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ANOMALIA PSÍQUICA
MEIOS DE PROVA
PODERES DO JUIZ
Sumário
No incidente de substituição de acompanhante, o juiz ordena a produção das provas que considere convenientes ante a adequação da medida a adoptar e recusa a produção de provas que considere desnecessárias. (Sumário do Relator)
Texto Integral
2236/13.5TBPTM-A.E1
Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Évora:
I. Relatório
1. No processo de inabilitação por anomalia psíquica – entretanto convertido em processo de acompanhamento de maior – instaurado pelo Ministério Público em benefício de (…), nascido a 11 de Julho de 1990, junta aos autos certidão de óbito da acompanhante designada, (…),mãe do beneficiário e ante as divergências sobre o preenchimento do cargo de acompanhante, foi proferido despacho a conceder prazo aos intervenientes processuais, “para requerem as diligências que considerem por adequadas, com vista a que o Tribunal possa melhor decidir sobre o preenchimento da vacatura do cargo de acompanhante, e nomeadamente acerca dos obstáculos se colocam à aqui nomeação do vogal/ ou do pai, para desempenhar as referidas funções”.
2. (…), pai do beneficiário, veio apresentar e requerer os seguintes meios de prova:
a) - sujeição do Beneficiário a novo exame pericial e a avaliação psicológica;
b) - realização de relatório social ao Requerente para aferição das efetivas condições sociais e familiares para o exercício da função de curador ou co-curador, “devendo, nesse contexto, ser ouvido o p. p. beneficiário, o pai, aquela que foi formadora D. (…), muito próxima quer do (…), quer dos pais, em particular da falecida, cuja identificação se facultará, a final, e as técnica social e a psicóloga que concretamente o acompanhavam, no centro que aquele, até 24 de setembro frequentava em (…), desde 2006, a saber, CRACEP, Cooperativa de Reeducação e Apoio ao Cidadão Excecional de (…)”.
c) - se solicite à Cooperativa de Reeducação e Apoio ao Cidadão Excecional de … (CRACEP), frequentada pelo beneficiário entre 2006 e até à data da morte da mãe, para informar: - Desde quando e até quanto frequentou o acompanhado a Instituição, qual o seu percurso, tipo de atividade aquele desenvolvia e com que objetivos, cursos frequentados, competências adquiridas e impacto da sua sustação, - Que valores foram pelo (…) recebidos, na referida Instituição, durante sua permanência na mesma, a fim de apurar a autonomia financeira que tal situação confere, positiva e desejavelmente, ao beneficiário, concedendo aquele um rendimento que pode gerir para seu uso pessoal, ao mesmo tempo, contribui para a sua desejável autonomia, responsabilidade, reconhecimento, no âmbito do projeto mais alargado de formação e reabilitação no qual estava inserido, - Se, apesar da denúncia, entretanto operada, por força da ausência desde 24-09-23, o (…) tem condições para ser readmitido na CRACEP, continuando a sua reeducação, de que tanto precisa e não pondo em causa um projeto de vida, a desenvolver na sua terra natal, onde tem amigos e familiares muito próximos que o conhecem e com ele convivem desde que nasceu – Doc. 4. - E, bem assim, para identificar a técnica social e psicóloga, que acompanharam o (…) durante todo o período em que este lá esteve, a fim das mesmas serem devidamente notificadas e ouvidas nestes autos, o que igualmente se requer.
d) - seja oficiado ao Hospital de Santa Maria, em Lisboa, o relatório que confirme o alegado em 13) e 15)[1] supra, para se perceber da real e melhor abordagem do assunto com o beneficiário, o que se requer,
e) - seja oficiado ao GHPA Saúde, sito na Av. (…), Hospital (…), (…), que informe desde quando e em que especialidade o (…) era seguido naquele Hospital;
f) - seja oficiado ao Centro de Saúde de (…), que informe sobre o início e o termo da inscrição do (…), naquele serviço do SNS.
g) - seja oficiado ao Banco (…) – (…) e ao (…) Banco, que informem sobre a a titularidade ou co-titularidade pelo (…) de contas bancárias, data de constituição das mesmas e se estas ainda estão abertas.
h) - seja oficiado ao Banco de Portugal que informe sobre a existência de outras contas bancárias tituladas ou co-tituladas pelo beneficiário, desde a data em que deixou (…) e, subsequentemente, oficiando-se aos respetivos bancos sobre os saldos das mesmas, para determinação da necessidade ou não, qual seja a/s medida/a adotar no interesse e proteção daquele no que respeita a gestão do seu património e devido acompanhamento.
