para prestação de facto - (…) para, em 10 dias, vir aos autos dizer/requerer o que tiver por conveniente, sendo certo que o Tribunal não desconhece as decisões já proferidas nos procedimentos cautelares anteriormente intentados, tendo até um deles sido proferido pela aqui signatária.”
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A requerente respondeu ao convite, alegando:
- não estar de má fé e que usará de todos os meios legais e processuais para defender o seu direito de propriedade e posse sobre o artigo ... rústico, da freguesia ...;
- tendo para tanto dado já entrada de ação de reconhecimento de propriedade, que corre termos nesse Tribunal e juízo sob proc. 1273/24.9T8PRD-J1, ação essa que instruiu com escritura de compra, do artigo ... rústico da freguesia ..., certidão matricial e registo predial;
- a sua propriedade exclusiva do artigo ... rústico foi já dada como provada no procedimento cautelar de restituição provisória de posse que corre termos nesse Tribunal sob proc. 246/24.6T8PRD-J2;
- que existe erro quanto à identificação e delimitação dos prédios por parte da recorrida, uma vez que os prédios em causa são confinantes e resulta provado nos autos que o prédio da requerente confronta a norte com CC;
- que o prédio identificado é propriedade exclusiva, titulada e registada da requerente;
- que não existe sobreposição de áreas e não é identificado, alegado ou peticionado no processo executivo para prestação de facto, em que a aqui requerida figura como exequente;
- nesse processo executivo é peticionada a entrega de 500m2 de área que pertence ao artigo ... rústico da freguesia ..., confinante com o artigo ... da requerente;
- quer na sentença que constitui título executivo dado à execução, quer no processo executivo (proc. 3819/15.4T8LOU-J1), nenhuma referência se faz, alega e/ou peticiona, a entrega do prédio ... R, propriedade titulada e registada da recorrente.
- os 500m2 cuja entrega a exequente requer na execução supra identificada foram já entregues à exequente, conforme auto de entrega celebrado pelo A.E. em 29-1-2024;
- a requerente apenas embargou a destruição do muro de vedação do artigo ..., rústico, da freguesia ..., do qual é dona e legítima proprietária.
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Foi designada data para a realização de audiência final, em que houve lugar a debate com os mandatários das partes. Tendo a Mma. Juiz concluído ser desnecessária a inquirição de testemunhas, determinou que os autos lhe fossem conclusos a fim de proferir decisão, sob pena de violação do princípio da economia processual vertido no art.º 130.º do C.P.C..
Foi proferida decisão que indeferiu o procedimento.
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Inconformada, a requerente interpôs o presente recurso, que rematou com as conclusões que em seguida se transcrevem.
A. A M.ma Juíz a quo não efetuou julgamento e por conseguinte não efetuou a produção de prova, nem atentou à prova documentalmente produzida do direito de propriedade da requerente, a qual é clara e inequívoca.
B. O direito de propriedade da requerente existe porque documentalmente provado por escritura, sendo por isso titulado e encontra-se registado e inscrito na matriz.
C. Sendo a prova do direito de propriedade da requerente e do prejuízo que lhe causa a obra de demolição de uma casa no seu prédio construído factos bastantes para o deferimento da providência requerida.
No entanto,
D. Proferiu a M.ma Juiz a quo uma decisão de indeferimento do procedimento cautelar que carece de fundamentação legal e factual.
E. Assim sendo, deverão V. Exas. declarar que carece de fundamento factual e legal a decisão de indeferimento do presente procedimento cautelar proferido por sentença e determinar a nulidade da mesma, devendo a Mma. Juiz a quo proceder a julgamento da presente ação e proferir decisão fundamentada.
Termos em que, invocando-se o Douto suprimento desse Venerando Tribunal, deverá revogar-se a decisão recorrida.
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II - Questões a dirimir:
a - se a decisão é nula por falta de fundamentação de facto e de direito;
b - se existe matéria controvertida, passível de produção de prova, que possa infletir o sentido da decisão de indeferimento proferida e que justifique a respetiva revogação, assinaladamente a prova de que o prédio em que o requerido pretende proceder a demolições é pertença da requerente.
