I- O juiz de execução de penas é, nos termos do disposto na alínea c) do nº 4 do artigo 138º do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade (“CEPMPL”), a entidade competente para decidir a concessão e revogação da liberdade condicional.
II- Tendo o requerente faltado ao cumprimento, de forma grosseira e repetida, das regras de condutas que lhe haviam sido impostas no despacho de concessão da liberdade condicional, justifica-se, face ao disposto na alínea a), do nº 1, do artigo 56º - aplicável ex vi nº 1 do artigo 64º - a revogação da liberdade condicional, tendo a determinação do cumprimento do tempo remanescente da pena de prisão suporte legal no nº 2 do artigo 64º, sendo ambas as normas do Código Penal.
III- Face ao disposto no nº 4 do artigo 185º do CEPMPL, a falta injustificada do condenado à diligência agendada para sua audição - prévia à decisão de revogação da liberdade condicional - vale como efetiva audição para todos os efeitos.
IV- Improcede, por isso, o pedido de habeas corpus apresentado com fundamento no disposto no artigo 222º, nº 2, alíneas a) e b) do Código de Processo Penal.
Acordam, na seção criminal (de turno) do Supremo Tribunal de Justiça:
I – RELATÓRIO
1. O Pedido
AA, atualmente a cumprir pena de prisão no Estabelecimento Prisional ..., veio apresentar a presente providência de habeas corpus, ao abrigo do disposto nas alíneas a) e b) do artigo 222º do Código de Processo Penal e com os seguintes fundamentos (transcrição integral):
“O requerente foi detido a 19/09/2023 e conduzido ao Estabelecimento Prisional ..., sem ser informado da razão pela qual estava a ser preso.
No dia 30 de Novembro de 2023, foi notificado no E.P. ... do despacho proferido a 24/10/2023 – referência n.º ......22 do processo nº 5277/10.0TXLSB-E do ... Juiz – Tribunal Execução de Penas ..., no qual foi informado que lhe tinha sido revogada a liberdade condicional concedida a 13/11/2021 e tinha sido determinado o cumprimento da pena que lhe faltava cumprir até 13/9/2023, sendo o remanescente de 1 ano e 10 meses de prisão.
Sucede que, o requerente sempre cumpriu com as suas obrigações perante os serviços de reinserção social e nunca foi notificado da abertura de qualquer incidente, em clara e expressa violação do previsto no n.º 2 do artigo 185.º do Código de Execução Penas.
Não teve conhecimento da data da audiência, do seu direito a defender-se, a estar presente e a poder recorrer da decisão que viesse a ser proferida.
Foi assim detido e preso, sem apelo nem agravo, com violação dos mais elementares direitos de defesa de um cidadão que reside num estado de direito.
Estatui o art.º 154.º do Código Execução de Penas que são correspondentemente aplicáveis as disposições do Código de Processo Penal, sempre que o contrário não resulte da lei.
Deste modo, a notificação e a presença do requerente é obrigatória no processo de revogação da liberdade condicional, o que não se verificou, pelo que consubstancia uma nulidade insanável prevista na alínea c) do art.º 119.º do Código Processo Penal. Esta nulidade insanável tem como consequência que todos os atos praticados são inexistentes e como tal, tem que ser colocado o requerente recluso em liberdade imediata.
O artigo 185.º do Código Execução de Penas é claro no n.º 2 quando especifica a obrigatoriedade da notificação ao condenado e seu defensor, bem como a presença do condenado na audiência, sob pena de estar a ser violado o mais elementar direito de defesa, o princípio do contraditório previsto no artigo 32.º, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa, e o próprio n.º 1 tendo sido coartadas todas as garantias de defesa do requerente.
Termos em que
Pelos motivos supra expostos o requerente foi preso por uma ordem inexistente (nulidade insanável) art.º 119 alínea c) do Cód. Proc. Penal e um fato não permite a prisão preventiva do requerente nos termos do art. 222.º n.º 2 alínea a) e b) do Código do Processo Penal.
Requer a V. Exa., seja instruído o processo com os documentos de prova do incidente de revogação da liberdade condicional e o recluso seja de imediato restituído à liberdade.”
2. A informação judicial
A 26 de abril de 2024, em obediência ao disposto no artigo 223.º, nº 1, do Código de Processo Penal, foi prestada pelo Juiz de Execução de Penas ... – Juiz ..., a seguinte informação (transcrição integral)1:
“Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do art. 223.º do Código de Processo
Penal consigno que dos presentes autos resulta que:
Do apenso E:
- o condenado encontrava-se a cumprir uma pena única de 11 meses de prisão, por decisão transitada em julgado, no processo n.º 53/12.9..., do(a) J. da Inst. Central Criminal ..., que englobou, para além da própria pena, a pena aplicada no proc. 1869/08.6...
- da respetiva liquidação consta como início do cumprimento das penas: 13.09.2012; -
- Meio da pena: 13.03.2018;
- Dois terços da pena: 13.01.2020;
- Cinco sextos da pena: 13.11.2021;
- Termo da pena: 13.09.2023.