i) - sejam inquiridas as seguintes testemunhas, pessoas integrantes do círculo familiar e social do beneficiário:
I. (…), amiga muito próxima da mãe do (…), que o tem acompanhado, nomeadamente na CRACEP;
II. (…);
III. (…), sobrinha da falecida mãe do (…), residente em 10, Rue (…), L - 2545 (…), Luxemburgo, que visita recorrentemente Portugal na qual aquela tinha muita confiança, a ouvir por teleconferência ou outro meio à distância;
IV. (…), professor, sobrinho e afilhado do ora requerente;
V. (…), planeamento de confeção, prima pela mãe do beneficiário;
VI. (…);
VIII. (…);
- Colaboradores da CRACEP
IX. A diretora da associação, a técnica de serviço social e a psicóloga que acompanharam o (…), a identificar pela CRACEP;
j) - caso se considere pertinente a audição da autora do relatório que diz juntar como doc. 4;
l) - a junção de 8 documentos e protesta juntar outro documento.
3. O Ministério Público, em vista do processo, lavrou douta promoção a considerar, em síntese, a pertinência da realização de perícia médica e a desnecessidade da produção dos restantes meios de prova requeridos.
4. O requerimento mereceu o seguinte despacho:
“Quanto aos requerimentos probatórios apresentados, apenas se justifica sujeitar o beneficiário a uma perícia de cariz psiquiátrico (e não psicológico) e bem assim determinar a realização de relatório social ao próprio requerido, não assumindo qualquer relevo, realizar qualquer outro relatório social nomeadamente ao progenitor e ou ao primeiro vogal. Como também não tem utilidade oficiar à instituição que foi frequentada pelo requerido para obter a informação indicada, nem oficiar a qualquer unidade de saúde, ante o teor do pedido de obtenção de informação clínica que já formalizado pelo progenitor do beneficiário. Sendo igualmente inútil, pelo menos por ora, ouvir todas as testemunhas arroladas, tanto mais, que a factualidade base relevante (o grau de incapacidade e as suas consequências), apenas é aferível com recurso a um juízo técnico. Assim como nenhuma utilidade tem a de conferir as contas bancárias da titularidade do beneficiário, já que a possibilidade de cessação da medida de acompanhamento, ainda que o beneficiário haja sido apenas declarado inabilitado, não será, por ora, de hipnotizar”.
5. O pai do beneficiário recorre deste despacho, motiva o recurso e conclui, na parte que releva (as demais conclusões reportam-se a recursos não admitidos – cfr. despacho do relator de 3/7/2024).
“(…)
S. Também não se concorda com o despacho supra, no que se refere ao indeferimento de diligências requeridas pelo ora recorrente, enquanto meios de prova adequados a apurar o que está em causa nos autos.
T. Por email de 10-12-2023, o ora recorrente, fez chegar aos autos informação sobre a morte da mãe do beneficiário seu filho, sua mulher, ocorrida em setembro último.
U. Entretanto, face ao promovido pelo Ministério Público, a 05-12-23, no âmbito da revisão das medidas de acompanhamento em vigor, foi proferido despacho ref.ª 130476614 de 10-12-23 no qual se ordenou e citamos, “Proceda como promovido devendo a acompanhante / curadora esclarecer se o requerido desenvolve atividade remunerada e quem faz a gestão do seu salário. Junte ainda aos autos certidão do assento de nascimento do beneficiário. Atenta a medida aplicada (a qual afeta apenas os poderes de administração do património do requerido), afira ainda junto da Autoridade Tributária se o beneficiário é titular de imóveis e ou bens móveis sujeitos a registo, desde já se autorizando, para obtenção de tal informação, nos termos do disposto no artigo 418.º, n.º 1, do CPC, o levantamento do sigilo fiscal.”
V. A diligência do dia 15 de janeiro de 2014[2] teve na sua origem, entre outros factos, tal enquadramento, tendo sido promovido pelo M.º P.º “…que as Mandatárias esclarecessem, em face do grau de litigiosidade deste caso, quais as diligências que pretendem que sejam realizadas, junto de que entidades, para aferir da idoneidade quer do progenitor, quer do vogal para o exercício de acompanhante de (…)”.
