COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS
RECONVENÇÃO
EMBARGOS DE EXECUTADO
Sumário

- a dedução de reconvenção tendo por objeto o reconhecimento de um crédito para obter compensação tem carácter necessário relativamente aos embargos de executado, embora não preclusivo do exercício autónomo do direito;
- por via disso, o contracrédito sobre o Exequente apenas pode ser fundamento de oposição à execução baseada em sentença se esse contracrédito se alicerçar em factos supervenientes ao momento de apresentação da defesa na ação declarativa.
(Sumário da Relatora)

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Évora

I – As Partes e o Litígio

Recorrente / Embargada: (…) – (…), (…), Representações, Importação e Exportação, SA
Recorrida / Embargante: (…) – (…), Operações, Actividades e Serviço Aéreo, Lda.

Por apenso à ação executiva para pagamento do montante de € 169.937,76 decorrente de sentença judicial, a Executada apresentou-se a deduzir embargos pedindo que seja reconhecida a compensação do seu crédito, no montante de € 14.253,00, sobre o crédito da Exequente, crédito esse que se encontra totalmente liquidado pela entrega do remanescente, no montante de € 155.683,84.
Pugna, portanto, pela extinção da execução.
Em sede de contestação, a Embargada alega que a Embargante podia ter invocado o seu crédito, fazendo operar a compensação, na ação declarativa cuja sentença constitui título executivo; não o tendo feito, não lhe assiste o direito a embargar com esse fundamento, está impedida de realizar a compensação mediante embargos de executado. Mais alega a prescrição de parte do crédito invocado, pelo que a compensação, a admitir-se, só há de operar pelo montante de € 9.175,65.