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III - Fundamentação de facto, enunciada com base no presente processo e no proc. que com o n.º 1357/23.0T8PRD correu termos no mesmo juízo local cível, nomeadamente, os seguintes documentos - sentença proferida nos autos que com o n.º 1551/14.5TBPRD, correram termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este - Paredes - Instância Local - Secção Cível - J2, transitada em julgado; requerimento executivo para prestação de facto, nos autos de execução n.º 3819/15.4T8LOU, que corre termos no juízo de execução de Lousada - juiz 1, para além de quanto emerge do relatório.
1 - Por sentença proferida nos autos que com o n.º 1551/14.5TBPRD, correram termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este - Paredes - Instância Local - Secção Cível - J2, transitada em julgado, foi reconhecido o direito de propriedade do requerido sobre o prédio rústico denominado ... ou ..., sito no lugar ..., freguesia ..., concelho de Paredes, inscrito na respetiva matriz rústica sob os artigos ... e ... e descrito na C.R.P do mesmo concelho, sob o nº ... (antiga descrição nº ... do Livro nº ...) - cf. fls. 54vº a 58vº.
2 - Na sentença referida foram a aqui requerente e II condenados a demolirem o imóvel que edificaram na parte poente do prédio supra referido (do aqui requerido); a demolirem o muro que edificaram no mesmo prédio, atravessando-o no sentido sul-norte; a arrancarem os arbustos que plantaram no dito prédio ao longo das estremas norte e sul, no sentido poente - nascente; a retirarem do dito prédio os escombros resultantes das demolições referidas supra e os arbustos após o seu arranque e os resíduos e a reporem o prédio no estado em que se encontrava antes da atuação dos RR. - cf. fls. 54vº a 58vº.
3 - O aqui requerido intentou execução para prestação de tais factos.
4 - Conforme doc. n.º 3 junto com a oposição - cf. fls. 59 a 60 vº -, em requerimento apresentado em 27-6-2023, decorridos 9 anos sobre o início daqueles autos, veio a requerente apresentar um entendimento da decisão judicial dada à execução, alegando que apenas havia sido requerida a entrega de uma área de 550 m2 pertencente ao artigo 514ºR, e alegando que lhe estaria a ser exigida a entrega de um terreno de sua propriedade, requerendo a suspensão daquela execução; mais alegou ter intentado procedimento cautelar comum para reconhecimento dos limites da área de terreno que compõe o artigo 512ºR da freguesia ..., de que alega ser proprietária - providência cautelar comum essa que correu termos neste Juízo Local Cível de Paredes, Juiz 1, P. 1357/23.0T8PRD.
5 - O supra referido requerimento da aqui requerente e ali executada foi decidido na execução, por despacho, proferido em 13-10-23 - cfr. fls.61 e 61vº, no qual se encontra exarado: “antes de mais diremos que a presente execução está pendente desde 2015 e executa uma sentença de 2014. Tiveram estes autos incidentes de embargos de terceiros e dois de oposição à penhora que se mostram decididos e transitados em julgado. Afigura-se-nos que a executada apenas propôs a prov. cautelar pelo facto de estes autos terem chegado finalmente à fase de execução efetiva com a remoção de cadeados e demolição de muros.”.
6 - O despacho referido conclui indeferindo a requerida suspensão da execução, sustentando que “no caso em apreço, a definição de limites da propriedade da Executada nunca será causa de impossibilidade da lide destes autos pois a sentença exequenda condenou a executada a demolir o imóvel que edificaram na parte poente do prédio do A. referido em G.1) dos factos provados, a demolir o muro que edificaram no mesmo prédio, atravessando-o no sentido sul-norte, referido em G.2) dos factos provados e a arrancar os arbustos que plantaram no dito prédio ao longo das extremas Norte e Sul, no sentido Poente Nascente, referidos em G.4) dos factos provados e a retirar do dito prédio os escombros resultantes das demolições referidas supra e os arbustos após o seu arranque e os resíduos referidos em G.5) dos factos provados e a reporem o prédio no estado em que se encontrava antes da atuação dos RR.. É assim evidente que as demolições ordenadas foram na parte poente do prédio do referido em G.1) dos factos provados ou seja, na propriedade do Exequente pelo que a definições de limites não tem a virtualidade de alterar a propriedade do exequente sob pena de ocorrer contradição de julgados.”
7 - A providência cautelar que correu termos no juízo com o n.º 1357/23.0T8PRD foi liminarmente indeferida.