W. A que se seguiu o despacho: “Concede-se o prazo de 2 dias às Mandatárias para requerem as diligências que considerem por adequadas, com vista a que o Tribunal possa melhor decidir sobre o preenchimento da vacatura do cargo de acompanhante, e nomeadamente acerca dos obstáculos se colocam à aqui nomeação do vogal / ou do pai, para desempenhar as referidas funções.”.
X. Ora, é nesse contexto, entende o recorrente, que o mero relatório técnico da perícia de cariz psiquiátrico não é suficiente para apurar tais factos, sendo também relevante, que se diligencie no sentido da obtenção de relatório psicológico, pois perante a morte inesperada de sua mãe, o beneficiário tem vindo a sofrer muito, o que exige, em nosso modesto entender, a aferição, paralelamente, da real necessidade de acompanhamento especializado.
Y. Discordando, assim, da decisão que indefere a realização de tal diligência.
Z. Mas também não se concorda com o referido despacho de que se recorre, quando aquele decide que, e citamos “não tem utilidade oficiar à instituição que foi frequentada pelo requerido para obter a informação indicada, nem oficiar a qualquer unidade de saúde, ante o teor do pedido de obtenção de informação clínica que já formalizado pelo progenitor do beneficiário. Sendo igualmente inútil, pelo menos por ora, ouvir todas as testemunhas arroladas, tanto mais, que a factualidade base relevante (o grau de incapacidade e as suas consequências), apenas é aferível com recurso a um juízo técnico”.
AA. Ora, salvo melhor opinião, face ao fundamento decisório transcrito em W), estaria em causa requerer diligências adequadas a melhor decidir quanto ao preenchimento da vacatura do cargo de acompanhante, ou seja, avaliando condições pessoais, familiares, logísticas, circunstâncias relevantes no que venha a ser a determinação de um possível putativo acompanhante na tomada de decisões, de gestão pessoal, educacional, de sustento e de património do beneficiário, da sua credibilidade e responsabilidade.
BB. Para a qual os factos trazidos pelo agora recorrente são da maior relevância, permitindo as diligências sugeridas, no seu conjunto, aferir quais as circunstâncias e credibilidade pessoais verificadas que serão relevantes, para uma tomada de decisão, sempre no melhor interesse do beneficiário, repete-se, único filho do recorrente com quem este sempre viveu.
CC. E, assim, tal desiderato, também se alcançará com a realização de relatório social ao progenitor, para que melhor se sustentem e demonstrem as condições, reais e familiares que o envolvem e a sua capacidade em acompanhar, sozinho, conjuntamente e/ ou em distribuição de funções, como sugerido e proposto pelo ora recorrente, e o tribunal, assim, possa melhor decidir sobre o preenchimento da vacatura do cargo de acompanhante.
DD. Também com audição imediata de testemunhas já identificadas, pessoas do círculo social do progenitor e do p. p. beneficiário, familiares diretas deste, do lado paterno e materno, quer no sentido da avaliação das medidas, já identificadas, que deverá decorrer.
EE. Quer no que concerne à aferição pelo próprio tribunal de que o aqui recorrente reúne, de facto, as condições necessárias para exercer a função de acompanhante ou funções no acompanhamento que se mostrem necessárias, e, bem assim demonstrar que tal escolha de acompanhante se mostra conducente ao melhor interesse do beneficiário.
FF. Mas também ordenando seja oficiado à instituição que foi frequentada pelo beneficiário durante largos anos, em Portimão, para obter a informação indicada, na medida em que, face ao que seja apurado quanto às suas necessidades e autonomia, este esteja ou não a prescindir de um complemento remuneratório importante para o seu futuro, que se demonstraria, já que ali auferia rendimento e em (…), onde se encontra não aufere, como refere o requerimento do vogal de 21/12/2023, ref.ª 12003047.
GG. E para se perceber, junto dos técnicos que têm seguido e privado com o beneficiário, há muitos anos, do enquadramento deste, necessidades e melhores respostas à sua autonomia ou falta dela que se apure.
HH. Também, deverá ser oficiado a unidade de saúde pública frequentada pelo beneficiário até à data da morte de sua mãe, em setembro último, que era a sua acompanhante, e com quem vivia, junto com o pai, desde que nasceu.