II – O Objeto do Recurso
Decorridos os trâmites processuais documentados nos autos, foi proferida sentença julgando os embargos parcialmente procedentes, decidindo-se:
«a) Julgar os embargos de executado parcialmente procedentes por provados, considerando-se válida e operante a compensação de créditos efetuada pela executada no montante de € 9.175,65, em consequência a execução deverá prosseguir os seus trâmites normais para cobrança do remanescente ainda em dívida, o que se determina;
b) Condenar a Embargante/executada «(…) – (…), Operações, Actividades e Serviços Aéreos, Lda.» e a Embargada/exequente «(…) – (…) e (…), Representações, Importação e Exportação, SA», no pagamento das custas e demais encargos com o processo, na proporção dos respetivos decaimentos, 35,63% e 64,37%, respetivamente.»
Inconformada, a Embargada apresentou-se a recorrer, pugnando pela revogação da decisão recorrida. As conclusões da alegação do recurso são as seguintes:
«1. O thema decidendum dos presentes autos trata-se de uma questão de direito e não de facto, prendendo-se exatamente com a questão de saber se a compensação alegada exclusivamente em sede de embargos de executado quanto a título executivo que é uma sentença transitada em julgado é admissível.
2. Após prolação de sentença de condenação da Recorrida no pagamento de € 161.361,30, e do transitado em julgado de tal decisão, veio a Recorrida efetuar compensação de créditos que alegadamente possuía perante a Recorrente no valor de € 14.253,92.
3. Em sede de ação declarativa a Recorrente nunca alegou qualquer crédito nem invocou a sua compensação.
4. A ação declarativa em causa correu sob a forma de processo comum e não se verificavam quaisquer impedimentos à dedução de reconvenção com vista à invocação da compensação.
5. Apenas em sede de embargos de executado veio a Recorrida invocar compensação, não obstante o facto de todos os requisitos à sua invocação se encontrarem preenchidos à data de dedução da contestação em sede de ação declarativa.
6. No processo civil vigora o princípio da concentração da defesa, segundo o qual toda a defesa do Réu deve ser apresentada em sede de contestação.
7. Acresce que, o processo executivo atribui uma especial força e importância ao título executivo sentença em virtude de este se encontrar dotado de uma especial estabilidade da situação jurídica subjacente devido à circunstância de ter sido objeto de apreciação judicial anterior.
8. Tal força é esvaziada pela tese vertida na sentença em crise, segundo a qual a Recorrida poderia livremente alegar compensação de créditos em sede de embargos de executado.
9. A seguir tal tese, de pouco ou nada vale o título executivo sentença, da mesma forma que de pouco ou nada vale o princípio da concentração da defesa em sede de ação declarativa.
10. É jurisprudencialmente pacífico e unânime que a alínea h) do artigo 729.º do CPC deve ser articulada com o artigo 266.º, n.º 2, alínea c), do CPC.
11. Por outro lado, a sentença em crise deve ser declarada nula em virtude do vício de omissão de fundamentação nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.
12. Com efeito, em momento algum da sentença o Tribunal a quo esclarece por que razão entende que não era possível à Recorrida a dedução de reconvenção para alegação de compensação.
13. O Douto Tribunal a quo refere apenas, de forma manifestamente conclusiva que a seu ver não era legalmente admissível a dedução de reconvenção.
14. Não alude a qualquer normativo legal, interpretação jurídica ou corrente jurisprudencial sobre a motivação de fundo que levou o Tribunal a concluir que a dedução de reconvenção não era admissível.
15. Aliás, o Tribunal a quo não alude sequer aos requisitos e pressupostos que se devem encontrar preenchidos para a dedução de reconvenção.
16. E muito menos refere qual o pressuposto cujo preenchimento se encontra em falta para que possa ser possível pugnar pela inadmissibilidade legal de dedução de reconvenção em sede de ação declarativa.
17. Os processos correm ambos sobre a forma de processo comum, as partes no processo são igualmente as partes da relação material alegada em sede de compensação, e o Tribunal no qual a Recorrente, intentou a ação declarativa era competente em razão da hierarquia e da matéria, pelo que é incompreensível por que razão o Douto Tribunal a quo defende que a reconvenção não era admissível.
18. O dever de fundamentação das decisões é uma garantia para os seus destinatários da legalidade e transparência do processo de tomada de decisão.
19. A total omissão de fundamentação fere ainda o direito de defesa da Recorrente uma vez que impede o seu pleno exercício ao subtrair-lhe a possibilidade de compreender e escrutinar a os fundamentos de direito e de facto em que se funda a decisão.
20. Por último, a jurisprudência tem vindo a entender que, para que a compensação possa operar contra um crédito judicialmente reconhecido e com força executiva esse mesmo crédito compensatório deve possuir força executiva, pois de outra forma haveria uma violação do princípio da igualdade de armas e de igualdade das partes ao permitir-se ao Executado o que não se permite ao Exequente.
21. Deste modo, ainda que se entenda que a operação da compensação seria possível em sede de embargos de executado, apesar de ter sido precludida em sede de contestação em ação declarativa, o que apenas se concede para efeitos de raciocínio, jamais um crédito judicialmente reconhecido e com força executiva poderia ser compensado por outro que não mereceu qualquer apreciação judicial e, portanto, não beneficia de força executiva.»

A Recorrida apresentou contra-alegações sustentando que o recurso deverá ser julgado improcedente, mantendo-se a decisão recorrida, já que a compensação em sede de embargos de executado tem cabimento por força do disposto no artigo 729.º, alínea h), do CPC, sendo certo que não lhe assistia o direito processual de invocar a compensação na ação declarativa, que porque a causa de pedir é distinta da que suportava a ação, quer porque só com a prolação da sentença naquela ação é que nasceu o crédito da embargada, não podendo, antes disso, ser-lhe contraposto o seu crédito.
O Tribunal de 1.ª Instância consignou que a sentença não enferma da nulidade invocada, exarando que, perante a configuração da ação declarativa, os seus fundamentos e o pedido nela formulado, não podia ter lugar reconvenção para obter pagamento de faturas relativas a fornecimentos de bens e serviços, porquanto a situação não se enquadra m qualquer umas das alíneas do n.º 2 do artigo 266.º do Código de Processo Civil.

Cumpre conhecer das seguintes questões:
i) Da nulidade da sentença;
ii) do desacerto da decisão de compensação de créditos em sede de embargos de executado, sendo o título executivo uma sentença judicial, não sendo supervenientes os factos donde decorre do crédito da Embargante.