- por decisão proferida em 11.11.2021, foi concedida a liberdade condicional ao recluso AA a partir de 13.11.2021, pelo tempo de prisão que, a contar da sua libertação, lhe faltaria cumprir, ou seja, até 13.09.2023.
- mais ficou estipulado na decisão o cumprimento das seguintes regras de conduta:
“A) Fixar a sua residência na ..., residência que não poderá abandonar por prazo superior a 08 (oito) dias, sem prévia autorização do Tribunal de Execução de Penas ..., solicitando, para tal, autorização prévia com indicação dos motivos da ausência ou da alteração de morada;
B) Aceitar a tutela da Direcção-Geral da Reinserção Social e apresentar-se no prazo máximo de 08 (oito) dias, contados da data da sua libertação e, posteriormente, com a periodicidade e no local que lhe sejam determinados, à equipa da DGRS – Equipa de Reinserção ..., sita na ...;
C) Manter bom comportamento social e procurar trabalho no sentido de exercer actividade regular, de no prazo de 2 (dois) meses e na impossibilidade, de não conseguir comprovar esse seu empenhamento junto da DGRS que o irá acompanhar, sujeitar-se a toda a orientação por parte desta Equipa;
D) Não cometer crimes, não consumir substâncias estupefacientes, não frequentar zonas, locais ou estabelecimentos, nem acompanhar indivíduos relacionados com actividades criminosas.”
- o condenado foi notificado de tal decisão em 12.11.2021.
- por despacho de 29.06.2022, foi determinado que solicitasse à DGRSP informação sobre se tomou conhecimento de qualquer alteração de morada do libertado e se afinal o mesmo se mantem a residir na morada fixada na decisão de concessão de liberdade condicional e também se tem cumprido as demais condições fixadas.
- por ofício de 1.08.2022, a DGRSP comunicou que contactado o condenado este informou que mantinha a sua residência na morada indicada ao Tribunal, na ....
- por despacho de 17.10.2022 foi determinada a expedição de carta dirigida à morada fixada na decisão de concessão de liberdade condicional, notificando-se o libertado para, em 10 dias, contactar a DGRSP ou, proceder ao envio para a DGRSP de um comprovativo de residência (através do ultimo recibo de luz, agua ou operadora telecomunicações), de uma declaração de inscrição no centro de emprego ou declaração da entidade patronal como está a realizar trabalhos na mesma e uma manifestação de interesse no SEF, conforme protestou enviar, advertindo-o de que o incumprimento culposo das obrigações fixadas, pode determinar a revogação da liberdade condicional. Mais e determinou que, decorridos 20 dias, a DGRSP informasse se o libertado entrou em contacto com esses serviços por qualquer via e/ou procedeu ao envio dos aludidos documentos.
- em 8.11.2022 foi junto aos autos carta devolvida de notificação ao condenado na morada: ..., com a menção de “objecto não reclamado”.
- em 21.11.2021, a DGRSP informou que: “contactamos o libertado AA, para agendar uma entrevista para dia 02 de novembro do corrente ano, nesse dia o condenado contactou os nossos serviços, para reagendar a entrevista, para conseguir a documentação solicitada, a mesma ficou marcada para dia 7 de novembro. Entrevista essa a que o libertado não compareceu, Neste seguimento efetuaram-se várias tentativas de contacto, em dias diferentes, para os diferentes números de contacto, existentes no processo todas infrutíferas (.......49-voice mail; .......74 Não atende; .......17-voice mail; .......90-sem tocar/desliga; .......40-não está atribuído e .......41-sem tocar/desliga). Até á data, o libertado, não entrou em contacto com os nossos serviços por qualquer via, desconhecendo-se o seu modo de vida.”.
- o Ministério Público promoveu em 24.11.2022, que fosse iniciado processo de incumprimento.
- por despacho de 30.11.2022, foi determinada a indicação de defensor oficioso ao condenado, bem como designado o dia 15.12.2022, pelas 10h15m, para a sua audição, nos termos do artigo 185.º, n.ºs 2, 3 e 4, do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade. Mais foi determinada a notificação do condenado na sua morada jurisdicional.
Do apenso U:
- em 5.12.2022 foi depositada, no receptáculo postal da morada ..., a notificação indicada no ponto que antecede.
- em 13.12.2022 veio devolvida a notificação enviada para a morada acima referida com a menção de “desconhecido”.
- em 15.12.2022, estando apenas presente o defensor oficioso nomeado ao arguido foi proferido o seguinte despacho, em acta de audição: “Uma vez que o arguido não compareceu neste Tribunal, tendo o mesmo sido notificado para a morada jurisdicional fixada aquando a concessão da liberdade condicional, vão os autos ao Ministério Público para os fins tidos por convenientes.
Solicite a DGRSP – Equipa ..., se o arguido AA entretanto contacto tais serviços.”.