8 - Os factos alegados no requerimento inicial nos presentes autos e então ocorridos foram alegados nos autos de execução para prestação de facto, tendo sido requerida extração de certidão para comunicação ao Ministério Público da prática dos crimes de desobediência e usurpação de coisa imóvel, o que foi já determinado pelo Tribunal - cf. fls.63.
9 - Foi intentada providência cautelar para a restituição provisória da posse que corre termos neste Tribunal - Juiz 2, P. 246/24.6T8PRD, tendo a mesma sido indeferida, decisão que foi alvo de recurso.
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IV - Subsunção jurídica
a - Da nulidade da decisão por falta de fundamentação de facto e jurídica
A recorrente argui a nulidade da decisão, considerando que esta carece de fundamentação factual e legal.
Nos termos do disposto no art.º 615.º/1/b do C.P.C. é nula a sentença que não especifique os fundamentos de facto e de direito, que justificam a decisão.
Está em causa um vício formal, em sentido lato, traduzido em error in procedendo ou erro de atividade, que afeta a validade da sentença.
Trata-se de um vício emergente da violação do dever de fundamentação das decisões judiciais, consagrado no art.º 208.º/1 da Constituição da República Portuguesa e no art.º 154.º do C.P.C..
Também o art.º 154.º/1 do C.P.C. prevê que as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas.
O nº 2 do mesmo artigo, por seu turno, consigna que a justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, salvo quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade.
Esta disposição evidencia que o dever de fundamentação das decisões judiciais conhece diferentes graus, consoante a decisão a proferir e a respetiva complexidade.
O grau mais elevado de exigência legal de fundamentação das decisões judiciais é aplicável à elaboração de sentença em ação contestada (art.º 607.º/3/4 do C.P.C.).
Escreve Tomé Gomes (Da Sentença Cível, p. 39): “(…) a falta de fundamentação de facto ocorre quando, na sentença, se omite ou se mostre de todo ininteligível o quadro factual em que era suposto assentar. Situação diferente é aquela em que os factos especificados são insuficientes para suportar a solução jurídica adotada, ou seja, quando a fundamentação de facto se mostra medíocre e, portanto, passível de um juízo de mérito negativo. /A falta de fundamentação de direito existe quando, não obstante a indicação do universo factual, na sentença, não se revela qualquer enquadramento jurídico ainda que implícito, de forma a deixar, no mínimo, ininteligível os fundamentos da decisão.”
Não basta que apenas tenha havido uma justificação deficiente ou pouco persuasiva. Afinal, neste caso, haverá sempre um juízo de valor subjetivo. O que para uns é bastante, para outros será insignificante ou escasso.
Só a absoluta falta de fundamentação - e não a sua insuficiência, mediocridade, ou erroneidade - integra a previsão da alínea b) do n.º 1 do art.º 615.º, cabendo o putativo desacerto da decisão no campo do erro de julgamento (cf. ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 2.6.2016, Fernanda Isabel Pereira, 781/11).
Lê-se no ac. do S.T.J, de 3-3-2021 (proc. 3157/17.8T8VFX.L1.S1, Leonor Cruz Rodrigues): há que distinguir as nulidades da decisão do erro de julgamento seja de facto seja de direito. As nulidades da decisão reconduzem-se a vícios formais decorrentes de erro de atividade ou de procedimento (error in procedendo) respeitante à disciplina legal; trata-se de vícios de formação ou atividade (referentes à inteligibilidade, à estrutura ou aos limites da decisão) que afetam a regularidade do silogismo judiciário, da peça processual que é a decisão e que se mostram obstativos de qualquer pronunciamento de mérito, enquanto o erro de julgamento (error in judicando) que resulta de uma distorção da realidade factual (error facti) ou na aplicação do direito (error juris), de forma a que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou à normativa, traduzindo-se numa apreciação da questão em desconformidade com a lei, consiste num desvio à realidade factual - nada tendo a ver com o apuramento ou fixação da mesma - ou jurídica, por ignorância ou falsa representação da mesma»).
As imputações efetuadas à sentença não consubstanciam a arguida nulidade, nem por o juiz ter deixado de enunciar a materialidade que levou em linha de conta para a sua decisão, nem por não ter esclarecido a sua posição jurídica.
A decisão recorrida refere expressamente as razões pelas quais julgou como assentes os factos assinalados e especificou o direito que considerou ser aplicável aos mesmos.
Na verdade, a discordância da recorrente dirige-se ao conteúdo do juízo efetuado.