III – Fundamentos
A – Os factos provados em 1.ª Instância
1. A exequente «(…) – (…), (…), Representações, Importação e Exportação, S.A.» em 10/03/2023, intentou a execução contra «(…) – (…), Operações, Actividades e Serviços Aéreos, Lda.» apresentando como título executivo o douto acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Évora, datado de 11/02/2021, proferido nos autos n.º 2737/19.1T8FAR em cujo segmento decisório consta, além do mais “IV. Dispositivo: Delibera-se, pelo exposto, na procedência parcial do recurso, em: (...) b) Condenar (…) – (…), Operações, Atividades e Serviços Aéreos, Lda. a para a (…) – (…) e (…), Representações, Importação e Exportação, S.A., a quantia de € 161.361,30, acrescida de juros, a contar da presente data e até integral pagamento, absolvendo-a do remanescente do pedido c) Manter, no mais, a decisão recorrida (...)”;
2. A Embargante/executada “(…) – (…), Operações, Actividade e Serviços Aéreos, Lda.” subscreveu e remeteu à Embargada/exequente «(…) – (…) e (…), Representações, Importação e Exportação, SA», por via postal registada com aviso de receção, a missiva cuja cópia faz fls. destes autos, no essencial com o seguinte teor “...(…), 07 de junho de 2022. Exmos. Senhores. Em Cumprimento do acórdão proferido no processo n.º 2737/19.1T8FAR que correu termos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que condenou a (…) a pagar a V. Exa. a indemnização de 161.361,30 euros, junto enviamos o cheque n.º (…), sacado sobre o Banco (…) no montante de € 155.683,84 para liquidação de toda a nossa responsabilidade, depois de efetuadas as operações de compensação de todos os respetivos créditos e débitos de ambas as empresas. Junto se remete ainda em anexo nota explicativa das operações de cálculo que suportam o montante líquido do presente pagamento (...)”;
3. A exequente recebeu o montante titulado pelo cheque n.º … (€ 155.683,84);
4. A Embargada/exequente forneceu à Embargante/executada bens e serviços, emitindo a fatura n.º (…), no valor de € 4.671,24, com data de vencimento em 31/11/2014, a fatura n.º (…), no valor de € 2.478,11, com data de vencimento em 20/12/2014, a fatura n.º (…), no valor de € 14.035,78, com data de vencimento em 02/03/2015, a fatura n.º (…), no valor de € 14.321,73, com data de vencimento em 23/08/2015, a fatura n.º (…), no valor de € 1.696,32, com data de vencimento em 03/09/2015, a fatura n.º (…), no valor de € 659,32, com data de vencimento em 14/09/2015 e a fatura n.º (…), no valor de € 757,29, com data de vencimento em 30/11/2016;
5. A Embargante/executada forneceu à Embargada/exequente bens e serviços, emitindo a fatura n.º (…), no valor de € 25.034,37, com data de vencimento em 22/07/2014, a fatura n.º (…), no valor de € 504,30, com data de vencimento em 31/05/2016 e a fatura n.º (…), no valor de € 26.157,18, com data de vencimento em 28/12/2018.