- Em 10.02.2023, a DGRSP informou que: “o libertado AA, teve o último contacto com os nossos serviços no dia 6 de dezembro de 2022, para reagendar uma entrevista para dia 7 de dezembro de 2022. Entrevista essa, que AA, não compareceu, nem justificou a sua falta. Tentou-se contactar, o libertado, em dias diferentes (a última tentativa a 10 de fevereiro de 2023), para os diferentes números de contacto, existentes no dossier individual (.......49-voice mail; .......74-desligado; .......17-voice mail; .......90-sem tocar/desliga; .......40-não atende, .......41-não está atribuído e o .......33-voice mail), sem sucesso. Até á data, o libertado, não entrou em contacto com os nossos serviços por qualquer via.”.
- em 28.02.2023, o Ministério Público emitiu parecer no sentido de: “revogação da liberdade condicional que foi concedida, nos termos previstos no art. 56º n.º 1 al. a), “ex vi” do art. 64º n.º 1, ambos do C. Penal e com os efeitos contemplados no n.º 2 deste último preceito legal, devendo em consequência ser determinada a execução da pena de prisão remanescente.”.
- em 06.03.2023 foi proferida decisão na qual se decidiu revogar a liberdade condicional concedida a AA, e se determinou o cumprimento do remanescente da pena de prisão aplicada no processo n.º 53/12.9..., do Juízo Central Criminal ...;
- tal decisão foi notificada electronicamente ao defensor oficioso do condenado em 7.03.2023.
- em 10.03.2023 foi depositada, no receptáculo postal da morada ..., a notificação da decisão de revogação da liberdade condicional.
Do apenso E:
- por despacho de 23.05.2023 foi determinada a emissão de mandados de detenção.
- consta, ademais, do mandado de detenção: “MAIS MANDA que, após cumprimento: 1. Seja exibido e entregue ao(à) detido(a), uma das cópias deste mandado (artº 258º, nº 3, do C.P. Penal)
2. Seja notificado de todo o conteúdo do despacho proferido, cuja cópia se junta para lhe ser entregue.
3. Seja lavrada certidão da ocorrência com data, local e identificação da entidade que a efetuou.”
- por ofício da PSP de 19.09.2023, foi informado o Tribunal que: “procedi ao mandado de detenção do arguido AA, com morada na ... Em ..., que se deslocou á Esquadra ..., ás 18H30, onde foi posteriormente conduzido ao Estabelecimento Prisional ..., no âmbito do processo 5277/10.0TXLSB, para cumprimento do remanescente da pena de prisão.”
- o mandado de detenção mostra-se com a data de detenção certificada no dia
19.09.2023.
- em 24.10.2024 foi proferido despacho de homologação de liquidação de pena, nos seguintes termos:
“O recluso reiniciou o cumprimento da pena (no seu remanescente), a 19-09-2023. Homologo a liquidação da pena que antecede.
Relevam, para efeitos de liberdade condicional, as seguintes datas:
Meio da pena – a 19-08-2024;
Dois terços da pena – a 09-12-2024;
Termo da pena – a 19-07-2025.”.
- em 30.11.2023 o condenado foi notificado do despacho de homologação da liquidação de pena.
- em 30.11.2023, o condenado deu entrada de requerimento solicitando a sua libertação.
-em 7.12.2023, o Ministério Público promoveu no sentido de: “Fls. 348 a 350 – a decisão de revogação da liberdade condicional proferida no incidente de incumprimento transitou em julgado em 20-04-2023.
Tal decisão apenas poderia ter sido impugnada pela via do recurso, o que não sucedeu. Pelo exposto, promovo que se indefira o requerido por falta de fundamento legal.”
- em 21.12.2023, foi proferido despacho a determinar o seguinte: “D. promoção que antecede:
Concordo.
Não se admitindo, por falta de cabimento legal (nos termos expressos na antedita promoção, para a qual remeto, e aqui dou inteiramente reproduzida), o requerimento que antecede.
Notifique.”.
- tal despacho foi notificado ao condenado em 27.12.2023.
Do apenso V:
- em virtude de o condenado ter a cumprir ainda uma pena de prisão de 1 ano e 6 meses, no Proc. 27/21.9..., em cumprimento sucessivo com a pena de 1 ano e 10 meses do Proc. 53/12.9..., foi homologada liquidação do cômputo de penas, por despacho de 19.06.2024, nos seguintes termos:
“− Início das penas: 19/09/2023
– 1/2 das penas: 19/05/2025
− 2/3 das penas: 09/12/2025
− Termo das penas: 19/01/2027.”
- mais foi determinado, no mesmo despacho, que fossem emitidos, com data de 19/08/2024, mandados de desligamento para o Proc. 53/12.9... e ligamento ao Proc. 27/21.9..., do Juízo Local Criminal ... – Juiz ..., a fim de o recluso cumprir a pena de 1 ano e 6 meses de prisão em que ali se mostra condenado.
- o arguido foi notificado de tal despacho em 21.06.2024.
Assim, em síntese, tendo o condenado nunca comparecido perante o tribunal, tendo-se apresentado voluntariamente para cumprimento do remanescente da pena no proc. 53/12.9... e tendo ainda uma pena de 1 ano e 6 meses por cumprir no Proc. 27/21.9..., entendemos que carece de fundamento a providência apresentada.
É quanto me cumpre informar.