Enquadrada que está a questão, entende-se não assistir razão à recorrente.
Assim, indeferem-se as arguidas nulidades.
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b - Se existe matéria controvertida, passível de produção de prova, que possa fazer infletir o sentido da decisão de indeferimento proferida.
O tribunal de 1.ª instância concluiu que as demolições em causa nos autos (embargadas pela apelante, cuja ratificação esta requer) são as determinadas por sentença transitada em julgado na ação cível comum que correu termos sob o n.º 1551/14.5TBPRD - Juízo Local Cível, no Tribunal Judicial de Paredes. Entendeu, por esse facto, não ser necessária a ulterior produção de prova, nomeadamente com inquirição de testemunhas, vindo a julgar o procedimento improcedente.
Dissentindo desta decisão, a requerente interpôs o presente recurso. Sustenta, em síntese:
- que para que seja decretado o procedimento cautelar de ratificação de embargo extrajudicial basta que a requerente demonstre a probabilidade séria de existência de posse em nome próprio, que esse direito tenha sido ou possa vir a ser ofendido em consequência da obra que se embargou e que ainda não esteja concluída e por fim que a obra embargada cause à requerente ou ameace causar prejuízo;
- que para o decretamento da ratificação do embargo extrajudicial, basta a prova de factos que permitam um juízo de probabilidade séria da existência do direito de propriedade da requerente e da verificação do prejuízo e /ou ameaça do mesmo;
- que para o decretamento da presente providência não é necessário que o requerente já esteja legalmente reconhecido como titular do direito de propriedade que invoca;
- que o indeferimento do procedimento se fundou apenas na circunstância de a juiz ter ficado com convicção de que o requerido pretende demolir e o requerente embargar é o mesmo que consta no doc. 4.
Entende a requerente que a M.ma Juiz, independentemente da decisão a proferir a final, deveria ter procedido a julgamento e à produção de prova requerida, associando-a à prova documental, do que resultaria provada a propriedade, plena e titulada, da requerente, decretando-se, em consequência, o procedimento.
Os pressupostos do decretamento da providência cautelar de embargo judicial de obra nova (art.º 397.º/1 do C.P.C.) consistem na alegação e prova de factos dos quais resulte a ofensa do direito de propriedade, singular ou comum, ou de qualquer outro direito, real ou pessoal de gozo ou da posse, em razão da execução de uma obra, trabalho ou serviço novo e ainda não concluído e que esta cause ou ameace causar prejuízo.
Tratando-se de ratificação judicial de embargo extrajudicial de obra nova (art.º 397.º/2/3 do C.P.C.), acrescem os seguintes requisitos: a notificação verbal ao dono da obra ou, na sua falta, ao encarregado ou quem o substituir para que não continue a obra, que essa notificação seja feita perante duas testemunhas e que o pedido de ratificação judicial do embargo extrajudicial realizado no prazo de cinco dias.
Assim, tendo sido requerido no âmbito de embargo judicial de obra nova que sejam apreciados os pressupostos da ratificação do embargo extrajudicial, por, na pendência do procedimento, o interessado ter procedido diretamente ao embargo, deve o tribunal conhecer deste pedido.
A apelante esteia a sua pretensão na alegação de que bastará a prova do seu direito de propriedade sobre o imóvel, que identifica como prédio rústico, com a área de 631,00m2, inscrito a seu favor na matriz sob o artigo ..., sito no lugar ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de Paredes sob o n.º ..., da freguesia ..., bem como a prova do prejuízo que lhe é causado pela obra de demolição para que a providência venha a ser deferida.
De acordo com a sua argumentação, os autos deveriam, pois, ter prosseguido.
Vejamos se, em contrário do que foi defendido em primeira instância, lhe assiste razão.
Compulsada a matéria de facto de que emerge a decisão proferida, constata-se que através do presente procedimento a requerente pretende embargar a realização de demolição ordenada através de decisão judicial transitada em julgado. Efetivamente, o requerido mais não procurou do que executar os trabalhos que a requerente foi condenada a realizar. Está em causa a sentença proferida no proc. 1551/14.5TBPRD, do Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este - Paredes - Instância Local - Secção Cível - J2, transitada em julgado. Esta decisão reconheceu o direito de propriedade do requerido sobre o prédio rústico denominado ... ou ..., sito no lugar ..., freguesia ..., concelho de Paredes, inscrito na respetiva matriz rústica sob os artigos ... e ... e descrito na C.R.P do mesmo concelho, sob o nº ... (antiga descrição nº ... do Livro nº ...).