II. Não sendo suficiente a instituição de saúde, já contactada a nível privado, tendo tal diligência sido deferida pelo Tribunal, mas sem êxito, face à proteção de dados que aquela invocou eximindo-se à prestação de informações, sem ser pela via judicial, pois que só através do tribunal se acederá às necessidades complementares e ao acompanhamento ou não que o beneficiário tem vindo a precisar e a que qualquer decisão não pode ser alheia.
JJ. Assim, mais uma vez se discorda da decisão que indefere a realização de tais diligências, pois só com a realização das mesmas se pode dar cumprimento sustentado a qualquer decisão sobre o que o tribunal vai decidir – o preenchimento da vacatura do cargo de acompanhante para a qual o mesmo deu prazo a que os intervenientes se pronunciassem.
KK. Atente-se no que diz a jurisprudência sobre a escolha da pessoa a desempenhar funções de acompanhante “Porém, ainda que a escolha recaia sobre alguém do círculo familiar do acompanhado, a sua nomeação deverá ser sempre precedida da realização de diligências que permitam perceber se os mesmos reúnem condições para exercerem o cargo de acompanhante, considerando que no exercício da sua função, o acompanhante deve sempre privilegiar o bem-estar e a recuperação do acompanhado, mantendo um contacto permanente com o mesmo, devendo visitá-lo, no mínimo, com uma periodicidade mensal, ou outra periodicidade que o tribunal considere adequada, e tendo sempre presente o interesse do beneficiário” – Ac. TRG de 12-11-2020, disponível em www.dgsi.pt.
LL. Resulta, assim, que todas as diligências requeridas pelo recorrente são adequadas a aferir das condições de cada um dos candidatos ao cargo em questão, mostrando-se ainda necessárias a assegurar aquilo que é uma escolha de acompanhante e do modelo e/ou modalidade no melhor interesse do beneficiário, objetivo final deste processo.
MM. Pelo que deve ser alterada a decisão no sentido de se realizarem as diligências requeridas, quais sejam realização de relatório psicológico, relatório social do progenitor, audição das testemunhas, oficiar à CRACEP e ao Centro de Saúde informação sobre o beneficiário, ouvir os técnicos que o acompanharam em (…), para permitir ao tribunal decidir: sobre o “preenchimento da vacatura do cargo de acompanhante, e nomeadamente acerca dos obstáculos se colocam à aqui nomeação do vogal / ou do pai, para desempenhar as referidas funções”, pois que não é tão só através de um juízo técnico que se pode aferir das reais necessidades do beneficiário”.
Não foi oferecida resposta.
Admitido o recurso e observados os vistos legais, cumpre decidir.
II. Objeto do recurso
O objeto dos recursos é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo do não conhecimento de questões que hajam ficado prejudicadas pela solução dada a outras – cfr. artigos 635.º, n.º 4, 639.º, n.º 1, 608.º, n.º 2 e 663.º, n.º 2, todos do CPC; vistas as conclusões, importa decidir se devem ser admitidos os meios de prova requeridos pelo pai do Beneficiário.
III. Fundamentação 1. Factos
Relevam para o conhecimento do recurso os factos decorrentes das ocorrências processuais relatadas.
2. Direito 2.1. Com a Lei n.º 49/2018, de 14 de agosto, foram revogados os institutos da interdição e inabilitação e, em sua substituição, foi introduzido o instituto do maior acompanhado.
De acordo com o artigo 26.º, n.º 4 e 8, da referida Lei n.º 49/2018, às interdições decretadas antes da entrada em vigor da presente lei aplica-se o regime do maior acompanhado, sendo atribuídos ao acompanhante poderes gerais de representação (n.º 4); os tutores e curadores nomeados antes da entrada em vigor da presente lei passam a acompanhantes, aplicando-se-lhes o regime adotado por esta lei (n.º 7).
Por sentença de 9-7-2014, foi decretada a inabilitação definitiva, por anomalia psíquica, de (…) e nomeada curadora (…), mãe do inabilitado e como vogais do conselho de família, (…), (pro-curador) e (…), primos do inabilitado.
Sob promoção do Ministério Público, em 5/12/2023, os autos prosseguiram para revisão da medida, hoje, de acompanhamento [artigo 26.º e Lei mencionada n.º 49/2018] e, no decurso do incidente, foi junta certidão de óbito da acompanhante (…), falecida em 24-09-2023.
Falecida a acompanhante em exercício coloca-se a questão da sua substituição.
É o que está em causa, por ora, nos autos.