1.3. Sequência processual
Convocada a Secção Criminal deste Supremo Tribunal de Justiça e notificado o Ministério Público e o Defensor do requerente, procedeu-se à audiência, de harmonia com as formalidades legais, após o que o Tribunal reuniu e deliberou como segue (artigo 223º, n.º 3, do Código de Processo Penal).
II. QUESTÃO A DECIDIR:
Da eventual ilegalidade da privação da liberdade do requerente, por ter sido ordenada por entidade incompetente e motivada por facto pelo qual a lei não permite, devendo ordenar-se a sua imediata libertação, caso se entenda estarem reunidos os requisitos da providência de habeas corpus, previstos nos artigos 31º da Constituição da República Portuguesa e 222º, nº 2 alíneas a) e b) do do Código de Processo Penal.
III - FUNDAMENTAÇÃO
3.1. Os factos
Das peças processuais juntas aos autos e do teor da informação prestada nos termos do art.223.º do Código de Processo Penal, emergem apurados os seguintes factos, relevantes para a decisão da providência requerida:
• Através de decisão proferida - e transitada em julgado - no Proc. 53/12.9..., do Juízo Central Criminal ..., que englobou, para além da pena em que o requerente foi condenado nesses autos, a que lhe foi aplicada no proc. 1869/08.6..., o requerente ficou condenado na pena única de 11 anos de prisão;
• O requerente iniciou o cumprimento dessa pena no dia 13 de setembro de 2012, estando então o seu termo previsto para 13 de setembro de 2023;
• Contudo, através de decisão proferida a 11 de novembro de 2021 - e da qual o AA foi notificado a 12 de novembro de 2021 -, foi concedida a seu favor a liberdade condicional, com início a 13 de novembro de 2021 e termo a 13 de setembro de 2023, ficando a mesma subordinada ao cumprimento das seguintes regras de conduta:
• “A) Fixar a sua residência na ..., residência que não poderá abandonar por prazo superior a 08 (oito) dias, sem prévia autorização do Tribunal de Execução de Penas ..., solicitando, para tal, autorização prévia com indicação dos motivos da ausência ou da alteração de morada;
• B) Aceitar a tutela da Direcção-Geral da Reinserção Social e apresentar-se no prazo máximo de 08 (oito) dias, contados da data da sua libertação e, posteriormente, com a periodicidade e no local que lhe sejam determinados, à equipa da DGRS – Equipa de Reinserção ...1, sita na ...;
• C) Manter bom comportamento social e procurar trabalho no sentido de exercer actividade regular, de no prazo de 2 (dois) meses e na impossibilidade, de não conseguir comprovar esse seu empenhamento junto da DGRS que o irá acompanhar, sujeitar-se a toda a orientação por parte desta Equipa;
• D) Não cometer crimes, não consumir substâncias estupefacientes, não frequentar zonas, locais ou estabelecimentos, nem acompanhar indivíduos relacionados com actividades criminosas.”
• No dia 1 de agosto de 2022, na sequência de solicitação do Tribunal de Execução de Penas ... (doravante “TEP”), a Direção Geral de Reinserção e Serviços prisionais (doravante “DGRSP”) comunicou que, contatado o requerente, este tinha confirmado continuar a morar na ...
• Posteriormente, na sequência de despacho de 17 de outubro de 2022 e através de carta registada enviada para a aludida morada, o AA foi notificado para “em 10 dias, contactar a DGRSP ou, proceder ao envio para a DGRSP de um comprovativo de residência (através do ultimo recibo de luz, agua ou operadora telecomunicações), de uma declaração de inscrição no centro de emprego ou declaração da entidade patronal como está a realizar trabalhos na mesma e uma manifestação de interesse no SEF, conforme protestou enviar, advertindo-o de que o incumprimento culposo das obrigações fixadas, pode determinar a revogação da liberdade condicional.”
• Porém, a 8 de novembro de 2022, essa carta foi devolvida aos autos com indicação de “objeto não reclamado”;
• A 21 de novembro de 2021 a DGRSP informou o TEP que havia contatado o requerente - com vista a recolher a documentação acima referenciada - e com ele agendou uma entrevista para o dia 2 de novembro, a qual foi posteriormente desmarcada a pedido do AA - por este alegar necessitar de mais tempo para obter a documentação solicitada – e reagendada para o dia 7 de novembro, mas não realizada, por falta injustificada do requerente. Mais informou que o tentou contatar, sem sucesso, através dos vários números de telefone disponíveis no processo (.......49-voice mail; .......74 Não atende; .......17-voice mail; .......90-sem tocar/desliga; .......40-não está atribuído e .......41-sem tocar/desliga). Informou, finalmente, que não voltou a ser contatada pelo requerente e que desconhecia o seu modo de vida.
• Perante esta situação foi iniciado processo de incumprimento da liberdade condicional, tendo sido, por despacho de 30 de novembro de 2022, ordenada a indicação de defensor para o AA e designado o dia 15 de dezembro de 2022 para audição deste, tendo o mesmo sido notificado desse despacho na morada constante dos autos.