B – As questões do Recurso
i) Da nulidade da sentença
A Recorrente sustenta que a sentença enferma de nulidade por falta de fundamentação já que não indica as razões que alicerçam a afirmação de que a compensação dos créditos não podia ter sido invocada na ação declarativa.
Nos termos do disposto no artigo 154.º/1, do CPC, as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas. O artigo 205.º/1, da Constituição da República Portuguesa, por sua vez, determina que as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.
Na senda deste regime legal, o artigo 615.º/1, alínea b), do CPC estatui que é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
Ora, vem sendo unanimemente entendido, na doutrina e na jurisprudência, que só a ausência absoluta de fundamentação, que não uma fundamentação escassa, deficiente, ou mesmo medíocre, pode ser geradora da nulidade das decisões judiciais.[1] A deficiente fundamentação ou motivação pode afetar o valor doutrinal intrínseco da sentença ou acórdão, mas não pode nem deve ser arvorada em causa de nulidade dos mesmos.[2] Só enferma de nulidade a sentença em que se verifique a falta absoluta de fundamentos, seja de facto, seja de direito, que justifiquem a decisão.
Só a falta de concretização dos factos provados que servem de base à decisão, permite que seja deduzida a nulidade da sentença/acórdão.[3] Por outro lado, o não atendimento de um facto que se encontre provado ou a consideração de algum facto que não devesse ser atendido não se traduzem em vícios formais da sentença, dado que tais factos não constituem, por si, uma questão a resolver nos termos do artigo 608.º, n.º 2, do CPC. Reconduzem-se antes a erros de julgamento passíveis de ser superados nos termos do artigo 607.º, n.º 4, 2.ª parte, do CPC.[4]
Por conseguinte, não enferma de nulidade a decisão em que a motivação é deficiente.
Quanto à fundamentação de direito, “o julgador não tem de analisar todas as razões jurídicas que cada uma das partes invoque em abono das suas posições, embora lhe incumba resolver todas as questões suscitadas pelas partes: a fundamentação da sentença/acórdão contenta-se com a indicação das razões jurídicas que servem de apoio à solução adotada pelo julgador.”[5]
Tendo sido exarado que, “considerando a configuração da ação onde foi proferida a decisão que serve de título executivo (…) não era legalmente admissível a dedução de reconvenção (…) com fundamento nos créditos emergentes das faturas emitidas e relativas a fornecimentos de bens e serviços”[6], afigura-se não ser a sentença desprovida de fundamentação de direito. Daquele trecho infere-se que se entendeu não se enquadrar a situação fáctica nas hipóteses previstas nas alíneas do n.º 2 do artigo 266.º do CPC, o que sustentou a admissão da compensação dos créditos nos embargos de executado.
Termos em que se conclui não enfermar a sentença da apontada nulidade.

