I. Ao ponderar o grau de culpa do trabalhador importa considerar sempre a situação concreta em que o mesmo tem de executar o seu trabalho, atendendo, designadamente, à extensão das tarefas que lhe são atribuídas e à deficiente cooperação do credor.
II. O nosso ordenamento jurídico não conhece um despedimento disciplinar fundado na mera perda da confiança, desacompanhada de um qualquer comportamento grave por parte do trabalhador, isto é, de uma infração disciplinar grave.
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça,
Relatório
AA intentou a presente ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, prevista nos artigos 98.º-B e ss. do Código de Processo de Trabalho contra Centro Social e Paroquial de ....
Não tendo sido possível a conciliação, a Ré apresentou articulado a fundamentar o despedimento e juntou cópia do procedimento disciplinar.
A Autora contestou e deduziu reconvenção, formulando os seguintes pedidos:
“TERMOS EM QUE
a) Deve a presente ação de Impugnação Judicial da Regularidade e Licitude do Despedimento ser julgada procedente, por provada e, em consequência;
b) Deverá ser declarado ilícito o despedimento, com justa causa, invocado pela Ré.
c) Deverá a Ré ser condenada a reintegrar a Autora, na mesma função e categoria profissional.
d) Pedido reconvencional: Deve ser declarado nulo o processo disciplinar com decisão aplicada em 25.12.2021, cuja sanção aplicada à A. foi a de repreensão registada.
e) Ao declarar-se nulo o processo disciplinar referido na alínea anterior, deverá ser declarada nula a sanção aplicada e ser a mesma apagada do registo disciplinar da A.
f) Deverá a Ré ser condenada a pagar à Autora as retribuições que a A. deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal que declare a ilicitude do despedimento, nos atermos do disposto no artigo 390º do Código do Trabalho.
g) Deverá a Ré ser condenada a entregar à Segurança Social o valor respeitante a subsídio de desemprego pago à Autora.
h) Deverá a Ré ser condenada ainda em custas do processo (incluindo custas de parte)
i) Deverá ser julgada improcedente a pretensão da Ré de oposição à reintegração da A. no seu posto de trabalho”.
A Ré respondeu ao articulado da Autora, propugnando pela inadmissibilidade da reconvenção e subsidiariamente pela sua absolvição do pedido reconvencional.
Foi proferido despacho saneador, no qual foi admitida reconvenção.
Realizada a audiência de julgamento, em 5.07.2023, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
“Por tudo quanto se deixou exposto, o tribunal julga procedente a ação, improcedente o pedido reconvencional e, em consequência:
a) condena a entidade empregadora a reintegrar a trabalhadora no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
b) condena a entidade empregadora a pagar à trabalhadora, desde 24 de Outubro de 2022 e até ao trânsito em julgado da presente sentença, o valor das retribuições que a trabalhadora deixou de auferir, à razão mensal de € 1.937,00, acrescidas do subsídio de coordenação, no valor mensal de € 160,00, sendo que, nessas retribuições se incluem as de férias, de subsídio de férias e de subsídio de Natal, embora neste último se não compute o subsídio de coordenação, sem prejuízo da dedução a que alude a al. c) do n.º 2 do art. 390.º que a entidade empregadora deverá entregar na Segurança Social, tudo conforme se vier a liquidar em sede de incidente de liquidação prévio à execução de sentença, sendo que os juros de mora apenas serão devidos após efetiva liquidação;
c) absolve a entidade empregadora do pedido reconvencional”.
A Ré interpôs recurso de apelação.
Por acórdão de 20.03.2024, os Juízes do Tribunal da Relação, com um voto de vencido, acordaram em julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença recorrida.
Ainda inconformada, a Ré veio interpor recurso de revista.