• Contudo, a carta depositada a 5 de dezembro de 2022 no recetáculo postal da morada do requerente, com vista à sua notificação do despacho atrás referido, foi devolvida ao processo a 13 de dezembro de 2022, com a menção de “desconhecido”;
• No dia 15 de dezembro de 2022 o arguido não compareceu no TEP, tendo, contudo, estado presente o seu defensor oficioso.
• A 10 de Fevereiro de 2023, na sequência de solicitação do TEP, a DGRSP informou que o último contato com o requerente tinha ocorrido a 6 de dezembro de 2022 e que, posteriormente, as diversas tentativas de contato telefónico com o AA que realizou até 10 de fevereiro para os números acima referidos, não tiveram sucesso, não tendo também o requerente contatado esses serviços.
• Assim, na sequência e em concordância com a promoção do Ministério Público, através de despacho proferido a 6 de março de 2023 foi proferida decisão que revogou a liberdade condicional concedida ao requerente e determinou que este cumprisse o remanescente da pena de prisão aplicada no processo 53/12.9..., do Juízo Central Criminal .... Tal decisão foi notificada a 7 de março de 2023, por meio eletrónico, ao defensor oficioso do requerente e a este através de carta depositada no recetáculo postal da morada pelo mesmo indicada nos autos.
• Por despacho de 23 de maio de 2023 foi determinada a emissão de mandados de detenção, os quais foram cumpridos pela Polícia de Segurança Pública a 19 de setembro de 2023, tendo o requerente sido conduzido ao Estabelecimento Prisional ....
• A 24 de outubro de 2024 foi proferido despacho de homologação da liquidação da pena acima referida – o qual foi notificado ao requerente a 30 de novembro de 2024 – dele resultando que o meio dessa sanção ocorrerá a 19 de agosto de 2024, os dois terços a 9 de dezembro de 2024 e o seu termo a 19 de julho de 2025.
• Finalmente, refira-se que o requerente tem ainda para cumprir, em regime sucessivo, uma pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses, que lhe foi aplicada no Proc. 27/21.9...
3.2. O Direito.
3.2.1. Introdução
O art. 27º da Constituição da República Portuguesa estabelece, designadamente, que:
“1 - Todos têm direito à liberdade e à segurança.
2 - Ninguém pode ser total ou parcialmente privado da liberdade, a não ser em consequência de sentença judicial condenatória pela prática de ato punido por lei com pena de prisão ou de aplicação judicial de medida de segurança.
3 – Exceptua-se deste princípio a privação da liberdade, pelo tempo e nas condições que a lei determinar, nos seguintes casos:
(…)
b) Detenção ou prisão preventiva por fortes indícios de prática de crime doloso a que corresponda pena de prisão cujo limite máximo seja superior a três anos”
Estas normas inspiraram-se, diretamente, nos artigos 3º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, 9º do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e 5.º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, que vinculam Portugal ao sistema internacional de proteção dos direitos humanos, garantindo, designadamente, o direito à liberdade física e à liberdade de movimentos, isto é, o direito de não ser detido, aprisionado ou de qualquer modo fisicamente confinado a um determinado espaço ou impedido de se movimentar (assim, por todos, o acórdão de 29.12.2021, Proc. 487/19.8PALSB-A.S1, em www.dgsi.pt).
Mais recentemente estes princípios foram reafirmados no artigo 6º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, da qual Portugal faz parte.
Por outro lado, e com vista a pôr termo à privação da liberdade ilegal, decorrente de abuso de poder, o nº 1 do art. 31º da Lei Fundamental veio consagrar o instituto do habeas corpus, a requerer perante tribunal competente.
O habeas corpus sempre foi concebido como um mecanismo de utilização simples, sem grandes formalismos, de rápida atuação - dado que o constrangimento de um direito fundamental, como o direito à liberdade, não se compactua com atrasos e demoras - e que deve abarcar todas as situações de privação ilegal de liberdade.
Estando inserido no Título II, da Parte I, da Constituição da República Portuguesa tem, por força do disposto no artigo 18º da Lei Fundamental, aplicabilidade direta e vincula entidades públicas e privadas.
Este “remédio”, de consagração constitucional, visa solucionar situações anormais, em que a pessoa foi restringida de sua liberdade por via de abuso de poder, colocando o Estado à pessoa que sofre dessa restrição, um meio idóneo e célere para que seja apreciada a ilegalidade, ou não, daquela limitação de liberdade.
Com efeito, a nossa doutrina2 e jurisprudência3 têm entendido que o habeas corpus constitui uma providência expedita e urgente, de garantia do direito à liberdade consagrado nos artigos 27.º e 28.º da Constituição, “cujo pressuposto constitucional é o abuso de poder”, em caso de detenção ou prisão «contrários aos princípios da constitucionalidade e da legalidade das medidas restritivas da liberdade», «em que não haja outro meio legal de fazer cessar a ofensa ao direito à liberdade», “distinto dos recursos” sendo, por isso, uma garantia privilegiada deste direito, por motivos penais ou outros.
Assim, em sintonia e no desenvolvimento destes princípios constitucionais e por forma a permitir a sua adequada aplicação prática, o artigo 222º do Código de Processo Penal estabelece o seguinte:
“1 - A qualquer pessoa que se encontrar ilegalmente presa o Supremo Tribunal de Justiça concede, sob petição, a providência de habeas corpus.