2.2. Nos termos do artigo 140.º do Código Civil, na redação da Lei n.º 49/2018, o “acompanhamento do maior visa assegurar o seu bem-estar, a sua recuperação, o pleno exercício de todos os seus direitos e o cumprimento dos seus deveres, salvo as exceções legais ou determinadas por sentença” (n.º 1); a “medida não tem lugar sempre que o seu objetivo se mostre garantido através dos deveres gerais de cooperação e de assistência que no caso caibam”.
De acordo com o artigo 143.º, n.º 1, do Código Civil, o“acompanhante, maior e no pleno exercício dos seus direitos, é escolhido pelo acompanhado ou pelo seu representante legal, sendo designado judicialmente”.
Na falta de escolha, designadamente decorrentes da condição de saúde do beneficiário, o acompanhamento é deferido, por força do artigo 143.º, n.º 2, à pessoa cuja designação melhor salvaguarde o interesse imperioso do beneficiário, indicando a lei as pessoas que podem ser designadas como acompanhantes: i) o cônjuge não separado, judicialmente ou de facto; ii) o unido de facto; iii) qualquer dos pais; iv) a pessoa designada pelos pais ou pela pessoa que exerça as responsabilidades parentais, em testamento ou em documento autêntico ou autenticado; v) os filhos maiores; vi) qualquer dos avós; vii) a pessoa indicada pela instituição em que o acompanhado esteja integrado; viii) o mandatário a quem o acompanhado tenha conferido poderes de representação; ix) outra pessoa idónea.
Prevê, ainda norma (n.º 3) a designação de vários acompanhantes com diferentes funções, especificando-se as atribuições de cada um.
A salvaguarda do “imperioso interesse do beneficiário”, constitui a pedra de toque da actuação do acompanhante, exigindo-se que este reúna condições para promover o bem-estar e a recuperação do acompanhado, com a diligência requerida a um bom pai de família, na concreta situação considerada, mantendo um contacto permanente com o acompanhado, devendo visitá-lo, no mínimo, com uma periodicidade mensal, ou outra periodicidade que o tribunal considere adequada [artigo 146.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil].
O regime do incidente da substituição do acompanhante retira-se, a nosso ver, do artigo 904.º, n.º 3, do CPC, segundo o qual ao “termo e à modificação das medidas de acompanhamento aplicam-se, com as necessárias adaptações e na medida do necessário, o disposto nos artigos 892.º e seguintes, correndo os incidentes respetivos por apenso ao processo principal”.
Interessa-nos o disposto no artigo 897.º do CPC o qual, sob a epígrafe ‘Poderes instrutórios’, dispõe: 1 - Findos os articulados, o juiz analisa os elementos juntos pelas partes, pronuncia-se sobre a prova por elas requerida e ordena as diligências que considere convenientes, podendo, designadamente, nomear um ou vários peritos. 2 - Em qualquer caso, o juiz deve proceder, sempre, à audição pessoal e direta do beneficiário, deslocando-se, se necessário, ao local onde o mesmo se encontre.
Adaptando a norma, na medida do necessário, ao incidente de substituição do acompanhante, a audição pessoal e directa do beneficiário é obrigatória; a produção da demais prova terá lugar, ou não, conforme o juiz a considere conveniente.
A atribuição desta liberdade probatória ao juiz está, aliás, de acordo com a natureza do processo do acompanhamento de maiores, segundo a qual se lhe aplica, com as necessárias adaptações, o disposto nos processos de jurisdição voluntária no que respeita aos poderes do juiz, ao critério de julgamento e à alteração das decisões com fundamento em circunstâncias supervenientes [artigo 891.º, n.º 1, do CPC], precisamente porque nos processos de jurisdição voluntária “só são admitidas as provas que o juiz considere necessárias” [artigo 986.º, n.º 2, do CPC].
No incidente de substituição de acompanhante, o juiz ordena a produção das provas que considere convenientes ante a adequação da medida a adoptar e recusa a produção de provas que considere desnecessárias.
As provas insusceptíveis de acrescentar um elemento probatório que se repercuta no desfecho da lide por respeitarem a factos que não constam do elenco a apurar são desnecessárias [Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Pires de Sousa, Código de Processo Civil anotado, vol. 1º, 3ª ed., pág. 554].