Na sentença referida foram a aqui requerente e II condenados a demolirem o imóvel que edificaram na parte poente do prédio supra referido (do aqui requerido); a demolirem o muro que edificaram no mesmo prédio, atravessando-o no sentido sul-norte; a arrancarem os arbustos que plantaram no dito prédio ao longo das estremas norte e sul, no sentido poente - nascente; a retirarem do dito prédio os escombros resultantes das demolições referidas supra e os arbustos após o seu arranque e os resíduos e a reporem o prédio no estado em que se encontrava antes da atuação dos RR..
A questão controvertida reside apenas em determinar se é possível saber com certeza se as edificações cuja demolição foi ordenada e que o requerido pretende executar são as mesmas - sitas, pois, pela própria natureza das coisas, no mesmo prédio - em cuja demolição a requerente pretende sobrestar através dos presentes autos.
A requerente aduz que o tribunal de 1.ª instância gerou indevidamente a sua convicção, impondo-se que seja produzida a prova testemunhal por si requerida.
Como bem aponta a decisão recorrida, a matéria fáctica enunciada aponta em sentido divergente do propugnado pela recorrente.
Os despachos proferidos em 13-10-2023, 21-2-2024 e 7-3-2024, em sede de processo executivo (cf. docs. 4, 6 e 7, juntos com a oposição) são elucidativos a este propósito. Aí se lê: foi proferida decisão transitada em julgado na qual foi reconhecido o direito de propriedade do aqui Requerido sobre determinado prédio lá devidamente identificado e foi a aqui Requerente condenada a demolir edificações e retirar plantas que estão a ofender aquele direito de propriedade. E é isso precisamente que se pretende efetivar com a execução intentada. Nada mais! E é isso que a Requerente pretende embargar.
Veja-se que a sentença condenatória foi proferida no âmbito de processo em que os RR. (a ora requerente e II) não contestaram os factos alegados pelo A. (aqui requerido) e em que aqueles não recorreram da sentença. Tampouco deduziram oposição à execução para prestação de facto.
Como advoga a decisão recorrida, a requerente deveria ter invocado todos os meios de defesa que pudesse invocar, quer em sede de contestação na ação declarativa quer em sede de oposição na execução para prestação de facto (mas optou por ficar em silêncio!) como decorre do princípio da concentração da defesa a que se liga o princípio da preclusão dos meios que as partes têm ao seu alcance quer, quando são autores devendo alegar os factos essenciais da causa de pedir que sejam do seu conhecimento, quer quando são réus, devendo opor ao seu antagonista todas as exceções que, desde logo, puderem invocar.
A exceção do caso julgado pressupõe uma tríplice identidade de sujeitos, pedido e causa de pedir (arts. 580.º e 581.º do C.P.C.).
O caso julgado tem como limites os que decorrem dos próprios termos da decisão, já que nos termos do art.º 621.º do C.P.C. a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga.
Definindo o âmbito de aplicação do caso julgado e da autoridade do caso julgado, ensina Miguel Teixeira de Sousa (in O objeto da sentença e o caso julgado material, B.M.J. 325, pp. 171 e ss.): (…) a exceção do caso julgado visa evitar que o órgão jurisdicional, duplicando as decisões sobre idêntico objeto processual, contraria na decisão posterior o sentido da decisão anterior ou repita na decisão posterior o conteúdo da decisão anterior: a exceção do caso julgado garante não apenas a impossibilidade de o Tribunal decidir sobre o mesmo objeto duas vezes de maneira diferente (...), mas também a inviabilidade do Tribunal decidir sobre o mesmo objeto duas vezes de maneira idêntica (...).Quando vigora como autoridade de caso julgado, o caso julgado material manifesta-se no seu aspeto positivo de proibição de contradição da decisão transitada: a autoridade de caso julgado é o comando de ação ou a proibição de omissão respeitante à vinculação subjetiva e à repetição no processo subsequente do conteúdo da decisão anterior e à não contradição no processo posterior do conteúdo da decisão antecedente.