2 - A petição é formulada pelo preso ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos, é dirigida, em duplicado, ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, apresentada à autoridade à ordem da qual aquele se mantenha preso e deve fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de:
a) Ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente;
b) Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; ou
c) Manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial.”
Ou seja, e como tem repetida e uniformemente decidido o Supremo Tribunal de Justiça,
“(A) providência de habeas corpus corresponde a uma medida extraordinária ou excecional de urgência – no sentido de acrescer a outras formas processualmente previstas de reagir contra a prisão ou detenção ilegais – perante ofensas graves à liberdade, com abuso de poder, ou seja, sem lei ou contra a lei que admita a privação da liberdade, referidas nas alíneas a), b) e c) do n.º 2 do artigo 222.º do CPP, e que não constitui um recurso de uma decisão judicial, um meio de reação tendo por objeto a validade ou o mérito de atos do processo através dos quais é ordenada ou mantida ou que fundamentem a privação da liberdade do arguido ou um «sucedâneo» dos recursos admissíveis (artigos 399.º e segs. do CPP), que são os meios adequados de impugnação das decisões judiciais (assim e quanto ao que se segue, por todos, de entre os mais recentes, o acórdão de 22.03.2023, Proc. n.º 631/19.5PBVLG-MC.S1, em www.dgsi.pt).
A diversidade do âmbito de proteção do habeas corpus e do recurso ordinário configuram diferentes níveis de garantia do direito à liberdade, em que aquela providência permite preencher um espaço de proteção imediata da pessoa privada da liberdade perante a inadmissibilidade legal da prisão. “
Ac. de 10 de maio de 2023 – Proc. 196/20.5JAAVR-B.S1 in www.dgsi.pt
Assim e procurando concluir esta introdução, os motivos de «ilegalidade da prisão», como fundamento da providência de habeas corpus, têm de reconduzir-se, necessária e exclusivamente, às situações previstas nas alíneas do n.º 2 do artigo 222.º do CPP, de enumeração taxativa.
Com efeito, como se tem afirmado em jurisprudência uniforme e reiterada, o Supremo Tribunal de Justiça apenas tem de verificar (a) se a prisão, em que o peticionante atualmente se encontra, resulta de uma decisão judicial exequível, proferida por autoridade judiciária competente, (b) se a privação da liberdade se encontra motivada por facto que a admite e (c) se estão respeitados os respetivos limites de tempo fixados na lei ou em decisão judicial (assim, de entre os mais recentes, por todos, os acórdãos de 16.11.2022, Proc. 4853/14.7TDPRT-A.S1, de 06.09.2022, Proc. 2930/04.1GFSNT-A.S1, de 9.3.2022, proc. 816/13.8PBCLD-A.S1, e de 29.12.2021, proc. 487/19.8PALSB-A.S1, em www.dgsi.pt).
3.2.2. O caso concreto
O Requerente não coloca em crise os prazos da prisão acima indicados.
Fundamenta o seu pedido de habeas corpus, designadamente, no disposto na al. a) do artigo 222º do Código de Processo Penal. Ou seja, entende que a prisão foi “efetuada ou ordenada por entidade incompetente”.
Contudo, a invocação deste fundamento é ininteligível e está votada, inapelavelmente, ao fracasso.
Com efeito, mesmo que, como alega o requerente, a sua prisão tivesse por base uma “ordem inexistente (nulidade insanável) art.º 119 alínea c) do Cód. Proc. Penal” isso não beliscaria a competência do juiz do TEP para a proferir o despacho de revogação da liberdade condicional.
Aliás, o requerente desde logo ignora a diferença entre os conceitos jurídicos de nulidade e de inexistência, sendo que, in casu e como adiante melhor se explicará, não se verifica nenhuma dessas realidades.
Voltando à matéria que estávamos a abordar e sem necessidade de maiores explicações, estabelece a alínea c) do nº 4 do artigo 138º do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade – aprovado pela Lei 115/2009, de 12 de outubro - que compete, designadamente, ao TEP: “c) conceder e revogar a liberdade condicional, a adaptação à liberdade condicional e a liberdade para prova”.
Por outro lado, também não há dúvida que o incidente de incumprimento da liberdade condicional foi conduzido pelo juiz ... do TEP ..., tendo designadamente sido esse magistrado judicial quem proferiu o despacho que determinou a revogação da liberdade condicional do requerente e o cumprimento do remanescente da pena em que o mesmo fora condenado.
Improcede, pois, quanto a este ponto, a pretensão do Requerente.