Nesse recurso sustenta que “os factos provados na primeira instância mostram que a Autora violou deveres laborais cuja gravidade impõe a sanção disciplinar máxima” (Conclusão 7) e que no próprio Acórdão recorrido se reconhece a existência de “violação do dever de lealdade (p.287 e ss.), violação do dever de zelo e diligência na execução do trabalho (p.290, 291 e 297), violação do dever de obediência (p.303), desinteresse ou mesmo desleixo no desempenho das suas funções (p.311)”, traduzindo-se nas seguintes infrações “reconhecidas pela Relação (p.321): i) incorreta faturação, no mês de abril de 2022, do pagamento da comparticipação da utente BB; ii) Divergência entre o valor contratualizado e o valor cobrado da mensalidade da utente CC ; iii) Elevado numero de processos individuais de utentes com as omissões descritas no ponto 3.2.4.; iv) Instrumentos contratuais de utentes assinados com recurso a impressão digital, sem qualquer outra menção; v) A não inclusão de dois utentes em lista de espera; vi) A omissão de comunicação à segurança social, do numero de NISS dos utentes, sabendo a trabalhadora da existência dessa recomendação” (Conclusão 9). Afirma-se que existe uma impossibilidade de subsistência da relação laboral (Conclusão 15) e uma perda de confiança do empregador na trabalhadora (Conclusões 31 e 40). E concluía pedindo a revogação do Acórdão recorrido.
A Autora apresentou contra-alegações.
Em cumprimento do disposto no artigo 87.º n.º 3 do Código do Processo do Trabalho o Ministério Público emitiu Parecer no sentido da improcedência do recurso.
Fundamentação
De Facto
Considera-se reproduzida para todos os efeitos legais a matéria de facto dada como provada nas instâncias e constante mormente de ff. 28 a 103 do Acórdão recorrido.
De Direito
Como se pode ler nas próprias alegações do recurso de revista, “a questão central é a de saber se os comportamentos imputados à Autora, no quadro factual apurado nas instâncias, constituem justa causa de despedimento” (Conclusão 24).
Da nota de culpa inicial (houve uma nota de culpa adicional) constava uma acusação referente a uma denúncia da qualidade da alimentação na cantina feita pela trabalhadora. Pode ler-se, designadamente, nos números 18 a 33 que a trabalhadora, sem que isso fosse da sua competência tirou fotografias aos alimentos, depois de questionar a proveniência dos mesmos e “quando a carne tinha vindo” (n.º 30), pondo em causa o profissionalismo da ... (n.º 32) que se sentiu ofendida (n.º 33). Atribui-se-lhe também a autoria de uma carta anónima dirigida ao administrador diocesano (n.º 90), carta essa em que se afirmava “que os idosos comem em tigelas descartáveis que deveriam ser deitadas fora, mas são reutilizadas pela escassez de loiça; que estiveram meses à espera de atoalhados para poder higienizar os idosos condignamente; que existe uma grande falta de cuidado no trato para com os trabalhadores pela ... de Serviços; que há falta de comida a tempo e horas para utentes e funcionários; sopa aguada com poucos legumes, queimada que não se consegue comer, má confeção dos alimentos, frango confecionado e posteriormente congelado para servir de novo; tudo atempadamente comunicado à ... de Serviço”.
Antes de mais sublinhe-se que a autoria da carta anónima não foi na realidade comprovada. Mas pergunta-se, sendo certo que a denúncia não foi feita, por exemplo, aos media, mas ao responsável pela organização será uma infração disciplinar? A trabalhadora que tinha como uma das suas funções a cantina social não tinha o direito de se preocupar legitimamente com a qualidade dos alimentos que ela própria e os utentes da instituição, pessoas particularmente vulneráveis, consumiam? Há, pois, que entender que não existe aqui qualquer infração e muito menos justa causa de despedimento.
Na nota de culpa dá-se também relevância ao facto de quando lhe foi comunicada a decisão de despedimento a trabalhadora ter levado consigo um tablet que não lhe pertencia e que só devolveu passados dias. Mas como também foi dado como provado que podia usar esse tablet para fins pessoais (facto 55), compreende-se perfeitamente que o tenha levado para “limpar” e copiar informações pessoais e só o tenha devolvido posteriormente.
Também não se pode atribuir qualquer relevância ao facto de terem sido encontradas chaves cuja existência a trabalhadora não comunicou e que aparentemente não se sabia que existiam…
A trabalhadora é acusada de várias desobediências. Não podemos, contudo, deixar de apontar que algumas dificilmente podem ser consideradas infrações disciplinares.