E prossegue o mesmo autor (Miguel Teixeira de Sousa, O objeto da sentença e o caso julgado material,B.M.J. 325 p. 178): o caso julgado material pode valer como autoridade do caso julgado quando o objeto da ação subsequente é dependente do objeto da ação anterior ou como exceção do caso julgado quando o objeto da ação posterior é idêntico ao objeto da ação antecedente.
Já a autoridade do caso julgado representa o comando de ação ou a proibição de omissão respeitante à vinculação subjetiva à repetição no processo subsequente do conteúdo da decisão anterior e à não contradição no processo posterior do conteúdo da decisão antecedente (ibidem, p. 179).
Os efeitos do caso julgado material projetam-se em processo subsequente necessariamente como autoridade de caso julgado material, em que o conteúdo da decisão anterior constitui uma vinculação à decisão do distinto objeto posterior, ou como exceção de caso julgado, em que a existência da decisão anterior constitui um impedimento à decisão de idêntico objeto posterior” (ibidem, p. 168).
Sumaria-se no ac. da Relação de Coimbra de 28-09-2010 (proc. 392/09.6TBCVL.S1, Jorge Arcanjo): I - A exceção do caso julgado destina-se a evitar uma nova decisão inútil (razões de economia processual), o que implica uma não decisão sobre a nova ação, pressupondo a tríplice identidade de sujeitos, objeto e pedido. II - A autoridade do caso julgado importa a aceitação de uma decisão proferida em ação anterior, que se insere, quanto ao seu objeto, no objeto da segunda, visando obstar a que a relação ou situação jurídica material definida por uma sentença possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença, não sendo exigível a coexistência da tríplice identidade prevista no art.º 498.º do Código de Processo Civil (581.º NCPC).
No caso vertente, atenta a circunstância de nos encontrarmos perante um procedimento cautelar, ademais de um procedimento com a especificidade dos embargos de obra nova, na modalidade de ratificação e de impedimento de uma demolição, é manifesto que não se verifica a exceção do caso julgado. Não obstante, as decisões reiteradas a propósito da questão suscitada impõem-se nos presentes autos pela autoridade de caso julgado.
Como já se frisou, a requerente não logrou suscitar dúvidas, nem no tribunal de cuja decisão se recorre, nem nesta instância, de que as demolições em causa se situam exatamente no mesmo imóvel, ou seja, de que está em causa o mesmo prédio, tratando-se das construções em cuja demolição a embargante precisamente foi condenada.
O princípio da adequação formal encontra-se previsto no artigo 547.º, do Código de Processo Civil, e, de acordo com o mesmo, o juiz deve adotar a tramitação processual adequada às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos atos processuais ao fim que visam atingir, assegurando um processo equitativo.
Leia-se a seguinte passagem da exposição dos motivos do Decreto-Lei n. 329-A/95,: ter-se-á de perspetivar o processo civil como um modelo de simplicidade e de concisão, apto a funcionar como um instrumento, como meio de ser alcançada a verdade material pela aplicação do direito substantivo, e não como estereótipo autista que a si próprio se contempla e impede que seja perseguida a justiça, afinal, o que os cidadãos apenas pretendem quando vão a juízo.
Salienta-se no ac. da Relação de Guimarães de 27-4-2017 (proc. 1752/12.0TJVNF.G1, Maria dos Anjos Nogueira): o novo princípio da adequação formal vem romper com o apertado regime da legalidade das formas, conferindo-se, então, os correspondentes poderes ao juiz para adaptar a sequência processual às especificidades da causa apresentada em juízo, reordenando os atos processuais a serem praticados no iter, inclusive com a determinação da prática de ato não previsto ou a dispensa de ato inútil previsto, ou ainda com a alteração da ordem dos atos abstratamente disciplinados em lei. Tal adequação fica, assim, justificada se houver circunstâncias específicas, relacionadas ao direito material, a aconselhar a variação da forma do procedimento processual.
Inexistia fundamento para a prossecução dos autos com produção de prova. Tal violaria, inclusivamente, o princípio da economia processual, vertido no art.º 130.º do C.P.C., segundo o qual não é lícito realizar no processo atos inúteis.
Outro não poderia, por conseguinte, ter sido o sentido da decisão proferida, estando a presente apelação votada ao insucesso.
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V - Dispositivo
Nos termos sobreditos, acorda-se em julgar improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
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Custas pela apelante, por ter decaído na sua pretensão (art.º 527.º/1/2 do C.P.C.).