* * *
Por outro lado, o requerente fundamenta a sua pretensão no disposto na alínea b) do nº 2 do artigo 222º do Código de Processo Penal: “Ser (a prisão) motivada por facto pelo qual a lei a não permite”
Contudo e usando as palavras de Paulo Pinto de Albuquerque, o disposto na aludida alínea al. c) do nº 2 do artigo 222º do Código de Processo Penal aplica-se quando a pessoa é presa por um motivo ou causa pelo qual a lei não permite que exista uma privação de liberdade, ou seja, existe um motivo de prisão em que a lei não prevê que a atitude do agente tenha como consequência a sua prisão. Por exemplo, casos em que o arguido comete um crime doloso punível com pena de prisão inferior a cinco anos de prisão ou inferior a 3 anos de prisão no caso crime doloso de terrorismo ou que corresponda a criminalidade altamente organizada ou detenção de arma proibida, detenção de armas ou outros dispositivos, ou por o crime ter sido amnistiado ou praticado negligentemente; casos em que se apura, à posteriori, que o arguido que se encontra preso preventivamente à data dos factos tinha 15 anos de idade; ou casos em que se verifica a revogação da suspensão da execução da pena de prisão com base no pressuposto do cometimento de outro crime doloso durante a suspensão, em que se verifica, mais tarde, que, afinal, teria sido cometido antes da sentença condenatória4
Ora, no caso dos autos o despacho de revogação da liberdade condicional, de 6 de março de 2023, tem o seu fundamento legal no disposto na alínea a), do nº 1, do artigo 56º do Código Penal, aplicável por força do nº 1 do artigo 64º do mesmo diploma legal, tendo a determinação do cumprimento do tempo remanescente da pena de prisão suporte legal no nº 2 do aludido artigo 64º.
Com efeito, estabelecem esses artigos o seguinte:
“Artigo 64.º
Regime da liberdade condicional
1 - É correspondentemente aplicável à liberdade condicional o disposto no artigo 52.º, nos n.os 1 e 2 do artigo 53.º, no artigo 54.º, nas alíneas a) a c) do artigo 55.º, no n.º 1 do artigo 56.º e no artigo 57.º
2 - A revogação da liberdade condicional determina a execução da pena de prisão ainda não cumprida. “
“
Artigo 56.º
Revogação da suspensão
1 - A suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado:
a) Infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano de reinserção social;”
Ora, resulta abundantemente dos autos que o Requerente infringiu, grosseira e repetidamente, as regras de conduta que lhe foram impostas aquando da concessão da liberdade condicional.
Fê-lo, desde logo e designadamente, quando não se manteve contatável pelo TEP e pela DGRSP na morada por si indicada ao Tribunal (indiciando-se, inclusive – pela devolução de várias cartas registadas enviadas para essa morada com as menções de “objeto não reclamado” e “desconhecido” –, que dela se terá ausentado sem ter previamente informado o Tribunal, conforme era sua obrigação face às regras de conduta a que estava subordinado.)
Fê-lo, quando faltou à reunião agendada – em contato pessoal com o requerente e com a sua concordância – para o aludido dia 7 de novembro, não tendo apresentado qualquer justificação para a sua não comparência na DGRSP5.
Fê-lo, quando se subtraiu à tutela da DGRSP, não só porque deixou de se apresentar nas instalações deste serviço, mas, também, porque impediu que a mesmo o contactasse através dos diversos números de telefone que indicou nos autos6
Fê-lo, ao não enviar para a DGRSP- como lhe tinha sido ordenado a 17 de outubro de 2022 pelo TEP e transmitido por aquela direção geral no contato mantido para agendar a reunião inicialmente marcada para o dia 2 de novembro de 2022 - um comprovativo de residência (através do último recibo de luz, água ou operadora telecomunicações), uma declaração de inscrição no centro de emprego ou declaração da entidade patronal como está a realizar trabalhos na mesma e uma manifestação de interesse no SEF, conforme tinha protestado enviar.
Por outro lado, ao contrário do que alega o requerente e como foi informado pelo TEP ..., o mesmo foi notificado do despacho que determinou a instauração do incidente de incumprimento, bem como da data designada para ser ouvido e exercer o seu direito ao contraditório, sendo que nessa diligência esteve presente o defensor oficioso que, para o efeito, lhe foi nomeado.
Portanto, também quanto ao fundamento a que alude a al. b) do artigo 222º do Código de Processo Penal improcede a pretensão do Requerente.
Aqui chegados, poderíamos dar por terminado a fundamentação do presente acórdão, já que as demais matérias a que o requerente se reporta não podem constituir objeto da presente providência de habeas corpus.
Com efeito e como deixámos assinalado, esta providência é um mecanismo de utilização simples, sem grandes formalismos, de rápida atuação, que visa constituir um espaço de proteção imediata da pessoa privada da liberdade perante situações anormais, em que o cidadão foi, de forma clara e evidente, restringido na sua liberdade por via de abuso de poder.
Ou seja, caso o requerente quisesse suscitar outras questões, teria de o fazer através de recurso, não se compreendendo, aliás, porque é que só agora vem reagir - e através da presente providência - a uma decisão que foi proferida a 6 de março de 2024 e da qual foi notificado, não só através de carta depositada a 10 de março de 2024 no recetáculo do domicílio que indicou nos autos, mas, também, quando foi detido pela Polícia de Segurança Pública…
Finalmente, não resistimos a aditar as seguintes três notas complementares:
A primeira, para recordar que, nos termos do acórdão de fixação de jurisprudência nº 3/2011 deste Supremo Tribunal de Justiça7, relativo à revogação da suspensão da execução da pena (regime que, como atrás se deixou consignado, é aplicável à revogação da liberdade condicional):
“(…)
III A notificação ao condenado do despacho de revogação da suspensão da pena pode assumir tanto a via de “contacto pessoal” como a “via postal registada, por meio de carta ou aviso registado” ou, mesmo, a “via postal simples, por meio de carta ou aviso “(artigo 113º, nº 1, alíneas a), b), c) e d) do Código de Processo Penal”
A segunda, para enfatizar que todas as notificações foram enviadas para a morada indicada pelo requerente, estando este obrigado a informar o Tribunal de uma eventual mudança de residência, o que nunca aconteceu.