Assim, por exemplo, relativamente à insistência da direção em que a trabalhadora justificasse perante a família de uma utente o eventual desaparecimento de 15 euros que terão sumido quando a roupa suja foi a lavar (factos 63 e seguintes), a trabalhadora deu uma resposta cabal e que reputamos satisfatória ao afirmar, quando confrontada com um email da ... de Serviços que exigia “uma resposta concreta, concisa e sem margem de erro” (facto 68), que “a ser mais incisiva [a resposta] será melhor solicitar apoio do nosso departamento jurídico, pois não domino os diversos pontos que aponta” (facto 69). A sugestão da trabalhadora era perfeitamente razoável, tendo em conta as suas qualificações profissionais, mas não foi atendida.
Do ponto 25 dos factos provados resulta que a trabalhadora desempenhava as seguintes funções:
- relação com os serviços de Segurança Social, a qualquer nível;
- relação com os Serviços de Ação Social das Autarquias Locais;
- relação com as instituições congéneres;
- relação com os serviços de apoio social das paróquias da área de ação da entidade empregadora;
- relação com os coordenadores dos outros sectores da entidade empregadora;
- organização e gestão processual dos utentes e suas famílias das valências sénior, cantina social, POAMC, e outras intervenções, bem como com os utentes de outras valências ou trabalhadores;
- relação com o corpo clínico da entidade empregadora e farmácia;
- atendimento social em situações de emergência.
No relatório do instrutor pode ler-se, designadamente, que “a trabalhadora arguida, que é a ... e única responsável pela valência sénior e consequentemente pela tramitação e organização dos processos dos utentes”.
Nesse relatório final (cfr. facto 23) refere-se, designadamente, o seguinte:
“79. Da análise processual realizada, foi constatado pelas Técnicas do ISS IP:
a) Incumprimento na determinação do valor do RPC;
b) Não é procedida à atualização anual das comparticipações familiares, de acordo com a documentação inerente ao cálculo das comparticipações familiares, que deveria ser anualmente solicitada aos utentes, nos termos do Anexo à Portaria 196-A/2015, na sua redação atual;
c) Divergência entre os valores apurados, em sede de folha de cálculo, no contrato de prestação de serviços e valores faturados;
d) Irregularidades nos contratos de prestação de serviços, quando à atualização, valor e assinaturas pelos clientes ou assinatura da ... Técnica em detrimento da assinatura da Direção, como é previsto pela Instituição;
e) Discrepância relativamente ao registo dos serviços contratualizados/prestados aos utentes; em alguns casos, verifica-se maior prestação de serviços ao fim de semana a utentes inscritos numa vaga comparticipada a 5 dias, e menos serviços ao fim de semana a utentes inscritos numa vaga comparticipada a 7 dias;
f) Deverá a ... Técnica acautelar o processo de gestão da responsabilidade pelo acesso à chave do domicílio do cliente;
g) Deverá haver procedimentos de registos de responsabilidade sobre a preparação da medicação a administrar aos utentes nos domicílios;
h) O livro de ocorrências deve ser devidamente paginado e assinado diariamente pela ... Técnica;
i) Nos contratos de prestação de serviço devem ser observáveis discriminadamente os serviços contratualizados e respetivas percentagens aplicadas no cálculo do valor da comparticipação familiar.
80. Na sequência da ação de acompanhamento, foram imputadas à Entidade Empregadora as seguintes irregularidades:
g) Incumprimento a determinação das comparticipações familiares;
h) Não é feita a publicitação dos apoios financeiros da segurança social, nem do período de funcionamento e horário de atendimento;
i) Afixação incorreta da tabela da comparticipação familiar;
81. Todas as irregularidades supra indicadas são da responsabilidade da Trabalhadora Arguida, por a execução de todas as tarefas se enquadrar nas suas funções.”
A ilação retirada no ponto 81 é, no entanto, incorreta. As irregularidades apontadas não são necessariamente imputáveis a uma conduta culposa do trabalhador, bem podendo resultar – ou resultar também – de outros fatores como a deficiente organização dos serviços, a igualmente deficiente supervisão do trabalho e a falta de cooperação adequada pelo credor.