ii) Do desacerto da decisão de compensação de créditos em sede de embargos de executado, sendo o título executivo uma sentença judicial, não sendo supervenientes os factos donde decorre do crédito da Embargante
Nos termos do disposto no artigo 729.º, alínea h), do CPC, fundando-se a execução em sentença, a oposição mediante embargos de executado pode ter fundamento em contracrédito sobre o exequente, com vista a obter a compensação de créditos. Já a alínea precedente determina que pode ter fundamento em qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento (…).
Tal regime foi introduzido no CPC de 2013, a par da alteração introduzida à alínea c) do n.º 2 do artigo 266.º do CPC, que passou a determinar que a reconvenção é admissível quando o réu pretende o reconhecimento de um crédito, seja para obter a compensação seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor.
Assim:
«a) Se o réu, no momento em que contesta na ação declarativa, estiver em condições de invocar crédito de que seja titular sobre o autor, deverá fazê-lo por via reconvencional, assegurando sua apreciação e o (eventual) reconhecimento nessa ação, com o inerente efeito compensatório (se tal crédito exceder o do autor, pode ainda obter a condenação deste no pagamento do diferencial). Esta solução é de adotar tanto no caso de o contracrédito ser invocado apenas nessa ocasião, como no caso de já ter sido invocado previamente, ao abrigo do artigo 848.º do CC, com intuito compensatório (…)
b) se o réu, no cenário que antecede, não tiver agido nos termos indicados e vier a ser condenado, fica impedido de invocar o contracrédito em sede de embargos de executado, o que significa que, neste contexto, a reconvenção tem caráter necessário, mas não propriamente preclusivo quanto ao direito de crédito, isto é, o impedimento de invocação do contracrédito em embargos de executado não obsta à invocação desse direito em ação declarativa que o tenha por objeto.»[7]
Neste sentido, cfr. Ac. STJ de 20/01/2022 (604/18):
«I. Prevendo o artigo 720.º, alínea h), do CPC, como fundamento de oposição à execução baseada em sentença, a invocação de contracrédito sobre o exequente, com vista a obter a compensação de créditos, há que harmonizar esse preceito com a regra, extraível do artigo 266.º, n.º 2, alínea c), do CPC, de que a compensação deve ser deduzida em reconvenção.
II. Assim, se, no momento em que apresentar a defesa na ação declarativa, o réu estiver em con­dições de invocar o contracrédito de que se considere titular, deverá realizá-lo através da reconvenção, para que a situação seja apreciada e decidida nessa ação. Não o fazendo, verá impedida a realização da compensação nos embargos de executado.
III. A circunstância de existirem opiniões no sentido de não ser admissível a reconvenção subsidiária, para efeitos de compensação (numa situação em que o réu contesta o crédito do autor e reconvém, estribado no seu contracrédito, prevenindo a hipótese de aquele ser reconhecido), não é razão suficiente para que tal reconvenção não seja, à partida, apresentada pelo réu, nem é também justificação bastante para, já em sede de embargos de executado, se admitir a compensação, apesar de não ter o réu/executado tomado a iniciativa de, em tempo oportuno, suscitar a sua apreciação e decisão na ação precedente.»
Ac. STJ de 12/12/2023 (3255/18):
«V- Se o réu estiver em condições de invocar o crédito a que se arroga sobre o autor no momento da contestação, deve deduzir pedido reconvencional, desse modo assegurando a respetiva apreciação e reconhecimento, e assim o efeito compensatório, sob pena de apenas o fazer em ação declarativa autónoma.
VI- Não tendo o réu adotado tal conduta, na procedência da ação com a sua condenação, fica inviabilizado que em sede de embargos de executado o possa fazer.
VII- Caso o contracrédito apenas se constituir ou poder ser invocado após o oferecimento da contestação da ação que produz o título executivo, então, conforme resulta da alínea h) do artigo 729.º do CPC. pode constituir fundamento de embargos, nos termos em que poderia ter sido invocado na ação declarativa, com o reconhecimento do crédito e os decorrentes efeitos, compensatórios, e apenas estes.»
Ac. TRL de 20/06/2023 (174/22):
«O Executado só pode invocar, em sede de embargos de executado, o seu contracrédito para efeitos de compensação, se não o pode invocar, por via de reconvenção, no âmbito da ação declarativa precedente, por não terem ainda ocorrido os factos que fundamentavam o alegado crédito do executado.»
Ac. TRP de 07/03/2024 (2360/23):
«II - A autonomização da compensação, como causa de extinção das obrigações, prevista na alínea h) do artigo 729.º do Código de Processo Civil, visou assegurar o seu reconhecimento como fundamento para oposição à execução, pondo, deste modo, termo à controvérsia doutrinária e jurisprudencial que tal questão antes suscitava.
III - Fundando-se a execução em sentença, a invocação da compensação do contracrédito do executado sobre a exequente apenas pode ser fundamento de embargos de executado e neles ser conhecido e reconhecido, sem que o tivesse sido antes em ação declarativa, se esse contra crédito for superveniente em relação à ação declarativa.»
Uma vez que o contracrédito da Embargante decorre de faturas vencidas entre 2014 e 2018, podia esta ter deduzido reconvenção no âmbito da ação declarativa que correu termos sob o n.º 2737/19.1T8FAR a coberto do disposto no artigo 266.º, n.º 2, alínea c), do CPC. Dado que a reconvenção tem caráter necessário relativamente aos embargos de executado (embora não preclusivo do exercício autónomo do direito, em ação declarativa intentada para reconhecimento do crédito e condenação do demandado ao respetivo pagamento), resulta a Executada impedida de invocar o contracrédito sobre o Exequente.
O que implica no indeferimento dos embargos, impondo-se a revogação da decisão da 1.ª Instância.

As custas recaem sobre a Recorrida – artigo 527.º, n.º 1, do CPC.

Sumário: (…)

IV – DECISÃO
Nestes termos, decide-se pela procedência do recurso, em consequência do que se revoga a decisão recorrida, indeferindo-se os embargos de executado.
Custas pela Recorrida.
Évora, 26 de setembro de 2024
Isabel de Matos Peixoto Imaginário
Eduarda Branquinho
Maria Domingas Simões

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[1] Alberto dos Reis, CPC Anotado, vol. V, págs. 139 e 140.
[2] Ac. STJ de 16/12/2004 (Ferreira de Almeida).
[3] Ac. STJ de 28/05/2015 (Granja da Fonseca).
[4] Ac. STJ de 23/03/2017 (Tomé Gomes).
[5] Antunes Varela, Miguel Bezerra, Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª Edição, pág. 688.
[6] Cfr. fls. 15 da sentença.
[7] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, CPC Anotado, Vol. II, págs. 85 e 86.