E a última, para recordar que, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 185º do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade e no que concerne à presença do requerente na diligência agendada para a sua audição: “A falta injustificada do condenado vale como efetiva audição para todos os efeitos legais.”
Face a todo o exposto e em conclusão, a presente providência de habeas corpus é manifestamente improcedente
3.3. Tributação e sanção processual
Nos termos do disposto nos artigos 524º do Código de Processo Penal e 8º, nº 9, do Regulamento das Custas Judiciais e da sua Tabela III anexa, o requerente deve ser condenado em custas, variando a taxa de justiça entre 1 e 5 unidades de conta (UC).
Face à não complexidade do processo fixa-se essa taxa de justiça em 2 (duas) Unidades de Conta
Por outro lado, a rejeição do requerimento por manifesta falta de fundamento implica ainda a condenação do requerente no pagamento de uma importância entre 6 e 30 UC (que não são meras custas judiciais, tendo antes natureza sancionatória), por força do disposto no artigo 223º, nº 6, do Código de Processo Penal.
Com efeito, são cumulativas a condenação em custas do incidente e em sanção, no caso de pedido manifestamente infundado, pois elas visam propósitos diferentes: uma tributa o decaimento num ato processual a que deu causa e a outra censura a apresentação de requerimento sem a prudência ou diligência exigíveis (Salvador da Costa, As custas Processuais, Coimbra: Almedina, 6.ª ed., 2017, p. 86).
Atendendo, por um lado, à pouca complexidade do objeto da decisão e, por outro, à manifesta improcedência do requerimento, considera-se ajustado fixar essa importância em 6 (seis) unidades de conta.
4 - DECISÃO
Face a todo o exposto, decide-se:
a. Indeferir a providência de habeas corpus, apresentada por AA, por manifesta falta de fundamento legal, nos termos do disposto no artigo 223º nº 4, al. a) do Código de Processo Penal;
b. Condenar o mesmo requerente nas custas do processo, nos termos do disposto nos artigos 524º do Código de Processo Penal e 8º, nº 9, do Regulamento das Custas Judiciais e da sua Tabela III anexa, fixando-se a taxa de justiça em 2 (duas) unidades de conta;
c. Condenar ainda o requerente na sanção processual prevista no artigo 223º, nº 6 do Código de Processo Penal, fixando-se o seu quantitativo em 6 (seis) unidades de conta.
Supremo Tribunal de Justiça, d.s. certificada
Os Juízes Conselheiros,
Celso Manata (Relator)
Jorge Bravo (1º Adjunto)
Albertina Pereira (2ª Ajunta)
Fernando Batista (Presidente da Secção)
_________________________________________
1. Nessa informação começa por se afirmar que o requerente foi condenado na pena de 11 meses de prisão. Tal constitui um óbvio lapso, sendo evidente que, face ao demais informado, o que se pretendia informar era que o requerente foi condenado em 11 anos de prisão. Assim e como o Requerente não fundamenta o seu pedido na ultrapassagem do prazo da prisão e para não provocar atraso no processo, optou-se por não se solicitar a confirmação de que se trata de um lapso o qual, consignando-se, contudo, esta explicação.↩︎
2. José Gomes Canotilho e Vital Moreira, “Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2007, p. 508” e Jorge Miranda e Rui Medeiros “Constituição Portuguesa Anotada, Vol. I, pág. 503 e sgs. e Germano Marques da Costa, “Curso de Processo Penal” II, pág. 321↩︎
3. Por todos Ac. do STJ de 10 de maio de 2023 – Proc. 196/20.5JAAVR-B.S1 in www.dgsi.pt↩︎
4. “Comentário ao Código de Processo Penal à luz da Constituição da República Portuguesa e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem” 5ª edição, vol. II, págs. 962 e sgs..↩︎
5. Acresce que uma das regras de conduta imposta ao requerente (Regra b)) consistia em “apresentar-se no prazo de 8 (oito) dias, contados da data da sua libertação, e posteriormente, com a periodicidade e no local que lhe sejam determinados, à equipa da DGRSP”↩︎
6. A este propósito a DGRSP informou que o tentou fazer em diversos dias e momentos e que os resultados foram sempre infrutíferos dado que os resultados obtidos foram os seguintes: “.......49-voice mail; .......74- Não atende; .......17-voice mail; .......90-sem tocar/desliga; .......40-não está atribuído e .......41-sem tocar/desliga”.↩︎
7. Publicado no Diário da República, I série, nº 29, de 10 de fevereiro de 2011↩︎