Já fizemos referência ao extenso elenco de funções que era atribuído à trabalhadora e que lhe incumbiam em exclusivo. Recorde-se que a doutrina tem sublinhado que uma técnica de assédio consiste na atribuição de um elenco tão vasto de funções que será quase fatal a ocorrência de erros e omissões pelo trabalhador. Importa, pois, ao ponderar o grau de culpa do trabalhador considerar sempre a situação concreta em que o mesmo tem de executar o seu trabalho.
A este respeito transcreve-se uma passagem – aliás também transcrita no Acórdão recorrido – da sentença de 1.ª instância que reputamos exata e esclarecedora:
“Tratava-se de tarefa a cargo da trabalhadora que de todo se justifica a não ser com o elevadíssimo volume de trabalho que tinha a seu cargo evidenciado não apenas também pelas inúmeras omissões que lhe foram imputadas – perguntou-se muitas vezes o tribunal, perante tanto inexato comportamento imputado, referente a tantas tarefas, a tantas respostas, como conseguiria a trabalhadora, sozinha, porque era a única ... Técnica, fazer tudo e bem – mas também por todo o elenco constante dos pontos 7. e 8. É um elenco extensíssimo de funções que se projeta não apenas na relação com a empregadora, mas, de sobremaneira, com os utentes e familiares das várias respostas sociais da empregadora – cuja colaboração será, seguramente, imprescindível e nunca que por nunca se diz que esta colaboração existia ao invés de ser a trabalhadora a ter que insistentemente a solicitá-la – e com organismos públicos, como seja a Segurança Social.
De todo o modo se dirá, também, neste conspecto e sem prejuízo da gravidade que dos factos avulta, o seguinte: os factos em apreço, cuja responsabilidade se assaca à trabalhadora, reportam-se, praticamente todos eles, a instrumentos contratuais subscritos pela entidade empregadora. E sendo assim, como é, é para nós evidente que, à revelia do que deveria ser, aparentemente a entidade empregadora não se importava nada com o facto de assinar um documento temporalmente desfasado do momento em que o fariam o utente e/ou familiares/cuidadores.
Ora, há, também, aqui, a par da conduta da trabalhadora, que aparentemente seria a responsável pela recolha das assinaturas dos contratos, um importante desleixo da entidade empregadora, pois que deveria ser ela a primeira a não subscrever um instrumento contratual imperfeito, na medida em que seguramente assinado a dois tempos.
Compreende-se que se trate de uma questão de facilidade e até de confiança depositada na trabalhadora.
De todo o modo o que não pode é consentir-se que a entidade empregadora se demita, neste assunto, de qualquer responsabilidade, como se a trabalhadora fosse, neste caso, a única responsável pela ausência de assinatura de vasta documentação. Aliás, neste, como noutros casos, a entidade empregadora parece demitir-se, por completo, do dever de fiscalização, escudando-se, no caso, pela elevada componente de autonomia que era dada à trabalhadora e na confiança que era em si depositada, mas que, estranhamente, só se coloca em causa e descobre aquando da sua suspensão”.
Concorda-se, inteiramente, com esta análise e com a argumentação exposta.
O extensíssimo rol de infrações que é imputado à trabalhadora – recorde-se que a nota de culpa foi seguida de uma nota de culpa adicional – é composto, como o Acórdão recorrido bem sublinha, por muitas infrações de reduzida gravidade, até pelas suas consequências. Há, por exemplo, a acusação de frequentes erros de cálculo (nota de culpa adicional, n.º 3 alíneas b) a l), n.º 5 alínea a); n.º 8) e da existência de utentes admitidos sem contrato escrito ou sem contrato assinado (nota de culpa adicional, n.º 4). Quanto aos erros de cálculo das mensalidades e atualizações não se vislumbra culpa grave na sua ocorrência, atendendo, como se disse, ao volume de trabalho da Autora. A falta de assinatura de certos contratos representa uma violação do dever de zelo, mas mais uma vez, como também se disse na sentença, pode e deve questionar-se se a direção do empregador não se devia ter interessado diretamente na assinatura de tais contratos e na supervisão tempestiva da atividade da trabalhadora.
Há, de resto, acusações que mal se compreendem: assim, por exemplo, a de a trabalhadora ter solicitado uma junta médica de revisão da incapacidade de uma utente da qual resultou o seu indeferimento e a perda do complemento que a utente auferia (números 18 a 22 da nota de culpa adicional) com a subsequente queixa dos seus familiares – mas não há um interesse público em que a Segurança Social pague aquilo a que a lei a obriga, mas não mais do que isso?