2.3. Na espécie, foi proferido despacho concedendo aos intervenientes processuais a faculdade de “requerem as diligências que considerem por adequadas, com vista a que o Tribunal possa melhor decidir sobre o preenchimento da vacatura do cargo de acompanhante, e nomeadamente acerca dos obstáculos se colocam à aqui nomeação do vogal/ ou do pai, para desempenhar as referidas funções”.
O âmbito da prova a requerer circunscreve-se, assim, a dois temas, intrinsecamente ligados: - preenchimento da vacatura do cargo de acompanhante; - obstáculos que se colocam à nomeação de … (vogal) ou de … (pai do beneficiário).
Ao abrigo deste despacho, o ora Recorrente requereu a realização de várias diligências [alíneas a) a h), supra], a inquirição de testemunhas [alíneas i) a j), supra] e juntou documentos [alínea l), supra]; o despacho recorrido não tomou posição sobre os documentos, admitindo-os tacitamente nos autos, julgou desnecessário, “pelo menos por ora, ouvir todas as testemunhas arroladas” e considerou justificar-se apenas (…) sujeitar o beneficiário a uma perícia de cariz psiquiátrico (e não psicológico) e bem assim determinar a realização de relatório social ao próprio requerido”.
Visto o requerimento de prova à luz do despacho recorrido, indeferiu-se a produção de prova na parte em que visava a avaliação psicológica do beneficiário [alínea a), 2ª parte] e relativamente às diligências requeridas nas alíneas b) a h) e j), supra; ora, todas estas diligências, como exceção da realização de relatório social ao Requerente [alínea b)], se reportam ao beneficiário, ao seu percurso na Cooperativa de Reeducação e Apoio ao Cidadão Excecional de (…) que terá frequentado, aos valores aí recebidos [alínea c), supra] à sua condição de saúde [alíneas d), e), f) supra], ao seu património [alíneas g) e h), supra], isto é, não se revelam susceptíveis de contribuir para o esclarecimento das questões objecto de prova – preenchimento da vacatura do cargo de acompanhante ou dos obstáculos que se colocam à nomeação de … (vogal) ou de … (pai do beneficiário); são, portanto, desnecessárias.
Desnecessário, do mesmo modo, o relatório social sobre as efetivas condições sociais e familiares do ora Recorrente, uma vez que o que releva apurar é a sua idoneidade para exercer o cargo de acompanhante, a qual pode ser aferida v.g. a partir do depoimento das testemunhas e para a qual não contribuem as condições sociais e familiares em que se insere [estas poderão, é certo, ser efeito daquela, em tese considerada, mas não a sua causa].
E sobre a prova testemunhal requerida sempre se dirá que o despacho recorrido não a rejeitou definitivamente; julgou desnecessário ouvi-las por agora, sem prejuízo de a posterior evolução do processo justificar solução (total ou parcial) diferente, o que lhe é permitido pelo artigo 897.º, n.º 1, e sempre teria amparo no artigo 6.º, n.º 1, ambos do CPC.
A decisão recorrida observa a nosso ver o quadro legal aplicável – o recorrente, aliás, não afirma o contrário, uma vez que não indica quaisquer normas violadas, como lhe impõe o artigo 639.º, n.º 2, alínea a), do CPC – e, como tal, deverá manter-se.
Improcede o recurso, restando confirmar a decisão recorrida.
Sumário (artigo 663.º, n.º 7, do CPC):
(…)
V. Dispositivo:
Delibera-se, pelo exposto, na improcedência do recurso, em confirmar a decisão recorrida.
Sem custas (artigo 4.º, n.º 2, alínea h), do Regulamento das Custas Judiciais).
Évora, 26 de Setembro de 2024
Francisco Matos
Canelas Brás
Cristina Dá Mesquita
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[1] 13- Mas, ainda, face ao ocorrido, em particular, com a morte da mãe mais nova que o pai e quando não se esperava e ao afastamento físico do pai, apurando os verdadeiros motivos para tal, entre outras, face ao que aquele verbalizou como sendo “porque não quer escorregar na rua em Portimão”, o que poderá denunciar uma necessidade estrema e urgente de acompanhamento e recuperação de confiança daquele, com aproximação dos locais que sempre foram os “seus”;
15- Faz-se notar que a mãe do beneficiário, na sequência de uma queda numa rua em (…), deu entrada no hospital, ali tendo sido vítima de uma septicémia, fatal.
[2] A indicação do ano enferma de lapso; a diligência teve lugar no dia 15-01-2024.