Há, pois, que dar razão ao Acórdão recorrido quando concluiu não existir justa causa para o despedimento da trabalhadora o que, nos termos da lei, acarreta a sua ilicitude.
Nas suas alegações de recurso, o empregador aduz, todavia, que perdeu a confiança na trabalhadora. Mas o nosso ordenamento jurídico não conhece um despedimento disciplinar fundado na mera perda da confiança, desacompanhada de um qualquer comportamento grave por parte do trabalhador, isto é, de uma infração disciplinar grave que, no caso dos autos, não existiu. A Recorrente invoca vários Acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça em que efetivamente se atribuiu relevo à perda de confiança do empregador, mas quando esta resultava da violação comprovada de deveres de honestidade ou probidade pelo trabalhador (que, por exemplo, se apoderara intencionalmente de uma quantia em dinheiro ou não entregara o produto da venda de bilhetes), o que nada tem de similar com o caso dos autos. Com efeito, muito embora a nota de culpa chegue ao ponto de acusar a Autora da violação do dever de honestidade, a verdade é que nem sequer remotamente se provou a violação desse dever.
Nas conclusões do seu recurso de revista – e são as conclusões do recurso que delimitam o seu objeto, sem prejuízo de questões de que o Tribunal deve conhecer oficiosamente – a Recorrente, ao contrário do que ocorreu no recurso de apelação, não desenvolve expressamente, em rigor, a questão da sua oposição à reintegração, pelo que dir-se-ia que não haveria que conhecer da mesma. Mas na Conclusão 12, ao descrever o conteúdo do seu recurso de apelação, afirma que “a terceira vertente do recurso [de apelação] foi declarada improcedente, por ter sido entendido que a trabalhadora não desempenhava um cargo de Direção, pelo que não poderia, à luz do disposto no artigo 392.º do Código do Trabalho, ser excluída a reintegração no Réu que não é uma microempresa”, acrescentando na Conclusão 13, “Conclusão a nosso ver contraditória com a fundamentação que a precedeu, já que no caso sub judice as infrações comprovadamente praticadas pela trabalhadora, o processo disciplinar e o processo judicial subsequente deterioram as já difíceis relações pessoais, como a primeira instância e a Relação frisaram em vários trechos dos respetivos arestos”. Face, sobretudo, à Conclusão 13, e ainda que esta questão não tenha sido tratada nas alegações de recurso, conhecer-se-á da mesma.
O artigo 392.º n.º 1 do CT permite ao empregador que se oponha à reintegração “em caso de microempresa ou de trabalhador que ocupe cargo de administração ou de direção (…) com fundamento em factos e circunstâncias que tornem o regresso do trabalhador gravemente prejudicial e perturbador do funcionamento da empresa”. Não estando, no caso vertente, perante uma microempresa (facto 4: a empregadora tem cerca de 70 trabalhadores ao seu serviço), importa, em primeiro lugar, questionarmo-nos sobre se a trabalhadora ocupava um cargo de administração ou direção. Para o efeito não pode atribuir-se importância decisiva ao nome ou designação do seu cargo – se numa empresa o único trabalhador encarregado da limpeza das instalações for designado de “diretor da salubridade” nem por isso a norma terá aplicação. No caso dos autos a trabalhadora desempenhava as funções de ... técnica na valência sénior (facto 8 j), mas não coordenava ou superentendia, não dirigia, ninguém. De qualquer modo o empregador não conseguiu alegar e provar o prejuízo grave e a especial perturbação que resultarão da reintegração da trabalhadora. Algum conflito é praticamente imanente a todo o ambiente laboral, quando não a todo o ambiente humano, e o desagrado de uma ... suscetível e de uma diretora de serviços muito ciosa das suas competências não parece constituir um obstáculo atendível à reintegração.
Decisão: Negada a revista, confirmando-se o Acórdão recorrido.
Custas pela Recorrente.
Lisboa, 25 de setembro de 2024
Júlio Gomes (Relator)
José Eduardo Sapateiro
Domingos José de Morais